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CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS 34. TRATAMENTO 35. PROGNÓSTICO 36. COLANGITE BILIAR PRIMÁRIA (CBP) 37. INTRODUÇÃO 38. EPIDEMIOLOGIA E ETIOPATOGENIA 39. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 40. MANIFESTAÇÕES LABORATORIAIS 41. DIAGNÓSTICO 42. TRATAMENTO 43. DOENÇA DE WILSON (DW) 44. INTRODUÇÃO 45. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 46. DIAGNÓSTICO 47. TRATAMENTO 48. INTRODUÇÃO 49. FISIOPATOLOGIA 50. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 51. DIAGNÓSTICO 52. TRATAMENTO 53. PROGNÓSTICO 54. COMPLICAÇÕES DA CIRROSE 55. INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICA 56. INTRODUÇÃO 57. ACHADOS PERIFÉRICOS medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina 58. DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS 59. MANIFESTAÇÕES HEMATOLÓGICAS 60. HIPERTENSÃO PORTA 61. INTRODUÇÃO 62. FISIOPATOLOGIA 63. ETIOLOGIA 64. DIAGNÓSTICO 65. MEDIDAS HEMODINÂMICAS 66. COMPLICAÇÕES E SEU MANUSEIO 67. VARIZES ESOFAGOGÁSTRICAS 68. VARIZES ESOFAGIANAS 69. VARIZES GÁSTRICAS (VG) E GASTROPATIA HIPERTENSIVA PORTAL (GHP) 70. CONDUTA NO SANGRAMENTO 71. PROFILAXIA PRIMÁRIA DO SANGRAMENTO 72. PROFILAXIA SECUNDÁRIA DO SANGRAMENTO 73. PROFILAXIA DE INFECÇÕES 74. PROFILAXIA DA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA 75. ASCITE 76. DEFINIÇÃO 77. O EXAME FÍSICO 78. EXAMES COMPLEMENTARES 79. RADIOGRAFIA 80. EXAME DO LÍQUIDO ASCÍTICO 81. ETIOLOGIA DAS ASCITES 82. ABORDAGEM DIAGNÓSTICA 83. MANEJO DAS ASCITES 84. PERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEA 85. OUTRAS COMPLICAÇÕES 86. ENCEFALOPATIA HEPÁTICA 87. SÍNDROME HEPATORRENAL 88. SÍNDROME HEPATOPULMONAR E HIPERTENSÃO PORTOPULMONAR 89. APÊNDICE: HEPATOPATIA MEDICAMENTOSA 90. INTRODUÇÃO 91. PRINCÍPIOS DE DIAGNÓSTICO E MANUSEIO 92. PRINCIPAIS MEDICAMENTOS ENVOLVIDOS 93. PARACETAMOL (ACETAMINOFENO) 94. ESQUEMA RIPE 95. AMIODARONA 96. ALFAMETILDOPA 97. AMOXICILINA + ÁCIDO CLAVULÂNICO 98. ERITROMICINA 99. HALOTANO 100. FENITOÍNA 101. ÁCIDO VALPROICO 102. ANTICONCEPCIONAIS ORAIS (ACO) 103. APÊNDICE: ETIOLOGIAS MENOS FREQUENTES DE CIRROSE 104. DEFICIÊNCIA DE ALFA-1-ANTITRIPSINA 105. CIRROSE CARDÍACA 106. GALACTOSEMIA 107. TIROSINEMIA 108. FIBROSE CÍSTICA 109. ATRESIA CONGÊNITA DAS VIAS BILIARES 110. CISTOS DE COLÉDOCO 111. COLESTASE INTRA-HEPÁTICA FAMILIAR PROGRESSIVA 112. RAREFAÇÃO DE DUCTOS BILIARES INTERLOBULARES (RDBIL) 113. APÊNDICE: TRANSPLANTE HEPÁTICO 114. INTRODUÇÃO 115. INDICAÇÕES DO TRANSPLANTE 116. CRITÉRIOS DE SELEÇÃO 117. INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES 118. TIPOS DE TRANSPLANTE HEPÁTICO medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina 119. TRANSPLANTE INTERVIVOS 120. TRANSPLANTE DO TIPO "SPLIT LIVER" 121. TRANSPLANTE EM "DOMINÓ" 122. SELEÇÃO DO DOADOR 123. TÉCNICA CIRÚRGICA 124. IMUNOSSUPRESSÃO 125. COMPLICAÇÕES DO TRANSPLANTE 126. NÃO FUNCIONAMENTO DO ENXERTO 127. COMPLICAÇÕES TÉCNICAS 128. REJEIÇÃO AGUDA E CRÔNICA 129. TRANSPLANTE NAS HEPATITES B E C 130. HEPATITE B 131. HEPATITE C 132. APÊNDICE: MANEJO CIRÚRGICO DA HIPERTENSÃO PORTA 133. INTRODUÇÃO 134. PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS 135. DERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS NÃO SELETIVAS 136. DERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS PARCIAIS 137. DERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS SELETIVAS 138. PROCEDIMENTOS DE DESVASCULARIZAÇÃO 139. TRANSPLANTE HEPÁTICO 140. ÁREA DE TREINAMENTO 141. QUESTÕES DA APOSTILA 142. TABELA DE EXAMES 143. BÔNUS APOSTILA _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Aqui há o video de apostila 1.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. CAPÍTULO 1CAPÍTULO 1 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina CAPÍTULO 1CAPÍTULO 1 CONCEITOS GERAISCONCEITOS GERAIS Aqui há o video de apostila 2.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO O termo cirrose hepática não se refere apenas ao surgimento de fibrose hepática . Na verdade, p a r a haver cirrose, é necessário um profundo remodelamento da citoarquitetura do parênquima hepático, além, é claro, da presença de extensa fibrose tecidual. Neste capítulo, definiremos o que vem a ser cirrose hepática, mas para tanto é preciso antes uma rápida revisão sobre a histologia do fígado e suas relações funcionais. Então, vamos lá! Os sinusoides conduzem o sangue das circulações porta e sistêmica (ramos da veia porta e artéria hepática presentes nos espaços porta) para a veia centrolobular (pertencente ao sistema cava) — Durante esta passagem, substâncias provenientes do sangue são captadas pelos hepatócitos para serem metabolizadas. É válido ressaltar que este último fato depende de duas características fundamentais dos sinusoides hepáticos, que os distinguem dos demais capilares do corpo: (1) eles são altamente fenestrados ( fenestra = “janela”, isto é, contêm verdadeiros “buracos” em sua parede); e (2) são desprovidos de membrana basal (facilitando a saída de macromoléculas para fora do vaso). Assim, todas as substâncias presentes no sangue podem atravessar livremente as fenestras sinusoidais e alcançar o espaço de Disse , que fica entre o sinusoide e o hepatócito. Tal espaço representa o interstício lobular e contém as células mais importantes para a gênese da cirrose hepática — as células estreladas ou células de Ito ( ). Figura 1. _ Figura 2 _ _ Fig. 1: Funcionamento dos sinusoides. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina As células estreladas normalmente são “quiescentes” (isto é, apresentam pouca atividade metabólica) e têm a função primordial de armazenar vitamina A. Entretanto, na presença de certos estímulos (ex.: atividade necroinflamatória crônica no parênquima), podem se transformar em células altamente capazes de sintetizar matriz extracelular (em particular, colágeno tipo I e III). Essa transformação é induzida por efeitos parácrinos de citocinas pró- inflamatórias, secretadas pelas células de Kupffer ativadas e outras células do sistema imunológico. A deposição de fibras colágenas no espaço de Disse leva ao fenômeno de capilarização dos sinusoides , no qual uma camada de colágeno, pouco permeável, oblitera as fenestras e impede o contato entre os hepatócitos e as substâncias oriundas do sangue, inclusive fazendo desaparecer as microvilosidades na membrana hepatocitária (o que reflete a diminuição na captação celular). Com isso, a capacidade de metabolização hepática — bem como a secreção, no sangue, de macromoléculas produzidas pelos hepatócitos — vai se tornando progressivamente comprometida. A capilarização dos sinusoides também diminui seu calibre, o que aumenta a resistência vascular intra-hepática (fator crucial na gênese da hipertensão porta). E as próprias células estreladas, em seu processo de transformação patogênica, acabam por adquirir capacidade contrátil (tornando-se miofibroblasto s), o que reduz ainda mais o diâmetro sinusoidal. Perceba que o processo de deposição de fibras colágenas e consequente capilarização dos sinusoides, em meio a segmentos de necrose hepatocitária, nada mais é do que a famosa fibrose em ponte (porta-centro). O sangue passa a circular por dentro dessas traves fibróticas sem entrar em contato com as placas de hepatócitos, numa espécie de shunt intra-hepático, indo Fig. 1: Funcionamento dos sinusoides. _ Fig. 2: Processo de transformação das células que dãocomo avaliar o paciente quanto à presença de sinais e sintomas de cirrose hepática descompensada. Apesar dessa preocupação, a relação risco-benefício em longo prazo é favorável à realização do procedimento. Das drogas utilizadas para tratamento da obesidade, os agonistas do GLP-1 (liraglutida, semaglutida) são os preferíveis na presença de MASLD ou MASH. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina TRATAMENTO FARMACOLÓGICOTRATAMENTO FARMACOLÓGICO ESPECÍFICOESPECÍFICO Algumas drogas parecem exercer ação direta sobre a esteatose hepática metabólica. No entanto, não existe uma recomendação formal para o seu emprego em todos os pacientes... A principal intervenção terapêutica continua sendo a mudança no estilo de vida (dieta + atividades físicas) aliada às medidas gerais anteriormente citadas! Não obstante, podemos considerar seu uso para pacientes que não atingem a meta de perda ponderal com tratamento conservador e apresentam MASH confirmada por biópsia e fibrose estágio F ≥ 2 . A escolha do medicamento depende da presença ou não de diabetes mellitus tipo 2 — . Tab. 7 MASH sem DM 2 Vitamina E 800 UI/dia. MASH com DM 2 Pioglitazona 30-45 mg/dia. O efeito benéfico da vitamina E parece ser secundário às suas propriedades antioxidantes . Já o efeito benéfico da pioglitazona parece ser o aumento da sensibilidade à insulina , além do que tal droga ajuda no controle glicêmico (a pioglitazona é o antidiabético preferencial em portadores de DM 2 que têm MASH e já estão em uso de metformina ou que não toleram a metformina). Vale lembrar que os agonistas de GLP-1, além de serem úteis para promover perda de peso, também ajudam a controlar a glicemia. Logo, pacientes diabéticos com MASLD/MASH e sobrepeso/ obesidade, quando precisam associar drogas antidiabéticas, têm como esquema preferencial a combinação de metformina, pioglitazona e agonistas de GLP-1 (Obs.: a metformina não melhora diretamente a esteatose hepática!). A literatura médica afirma que, quando o paciente não é portador de DM 2, não há benefício em prescrever pioglitazona. Por outro lado, quando o paciente é portador de DM 2, não há benefício em prescrever vitamina E. Logo, a escolha entre uma droga e outra é pautada pela presença ou não de DM 2... O motivo para isso é simples: os estudos que validaram a vitamina E no tratamento da MASH não incluíram pacientes diabéticos, logo, não há evidências científicas de benefício neste grupo. Já os estudos que validaram a pioglitazona não incluíram pacientes Tabela 7 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina neste grupo. Já os estudos que validaram a pioglitazona não incluíram pacientes não diabéticos, e a mesma conclusão pode ser obtida. A conduta terapêutica para portadores de cirrose por MASH segue as mesmas diretrizes para a cirrose em geral. HEPATITE AUTOIMUNE (HAI)HEPATITE AUTOIMUNE (HAI) INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO Aqui há o video de apostila 4.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. A Hepatite Autoimune (HAI) é uma doença típica de mulheres jovens em que um processo de hepatite crônica caracterizado pela “hepatite de interface” ( ) se acompanha de hipergamaglobulinemia e positividade para certos marcadores sorológicos, como F A N e antimúsculo liso (HAI tipo 1 — forma mais comum da doença), anti-LKM (HAI tipo 2 — variante que predomina em crianças) ou anti-SLA (HAI tipo 3 — forma mais agressiva). Manifestações extra-hepáticas de autoimunidade também podem ocorrer (ex.: artrite, glomerulonefrite, Sjögren etc.)... Esta condição costuma responder ao tratamento imunossu‐ pressor, feito inicialmente com glicocorticoide e azatioprina. Na ausência de tratamento e nos n ã o respondedores, a evolução para cirrose/falência hepática costuma ser a regra, com mortalidade que pode chegar a 40% em seis meses. Com tratamento adequado, no entanto, a sobrevida em dez anos é de 80–90%. SAIBA MAIS... Muitos autores evitam o uso de vitamina E em indivíduos com história pessoal ou familiar de câncer de próstata, pois há indícios de que a reposição dessa vitamina possa aumentar o risco dessa neoplasia. Figura 7 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Acredita-se que a HAI seja a etiologia de uma boa parte dos casos de cirrose hepática “criptogênica” (definida após a exclusão de infecções por vírus hepatotrópicos, doenças metabólicas e genéticas e exposição a hepatotoxinas)! Nestes pacientes, a biópsia hepática mostra apenas fibrose e nódulos de regeneração, sem qualquer achado que dê pistas da patologia inicial. Em fases avançadas, os marcadores sorológicos de autoimunidade podem desaparecer e dificultar o diagnóstico. EPIDEMIOLOGIAEPIDEMIOLOGIA Apesar da preferência por mulheres jovens (HAI tipo 1) ou crianças (HAI tipo 2), a hepatite autoimune pode aparecer em qualquer sexo e faixa etária! Trata-se de uma doença incomum, com incidência de 8,5 casos por milhão de pessoas e prevalência de 107 casos por milhão. A maioria dos doentes possui pelo menos um dos marcadores genéticos a seguir: HLA-B8 e HLA-DR3 (mais comum em jovens) ou HLA- DR4 (mais comum em idosos). Existem evidências de que a HAI seja desencadeada pela interação entre fatores de predisposição genética e fatores ambientais. Já foi documentado, por exemplo, que infecções agudas e autolimitadas por vírus hepatotrópicos (ex.: hepatite A) podem servir de “gatilho” para o surgimento de uma resposta autoimune persis‐ tente, direcionada contra os hepatócitos. Exposição a certas substâncias (ex.: nitro furantoína, infliximabe) também pode iniciar o quadro. MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Em 40% dos casos, a doença se apresenta de forma aguda, assumindo, ocasionalmente, um padrão “fulminante”. No restante, a HAI segue um curso tipicamente insidioso, evoluindo com Fig. 7: " Hepatite de interface”. Observe o infiltrado inflamatório concentrado no espaço porta formando uma “linha de frente” com as arestas do lóbulo hepático. Os hepatócitos mais periféricos vão sendo progressiva‐ mente destruídos na medida em que o processo avança na direção centrolobular. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina padrão “fulminante”. No restante, a HAI segue um curso tipicamente insidioso, evoluindo com queixas progressivas de fadiga, anorexia, icterícia e artralgia. Em mulheres, são comuns ainda as queixas de amenorreia (que pode ser a primeira manifestação clínica da doença), hirsutismo e acne. Alguns pacientes permanecem assintomáticos por longos períodos, procurando auxílio médico somente em fases avançadas de dano hepático, já com estigmas de cirrose, por exemplo: sinais e sintomas de falência hepatocelular (encefalopatia, hipoalbuminemia, alargamento do TAP/INR) e/ou sinais e sintomas de hipertensão porta (esplenomegalia, varizes de esôfago, ascite). O risco de carcinoma hepatocelular em portadores de HAI com cirrose hepática é de cerca de 1% ao ano (inferior ao da cirrose causada por hepatites virais crônicas). Também podem ocorrer manifestações extra-hepáticas de autoimunidade, como: rash maculopapular, vasculite cutânea, eritema nodoso, artrite, glomerulonefrite, pericardite, pleurite, tireoidite, síndrome de Sjögren, colite ulcerativa e anemia hemolítica Coombs-positivo . Tais achados geralmente se associam à deposição tecidual de imunocomplexos circulantes, acompanhan do-se de ativação e consumo do complemento. MANIFESTAÇÕES LABORATORIAISMANIFESTAÇÕES LABORATORIAIS O hepatograma é semelhante ao das hepatites virais crônicas: aminotransferases variavelmente aumentadas e “flutuantes” (em geral, entre 100–1.000 U/L), icterícia à custa de bilirrubina direta (que costuma ficar entre 3–10 mg/dl), hipoalbuminemia e alargamento do TAP/INR em casos muito intensos ou avançados. É digno de nota que as enzimas canaliculares (fosfatase alcalina e gama GT), em geral, são normais ou discretamente aumentadas. Quando tais enzimas têm aumentos proeminentes, temos que pensar numa síndrome de superposição entre HAI e colangite biliar primária ou entre HAI e colangiteesclerosante primária! Um achado laboratorial característico é a hipergamaglobulinemia (> 2,5 g/dl). Trata-se de uma hipergama “policlonal”, que pode justificar um resultado “falso-positivo” na pesquisa do fator reumatoide , bem como em diversas sorologias virais, incluindo hepatite C (o RIBA e o PCR para HCV-RNA serão negativos nestes casos). Em relação aos autoanticorpos que aparecem na HAI, descrevem-se padrões sorológicos associados a determinadas características clínicas distintivas, o que permite a subdivisão da doença ( ). Tab. 8 HAI Tipo I Anticorpos Tabela 8 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Características FAN (padrão homo gêneo), antimúsculo liso, antiactina, p-ANCA "atípico". Forma mais comum da doença, de predomínio em mulheres jovens, sendo acompanhada por hipergamaglobu linemia e manifestações extra-hepáticas de auto ‐ imunidade (justificando a antiga denominação "hepatite lupoide"). HAI Tipo II Anticorpos Características Apenas anti-LKM. Forma predominante em meninas com menos de 14 anos de idade, geralmente de ascendência medi terrânea. O FAN costuma ser negativo, e pode não haver hipergamaglo bulinemia. Alguns pacientes têm também o autoanticorpo "anticitosol hepático-1 ". HAI Tipo III (?) Anticorpos Características Apenas anti-SLA. Quadro clínico semelhante ao tipo I, porém o FAN e o antimúsculo liso são negativos, e a evolução tende a ser mais grave e recidivante. Muitos consideram que o anti- SLA define uma variante mais agressiva da HAI tipo I, não aceitando a denominação "HAI tipo III". Legenda Obs.: ( 1 ) p-ANCA “atípico” é aquele que mostra padrão “perinuclear” na pesquisa de ANCA por imunofluorescência, porém não se associa ao autoanticorpo antimieloperoxidase; (2) LKM = Liver- Kidney Microsome ; (3) SLA = Soluble Liver Antigen . CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOSCRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS A biópsia hepática é sempre indicada na avaliação de um caso suspeito de HAI: o achado de medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A biópsia hepática é sempre indicada na avaliação de um caso suspeito de HAI: o achado de “hepatite de interface” não é patognomônico, pois pode ser observado em outras hepatites crônicas. No entanto, num contexto clinicolaboratorial sugestivo de HAI, tal achado confere especificidade ao diagnóstico (ver adiante)! QUADRO DE CONCEITOS V O que caracteriza os quadros de HAI na biópsia hepática é a lesão conhecida como hepatite de interface . Laboratorialmente, a maioria dos casos de HAI (representados pelo tipo I) cursa com hipergamaglobulinemia e presença de determinados autoanticorpos . Em casos típicos em que nenhuma outra hepatopatia pode ser identificada, o diagnóstico de HAI costuma ser estabelecido sem dificuldade. Contudo, para os casos duvidosos, foi desenvolvido um escore que auxilia na decisão diagnóstica ( ). Com 6 pontos, o diagnóstico de HAI é “provável”; com 7 ou mais pontos, o diagnóstico é “definitivo”. Tab. 9 Obs.: LSN = Limite Superior da Normalidade. TRATAMENTOTRATAMENTO A imunossupressão representa a base da conduta terapêutica e comprovadamente induz melhora dos sintomas, do laboratório (hepatograma, hipergamaglobulinemia) e das alterações histopatológicas. As principais indicações de tratamento farmacológico para a HAI são listadas a seguir: ● Aminotransferases > 10x o LSN; ● Aminotransferases > 2x o LSN com: Tabela 9 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Aminotransferases > 2x o LSN com: � Sintomas; � Aumento dos níveis de IgG; � Aumento da bilirrubina direta; � Hepatite de interface na biópsia. ● Cirrose hepática com ou sem inflamação ativa (em qualquer grau) na biópsia hepática; ● Idadepor acaso quando há demonstração de níveis séricos elevados de fosfatase alcalina em indivíduos assintomáticos. O antigo nome “cirrose biliar” acabou sendo medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina alcalina em indivíduos assintomáticos. O antigo nome “cirrose biliar” acabou sendo substituído, pois o diagnóstico precoce e o início do tratamento em fases inicias conseguem prevenir ou pelo menos atrasar a evolução para cirrose hepática. QUADRO DE CONCEITOS IV Na CBP, os ductos biliares intra-hepáticos são destruídos, levando à colestase progressiva e à cirrose. A doença predomina em mulheres de meia-idade, possuindo como marcador diagnóstico o antimitocôndria. O prognóstico não é bom, com a maioria evoluindo para falência hepática na ausência de tratamento. Este é feito atualmente com ácido ursodesoxicólico. EPIDEMIOLOGIA E ETIOPATOGENIAEPIDEMIOLOGIA E ETIOPATOGENIA Nos EUA, a incidência de CBP em mulheres gira em torno de 4,5 casos por 100.000 e 0,7 casos por 100.000 em homens. Por motivos desconhecidos, sua frequência parece estar aumentando nos últimos anos. Nota-se uma clara predisposição genética. Até 6% dos parentes de primeiro grau de um indivíduo acometido também desenvolvem CBP, e a concordância entre gêmeos monozigóticos é alta, sugerindo a participação de fatores de predisposição genética. De fato, já foi demonstrado que a CBP se associa aos alelos do HLA-DRB1 e DQB1, além de polimorfismos nos genes IL12A, IL12RB2 e IRF5-TNPO3 (todos envolvidos na regulação de citocinas pró- inflamatórias). Portadores de monossomia do cromossomo X ( síndrome de Turner ) parecem especialmente propensos a desenvolver CBP na vida adulta. Alguns fatores ambientais são capazes de desencadear a doença em indivíduos geneticamente predispostos, por exemplo: (1) infecções por Chlamydophila pneumoniae, E. coli, Novosphin go ‐ bium aromaticivorans e Betaretrovirus humano; (2) vacinação com Lactobacillus na prevenção da vaginite recorrente; (3) tabagismo; (4) terapia de reposição hormonal; e (5) exposição a tintas de cabelo. Existem relatos de "surtos" de CBP, com casos agrupados no tempo e no espaço, o que corrobora a existência de fatores ambientais em sua gênese. A CBP muitas vezes coexiste com uma ou mais das seguintes condições: síndrome de Sjögren, tireoidite de Hashimoto, doença de Graves, doença celíaca, esclerose sistêmica e fenômeno de Raynaud. MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Boa parte dos pacientes permanece assintomática por anos, sendo o início da doença medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Boa parte dos pacientes permanece assintomática por anos, sendo o início da doença tipicamente insidioso. Os primeiros sintomas que costumam ser notados são a fadiga e o prurido . Ao exame físico, notam-se hepatoesplenomegalia e uma típica alteração cutânea indicativa de hipercolesterolemia acentuada (consequência da colestase intra-hepática): a s lesões xantomatosas ( xantoma = “tumor amarelo”), que são depósitos de colesterol na pele. Os xantomas se formam no rosto, geralmente nas pálpebras ( ) , e também podem se depositar nos tendões dos músculos esqueléticos. Icterícia, esteatorreia e sinais e sintomas de hipertensão porta costumam ser manifestações tardias, indicativas de cirrose hepática. Desmineralização óssea (osteopenia/osteoporose) pode acontecer em decorrência da deficiência de vitamina D. Muitos pacientes desenvolvem quadros de disautonomia c o m hipotensão ortostática e agravamento da sensação de fadiga, além de deficit cognitivo , ambos de mecanismo pouco compreendido. Figura 8 _ _ Fig. 8 : Os "xantelasmas" (depósitos de colesterol nas pálpebras) típicos da hipercolesterolemia que acompanha a CBP. SAIBA MAIS… A origem do prurido na CBP. O prurido desses pacientes é secundário ao acúmulo de ácido lisofosfatídico no medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina MANIFESTAÇÕES LABORATORIAISMANIFESTAÇÕES LABORATORIAIS INESPECÍFICASINESPECÍFICAS A primeira alteração laboratorial observada na CBP (geralmente com o paciente ainda assintomático) é o aumento da fosfatase alcalina sérica . Na medida em que a colestase intra- hepática evolui, é muito comum o surgimento de hipercolesterolemia, com aumento particular‐ mente pronunciado dos níveis de HDL (lipoproteína de alta densidade). Somente em estágios avançados é que sobrevém a hiperbilirrubinemia (com predomínio da fração direta). ESPECÍFICASESPECÍFICAS O autoanticorpo antimitocôndria está presente em 95% dos casos , sendo sensível e específico para o diagnóstico de CBP (S = 95%; E = 98%). Ele tem como antígeno-alvo uma porção da enzima piruvato desidrogenase mitocondrial (a fração “di-hidrolipoamida acetiltransferase”). O antimitocôndria é uma imunoglobulina da classe IgM, explicando o aumento de IgM na eletroforese de proteínas do paciente. Existe ainda outra alteração sorológica específica: o FAN (Fator Antinuclear) com padrão de reatividade contra o “complexo do poro nuclear” (anticorpos contra a gp210 presente no envelope nuclear). Tal exame, no entanto, não é feito de rotina, somente por laboratórios especializados. QUADRO DE CONCEITOS VII A CBP possui um marcador sorológico específico: o autoanticorpo antimitocôndria . Os níveis séricos de IgM encontram-se aumentados, e o FAN pode ser positivo num padrão de reatividade contra o "complexo do poro nuclear". DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO Segundo a AASLD ( American Association for the Study of Liver Diseases ), a hipótese de CBP deve ser aventada em todo paciente que apresenta níveis séricos elevados de fosfatase alcalina. Se outras etiologias mais comuns para este achado puderem ser afastadas (ex.: álcool, colestase por obstrução da árvore biliar e medicamentos indutores de colestase intra-hepática — ex.: clorpromazina, esteroides androgênicos sintéticos, trimetoprima-sulfametoxazol, tolbutamida), a dosagem do autoanticorpo antimitocôndria deve ser solicitada. Títulos ≥ 1:80 são altamente específicos. Para confirmar o diagnóstico, é preciso ter, pelo menos, dois dos três critérios a seguir ( ). organismo. Tal fenômeno, por sua vez, é decorrente de um aumento na atividade da enzima autotaxina , o que é diretamente induzido pela doença. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina seguir ( ). Tab. 10 Critérios Diagnósticos de CBP (AASLD) ● Presença do antimitocôndria. ● Hepatograma sugestivo de colestase (comumen te aumento isolado da fosfatase alcalina). ● Biópsia hepática mostrando colangite destrutiva não supurativa, com lesão dos ductos biliares interlobulares. Como deu pra perceber, a biópsia hepática atualmente NÃO É CONSIDERADA OBRIGA‐ TÓRIA para confirmar o diagnóstico! No entanto, vale dizer que, graças às importantes informações que este exame fornece (estadiamento da doença), a maioria dos hepatolo gistas acaba optando por sua realização. Observe, na , uma representação esquemática das alterações histológicas evolutivas da CBP. Estude, na , o sistema de estadiamento. Tabela 10 Figura 9 _ Tabela 11 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Tab. 11 Estadiamento Histológico da CBP ● Inflamação restrita aos espaços porta, com formação de granulomas. ● Inflamação atingindo a região periportal, com proliferação de ductos biliares. ● Septos fibrosos interlobulares. ● Cirrose hepática. TRATAMENTOTRATAMENTO O prurido é tradicionalmente abordado com colestiramina (4 g diluído em água, 3x/dia). Este quelante de ácidos biliares atua aumentando a eliminação intestinal de substâncias relacionadas ao prurido que se acumulam no corpo do paciente. Outros fármacos que se mostraram benéficos no controle do prurido da CBP são: ondansetrona (4 mg VO conforme necessidade, até 3x/dia) e a sertralina (75–100 mg/dia). O primeiro é um antiemético antagonista do receptor 5-HT3 de serotonina; o segundo é um antidepressivo inibidor seletivo da recaptação de serotonina no SNC. Casos refratários e insuportáveis podem ser submetidos à plasmaférese . Em pacientes que cursamcom esteatorreia, deve-se repor, conforme a necessidade, as vitaminas lipossolúveis do grupo “ADEK” , principalmente se o paciente fizer uso de colestiramina, que diminui ainda mais a absorção intestinal desses nutrientes. Fig. 9: Representação esquemática das alterações histológicas evolutivas da CBP. SAIBA MAIS… CBP e antimitocôndria negativo. Raros pacientes apresentam quadro clinicolaboratorial compatível com CBP, exceto pela negatividade do antimitocôndria. Alguns autores se referem a esta entidade através da denominação genérica “colangite autoimune”. Sabemos que os níveis séricos de IgM não são tão altos nesses doentes e que, com frequência, eles são positivos para o autoanticorpo antimúsculo liso . Muitos apresentam, na realidade, uma síndrome de superposição com hepatite autoimune ou colangite esclerosante primária. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A droga que se mostrou mais eficaz em tratar especificamente a CBP é o ácido ursodesoxicólico (13–15 mg/kg/dia, dividido em 1–2 tomadas). Ele comprovadamente atrasa a progressão da doença, em particular se iniciado em fases precoces, estabilizando a histologia hepática e aumentando a sobrevida em longo prazo. A necessidade de um transplante hepático pode ser protelada e até mesmo evitada em muitos indivíduos. O fato é que 20% dos pacientes tratados com ácido ursodesoxicólico apresentam normalização do hepatograma dentro de dois anos, proporção que aumenta para 40% após cinco anos. O principal efeito colateral é o ganho de peso e, eventualmente, diarreia . Recentemente, um novo fármaco foi aprovado para tratamento da CBP: trata-se do ácido obeticólico . Esta droga pode ser associada ao ácido ursodesoxicólico em pacientes com cirrose compensada (Child A) e resposta insatisfatória a este último. Também pode substituir o ácido ursodesoxicólico nos pacientes intolerantes, sendo utilizado em monoterapia, desde que a doença hepática esteja compensada (Child A). Seu uso na cirrose descompensada (Child B ou C) ainda não foi adequadamente estudado. Diversos outros fármacos já foram testados no tratamento da CBP, mas nenhum obteve os mesmos benefícios que o ácido ursodesoxicólico. No entanto, vale mencionar que a colchicina (0,6 mg VO 2x/dia) e o metotrexato (15 mg VO 1x/semana) também são eficazes para melhorar as manifestações clínicas da doença. Tais drogas só não são usadas de rotina porque acarretam muito mais efeitos colaterais que o ácido ursodesoxicólico, além de não serem tão eficazes quanto ele. Por fim, para pacientes que atingem estágios avançados (fibrose/cirrose hepática), apenas o transplante de fígado pode prolongar a sobrevida. Além da presença de cirrose estabelecida, também devem ser encaminhados para o transplante pacientes com níveis de bilirrubina > 5 mg/dl, albuminade hepatócitos determina uma liberação súbita de cobre na circulação, originando hemólise . Os anéis de Kayser- Fleischer podem estar ausentes (ver adiante). As medidas de cobre, urinário e plasmático, estão elevadas, e a ceruloplasmina sérica costuma estar reduzida. Cirrose: todo paciente jovem que se apresentar com quadro de cirrose inexplicada, com marcadores virais negativos e sem história de alcoolismo, especialmente se também houver alguma anormalidade neurológica, deve ser cuidadosamente investigado para doença de Wilson. FORMA NEUROLÓGICAFORMA NEUROLÓGICA Embora quase metade dos pacientes se apresente com algum distúrbio psiquiátrico, geralmente alterações de personalidade, a função cognitiva costuma ser preservada. Podem ocorrer medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina alterações de personalidade, a função cognitiva costuma ser preservada. Podem ocorrer síndromes indistinguíveis da esquizofrenia ou do transtorno bipolar. Em relação aos sinais e sintomas neurológicos, estes estão sempre relacionados, de forma ampla, aos movimentos (tipicamente, o paciente apresenta manifestações de distonia — ver ) . Não são descritas alterações sensoriais. Tab. 12 Sinais e Sintomas Neurológicos na Doença de Wilson: Distúrbios do Movimento ● Distonia. ● Hipertonia. ● Rigidez. ● Tremores. ● Espasmos. ● Contraturas. ● Disartria. ● Disfonia. ● Disfagia. Os distúrbios neurológicos e psiquiátricos ocorrem no adulto jovem e podem ser os primeiros sinais clínicos em alguns pacientes. São sempre acompanhados pelos anéis de Kayser-Fleischer ( ). Estes anéis são formados por depósitos de cobre na membrana de Descemet da córnea, que adquirem uma coloração verde-dourada. Nunca interferem na visão, mas indicam que o cobre hepático foi liberado e produziu lesão cerebral. Quando um paciente com doença neurológica ou psiquiátrica não apresenta os anéis de Kayser-Fleischer ao exame clínico, pode- se praticamente excluir a DW do diagnóstico diferencial! Tabela 12 Figura 10 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina O quadro, na maioria das vezes, é crônico e insidioso, mas pode também ser agudo e rapidamente progressivo. A morte pode ser resultante dos efeitos da toxicose cúprica sobre o sistema nervoso central, com pouca ou nenhuma evidência de disfunção hepática. Entretanto, a hepatopatia costuma ocorrer em algum período durante a evolução da doença. Os pacientes com sobrevida aumentada quase sempre apresentam cirrose hepática. Os estudos de imagem do sistema nervoso central, como a ressonância nuclear magnética, costumam evidenciar comprometimento bilateral dos gânglios da base, às vezes com lesão associada em ponte, tálamo e/ou cerebelo. ENVOLVIMENTO RENALENVOLVIMENTO RENAL Os rins também podem ser afetados pela doença de Wilson. Depósitos de cobre nos túbulos proximais podem justificar glicosúria, aminoacidúria, acidose tubular renal tipo II, ou mesmo todas em conjunto, no espectro da síndrome de Fanconi . Os efeitos patológicos do excesso de cobre em outros órgãos são mínimos, mas vale ressaltar que é descrita uma maior incidência de abortamentos de repetição em mulheres jovens. DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO O diagnóstico da DW deve ser suspeitado em todo paciente com menos de 40 anos de idade que apresente uma ou mais das seguintes alterações: ● Hepatite crônica ativa sem causa aparente; ● Cirrose hepática sem causa aparente; ● Anemia hemolítica na presença de hepatite aguda; Fig. 10: O anel de Kayser-Fleischer na doença de Wilson. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Distúrbios inexplicados do sistema nervoso central (principalmente os quadros de distonia associados a alterações de personalidade). A avaliação inicial de um paciente com suspeita de doença de Wilson se dá por métodos não invasivos. Um dos mais valiosos, como já vimos, seria a pesquisa dos anéis de Kayser-Fleisher . Sabemos que eles podem ser visíveis a olho nu, mas se recomenda que sua presença seja SEMPRE confirmada por um exame de lâmpada de fenda (biomicroscopia), realizado por oftalmologista experiente. Os anéis de KF estão presentes em mais de 99% dos indivíduos com sintomas neuropsiquiátricos, porém somente cerca de 30–50% dos indivíduos na fase pré- sintomática ou com sintomas exclusivamente hepáticos os possuem. Entre os exames laboratoriais, a ceruloplasmina é normalmente o primeiro a ser solicitado. Trata-se de uma proteína sintetizada no fígado que se responsabiliza pelo transporte de cobre no sangue, evitando que este metal circule em sua forma livre. Os níveis normais de ceruloplasmina variam de 20–50 mg/dl. Nos pacientes com doença de Wilson, estes níveis estão caracteristicamente reduzidos ( 100 mcg/dia, num paciente com sintomas compatíveis, são muito sugestivos do diagnóstico! Na fase pré-sintomática (isto é, crianças ainda sem manifestações neurológicas ou cirrose hepática estabelecida), podemos encontrar valores entre 60–100 mcg/dia, e nos indivíduos heterozigotos para mutações no gene ATP7B, a excreção urinária de cobre pode chegar a 80 mcg/dia. De toda forma, em pessoas hígidas a excreção urinária de cobre não ultrapassa 20–50 mcg/dia. Mais recentemente, passamos a ter disponíveis métodos de análise genética para identificar mutações específicas do gene ATP7B. Recomenda-se, ainda, que parentes de primeiro grau de portadores da doença sejam rastreados. Enfim, o método padrão-ouro para a confirmação diagnóstica é a biópsia hepática , com quantificação da quantidade de cobre (em microgramas) por grama de peso seco de tecido. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Valores > 200 mcg/g confirmam o diagnóstico na ausência de colestase obstrutiva prolongada (esta última situação também aumenta o cobre hepático e pode justificar o surgimento dos anéis de Kayser-Fleischer). Métodos histoquímicos para coloração do cobre no parênquima hepático NÃO são confiáveis e não devem ser empregados! Nos dias de hoje, a demonstração de níveis reduzidos de ceruloplasmina não deve ser considerada "obrigatória" para o diagnóstico, pois se viu que cerca de 10% dos pacientes possui ceruloplasmina normal. Além do mais, em cerca de 20% dos heterozigotos para alelos mutantes do ATP7B (portadores do "traço" da DW, que não desenvolvem a doença), a ceruloplasmina pode estar reduzida… Em suma, o diagnóstico da DW é confirmado pela combinação entre quadro clínico e dados bioquímicos e histoquímicos compatíveis. A ceruloplasmina costuma ser utilizada como teste inicial, seguida de exame ocular com a lâmpada de fenda e/ou da excreção urinária de cobre nas 24h. Testes genéticos podem ser utilizados e já existem alguns disponíveis no mercado. Em caso de dúvida ou para a determinação prognóstica mais exata da quantidade de cobre hepático, fica indicada a biópsia hepática. TRATAMENTOTRATAMENTO TRATAMENTO FARMACOLÓGICOTRATAMENTO FARMACOLÓGICO O tratamento da DW visa à remoção do excesso de cobre do organismo. A droga mais utilizada no passado era a D-penicilamina, ministradapela via oral na dose de 1,5–2 g/dia, fracionada em quatro tomadas diárias (antes das refeições). Como esta droga apresenta efeito antipiridoxí‐ nico, recomenda-se sempre a coadministração de 25–50 mg/dia de vitamina B6 (piridoxina). Nos dias de hoje, a D-penicilamina tornou-se uma medicação de segunda linha no tratamento da DW, pois a experiência mostrou que ela se associa a elevadas taxas de efeitos adversos (ex.: proteinúria nefrótica por glomerulopatia membranosa). Além do mais, a D-penicilamina paradoxalmente piora as manifestações neuropsiquiátricas quando utilizada como primeira droga em pacientes que apresentam acometimento do SNC. A estratégia terapêutica moderna se baseia no tipo de manifestação que o paciente apresenta no momento do diagnóstico. Para pacientes em fase pré-sintomática ou em terapia de manutenção, a estratégia de escolha pode ser apenas a suplementação diária de zinco pelo resto da vida. O z i n c o é medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina comprovadamente eficaz na DW, sendo em geral bem tolerado. Ele atua principalmente pela inibição da absorção intestinal de cobre, favorecendo um balanço negativo deste elemento (pela eliminação urinária do excesso de cobre). Outro efeito do zinco é a indução da síntese hepática de metalotioneína , um quelante endógeno de cobre expresso no citoplasma do hepatócito, que ajuda a reduzir o cobre livre. Quando o indivíduo se apresenta com doença sintomática , a literatura atual recomenda uma avaliação especificamente padronizada da gravidade do quadro. Um método sugerido é chamado de índice de Nazer ( ) e consiste num escore capaz de predizer o prognóstico da falência hepática induzida pela DW. Tab. 2 Um índice de Nazer 9 indica péssimo prognóstico e baixa probabilidade de resposta ao tratamento clínico, sendo recomendável proceder diretamente ao Transplante Ortotópico de Fígado (TOF) . Aqui também se encaixariam aqueles com formas fulminantes da DW. Nazer entre 7–9 requer avaliação individualizada da conduta, podendo-se tentar o tratamento clínico sem obrigatoriedade de listar o paciente para transplante. Pacientes com manifestações neuropsiquiátricas da DW vêm sendo satisfatoriamente tratados com uma droga experimental, o tetratiomolibdato , que se mostrou capaz de reduzir agudamente a toxicidade do cobre sérico livre, sem agravar as manifestações neurológicas da doença (ao contrário da penicilamina e da trientina). Como o tetratiomolibdato ainda não se encontra amplamente disponível, na sua ausência, a droga de escolha para pacientes com manifestações neuropsiquiátricas passa a ser o zinco (que também é inócuo do ponto de vista neurológico). Tabela 13 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A indica os principais esquemas terapêuticos para a DW. Vale lembrar que o tratamento farmacológico deve ser permanente! Qualquer interrupção resultará em recidiva. Uma dieta pobre em cobre não resulta concretamente em nenhum benefício, entretanto devemos orientar os pacientes a evitar a utilização excessiva de alimentos ricos neste metal, como chocolate, ostras e amendoim. Tab. 14 Gestantes portadoras da DW podem ser tratadas com zinco ou trientina durante a gravidez, mas a intensidade do tratamento deve ser rigorosamente monitorada (ver adiante), uma vez que a carência de cobre possui efeitos teratogênicos. Tabela 14 _ SAIBA MAIS... Monitoração da terapia redutora de cobre. Usuários de quelantes de cobre, como trientina e D-penicilamina, devem ser monitorados com dosagens seriadas do cobre sérico livre. O cobre sérico livre é calculado através da fórmula: Cobre sérico total - Cobre ligado à ceruloplasmina Considera-se que cada 10 mg/dl de ceruloplasmina contêm 3 mcg/dl de cobre, e tal valor deve ser substituído na fórmula exposta. O valor normal do cobre sérico livre varia entre 10–15 mcg/dl e, em pacientes com DW, este valor comumente ultrapassa 50 mcg/dl. O objetivo do tratamento com quelantes de cobre é manter o cobre sérico livre 200 mcg/dia. O tratamento efetivo com zinco, após 1–2 anos, deve reduzir a excreção urinária para valores( ))Figura 11 Figura 11 __ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina É fácil percebermos, analisando o metabolismo do ferro, que a etapa intestinal é a grande divisora de águas para a circulação do metal no organismo. Ao mesmo tempo em que é responsável diretamente pela absorção do ferro, é também a sua principal via de excreção. Várias anormalidades metabólicas têm sido sugeridas para a patogênese do superacúmulo tissular de ferro na HH. A hipótese mais aceita é a que descreve um aumento no transporte intestinal de ferro dos enterócitos para a corrente sanguínea. O aumento é provavelmente consequência de uma programação equivocada das células duodenais superficiais quando ainda se encontravam nas criptas, fazendo com que elas captassem ferro avidamente (como se houvesse uma deficiência orgânica de ferro). Além disso, foi demonstrado que a absorção de ferro é regulada por um transportador duodenal de metais chamado DMT1 ou NRAMP2. Zoller e colaboradores detectaram uma maior expressão do RNA-mensageiro do transportador DMT1 na mucosa duodenal de indivíduos com HH, o que promoveria a maior captação duodenal de ferro. Em indivíduos sem a doença, o conteúdo total de ferro no organismo é muito estável: cerca de 4 a 5 g. Entretanto, nos pacientes homozigóticos C282Y sintomáticos, o que geralmente ocorre entre os 40 e 60 anos de idade, os estoques de ferro oscilam entre 20 e 40 g. Isso ocorre porque na HH há uma hiperabsorção intestinal de ferro, muito acima das necessidades orgânicas. Os pacientes com HH têm, assim, uma absorção aumentada de ferro a despeito de ingesta dietética com conteúdo normal do metal . Embora existam várias teorias fisiopatogênicas que se propõem a elucidar o mecanismo exato do descontrole na absorção intestinal de ferro da hemocromatose, ainda hoje muitas dúvidas persistem, até porque grande parte do conhecimento acerca do metabolismo do ferro advém de estudos experimentais, carecendo, portanto, de confirmação de estudos em humanos. A deposição excessiva de ferro nas células parenquimatosas, em especial do fígado , pâncreas e coração , acaba por estimular a peroxidação lipídica e a produção de radicais livres, lesando-as e promovendo fibrose progressiva. Tab. 16 Sintomas Inespecíficos (apresentação da doença) ● Astenia. Fig. 11: Fisiopatologia da HH. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Letargia. ● Fadiga. ● Artralgias. ● Perda da libido. ● Impotência sexual. ● Amenorreia. ● Hepatomegalia. Aqui há o video de apostila 7.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A HH é raramente diagnosticada antes dos 20 anos. A maioria dos pacientes sintomáticos encontram-se entre os 40–50 anos de idade ao diagnóstico. Embora o gene defeituoso seja igualmente distribuído entre homens e mulheres, a maioria das séries tem identificado mais homens do que mulheres em taxas que variam de 4 a 10:1, o que pode ser explicado pelas "perdas fisiológicas" de ferro através das menstruações e gestações. A doença também predomina em populações caucasianas. O início da HH é insidioso, com sintomas inespecíficos que incluem astenia, letargia, fadiga, artralgias, perda da libido ou impotência sexual entre os homens, e amenorreia entre as mulheres. A hepatomegalia está presente em cerca de 95% dos pacientes sintomáticos e geralmente precede o desenvolvimento de sintomas ou alterações dos testes de função hepática. Com o decorrer do tempo, outros sintomas e sinais aparecem, tais como os que serão descritos a seguir: DOR ABDOMINALDOR ABDOMINAL Geralmente de caráter crônico, pode localizar-se em epigástrio e/ou quadrante superior direito, provavelmente em virtude da hepatomegalia e distensão da cápsula hepática que se instalam. A dor abdominal como sintoma inicial tem sido identificada nas diversas séries com frequências que variam entre 10–50%. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Casos raros de dor abdominal intensa aguda associada a choque circulatório têm sido relatados. Várias etiologias já foram implicadas, incluindo peritonite bacteriana e sepse por bactérias Gram-negativas. DIABETES MELLITUSDIABETES MELLITUS Embora depósitos de hemossiderina e fibrose sejam quase invariavelmente presentes no parênquima pancreático, e os maiores depósitos sejam encontrados nas células exócrinas, nenhuma evidência de insuficiência pancreática exócrina já foi documentada. Por outro lado, 30–60% dos pacientes com HH avançada têm diabetes mellitus , sendo 70% insulino-dependentes. Tanto a resistência à insulina quanto a sua diminuição de produção são encontradas. A presença de diabetes piora o prognóstico. OUTRAS ANORMALIDADES ENDÓCRINASOUTRAS ANORMALIDADES ENDÓCRINAS A perda da libido e a atrofia testicular são comuns em indivíduos sintomáticos e podem anteceder outras manifestações clínicas, principalmente em jovens. Da mesma forma, outros sintomas de hipogonadismo (como amenorreia) também podem ocorrer antes que se altere a função hepática. MANIFESTAÇÕES CARDÍACASMANIFESTAÇÕES CARDÍACAS As manifestações cardíacas são aparentes em 20 a 30% dos portadores de HH. Em pacientes jovens, geralmente estão presentes no quadro inicial e constituem causa de morte frequente entre eles. Clinicamente, constituem Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC) com dilatação ventricular bilateral, embora características restritivas tenham sido descritas. Arritmias também ocorrem, sendo as extrassístoles ventriculares as mais frequentes. Entretanto, taquicardias ventricular e supraventricular, fibrilação ventricular e vários graus de bloqueios não são incomuns. Mesmo nos casos avançados de ICC, pode-se obter boa resposta clínica após depleção de ferro através de programa de flebotomias em associação com deferoxamina. HIPERPIGMENTAÇÃO CUTÂNEAHIPERPIGMENTAÇÃO CUTÂNEA A hiperpigmentação cutânea está presente na maioria dos pacientes sintomáticos, mas está medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ausente nos estádios mais precoces do acúmulo de ferro. A pigmentação geralmente é generalizada, mas comumente é mais acentuada na face, pescoço, faces extensoras dos antebraços, dorso das mãos, pernas, região genital e antigas cicatrizes. Ocorre principalmente por deposição de melanina na derme. Os depósitos de hemossiderina, quando presentes, são mais óbvios nas glândulas sudoríparas. ARTROPATIA HEMOCROMATÓTICAARTROPATIA HEMOCROMATÓTICA Ocorre em torno de 50% dos indivíduos sintomáticos e pode representar a queixa inicial. Deve- se sempre suspeitar de HH nos casos de sinais e sintomas de osteoartrite antes de 40 anos de idade. Não está associada à extensão ou duração da sobrecarga de ferro e pode surgir ou se agravar mesmo após a remoção do excesso dos estoques férricos. É idêntica à osteoartrite degenerativa, exceto pelo achado frequente (50%) de deposição de pirofosfato cálcico (condrocalcinose — ).Figura 12 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Qualquer articulação pode ser envolvida, mas o comprometimento mais característico se faz nas metacarpofalangianas, principalmente na segunda e terceira articulações ( ). Embora o envolvimento seja geralmente simétrico, pode ser unilateral. A incidência e a gravidade aumentam com a idade, a despeito das flebotomias. Fig. 12: Condrocalcinose. Figura 13 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina SINAIS DE INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICASINAIS DE INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICA Nas fases mais tardias da doença, podem ocorrer esplenomegalia, edemas, ascite, icterícia e outros sinais de insuficiência hepática crônica e hipertensão porta. Sinais como eritema palmar, telangiectasias, rarefação de pelos e ginecomastia são descritos, embora sejam menos comuns do que em cirroses de outras etiologias. As manifestações de hipertensão porta podem também ocorrer, mas são menos frequentes do que na cirrose hepática alcoólica. A função hepática é geralmente bem conservada, e os testes de função hepática podemser normais, a despeito de grandes concentrações de ferro hepático e fibrose. PREDISPOSIÇÃO A INFECÇÕESPREDISPOSIÇÃO A INFECÇÕES Há uma maior predisposição a infecções, notadamente por Yersinia enterocolitica, Vibrio vulnificus, Listeria monocytogenes e Pasteurella pseudotuberculosis . Especula-se que a maior oferta de ferro não ligado a transferrina e uma possível disfunção dos linfócitos CD8 e macrófagos possam ter algum papel nesta predisposição. A frequência dos achados clínicos em 212 pacientes italianos com HH, na presença ou ausência de cirrose hepática está relatada, na . A hepatomegalia e a pigmentação cutânea foram os sinais mais prevalentes tanto em cirróticos como entre os não cirróticos. Por outro lado, o diabetes, o hipogonadismo, o envolvimento cardíaco e a artropatia foram bem mais comuns nos pacientes cirróticos. Tab. 17 Fig. 13: Condrocalcinose nas metacarpofalangianas. Tabela 17 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO Primeiro passo: há suspeita clínica de hemocromatose hereditária? O diagnóstico de HH em um homem de meia-idade com sinais de cirrose, com hiperpigmentação cutânea e diabetes (chamado pelos franceses de "diabetes bronzeado"), possivelmente associado com insuficiência gonadal ou ICC, é relativamente simples, mas deve ser considerada uma falha diagnóstica. Na verdade, a suspeita diagnóstica de HH deverá ser considerada em homens ou mulheres, em qualquer idade na vida adulta, quando estiverem presentes Astenia crônica imotivada e/ou Artralgia e/ou Aminotransferases elevadas sem motivo aparente, principalmente quando a elevação for inferior a três vezes o limite superior da normalidade: é a "regra dos 3 As" . A "regra dos 3 As" é uma simplificação de raciocínio clínico cujo maior ensinamento é ampliar a noção de inespecificidade da apresentação clínica inicial dos pacientes com HH, visando ao aumento da sensibilidade do exame clínico para o diagnóstico daquela doença. Segundo passo: há anormalidades bioquímicas do metabolismo do ferro? Uma vez identificado o paciente com suspeita clínica de HH, é necessário investigar os três principais parâmetros do metabolismo do ferro, que são: o ferro sérico, o Índice de Saturação da Transferrina (IST) e a ferritina sérica. 1. Ferro sérico: o ferro sérico, cujos níveis normais situam-se em torno de 20 µmol/L, tendendo a maiores valores entre os homens, geralmente possui níveis acima de 30 µmol/L nas sobrecargas de ferro. Entretanto, por ser um índice muito sensível a variações por alterações intralaboratoriais, circadianas e ao longo do ciclo menstrual, praticamente só tem utilidade para o cálculo do IST. 2. Índice de Saturação da Transferrina (IST): o IST é o teste isolado mais sensível para a medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina identificação fenotípica de homozigotos para HH. É calculado a partir do quociente entre o ferro sérico e a capacidade total de ligação do ferro, multiplicado por 100. O valor normal do IST situa-se entre 30–40%, sendo geralmente maior que 60% nos homens e maior que 50% nas mulheres com HH clínica. É um índice mais estável que o ferro sérico e mais precoce, já que frequentemente se eleva já na adolescência dos pacientes com HH. É sabido que o IST é mais sensível para o diagnóstico de HH do que a ferritina sérica, a qual só se torna elevada na presença de grandes acúmulos de ferro. 3. Ferritina sérica: a ferritina sérica reflete os estoques de ferro, estando, em indivíduos normais, na faixa entre 10–300 µg/L. Não há variação diurna significativa, e os valores são maiores nos homens. Devemos lembrar, entretanto, que na HH, principalmente em adolescentes, a ferritina sérica poderá estar normal... Quando em níveis superiores a 1.000 µg/L, a ferritina pode sugerir a presença de fibrose, principalmente quando há história de ingesta etílica superior a 60 g de etanol por dia, hepatomegalia e/ou aumento de transaminases. Também é importante ressaltar que a ferritina sérica é uma proteína de reação de fase aguda, podendo estar elevada em infecções, processos inflamatórios ativos e neoplasias malignas. A combinação de IST aumentado e ferritina sérica também aumentada em um indivíduo saudável tem sensibilidade de 93% para o diagnóstico de HH. Por outro lado, em um indivíduo com mais de 35 anos, o valor preditivo negativo dos dois testes associados é de 97%. Em um estudo australiano, a sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo de um IST acima de 50% para a detecção de homozigose para C282Y foi, respectivamente, 94%, 96% e 6%. Terceiro passo: há hemocromatose? O terceiro passo consiste em provar a existência de HH, o que poderá ser feito através de duas vias confirmatórias, na dependência da disponibilidade de testes genéticos. 1. Via confirmatória clássica: é baseada na realização de biópsia hepática naqueles indivíduos com indícios clínicos e/ou laboratoriais de sobrecarga de ferro. A histologia hepática é essencial para: (1) confirmar a sobrecarga férrica (ferro hepático corável pela coloração de Perls ou “azul da Prússia” graus 3/4+); ( 2 ) identificar o padrão característico de distribuição periportal e hepatocítica dos depósitos de ferro; (3) promover uma avaliação semiquantitativa do excesso de ferro (concentração hepática de ferro superior a 80 μmol/g de tecido hepático seco; índice hepático de ferro superior a 1,9); e (4) detecção de lesões pré-malignas potenciais, como por exemplo, focos livres de depósitos de ferro. 2. Nova via confirmatória: é baseada na detecção da mutação C282Y por técnica baseada em reação de cadeia de polimerase (PCR). A genotipagem para a mutação C282Y é um teste útil no diagnóstico de HH na prática clínica, com uma sensibilidade de cerca de 90% e uma especificidade de 100%. Quando é determinada a homozigose para a mutação C282Y, isto é, medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina especificidade de 100%. Quando é determinada a homozigose para a mutação C282Y, isto é, C282Y +/+, é feito o diagnóstico de HH. Nesse caso, a avaliação do nível de sobrecarga de ferro se pautaria no grau de hiperferritinemia e, se disponível, em dados de ressonância nuclear magnética (RM — hipossinal hepático em T2). A biópsia hepática ficaria então restrita aos casos nos quais haja suspeita significativa de uma sobrecarga de ferro suficientemente grande que possibilite a existência de dano hepático: fibrose ou mesmo cirrose. Dessa forma, a maior mudança estratégica entre as duas vias confirmatórias é a realização de biópsia hepática, na nova via, mais com objetivos prognósticos do que diagnósticos. Na prática, é importante ressaltar que a biópsia hepática deverá sempre ser considerada quando houver suspeitas suficientes de superacúmulo de ferro, a despeito de testes genéticos negativos. Veja, nas e , os exames de imagem confirmando a hemocromatose.Figuras 14 _ 15 _ _ Fig. 14: HH vista à RM. Imagens axiais e sagitais em T1 e T2 do abdome superior, mostrando hipossinal evidente em todo o parênquima hepático. _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Tab. 18: Exames complementares na hemocromatose. *É calculado dividindo-se o ferro hepático (em mmol/g) pela idade do paciente em anos. RASTREAMENTORASTREAMENTO O screening familiar entre parentes de primeiro grau e, se possível, entre os de segundo grau de pacientes sabidamente portadores de HH deverá ser feito com teste genético para a detecção da mutação C282Y e, em caso de homozigose, avaliar-se-iam os índices do metabolismo do ferro e Fig. 15: TC de abdome superior mostrando grande atenuação do parênquima hepático, o qual normalmente possui uma atenuação semelhante ao parênquima esplênico. Sinais semelhantes são vistos na toxicidade por amiodarona. _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina enzimas hepáticas. Não se justifica o teste genético em parentes com idade inferior a dez anos. O rastreamento para HH na população geral é uma questão mais controversa. Aparentemente, ainda não foidefinido o papel dos testes genéticos no diagnóstico populacional da doença, em virtude da ausência de análises adequadas de custo-benefício e as recentes dúvidas quanto à possibilidade de discriminação genética. Uma abordagem mais prática e consensual é a de analisar o metabolismo do ferro através do IST e ferritina sérica como exames iniciais. Provavelmente, a faixa etária ideal para esse rastreamento encontra-se entre 18–30 anos, faixa na qual a doença é provavelmente detectável por testes séricos do ferro na maioria dos pacientes antes de haver fibrose hepática significativa ou outros danos orgânicos. Assim, o teste genético estaria reservado àqueles com IST maior que 45% e/ou ferritina sérica maior que 300 µg/L. Apesar de alguns autores defenderem a pesquisa ostensiva em subgrupos supostamente com maior risco de HH, como os diabéticos e os pacientes com miocardiopatia dilatada ou artrite de origem desconhecida, este “ screening dirigido” sofre algumas críticas por outros autores. Como exemplo, citamos um recente estudo neozelandês que demonstrou prevalências equivalentes de mutações do gene HFE entre diabéticos e a população geral, não referendando o rastreamento dirigido para pacientes diabéticos. TRATAMENTOTRATAMENTO Além das medidas direcionadas à retirada do excesso corporal de ferro, que serão descritas a seguir, o tratamento das disfunções cardíacas pode requerer glicosídeos, o diabetes pode necessitar de insulina em cerca de 70% dos pacientes, o hipotireoidismo requer reposição de hormônio tireoidiano, a impotência sexual pode ser aliviada com o uso de andrógenos, e a artropatia poderá ser tratada com anti-inflamatórios não hormonais. ORIENTAÇÕES GERAISORIENTAÇÕES GERAIS Os pacientes com hemocromatose devem evitar suplementos de ferro (antianêmicos ou polivitamínicos enriquecidos com ferro), vitamina C (que aumenta a absorção intestinal de ferro) e ingesta excessiva de carne vermelha (uma rica fonte de ferro ligado ao heme). Além disso, estes pacientes não devem ingerir bebidas alcoólicas (que podem acelerar o dano hepático) e frutos do mar, principalmente ostras cruas, já que têm sido descritos casos de infecções fatais por ostras contaminadas com Vibrio vulnificus em pacientes com HH. FLEBOTOMIASFLEBOTOMIAS A remoção de ferro através de flebotomias (sangrias) ainda é a principal ferramenta terapêutica medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A remoção de ferro através de flebotomias (sangrias) ainda é a principal ferramenta terapêutica para a HH , com indícios evidentes de melhora da sobrevida em vários estudos. O tratamento visa apenas os homozigotos e tem por finalidade esgotar os estoques aumentados de ferro, procurando levá-los aos seus níveis normais. A maioria dos autores preconiza um programa semanal ou quinzenal de flebotomias, de acordo com a tolerância de cada indivíduo (menor nos indivíduos idosos). O programa terá a duração de alguns meses até dois a três anos, conforme a precocidade do diagnóstico e do tratamento. Cada sangria de 500 ml de sangue total proporciona uma perda de cerca de 250 mg de ferro. Realizam-se uma a duas flebotomias por semana até que os estoques em excesso de ferro sejam esgotados. É aconselhável proceder-se à dosagem de ferritina sérica e IST a cada dois a três meses ou a cada 1 a 2 g de ferro removido (1 g ferro corresponde, aproximadamente, a quatro sangrias), a fim de acompanhar o retorno ao normal dos estoques férricos. No início, a ferritina pode oscilar muito, para em seguida cair progressivamente. Já o IST não é um bom parâmetro para avaliação durante o programa de sangrias, já que tem uma tendência a se manter elevado até que os estoques se aproximem dos limites inferiores da normalidade. Quando isso ocorre, a ferritina apresenta-se abaixo de 50 ng/ml, o IST é inferior a 50%, e a hemoglobina (que deverá ser dosada a cada sangria) encontra-se em torno de 11 g/dl, sem tendência a se elevar de imediato com a suspensão do tratamento. Quando esses parâmetros são alcançados, o objetivo passa a ser o de evitar o reacúmulo, sendo suficiente, em geral, uma sangria de 500 ml a cada três a quatro meses por toda a vida, embora alguns indivíduos possam requerê-las em intervalos mais curtos. Os níveis de ferritina devem ser mantidos entre 50–100 ng/ml , evitando-se a deficiência de ferro. O sangue retirado poderá ser utilizado em bancos de sangue, desde que sejam excluídas as doenças hemotransmissíveis potenciais. Em pacientes cirróticos e com hipoproteinemia, a eritrocitaférese (retirada através de um equipamento automatizado de eritrócitos do sangue) com reinfusão de plasma centrifugado representa uma válida alternativa. DEFEROXAMINA/DEFERIPRONADEFEROXAMINA/DEFERIPRONA A deferoxamina é um agente quelante do ferro introduzido na prática clínica há mais de 20 anos. Entretanto, não é recomendada habitualmente no tratamento da HH, já que é uma droga de alto custo, de administração trabalhosa (geralmente como infusão subcutânea contínua em um período de 12 horas, por quatro a seis dias por semana, através de uma bomba especial portátil) e, sozinha, é praticamente ineficaz neste tipo de doença, pois possibilita a excreção diária de apenas 20 a 90 mg de ferro. Além disso, existem complicações potenciais com o uso crônico da deferoxamina, tais como infecções por Yersinia spp., lesões retinianas e de nervo acústico. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A deferoxamina poderá ser útil, todavia, como coadjuvante das flebotomias em alguns casos de HH com cardiopatia ou naqueles indivíduos que não toleram o programa de sangrias. A deferiprona, um quelante oral do ferro, é atualmente liberado para uso clínico somente na Índia, para o tratamento das sobrecargas secundárias de ferro, principalmente nos casos associados à talassemia major . A eficácia em curto prazo é similar à da deferoxamina, mas a eficácia em longo prazo é controversa. Alguns estudos têm relatado diminuição na ferritina sérica, outros não mostraram benefício algum ou mostraram até mesmo uma aceleração da fibrose hepática com o seu uso em pacientes com talassemia major . Por esse motivo e por potenciais efeitos colaterais graves, não é recomendado seu uso no tratamento da HH. TRANSPLANTE HEPÁTICOTRANSPLANTE HEPÁTICO O Transplante Ortotópico de Fígado (TOF) tem sido recomendado para os casos de cirrose terminal. Entretanto, é importante ressaltar que vários estudos têm demonstrado que os hemocromatóticos apresentam uma mortalidade pós-transplante muito maior que os outros tipos de cirrose, provavelmente em decorrência de cardiopatias concomitantes e intercorrências infecciosas. A sobrevida em um ano após TOF para pacientes com HH é de cerca de 50%, o que é muito inferior à sobrevida após TOF por outras etiologias. RESPOSTA AO TRATAMENTORESPOSTA AO TRATAMENTO O tratamento não reverte a cirrose já estabelecida, mas proporciona uma nítida melhora clínica e laboratorial da disfunção hepática presente. Ele reduz também a dependência à insulina dos pacientes com diabetes mellitus , melhora a pigmentação anormal da pele, os distúrbios cardíacos determinados pela síndrome, o mal-estar geral, a astenia e as dores abdominais, se já presentes. Por outro lado, as flebotomias não melhoram o hipogonadismo e suas consequências, não impedem o aparecimento e a progressão da artropatia nem o surgimento de Carcinoma Hepatocelular (CHC). PROGNÓSTICOPROGNÓSTICO O prognóstico da HH parece depender diretamente da quantidade (e, provavelmente, da duração) do acúmulo de ferro. Pacientes que são depletados durante os primeiros 18 meses de tratamento têm melhor prognóstico. A expectativa de vida é normal se as flebotomias forem iniciadas antes do surgimento de cirrose medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A expectativa de vida é normal se as flebotomias forem iniciadas antes do surgimento de cirrose e, mesmo nos cirróticos, a taxa de sobrevida em dez anos, após normalização dos estoques de ferro, é de 80%, superior ao que ocorre em outras formas decirrose hepática. O prognóstico é mais grave quando há cirrose hepática ao diagnóstico, diabetes mellitus , mas não é influenciado pelo sexo ou pela existência de artropatia. Existem várias evidências provenientes de estudos experimentais e em humanos que sustentam o papel carcinogênico do ferro, tanto a forma livre do íon quanto o ferro ligado à transferrina. O risco de morte por CHC de um indivíduo com HH é 100 vezes maior que o risco na população geral. Além disso, muitos casos de CHC ocorrem vários anos após a depleção adequada dos estoques de ferro por flebotomias. Vale ressaltar que a sobrecarga de ferro parece contribuir para o desenvolvimento de CHC em indivíduos com cirrose hepática causada por infecção crônica pelo vírus da hepatite C. O rastreamento ideal de CHC em portadores de HH ainda está por ser definido. Entretanto, estudos preliminares prospectivos multinacionais têm mostrado que o rastreamento semestral com USG e dosagem de alfafetoproteína pode detectar tumores de até 1 cm de diâmetro. CAPÍTULO 3CAPÍTULO 3 COMPLICAÇÕES DA CIRROSECOMPLICAÇÕES DA CIRROSE INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICAINSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICA INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO Aqui há o video de apostila 8.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. Como vimos, qualquer doença crônica que acometa o fígado pode resultar em cirrose a partir da instalação de necrose hepatocelular difusa e da consequente tentativa de regeneração dos hepatócitos. Este processo dinâmico de destruição e regeneração leva a modificações na matriz extracelular que culminam em deposição progressiva de tecido fibrótico em substituição ao parênquima funcionante. Surge, assim, uma significativa desorganização arquitetônica e vascular dos lóbulos hepáticos que acaba por gerar graves danos funcionais. Dúvidas Acadêmicas do CapítuloTESTE SEU CONHECIMENTOConfira as dúvidas acadêmicas do capítulo clicando aqui medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina vascular dos lóbulos hepáticos que acaba por gerar graves danos funcionais. O termo “insuficiência hepática crônica” é utilizado para descrever as complicações sistêmicas decorrentes de uma queda lenta e gradual na função dos hepatócitos, tal como acontece na cirrose. A esse conjunto de sinais e sintomas, podemos caracterizar a “síndrome de insuficiência hepatocelular”. Reservamos o termo “insuficiência hepática aguda” para os casos de lesão hepatocelular fulminante, em que a função dos hepatócitos é abruptamente perdida. Quais são as consequências da cirrose hepática? A perda progressiva de hepatócitos funcionantes leva a uma série de alterações que se instalam de maneira insidiosa. Assim, podemos dividir a evolução do dano hepático em duas fases principais. A primeira é a “fase compensada”, em que predominam distúrbios endócrinos e hemodinâmicos . Os distúrbios endócrinos são caracterizados pelo hiperestrogenismo e hipoandrogenismo, explicando (pelo menos em parte) vários achados semiológicos da cirrose (ex.: telangiectasias e ginecomastia). As alterações hemodinâmicas da cirrose são complexas: ao lado de um estado hiperdinâmico de alto débito cardíaco e retenção hidrossalina, observa-se uma “hipovolemia relativa”, na qual o volume circulante efetivo, e, portanto, o fluxo sanguíneo para os órgãos, está reduzido. Num segundo momento, teríamos a “fase descompensada”, caracterizada por complicações da hipertensão porta (varizes esofagogástricas, ascite) ou da disfunção hepática (encefalopatia hepática, hipoalbuminemia e coagulopatia). A resume as complicações da cirrose. Tab. 1 Principais Complicações da C irrose Hepática Insuficiência Hepática Crônica Hiperestrogenismo/hipoandrogenismo ● Eritema palmar. ● Telangiectasias do tipo "aranha vascular". ● Ginecomastia. ● Redução da massa muscular. ● Atrofia interóssea. ● Rarefação de pelos. ● Atrofia testicular. ● Perda da libido, disfunção erétil. Tabela 1 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Perda da libido, disfunção erétil. Distúrbios hemodinâmicos ● Resistência vascular periférica diminuída (vasodilatação). ● Alto débito cardíaco. ● Retenção hidrossalina (ascite, anasarca). ● Hipovolemia relativa — redução do volume circulante efetivo. Outras alterações ● Baqueteamento (ou hipocratismo) digital. ● Aumento de parótidas. Hipertensão Porta (“sinusoidal”) ● Ascite. ● Varizes esofagogástricas (sangramento digestivo). ● Esplenomegalia congestiva (hiperesplenismo: plaquetopenia, leucopenia, anemia). ● Circulação colateral visível no abdome (“cabeça de medusa”). Insuficiência Hepatocelular ● Icterícia. ● Encefalopatia hepática. ● Coagulopatia. ● Hipoalbuminemia (anasarca). ● Desnutrição. ● Imunodepressão. ● Síndromes hepatorrenal e hepatopulmonar. Hepatocarcinoma Certamente, esta divisão é muito mais de cunho didático e vai mudando conforme novos conceitos são agregados. Nos consensos atuais, por exemplo, podemos encontrar termos um pouco mais específicos como “Doença Hepática Crônica Avançada compensada (DHCAc)”, definido pela ausência de complicações da cirrose no presente ou no passado que pode vir medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina definido pela ausência de complicações da cirrose no presente ou no passado que pode vir acompanhada de hipertensão porta clinicamente significativa ou não (veremos adiante). Já para a doença descompensada, a definição inclui critérios como ascite evidente (ou derrame pleural com GASA ≥ 1,1), encefalopatia hepática evidente (> grau II de West Haven) ou sangramento varicoso. ACHADOS PERIFÉRICOSACHADOS PERIFÉRICOS SINAIS DE HIPERESSINAIS DE HIPERES TROGETROGE NISMO/HIPOANDRONISMO/HIPOANDRO GENISMOGENISMO Por mecanismos pouco compreendidos, a cirrose hepática altera a homeostase dos hormônios sexuais. Nas fases iniciais, sabe-se que a metabolização do estrogênio pode estar prejudicada. Além disso, detecta-se um aumento dos níveis séricos de estrona, devido à maior conversão periférica de androgênios em estrogênios no tecido adiposo. O aumento da SHBG (globulina ligadora de hormônio sexual) também é característico da cirrose e pode contribuir para a detecção de níveis altos de estrogênios nesses pacientes. Com o avançar da hepatopatia, caem os níveis séricos de testosterona. Embora a maior parte seja transformada na forma ativa por ação da 5-alfa-redutase na próstata, uma parte também se dá na pele e no fígado. Ainda se pode observar a diminuição na síntese do hormônio nas gônadas. Dessa forma, podemos dizer que o achado característico da cirrose hepática é a associação de hiperestrogenismo com hipoandrogenismo . Cirrose hepática Hiperestrogenismo + Hipoandrogenismo O hiperestrogenismo é o responsável pelas alterações vasculares cutâneas da cirrose, representadas pelo eritema palmar e pelas telangiectasias do tipo “aranha vascular”. Sabe-se que altos níveis de estrogênio causam proliferação e dilatação de vasos cutâneos, especialmente na porção superior do corpo. As telangiectasias do tipo “aranha vascular” (ou spider angioma ) são caracterizadas por uma dilatação arteriolar central ligando-se a capilares dilatados com disposição radial — .Figura 1 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina O enchimento após a compressão da lesão ocorre do centro para a periferia, sendo específico desse tipo de telangiectasia. São encontradas no pescoço, na porção superior do tronco e dos membros superiores. O eritema palmar é decorrente da vasodilatação cutânea restrita à região palmar, principalmente nas regiões tenar e hipotenar. O fluxo sanguíneo para essa região pode aumentar em até seis vezes. Não era de se estranhar o aparecimento dessas lesões cutâneas do hiperestrogenismo... Durante a gestação, uma condição fisiológica de hiperestrogenismo, observamos o aparecimento de telangiectasias do tipo “aranha vascular” e eritema palmar em até 70% dos casos! Essas lesões costumam desaparecer, em média, três meses após o parto. Na doença hepática aguda e, eventualmente, em pessoas normais, tais lesões tambémorigem à cirrose hepática. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina entrar em contato com as placas de hepatócitos, numa espécie de shunt intra-hepático, indo diretamente dos espaços porta para as veias centrolobulares. E como existe uma doença hepática crônica, com atividade necroinflamatória persistente, os ciclos de necrose, fibrose e regeneração celular continuam se alternando, até que a regeneração hepatocitária fique restrita aos espaços formados entre diversas traves fibróticas interligadas. Temos então os chamados “ nódulos de regeneração ” Ao contrário dos lóbulos hepáticos normais, onde as placas de hepatócitos e a rede de sinusoides são rigorosamente coordenadas, de modo a fazer o sangue fluir em direção à veia centrolobular (sistema cava), os nódulos de regeneração são constituídos por uma massa de hepatócitos desprovida de funcionalidade, uma vez que tais nódulos não possuem relação com uma veia centrolobular . Assim, os nódulos de regeneração representam uma tentativa (frustrada) do fígado de reestabelecer sua citoarquitetura funcional em meio à fibrose intensa e disseminada secundária ao processo necroinflamatório crônico! Lembra da incrível capacidade ( Figura 3 ) . _ _ Fig. 3: Tentativa de regeneração do fígado. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina que o fígado tem de se regenerar? Pois é... O desarranjo estrutural que caracteriza a cirrose hepática pode ser decorrente de qualquer doença hepática crônica e, quando bem estabelecido, infelizmente, é irreversível. QUADRO DE CONCEITOS I O que é cirrose hepática? Cirrose hepática é um processo patológico irreversível do parênquima hepático caracterizado por dois componentes: (1) fibrose hepática "em ponte" , com formação de shunts vasculares no interior dessas traves fibróticas; e (2) rearranjo da arquitetura lobular nos chamados nódulos de regeneração , desprovidos de comunicação com uma veia centrolobular. É a resposta comum do parênquima hepático a qualquer estímulo lesivo persistente, representado geralmente por inflamação e necrose hepatocitária. A apresenta uma peça de biópsia hepática de um paciente cirrótico, visualizada à microscopia de menor aumento. Observe os vários nódulos regenerativos (em vermelho) circundados por tecido fibrótico (em azul). Obs.: o formato cilíndrico da peça corresponde à luz da agulha de biópsia. Figura 4 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina O encontro desse “panorama histopatológico” (fibrose em ponte + nódulos) tem o poder de confirmar o diagnóstico de cirrose hepática (logo, método “padrão-ouro” = biópsia). Mas é válido ressaltar que, apesar de ser o exame “padrão-ouro”, na maioria das vezes, a biópsia não é necessária para o DIAGNÓSTICO de cirrose, bastando uma análise conjunta do quadro clínico, laboratorial e radiológico. A biópsia seria reservada aos casos de dúvida diagnóstica persistente, assim como em situações específicas, por exemplo: no acompanhamento das hepatites virais crônicas, para avaliar a indicação de tratamento em alguns pacientes e estimar o prognóstico. O fígado com cirrose em estágio avançado também é diferente, à macroscopia, do fígado normal. Por exemplo: quando o cirurgião opera o abdome de um cirrótico, pode-se notar um aspecto macro ou micronodular na superfície do órgão. O tamanho do fígado depende do grau de cirrose: nos casos mais avançados, a tendência é sua redução e atrofia como um todo! Por outro lado, um dado semiológico patognomônico de cirrose é o encontro de redução do lobo hepático direito ( 1. A partir do momento em que a cirrose se instala, é típica uma inversão desse padrão, com o paciente apresentando ALT/AST AST (TGO), enquanto que, na cirrose, temos o oposto: AST (TGO) > ALT (TGP). medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina (TGO), enquanto que, na cirrose, temos o oposto: AST (TGO) > ALT (TGP). Exceção à regra é a doença hepática alcoólica , onde AST (TGO) > ALT (TGP) desde o início do quadro. BILIRRUBINASBILIRRUBINAS A hiperbilirrubinemia é um fator de mau prognóstico na cirrose hepática, ocorrendo principalmente à custa da fração direta. Na colangite biliar primária, por exemplo, bilirrubina total superior a 10 mg/dl indica a necessidade de transplante ortotópico de fígado! HIPOALBUMINEMIAHIPOALBUMINEMIA Denota insuficiência crônica de síntese hepatocelular. O deficit de síntese costuma se associar à desnutrição proteicocalórica, comum no paciente cirrótico, o que piora ainda mais a hipoalbuminemia. Isto é particularmente frequente nos etilistas crônicos portadores de cirrose alcoólica. ALARGAMENTO DO TEMPO DE PROTROMBINA EALARGAMENTOpodem ser encontradas... O hipoandrogenismo é responsável pela queda da libido, impotência masculina, atrofia testicular, redução importante da massa muscular (evidenciada pela atrofia dos músculos interósseos das mãos) e rarefação de pelos (cuja distribuição passa a respeitar o padrão feminino). A ginecomastia — — é decorrente do hipoandrogenismo associado ao hiperestrogenismo. Fig. 1: Telangiectasias do tipo "aranha vascular". Figura 2 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina BAQUETEAMENTO (OU HIPOCRATISMO) DIGITALBAQUETEAMENTO (OU HIPOCRATISMO) DIGITAL O que é baqueteamento (ou hipocratismo) digital? Quem já viu nunca mais esquece... A ponta dos dedos torna-se "abaulada" na base da unha, dando ao dedo um aspecto de "baqueta de tambor" — . O que ocorre é um aumento volumétrico do tecido subcutâneo vascularizado da extremidade digital, por mecanismos ainda desconhecidos. A sinonímia "hipocratismo digital" vem do fato de esta anomalia ter sido inicialmente reconhecida pelo lendário Hipócrates no século IV a.C. Fig. 2: Ginecomastia. Figura 3 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A enumera as principais condições relacionadas ao baqueteamento digital. É importante lembrar que existe o baqueteamento digital hereditário , de herança autossômica dominante. Este deve ser suspeitado quando o indivíduo tem baqueteamento desde criança e existem outros familiares com a mesma alteração. Entretanto, a forma hereditária é rara quando comparada à forma adquirida. Tab. 2 Causas de Baqueteamento (ou hipocratismo) Digital Doenças intratorácicas e pulmonares ● CA broncogênico. ● Outros CA intratorácicos (metástase, mesotelioma, tumor de mediastino). ● Supurações crônicas (empiema pleural, abscesso pulmonar). ● Bronquiectasias. ● Fibrose cística. ● Fibrose pulmonar idiopática. Doenças cardíacas ● Cardiopatia congênita cianótica (ex.: tetralogia de Fallot). ● Endocardite bacteriana subaguda. Doenças gastrointestinais ● Cirrose hepática. ● Esquistossomose. ● Doença inflamatória intestinal (Crohn, retocolite). ● Diarreia crônica. ● Fig. 3: Baqueteamento (ou hipocratismo) digital. Tabela 2 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Uso de laxantes. DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOSDISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS Embora os distúrbios hemodinâmicos da cirrose hepática sejam altamente dependentes da hipertensão porta, a disfunção hepatocelular também pode contribuir para sua gênese, uma vez que um distúrbio semelhante é identificado nos pacientes com insuficiência hepática fulminante (quando não há hipertensão porta). Uma teoria clássica, chamada " Teoria do Underfilling ", diz o seguinte: a hipertensão porta da cirrose provoca o extravasamento de líquido intravascular para a cavidade peritoneal, através dos sinusoides hepáticos. Essa pequena queda da volemia estimula os barorreceptores a ativar o sistema renina-angiotensina-aldosterona, o sistema nervoso simpático e a liberação de ADH (hormônio antidiurético). A ativação desses sistemas, por sua vez, promove a retenção de líquido pelos rins, na tentativa de restaurar a volemia. Porém todo o líquido retido volta a extravasar para a cavidade peritoneal e, assim, forma-se um círculo vicioso no qual “quanto mais líquido extravasa, maior a tendência hipovolêmica” e “quanto maior a tendência hipovolêmica, maior a retenção hidrossalina renal” e “quanto maior a retenção hidrossalina renal, mais líquido extravasa para o peritônio”. Com isso, o paciente vai formando a sua ascite e mantém-se sempre com uma tendência hipovolêmica. Entretanto, essa teoria simplória pode explicar a ascite relacionada à cirrose, mas não explica uma série de outras alterações hemodinâmicas encontradas nesses pacientes. Entre elas, podemos destacar a vasodilatação sistêmica (queda da resistência arterial periférica), o aumento do débito cardíaco e o aumento real da volemia total (volume sanguíneo presente em toda a circulação: venosa + arterial). E agora? Como resolver essa questão? Pois é... Para explicar todas essas alterações, surgiu uma outra teoria: a " teoria da vasodilatação ". Esta é a mais aceita atualmente! Os passos dessa teoria serão descritos de forma sequencial, para que você não perca a linha de raciocínio. Acompanhe... ● 1 º passo : uma das primeiras alterações hemodinâmicas que surgem na cirrose hepática é a vasodilatação arteriolar esplâncnica (hiperemia mesentérica). O mecanismo dessa vasodilatação provavelmente é o aumento da síntese local de óxido nítrico ( NO ) pelo endotélio vascular, um potente vasodilatador endógeno. A hipertensão porta contribui para a gênese desse fenômeno — ao desviar o sangue mesentérico para a circulação cava, sem passar pelo fígado, perde-se o “filtro medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina mesentérico para a circulação cava, sem passar pelo fígado, perde-se o “filtro hepático” contra as bactérias Gram-negativas provenientes da translocação intestinal. A endotoxina das bactérias Gram-negativas (LPS) estimula a síntese endotelial de NO. ● 2º passo : a vasodilatação esplâncnica desloca uma parte da volemia para este território vascular, reduzindo, por conseguinte, o volume sanguíneo que perfunde os outros órgãos e tecidos — chamado “volume arterial efetivo”. A queda desse volume estimula os barorreceptores renais e carotídeos, tendo como resultado a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, sistema nervoso simpático e liberação de ADH. Estes sistemas neuro-hormonais estimulam os rins a reterem sal e água, na tentativa de restaurar o “volume arterial efetivo”. ● 3 º passo : a retenção hidrossalina, na verdade, aumenta a volemia total, porém esse volume sanguíneo adicional está quase todo “sequestrado” nos vasos esplâncnicos dilatados e, portanto, não corrige o deficit de “volume arterial efetivo”. O processo então se perpetua... A retenção hidrossalina continua e progride, e o paciente começa a formar ascite, pois o excesso de líquido presente no território mesentérico começa a transudar diretamente para a cavidade peritoneal em consequência ao aumento de permeabilidade que acompanha a vasodilatação, fenômeno potencializado pela hipoalbuminemia (queda na pressão coloidosmótica do plasma) que tipicamente está presente neste momento... ● Conclusão : no final das contas, o paciente apresenta: (1 ) redução do “volume arterial efetivo”, comportando-se como um paciente hipovolêmico, inclusive com tendência à hipotensão arterial e azotemia pré-renal; (2) aumento da volemia total, só que distribuída basicamente no território esplâncnico e portal; (3 ) aumento do sódio e da água corporal total, que se distribui principalmente no peritônio (ascite) e no interstício (edema); (4) redução da resistência vascular periférica, pela intensa vasodilatação; e (5) aumento do débito cardíaco, já que o coração está bombeando contra uma baixa resistência — um fenômeno semelhante ao que ocorre na sepse. Observe a , que esquematiza a fisiopatologia da cirrose hepática.Figura 4 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina DEFICIT DEFICIT DE SÍNTESE HEPÁTICADE SÍNTESE HEPÁTICA Os hepatócitos possuem a importante função de sintetizar proteínas e fatores da coagulação. Entre as proteínas sintetizadas pelo fígado, a albumina é sem dúvida a mais importante, em termos quantitativos, mas as alfaglobulinas, betaglobulinas, ferritina e a proteína C reativa também são outros exemplos de peso. Com exceção do fator VIII , que é produzido pelas células endoteliais hepáticas, todos os demais fatores da coagulação são sintetizados pelos hepatócitos, como o fibrinogênio (fator I), a protrombina (fator II) e os fatores V, VII, IX, X e XI. Vale lembrar que quatro desses fatores dependem da vitamina K para a sua síntese. São os fatores II (protrombina), VII, IX e X — o chamado complexo protrombínico . HIPOALBUMINEMIAHIPOALBUMINEMIA A albumina é a proteína presente no plasma em maior concentração, sendo a principal responsável pelapressão oncótica ou coloidosmótica do plasma. Esta é a pressão que “prende” o líquido no compartimento intravascular. Nos vasos capilares, existe um balanço de forças no qual a pressão hidrostática “empurra” o líquido para fora do vaso, enquanto a pressão oncótica “puxa” o líquido para o interior do vaso. Na hipoalbuminemia, existe uma tendência à saída de líquido para o interstício, predispondo o paciente ao edema. As condições de maior potencial edemigênico são aquelas em que encontramos ao mesmo tempo hipoalbuminemia com aumento da pressão hidrostática capilar, tal como ocorre na cirrose hepática e na síndrome nefrótica. O fígado é o único órgão capaz de sintetizar albumina. Graças a ele, mantemos uma albuminemia na faixa normal, que se situa entre 3,5–5,5 g/dl , à custa da produção de cerca de 15 g/dia de albumina. Nas hepatopatias agudas, a hipoalbuminemia não é um evento comum (pois a meia-vida da albumina é relativamente longa — vinte dias em média — em comparação com a dos fatores de coagulação); por isso, a presença de uma albumina plasmática 1,7. Como os demais fatores da coagulação também acabam sendo reduzidos na insuficiência hepática, o outro exame que avalia a coagulação — o PTT (Tempo de Tromboplastina Parcial) — também pode alterar. Este exame avalia a via intrínseca da coagulação. No paciente hepatopata, o TP alargado (com atividade de protrombina baixa e INR alto) também pode ter outra explicação, diferente da insuficiência hepatocelular: coléstase! A coléstase intra ou extra-hepática reduz a secreção biliar e, portanto, há menos sais biliares chegando ao intestino para auxiliar na absorção das vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K). A má absorção da vitamina K pode causar uma coagulopatia pela redução na síntese dos fatores II, VII, IX e X, mais uma vez predominando a depleção do fator VII... O coagulograma é muito parecido com o da insuficiência hepática! E quando suspeitar de col é stase? medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Geralmente, o paciente está ictérico (predomínio importante da bilirrubina direta), com colúria e hipocolia fecal; a fosfatase alcalina e a gama GT estão elevadas, porém tais achados não são obrigatórios. Por isso, todo hepatopata com TP alargado deve ser submetido a uma prova terapêutica com vitamina K exógena, dose única, ou por até três dias, de 10 mg SC ou IV, obtendo-se novo TP (INR) 24h depois. Se houver resposta significativa do coagulograma, há uma grande chance de o paciente ter coléstase! QUADRO DE CONCEITOS I O paciente hepatopata que está sangrando por coagulopatia deve ser tratado com reposição de plasma fresco congelado (o único hemoderivado que fornece todos os fatores da coagulação). Não adianta fazer só vitamina K (pois o problema pode não ser coléstase e, mesmo se for, o efeito da vitamina K demora mais de 12h para acontecer), nem adianta fazer crioprecipitado (que contém apenas fibrinogênio, FvW e os fatores VIII e XIII). Existe controvérsia a respeito do uso de fator VII ativado recombinante : apesar de ser eficaz na restauração da reserva hemostática, tal droga pode “ir além da conta”, aumentando o risco de trombose aguda! O fator VIIa recombinante tem sido reservado para os casos de hemorragia refratária. Um conceito interessante e recém-elucidado é o de que, na cirrose hepática, o INR não possui correlação direta com o risco de sangramento ! Isso é explicado pela diminuição concomitante da fibrinólise endógena (mediada pelo plasminogênio, que também é produzido no fígado). Assim, mesmo com INR alargado, podem ocorrer fenômenos tromboembólicos, principalmente em pacientes hospitalizados por infecções agudas (pois nesta situação soma-se o efeito pró- trombótico sistêmico das citocinas pró-inflamatórias e o fato de o paciente geralmente estar acamado). MANIFESTAÇÕES HEMATOLÓGICASMANIFESTAÇÕES HEMATOLÓGICAS Além da coagulopatia já explicada anteriormente, uma série de manifestações hematológicas acompanha o paciente cirrótico. Entre elas, destacam-se a anemia da hepatopatia crônica e o hiperesplenismo. ANEMIA DA HEPATOPATIA CRÔNICAANEMIA DA HEPATOPATIA CRÔNICA A hepatopatia crônica frequentemente cursa com anemia, em geral leve ou moderada. Apesar de a prevalência de anemia nos hepatopatas crônicos girar em torno de 75%, na maioria das vezes, o mecanismo é meramente dilucional, em resposta à retenção hidrossalina característica da hipertensão porta. Apenas 40% desses indivíduos possuem redução verdadeira na massa de hemácias circulantes! medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina hemácias circulantes! PATOGÊNESEPATOGÊNESE Como dito, o mecanismo mais comum de anemia na hepatopatia crônica é a hemodiluição. Contudo, vários são os fatores que podem induzir uma "anemia verdadeira", isto é, a redução da massa de hemácias. Dois fatores costumam estar associados: (1) redução da meia-vida das hemácias de 120 para 20–30 dias; e (2) redução da resposta eritropoiética à anemia. A justificativa para uma menor vida média do eritrócito é multifatorial, estando entre os principais fatores: (1) o hiperesplenismo (devido à esplenomegalia congestiva); (2) alterações no metabolismo eritrocitário, tornando as hemácias instáveis; e (3 ) alterações da composição lipídica de suas membranas, com aumento do teor de colesterol e lecitina. A menor resposta eritropoiética pode ser explicada por: (1) efeito direto do álcool na medula óssea (quando a etiologia da hepatopatia é alcoólica); (2) anemia megaloblástica por carência de folato (secundária à desnutrição que quase sempre acompanha o cirrótico); (3 ) anemia ferropriva por sangramento crônico, geralmente proveniente do trato digestivo alto (varizes, doença ulcerosa); e (4) provável queda na produção de eritropoetina hepática. Na verdade, a anemia da hepatopatia crônica pode até ser diretamente resultante da doença hepática em si, mas com frequência tem como causa principal algum distúrbio associado (etilismo, ferropenia pelo sangramento, megaloblastose pela carência de folato). ● Síndrome de Zieve : episódios de anemia hemolítica aguda autolimitada podem se desenvolver em etilistas crônicos com hepatopatia gordurosa ou cirrose. Os pacientes apresentam dor abdominal intensa em quadrante superior direito, icterícia, hiperlipidemia e anemia hemolítica, quadro que conhecemos como síndrome de Zieve . A patogênese desta anemia é desconhecida. ● Anemia hemolítica com acantócitos : cerca de 5% dos pacientes com disfunção hepatocelular avançada desenvolvemuma anemia hemolítica grave, marcada pela presença de múltiplos acantócitos na periferia. O mecanismo parece estar relacionado ao aumento do teor de colesterol na membrana eritrocítica, sem um aumento correspondente da lecitina. A esplenectomia pode corrigir apenas parcialmente esta anemia. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E LABORATORIAISMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E LABORATORIAIS Como, na maioria das vezes, a anemia é leve ou moderada, o quadro clínico é marcado apenas pelos sinais e sintomas da hepatopatia crônica. Os achados laboratoriais característicos são de uma anemia normocítica ou macrocítica, geralmente com o índice de reticulócitos corrigido medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina elevado. A macrocitose ocorre em 30–50% dos casos, geralmente não excedendo o limite de 115 fL. O esfregaço do sangue periférico pode mostrar uma série de alterações sugestivas: (1) macrócitos finos — hemácias com diâmetro aumentado, porém com volume corpuscular normal — este achado é comum, ocorrendo em cerca de 60% dos casos; (2) hemácias em alvo ( ) — idênticas àquelas encontradas nas hemoglobinopatias e na esplenectomia — o mecanismo de sua formação é o aumento da superfície da hemácia, devido ao acúmulo de lipídios na membrana, em relação ao volume corpuscular; e (3) acantócitos — a presença de múltiplas células como esta indica hemólise grave, ocorrendo em apenas 5% dos pacientes — uma pancitopenia ou bicitopenia não são incomuns, devido ao hiperesplenismo frequentemente coexistente. HIPERESPLENISMOHIPERESPLENISMO O baço é um órgão encarregado de diversas funções, e uma delas é denominada hemocaterese , que significa a destruição de hemácias senescentes ou defeituosas. Além disso, o baço também funciona como uma espécie de "armazenador" de plaquetas e, em menor grau, de leucócitos. Na cirrose, a instalação da hipertensão porta determina uma esplenomegalia congestiva. O baço destes pacientes aumenta o seu poder de hemocaterese, pois o sangue passa com maior morosidade pelos cordões esplênicos congestos. O resultado é a hemólise extravascular, um dos componentes da anemia da hepatopatia crônica. Este tipo de anemia hemolítica tende a ser leve, pois o poder de destruição do baço congesto geralmente é contrabalançado pelo aumento Figura 5 _ _ Fig. 5: Hemácias em alvo nas hepatopatias. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina na produção de hemácias pela medula óssea. Os pacientes então desenvolvem reticulocitose . Mais importante do que a anemia é a trombocitopenia do hiperesplenismo, uma de suas principais consequências. Um baço normal “armazena” ou “sequestra” cerca de 1/3 das plaquetas circulantes. Um baço congesto é capaz de “sequestrar” um percentual muito maior, acarretando plaquetopenia. Nos casos de cirrose com hipertensão porta grave, o hiperesplenismo cursa com plaquetopenia na faixa de 30.000–60.000/mm 3 . Uma plaquetopenia inferior deve levar à suspeita de outras patologias associadas. A neutropenia por “sequestro esplênico” pode acompanhar a plaquetopenia em alguns casos. Geralmente é uma neutropenia leve a moderada. Nos raros casos de citopenias graves, pode ser indicada a esplenectomia. Cabe destacar que a plaquetometria nem sempre será por sequestro, sugerindo a presença de outros fatores relacionados como a redução de trombopoetina. HIPERTENSÃO PORTAHIPERTENSÃO PORTA INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO Aqui há o video de apostila 9.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. A veia porta compõe um sistema vascular muito especial! Ele difere dos demais sistemas vasculares do corpo por ligar estrategicamente duas importantes redes capilares — mesentérica e hepática. Assim, todas as substâncias que vêm do intestino e do baço chegam ao fígado pelo sistema porta, penetrando neste órgão através dos espaços-porta interlobulares e ganhando a circulação sinusoidal que banha os hepatócitos. Veja a .Figura 6 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Veremos neste tópico sobre hipertensão porta (ou portal): ● A sua fisiopatologia; ● As suas causas; ● As suas complicações; ● O seu tratamento. VASCULARIZAÇÃO VASCULARIZAÇÃO HEPÁTICA E ANATOMIA HEPÁTICA E ANATOMIA DO SISTEMADO SISTEMA PORTAPORTA O fígado recebe seu aporte sanguíneo basicamente de duas fontes: a veia porta e a artéria hepática. A artéria hepática é um dos três ramos do tronco celíaco. Ela origina as artérias hepáticas direita e esquerda após a emergência da artéria gastroduodenal. Antes da origem deste ramo, a artéria denomina-se “hepática comum” e, após a origem deste ramo, “hepática própria”. Em cerca de 20% dos casos, a artéria hepática direita origina-se da artéria mesentérica superior; em 15% dos casos, a artéria hepática esquerda origina-se da artéria gástrica esquerda. Ambas as anomalias podem coexistir, e o conhecimento desta variação anatômica pelo cirurgião é importantíssimo no manejo do transplante. A circulação arterial hepática possui uma riqueza de vias colaterais (cerca de 20 pequenas artérias), dez ramos provenientes do território celíaco (gastroduodenal e mesentérica superior) e dez ramos oriundos de território não celíaco (artérias diafragmáticas). A veia porta é formada atrás do colo do pâncreas, pela confluência das veias mesentérica superior e esplênica . Ela segue um trajeto na borda livre do ligamento gastro-hepático até alcançar o porta hepatis , onde se divide em ramos esquerdo e direito. A veia gástrica esquerda ou coronária drena a porção distal do esôfago e a pequena curvatura gástrica. Ela entra na veia porta em cerca de 2/3 dos casos e drena para a veia esplênica no terço restante. A veia coronária é uma das principais responsáveis pela gênese das varizes Fig. 6: Circulação colateral portossistêmica. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina terço restante. A veia coronária é uma das principais responsáveis pela gênese das varizes esofagogástricas (ver adiante). A veia mesentérica inferior drena para a veia esplênica em cerca de 2/3 dos indivíduos normais e para veia mesentérica superior no terço restante. O fluxo sanguíneo hepático corresponde a 1.500 ml/min, o que representa cerca de 25% do débito cardíaco. A veia porta contribui com cerca de 75% dessa quantidade, e a artéria hepática , com os 25% restantes. O volume carreado pelo sistema porta é regulado, de maneira indireta, pela vasoconstrição ou vasodilatação do leito venoso esplâncnico. Quando, por alguma razão, como choque hipovolêmico ou derivações cirúrgicas, o sangue no interior da veia porta é insuficiente, existe uma compensação da perda, determinada por um fluxo aumentado de sangue pela artéria hepática. Apesar do rótulo de “veia”, a veia porta carreia mais da metade do suprimento de oxigênio necessário para o fígado, além de transportar hormônios hepatotróficos esplâncnicos que mantêm a integridade e a função dos hepatócitos. Por outro lado, este vaso leva também para o fígado toxinas que precisam ser devidamente depuradas pelos hepatócitos. Dessa forma, não é de se estranhar que, em casos avançados de hipertensão porta e em pacientes com derivações cirúrgicas, o sangue “reduzido” na circulação porta venha a agravar a insuficiência hepatocelular e desviar as “toxinas” para a circulação sistêmica, determinando piora ou surgimento de encefalopatia. VEIAS COLATERAIS PORTO-CAVAVEIAS COLATERAIS PORTO-CAVA O sistema porta, em condições normais, possui baixa pressão. Uma resistência aumentada a seu fluxo determina uma diferença de pressão (geralmente superior a 5 mmHg) entre a circulação porta e a sistêmica, representada pela veia cava inferior. Imediatamente, vasos colaterais se desenvolvem, numa tentativa de equalizar as pressões em ambos os sistemas e escoar o sangue porta. A rede colateral constituída pela veia coronária (diretamente da veia porta) e pelas veias gástricas curtas (pela veia esplênica), que drenam, através das veias esofagianas e paraesofagianas, para a veia ázigos (no tórax), é a mais importante clinicamente, pois determina a formação das “temidas” varizesesofagogástricas. Outros sítios de importância em que ocorre a formação de colaterais incluem: ● Recanalização da veia umbilical , ligando o ramo esquerdo da veia porta com as veias epigástricas (sistema cava). A acentuação desta rede colateral dá origem ao sinal semiológico conhecido como "cabeça de medusa" ( caput medusae — ). É a chamada "circulação colateral abdominal tipo porto-cava"; Figura 7 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Plexo venoso hemorroidário , conectando as veias hemorroidárias superiores (tributárias da mesentérica superior e, logo, do sistema portal) com as hemorroidárias médias e inferiores (que drenam para o sistema cava). A acentuação do fluxo sanguíneo nestes vasos colaterais, em consequência à hipertensão porta, justifica o surgimento de varizes anorretais . É importante compreender que varizes retais não são a mesma coisa que hemorroidas !!! Os vasos que dão origem às hemorroidas não apresentam comunicação com o sistema porta, logo, a incidência de hemorroidas não está aumentada na hipertensão porta. ● _ Fig. 7: Caput medusae . medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Vasos retroperitoneais. FISIOPATOLOGIAFISIOPATOLOGIA Tecnicamente, a hipertensão porta é definida por uma pressão na veia porta ≥ 10 mmHg (normal = 5 a 10 mmHg). No entanto, como a mensuração direta da pressão na veia porta é muito complicada, outra definição habitualmente utilizada se refere a uma forma indireta de avaliação: o chamado gradiente de pressão venosa hepática (HVPG, em inglês), que, quando ≥ 5 mmHg, identifica a existência de hipertensão porta (normal = 1–5 mmHg). O HVPG é aferido através da cateterização da veia hepática (após punção da veia jugular interna). Guiado por fluoroscopia, um cateter com balão na ponta é colocado no interior de uma das veias hepáticas (com o balão vazio), obtendo-se a chamada “pressão venosa hepática livre”. Posteriormente, o balão é inflado até ocluir aquele segmento vascular, obtendo-se a “pressão encunhada” da veia hepática. No fígado cirrótico, a pressão encunhada corresponde à pressão intrassinusoidal que, por sua vez, corresponde à pressão no interior da veia porta. O HVPG, então, é calculado pela diferença entre a pressão “encunhada” e a pressão venosa hepática “livre”... A literatura demonstrou que o HVPG é um bom preditor prognóstico: as varizes esofagogástricas começam a se formar quando o HVPG ultrapassa o valor de 10 mmHg, tornando-se o risco de sangramento clinicamente significativo a partir de valores de HVPG ≥ 12 mmHg. Valores ≥ 20 mmHg preveem hemorragia incontrolável ou chance elevada de ressangramento em pacientes submetidos à terapia endoscópica durante um episódio de hemorragia aguda. Em suma, quanto maior o HVPG, maior o risco de hemorragia e de mortalidade! Quando o tratamento farmacológico da hipertensão porta consegue promover reduções do HVPG > 10–20% do valor inicial (colocando o valor absolutoálcool, autoimune etc.), a presença dos nódulos de regeneração comprimindo os sinusoides, a fibrose do espaço de Disse e a contração dos miofibroblastos se encarregam de aumentar a resistência ao fluxo portal hepático. HEPATITE AGUDAHEPATITE AGUDA A hepatite aguda também pode cursar com hipertensão porta transitória; esse fenômeno é mais frequentemente encontrado nos pacientes com hepatite alcoólica ou hepatite viral fulminante, tendo relação com o grau de colapso dos sinusoides resultante da compressão gerada pela necrose hepática. HEPATITE CRÔNICAHEPATITE CRÔNICA As lesões iniciais localizam-se mais comumente na fronteira entre os espaços-porta e o lóbulo hepático ("hepatite de interface"). Com a progressão da doença, notamos hepatite lobular, com aumento da deposição de colágeno nos espaços de Disse (espaço entre os sinusoides e os hepatócitos) e comprometimento sinusoidal. Dessa forma, temos um componente pré- medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina hepatócitos) e comprometimento sinusoidal. Dessa forma, temos um componente pré- sinusoidal e, com o avançar da doença, um comprometimento sinusoidal. Devemos ter em mente que a hipertensão porta pode surgir eventualmente na ausência de cirrose, embora seja bastante incomum. QUADRO DE CONCEITOS III A esquistossomose é a causa mais comum de HP intra-hepática pré-sinusoidal ! HP INTRA-HEPÁTICA PRÉ-SINUSOIDALHP INTRA-HEPÁTICA PRÉ-SINUSOIDAL ESQUISTOSSOMOSE HEPATOESPLÊNICAESQUISTOSSOMOSE HEPATOESPLÊNICA Esta desordem é uma das principais causas de hipertensão porta em países subdesenvolvidos, principalmente no Brasil, onde a doença é endêmica em Minas Gerais e no Nordeste. Nas fases precoces da esquistossomose hepática, a HP é decorrente de uma reação granulomatosa nas vênulas hepáticas (localizadas nos espaços-porta), provocada pela deposição de ovos do parasita. Essa resposta inflamatória leva à fibrose e obliteração das vênulas portais, com manifestações de HP na ausência de injúria hepatocelular importante, determinando uma HP pré-sinusoidal . Sabemos que, ao longo do tempo, os espaços-porta tornam-se intensamente fibrosados ( fibrose de Symmers )... HIPERTENSÃO PORTA IDIOPÁTICA (SÍNDROME DE BANTIHIPERTENSÃO PORTA IDIOPÁTICA (SÍNDROME DE BANTI OU FIBROSE OU FIBROSE PORTAL NÃO PORTAL NÃO CIRRÓTICA IDIOPÁTICA)CIRRÓTICA IDIOPÁTICA) Esta síndrome, inicialmente descrita na Ásia (especialmente Índia e Japão), agora é reconhecida em outros países, como os EUA. Predomina em pessoas jovens e tem exatamente as mesmas características clínicas e patológicas da esquistossomose hepatoesplênica (esplenomegalia, hiperesplenismo, varizes esofagogástricas, sem insuficiência hepática importante). OUTRASOUTRAS Sarcoidose: o envolvimento apenas histológico do fígado, sem sintomas clínicos, é muito frequente na sarcoidose. Dessa forma, a HP é uma manifestação rara da sarcoidose hepática. Quando ela ocorre, geralmente é decorrente da localização dos granulomas sarcoides na periferia do lóbulo, próximo às vênulas dos espaços-porta, determinando uma HP pré- sinusoidal. Hiperplasia nodular regenerativa: esta desordem tem sido descrita em condições associadas à diminuição do fluxo de sangue, de maneira não uniforme, para o parênquima hepático. Temos como característica anatomopatológica uma transformação nodular do parênquima hepático medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina como característica anatomopatológica uma transformação nodular do parênquima hepático sem tecido fibroso unindo essas estruturas. Os ácinos com suprimento sanguíneo inadequado se atrofiam, enquanto outros, com fluxo em excesso, se hipertrofiam, nos dando a aparência de verdadeiros nódulos. A HNR é causada mais comumente por doenças do colágeno (artrite reumatoide, síndrome de Felty), aterosclerose, vasculites, insuficiência cardíaca congestiva, diabetes mellitus e idade avançada. Todas estas condições têm em comum uma diminuição, em maior ou menor grau, do fluxo sanguíneo hepático. Estes nódulos e a obstrução (ou hipofluxo) das vênulas comprometem, com maior frequência, os espaços-porta, determinando HP pré- sinusoidal. Entretanto, os sinusoides podem também ser acometidos na HNR. Colangite biliar primária — fase pré-cirrótica: nas fases iniciais desta doença, a inflamação dos ductos bilíferos nos espaços-porta compromete também as vênulas hepáticas, determinando HP pré-sinusoidal. Com a cirrose hepática estabelecida, o componente sinusoidal passa a ser mais importante. Doença de Wilson — fase pré-cirrótica: as lesões que causam HP na doença de Wilson são consideradas pré-sinusoidais. Entretanto, como ocorre em várias doenças associadas a esta categoria de HP, um componente sinusoidal também pode ser observado. Malignidade hepática: como vimos acima, as neoplasias malignas do fígado podem determinar hipertensão porta por diversos mecanismos. Quando o comprometimento é intra-hepático, podemos observar o surgimento de fístula entre a artéria hepática e a veia porta, compressão do tronco porta, trombose das vênulas porta etc. Nesses casos, varizes gastroesofágicas e ascite transudativa são encontradas. Por outro lado, o hepatocarcinoma pode surgir na evolução de uma cirrose hepática. Em alguns pacientes, o agravamento de uma HP já existente pode representar a manifestação clínica inicial. Por exemplo, ascite de difícil manejo, em um paciente cirrótico previamente compensado. Peliosis hepatis : a peliose é uma lesão histológica rara do fígado caracterizada pelo surgimento de pequenos cistos cheios de sangue, que ocupam espaço nos lóbulos hepáticos. Esta desordem pode originar-se de lesões aos sinusoides, resultando em dilatação de seu lúmen e alargamento dos espaços de Disse. Devemos ter em mente que as manifestações referentes à HP raramente dominam o quadro clínico nesses pacientes. As principais causas de peliose hepática incluem os tumores hepáticos, icterícia colestática e a toxicidade por drogas (azatioprina, vitamina A, contraceptivos orais, tamoxifeno...) e o uso de esteroides anabolizantes. A síndrome da imunodeficiência adquirida, a tuberculose, a doença de Hodgkin também são causas descritas. HP INTRA-HEPÁTICA PÓS-SINUSOIDALHP INTRA-HEPÁTICA PÓS-SINUSOIDAL DOENÇA HEPÁTICA VENO-OCLUSIVADOENÇA HEPÁTICA VENO-OCLUSIVA A doença veno-oclusiva hepática acomete pequenas veias hepáticas. Observamos deposição de ■ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A doença veno-oclusiva hepática acomete pequenas veias hepáticas. Observamos deposição de uma matriz rica em fibronectina em torno das veias centrais dos lóbulos (portanto pós- sinusoidal). A doença se manifesta de forma aguda com icterícia, hepatomegalia congestiva e dolorosa, ascite e varizes gastroesofágicas. A elevação das aminotransferases e da bilirrubina são achados laboratoriais frequentes. Esta condição é mais comumente observada na doença enxerto vs. hospedeiro, sendo uma complicação comum no transplante alogênico de células- tronco. Outras causas incluem irradiação hepática e uso de um chá ( bush tea disease) jamaicano, que contém alcaloides de determinadas plantas (crotalaria). HP PRÉ-HEPÁTICAHP PRÉ-HEPÁTICA Neste grupo, incluímos todas as causas de aumento de pressão na veia porta não associadas a desordens de estruturas localizadas no interior do parênquima hepático. Alguns autores classificam este grupo como hipertensão porta pré-sinusoidal extra-hepática, porém preferimos a primeira classificação. Vamos descrever os principais distúrbios encontrados. TROMBOSE DE VEIA PORTATROMBOSE DE VEIA PORTA É a principal causa de hipertensão porta pré-hepática. Esta desordem é mais frequentemente encontrada na população pediátrica, tendo sua origem a partir de uma infecção na veia umbilical. Na população adulta, encontramos como causa importante a cirrose hepática e as desordens trombofílicas (presentes em 60% dos casos). O carcinoma hepatocelular, complicando uma cirrose preestabelecida, também pode se apresentar como trombose de veia porta. Outras condições associadasincluem a doença intestinal inflamatória, as síndromes mieloproliferativas, hemoglobinúria paroxística noturna, complicação de escleroterapia, gravidez, uso de contraceptivos etc. A trombose crônica da veia porta pode levar à transformação cavernosa da veia porta : dilatação de veias colaterais hepatopetais (em direção ao fígado), dando a aparência de “dilatações cavernosas”. O diagnóstico geralmente é feito por USG-Doppler da porta, sendo a RM ou a TC reservadas para os casos duvidosos. O tratamento na fase aguda é feito com anticoagulação, enquanto que na crônica é assunto controverso... FÍSTULA ARTERIOVENOSA ESPLÂNCNICAFÍSTULA ARTERIOVENOSA ESPLÂNCNICA As fístulas arteriovenosas no baço e leito vascular esplâncnico podem se manifestar como hipertensão porta, ascite e hemorragia digestiva por varizes gastroesofágicas. Outros achados clínicos incluem dor abdominal no quadrante superior direito e sopro abdominal. Esta rara condição pode ser congênita, representada pela telangiectasia hemorrágica hereditária (síndrome de Rendu-Osler-Weber), ou adquirida. Neste último grupo, incluímos os traumatismos abdominais, procedimentos hepáticos (como a biópsia hepática), a ruptura de aneurismas de artéria hepática e o carcinoma hepatocelular. A hipertensão porta é decorrente ■ ■ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina do aumento importante de fluxo nesse vaso. Este fenômeno, se não corrigido, pode levar, ao longo do tempo, à esclerose dos espaços-porta, ocasionando uma desordem intra-hepática pré- sinusoidal. O tratamento pode ser feito com a embolização arterial percutânea da fístula. TROMBOSE DE VEIA ESPLÊNICA (HIPERTENSÃO PORTATROMBOSE DE VEIA ESPLÊNICA (HIPERTENSÃO PORTA SEGMENTAR)SEGMENTAR) Causa a chamada hipertensão porta segmentar . Devemos suspeitar de trombose de veia esplênica quando nos deparamos com sinais de hipertensão porta, particularmente hemorragia por varizes gástricas, em pacientes com função hepatocelular normal. A principal causa desta condição é representada pelas doenças do pâncreas. A pancreatite crônica é responsável pela grande maioria dos casos, com o câncer de pâncreas em segundo lugar! Devido à anatomia do sistema porta, este distúrbio geralmente cursa com varizes de fundo gástrico isoladas (HP segmentar ou HP esquerda ou sinistra). Entretanto, a identificação de varizes gastroesofágicas não é incomum. O diagnóstico desta variedade de HP torna-se fundamental, uma vez que a esplenectomia corrige inteiramente o distúrbio. Hipertensão porta segmentar = Patologias pancreáticas ESPLENOMEGALIA DE GRANDE MONTAESPLENOMEGALIA DE GRANDE MONTA Este fenômeno ocorre em uma minoria de pacientes com aumento do baço. Entre as condições encontradas, citamos a leucemia mieloide crônica, os linfomas, a doença de Gaucher, a policitemia v e r a e a metaplasia mieloide. Nesses casos, a HP é decorrente do fluxo hiperdinâmico proveniente da veia esplênica a partir do baço absurdamente aumentado. A esplenectomia pode normalizar a pressão porta em alguns pacientes. Entretanto, na maioria das desordens hematológicas, observamos aumento da resistência ao fluxo porta hepático devido à infiltração do parênquima por células neoplásicas. Outras causas também frequentes de HP nesse grupo seriam as tromboses de veias porta e hepática. HP PÓS-HEPÁTICAHP PÓS-HEPÁTICA Estes distúrbios determinam um aumento da pressão porta como um reflexo de elevações da pressão em sistemas venosos localizados “acima” do fígado, principalmente a veia cava inferior. Qualquer doença que eleve as pressões em câmaras cardíacas direitas pode estar envolvida. Uma vez que a circulação hepática não contém valvas, qualquer obstrução ou aumento de pressão de outra etiologia, distal aos sinusoides, resulta em hipertensão sinusoidal, fluxo retrógrado na veia porta e acentuação de colaterais. O achado histológico da obstrução pós- hepática é representado por congestão sinusoidal com áreas de infarto centrolobular. ■ ■ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina SÍNDROME DE BUDD-CHIARISÍNDROME DE BUDD-CHIARI Esta síndrome, assim como a doença veno-oclusiva, não possui achados histológicos de cirrose. Nesta desordem, observamos obstrução de caráter insidioso ou agudo das veias hepáticas. Como causas mais frequentes, citam-se as desordens mieloproliferativas ( policitemia vera ), a hemoglobinúria paroxística noturna, outras trombofilias (fator V de Leiden, SAAF, deficiência de antitrombina III), a gravidez, o uso de contraceptivos orais e malignidades em geral. A síndrome de Budd-Chiari aguda manifesta-se com dor intensa em quadrante superior direito, associada à hepatomegalia, com rápido desenvolvimento de ascite e icterícia; sangramento gastrointestinal por ruptura de varizes esofágicas pode ocorrer. Na forma crônica/subaguda, o quadro álgico e a hepatomegalia são menos comuns, com o aparecimento insidioso da sintomatologia (principalmente ascite). Síndrome de Budd-Chiari Ocorre em consequência à trombose das veias hepáticas, levando a um mecanismo de hipertensão porta pós-sinusoidal e franca ascite e hepatomegalia. Está muito associada às síndromes trombofílicas (de hipercoagulabilidade), como as neoplasias e síndromes mieloproliferativas (classicamente a policitemia vera ). OBSTRUÇÃO DA VEIA CAVA INFERIOR (VCI)OBSTRUÇÃO DA VEIA CAVA INFERIOR (VCI) As causas de obstrução mecânica da VCI incluem trombose venosa, tumores, cistos, abscessos e obstrução membranosa por uma “teia”. Esta última condição é tipicamente encontrada em alguns países da África e do Oriente. O quadro clínico se caracteriza por desenvolvimento lento e progressivo de manifestações de hipertensão porta, associado a uma hepatomegalia dolorosa. A trombose da VCI, quando associada à oclusão da veia hepática (síndrome de Budd-Chiari), possui apresentação clínica mais abrupta, com o surgimento de sangramento por varizes rotas e ascite de maneira mais precoce. Independentemente da causa de obstrução da cava inferior, encontramos somente nestes pacientes achados como edema de membros inferiores e circulação colateral no dorso. DOENÇAS CARDÍACASDOENÇAS CARDÍACAS Como vimos acima, qualquer aumento de pressão em cavidades direitas do coração, seja decorrente de pericardite constritiva , cardiopatias orovalvares ou cardiomiopatias, transmite-se para a cava inferior, daí para a veia hepática, sinusoides e, finalmente, veia porta. Os pacientes com esta síndrome possuem evidências de ascite intratável e disfunção hepatocelular, que são muitas vezes difíceis de distinguir de outras causas de hipertensão porta. Embora os pacientes com sobrecarga de cavidades direitas desenvolvam ascite, as varizes gastroesofágicas são medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina com sobrecarga de cavidades direitas desenvolvam ascite, as varizes gastroesofágicas são detectadas somente naqueles indivíduos com doença hepática intrínseca que produza um gradiente significativo entre o sistema porta e a veia ázigos. DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO Devemos suspeitar de hipertensão porta em todo paciente que apresente uma combinação dos seguintes achados: ascite, esplenomegalia, encefalopatia ou varizes esofagogástricas. Os exames laboratoriais iniciais nos ajudam a identificar a existência ou não de disfunção hepatocelular associada e incluem a dosagem sérica de albumina, o hemograma completo, as provas de função hepática e a determinação do TAP. ULTRASSONOGRAFIA-DOPPLERULTRASSONOGRAFIA-DOPPLER A USG é o método tradicionalmente utilizado na avaliação inicial do sistema porta em pacientes com suspeita de HP. Possui elevada acurácia em distinguir uma veia porta trombosada de uma patente. Além disso, as colaterais do sistema porta em torno da veia ázigos, estômago, baço e retroperitônio são também visualizadas. O tamanho do baço é determinado com clareza e constitui dado diagnóstico adicional. O calibre da veia porta, em casos de hipertensão, acha-se em torno de 15 mm , entretanto, um valor normal (até 12 mm) não afasta esta condição. Uma veiaporta normal aumenta seu calibre em resposta à alimentação (hiperemia reativa). A ausência desse fenômeno é sugestiva de hipertensão porta... A inabilidade de visualizar a veia porta é sugestiva de trombose deste vaso. O uso concomitante da fluxometria pelo Doppler permite uma estimativa do fluxo porta. Um sentido hepatopetal (em direção ao fígado) é observado em indivíduos normais e nos casos menos severos de HP. O fluxo hepatofugal (contrário ao fígado) revela a existência de hipertensão porta grave. ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTAENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA A endoscopia digestiva está sempre indicada na suspeita ou após o diagnóstico de HP. A presença de varizes esofagogástricas (esofagianas e/ou gástricas) sela o diagnóstico de hipertensão porta! Uma proporção variável de pacientes com HP não possui varizes. A presença de outras complicações da hipertensão porta, como encefalopatia e ascite, não é capaz de indicar, com confiabilidade, se um indivíduo já tem ou não varizes. Uma contagem plaquetária inferior a 140.000/mm³ e um diâmetro da veia porta superior a 13 mm na USG têm se correlacionado melhor com a presença de varizes. Uma vez identificadas, a graduação das varizes de acordo com o seu tamanho é útil para indicarmos profilaxia primária (antes do primeiro episódio) ou não. Outros achados endoscópicos que se correlacionam com o risco de ruptura incluem manchas vermelho-cereja ( cherry-red spots ) e manchas hematocísticas. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina hematocísticas. As varizes gástricas são de reconhecimento um pouco mais difícil, uma vez que se assemelham às pregas da mucosa. A coexistência de outras lesões, como gastrite e úlceras pépticas, é frequente em pacientes com cirrose. A gastropatia hipertensiva portal é descrita como uma mucosa com áreas esbranquiçadas reticulares entremeadas a áreas róseas (por vezes sangrantes), dando o aspecto de “pele de cobra”. Seu reconhecimento, através da endoscopia, é difícil, porém útil no diagnóstico diferencial de hemorragias digestivas altas nessa população. ANGIO-TC E RESSONÂNCIA MAGNÉTICAANGIO-TC E RESSONÂNCIA MAGNÉTICA A angio-TC e a RM são métodos não invasivos capazes de delinear o sistema porta. Estes exames radiológicos diagnosticam com elevada acurácia a trombose de veia porta, além de determinar a patência de derivações cirúrgicas. São indicados em casos de dúvida diagnóstica ao USG-Doppler de sistema porta. Ao contrário da USG, não apresentam limitações devido à obesidade, experiência do examinador e presença de gás intestinal, embora sejam exames de alto custo. ANGIOGRAFIAANGIOGRAFIA Este método radiológico invasivo é útil para delinear a anatomia das colaterais do sistema porta, a patência dos vasos, a presença de aneurismas, fístulas e lesões vasculares intra- hepáticas. A angiografia de fase venosa pode ser realizada após a injeção seletiva de contraste na artéria mesentérica superior e esplênica. Este exame nos permite uma definição correta da anatomia, sendo utilizado no planejamento cirúrgico da hipertensão porta. MEDIDAS HEMODINÂMICASMEDIDAS HEMODINÂMICAS A cateterização da veia hepática para medida do HVPG atualmente é empregada apenas em casos duvidosos, nos quais os demais métodos não invasivos não conseguem firmar o diagnóstico de HP, ou então após implantação do TIPS ou cirurgia de derivação porto-cava, a fim de avaliar a eficácia do tratamento (cujo objetivo é a obtenção de um HVPG 15 kPa . O exame também se revelou ser um bom preditor da ocorrência de complicações relacionadas à cirrose, como a formação de varizes de esôfago e hemorragia digestiva. Vale lembrar que o padrão-ouro para a confirmação diagnóstica de cirrose ainda é a biópsia hepática. COMPLICAÇÕES E SEU MANUSEIOCOMPLICAÇÕES E SEU MANUSEIO Aqui há o video de apostila 10.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. As consequências clínicas mais importantes da HP estão associadas à formação de colaterais portossistêmicos . A dilatação de canais embrionários preexistentes consiste no mecanismo principal na formação destes vasos colaterais. A importância clínica do fenômeno vai depender de sua localização e a frequência com que ocorre. ● As colaterais gastroesofágicas se desenvolvem entre as veias gástricas curtas, as veias esofagianas e a veia ázigos e veias intercostais, determinando o aparecimento de varizes gástricas e esofagianas , que possuem importância clínica em razão de sangramentos de vulto que podem ocorrer. ● As colaterais retais podem determinar o aparecimento de varizes anorretais que se desenvolvem através da conexão da veia retal superior (sistema porta) com as veias retais média e inferior (sistema cava). Estas varizes podem sangrar, embora isso não seja muito comum. ● O remanescente da veia umbilical pode se dilatar e servir como conexão entre o ramo esquerdo da veia porta e as veias epigástricas (sistema cava), fenômeno responsável pela “ cabeça de medusa ” observada à ectoscopia, constituindo-se em um sinal que nos indica a presença de hipertensão porta. ● Colaterais podem se desenvolver entre o sistema porta e a parede abdominal posterior e através da cápsula do fígado e diafragma. ● Grandes e espontâneas anastomoses podem se desenvolver entre o sistema porta e a veia renal esquerda. Estas podem ser tão grandes que simulam algumas vezes uma derivação cirúrgica. Estas colaterais nunca sangram e são raramente medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina uma derivação cirúrgica. Estas colaterais nunca sangram e são raramente identificadas. Sendo assim, devido à importância do tema, daremos destaque ao manejo das varizes esofagogástricas a seguir. Um dos principais marcadores prognósticos dos pacientes com hemorragia digestiva alta por varizes de esôfago é o grau de insuficiência hepática. Existe uma relação direta: quanto maior a pontuação pelo escore de Child, maior a mortalidade. Enquanto nos pacientes Child A encontra-se em torno de 15%, no Child C é em média 50%. Além disso, muitas causas de hipertensão porta, como a cirrose hepática (a principal), também cursam com outro sinal importante — a ascite . Também pela sua importância, ele será abordado na sequência. Tab. 3: Classificação de Child-Pugh. Tab. 4 VARIZES ESOFAGOGÁSTRICASVARIZES ESOFAGOGÁSTRICAS VARIZES ESOFAGIANASVARIZES ESOFAGIANAS A prevalência de varizes esofagianas em pacientes recém-diagnosticados com cirrose hepática encontra-se em torno de 50%, sendo de 40% nos pacientes Child A e 85% nos Child C. As varizes esofagianas evoluem para sangramento em pelo menos 30–40% dos casos e são a _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina As varizes esofagianas evoluem para sangramento em pelo menos 30–40% dos casos e são a causa mais comum de hemorragia digestiva alta em pacientes com hipertensão porta. Para os pacientes que sobrevivem à hemorragia inicial, cerca de 70% voltam a sangrar novamente em um período de um ano, com uma letalidade de 30%. A mortalidade decorrente de um primeiro episódiode sangramento é de 25–30% . O risco é máximo após os primeiros dias e diminui gradativamente nas próximas seis semanas. A mortalidade está principalmente relacionada com o grau de disfunção hepática. Pacientes com Child C possuem mortalidade precoce de 50% ( versus 15% nos Child A) e de até 90% em um ano após um episódio de hemorragia. Mesmo os pacientes com Child A possuem uma sobrevida de apenas 50% em cinco anos. Os índices prognósticos de ressangramento incluem o grau de disfunção hepática e o tamanho, as características (presença ou não de sinais vermelhos) e a espessura da parede das varizes. A a seguir mostra a classificação das varizes em estágios. Tab. 5 Classificações das Varizes Esofagianas F1 (pequeno calibre) Varizes minimamente elevadas, sem tortuosidades ( 20 mm de diâmetro). VARIZES GÁSTRICAS (VG) E GASTROPATIA HIPERTENSIVAVARIZES GÁSTRICAS (VG) E GASTROPATIA HIPERTENSIVA PORTAL (GHP)PORTAL (GHP) As varizes gástricas podem ser isoladas ou associadas às esofágicas (achado mais comum), sendo mais frequentes na hipertensão porta pré-hepática. São responsáveis por até 10% de todos os episódios de hemorragia digestiva alta no paciente cirrótico. O diagnóstico requer, além da endoscopia convencional, o uso de ultrassonografia endoscópica . As varizes gástricas são alimentadas pelas veias gástricas curtas e posteriores, sendo geralmente associadas a uma pressão portal menor do que a encontrada nas varizes esofágicas. Shunts gastrorrenais espontâneos através da veia esplênica ocorrem em 60–85% dos casos, explicando dois achados: menor risco de sangramento (quando comparado às esofagianas) e maior incidência de encefalopatia. Após um primeiro episódio de sangramento por VG, a recidiva varia de 25–90%. A mortalidade relacionada ao sangramento encontra-se em torno de 20%. A Gastropatia Tabela 5 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina mortalidade relacionada ao sangramento encontra-se em torno de 20%. A Gastropatia Hipertensiva Portal (GHP) é caracterizada por alterações na mucosa do estômago relacionadas à hipertensão porta. Histologicamente, observam-se dilatações dos capilares e vênulas da mucosa. O sangramento da GHP é difuso por toda a mucosa gástrica, sendo conhecido como sangramento "em lençol"; o sangramento pode ser crônico e insidioso, sendo uma causa de anemia ferropriva nos pacientes cirróticos, ou agudo, apresentando-se com melena. Vale ressaltar que o tratamento endoscópico NÃO é eficaz na GHP (ver adiante). CONDUTA NO SANGRAMENTOCONDUTA NO SANGRAMENTO CONTROLE RESPIRATÓRIO E HEMODINÂMICOCONTROLE RESPIRATÓRIO E HEMODINÂMICO A estabilização da pressão arterial é a primeira medida em qualquer hemorragia digestiva. A reposição de solução cristaloide e, mesmo sangue, é recomendada. Um cuidado a ser tomado é evitar a reposição excessiva de líquidos, que pode aumentar a pressão portal, aumentando o sangramento! O emprego de plasma fresco congelado está indicado quando o INR está acima de 1,7, e a transfusão de plaquetas quando a plaquetometria for inferior a 50.000/mm³. Os pacientes que se apresentam confusos ou com rebaixamento do nível de consciência merecem ser intubados, até mesmo para proteger a via aérea durante a realização de endoscopia digestiva alta. A EDA deve ser realizada o mais rapidamente possível, mesmo com o doente estabilizado do ponto de vista respiratório e hemodinâmico. TERAPIA ENDOSCÓPICATERAPIA ENDOSCÓPICA Uma vez estabilizada a hemodinâmica, o estômago deve ser lavado vigorosamente, e uma endoscopia digestiva alta realizada, de preferência, dentro das primeiras 12h. Este procedimento permite a localização adequada do sítio de sangramento, confirmando ou afastando o sangramento por varizes esofagogástricas rotas. Sabemos que cerca de 30–40% dos pacientes com hipertensão porta possuem sangramentos decorrentes de outras lesões, como a síndrome de Mallory-Weiss e a esofagite ou gastrite erosiva. A terapia endoscópica é a conduta de escolha para hemorragia digestiva alta decorrente de sangramento de varizes esofagianas, mas não as gástricas. A técnica hemostática de escolha é a ligadura elástica (preferencial à escleroterapia ). Cerca de 60% dos episódios de hemorragia por varizes cessam de maneira espontânea. Entretanto, a hemostasia endoscópica torna-se sempre necessária, mesmo em vasos que já pararam de sangrar, devido ao elevado risco de ressangramento precoce. O tratamento endoscópico controla o sangramento das varizes em 85 – 90% dos casos. Aqui há o video de apostila 11.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Aqui há o video de apostila 11.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. Aqui há o video de apostila 12.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. A escleroterapia tem como princípio a injeção de substâncias esclerosantes no interior das varizes ou na região paravariceal, provocando irritação na parede vascular e subsequente trombose. As drogas empregadas são o oleato de etanolamina a 2,5–5%, o polidocanol a 0,5– 1%, tetradecilsulfato de sódio a 1–3%, ou o morruato de sódio a 5%. Na ligadura elástica ou Ligadura Endoscópica de Varizes (LEV), ocorre estrangulamento do vaso varicoso, e o sangramento cessa. A ligadura elástica encontra-se associada a uma obliteração mais rápida das varizes. Os dispositivos atuais permitem o posicionamento de cinco a seis faixas elásticas por vez. A ligadura elástica apresenta menor potencial de complicações que a escleroterapia! As complicações da escleroterapia incluem febre, disfagia temporária, derrame pleural assintomático e dor torácica retroesternal. A principal e incomum complicação esofagiana clinicamente significativa, que requer uma mudança na estratégia terapêutica, inclui a ulceração mucosa, que pode provocar sangramento em 20% dos casos. A perfuração esofágica é rara, mas é a mais temida das complicações. O tratamento das varizes de fundo gástrico e cárdia é tecnicamente mais difícil. Nesta situação, uma nova droga vem despontando para ser aplicada na lesão sangrante durante a endoscopia: o cianoacrilato , uma substância gelatinosa que endurece em contato com o meio, transformando-se em material plástico. Outra terapia que vem sendo estudada é a injeção de trombina nas varizes. Todavia, como veremos adiante, o tratamento padrão-ouro, na atualidade, para combater a hemorragia por varizes gástricas, é a infusão de vasoconstritores esplâncnicos . TERAPIA FARMACOLÓGICATERAPIA FARMACOLÓGICA É realizada com vasoconstritores esplâncnicos intravenosos, que reduzem o fluxo sanguíneo porta e, portanto, a pressão portal. Citamos a terlipressina (análogo da vasopressina), atualmente considerada a droga de escolha por alguns autores; a somatostatina (pouco disponível no mercado); o octreotida e seus derivados (análogos da somatostatina). Estes últimos inibem a ação vasodilatadora esplâncnica do glucagon. A terapia com estas medicações deve ser iniciada de imediato, uma vez diagnosticado o sangramento por varizes, sendo considerada adjuvante à terapia endoscópica ou terapia isolada nas varizes gástricas e na gastropatia hipertensiva portal sangrante. O potencial de controle da hemorragia é de 80% , quando em terapia isolada. A terapia farmacológica é a conduta de primeira linha para a hemorragia das varizes gástricas ou da gastropatia hipertensiva portal. Antigamente, a vasopressina era considerada uma opção terapêutica, porém, devido a seus efeitos colaterais, como vasoconstrição coronariana, hiponatremia e insuficiência renal aguda, medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina efeitos colaterais, como vasoconstrição coronariana, hiponatremia e insuficiência renal aguda, tornou-se uma droga obsoleta. A terlipressina apresenta menor potencial de efeitos adversos cardiovasculares e maior eficácia do que a vasopressina.Observe as doses dos principais esquemas utilizados (ambos de uso intravenoso): ● Terlipressina 250–500 mcg/h; ● Octreotida 50 mcg em bolo e 50 mcg/h. A terlipressina é a droga de escolha no controle da hemorragia das varizes esofagogástricas por ser a única que, além de melhorar o sangramento, demonstrou reduzir a mortalidade. A somatostatina e o octreotida e seus análogos melhoram o sangramento, porém, de acordo com a literatura, não se mostraram capazes de reduzir a mortalidade. A terapia com essas drogas é mantida por 2 – 5 dias . BALÃO DE SENGSTAKEN-BLAKEMOREBALÃO DE SENGSTAKEN-BLAKEMORE Na ausência de procedimentos endoscópicos de urgência ou nos pacientes que permanecem sangrando a despeito da terapia endoscópica e farmacológica, podemos empregar o tamponamento com Balão de Sengstaken-Blakemore (BSB). Técnica: o BSB possui três lúmens (para encher o balonete gástrico, o balonete esofágico e para aspiração gástrica). Modelos novos possuem um quarto lúmen para aspiração esofágica... O dispositivo deve ser passado até o estômago e inflado o balonete gástrico com 250 ml de ar, sendo duplamente pinçado; após devida tração do BSB, é colocado um peso com 500 ml de soro para mantê-lo tracionado. O balonete esofágico então é inflado com 40 mmHg de pressão de ar, sendo também pinçado. Parece que o efeito hemostático mais importante do BSB deve-se ao balonete intragástrico tracionado! O balão deve ser mantido por curta permanência (idealmente 10 mm. A encefalopatia costuma se instalar Fig. 9: TIPS — Shunt portossistêmico intra-hepático transjugular, unindo a circulação porta e sistêmica "por dentro" do parênquima do fígado. _ Fig. 10: Detalhe na inserção da agulha com o guia na veia porta direita, durante a colocação de um TIPS. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina 2–3 semanas após a implantação do TIPS e geralmente responde às medidas convencionais, como o uso de lactulose. Outro problema comum é a estenose . O mecanismo principal é a hiperplasia da chamada pseudo-íntima em seu lúmen. A estenose do stent era observada em 50–75% dos casos após 6–12 meses de acompanhamento e, após dois anos, ocorria virtualmente em todos os pacientes. Atualmente, porém, com o uso de stents recobertos pelo politetrafluoretileno, a taxa de estenoses caiu bastante, para cerca de 8% após um ano. A estenose dificulta a vazão do shunt , permitindo a recidiva das complicações da hipertensão porta. A estenose pode ser adequadamente revertida com angioplastia ou com a colocação de um novo stent . A patência do TIPS pode ser monitorizada com USG-Doppler seriados, de seis em seis meses, pelo menos nos primeiros dois anos. A atual indicação do TIPS é para os pacientes que ressangraram apesar da terapia endoscópica e do tratamento medicamentoso otimizado, principalmente nos que aguardam transplante de fígado. Ao contrário da cirurgia de derivação portossistêmica, o TIPS não altera a anatomia dos sistemas porta e cava, daí a importância de utilizá-lo nos indivíduos com transplante programado. Em pacientes sem previsão ou perspectiva de transplante, a cirurgia é a melhor opção, pela chance de recidiva da hipertensão porta com o TIPS, porém é um procedimento de maior risco e só deve ser realizado nos pacientes com boas condições clínicas (Child A — ou seja, cirróticos Child B ou C, devido à elevada morbimortalidade peroperatória, não devem ser submetidos ao tratamento cirúrgico da hipertensão porta). QUADRO DE CONCEITOS IV Quais são as principais indicações de TIPS na cirrose? ● Hemorragia refratária ou recorrente por varizes esofagogástricas apesar de tratamento clínico endoscópico. ● Ascite refratária. Quais são as principais complicações? ● Encefalopatia hepática. ● Estenose do stent (com retorno dos sintomas de hipertensão porta). Quais são as contraindicações ao procedimento? (1) Insuficiência cardíaca congestiva; (2) múltiplos cistos hepáticos; (3) hipertensão pulmonar moderada/severa; (4) neoplasias muito vascularizadas; (5) trombose de porta ou de todas as veias hepáticas; (6) encefalopatia hepática refratária; e (7) dilatação da árvore biliar. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina CIRURGIA DE URGÊNCIACIRURGIA DE URGÊNCIA A taxa de sucesso no controle dos episódios agudos de sangramento por varizes esofagogástricas rotas "refratárias" ao tratamento convencional (ligadura elástica + farmacoterapia) supera os 95%. Além disso, o TIPS tem sido bastante indicado nos casos de hemorragia refratária, substituindo, na prática, as cirurgias descompressivas de emergência (que antigamenterepresentavam a única opção terapêutica disponível) e a passagem de um BSB. Assim, a cirurgia é reservada para os casos de sangramento incontrolável pela endoscopia e/ou terapia farmacológica em hospitais que não dispõem do TIPS. A cirurgia de urgência mais utilizada é a derivação porto-cava (não seletiva) . Esta cirurgia é rápida e extremamente eficaz, porém acarreta mortalidade de até 25% quando realizada em condições de emergência. A transecção esofágica com grampeador é um método cirúrgico bem mais simples e fácil de executar, embora tenha um risco alto de ressangramento. Pode ser a alternativa em centros que contam com cirurgiões de urgência sem experiência na confecção da derivação porto-cava. O a seguir resume a conduta diante de uma hemorragia digestiva alta por varizes de esôfago rotas. Fluxograma 1 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina PROFILAXIA PRIMÁRIA DO SANGRAMENTOPROFILAXIA PRIMÁRIA DO SANGRAMENTO A presença de hipertensão porta por si só não necessariamente está associada a um risco elevado de sangramento por varizes, mas sim os casos de Hipertensão Porta Clinicamente Significativa (HPCS) . A HPCS é definida pelo Gradiente de Pressão Venosa Hepática (GPVH) ≥ 10 mmHg (padrão-ouro) ou pela presença de manifestações clínicas da HP (ex.: ascite, circulação colateral). A recomendação atual é para que todo paciente com cirrose e HPCS receba profilaxia primária medicamentosa com betabloqueadores para sangramento, independentemente da presença de varizes ou do seu calibre . Entre os betabloqueadores, os mais estudados são os não seletivos propranolol e o nadolol . O grande efeito é levar à vasoconstrição esplâncnica (bloqueia o efeito beta, predominando o efeito alfavasoconstritor), isto é, dos órgãos mesentéricos. A consequência é uma redução do fluxo venoso que chega ao sistema porta e da pressão portal. Lembre-se d e que, além da obstrução, um dos mecanismos da HP é o aumento do fluxo! Mais recentemente, o carvedilol (que também bloqueia atividade alfa-1-vasoconstritora com redução do tônus vascular hepático e da resistência hepática) foi integrado a esta lista. Inclusive, por ser mais efetivo na redução da pressão porta e por apresentar melhor tolerância que os demais, já é considerada a droga de escolha . Mas, e nos demais pacientes, precisamos fazer rastreamento de varizes para antecipar o sangramento? Depende! Em teoria, TODO paciente com cirrose hepática deve ser submetido à endoscopia digestiva alta para rastrear as varizes esofagogástricas. Contudo, o rastreio poderia ser adiado, a partir da realização de seguimento anual com a Elastografia Hepática Transitória (EHT) e a contagem de plaquetas. Sabe-se atualmente que tais testes não invasivos são acurados para estimar a HCPS. O rastreio endoscópico ficaria indicado então para aqueles com EHT ≥ 20 kPa ou contagem de plaquetas ≤ 150.000/mm³. Além disso, os pacientes que já estiverem compensados em uso de betabloqueadores (titulados para FC de repouso de 50–55 bpm ou pelo GPVH) não necessitam de rastreamento endoscópico para detecção de varizes! Afinal, a conduta não sofrerá modificações. Uma vez indicado, o rastreamento deve ser repetido a cada 2–3 anos na ausência de varizes, 1– 2 anos na presença de pequenas varizes e anualmente se Child-Pugh B/C. Nesse contexto, a profilaxia primária estaria indicada em caso de: Fluxograma 1: Conduta diante de uma hemorragia digestiva alta por varizes de esôfago rotas. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina profilaxia primária estaria indicada em caso de: ● Varizes de médio e grande calibre (F2/F3); ou ● Varizes de pequeno calibre em pacientes com alto risco de sangrar (Child B/C ou “pontos avermelhados” na EDA). Caso não possam receber betabloqueadores (contraindicação ou tolerância), a escolha recai sobre a Ligadura Endoscópica de Varizes (LEV). Esta deve ser realizada a cada 1–2 semanas até obliteração do vaso. Em seguida, faz-se vigilância endoscópica com EDA 1–3 meses depois e, consecutivamente, a cada seis meses. Além dos betabloqueadores, outras drogas potencialmente benéficas também já foram descritas. Entre elas, nitrato e sinvastatina (pela elevação do óxido nítrico na circulação intra- hepática), prasozin/clonidina (pelo bloqueio adrenérgico) e captopril/losartan (pelo bloqueio da angiotensina). O grande problema dos venodilatadores, no entanto, é agravar a retenção de sódio e a vasoconstrição renal. Terapia de escolha na profilaxia primária = betabloqueio (preferência) ou ligadura elástica Obs.: a escleroterapia não deve ser usada como profilaxia primária. RESUMINDO... Indica ções de pro filaxia primá ria de sangra mento. ● Hipertensão Porta Clinicamente Significativa (HPCS). ● Varizes de grosso e médio calibre. ● Varizes de pequeno calibre: � Com sinais vermelhos; � Cirróticos Child B e C. PROFILAXIA SECUNDÁRIA DO SANGRAMENTOPROFILAXIA SECUNDÁRIA DO SANGRAMENTO A profilaxia secundária é aquela realizada após o primeiro episódio de hemorragia já controlada. Em um ano, sem a profilaxia, 25% dos pacientes Child A, 50% dos Child B e 75% medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina controlada. Em um ano, sem a profilaxia, 25% dos pacientes Child A, 50% dos Child B e 75% dos Child C terão um novo sangramento varicoso. Idealmente, a prevenção de novos sangramentos é feita pela combinação de: (1) terapia endoscópica ; e (2) betabloqueadores . Os melhores resultados são obtidos com a redução monitorizada do gradiente de pressão venosa hepática (DO TEMPO DE PROTROMBINA E DIMINUIÇÃO DA ATIVIDADE DE DIMINUIÇÃO DA ATIVIDADE DE PROTROMBINAPROTROMBINA Considerando que o fígado é a principal sede da síntese de fatores de coagulação, incluindo a síntese dos fatores vitamina K-dependentes (II, VII, IX e X), fica fácil entender que uma redução significativa da função hepática resulta em coagulopatia (tendência hemorrágica). HIPERGAMAGLOBULIHIPERGAMAGLOBULI NEMIANEMIA O cirrótico apresenta tendência aumentada à ocorrência do fenômeno de translocação intestinal bacteriana (bacteremia espontânea a partir do trato gastrointestinal). O menor clearance hepático de bactérias presentes no sangue portal bem como a “fuga” dessas bactérias pelos shunts portossistêmicos explicam tal fato. Assim, o braço humoral do sistema imunológico (linfócitos B) sofre um certo grau de hiperestimulação constante na cirrose hepática, o que pode resultar em hipergamaglobulinemia policlonal quando há presença de cirrose hepática avançada e hipertensão porta grave. Lembrar também que, na doença hepática alcoólica, há típico aumento da fração IgA (as células de Kupffer, responsáveis pela remoção de complexos contendo IgA, possuem sua função prejudicada); na colangite biliar primária, há aumento característico da fração IgM e, na hepatite autoimune, há elevação de IgG. SÓDIO SÉRICOSÓDIO SÉRICO medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina A hiponatremia é um marcador de péssimo prognóstico na cirrose avançada com ascite. Seu mecanismo é a incapacidade de excretar água livre, decorrente do excesso de hormônio antidiurético (ADH). Este excesso, por sua vez, é estimulado pela redução do volume circulante efetivo (secreção “não osmótica” de ADH). PANCITOPENIAPANCITOPENIA Na cirrose avançada complicada por hipertensão porta, há esplenomegalia e hiperesplenismo, com consequente redução não só do número de plaquetas circulantes (sinal mais precoce), mas também da hematimetria e da contagem de leucócitos (sinais mais tardios). A anemia do paciente cirrótico, na verdade, costuma ser multifatorial (ex.: desnutrição, sangramento digestivo crônico, supressão medular pelo álcool ou por vírus), sendo muito comum, ainda, a ocorrência de anemia de doença crônica , secundária à doença de base. Na hepatite C, a plaquetopenia pode surgir mesmo na ausência de hiperesplenismo. MARCADORES SÉRICOS DIRETOS E INDIRETOS DE FIBROSEMARCADORES SÉRICOS DIRETOS E INDIRETOS DE FIBROSE AVANÇADA/CIRROSEAVANÇADA/CIRROSE Grandes progressos têm sido feitos no sentido de criar métodos não invasivos para diagnóstico, quantificação e acompanhamento da fibrose hepática. Todavia, até o momento, nenhum desses exames suplantou a acurácia da biópsia, e não existe nenhuma recomendação oficial para o seu uso na prática clínica diária. A maioria vem sendo aplicada em centros de pesquisa. Um exemplo de marcadores sorológicos de fibrose validados é o teste ELF, que combina três deles: ( 1 ) ácido hialurônico (HA); ( 2 ) pró-colágeno III peptídeo com terminação amino (PIIINP); e (3) o inibidor tissular de metaloproteinase I (TIMP-1). A dosagem de lâmina e de uma molécula chamada “chondrex” (YKL 40) também pode vir a ter um papel importante no futuro. Alguns índices multivariados — que se propõem a avaliar indiretamente a existência de fibrose hepática — também vêm sendo estudados. O FibroIndex , por exemplo, que gera um escore a partir dos valores de AST, plaquetas e gamaglobulinas; o Hepascore , que combina idade, sexo, GGT, bilirrubina, ácido hialurônico sérico e níveis de alfa-2-macroglobulina; o índice PGA , que avalia o tempo de protrombina, a GGT e os níveis séricos de apolipoproteína A1, e demonstrou ter acurácia de 66 a 72% para detecção de cirrose no contexto da doença hepática alcoólica. DIAGNÓSTICO POR EXAMES DE IMAGEMDIAGNÓSTICO POR EXAMES DE IMAGEM O papel da radiologia na avaliação da cirrose hepática inclui: ( 1 ) avaliar as alterações morfológicas da doença; (2) avaliar a vascularização hepática e extra-hepática; (3) detectar e estimar os efeitos da hipertensão porta; e (4) identificar tumores hepáticos, diferenciando o medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina estimar os efeitos da hipertensão porta; e (4) identificar tumores hepáticos, diferenciando o Carcinoma Hepatocelular (CHC) de outros tipos de tumor. Tendo estes objetivos em mente, várias técnicas de imagem podem ser utilizadas: ● Ultrassonografia convencional do abdome (USG); ● Ultrassonografia do abdome com Doppler (USGD); ● Tomografia Computadorizada do abdome (TC); ● Ressonância Magnética (RM) — ; ● Angiorressonância Magnética (ARM); ● Elastografia Transitória por USG ou RM (ET); ● Arteriografia com ou sem lipiodol (AG). Nas fases iniciais da cirrose hepática, todos esses exames podem ser normais! Por outro lado, nas fases mais avançadas, a USG, TC e a RM costumam detectar alterações sugestivas da doença. Desse modo, podemos dizer que o papel da radiologia na avaliação do hepatopata crônico é corroborar uma forte suspeita clínica de cirrose!!! Quando a suspeita é de cirrose em fases iniciais, mesmo os métodos radiológicos mais modernos (ex.: RM) não têm resolução suficiente para detectar graus menores de fibrose. Observe as alterações mais encontradas na Figura 6 _ _ Fig. 6: RM de abdome. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina suficiente para detectar graus menores de fibrose. Observe as alterações mais encontradas na cirrose hepática bem estabelecida: ● Nodularidade da superfície hepática; ● Heterogeneidade do parênquima hepático; ● Alargamento da porta hepatis e da fissura interlobar; ● Redução volumétrica do lobo hepático direito e do segmento médio do lobo hepático esquerdo; ● Aumento volumétrico do lobo caudado e do segmento lateral do lobo hepático esquerdo; ● Identificação de nódulos regenerativos. Neste caso, a RM constitui método superior aos demais. Além disso, o carcinoma hepatocelular pode ser identificado pelos exames de imagem, algumas vezes de maneira tão precoce que permita sua ressecção curativa ou transplante hepático. Nesse sentido, a USG (e com menor frequência, a TC) é utilizada no rastreamento semestral de CHC em pacientes sabidamente cirróticos, juntamente com a dosagem sérica da alfafetoproteína . Em caso de dúvida diagnóstica, a AG com lipiodol pode ser empregada, dada sua alta especificidade para o diagnóstico de CHC! Este último método torna-se particularmente útil na presença de um nódulo parenquimatoso com características intermediárias entre CHC e nódulo regenerativo. A AG, a USG com Doppler e a ARM também podem ser usadas para o estudo do sistema porta e identificação de possíveis shunts portossistêmicos secundários à hipertensão porta. Com relação à elastografia, o FibroScan ® é um dos exames mais utilizados e o que consegue quantificar a fibrose medindo a velocidade da onda que o tecido reproduz, sendo essa diretamente relacionada à rigidez hepática. Chega a ter 94% de sensibilidade e 89% de especificidade na determinação de fibrose hepática significativa. BIÓPSIA HEPÁTICABIÓPSIA HEPÁTICA Como vimos no início do capítulo, o padrão-ouro para o diagnóstico de cirrose hepática é a histopatologia, com base no achado de espessos e completos septos fibrosos porta-centro e porta-porta, os quais delimitam nódulos, resultando em uma completa desorganização da arquitetura lobular e vascular . Quando os dados clínicos, laboratoriais e radiológicos são extremamente medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Quando os dados clínicos, laboratoriais e radiológicos são extremamente sugestivos de cirrose avançada (ex.: ascite, esplenomegalia, hipoalbuminemia, INR alargado, fígado atrofiado, heterogêneo e nodular), a biópsia geralmente é desnecessária (e até arriscada). A biópsia hepática, além de confirmar o diagnóstico de cirrose, também pode fornecer pistas quanto a sua etiologia (ex.: através de métodos imuno-histoquímicos). Vale lembrar que a biópsia hepática percutânea não deve ser realizada em pacientes com atividadejá na admissão, idealmente antes mesmo da endoscopia digestiva. Seu uso mostrou diminuição na mortalidade, baseado principalmente na diminuição da incidência de infecções (como, por exemplo, a peritonite bacteriana espontânea). Estudos mostraram também uma redução na taxa de ressangramento pelas varizes. Tradicionalmente, o antibiótico de escolha tem sido o norfloxacino, na dose de 400 mg 12/12h, por sete dias. Casos graves em que o paciente esteja impossibilitado de utilizar a via oral podem ser manejados com ceftriaxona IV ou IM (1 g 1x/dia), trocando-se posteriormente para norfloxacino oral até completar sete dias. Em locais onde a prevalência de resistência dos Gram-negativos às quinolonas está aumentando, o esquema com ceftriaxona 1 g/dia vem sendo considerado preferencial a o tradicional norfloxacino como profilaxia da PBE em cirróticos com hemorragia digestiva alta. PROFILAXIA DA ENCEFALOPATIA HEPÁTICAPROFILAXIA DA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA Embora não haja recomendação formal para serem iniciadas de rotina, a lactulose e a rifaximina poderiam ser usadas como profilaxia para a encefalopatia hepática após episódio de sangramento digestivo, segundo os benefícios apresentados por alguns estudos. ASCITEASCITE DEFINIÇÃODEFINIÇÃO Aqui há o video de apostila 13.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. Ascite quer dizer derrame líquido na cavidade peritoneal e não representa uma doença, mas uma manifestação comum a várias doenças. Não devemos esquecer, entretanto, que (1) existe um transudato fisiológico (até 100 ml), responsável pela lubrificação das membranas peritoneais; e (2) os derrames de sangue ou pus na cavidade peritoneal não representam ascite, mas, respectivamente, hemoperitônio e pioperitônio. A hipertensão portal relacionada à cirrose hepática é a principal causa de ascite no Brasil e no mundo. O EXAME FÍSICOO EXAME FÍSICO Quando a ascite é volumosa, o abdome apresenta-se globoso, tanto com o paciente em pé quanto deitado. A cicatriz umbilical pode se aplanar ou até everter (ao contrário da gravidez e do meteorismo, em que isso em geral não ocorre). Se a ascite for devido à hipertensão porta (ver adiante), é comum a presença de circulação colateral evidente no abdome ("cabeça de medusa"). medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina medusa"). Quando a ascite não é muito volumosa e o tônus da musculatura abdominal está reduzido: ● No paciente em pé, o abdome pode "cair" sobre o púbis, configurando a forma "em avental"; ● No paciente deitado, o abdome se alarga para os flancos, configurando a forma de "batráquio". Sinal do Piparote (Morgani): o sinal do Piparote deve ser pesquisado no paciente em decúbito dorsal — o médico dá um "peteleco" em um dos flancos do paciente e tenta sentir a propagação da força no outro flanco. Para evitar a propagação de uma onda superficial da parede abdominal que confundiria o diagnóstico, o médico deve colocar a borda cubital da mão na região mediana ou pedir para que o próprio paciente o ajude ( ). Cumpre ressaltar que este sinal só é positivo quando a ascite é muito grande, geralmente superior a cinco litros, e ainda pode ser negativo se houver tensão da parede abdominal. Macicez móvel de decúbito: é o melhor método semiológico para detecção de ascite; baseia-se na análise diferencial dos sons da percussão abdominal, quando o paciente se posiciona em várias angulações de decúbito lateral. Mas como é a técnica? Inicialmente se faz a percussão do paciente em decúbito dorsal, marcando o local do flanco em que o som fica maciço. Pede-se então que o paciente adote uma angulação de decúbito lateral. Percute-se no local marcado e, se este estiver timpânico agora, configura-se a macicez móvel de decúbito. Geralmente detecta ascite a partir de 1,5 litros. Alguns autores mais clássicos chegam a dizer que poderíamos lançar mão de manobras “mais sensíveis”, como o toque retal e pesquisa do sinal da “poça”, quando faríamos a percussão da barriga com o paciente apoiado sobre quatro apoios. Certamente, não é preciso explicar por que tais manobras se tornaram obsoletas... Figura 11 _ _ Fig. 11: O sinal do Piparote — útil somente para as grandes ascites, superiores a cinco litros. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina É importante chamar a atenção para o fato de que o líquido peritoneal, principalmente nos processos inflamatórios ou neoplásicos do abdome, pode estar contido em cavidades septadas, dificultando a interpretação dos métodos propedêuticos utilizados. Nesse caso, a pesquisa dos semicírculos de Skoda constitui um método útil para diferenciar líquido livre na cavidade de líquido septado. Com o paciente em decúbito dorsal, percute-se todo o abdome a partir de linhas convergentes para o mesmo ponto, de modo a delimitar os limites entre o timpanismo e a macicez. Se a concavidade for voltada para cima, estaremos diante de um líquido livre. No caso contrário, trata-se de um derrame septado, cisto anexial, bexigoma ou aumento uterino. Tab. 6: Classificação da ascite. *PGV: Paracentese de Grande Volume. EXAMES COMPLEMENTARESEXAMES COMPLEMENTARES RADIOGRAFIARADIOGRAFIA As radiografias têm pouco valor para o diagnóstico de ascite. Descreveremos a seguir apenas algumas considerações a título de curiosidade (se preferir, passe direto para o próximo exame: USG). A presença de líquido livre na cavidade peritoneal pode ser demonstrada na região da pequena bacia, nos flancos e na parte média do abdome, entre as alças. Na região da pequena bacia, o líquido livre se localiza nos espaços pararretais, vesicorretal, pélvico e extensão inferior das goteiras paracólicas. Quando o derrame peritoneal, mesmo que pequeno, se insinua nos espaços pélvicos-laterais, obtém-se a configuração em "orelha de cachorro". Nos flancos, o líquido ocupa os espaços entre as alças intestinais, alargando-os. O aspecto que se forma é o de um "pente". Outro sinal é a obliteração do ângulo hepático (segmento inferior da borda lateral direita do fígado). A interposição de líquido entre o fígado e o gradil costal separa estas duas _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina direita do fígado). A interposição de líquido entre o fígado e o gradil costal separa estas duas estruturas — tal fenômeno pode ser mais percebido nas radiografias oblíquas. A borda hepática identificada num RX oblíquo posterior direito, com baixa quilovoltagem, permite diagnosticar o afastamento do fígado do gradil costal, e é considerado por alguns patognomônico de ascite. Grandes quantidades de líquido podem dar aspecto homogêneo ao abdome, fazendo desaparecer os contornos dos órgãos abdominais. Em quantidades ainda maiores, há separação do fundo gástrico e cólon transverso do diafragma. ULTRASSONOGRAFIA (USG)ULTRASSONOGRAFIA (USG) A USG é o método de escolha para se detectar pequenas coleções líquidas no abdome , que aparecem como imagens anecoicas (livres de ecos). A USG também diz se o derrame peritoneal está encistado ou faz parte de massas complexas, isto é, ao mesmo tempo sólidas e líquidas (hematomas, abscessos e tumores necrosados). A USG pode ainda frequentemente diagnosticar a causa da ascite, demonstrando alterações compatíveis com cirrose, uma massa abdominal ou pélvica, metástases, cistos pancreáticos etc. Por fim, este exame também é importante na realização de punções diagnósticas ou terapêuticas de coleções abdominais. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA (TC)TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA (TC) A TC permite o diagnóstico de ascite com segurança e também diferencia as coleções líquidas livres das massas sólidas ou císticas, uma vez que o líquido ascítico apresenta menor densidade radiológica que as estruturas sólidas adjacentes. As ascites de pequeno volume podem ser detectadas pela tomografia axial computadorizada, na região da ponta do fígado, e na goteira paracólica esquerda e na pelve. Como é um método caro, a TC não costuma ser usada no diagnóstico de ascite — entretanto, é frequentemente utilizada para o seu diagnóstico etiológico. PARACENTESEPARACENTESEA paracentese abdominal tem as seguintes finalidades principais: ● Obtenção de material para análise (diagnóstico etiológico da ascite); ● Aliviar o doente dos sintomas compressivos. A paracentese diagnóstica é exame obrigatório no paciente com ascite! É a melhor maneira de se começar a investigação etiológica. Em pacientes cirróticos com ascite, uma paracentese sempre deve ser realizada numa internação hospitalar (por qualquer motivo) para procurar o diagnóstico da importante síndrome da peritonite bacteriana espontânea, eventualmente diagnosticada em cirróticos ascíticos assintomáticos. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina diagnosticada em cirróticos ascíticos assintomáticos. A paracentese deve ser realizada com o paciente em decúbito dorsal, após anestesia local, com assepsia cuidadosa da área a ser puncionada. Para determinar o ponto de punção, devemos traçar uma linha imaginária do umbigo à espinha ilíaca anterossuperior esquerda e dividi-la em três partes. Na junção entre o terço médio e o terço inferior, procede-se à inserção da agulha para realização da paracentese. Mas por que deve ser feita do lado esquerdo? Por um motivo simples: o ceco (localizado à direita) é mais fixo em sua posição do que as alças contralaterais, aumentando o risco de perfuração do lado direito. As complicações da paracentese abdominal são muito raras e incluem perfuração intestinal e hemorragia. A perfuração pode ser evitada se a paracentese for realizada apenas naqueles que sabidamente tenham ascite e não tenham obstrução intestinal ou acentuada distensão de alças — também não deve ser realizada próximo a cicatrizes cirúrgicas, devido à possibilidade de, nesses locais, existirem alças aderidas à parede abdominal. Embora aumente o risco de hemorragia, o distúrbio da coagulação (comum em hepatopatas) não contraindica o procedimento, pois o risco continua sendo pequeno, contanto que se utilize a técnica corretamente... Obs.: após a punção, pode ocorrer saída constante de líquido (principalmente se a ascite for grande), o que pode ser evitado realizando-se a técnica em "Z" (desloca-se a pele para o lado e realiza-se a punção, perfurando a pele e o peritônio em locais diferentes). Após a punção, deve-se aplicar um curativo compressivo. BIÓPSIA PERITONEALBIÓPSIA PERITONEAL Este procedimento é utilizado para o diagnóstico de casos selecionados de ascite. Idealmente, deve ser feito por via laparoscópica , reduzindo riscos e orientando o melhor local para a biópsia. A inspeção do peritônio pode fornecer pistas importantes para o diagnóstico! EXAME DO LÍQUIDO ASCÍTICOEXAME DO LÍQUIDO ASCÍTICO Fundamental para a elucidação diagnóstica da ascite, o exame do líquido colhido na primeira paracentese deve incluir: ( 1 ) aspecto macroscópico; ( 2 ) exames bioquímicos como LDH, proteínas, glicose, amilase, lipídios, marcadores tumorais e outros; (3) citologia convencional e oncótica; (4) bacterioscopia (Gram/Ziehl-Nielsen); e (5) cultura (bactérias/fungos/BK). MACROSCOPIAMACROSCOPIA Quanto ao aspecto macroscópico, o líquido ascítico pode ser: medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Seroso: mais comum — o líquido é claro e transparente ou amarelo-citrino e decorre de várias causas. É o aspecto clássico da cirrose não complicada; ● Hemorrágico: aspecto serossanguinolento, róseo ou de cor sanguínea mais viva — pode ser observado nas neoplasias e, mais raramente, na peritonite tuberculosa. É importante não se confundir com hemoperitôneo. Mas como diferenciar a ascite hemorrágica de um acidente de punção? Pode ser feito associando-se duas informações: ( 1 ) normalmente, no acidente de punção, o líquido ascítico vai clareando durante a drenagem; e (2) o sangue presente na ascite hemorrágica não coagula, ao contrário do sangue do acidente de punção; ● Turvo: sugestivo de infecção. Pode haver odor fétido; ● Lactescente: constituído por líquido branco-amarelado, de aparência leitosa, distinguindo-se em duas variedades: (1) quiloso — caracterizado pela presença de linfa, resulta da obstrução ou ruptura do canal torácico ou de vasos linfáticos quilíferos. As causas mais frequentes são as neoplasias e os traumatismos; e ( 2 ) quiliforme — caracterizado pela presença de células endoteliais e leucócitos em estados de degeneração gordurosa (tumores do peritônio) ou de lipídios em abundância (nefrose lipídica). Eventualmente (0,5% dos casos), os pacientes cirróticos podem se apresentar com ascite quilosa; ● Bilioso: de coloração esverdeada, observado nos traumatismos das vias biliares (inclusive cirúrgicos); ● Gelatinoso: amarelado e espesso, de viscosidade semelhante à da gelatina — observado nos tumores mucinosos e no pseudomyxoma peritonei. BIOQUÍMICABIOQUÍMICA A análise bioquímica do líquido ascítico é de extrema importância para a abordagem inicial de qualquer forma de ascite. Atualmente o exame de maior destaque, por ser um "divisor de águas" para o início das investigações, envolve a dosagem de albumina (no líquido ascítico e ao mesmo tempo no plasma): é o gradiente de albumina soroascite . Detalharemos este exame mais adiante. Outros parâmetros bioquímicos que podem ser bastante úteis em situações específicas são a proteína total, a glicose e o L DH (para diferenciar a peritonite bacteriana espontânea da peritonite secundária), os triglicerídeos (bastante aumentados nas ascites quilosas), as bilirrubinas (presentes nas ascites biliares), os níveis de ureia (elevados na ascite urinária) e a amilase (presente na ascite pancreática). medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina CITOMETRIACITOMETRIA A citometria também é um importante exame no diagnóstico etiológico das ascites — veja: ● O encontro de um grande número de hemácias orienta para o diagnóstico de neoplasia e, em menor grau, para o de tuberculose. Outras causas possíveis são patologia pancreática e trombose mesentérica; ● A contagem de leucócitos elevada sugere fortemente a presença de um processo inflamatório do peritônio — a predominância de Polimorfonucleares (PMN) sugere infecção bacteriana aguda, enquanto a presença de mononucleares (linfócitos/monócitos) sugere tuberculose peritoneal, neoplasia e colagenoses. Tab. 7: Orientações na paracentese diagnóstica em pacientes com cirrose. O diagnóstico da peritonite bacteriana espontânea é dado pela presença de mais de 250 polimorfonucleares (neutrófilos) por mm³. A contagem é feita de forma manual, mas deve ser a mais precisa possível. Um fator de erro ocorre nos derrames hemorrágicos: o sangue tem _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina mais precisa possível. Um fator de erro ocorre nos derrames hemorrágicos: o sangue tem leucócitos e, portanto, a leucometria do líquido ascítico estará falsamente elevada. Pode-se corrigir a leucometria do líquido ascítico subtraindo-se 1 PMN para cada 250 hemácias por mm³ encontradas. CITOLOGIA ONCÓTICACITOLOGIA ONCÓTICA É o principal exame para o diagnóstico da ascite carcinomatosa (cânceres gastrointestinais, câncer de ovário), apresentando alta sensibilidade. No hepatocarcinoma, a citologia oncótica é quase sempre negativa. BACTERIOLOGIABACTERIOLOGIA Os exames bacteriológicos incluem a bacterioscopia e as culturas — deve-se saber que a bacterioscopia, seja pelo Gram, seja pelo Ziehl-Nielsen, é de valor limitado (baixa sensibilidade): são positivos em apenas 2% dos pacientes com peritonite tuberculosa e 10% dos pacientes com peritonite bacteriana espontânea. Esse percentual aumenta bastante nos casos de perfurações intestinais. As ascites fúngicas são muito raras; desta forma, não são geralmente pedidas culturas para fungos. Para confirmar o diagnóstico bacteriológico da peritonite bacteriana espontânea, o material colhido deve ser imediatamente introduzido em um frasco de hemocultura. O ideal é colocar 10 ml num frasco de 100 ml: neste caso, a sensibilidade pode chegar a 80%. ETIOLOGIA DAS ASCITESETIOLOGIA DAS ASCITES HIPERTENSÃO PORTA (HP)HIPERTENSÃO PORTA (HP) O aumento da pressãono sistema venoso porta-hepático gera sabidamente ascite. Uma pergunta que devemos responder é: de onde vem o líquido que preenche toda a cavidade abdominal? De onde surge o líquido ascítico? Você alguma vez já se fez esta pergunta? Veja, é fundamental compreender isso, pois, caso contrário, teremos que decorar (sem entender) diversas situações clínicas que envolvem este tema. É o caso, por exemplo, de algumas formas de HP (como a esquistossomose), que originam níveis pressóricos altíssimos no sistema porta sem resultar em ascite, ou então das condições que, mesmo gerando aumentos apenas discretos da pressão porta, conseguem produzir um quadro clássico de ascite grave e refratária, como acontece na síndrome de Budd-Chiari. Analise atentamente a e observe um detalhe microanatômico muito importante da circulação porta: existem "válvulas de segurança" no meio deste sistema venoso que permitem que haja um "escape" pressórico toda vez que a pressão porta se eleva muito — exatamente como em uma panela de pressão. Os sinusoides hepáticos são esta válvula . Eles são Figura 12 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina como em uma panela de pressão. Os sinusoides hepáticos são esta válvula . Eles são extremamente fenestrados, de forma que qualquer aumento de pressão porta resulta em extravasamento de líquido (linfa hepática) para a cavidade peritoneal. Conclusão: em condições de HP, o fígado literalmente "goteja" linfa para a cavidade peritoneal, formando a ascite. Nesse exato momento, vem uma dúvida: mas e se a obstrução porta estiver localizada em um ponto anterior (em relação ao sentido do fluxo sanguíneo) aos sinusoides hepáticos? Como não há aumento da pressão no interior dos sinusoides, haveria mesmo assim ascite? Pois bem, chegamos ao ponto mais importante sobre conceitos que envolvem hipertensão porta e ascite. Todo quadro de hipertensão porta deve obrigatoriamente ser classificado em: ● Pré-sinusoidal; ● Pós-sinusoidal; ● Intrassinusoidal. _ Fig. 12: Representação esquemática da gênese das ascites pós-sinusoidais. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Intrassinusoidal. As obstruções pré-sinusoidais dificilmente geram ascite porque não envolvem os sinusoides hepáticos — é o caso da esquistossomose, em que a obstrução ocorre nos espaços-porta. Como não há "válvulas de escape", estes pacientes acabam desenvolvendo um quadro clínico marcado por manifestações graves de HP, como circulação colateral, varizes de esôfago sangrantes e esplenomegalia severa, mas sem ascite. Menos comumente surge ascite naqueles que desenvolvem concomitantemente hipoalbuminemia grave ou mesmo cirrose. As obstruções pós-sinusoidais , como a síndrome de Budd-Chiari, produzem um quadro de hipertensão porta completamente diferente, marcado principalmente pela ascite — aliás, grave e de difícil controle. É menos frequente nestes pacientes encontrarmos varizes de esôfago sangrantes, esplenomegalia grave ou circulação colateral abundante. Mas veja: 85% dos casos de hipertensão porta são resultantes de cirrose hepática, que na verdade origina ambos os mecanismos patogênicos (pré e pós-sinusoidal) — assim, muitos classificam o mecanismo da cirrose como " intrassinusoidal ". Nos cirróticos, em geral, encontramos em conjunto tanto a ascite quanto todos os outros sinais clínicos de HP grave. Por ser formada por um mecanismo que envolve apenas o aumento da pressão vascular (no sistema porta), o líquido formado, ou seja, a ascite, é do tipo transudativa, pobre em proteínas . DOENÇA PERITONEALDOENÇA PERITONEAL As doenças peritoneais que resultam em ascite são as neoplasias (primárias ou mesmo metástases para o peritônio) e as infecções, mais especificamente a tuberculose peritoneal . Estas formas de ascite têm uma fisiopatogênese diferente, resultando basicamente das seguintes causas: ● Aumento da permeabilidade dos capilares do peritônio (processo inflamatório); ● Obstrução, pelas células tumorais, dos canais linfáticos que ligam a cavidade peritoneal aos plexos linfáticos subdiafragmáticos, impedindo, assim, a sua drenagem adequada; ● Tumores podem liberar substâncias angiogênicas, que também aumentam diretamente a permeabilidade peritoneal. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Em função desses mecanismos, a ascite resultante de uma doença do peritônio, seja neoplasia ou tuberculose, é classicamente do tipo exsudativa , ou seja, com elevado teor de proteínas (numa composição bem mais próxima da do plasma). ASCITE NEOPLÁSICAASCITE NEOPLÁSICA É a segunda causa mais comum de ascite . Embora, na maioria dos casos, a ascite neoplásica revele-se um líquido amarelo-citrino, não raramente se torna hemorrágica ou mesmo quilosa . A presença deste tipo de ascite (hemorrágica ou quilosa) sugere fortemente uma etiologia neoplásica, principalmente se houver suspeita clínica. As neoplasias malignas mais comumente associadas à ascite incluem o tumor de ovário, o câncer colorretal, do estômago, do pâncreas e, menos comumente, linfoma, mama, pulmão, útero, mesotelioma, próstata, colangiocarcinoma e neoplasia maligna do esôfago. O líquido ascítico possui citologia positiva em amostra única em pouco mais de 80% dos pacientes com carcinomatose, chegando, porém, a 97% quando realizadas três paracenteses de grande volume. Outras características incluem elevados níveis de proteínas, LDH e colesterol, além, é claro, do gradiente albumina S-Ada presença da micobactéria através do PCR ( Polymerase Chain Reaction — detecta o RNA do patógeno), tendo mostrado excelentes resultados em estudos pequenos. Finalmente, a laparoscopia é um exame de grande valia na tuberculose peritoneal, já que, além de poder identificar as características granulações de natureza tuberculosa (dispersas pela membrana peritoneal) e as típicas aderências entre o peritônio visceral e o parietal, também pode viabilizar a biópsia destas lesões, chegando-se a uma sensibilidade de quase 100% . FORMAS MENOS COMUNS DE ASCITEFORMAS MENOS COMUNS DE ASCITE As formas de ascite descritas a seguir, além de raras, não costumam entrar no diagnóstico diferencial das ascites clínicas, ou seja, dos pacientes que se apresentam com abdome globoso devido ao acúmulo de líquido. São formas de ascite, em sua maioria, ditas "ultrassonográficas", pois só conseguem ser percebidas por métodos de imagem. ASCITE PANCREÁTICAASCITE PANCREÁTICA A ascite é uma complicação rara da pancreatite. Ela resulta de extravasamento de um pseudocisto ou da formação de fístula com o peritônio a partir de ducto pancreático rompido. O acúmulo de fluido se dá ao longo de semanas a meses e pode ser maciço. Como as enzimas medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina O acúmulo de fluido se dá ao longo de semanas a meses e pode ser maciço. Como as enzimas não estão ativadas, não ocorre uma peritonite aguda, e a ascite pancreática costuma ser indolor (só eventualmente há uma leve irritação peritoneal). O exame do líquido ascítico é fundamental para o diagnóstico — em geral ele é um exsudato amarelo-citrino, eventualmente hemorrágico. Sua análise evidencia proteína elevada (maior do que 3 g/dl), gradiente soroascite baixo, elevação variável dos leucócitos e uma amilase maior do que 1.000 IU/L associada à amilasemia praticamente normal. As lipases também podem estar aumentadas, mas este teste tem pouco valor prático devido às dificuldades técnicas. Nem os outros exames bioquímicos nem a laparoscopia são muito úteis na ascite pancreática. A USG e a TC só são úteis se evidenciarem um cisto pancreático ou um pâncreas aumentado de volume, com ou sem calcificações. O tratamento desta condição consiste de nutrição parenteral total e uso de octreotida, visando o fechamento da fístula pancreática. ASCITE BILIARASCITE BILIAR A ascite biliar, ou coleperitônio, é uma condição pouco frequente e resulta necessariamente da lesão da vesícula ou de um de seus ductos. Tal processo pode ocorrer a partir da erosão da árvore biliar por um cálculo ou então por traumatismo, cirurgia das vias biliares, biópsia hepática e colangiografia trans-hepática percutânea. O extravasamento de bile pode se fazer de forma aguda, caracterizando a peritonite biliar (com dor), ou de forma lenta, oligossintomática, o que chamamos de "ascite biliosa". Pode haver também peritonite bacteriana secundária, que passa a dominar o quadro clínico (das complicações, esta é a mais frequente) — deve-se guardar a seguinte associação: ascite biliar = peritonite infecciosa. O líquido ascítico, como se deveria esperar, é caracteristicamente esverdeado, e a absorção da bile do derrame peritoneal eventualmente determina icterícia. A dosagem de bilirrubina é diagnóstica (os níveis de bilirrubina no líquido ascítico são maiores que 6 mg/dl), e os outros testes bioquímicos são de pouco valor. A colangiografia endoscópica retrógrada e a colangiografia trans-hepática só são utilizadas quando se pretende localizar a lesão para uma cirurgia posterior. ASCITE QUILOSAASCITE QUILOSA A ascite quilosa (quiloperitônio) apresenta aspecto leitoso, possui triglicerídeos elevados (> 200 mg/dl e comumente acima de 1.000 mg/dl!) e é mais comumente associada à malignidade, particularmente linfoma. Outras causas incluem tuberculose, injúria aos linfáticos do peritônio por irradiação e ascite pancreática (que, às vezes, pode ser quilosa). No paciente com aids, o sarcoma de Kaposi e a infecção pelo Mycobacterium avium-intracellulare são as principais medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina causas. O tratamento consiste na correção da desordem subjacente, emprego de triglicerídeos de cadeia média na dieta (os quais, após absorção intestinal, são transferidos diretamente para o sangue venoso porta, sem passar pela linfa) e repouso intestinal com NPT. A terapia diurética geralmente é ineficaz, pois a hipertensão porta dificilmente se encontra presente. ASCITE NEFROGÊNICAASCITE NEFROGÊNICA Destaca-se a síndrome nefrótica , uma síndrome edemigênica na qual tanto a hipoalbuminemia quanto a retenção hidrossalina renal contribuem para a anasarca. Ao contrário do que muitos pensam, a ascite nefrótica tem um gradiente de albumina soroascite baixo (costuma dominar o quadro na pericardite constritiva , na cardiomiopatia restritiva e na insuficiência tricúspide grave. A ascite cardiogênica é classicamente transudativa, inclusive com gradiente de albumina soroascite elevado, com proteína total também aumentada. ABORDAGEM DIAGNÓSTICAABORDAGEM DIAGNÓSTICA De agora em diante, toda vez que você se deparar com um paciente com um quadro ascite (clínica) a esclarecer, antes de mais nada, faça para si mesmo a seguinte pergunta: será que é hipertensão porta ou será que é alguma doença do peritônio? Confirme se a ascite não faz parte de um quadro de anasarca; as outras possibilidades são mais remotas... Mas como esclarecer objetivamente essa dúvida? É simples: se for doença do peritônio, o líquido ascítico será exsudativo ; e se for hipertensão porta, será transudativo — é só realizar a paracentese e uma análise bioquímica simples. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina O parâmetro principal e atualmente recomendado para diferenciação é o "Gradiente de Albumina Soroascite (GASA)" . Veja, é um gradiente (subtração) e não uma relação (divisão). É feito da seguinte forma: pegamos a concentração plasmática de albumina e subtraímos o valor da sua concentração no líquido ascítico. Exemplo: albumina sérica: 4 g/dl; albumina na ascite: 2 g/dl. Logo, gradiente = (4 - 2) = 2. É simples assim. Devemos só ter o cuidado de colher o soro logo antes ou logo após a paracentese. Se o valor do gradiente de albumina soroascite for inferior a 1,1 g/dl, o líquido ascítico é classificado como exsudato, e um valor maior ou igual a 1,1 g/dl o classifica como transudato. A ideia é: quanto maior a concentração de albumina na ascite, menor será o resultado da subtração, ou seja, menor o gradiente. Tecnicamente, quanto mais proteína passar do plasma para a ascite, menor o gradiente. Assim, os exsudatos são caracterizados por um gradiente baixo. Como os transudatos se caracterizam por uma concentração pequena de proteínas (albumina) na ascite, o valor da subtração será alto. RESUMINDO... Memorize para sempre!!! Aqui há o video de apostila 14.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. ● Gradiente menor que 1,1 g/dl = exsudato = doença peritoneal . ● Gradiente maior que 1,1 g/dl = transudato = hipertensão porta . De forma objetiva, se o gradiente de albumina soroascite for menor que 1,1 g/dl, devemos direcionar a investigação diagnóstica da ascite para a existência de câncer ou tuberculose peritoneal. Se o gradiente de albumina soroascite for maior ou igual a 1,1 g/dl, estamos diante de uma das causas de hipertensão porta (com 85% de chance para o diagnóstico de cirrose hepática). Outro dado que pode ser útil é a dosagem da proteína total do líquido ascítico. Sabemos que o gradiente soroascite de albumina reflete, em linhas gerais, a pressão hidrostática dos sinusoides hepáticos (gradiente alto indica hipertensão porta). Por outro lado, os níveis de proteína total no líquido ascítico são indicativos da integridade sinusoidal propriamente dita. Sinusoides "capilarizados" (como ocorre na cirrose) são menos permeáveis às proteínas, e por isso o líquido ascítico na cirrose hepática tipicamente possui baixos níveis de proteína total. Devido à fibrose do espaço de Disse, apenas líquido e uma pequena quantidade de proteínas de baixo peso molecular (albumina) passam para a cavidade peritoneal. No caso da síndrome nefrótica, a origem de uma proteína baixa é ainda mais simples. Como há pouca proteína no medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina plasma (houve perda urinária), haverá ainda menos proteína nos líquidos transudados. Já em etiologias de ascite em que a barreira sinusoidal encontra-se íntegra e permeável (ex.: ICC), os níveis de proteína total no líquido ascítico tendem a estar altos, mesmo que exista hipertensão porta. Apesar de manter um GASA alto, proporcionalmente há mais proteínas de peso molecular maior, o que justifica valores de proteína total entre 2,5–3,0 mg/dl. Observe a seguir o fluxograma diagnóstico das ascites. MANEJO DAS ASCITESMANEJO DAS ASCITES Aqui há o video de apostila 15.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. O tratamento da ascite exsudativa, originada, portanto, por uma doença peritoneal, depende exclusivamente do tratamento da doença de base, seja tuberculose, seja neoplasia. Tratada (se _ Fluxograma . 2: Diagnóstico simplificado das ascites. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina exclusivamente do tratamento da doença de base, seja tuberculose, seja neoplasia. Tratada (se possível) a doença de base, a ascite reverte. Todas as considerações terapêuticas a respeito deste tema terão como foco a única forma de ascite que necessita de um manejo específico: as originadas por hipertensão porta, em especial na cirrose hepática. Existem diferentes formas de tratar a ascite. As questões relevantes à terapia dizem respeito, em primeiro plano, à reversibilidade ou não da doença hepática subjacente (geralmente, não existe...) e, em segundo, se existe ou não colaboração e aderência ao tratamento por parte do paciente. A qualidade de vida e as expectativas quanto à sobrevida também influenciam o tratamento. TRATAMENTO DA DOENÇA HEPÁTICA DE BASETRATAMENTO DA DOENÇA HEPÁTICA DE BASE Em determinadas doenças, existe uma pequena regressão histológica da lesão hepática que favorece a terapia da ascite. Como exemplos, poderíamos citar o tratamento antiviral nas hepatites crônicas B e C, a terapia da doença de Wilson e da hepatite autoimune e a cessação do consumo de álcool na cirrose alcoólica. REPOUSO, RESTRIÇÃO DE SAL E DE ÁGUAREPOUSO, RESTRIÇÃO DE SAL E DE ÁGUA O repouso facilita a mobilização de fluidos no paciente com ascite, por melhorar o fluxo renal (deslocado do fluxo muscular). A função renal e a resposta aos diuréticos pioram na posição ortostática devido a um aumento dos hormônios retentores hidrossalinos. Uma restrição de sódio é aconselhável (2 g de sódio ao dia = equivalente a 4 g de sal (NaCl) ou duas colheres de chá rasas). A restrição salina é mandatória para se induzir um balanço negativo de sódio (sódio urinário maior que sódio ingerido) e é a única maneira de se controlar a ascite na terapia conservadora. Pacientes que excretam mais de 80 mEq/dia de Na na urina podem controlar a ascite apenas com restrição de sal na dieta... Somente na presença de hiponatremia importante (Nacuidado com a hipercalemia, pois este diurético é poupador de potássio... A ginecomastia dolorosa é indicação de suspensão da droga; a amilorida e o triantereno, através do fechamento dos canais de sódio sensíveis à aldosterona, são alternativas nestes casos. A eplerenona, outro antagonista da aldosterona altamente específico com menos efeitos colaterais, é uma droga já estudada nos pacientes com ICC, porém ainda não avaliada nos pacientes cirróticos. A furosemida deve ser acrescentada ao esquema terapêutico em indivíduos não responsivos às doses iniciais de espironolactona. Nestes pacientes, geralmente, observamos uma maior absorção de sódio nas porções proximais do néfron (geralmente alça de Henle), daí a utilidade do diurético de alça, em combinação com a espironolactona. A dose varia de 40–160 mg/dia. Geralmente se utiliza o esquema combinado de furosemida + espironolactona, mantendo-se a relação espironolactona 100 mg/furosemida 40 mg, com aumento a cada 3–5 dias (ex.: 200 mg/80 mg, 300 mg/120 mg). TERAPIA DA ASCITE REFRATÁRIATERAPIA DA ASCITE REFRATÁRIA Consideramos uma ascite como refratária quando observamos intolerância ou resistência à associação diurética com 160 mg de furosemida e 400 mg de espironolactona, ou quando se apresenta ascite recorrente (pelo menos 3x/ano). Ela é observada em 10% dos pacientes cirróticos ascíticos. Nestes casos, um período de observação de pelo menos 12 semanas é recomendado antes de rotularmos o paciente como "não responsivo". A ascite refratária deve ser diferenciada da má adesão terapêutica, especialmente à dieta de restrição salina. Neste caso, é só dosar o sódio na urina de 24h. Se este estiver acima de 80 mEq/dia, e o paciente não estiver perdendo peso, certamente se trata de má adesão! Mas por quê? Porque, na dieta restritiva de sódio, o paciente ingere em torno de 88 mEq/dia, sendo que 10 mEq ele perde por via não urinária (suor, fezes...). Logo, se a urina contém mais de 80 mEq/dia, deveria haver um balanço negativo de sódio, com diminuição obrigatória do líquido ascítico... Na ascite refratária, o sódio urinário é caracteristicamente inferior a 80 mEq/dia! Até pouco tempo, havia indícios de que betabloqueadores poderiam ser deletérios para pacientes com ascite refratária, o que acabou não se confirmando. Assim, não são medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina pacientes com ascite refratária, o que acabou não se confirmando. Assim, não são medicamentos contraindicados, mas se recomenda cautela na sua utilização. PARACENTESE DE GRANDE VOLUMEPARACENTESE DE GRANDE VOLUME A paracentese de grande volume, cerca de 5–15 litros, pode ser realizada de maneira eficaz e segura, sendo apenas necessária uma infusão de coloides para a manutenção do volume intravascular. Além de ser uma opção terapêutica para a ascite refratária, a paracentese de grande volume pode ser realizada como medida inicial na ascite tensa (seguida do uso do diurético + restrição salina), visando uma estabilização mais rápida do quadro clínico e da resposta à terapia conservadora. Para a ascite verdadeiramente refratária, recomenda-se a retirada de 5–9 litros a cada duas semanas. No intuito de evitar a instabilidade hemodinâmica e renal associada à paracentese, é necessária a infusão de coloides em paracenteses superiores a cinco litros. Recomenda-se a infusão de 6–8 g de albumina para cada litro retirado, quando a paracentese é superior a cinco litros (ex.: se retirarmos seis litros de líquido ascítico, a dose de albumina a ser reposta é 6 x 6 = 36 g). Estudos recentes trouxeram resultados conflitantes na tentativa de provar a real eficácia desta reposição. Mesmo assim, ela tem sido feita de rotina. TIPS ( TIPS ( TRANSJUGULAR INTRAHEPATIC PORTOSYSTEMICTRANSJUGULAR INTRAHEPATIC PORTOSYSTEMIC SHUNT SHUNT )) Você já estudou o TIPS no tópico de hipertensão porta. Saiba que este dispositivo possui um excelente efeito no tratamento da ascite refratária, com resultados superiores à paracentese de repetição, porém sem melhora importante na sobrevida. O inconveniente do TIPS é a encefalopatia hepática que se instala em 30% dos casos, mais comum em pacientes Child C, além das complicações inerentes ao procedimento. Lembre-se de que o TIPS é uma derivação portossistêmica não seletiva... Atualmente, indica-se o TIPS (se disponível) nos pacientes cirróticos com ascite refratária Child A ou B e na ausência de história prévia de encefalopatia hepática espontânea. É também uma ótima escolha nos pacientes Child C que estão aguardando o transplante e tiveram hemorragia por varizes esofagogástricas apesar da terapia endoscópica e do uso de betabloqueadores. SHUNT SHUNT PERITÔNIO-VENOSO PERITÔNIO-VENOSO (SPV)(SPV) É também chamado shunt de Le Veen . Neste procedimento, um cateter é utilizado para drenar o líquido ascítico para a veia jugular interna direita. Ele possui trajeto no subcutâneo, sendo visível a olho nu, como mostra a . Este procedimento foi praticamente substituídoFigura 13 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina pelo TIPS, pela sua menor eficácia e pelo maior risco de complicações (coagulação intravascular disseminada, infecção, oclusão do shunt , obstrução intestinal e sangramento varicoso, este último pela expansão volêmica). A existência de lesões da mucosa gastroduodenal não tratadas, a presença de um episódio prévio de peritonite bacteriana espontânea e a doença renal crônica avançada constituem contraindicações. _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina É recomendado, atualmente, para pacientes não candidatos ao transplante ou ao TIPS, com abdome inadequado para paracenteses de repetição (ex.: múltiplas cicatrizes cirúrgicas). CIRURGIA DE DERIVAÇÃO PORTOSSISTÊMICACIRURGIA DE DERIVAÇÃO PORTOSSISTÊMICA As derivações portossistêmicas não seletivas ou parciais são eficazes no tratamento da ascite refratária, embora possam causar encefalopatia hepática e piora da função hepática. Tem-se dado preferência ao TIPS ou às paracenteses de repetição, pela mortalidade relativamente elevada dessas cirurgias em pacientes com ascite refratária. TRANSPLANTE HEPÁTICOTRANSPLANTE HEPÁTICO É a terapia definitiva, indicada nos pacientes com reserva hepática mais comprometida. Este tema é abordado em apêndice desta apostila. PERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEAPERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEA Aqui há o video de apostila 16.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. Embora qualquer paciente com ascite, independentemente de sua origem, esteja sob risco de desenvolver uma complicação chamada Peritonite Bacteriana Primária ou Espontânea (PBE), este risco é sabidamente muito mais alto naqueles com ascite associada à cirrose hepática. Conceitualmente, a PBE é a infecção da ascite que surge na ausência de uma fonte contígua de contaminação, tal como abscessos intra-abdominais ou perfuração de víscera oca. Em sua fisiopatogênese, está envolvida a translocação bacteriana a partir do tubo digestivo e a deficiência de opsoninas (proteínas do complemento) no líquido ascítico (comum em cirróticos). Mas como ocorre a translocação? A bactéria migra do lúmen intestinal para os linfonodos mesentéricos, ocorrendo então bacteremia, com posterior deposição do patógeno no líquido ascítico; auxiliado pela defesa precária do organismo na ascite, inicia a replicação, provocando uma PBE. A proteína total do líquido ascítico encontra-se caracteristicamente baixa na PBE, inferior a 1 g/dl. Outros mecanismos que podem estar envolvidos na gênese da PBE são um supercrescimento bacteriano intestinal, frequentemente encontrado em cirróticos e u m a disfunção do sistema fagocítico reticuloendotelial, permitindo uma bacteremia mais Fig. 13: Shunt peritônio-venoso — observar o cateter utilizado para drenar o líquido ascítico para o sistema venoso. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina u m a disfunção do sistema fagocítico reticuloendotelial, permitindo uma bacteremia mais prolongada. A síndrome nefrótica é uma outra causa de ascite relacionada à PBE...Caracteristicamente, a PBE é monobacteriana, sendo que a maioria dos casos de PBE (70%) é causada por Gram-negativos entéricos, com destaque para a Escherichia coli seguida da Klebsiella pneumoniae , que chegam ao peritônio a partir de disseminação linfo-hematogênica após translocação bacteriana intestinal. Os Gram-positivos, como o Streptococcus pneumoniae (pneumococo), também podem causar PBE, sendo geralmente provenientes de um foco à distância. QUADRO DE CONCEITOS VI Atenção, não se confunda! A Escherichia coli é o principal patógeno da PBE na cirrose hepática, enquanto o pneumococo é o agente mais comum da PBE na ascite nefrótica. A presença de infecção polimicrobiana (Gram-negativos entéricos, Enterococcus faecalis e anaeróbios) e a ausência de resposta clínica à antibioticoterapia padrão devem levantar suspeitas quanto à possibilidade de peritonite bacteriana secundária, devido a abscesso intra- abdominal ou perfuração de víscera oca. Dos casos de peritonite bacteriana nos cirróticos com ascite, 90% são PBE e 10% peritonite secundária... Quando da sua descrição, a mortalidade da PBE era de aproximadamente 90%. Atualmente, com o diagnóstico precoce e a facilidade de antibioticoterapia adequada, esta taxa foi reduzida para cerca de 20%. Entretanto, a recorrência de PBE nos sobreviventes do primeiro episódio é de 70% em um ano. QUADRO CLÍNICOQUADRO CLÍNICO Os sinais e sintomas mais comuns de apresentação da PBE são (percentual de ocorrência entre parênteses): febre em torno de 38ºC (70%), dor abdominal difusa (60%), alteração do estado mental por encefalopatia hepática (55%), dor à palpação abdominal (50%) e outros (diarreia, íleo paralítico, hipotensão arterial). Pela presença da ascite, os sinais de peritonite são praticamente inexistentes. Em até 1/3 dos casos, porém, o paciente está com ascite assintomática, e o diagnóstico da PBE é feito apenas pelo exame do líquido ascítico. DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO Mas como deve ser feito o diagnóstico desta complicação? É simples e arbitrário: o diagnóstico de PBE é definido pela contagem de polimorfonucleares (PMN) no líquido ascítico ≥ 250/mm³ , com cultura positiva monobacteriana. Como a cultura demora 48h para revelar o resultado, e medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina com cultura positiva monobacteriana. Como a cultura demora 48h para revelar o resultado, e o tratamento não pode esperar, o diagnóstico já pode ser considerado apenas pelo critério dos leucócitos! Se o resultado da cultura for negativo, estamos diante de uma entidade chamada ascite neutrofílica , que geralmente é tratada como PBE. 35% desses pacientes se tornaram cultura positiva durante acompanhamento em estudos. Não se esqueça de um detalhe: se houver hemácias na amostra, a cada 250 hemácias, deve-se subtrair um leucócito do total. Para o diagnóstico de PBE, precisamos da presença de mais de 250 polimorfo ‐ nucleares e não de mais de 250 leucócitos!!! Esta é uma armadilha frequente nas provas de residência!!! Uma variante da PBE, chamada bacterascite , é definida pela cultura positiva monobacteriana na ausência do critério leucocitário. A bacterascite é uma fase muito precoce na patogênese da PBE (representando a "chegada" da bactéria ao líquido ascítico) e, em 60% dos casos, resolve espontaneamente, sem evoluir para a peritonite espontânea. A recomendação atual é que os pacientes com bacterascite sintomáticos (febre, dor abdominal etc.) sejam tratados, enquanto os assintomáticos devem ser apenas observados. O diagnóstico diferencial mais importante da PBE é a Peritonite Bacteriana Secundária (PBS). Mesmo na presença de uma peritonite fecal, por exemplo, a ascite oculta os sinais de irritação peritoneal. Se não for feito o tratamento cirúrgico, praticamente 100% dos pacientes cirróticos ascíticos com PBS irão falecer! Enquanto isso, uma cirurgia abdominal traz uma mortalidade de até 80% na PBE... Conclusão: não podemos confundir essas duas entidades!!! O diagnóstico diferencial é feito pela dosagem de proteína total , glicose e L DH do líquido ascítico. Dois ou mais dos seguintes critérios indicam peritonite secundária e, portanto, provável laparotomia: ● Proteína total > 1,0 g/dl. ● Glicose 5 ng/ml) e fosfatase alcalina (> 240 U/L) no líquido ascítico. A medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina dosagem aumentada de CEA (> 5 ng/ml) e fosfatase alcalina (> 240 U/L) no líquido ascítico. A não melhora clínica do paciente associada a uma piora na contagem dos polimorfonucleares são as grandes dicas para a forma não perfurada. A peritonite bacteriana secundária também é caracterizada por uma infecção polimicrobiana e identificação de numerosas bactérias na bacterioscopia do líquido ascítico; o achado de número muito elevado de polimorfonucleares (usualmente milhares) também sugere a origem secundária da peritonite. Os casos suspeitos de peritonite secundária devem ser submetidos a exames de imagens, como tomografia computadorizada de abdome. Pneumoperitônio ou extravasamento do contraste selam o diagnóstico, indicando pronta laparotomia. PROGNÓSTICO E TRATAMENTOPROGNÓSTICO E TRATAMENTO Deve-se ressaltar que a chave para o sucesso terapêutico é o diagnóstico precoce. Dessa forma, todo paciente cirrótico admitido com ascite no hospital deve ser submetido a uma paracentese diagnóstica, independentemente da presença de sintomas sugestivos de PBE, como febre e dor abdominal. O mesmo procedimento deve ser adotado na vigência de encefalopatia hepática, insuficiência renal ou deterioração súbita da função hepática em um paciente cirrótico, considerando-se que a PBE é um dos fatores mais frequentemente associados à descompensação clínica nesses doentes. Fatores preditivos de boa evolução na PBE: ● PBE adquirida na comunidade; ● Ausência de encefalopatia; ● Ureia 2 mg/dl) e síndrome hepatorrenal; ● Albumina 8 mg/dl. No tratamento da PBE, é fundamental que a antibioticoterapia seja iniciada anteriormente ao resultado dos estudos microbiológicos do líquido ascítico. Se iniciado precocemente, reduz sobremaneira a mortalidade! A terapia de escolha é uma cefalosporina de terceira geração venosa: cefotaxima 2 g IV 12/12h. A ceftriaxona é uma alternativa. A duração é de cinco dias , quando então o paciente é reavaliado. Em pacientes com PBE adquirida na comunidade, sem encefalopatia e com função renal normal, a ofloxacina oral é uma alternativa válida. Se houver melhora sintomática dramática, a terapia está encerrada; se não, uma nova paracentese deve ser realizada. ● Se PMN 250/mm³, porém menor que a contagem da paracentese anterior: completar sete dias e realizar nova paracentese; ● Se PMN aumentar em relação à paracentese anterior: reavaliar possibilidade de peritonite secundária. Se existir qualquer suspeita de peritonite secundária (não confirmada na investigação na admissão), a paracentese deve ser repetida mais precocemente, com 48 horas do tratamento. A paracentese de acompanhamento (em 48 horas) não está indicada em todos os pacientes com PBE, sendo reservada apenas para os casos de evolução inicial insatisfatória! PROFILAXIA DA PBEPROFILAXIA DA PBE Todos os pacientes que desenvolveram PBE devem receber profilaxia secundária com norfloxacino 400 mg/dia ou sulfametoxazol + trimetoprima (800/160 mg/dia) por tempo indeterminado. Vale lembrar que, quando estes pacientes desenvolvem novo episódio de PBE duranteo uso de norfloxacino, a chance de que haja um germe Gram-positivo ou um Gram- negativo resistente às quinolonas é muito maior. A profilaxia primária aguda é indicada após qualquer hemorragia por varizes esofagogástricas em um paciente cirrótico e não há necessidade de que se tenha confirmado a presença de ascite, já que o esquema também reduz outras infecções, como as urinárias e respiratórias. Cabe lembrar que a hemorragia digestiva facilita o processo de translocação de bactérias do trato gastrointestinal, o que predispõe à ocorrência de PBE. A profilaxia é feita pela administração medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina gastrointestinal, o que predispõe à ocorrência de PBE. A profilaxia é feita pela administração de norfloxacino 400 mg 12/12h por sete dias ou ceftriaxona 1 g/dia, de preferência pela via IV, pelo mesmo período. Já a profilaxia primária crônica é geralmente utilizada em pacientes cirróticos com níveis de proteína total no líquido ascítico ≤ 1,5 g/dl e pelo menos um dos seguintes achados: (1) creatinina ≥ 1,2 mg/dl ou BUN ≥ 25 mg/dl (ureia ≥ 53,5 mg/dl) ou sódio ≤ 130 mg/dl; ou (2) Child-Pugh ≥ 9 pontos e bilirrubina total ≥ 3 mg/dl. Em pacientes com cirrose, hospitalizados por outras condições, e que tenham apenas uma proteína total no líquido ascítico ≤ 1 g/dl, pode-se utilizar norfloxacino ou sulfametoxazol + trimetoprima nas mesmas doses, até a alta do paciente. Uma vez que a sobrevida média após o primeiro episódio de PBE é de cerca de nove meses, esta infecção deve motivar a colocação do paciente em lista de espera para o transplante hepático . PROFILAXIA DA SÍNDROME HEPATORRENALPROFILAXIA DA SÍNDROME HEPATORRENAL A expansão plasmática com albumina , usada como terapia adjuvante à antibioticoterapia, faz parte do tratamento padrão da PBE, diminuindo a incidência de insuficiência renal (incluindo de síndrome hepatorrenal) e melhorando substancialmente a sobrevida dos cirróticos com PBE. A dose recomendada é de 1,5 g/kg no primeiro dia de tratamento e 1 g/kg no terceiro dia. OUTRAS COMPLICAÇÕESOUTRAS COMPLICAÇÕES ENCEFALOPATIA HEPÁTICAENCEFALOPATIA HEPÁTICA O termo “encefalopatia hepática” se refere a uma síndrome neuropsiquiátrica potencialmente reversível que pode surgir em pacientes portadores de hepatopatia crônica avançada ou mesmo na insuficiência hepática aguda. A encefalopatia é causada pela passagem de substâncias tóxicas (provenientes do intestino) para o cérebro, que, em uma pessoa normal,seriam depuradas pelo fígado. A disfunção hepatocelular grave é um elemento primordial para o desenvolvimento da síndrome, porém, na cirrose hepática avançada, outro fator também deve ser considerado: a hipertensão porta, que desvia o sangue mesentérico para a circulação sistêmica “bypassando” os sinusoides hepáticos. Por isso a sinonímia — encefalopatia portossistêmica . Uma das substâncias mais implicadas na gênese da encefalopatia hepática é a amônia (NH 3 )! As principais fontes de amônia intestinal são: (1) enterócitos — metabolismo do aminoácido glutamina; e (2) bactérias colônicas — catabolismo de proteínas alimentares e da ureia secretada medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina no lúmen intestinal. É importante ressaltar que o fígado normal depura quase toda a amônia presente no sistema porta. Os hepatócitos transformam esse composto de alta toxicidade no aminoácido glutamina ou numa substância bem menos tóxica para o organismo — a ureia. QUADRO DE CONCEITOS VII Para compreender a patogênese da encefalopatia hepática, deve-se ter em mente o seguinte conceito: uma das principais funções do fígado é a depuração de toxinas provenientes da absorção intestinal. Estas substâncias são absorvidas pelos enterócitos, ganham a circulação venosa mesentérica e em seguida a veia porta, para então penetrar nos espaços-porta, atingindo os sinusoides hepáticos. Entre tais substâncias, a mais importante é a amônia , derivada dos enterócitos e do metabolismo das bactérias colônicas. Sua não depuração (tanto pela insuficiência hepatocelular quanto pela hipertensão porta, que desvia o sangue do sistema porta para a circulação sistêmica) causa a encefalopatia hepática. PATOGÊNESEPATOGÊNESE Existem inúmeros fatores supostamente incriminados na gênese da encefalopatia hepática. Em primeiro lugar, a natureza “metabólica” da disfunção cerebral é revelada pela sua reversibilidade (pelo menos parcial) e pela ausência de alterações neuropatológicas orgânicas que, por si só, poderiam explicar a síndrome. Apesar desse conceito irrefutável, a encefalopatia hepática crônica pode, de fato, produzir alterações orgânicas degenerativas no cérebro, as quais provavelmente são consequências (e não causas) do processo patológico. A principal alteração descrita consiste em mudanças morfológicas e funcionais dos astrócitos tipo II, decorrentes de edema celular (astrocitose tipo II de Alzheimer) . Surge, nesses casos, degeneração de células nervosas e de fibras axonais do cérebro, cerebelo e medula espinhal, com áreas de cavitação microscópicas, conferindo uma aparência esponjosa. Para esse tipo de alteração patológica, emprega-se o termo “degeneração hepatocerebral adquirida”. Muito bem... Voltemos aos mecanismos causais da encefalopatia hepática. Quais são as substâncias incriminadas? Veja a . Tab. 8 Substâncias Incriminadas na Encefalopatia Hepática ● Amônia. ● Mercaptanos. Tabela 8 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Mercaptanos. ● Manganês. ● Oxindoles. ● Ácidos graxos de cadeia curta. ● “Falsos neurotransmissores” (octopamina, feniletanolamina). ● Aminoácidos aromáticos (triptofano, fenilalanina, tirosina). ● Benzodiazepinas endógenas. A hiperamonemia é um achado quase universal na insuficiência hepática grave. A amônia é uma importante neurotoxina e provavelmente o mais importante “vilão” da encefalopatia hepática! Outras neurotoxinas, como os mercaptanos e os ácidos graxos de cadeia curta , potencializam o efeito neurotóxico da amônia. Vejamos alguns efeitos da amônia no metabolismo cerebral: ( 1 ) aumenta a captação de aminoácidos aromáticos pela barreira hematoencefálica; (2) aumenta a osmolaridade das células gliais (astrócitos), fazendo com que estas células se tornem edemaciadas — edema cerebral do tipo celular; (3) inibe a atividade elétrica neuronal pós-sináptica; e (4) estimula a produção de GABA, um importante depressor da atividade cortical (ver adiante). Os aminoácidos aromáticos dão origem a neurotransmissores inibitórios do tipo serotonina e aos falsos neurotransmissores (octopamina, feniletanolamina), caracteristicamente aumentados na encefalopatia hepática. Um ponto importante da patogênese da encefalopatia hepática é a hiperatividade do sistema neurotransmissor GABAérgico. O GABA (ácido gama-aminobutírico) é um neurotransmissor inibitório cujo receptor pós-sináptico pode ser estimulado pelos benzodiazepínicos e barbitúricos. Neurotoxinas como a amônia aumentam indiretamente a atividade desse sistema, através da estimulação da síntese de neuroesteroides, os mais poderosos moduladores do GABA. Um fato curioso: foram identificadas benzodiazepinas endógenas que se acumulariam em pacientes com encefalopatia hepática!!! Isso explica o porquê de alguns pacientes obterem melhora dos sintomas com o flumazenil — um antagonista benzodiazepínico. CLASSIFICAÇÃOCLASSIFICAÇÃO A EH pode ser classificada de diferentes maneiras, de acordo com o aspecto observado: 1. Mecanismo de origem: ● Tipo A : EH associada à falência hepática aguda; ● Tipo B : EH associada à falência hepática aguda; medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Tipo B : EH associada à falência hepática aguda; ● Tipo C : EH associada à cirrose e à hipertensão porta. 2. Evolução: ● Episódica : aguda, esporádica; ● Recorrente : ocorre em intervalos de seis meses ou menos; ● Persistente : crônica, continuamente sintomática, com períodos de exacerbação. 3. Manifestações clínicas (classificação de West Haven): Estaé a mais frequentemente citada nas provas e dividida em graus. Veja a . Essencialmente ela pode ser diferenciada em mínima (subclínica) ou manifesta (graus I a IV). Tab. 9: Critérios da encefalopatia hepática — critérios de West Haven. Obs.: os graus II,III e IV são considerados como EH franca ou aberta. ENCEFALOPATIA HEPÁTICA MÍNIMA (OU SUBCLÍNICA)ENCEFALOPATIA HEPÁTICA MÍNIMA (OU SUBCLÍNICA) É definida pela presença de alterações neuropsiquiá- tricas só detectadas pelos testes neuropsicométricos, pelo fato de serem sutis. Tais alterações geralmente não são percebidas nem pelo paciente nem pelo médico, mas estão presentes em até 70% dos cirróticos! Exames complementares como o eletroencefalograma podem reforçar o diagnóstico, mas, na prática, em geral NÃO se recomenda a pesquisa deste tipo de encefalopatia em todos os cirróticos, pois seus critérios diagnósticos não são bem estabelecidos, e o risco do tratamento pode ser superior aos benefícios. A conduta perante o paciente com “encefalopatia mínima” deve ser individualizada. Como a dificuldade para dirigir vem sendo considerada a principal complicação associada a esse tipo de encefalopatia, pacientes e familiares devem ser orientados quanto a este risco. Tabela 9 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina quanto a este risco. ENCEFALOPATIA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA MANIFESTAHEPÁTICA MANIFESTA Aqui está o que você está acostumado a ver nas enfermarias de clínica médica ou gastroenterologia! O paciente é trazido ao hospital por familiares, com um quadro de desorientação, agitação psicomotora, torpor ou mesmo estado de coma (“coma hepático”). A boa notícia é que a grande maioria destes pacientes melhora do quadro neurológico com a terapia voltada para a encefalopatia hepática e com o controle do fator precipitante (é importante ter em mente que, em cerca de 80% dos casos de encefalopatia hepática aguda, se possui um fator precipitante detectável). Eventualmente, nenhum fator precipitante é detectado — para este caso, reservamos o termo “EH aguda esporádica espontânea”. A encefalopatia hepática “manifesta” compreende várias anormalidades neurológicas e psiquiátricas, tais como: distúrbios de comportamento (agressividade, agitação), sonolência/letargia, inversão do ciclo sono-vigília (insônia noturna com sonolência diurna), fala arrastada com bradipsiquismo, “hálito hepático” (ou fetor hepaticus ), asterixis (= flapping ), incoordenação muscular e hipertonia, escrita irregular, reflexos tendinosos exacerbados ou alentecidos, sinal de Babinski, crises convulsivas e postura de descerebração. Um ponto importante é saber avaliar a presença de flapping . Deve-se solicitar ao paciente que estenda o braço para frente e faça a dorsoflexão da mão (mão aberta e com os dedos bem separados). A pessoa normal mantém a posição estável, enquanto no paciente com encefalopatia a mão cai repetidamente, em movimentos ritmados, devido a relaxamentos rápidos (perda do tônus) seguidos de retomada da contração muscular. Se não for desencadeado espontaneamente, o médico pode hiperestender o punho do paciente, causando o chamado “ flapping induzido”. QUADRO DE CONCEITOS VIII O asterixis (ou flapping ) não é patognomônico da encefalopatia hepática! Pode ocorrer em outras condições importantes na prática médica, como a encefalopatia urêmica, a carbonarcose da DPOC, a pré-eclâmpsia grave ou eclâmpsia e a intoxicação pelo lítio. E quais seriam os fatores precipitantes mais importantes da encefalopatia hepática? ● Hemorragia digestiva alta. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Hipocalemia. ● Alcalose metabólica ou respiratória. ● Desidratação/hipovole mia. ● Diuréticos tiazídicos ou de alça (furosemida). ● Infecções (incluindo a peritonite bacteriana espontânea). ● Uso de sedativos (benzodiazepínicos e barbitúricos). ● Dieta hiperproteica. ● Procedimentos cirúrgicos. ● Constipação intestinal. ● Hipóxia. ● Shunts portossistêmicos: espontâneos (ex.: esplenorrenal) e cirúrgicos (incluindo o TIPS — Transjugular Intrahepatic Portosystemic Shunt ). O paciente cirrótico é propenso à hemorragia digestiva por vários motivos: (1) distúrbio da hemostasia — plaquetopenia + coagulopatia; ( 2 ) presença das varizes esofagogástricas, clássicas da hipertensão porta; e (3) aumento do risco de úlcera péptica. O sangue liberado no tubo digestivo é digerido pelas bactérias colônicas. Do metabolismo da hemoglobina (proteína), forma-se mais amônia. Esta amônia é prontamente absorvida pelos enterócitos, desencadeando a EH. A alcalose metabólica desencadeia encefalopatia hepática pelo seguinte mecanismo: o pH plasmático mais alcalino converte a forma ionizada NH 4 + (amônio) na forma não ionizada N H 3 (amônia). Esta última, por ser lipossolúvel, passa livremente pela barreira SAIBA MAIS... Mas por que os pacientes cirróticos apresen tam maior incidência de úlceras pépticas? A explicação é bem simples... A histamina produzida no organismo é depurada pelo fígado. Com o desenvolvimento da insuficiência hepatocelular, há um aumento dos níveis de histamina circulante. Relembrando o bloco de Gastro, a histamina estimula diretamente as células parietais do estômago a produzirem ácido clorídrico, justificando a propensão ao surgimento de doença ulcerosa péptica. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina N H 3 (amônia). Esta última, por ser lipossolúvel, passa livremente pela barreira hematoencefálica, aumentando a impregnação cerebral da neurotoxina. A hipocalemia aumenta a produção renal de NH 3 , por reduzir o pH intracelular das células tubulares proximais (saem íons K + em troca da entrada de íons H + ). A maior produção de NH 3 e a precipitação de uma alcalose fazem da hipocalemia um fator desencadeante de encefalopatia hepática! Perceba que os diuréticos de alça (furosemida) e os tiazídicos podem causar encefalopatia em cirróticos (se usados indiscriminadamente), por provocarem hipocalemia, alcalose metabólica e, eventualmente, desidratação. As infecções são importantes fatores precipitantes de EH, por mecanismos pouco conhecidos. O destaque é para a peritonite bacteriana espontânea . Todo paciente com ascite e encefalopatia deve ter sua ascite investigada para infecção, mesmo na ausência de sinais infecciosos! As infecções uriná- rias e respiratórias também são importantes, pela sua elevada frequência. A dieta hiperproteica pode desencadear EH por aumentar a produção de amônia pelas bactérias colônicas que metabolizam a proteína alimentar. A constipação intestinal , ao aumentar a proliferação dessas bactérias e o tempo de contato entre a amônia produzida com a mucosa intestinal (aumentando sua absorção), também pode precipitar o evento mórbido. DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO O diagnóstico de encefalopatia hepática é eminentemente clínico, mas existem exames complementares que podem corroborá-lo. A dosagem sérica de amônia, por exemplo, não é recomendada de rotina; geralmente se encontra elevada na encefalopatia hepática, porém sua especificidade é baixa (existem diversas patologias que podem elevar a amônia). E mais: seus níveis séricos não têm boa correlação com o grau de encefalopatia!!! As alterações eletroencefalográficas encontradas na EH (alentecimento global, ondas theta na fase pré- comatosa e ondas delta nas fases avançadas) não são patognomônicas nem possuem valor prognóstico, mas podem ser úteis na avaliação da resposta terapêutica. Um exame bastante promissor é a ressonância nuclear magnética com espectroscopia, no qual se avalia o metabolismo cerebral. Estudos ainda estão em andamento para definir sua função no manejo da encefalopatia hepática. De uma forma geral, os exames auxiliares são empregados apenas em estudos científicos, sendo o diagnóstico, na prática, fundamentado no reconhecimento puramente clínico da síndrome. QUADRO DE CONCEITOS IX Sempre que um paciente cirrótico interna com encefalopatia hepática deve ser feita medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicinaSempre que um paciente cirrótico interna com encefalopatia hepática deve ser feita a seguinte pergunta: qual foi o fator precipitante? A busca deve ser ativa, com a anamnese (uso de medicamentos, libação alimentar, constipação...), investigação de quadro infeccioso (com paracentese diagnóstica se ascite presente), exames laboratoriais (com avaliação hidroeletrolítica) e observação do aspecto das fezes (pesquisa de melena). TRATAMENTOTRATAMENTO O tratamento da encefalopatia hepática se baseia primariamente no controle dos fatores precipitantes e na redução da produção e da absorção de amônia pelo cólon. Sabemos que a amônia é produzida pelo metabolismo das bactérias colônicas, ao degradar os compostos nitrogenados (ureia e proteínas) presentes no lúmen intestinal. ● Restrição proteica: durante muito tempo a restrição proteica foi advogada como medida essencial na abordagem terapêutica da EH aguda. Todavia, o impacto nutricional dessa medida provavelmente acarreta mais riscos para o estado geral do paciente do que quaisquer benefícios quanto ao controle do quadro neuropsiquiátrico! Desse modo, a restrição proteica na dieta não está indicada de rotina no tratamento da EH aguda!!! Contudo, nos pacientes com encefalopatia hepática aguda ou crônica refratária ao tratamento com lactulose e/ou antibióticos — ver a seguir —, a manipulação dietética tem papel adjuvante: nestes casos recomenda-se substituir fontes proteicas animais (ex.: carnes, ovos, leite) por fontes proteicas vegetais (ex.: soja). Vale lembrar que pacientes com EH estágio III ou IV devem ficar em dieta zero pelo menos nas primeiras 24–48h e tão logo comecem a se recuperar, a dieta deve ser reintroduzida. ● Corrigir a constipação: como vimos, a constipação aumenta a proliferação bacteriana no cólon. Para combatê-la, o laxante mais utilizado é a lactulose oral (ver adiante), mas, nos casos refratários, recomenda-se que a lactulose seja feita sob a forma de clister (com lactulose a 20%). Para fazer este clister, misturamos 300 ml de lactulose com 700 ml de água. A resposta costuma ser muito boa. ● Lactulose: a lactulose (ou betagalactosidofrutose) é considerada a “pedra mestra” na terapia da encefalopatia hepática aguda esporádica, tendo uma eficácia oscilando entre 70–80% . A lactulose tem uma grande vantagem sobre os outros açúcares dissacarídeos (como a sacarose, a lactose e a frutose): ela não é “quebrada” pelas dissacaridases presentes nas microvilosidades dos enterócitos do intestino delgado e, portanto, consegue atingir o cólon de forma intacta. Seu principal mecanismo de ação vem do fato de ser metabolizada pelas bactérias colônicas em ácidos graxos de cadeia curta (ácido láctico e ácido acético), reduzindo o pH do lúmen colônico para em torno de 5,0. Com o pH mais ácido, o NH 3 (amônia) é convertido em NH 4 + (amônio), este último inabsorvível pela mucosa intestinal. O resultado é a menor absorção de medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina amônia e a melhora do quadro da EH. A lactulose também age pelo seu efeito catártico (laxante). Uma opção à lactulose é o lactitol, com efeitos semelhantes, porém com sabor mais palatável. Veja os principais efeitos da lactulose na . Tab. 10 Mecanismo de Ação da Lactulose ● Reduz o pH do lúmen colônico, transformando NH 3 em NH 4 +, forma não absorvível da amônia. ● Aumenta a flora de Lactobacillus , bactérias que não produzem NH 3 em seu metabolismo, substituindo as bactérias produtoras de NH 3 . ● Efeito catártico — ao elevar a osmolaridade do cólon, aumenta a eliminação de água nas fezes. ● Aumenta a incorporação de amônia em algumas bactérias. A dose da lactulose deve ser 20–30 g (30–45 ml da solução disponível no mercado) de duas a quatro vezes por dia. A “meta” é fazer com que o paciente tenha de 2–3 evacuações pastosas por dia . ● Antibióticos: certos antibióticos orais podem ser administrados com o intuito de reduzir a flora bacteriana colônica produtora de amônia. O mais tradicional é a neomicina , na dose 2–8 g/dia VO, em quatro tomadas (6/6h). Ou seja, uma dose inicial de 500 mg VO 6/6h e máxima de 2 g VO 6/6h. Mesmo sendo pouco absorvido (menos de 4% da dose), este aminoglicosídeo pode ser ototóxico e nefrotóxico, principalmente quando tomado por longo tempo. Outro antibiótico clássico é o metronidazol , na dose 250 mg VO 8/8h, porém apresenta um grande limitante ao seu uso crônico: o desenvolvimento de neuropatia periférica. A rifaximina 550 mg VO 12/12h recentemente ganhou espaço no tratamento da EH, após alguns estudos terem sugerido que ela é tão ou mais eficaz que os antimicrobianos anteriormente citados, com a vantagem de não apresentar efeitos colaterais significativos. Existem evidências de que seu uso crônico pode reduzir a recorrência de EH, além de aumentar a eficácia do tratamento agudo quando ministrada em conjunto com a lactulose. Seja como for, os antibióticos costumam ser reservados para os pacientes intolerantes ou refratários à lactulose. Nestes últimos, vale dizer, o antibiótico NÃO deve substituir a lactulose: tais pacientes utilizam lactulose + antibiótico para o controle da EH. Tabela 10 SAIBA MAIS... Síndrome de abstinência alcoólica + encefalopatia hepática. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Outros tratamentos: a L-Ornitina-L-Aspartato (LOLA) aumenta a depuração hepática e, em menor grau, muscular da amônia! Estudos mostraram benefícios em relação ao placebo, porém o LOLA ainda não foi comparado ao tratamento padrão (lactulose), e faltam estudos em pacientes graves. A administração oral de PROBIÓTICOS, como o extrato de bactérias sacarolíticas não produtoras de urease, pode modificar a flora colônica do paciente para uma flora menos produtora de amônia. Alguns pacientes também melhoram com a suplementação de ZINCO. O FLUMAZENIL (antagonista dos benzodiazepínicos) pode ser tentado na encefalopatia grave para evitar intubação orotraqueal, mas a resposta é imprevisível. O BENZOATO DE SÓDIO apareceu como droga promissora em um estudo indiano, agindo através do aumento da excreção renal de nitrogênio com efetividade semelhante à lactulose, mas seu uso ainda não foi corroborado por estudos norte-americanos e europeus. Aqui há o video de apostila 17.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. SÍNDROME HEPATORRENALSÍNDROME HEPATORRENAL Aqui há o video de apostila 18.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. A Síndrome Hepatorrenal (SHR) é uma forma de insuficiência renal funcional (isto é, não acompanhada de alterações histopatológicas renais), que ocorre geralmente em indivíduos com hepatopatia crônica avançada, insuficiência hepática grave e hipertensão porta. É caracterizada pela perda progressiva da função renal, secundária à vasoconstrição renal (com consequente Portadores de cirrose alcoólica que ainda bebem podem se apresentar com quadros de alteração do estado mental que têm componentes tanto de encefalopatia hepática quanto de abstinência alcoólica. O tratamento da abstinência alcoólica envolve o uso de benzodiazepínicos , porém sabemos que esta classe de drogas deve ser evitada no contexto da encefalopatia hepática (já que os benzodiazepínicos podem desencadear ou agravar esta última). Como proceder então??? Veja: os benzodiazepínicos são excelentes sedativos e até podem ser usados em quadros de agitação psicomotora (APM) mesmo em portadores de encefalopatia hepática “pura”, quando se julga que o paciente põe em risco sua integridade física e a de terceiros, e principalmente quando ele não responde ao tratamento farmacológico padrão da APM, que consiste no uso de antipsicóticos (ex.: haloperidol ) em baixas doses. Logo, perante a suspeita das duas síndromes combinadas, principalmente se houver APM importante e refratariedade ao antipsicótico, com risco à integridade física, podemos e devemos lançar mão dos benzodiazepínicos! O detalhe está na escolha da droga específica : em cirróticos, o benzodiazepínico de escolha é o lorazepam , que, de todos os fármacos destade protrombina 1,30 O U plaquetas 3,5 = 1 ponto; 2,8–3,5 = 2 pontos; 3,5 = 1 ponto; 2,8–3,5 = 2 pontos;classe, é o que apresenta maior eliminação RENAL. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina pela perda progressiva da função renal, secundária à vasoconstrição renal (com consequente diminuição da Taxa de Filtração Glomerular — TFG) e vasodilatação extrarrenal (principalmente no leito mesentérico), havendo queda da resistência vascular periférica e, eventualmente, hipotensão arterial. Contudo, veja um conceito: nos últimos anos, novos dados apareceram sobre a SHR, sobretudo em relação a sua patogênese! Atualmente, ela tem sido cada vez mais reconhecida não apenas como um distúrbio “funcional”, mas que também conta com a participação de inflamação sistêmica, estresse oxidativo e dano tubular por sais biliares. Ou seja, a SHR teria um componente estrutural adicional. PATOGÊNESEPATOGÊNESE A vasodilatação esplâncnica parece ser um evento precoce na gênese da SHR. Essa vasodilatação leva a uma diminuição do volume circulante efetivo, com ativação dos sistemas renina-angiotensina-aldosterona e noradrenérgico (simpático), cuja ação, por sua vez, ocorrerá predominantemente nos rins, levando à vasoconstrição renal. Estudos mostram que a causa da vasodilatação esplâncnica é a translocação bacteriana intestinal . Germes Gram-negativos do lúmen intestinal atravessam a mucosa lesada (cuja predisposição é maior no cirrótico), alcançando linfonodos mesentéricos e induzindo a secreção de citocinas como IL-6 e TNF-alfa por macrófagos locais. Tais citocinas estimulam o endotélio dos vasos mesentéricos a produzir quantidades absurdas de óxido nítrico, levando à vasodilatação nesta região. Assim, a SHR reflete um desequilíbrio entre os fatores vasodilatadores e vasoconstritores, resultando no aumento significativo da resistência vascular renal, na diminuição da TFG e numa ávida retenção de sódio e água (o sódio urinário desses pacientes geralmente é 1,5 mg/dl e/ ou o clearance de creatinina é 1,5 mg/dl ou aumento > 0,3 mg/dl em 48h ou > 50% do valor basal em até sete dias*. ● Ausência de melhora da creatinina sérica após dois dias de retirada de diuréticos e expansão volêmica com albumina (1 g/kg/dia). ● Ausência de choque. ● Ausência de uso recente ou atual de drogas nefrotóxicas. ● Ausência de doença parenquimatosa renal, definida por: (1) proteinúria > 500 mg/dia; (2) hematúria > 50 células por campo de grande aumento; e (3) USG renal anormal. A USG com Doppler, ao avaliar a resistência arterial renal, fornece também informações importantes para compreendermos o que de fato acontece na SHR. Valores aumentados são encontrados em pacientes cirróticos sem ascite ou uremia, mas valores ainda maiores são evidenciados nos ascíticos com SHR. Tal achado, inclusive, indica um pior prognóstico. TRATAMENTOTRATAMENTO O tratamento conservador compreende medidas gerais, tais como: repouso, manutenção do estado euvolêmico e retirada de agentes nefrotóxicos (principalmente aminoglicosídeos e anti- inflamatórios). Paracenteses de alívio (de pequeno volume) podem ser necessárias para amenizar o desconforto da ascite. O tratamento farmacológico está baseado na combinação de drogas com ação vasoconstritora esplâncnica + infusão de albumina (1 g/kg no primeiro dia seguido de 20–40 g/dia). O vasoconstritor de escolha é a terlipressina , com taxas de resposta completa (creatinina sérica abaixo de 1,5) de aproximadamente 60%. Alternativas possíveis são: (1) noradrenalina; e (2) a combinação de midodrina (um agonista �-1-adrenérgico seletivo) com octreotida (um análogo da somatostatina). A resposta inicial à terapia deve ser observada em três dias, podendo se manter o esquema por 14 dias ou até a resolução completa do quadro. A sobrevida em longo prazo infelizmente não é alterada com essas medidas, visto que o paciente mantém-se portador de uma insuficiência hepática grave. O TIPS, que veremos com mais detalhes adiante, é uma alternativa nos pacientes que não obtiveram boa resposta com o tratamento farmacológico (principalmente na SHR tipo II), porém seu uso é limitado devido ao risco de encefalopatia e da exclusão para o procedimento medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina porém seu uso é limitado devido ao risco de encefalopatia e da exclusão para o procedimento dos pacientes com história de encefalopatia severa, bilirrubina > 5 mg/dl, Child-Pugh > 11 e disfunção cardíaca ou pulmonar importante. A terapia de substituição renal não aumenta a sobrevida, mas pode ser usada como ponte para o transplante hepático. O transplante hepático é considerado o tratamento de escolha da SHR, sendo o único tratamento que efetivamente aumenta a sobrevida. Em indivíduos com SHR, a taxa de sobrevida em três anos é de cerca de 60%, uma taxa discretamente menor quando comparada aos pacientes sem SHR (70–80%). A reversão da SHR com o tratamento farmacológico antes do transplante parece melhorar a sobrevida deste último. O desenvolvimento da SHR pode ser prevenido em dois contextos clínicos: (1) n a peritonite bacteriana espontânea, através da infusão de albumina (1,5 g/kg de peso no primeiro dia, depois 1 g/kg de peso no terceiro dia) — ver tópico de ascite — e (2) n a hepatite alcoólica aguda, através do uso da pentoxifilina, um inibidor do TNF-α . SÍNDROME HEPATOPULMONAR E HIPERTENSÃOSÍNDROME HEPATOPULMONAR E HIPERTENSÃO PORTOPULMONARPORTOPULMONAR SÍNDROME HEPATOPULMONARSÍNDROME HEPATOPULMONAR Aqui há o video de apostila 19.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. Os distúrbios da troca gasosa secundários à cirrose hepáticaincluem um amplo espectro de alterações, desde aquelas que são só detectadas em investigação laboratorial, em pacientes totalmente assintomáticos, até hipoxemia arterial grave, incapacitante, em pacientes cianóticos (com baqueteamento digital) e dependentes de oxigênio. O termo Síndrome Hepatopulmonar (SHP) se refere a uma tríade clínica composta por: 1. Doença hepática crônica; 2. Hipoxemia: com gradiente alvéolo arterial aumentado (indicando a presença de shunt arteriovenoso) e; 3. Evidências de alterações vasculares intrapulmonares, referidas como "dilatações vasculares intrapulmonares (DVIP) ". A disfunção respiratória depende basicamente da presença das DVIP, que funcionam como shunt arteriovenoso pulmonar. O sangue dessaturado “bypassa” alguns alvéolos ao prosseguir pelos vasos dilatados, misturando-se ao restante do sangue que sai dos pulmões. A mistura do sangue dessaturado (vindo das DVIP) com o sangue do restante do parênquima determina medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina sangue dessaturado (vindo das DVIP) com o sangue do restante do parênquima determina hipoxemia. Vamos falar em números para que você entenda melhor. Os capilares pulmonares normais têm geralmente um diâmetro de 8–15 µm, sendo as hemácias levemente menores que 8 µm, havendo a passagem de uma ou poucas células por vez, para que haja tempo adequado para troca gasosa. Na SHP, os capilares podem ficar absurdamente dilatados! Onde passava uma hemácia, agora passam dezenas. Obviamente, muitas passam sem ser oxigenadas, explicando o shunt direita-esquerda. Observe a . Esse shunt não é considerado verdadeiro (como na SARA), pois responde à suplementação de oxigênio inalatório. O oxigênio em grande quantidade consegue se difundir dos alvéolos adjacentes para o interior das DVIP. A fisiopatogênese da SHP não é conhecida, mas a principal hipótese é o aumento na circulação pulmonar de vasodilatadores endógenos (ex.: NO), resultante do deficit d e detoxificação hepática (por insuficiência hepatocelular e por formação de anastomoses portossistêmicas). Uma vez que a SHP tem sido descrita em doenças que cursam com hipertensão porta e função hepática preservada, deduz-se que a pressão portal elevada constitui uma condição suficiente para o seu desenvolvimento. A SHP pode ocorrer em 5–10% dos pacientes com cirrose hepática independentemente da etiologia, mas também pode se desenvolver em doenças não cirróticas tais como esquistossomose, fibrose hepática congênita e hipertensão porta não cirrótica. Além disso, a Figura 14 _ _ Fig. 14: Vasodilatação do capilar pulmonar na síndrome hepatopulmonar. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina esquistossomose, fibrose hepática congênita e hipertensão porta não cirrótica. Além disso, a síndrome já foi descrita após derivação porto-cava e derivação esplenorrenal assim como na vigência de hepatite fulminante e na rejeição pós-transplante hepático. Clinicamente, a SHP pode se manifestar através de dispneia, cianose de lábios e extremidades, baqueteamento digital, aranhas vasculares e platipneia (dispneia que piora com a posição sentada ou em pé). A platipneia é um achado clássico!!! É acompanhada da ortodeoxi a: hipoxemia desencadeada ou agravada pela posição ortostática, outro achado clássico! Pode ser explicada pela localização preferencial das DVIP nas bases pulmonares. Platipneia + cirrose hepática + ortodeoxia = síndrome hepatopulmonar Em cerca de 80% dos pacientes adultos com SHP, os sintomas da hepatopatia antecedem à queixa pulmonar. A história natural da SHP não é bem conhecida. A deterioração da oxigenação arterial pode surgir a despeito de uma função hepática estável. A síndrome se associa a uma mortalidade de pelo menos 40% em um período aproximado de 2,5 anos, sendo que a causa de morte nem sempre está associada à hipoxemia. A melhora ou reversão espontânea da SHP constitui um evento raro. A coexistência de anormalidades pulmonares, tais como derrame pleural ou obstrução ao fluxo expiratório, comuns em pacientes com doenças hepáticas, não exclui o diagnóstico de SHP. AVALIAÇÃO CLÍNICA E DIAGNÓSTICOAVALIAÇÃO CLÍNICA E DIAGNÓSTICO A gasometria arterial permite avaliar a presença ou não de hipoxemia, hipocapnia, alcalose respiratória e ortodeoxia (redução da PaO 2 na posição ortostática). É importante lembrar que a saturação de O 2 pode estar falsamente diminuída nos pacientes com hiperbilirrubinemia. A hipoxemia arterial pode ser definida como PaO 2 em ar ambiente e em posição supinafígado, as artérias pulmonares medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina acúmulo de substâncias endotélio-tóxicas não depuradas pelo fígado, as artérias pulmonares periféricas sofrem remodelamento , com vasoconstrição, hiperplasia da média, espessamento da íntima e formação de trombos in situ . Existe a hipótese (não comprovada) de que pequenas embolias pulmonares de repetição, com pequenos trombos provenientes do sistema porta submetido à estase, possam contribuir para a hipertensão arterial pulmonar destes pacientes. QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICOQUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO O quadro clínico é marcado por dispneia progressiva aos esforços e sinais de sobrecarga de VD no exame clínico, além de hiperfonese do componente P2 da segunda bulha. Pode haver síncope e dor torácica. A radiografia de tórax pode mostrar um abaulamento do segundo arco da silhueta cardíaca esquerda (correspondente ao tronco da artéria pulmonar) e um aumento da área cardíaca à custa de VD. O diagnóstico começa pelo ecocardiograma , para mostrar a sobrecarga do VD e estimar a pressão sistólica da artéria pulmonar (PAPsist); depois passa pela cintilografia pulmonar V / Q (para afastar tromboembolismo pulmonar recorrente) e é confirmado pelo cateterismo cardíaco direito , com mensuração direta da pressão sistólica da artéria pulmonar (PAPsist), que deve estar superior a 25 mmHg. Um teste com vasodilatadores locais é feito, para ver se há reversão, pelo menos parcial, da PAPm (pressão média da artéria pulmonar) e/ ou da resistência vascular pulmonar. A resposta terapêutica é proporcional ao resultado desse teste. TRATAMENTOTRATAMENTO O tratamento da hipertensão portopulmonar é semelhante ao da hipertensão arterial pulmonar primária. Na ausência de contraindicações, pode-se instituir anticoagulação crônica com warfarin , objetivando manter o INR em torno de 1,5 , isto é, faz-se uma anticoagulação de "baixa intensidade", devido ao risco aumentado de hemorragia em hepatopatas crônicos. O anticoagulante visa reverter e prevenir a formação dos trombos in situ ou dos microêmbolos. Deve-se associar também um vasodilatador arterial pulmonar, sendo a primeira escolha na atualidade o epoprostenol (prostaciclina), ministrado em infusão contínua por uma bomba implantada no subcutâneo. Dado o limitado benefício e o alto custo da terapia conservadora, bem como a curta sobrevida desses doentes, pode-se indicar o transplante hepático em casos selecionados. Para tanto, é preciso que a PAPsist atinja níveis inferiores a 35 mmHg — acima deste valor, a mortalidade do transplante torna-se proibitiva... Aqui há o video de apostila 20.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. Dúvidas Acadêmicas do CapítuloTESTE SEU CONHECIMENTOConfira as dúvidas acadêmicas do capítulo clicando aqui medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina APÊNDICEAPÊNDICE HEPATOPATIA MEDICAMENTOSAHEPATOPATIA MEDICAMENTOSA INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO O objetivo primordial deste capítulo é que o aluno tenha conhecimento das principais drogas capazes de causar lesão hepática, sabendo algumas particularidades de cada uma, como o tipo de lesão instalada. Por exemplo, o paracetamol em altas doses pode provocar necrose de hepatócitos na região centrolobular, eventualmente levando à insuficiência hepática fulminante; já os anticoncepcionais podem ser associados à colestase intra-hepática, por alterarem os mecanismos de secreção dos sais biliares na membrana dos canalículos biliares. A definição de "hepatopatia medicamentosa" é bastante abrangente: qualquer grau de alteração hepática que tenha relação com o uso de alguma droga deve ser inserido neste conceito! Assim, podemos afirmar que o número de drogas e toxinas que podem levar à injúria hepática é muito grande. Em termos epidemiológicos, a real incidência de hepatopatia farmacoinduzida não pode ser determinada, pois, na maioria das vezes, essas alterações são assintomáticas e passam despercebidas (acredita-se que menos de 10% dos casos sejam detectados). Lesões mais significativas, por outro lado, recentemente tiveram sua incidência estimada em países como a Inglaterra: estima-se que ocorram cerca de 22 casos de hepatopatia medicamentosa para cada 1 milhão de pacientes-ano naquele país. Mas atenção: não podemos generalizar esta última cifra! Em países em desenvolvimento (como o Brasil), acredita-se que o número de casos de hepatopatia farmacoinduzida seja ainda menor, e se relacione a um número mais restrito de drogas. Os agentes químicos industriais, os alcaloides vegetais, as microtoxinas de ocorrência natural e as drogas utilizadas no tratamento das diversas doenças (tanto em doses farmacológicas quanto na overdose ) são os principais agentes implicados. Os hepatócitos (lesão hepatocelular), o fluxo biliar (lesão colestática) e as estruturas vasculares podem ser comprometidos em combinações variadas. Os mecanismos que levam à lesão envolvem efeito direto do agente ou reação "idiossincrásica" (própria) do indivíduo. Esta última resposta pode ser desencadeada por reação imunológica "contra" o fígado, induzida pela formação de neoantígenos compostos por moléculas do medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina "contra" o fígado, induzida pela formação de neoantígenos compostos por moléculas do parênquima hepático combinadas à droga em questão ou seus metabólitos, ou por diferenças individuais na metabolização do agente (componente genético), fenômeno que induz a formação de metabólitos tóxicos. Por motivos desconhecidos, as hepatopatias medicamentosas são mais frequentes no sexo feminino. A apresentação clinicolaboratorial pode variar desde anormalidades assintomáticas nas provas de função hepática até a necrose hepática maciça e fatal. A hepatite viral e a obstrução biliar podem ser simuladas pelas reações medicamentosas hepatotóxicas, e a exposição a determinados agentes também pode resultar em hepatite crônica, cirrose e tumores hepáticos. QUADRO DE CONCEITOS I O que é "hepatopatia medicamentosa"? Por hepatopatia medicamentosa entendemos QUALQUER alteração hepática relacionada ao uso de uma droga (ex.: aumento de aminotransferases ou enzimas biliares), tenha esta alteração um caráter assintomático ou mesmo se expresse na forma de uma insuficiência hepática fulminante, subfulminante ou crônica. As hepatopatias medicamentosas podem ser decorrentes de toxicidade direta (dose- dependente e previsível) ou então serem mediadas pelo fenômeno de idiossincrasia, isto é, dose-independentes, imprevisíveis e, em geral, geneticamente determinadas. Tab. 1: Classificação da hepatopatia farmacoinduzida. Categoria Exemplos Necrose zonal . Acetaminofeno, tetracloreto de carbono, sinvastatina. Hepatite inespecífica . AAS, oxacilina. Semelhante à hepatite viral . Halotano, isoniazida, fenitoína, diclofenaco. Semelhante à hepatite autoimune (FAN, antimúsculo liso) . Metildopa, nitrofurantoína, diclofenaco, fenofibrato, fenitoína, propiltiouracil, levostatina. Colestase não inflamatória . medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Colestase não inflamatória . Estrogênios, esteroides 17-alfa- substituídos. Lesão inflamatória dos pequenos ductos (síndorme do evanescimento dos ductos biliares) . Amoxicilina + clavulanato, piroxicam, tiabendazol, haloperidol. Lesão dos grandes ductos (colangite esclerosante) . Fluorodesoxiuidina. Esteatose hepática : ● Grandes gotículas; ● Pequenas gotículas. Etanol, corticosteroides. Tetraciclina, ácido valproico, didanosina, amiodarona. Fosfolipídios e esteato-hepatite . Amiodarona, maleato de perexilina. Granulomas . Fenilbutazona, alopurinol, carbamazepina, diltiazem, hidralazina, fenitoína, rosiglitazona, sulfonamidas, penicilamina. Fibrose . Metotrexato, hipervitaminose A, etanol, metildopa. Tumores : ● Adenoma; ● Angiocarcinoma. Estrogênios. Cloreto de vinila. Trombose de veia hepática . Agente antineoplásicos (ex.: bussulfano), medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina azatioprina.Doença veno-oclusiva . Esteroides anabolizantes, estrogênio, cloreto de vinila. Peliose hepática . Alopurinol, fluorodesoxiuridina. Hiperplasia regenerativa nodular . Azatioprina, agentes antineoplásicos. PRINCÍPIOS DE DIAGNÓSTICO E MANUSEIOPRINCÍPIOS DE DIAGNÓSTICO E MANUSEIO O s medicamentos podem produzir anormalidades semelhantes às observadas em outros distúrbios comuns, como hepatite viral ou doença biliar, e alguns podem provocar lesões mistas. Contudo, em 90% das vezes, o padrão é hepatocelular, com aumento predominante de ALT/AST em relação aos demais marcadores hepáticos. Desse modo, o fator decisivo para o diagnóstico é o alto grau de suspeição por parte do médico, o que está baseado no estabelecimento de uma "linha do tempo" entre a introdução do (s) fármaco (s) e o surgimento de lesão hepática: em geral, a maioria das drogas inicia sua hepatotoxicidade entre 5 – 90 dias . Isso torna a história clínica detalhada a peça fundamental para o diagnóstico, e as informações sobre qualquer exposição anterior a um agente suspeito podem ser de grande valia (toxicidade mais tardia). Como numerosas substâncias químicas industriais são hepatotóxicas, também é imprescindível obter detalhes relativos à profissão e ao ambiente de trabalho do paciente. O exame físico costuma oferecer pouca ajuda, exceto nos casos onde se detecta um rash cutâneo (que corrobora, por exemplo, a hipótese de toxicidade da fenitoína — ver adiante). Evidentemente, outras etiologias devem ser descartadas através de uma rotina geral de investigação das hepatopatias (ex.: sorologias virais). A negatividade desses exames, associada à resolução das alterações hepáticas em semanas a meses após a suspensão do fármaco, é o principal meio de diagnóstico das hepatopatias medicamentosas! Vale ressaltar que a biópsia hepática costuma ser de pouca valia neste processo. Em geral, encontramos alterações histopatológicas indistinguíveis de uma hepatite viral! Entretanto, casos em que múltiplas possibilidades etiológicas são aventadas poderiam ser resolvidos pelo encontro de certos achados (incomuns) bastante sugestivos de hepatopatia farmacoinduzida: infiltração eosinofílica hepática ou formação de granulomas no parênquima. Em vista da típica dificuldade diagnóstica, um conceito prático muito importante deve ser enfatizado: à menor suspeita de hepatotoxicidade após a introdução de um novo medicamento medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina enfatizado: à menor suspeita de hepatotoxicidade após a introdução de um novo medicamento (ex.: aumento de ALT > 3x o LSN), este medicamento deve ser imediatamente suspenso!!! Não s e deve aguardar resultados de exames laboratoriais para confirmar ou descartar outras hipóteses. A suspensão precoce da droga tem o potencial de evitar a evolução para insuficiência hepática na grande maioria das vezes! Em alguns casos, quando apenas um agente é envolvido e se encontra um tipo histológico característico de lesão, o diagnóstico com base em achados laboratoriais e de biópsia é relativamente simples. São exemplos a esteatose hepática microvesicular causada pela tetraciclina , ou a necrose centrolobular provocada pelo acetaminofeno (paracetamol). O diagnóstico se torna mais complexo quando vários fármacos estão sendo utilizados ao mesmo tempo, e qualquer um deles pode ser responsável por uma lesão hepática inespecífica ou semelhante à hepatite viral. Eventualmente, até mesmo os distúrbios subjacentes para os quais os medicamentos foram prescritos também podem causar lesão hepática (EHNA, no portador de diabetes mellitus ). A hepatopatia farmacoinduzida costuma ser controlada pela interrupção do (s) fármaco (s) implicado (s) e, muito raramente, o curso clínico pode ser progressivo a despeito da suspensão do agente envolvido. Com exceção da toxicidade pelo paracetamol — em que um antídoto específico é comprovadamente benéfico (N-acetilcisteína) — e da toxicidade pela tetraciclina — onde a L-carnitina se mostrou benéfica. Nos demais casos, oferecemos essencialmente tratamento de suporte e o Transplante Ortotópico de Fígado (TOF), quando indicado. E, diga- se de passagem, em mais de 50% dos casos de falência hepática associada à idiossincrasia, o transplante será necessário (pois, nesta situação, a mortalidade sem transplante gira em torno de 80%). Os glicocorticoides não têm valor no tratamento da hepatopatia farmacoinduzida, embora possam suprimir manifestações de hipersensibilidade, como a síndrome semelhante à doença do soro que ocorre em decorrência de certas reações idiossincrásicas. QUADRO DE CONCEITOS II Como estabelecer o diagnóstico de uma "hepatopatia medicamentosa"? Em suma, o diagnóstico de hepatopatia farmacoinduzida depende de: ● História de exposição, em geral, entre 5 e 90 dias; ● Achados clínicos e laboratoriais e, ocasionalmente, de biópsia hepática consistentes; ● Eliminação de outras possibilidades diagnósticas; ● Resolução da lesão hepática após a interrupção da toxina suspeita. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina PRINCIPAIS MEDICAMENTOS ENVOLVIDOSPRINCIPAIS MEDICAMENTOS ENVOLVIDOS PARACETAMOL (ACETAMINOFENO)PARACETAMOL (ACETAMINOFENO) E sse analgésico e antipirético é um exemplo clássico de hepatotoxina intrínseca (dose- dependente) que provoca necrose hepatocitária e insuficiência hepática aguda, frequentemente associada à insuficiência renal. Em geral, ocorre lesão hepática significativa com doses acima de 10–15 g, tomadas quase sempre como tentativa de suicídio. Trata-se da principal causa farmacológica de Insuficiência Hepática Fulminante (IHF) no mundo. Em algumas horas o paciente apresenta náuseas, vômitos e diarreia, manifestações iniciais que regridem rapidamente, sendo seguidas por uma fase assintomática. Os sinais clínicos e laboratoriais de dano hepático tornam-se evidentes 24–48 horas após a ingestão do fármaco. São comuns níveis séricos de aminotransferases > 5.000 UI/L, e a lesão hepática grave pode resultar em insuficiência hepática progressiva, com encefalopatia, coagulopatia, hipoglicemia e acidose láctica. O tratamento inicial da superdosagem do paracetamol consiste em medidas d e suporte e descontaminação gástrica , como o uso de carvão ativado pela via oral (1 g/kg de peso, dose máxima 50 g), dentro das primeiras 4h da ingestão tóxica. Deve-se administrar N-acetilcisteína (NAC) a pacientes de alto risco, isto é, aqueles que ingeriram quantidades previsivelmente tóxicas do fármaco! Nestes casos, a NAC reduz a gravidade da necrose hepática e a taxa de mortalidade, principalmente se administrada ANTES da elevação das aminotransferases. Como regra geral, recomenda-se que a NAC seja administrada, nestes indivíduos, dentro das primeiras 8h da ingestão! Dosar o nível plasmático de paracetamol não é a melhor forma de avaliar o prognóstico, o fator mais importante é a dose total ingerida, pois a droga é previsivelmente tóxica ! Todavia, níveis superiores a 200 mg/L em 4h, 100 mg/L em 8h ou 50 mg/L em 12h após a ingestão do fármaco são preditivos de lesão hepática grave e também constituem indicações para o tratamento com N-acetilcisteína. A NAC parece atuar através do fornecimento de cisteína para a síntese da glutationa, o que regenera este importante agente antioxidante endógeno. Seu benefício após 24h da ingestão tóxica não foi estabelecido. A dose oral recomendada é de 140 mg/kg inicialmente, seguida por doses de manutenção de 70 mg/kg a cada 4h, durante 72h. Também é possível utilizar um protocolo de administração endovenosa da NAC, que consiste numa etapa de infusão rápida de 150 mg/kg em 60min, seguida de infusão 50 mg/kg ao longo de 4h e, por fim, 6,25 mg/kg/h em 16h. A principal desvantagem da via endovenosa é que 10–20% dos indivíduos desenvolvem reação anafilactoide quando o fármaco é feito por esta via. Em pacientes medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina desenvolvem reação anafilactoide quando o fármaco é feito por esta via. Em pacientes gravemente enfermos (falência hepática franca,vômitos incoercíveis, íleo paralítico), esta pode ser a única maneira de administrar a NAC. De forma geral, pacientes com intoxicação aguda por paracetamol que são tratados a tempo conseguem se recuperar por completo, sem qualquer lesão hepática residual. ESQUEMA RIPEESQUEMA RIPE Três drogas do esquema RIPE (Rifampicina, Isoniazida e Pirazinamida) apresentam potencial para lesão hepática aguda. A associação isoniazida + rifampicina tem sinergismo hepatotóxico. Das três, a isoniazida é a mais estudada. Essa droga tem um metabólito chamado acetil- hidrazina — o verdadeiro responsável pela lesão hepática, formado pelo sistema do citocromo P450. As drogas indutoras deste sistema enzimático, como a rifampicina, aumentam os níveis do metabólito, aumentando a chance de hepatotoxicidade. Os indivíduos acetiladores lentos são mais suscetíveis ao acúmulo desse metabólito, pois a sua transformação para a substância atóxica diacetil-hidrazina está lentificada. A isoniazida isoladamente pode induzir um leve aumento das aminotransferases em 10–20% dos casos, surgindo geralmente nas primeiras semanas do tratamento. Essa elevação reflete uma hepatite focal transitória. Entretanto, cerca de 1% dos pacientes que tomam a droga desenvolvem lesão hepática grave, cuja histopatologia é muito semelhante à da hepatite aguda viral. Esse tipo de hepatite costuma ocorrer dentro dos primeiros 2–3 meses do uso da droga, manifestando-se com mal-estar, anorexia, náuseas e vômitos. A icterícia chama atenção. O quadro laboratorial é típico de uma lesão hepatocelular (elevação das aminotransferases). Alguns pacientes podem evoluir com hepatite crônica e até mesmo cirrose hepática. A hepatotoxicidade pela isoniazida é mais frequente em pessoas com mais de 50 anos de idade. Quando o paciente está em uso do esquema RIPE, um aumento de até 250 UI/ml das aminotransferases, estável ou em involução, não justifica a suspensão das drogas. Porém, se houver icterícia ou elevação de aminotransferases acima desses níveis, a conduta deve ser suspender todo o esquema RIPE e introduzir droga por droga, com intervalo de quatro dias. Será que é hepatotoxicidade da pirazinamida? Se não for, provavelmente trata-se de lesão hepática propiciada pelo sinergismo entre isoniazida + rifampicina. AMIODARONAAMIODARONA Diversos pacientes que recebem amiodarona apresentam discretos aumentos dos níveis séricos de aminotransferases, que se podem normalizar mesmo com a continuação da terapia, acompanhados de ingurgitação dos lisossomos com fosfolipídios. 1 a 3% dos pacientes que recebem amiodarona desenvolvem lesão hepática mais grave, que se assemelha, medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina recebem amiodarona desenvolvem lesão hepática mais grave, que se assemelha, histologicamente, à hepatite alcoólica aguda, com infiltração gordurosa dos hepatócitos, necrose focal, fibrose, infiltrados de leucócitos Polimorfonucleares (PMN) e corpúsculo de Mallory. Essa lesão, também conhecida como esteato-hepatite não alcoólica, pode progredir para cirrose micronodular com hipertensão porta e insuficiência hepática. Tal lesão pseudoalcoólica e sua progressão para cirrose ocorrem, geralmente, de modo clinicamente insidioso, com elevação mínima dos níveis séricos de aminotransferases. Hepatomegalia pode ser encontrada, porém icterícia é rara. As evidências de hepatotoxicidade podem persistir por vários meses após a interrupção do fármaco. A biópsia hepática se mostra útil no estabelecimento do diagnóstico, devendo ser considerada em pacientes em uso de amiodarona que desenvolvem elevações persistentes ou significativas (mais de duas vezes) dos níveis séricos de aminotransferases ou hepatomegalia. A decisão de suspender a amiodarona, quando há evidências histológicas de hepatotoxicidade é frequentemente difícil em pacientes que foram tratados com amiodarona após fracasso de outras medicações menos tóxicas, sobretudo se o uso de cardioversor/desfibrilador implantado automático não for apropriado. ALFAMETILDOPAALFAMETILDOPA Até 6% dos pacientes tratados com este agente anti-hipertensivo desenvolvem alterações assintomáticas nas provas de função hepática. A hepatotoxicidade clinicamente óbvia, que habitualmente se assemelha à hepatite viral aguda ou à hepatite ativa crônica, é muito menos comum e surge, em geral, nas 20 semanas após o início da administração de metildopa. O teste de Coombs pode se tornar positivo nos usuários desse fármaco, porém não se correlaciona com o desenvolvimento de lesão hepática. Além disso, as manifestações clínicas de hipersensibilidade medicamentosa são incomuns na hepatopatia induzida por metildopa, que pode ser mediada por um metabólito tóxico do fármaco. Em geral, a hepatite regride quando o fármaco é interrompido; entretanto, a recuperação pode ser retardada de vários meses e, em alguns casos, ocorre progressão para um desfecho fatal a despeito da interrupção do medicamento. AMOXICILINA + ÁCIDO CLAVULÂNICOAMOXICILINA + ÁCIDO CLAVULÂNICO A amoxicilina em si tem pouco potencial hepatotóxico; todavia, em combinação com o inibidor da �-lactamase (ácido clavulânico), produz lesão hepática colestática, cujas manifestações frequentemente surgem várias semanas após o término do tratamento. Os homens idosos são afetados com mais frequência. A icterícia constitui uma característica consistente, e o exame histológico do fígado revela colestase com necrose ou inflamação mínima. As manifestações de hipersensibilidade são incomuns. A evolução clínica tem sido benigna na maioria dos casos, com recuperação completa em quatro a seis meses. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ERITROMICINAERITROMICINA Seu uso pode ser complicado pelo desenvolvimento de uma reação colestática com componentes de infiltração das células inflamatórias e necroses dos hepatócitos. Na maioria dos casos, essa reação é observada com o estolato de eritromicina, enquanto as outras eritromicinas, como o etilsuccinato e o lactobionato, implicadas com menos frequência. Tipicamente, a hepatotoxicidade se manifesta como síndrome aguda de dor no hipocôndrio direito, febre e sintomas colestáticos variáveis. O quadro clínico pode imitar bastante o da colecistite aguda ou colangite e, em alguns casos, exige exploração cirúrgica. O prognóstico é sempre excelente, porém a reação pode sofrer recidiva alguns dias após a readministração do fármaco. HALOTANOHALOTANO Esse anestésico raramente provoca uma reação semelhante à hepatite viral e, nos casos graves, pode progredir para necrose hepática maciça fatal. A suscetibilidade à hepatite por halotano parece ser aumentada em indivíduos idosos, mulheres e indivíduos obesos; em geral, ocorrem reações graves após exposições anteriores ou múltiplas a esse anestésico. Os sintomas surgem de sete a dez dias após a anestesia; esse intervalo pode ser reduzido após exposição repetida. A febre com calafrios e sudorese, precede comumente o início da icterícia. A evolução pode levar à morte em alguns dias, ou pode ocorrer recuperação rápida e completa. Alguns pacientes têm uma evolução mais prolongada antes da sua recuperação ou do desenvolvimento de insuficiência hepática. Os metabólitos do halotano formados pelo sistema do citocromo P450 são claramente importantes no mecanismo da lesão hepática. Alguns desses metabólitos podem ser diretamente tóxicos, outros podem formar haptenos com as proteínas da membrana celular, provocando um ataque ao fígado imunologicamente mediado. Pode ocorrer sensibilização cruzada entre o halotano, o metoxiflurano e o enflurano, embora a lesão hepática pareça ser menos comum com os dois últimos agentes anestésicos. FENITOÍNAFENITOÍNA Este anticonvulsivante pode estar raramente associado a um quadro de injúria hepática grave, semelhante à hepatite viral (em termos de histopatológico e laboratório), porém, cursando também com sinais proeminentes de "hipersensibilidade" (do tipo "doença do soro"). Os sintomas começam dentro de seis semanas do seu uso, apresentando-se com mal-estar, febrealta, linfadenopatia e rash cutâneo. O hemograma revela leucocitose neutrofílica, linfocitose atípica e eosinofilia. A hepatite difere da hepatite viral aguda apenas por conter eosinófilos no infiltrado portal. A predisposição à hepatotoxicidade pela fenitoína é geneticamente predeterminada — uma incapacidade inata de metabolizar os óxidos arenos altamente reativos medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina predeterminada — uma incapacidade inata de metabolizar os óxidos arenos altamente reativos provenientes da biotransformação do fármaco. ÁCIDO VALPROICOÁCIDO VALPROICO Este anticonvulsivante de amplo espectro é utilizado no tratamento do pequeno mal e no grande mal epilépticos. A hepatotoxicidade pode ser grave, especialmente em crianças com idadeclínicas diferentes de tirosinemia hereditária (tipos 1, 2 e 3), um erro inato do medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Existem três formas clínicas diferentes de tirosinemia hereditária (tipos 1, 2 e 3), um erro inato do metabolismo , de caráter autossômico recessivo, causado por mutações nos genes envolvidos com o catabolismo da tirosina, que resulta em níveis séricos aumentados desse aminoácido... O tipo 1 ( tirosinemia hepatorrenal — a forma mais grave de todas) é o que nos interessa aqui, por acometer o fígado... A enzima deficiente, neste caso, é a Fumarilacetoacetato Hidrolase (FAH), que normalmente se localiza nos hepatócitos e células do túbulo proximal, justificando seu quadro clínico ser caracterizado por lesão hepática crônica (que evolui para cirrose) e lesão tubular renal (que evolui com disfunção completa do túbulo proximal, gerando a síndrome de Fanconi ). Tais lesões são decorrentes do acúmulo intracelular de substratos tóxicos que seriam metabolizados pela FAH. As manifestações clínicas tendem a ser precoces, com o paciente apresentando hepatomegalia, baixo ganho ponderoestatural e elevados níveis séricos de tirosina já na primeira infância. Se não reconhecida e tratada pode levar à falência hepática no segundo ano de vida ou — nos sobreviventes — gera cirrose hepática e carcinoma hepatocelular ainda na infância. O diagnóstico é feito pela documentação da presença de ácidos orgânicos na urina, particularmente a substância Succinilacetona (SA), que é patognomônica da tirosinemia hereditária tipo 1. O padrão-ouro para confirmação do diagnóstico é a cultura de fibroblastos cutâneos, com demonstração de baixa atividade da FAH. Atualmente existe um tratamento específico: a nitisinona (previamente chamada de NTBC). Usuários desse medicamento devem complementar a estratégia terapêutica, fazendo restrição dietética de fenilalanina e tirosina. Casos refratários (ou aqueles que evoluem com cirrose hepática/carcinoma hepatocelular) devem ser manejados com transplante ortotópico de fígado. FIBROSE CÍSTICAFIBROSE CÍSTICA A fibrose cística é uma doença genética autossômica recessiva causada por mutações no gene do CFTR ( Cystic Fibrosis Transmembrane Conductance R egulator ), uma proteína transmembrana responsável pelo transporte de cloreto para as secreções exócrinas de vários órgãos. Esses pacientes produzem secreções espessas e viscosas no pulmão, pâncreas, fígado (neste caso, a bile), intestino e trato reprodutivo, podendo, por este motivo, desenvolver lesão crônica de um ou todos esses órgãos. A cirrose hepática é responsável por virtualmente todas as mortes de causa não pulmonar em pacientes com fibrose cística! O acúmulo de material eosinofílico amorfo nos pequenos ductos biliares gera uma reação inflamatória progressiva que culmina em Cirrose Biliar Focal (CBF). A CBF pode evoluir para cirrose biliar multilobular. A cirrose biliar também pode surgir em decorrência da obstrução persistente do colédoco terminal por fibrose da cabeça do medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina surgir em decorrência da obstrução persistente do colédoco terminal por fibrose da cabeça do pâncreas. A obstrução do ducto cístico, encontrada em 15–20% dos pacientes, pode causar atrofia da vesícula biliar. Outras lesões hepatobiliares comuns incluem: esteatose hepática; colestase neonatal (30% dos casos); colangite esclerosante; colelitíase (principalmente à custa de bilirrubinato de cálcio); e colecistite litiásica. A função hepática é preservada e o paciente se mantém sem sinais de insuficiência hepatocelular até que a obstrução dos ductos biliares culmine em hipertensão porta e substituição fibrótica substancial do parênquima hepático. O Ácido Ursodesoxicólico (UDCA) em altas doses melhora a bioquímica hepática e o estado nutricional dos pacientes (fornece proteção contra ácidos biliares que se acumulam em doses tóxicas no interior do sistema canalicular), embora seu benefício seja incerto em termos de melhora de sobrevida. A hipertensão porta pode ser tratada com escleroterapia, derivações cirúrgicas ou transplante hepático. A terapia gênica poderá ser usada no futuro no sentido de prevenir as complicações hepatobiliares da fibrose cística. ATRESIA CONGÊNITA DAS VIAS BILIARESATRESIA CONGÊNITA DAS VIAS BILIARES Na população caucasiana, a atresia congênita das vias biliares extra-hepáticas surge em 1:13.000 a 1:8.000 nascimentos, com incidência equivalente entre os sexos. O padrão de anormalidade mais comum é a atresia completa de todas as estruturas biliares extra-hepáticas. Atualmente, se acredita que a etiologia da doença seja multifatorial (genética, autoimune, infecciosa). Outras malformações congênitas, notadamente as vasculares, surgem em 20–30% dos casos. A associação mais comum é a síndrome de poliesplenia : situs inversus , veia porta pré-duodenal, interrupção da veia cava inferior, poliesplenia e fígado deslocado para a linha média. Clinicamente , manifesta-se por icterícia tipicamente iniciada após duas a três semanas de vida, embora possa surgir mais precocemente. Hipocolia fecal, hepatomegalia, esplenomegalia, prurido, baqueteamento digital, xantomas, rosário raquítico e insuficiência de crescimento compõem o quadro. Ascite e hemorragia por hipertensão porta são eventos tardios. Os testes hepáticos revelam aumento das enzimas colestáticas e discreto aumento de aminotransferases. A USG sugere o diagnóstico e a biópsia hepática pode diferenciar causas de colestase intra- hepática da atresia biliar extra-hepática em mais de 90% dos casos. Naqueles casos em que o diagnóstico não pode ser definido até 60 dias de vida, a laparotomia exploradora com biópsia hepática e colangiografia peroperatória se torna necessária. Na ausência de tratamento adequado, a insuficiência hepática causa a morte da criança entre medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Na ausência de tratamento adequado, a insuficiência hepática causa a morte da criança entre 18–24 meses de idade. A estratégia cirúrgica de correção, tradicionalmente indicada, é o procedimento de Kasai (hepatoportoenterostomia), o qual deverá ser realizado o mais precocemente possível (seis a dez semanas de vida). O sucesso desta técnica, em crianças com mais de quatro meses de idade, é bastante incomum. Neste caso e nos casos que evoluem com cirrose biliar terminal, o transplante deve ser considerado (a sobrevida em cinco anos é de 60– 80%). CISTOS DE COLÉDOCOCISTOS DE COLÉDOCO Os cistos de colédoco respondem por 2–5% das colestases extra-hepáticas neonatais, principalmente nos países asiáticos. Suas manifestações clínicas, laboratoriais e histológicas são indistinguíveis dos achados na atresia biliar. Na verdade, os cistos sintomáticos neonatais são geralmente associados à atresia do colédoco. Eventualmente, pode-se palpar uma massa subepática, a qual deve motivar a confirmação diagnóstica através de USG. Icterícia obstrutiva, colangites de repetição e dor abdominal são comuns. Uma vez que 5–15% dos cistos sofrem degeneração maligna na vida adulta, a excisão precoce do cisto é mandatória. A técnica cirúrgica de escolha é a excisão com anastomose coledocojejunal. COLESTASE INTRA-HEPÁTICA FAMILIAR PROGRESSIVACOLESTASE INTRA-HEPÁTICA FAMILIAR PROGRESSIVA A colestase intra-hepática familiar progressiva (sigla em inglês, PFIC), também chamada de doença de Byler, é uma doença de herança autossômica recessiva que constitui a segunda causa mais frequente de colestase intra-hepática familiar, perdendo somente para a síndrome de Alagille (ver a seguir). A PFIC se inicia nos primeiros 6–12 meses de idade, com icterícia de intensidade variável, prurido intenso e persistente, colúria e hipocolia fecal. Há hepatomegalia com ou sem esplenomegalia. Em consequência da colestase crônica, surgem deficit de crescimento, síndrome de má absorção, deficiência de vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K). Não há tratamento que evite a evolução da doença: a maioria dos afetados evolui com cirrose e insuficiênciahepática, necessitando de transplante. RAREFAÇÃO DE DUCTOS BILIARES INTERLOBULARESRAREFAÇÃO DE DUCTOS BILIARES INTERLOBULARES (RDBIL)(RDBIL) A RDBIL pode ser subdividida didaticamente em duas formas: a forma sindrômica ( síndrome d e Alagille ) — associada a várias outras malformações congênitas — e a variedade não sindrômica — caracterizada pela presença isolada de colestase intra-hepática congênita sem anomalias extra-hepáticas. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina anomalias extra-hepáticas. A síndrome de Alagille constitui a causa mais comum de colestase intra-hepática familiar, sendo também chamada de displasia artério-hepática. É uma doença autossômica dominante que acomete mais comumente crianças do sexo masculino, as quais geralmente nascem pequenas para a idade gestacional. As principais manifestações clínicas da síndrome são: ● Fácies típico: fronte e orelhas proeminentes, olhos fundos e com hipertelorismo e hipognatismo; ● Voz estridente e aguda; ● Colestase com icterícia variável, prurido (com três a seis meses de vida) e xantomas tardios. As enzimas hepáticas estão elevadas e as aminotransferases discretamente aumentadas, com síntese hepática preservada; ● Cardiopatias congênitas, principalmente estenose de um ramo periférico da artéria pulmonar ou estenose da valva pulmonar. Outras anomalias que podem surgir incluem defeito de septo atrial, coarctação da aorta e tetralogia de Fallot; ● Defeitos do arco vertebral, com fusão incompleta de corpos vertebrais ou do arco anterior (deformidade em borboleta); ● Anomalias oculares, notadamente o embriotoxon posterior; ● Anomalias renais: rins displásicos, ectasia tubular renal, rim único, hematúria; ● Alterações neurológicas e retardo mental: arreflexia, ataxia e oftalmoplegia, associadas à deficiência de vitamina E; ● Hipogonadismo com micropênis. O tratamento da RDBIL é baseado no suporte nutricional com reposição de vitaminas lipossolúveis e no uso de Ácido Ursodesoxicólico (UDCA). São alternativas a colestiramina e o fenobarbital. O prognóstico é melhor na variante sindrômica. Nesta, apenas 30–40% desenvolvem complicações graves da doença, o que ocorre em mais de 70% dos portadores da forma não sindrômica, os quais frequentemente evoluem com cirrose hepática. Na síndrome de Alagille, a sobrevida adulta com mínima fibrose é comum, embora muitos casos de carcinoma hepatocelular tenham sido descritos. Nesta síndrome, nos poucos casos cuja colestase grave torna-se fator limitante da sobrevida, o transplante hepático pode ser realizado. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina APÊNDICEAPÊNDICE TRANSPLANTE HEPÁTICOTRANSPLANTE HEPÁTICO INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO Foi em 1963 que Starzl e seu grupo realizaram o primeiro transplante hepático com sucesso em seres humanos. No início, é claro, os resultados não eram tão bons como são atualmente. Hoje em dia, com a evolução da técnica cirúrgica, a experiência dos cirurgiões e com a terapia imunossupressora, o transplante hepático oferece uma sobrevida de > 90% em um ano, 85– Dúvidas Acadêmicas do CapítuloTESTE SEU CONHECIMENTOConfira as dúvidas acadêmicas do capítulo clicando aqui _ Fig. 1: Este paciente com cirrose alcoólica descompensada respeitou o critério de ficar sem beber há > 6 meses e recebeu um transplante ortotópico de fígado ("um fígado novo no lugar do velho, que foi removido"). Observe à esquerda o preparo do fígado retirado do doador cadavérico e, abaixo, o aspecto final da cirurgia, com o enxerto bem vascularizado, mostrando sinais de vitalidade tecidual. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina imunossupressora, o transplante hepático oferece uma sobrevida de > 90% em um ano, 85– 90% em cinco anos e 60% em dez anos. Sem o transplante, estes pacientes teriam a sobrevida contada em poucos meses. Neste capítulo, estudaremos resumidamente as indicações, tipos e complicações relacionadas ao transplante hepático... INDICAÇÕES DO TRANSPLANTEINDICAÇÕES DO TRANSPLANTE O paciente candidato ao transplante deve ter uma doença hepática avançada, progressiva e irreversível. Deve ter uma qualidade de vida bastante comprometida pela hepatopatia, com expectativa de vida inferior a um ano. CRITÉRIOS DE SELEÇÃOCRITÉRIOS DE SELEÇÃO Nos EUA, a procura é bem maior que a oferta, problema também observado em outros transplantes de órgãos sólidos. Em média, naquele país, os pacientes com cirrose avançada esperam de 6–12 meses para ganhar um fígado novo. É a chamada "fila do transplante". O critério de seleção não é dado simplesmente pela ordem de chegada, mas sim pela gravidade da doença: quanto menor a expectativa de sobrevida, mais rapidamente o indivíduo é alocado para receber o transplante. Por exemplo, na insuficiência hepática fulminante e em casos selecionados de hepatocarcinoma, o transplante tem que ser realizado de imediato, enquanto os cirróticos crônicos toleram esperar mais tempo. A indicação de transplante hepático deve ser decidida por uma junta multidisciplinar, em conjunto com o paciente e sua família. Os riscos do procedimento e a necessidade de imunossupressão para o resto da vida são dados que devem ser ponderados. O critério atualmente adotado para alocar pacientes na fila do transplante hepático é o escore MELD ( Model for End-Stage Liver Disease ) , mais simples e com melhor capacidade de prever a sobrevida dos hepatopatas. Tal escore se baseia em apenas três variáveis: bilirrubina, INR e creatinina . O paciente adulto poderá ser inscrito na lista nacional de transplante de fígado quando seu MELD for maior ou igual a 11 . Hoje em dia, o MELD substituiu os antigos status de prioridade, sem, entretanto, modificar certas diretrizes básicas, como a necessidade de se transplantar rapidamente uma hepatite fulminante e um hepatocarcinoma curável. Veja como funciona o MELD ( ).Tabela 1 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Tab. 1 Escore MELD (cálculo) ● 3,78 x log e (bilirrubina) + 11,2 x log e (INR) + 9,57 x log e (creatinina) + 6,43*. *A constante 6,43 é desconsiderada nos casos de cirrose alcoólica ou cirrose biliar (primária ou secundária). Obs.: log e = logaritmo neperiano (presente em qualquer calculadora científica). ● No Brasil, o paciente entra na lista de transplante hepático quando seu MELD é ≥ 11. Você pode calcular o MELD no seguinte site: www.unos.org/resources . É óbvio que você não precisa decorar a fórmula, mas é importante conhecer suas variáveis... Os pacientes com diagnóstico de hepatocarcinoma recebem inicialmente 20 pontos no MELD, com elevação progressiva com o passar do tempo. Os portadores de hepatocarcinoma podem receber um transplante hepático somente se obedecerem aos critérios de Milão : (1) lesão única ≤ 5 cm; (2) lesões múltiplas (até três), todas menores que 3 cm; e (3) ausência de metástases a distância ou invasão do pedículo vascular hepático. INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕESINDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES Quanto à etiologia da hepatopatia, teoricamente, qualquer causa de cirrose hepática pode ser incluída na lista das indicações de transplante. De uma forma geral, os resultados são melhores na cirrose alcoólica, na colangite biliar primária e na cirrose secundária à colangite esclerosante. Contraindicações absolutas ao transplante incluem: tumores aparentemente incuráveis pelo transplante (doença hepática metastática, colangiocarcinoma), não adesão à abstinência alcoólica, infecções não controladas, doenças extra-hepáticas limitadoras de vida, entre outras. Veja na as principais indicações e contraindicações ao transplante hepático. Fatores que atrapalham o resultado do transplante, mas não o inviabilizam, são considerados contraindicações relativas: idade > 70 anos, anastomose porto-cava prévia, cirurgia hepatobiliar complexa prévia, trombose da veia porta, retransplante, transplante de múltiplos órgãos, insuficiência renal, obesidade, HIV positivo ainda não na fase aids, incompatibilidade CMV etc. Tab. 2 Indicações de Transplante HepáticoAdultos Crianças Tabela 2 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Crianças ● Hepatite crônica com cirrose (viral, autoimune, doença de Wilson, hemocromatose, NASH). ● Cirrose alcoólica. ● Cirrose biliar primária. ● Colangite esclerosante com cirrose. ● Cirrose criptogênica. ● Trombose de veia hepática (Budd-Chiari). ● Hepatite fulminante. ● Adenoma hepático. ● Câncer primário do fígado. ● Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF). ● Doença de Caroli. ● Metástases hepáticas irressecáveis de tumor neuroendócrino com tumor primário ressecado ou indetectável. ● Atresia biliar (causa mais comum de transplante hepático em crianças). ● Fibrose hepática congênita. ● Doença de Alagille. ● Doença de Byler. ● Deficiência de alfa-1-antitripsina. ● Doença de Wilson. ● Tirosinemia. ● Doença de Crigler-Najjar tipo I. Contraindicações ao Transplante Hepático ● medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Colangiocarcinoma. ● Doença sistêmica ameaçadora à vida. ● Sepse ativa, não tratada. ● Infecção extra-hepatobiliar não controlada. ● Doença metastática para o fígado (exceto alguns tumores neuroendócrinos). ● Câncer extra-hepatobiliar. ● Aids (contraindicação relativa na atualidade). ● Uso de álcool ou drogas nos últimos seis meses. ● Anomalias congênitas incorrigíveis e limitantes. ● Doença cardiopulmonar avançada. TIPOS DE TRANSPLANTE HEPÁTICOTIPOS DE TRANSPLANTE HEPÁTICO Transplante hepático ortotópico : é o tipo mais utilizado na prática. Refere-se à retirada do fígado doente, seguida do transplante de um fígado inteiro do doador, neste caso, um doador cadavérico (morto). A coleta do fígado cadavérico é realizada por equipe cirúrgica especializada em captação de fígado. O doador deve ter morte cerebral documentada. Adiante veremos os critérios de seleção do doador... Transplante hepático heterotópico : refere-se ao transplante de um fígado novo em um outro sítio anatômico, mantendo-se o fígado do receptor. Esta técnica pode ser usada em casos de insuficiência hepática fulminante, quando existe uma chance de recuperação do fígado doente. Transplante de fígado reduzido : refere-se à retirada do fígado doente, seguida do transplante de uma parte do fígado do doador (lobo esquerdo ou lobo direito). Neste caso, o doador pode ser cadavérico ou vivo. Um dos principais problemas do transplante de órgãos é o fato de a demanda ser muito maior do que a oferta. Por isso, muita gente morre na "fila do transplante", simplesmente pela indisponibilidade de um doador no momento em que se mais precisa. No caso do transplante medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina hepático, algumas estratégias estão sendo criadas para minimizar este problema. Vejamos quais... TRANSPLANTE INTERVIVOSTRANSPLANTE INTERVIVOS Essa técnica, teoricamente, só é possível em transplantes de órgãos duplos, como os rins. Entretanto, devido a sua alta capacidade regenerativa, pode-se retirar um lobo hepático de uma pessoa viva e transplantar no paciente que precisa receber um fígado novo. No caso dos adultos , o transplante do lobo hepático direito (o maior lobo hepático) é suficiente para garantir uma plena função hepática no receptor; no caso da criança , o transplante do lobo esquerdo costuma funcionar bem. A o aceitar doadores vivos (neste caso, aparentados), a disponibilidade de órgãos torna-se maior. A principal desvantagem do transplante intervivos é a possibilidade de complicações da cirurgia de retirada no doador, com taxas de 5% de complicações biliares; 10–20% de hérnia incisional; sem falar da infecção da ferida operatória; obstrução intestinal e ainda com uma mortalidade registrada de 0,2–0,4%. O doador vivo precisa ainda se afastar do trabalho por uma média de dez semanas. Outro problema é o risco maior de complicações biliares (15–30%) e vasculares (10%) no receptor, já que este receberá parte de um fígado, em vez de um fígado inteiro, dificultando a técnica das anastomoses vasculares e biliares. Mesmo assim, o transplante intervivos tem sido cada vez mais realizado... TRANSPLANTE DO TIPO "SPLIT LIVER"TRANSPLANTE DO TIPO "SPLIT LIVER" Neste caso, o fígado de um cadáver pode beneficiar dois receptores: um adulto recebe o lobo direito; e uma criança, o lobo esquerdo. TRANSPLANTE EM "DOMINÓ"TRANSPLANTE EM "DOMINÓ" É um tipo raramente utilizado. Nesta estratégia, um paciente recebe um transplante hepático e o seu próprio fígado, que foi retirado, é transplantado num outro receptor. O seu primeiro pensamento foi: mas se o primeiro precisou de um transplante hepático, é porque o seu fígado era doente — como este fígado pode ser aproveitado por outra pessoa? A explicação é a seguinte: só existe uma doença em que isso pode ser feito — a polineuropatia amiloide familiar ... Esta doença é de herança autossômica dominante, ocorrendo medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina amiloide familiar ... Esta doença é de herança autossômica dominante, ocorrendo principalmente em Portugal ("doença dos pezinhos"), mas também no Brasil, Argentina, Suécia e Japão. Nela, o fígado produz um mutante da proteína transtirretina que possui propriedades amiloidogênicas, isto é, a capacidade de se depositar irreversivelmente nos tecidos, em especial os nervos periféricos, sob a forma de fibrilas amiloides. O único tratamento possível é o transplante hepático, que pode curar a doença, caso contrário, a morte ocorrerá numa média de 15–20 anos depois do diagnóstico. Como a deposição ocorre de forma muito lenta, a doença só começa a se manifestar cerca de 30–40 anos depois. Agora, entenda o "transplante dominó": um paciente com polineuropatia amiloide familiar recebe um fígado transplantado, enquanto o seu fígado retirado é doado a outro receptor. Este fígado é normal do ponto de vista anatômico e funcional — o seu único defeito é produzir a transtirretina amiloidogênica. Como demora 30–40 anos para o desenvolvimento da polineuropatia, o receptor deste fígado terá uma vida normal durante todo este período. Portanto, o "transplante dominó" pode beneficiar pacientes hepatopatas graves, mas que apresentam uma sobrevida média limitada por outros fatores, como doença cardiovascular extensa ou idade avançada... SELEÇÃO DO DOADORSELEÇÃO DO DOADOR O doador cadavérico deve estar comprovadamente em morte cerebral, sem ter evoluído com instabilidade hemodinâmica ou respiratória mal controladas, ou sepse grave. Além disso, deve ter as provas de função hepática adequadas e, idealmente, a sorologia para vírus B e C negativas. Obviamente, o anti-HIV tem que ser negativo... O grupo sanguíneo ABO deve ser compatível, como se fosse uma transfusão de sangue. Curiosamente, o sistema HLA não precisa ser compatível, já que o enxerto hepático é pouco imunogênico quando comparado ao rim (é claro que não tão pouco imunogênico a ponto de prescindir da terapia imunossupressora). TÉCNICA CIRÚRGICATÉCNICA CIRÚRGICA A cirurgia do transplante hepático é um dos procedimentos mais difíceis da cirurgia abdominal, exigindo ampla experiência e treinamento específico do cirurgião. Nos grandes centros, esta cirurgia tem sido realizada com uma mortalidade operatória de 5–7% . medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina O pós-operatório deve ser sempre feito numa UTI, observando-se a recuperação da função hepática e tratando qualquer tipo de complicação (ver adiante). O tempo cirúrgico médio é de oito horas. A perda de sangue é variável, desde mínima até maciça. As estruturas hilares e a veia cava, acima e abaixo do fígado, são dissecadas. Os vários vasos são grampeados e seccionados para permitir a remoção do fígado. Durante o implante do novo fígado, deve-se interromper a circulação no território esplâncnico e da veia cava, durante o qual uma derivação venovenosa pode ser instalada para prevenir a congestão da metade inferior do corpo (as cânulas são colocadas na veia cava inferior, via veia femoral e na veia porta, desviando o sangue para a veia subclávia).Durante esta fase operatória, o organismo do paciente não conta com a função hepática: fase anepática . O anestesista deve estar preparado para contornar possíveis complicações nesta fase... O líquido de conservação é drenado do enxerto, e as anastomoses começam a ser confeccionadas. Estas últimas são a parte mais complicada da cirurgia e são realizadas na seguinte ordem: veia cava supra-hepática, veia cava infra-hepática, veia porta, artéria hepática e sistema biliar. Essas anastomoses são feitas diretamente e são terminoterminais. Um dreno de Kehr deve ser colocado na via biliar. É fundamental que o cirurgião conheça as variações anatômicas, especialmente as do sistema arterial e do sistema biliar . Estas variações podem tornar a anastomose tecnicamente complicada. IMUNOSSUPRESSÃOIMUNOSSUPRESSÃO O grande avanço nos resultados em curto e longo prazos com o transplante hepático advém do surgimento dos inibidores da calcineurina. O primeiro a ser usado foi a ciclosporina e depois surgiu o tacrolimo . Essas drogas agem basicamente nos linfócitos T helper, inibindo a calcineurina, proteína importante para a função de fatores de transcrição gênica, implicados na produção de citocinas. O resultado é a inibição da síntese dessas citocinas, em especial a Interleucina-2 (IL-2), implicada na ativação e proliferação de linfócitos e monócitos. Este efeito é capaz de evitar, ou pelo menos reduzir, a incidência da rejeição ao fígado transplantado. Existem vários protocolos diferentes para a imunossupressão pós-transplante hepático! Não vamos entrar aqui em pormenores sobre este tópico, porém cumpre ressaltar que a maioria desses protocolos emprega uma imunossupressão mais agressiva no pós-transplante imediato (ex.: corticoide + ciclosporina + tacrolimo + micofenolato + azatioprina durante o primeiro mês), desmamando medicações (ex.: ao longo dos primeiros seis meses) até que o paciente se mantenha em uso apenas da combinação de ciclosporina e tacrolimo , na menor dose possível, medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina por longo prazo. O principal efeito adverso da ciclosporina e do tacrolimo é a nefrotoxicidade , levando à insuficiência renal aguda por vasoconstrição renal e necrose tubular aguda. Apesar de o tacrolimo ser um imunossupressor mais moderno e potente, está mais associado a efeitos colaterais. A lesão renal pode reverter com a redução da dose ou com a suspensão do medicamento. O monitoramento dos níveis séricos pode ajudar a prevenir a complicação. Outros efeitos adversos relatados são: neurotoxicidade (cefaleia, borramento visual, crise epiléptica, encefalopatia, tremores, mutismo acinético), crise hipertensiva e hiperglicemia/ diabetes mellitus. As infecções oportunistas podem ocorrer, destacando-se a citomegalovirose e a pneumocistose. O SMX-TMP em dose profilática está indicado para prevenção da pneumocistose, assim como o uso de aciclovir, ganciclovir ou valganciclovir profiláticos para CMV. O uso de fluconazol oral também pode ser feito nas primeiras seis semanas do pós-transplante para evitar infecções fúngicas. Ao longo dos próximos anos, há um aumento do risco de linfoma não Hodgkin de células B, geralmente associado ao vírus Epstein-Barr. COMPLICAÇÕES DO TRANSPLANTECOMPLICAÇÕES DO TRANSPLANTE NÃO FUNCIONAMENTO DO ENXERTONÃO FUNCIONAMENTO DO ENXERTO Ocorre em 5 % dos casos, entre as primeiras 24–48h e está relacionado à conservação inadequada do enxerto, geralmente um tempo de esfriamento longo (> 20–30h) ou um tempo prolongado de isquemia, por complicações hemodinâmicas. Já podemos suspeitar deste diagnóstico durante o ato operatório: o primeiro sinal de funcionamento do enxerto é a produção de bile! Assim, quando o fígado recém-transplantado não apresentar produção imediata de bile, deve-se considerar a falência primária do enxerto e listar o paciente para o retransplante. Enquanto este não for feito, o quadro será semelhante ao de uma insuficiência hepática fulminante, com elevada morbimortalidade. COMPLICAÇÕES TÉCNICASCOMPLICAÇÕES TÉCNICAS As complicações vasculares são mais comuns nas crianças e podem ser a trombose da artéria hepática ou da veia porta. A trombose arterial pode causar febre, elevação das aminotransferases e, eventualmente, isquemia e necrose do enxerto. É diagnosticada por métodos de imagem como USG-Doppler, angio-RM ou mesmo arteriografia. O tratamento pode ser feito por trombólise química, angioplastia percutânea ou reanastomose cirúrgica. As complicações biliares estão associadas ao extravasamento de bile pela anastomose. Podem medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina As complicações biliares estão associadas ao extravasamento de bile pela anastomose. Podem s e r diagnosticadas pela colangiografia e tratadas por inserção de stent ou reconstrução cirúrgica. Em ambos os casos, a falência dos tratamentos de resgate pode indicar o retransplante . REJEIÇÃO AGUDA E CRÔNICAREJEIÇÃO AGUDA E CRÔNICA Embora o fígado seja um órgão privilegiado imunologicamente em relação ao transplante, talvez pelo fato de os hepatócitos carregarem menos antígenos de superfície, os episódios de rejeição de fato acontecem, especialmente a rejeição aguda. A rejeição aguda ocorre em 25–50% dos casos, geralmente entre 5–20 dias após o transplante. A rejeição aguda não tem um efeito adverso sobre a sobrevida do paciente ou do enxerto, exceto os casos mais graves. A complicação se manifesta com febre, taquicardia, hepatomegalia dolorosa, elevação das aminotransferases e icterícia. O INR pode se elevar. O diagnóstico deve ser confirmado pela biópsia hepática, que irá revelar a tríade clássica da inflamação portal linfocítica, lesão dos ductos biliares e inflamação subendotelial das vênulas porta e vênulas hepáticas (endotelite). Pelos critérios histopatológicos, a rejeição aguda é classificada em leve (A1), moderada (A2) e grave (A3). Os casos graves podem contribuir para a morte precoce do paciente e necessidade de retransplante. O tratamento é eficaz em 90% dos casos. Deve ser feito com pulsoterapia, com metilprednisolona 1 g/dia por três dias. Os casos não responsivos devem ser resgatados com a imunoglobulina antitimócito (OKT3). Recentemente, foram introduzidos os agentes biológicos daclizumabe e basiliximabe, anticorpos monoclonais que inibem o receptor de IL-2. A rejeição crônica é um processo insidioso, observada atualmente em 1–4% dos casos, pela melhora da terapia imunossupressora de manutenção (antigamente, na década de 80, era observada em 15% dos pacientes). É chamada de "rejeição crônica ductopênica", devido à sua principal característica histopatológica, a perda dos ductos biliares interlobulares e septais em pelo menos 50% dos espaços-porta. O epitélio do ducto biliar é invadido por células mononucleares, resultando em necrose focal e ruptura epitelial. O paciente começa a apresentar colestase progressiva, seguida pela perda paulatina da função hepática. O aumento da imunossupressão pode não reverter o processo, necessitando, muitas vezes, do retransplante. TRANSPLANTE NAS HEPATITES B E CTRANSPLANTE NAS HEPATITES B E C medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina HEPATITE BHEPATITE B Antigamente, a recidiva da infecção hepática pelo vírus B após o transplante hepático em pacientes com cirrose pós-hepatite B oscilava entre 80–100%. A maioria desses pacientes apresentava recidiva clínica e laboratorial da hepatite, incluindo uma forma mais grave (hepatite colestática fibrosante), trazendo, portanto, resultados precários. Atualmente, esses problemas se tornaram RAROS devido ao uso de esquemas profiláticos. O vírus B possui reservatórios fora do fígado, como os monócitos circulantes e o baço, e sofre acelerada reativação por conta dos imunossupressores utilizados de rotina no transplante hepático. O diagnóstico da recidiva ou reinfeção é estabelecido pelo HBsAg positivo. Estes pacientes costumam ter alta dosagem do DNA viral e HBeAg positivo (alta replicação). A profilaxia da recidiva/reinfecção pelo vírus B noesteatose assintomática (“fígado gorduroso”); ( 2 ) esteato-hepatite aguda (“hepatite alcoólica”); e (3) cirrose alcoólica ( cirrose de Laennec ). A maioria dos alcoolistas “inveterados” desenvolve esteatose, mas somente uma pequena fração evolui com hepatite alcoólica que, quando persistente ou recorrente, pode levar à cirrose hepática. Observe a . QUADRO DE CONCEITOS I A DHA evolui através de três estágios sucessivos: esteatose, esteato-hepatite e cirrose. PATOGÊNESEPATOGÊNESE Figura 1 _ _ Fig. 1: Progressão da DHA em alcoolistas. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina PATOGÊNESEPATOGÊNESE O principal determinante do surgimento de DHA é a quantidade de álcool ingerida. Em homens , as formas graves da doença em geral só aparecem quando o consumo é > 80 g/dia por mais de dez anos , ao passo que, nas mulheres , este limiar é um pouco mais baixo: > 30–40 g/dia por mais de dez anos . A maior suscetibilidade do sexo feminino ao dano hepático induzido pelo álcool é explicada em parte pela menor concentração da enzima álcool desidrogenase na mucosa gástrica. É por isso, inclusive, que os níveis séricos de etanol são maiores nas mulheres, em comparação com os homens, após a ingestão de uma mesma dose de bebida alcoólica! Existem dúvidas se o tipo de bebida interfere no risco de DHA: alguns estudos sugeriram que o vinho acarretaria menos risco que a cerveja e os destilados, porém tal assunto é controverso… Talvez o vinho também possua substâncias que protejam contra a DHA! Diversos cofatores modulam o risco de DHA. As hepatites virais crônicas (B e C) bem como a presença de obesidade e outras hepatopatias (ex.: hemocromatose ) representam os principais amplificadores do risco !!! A desnutrição (com deficiência de calorias e de múltiplas vitaminas) é outra comorbidade que potencializa o dano hepático alcoólico por mecanismos pouco compreendidos. Fatores genéticos como polimorfismos nos genes do PNPLA3 ( patatin-like phospholipase domain-containing protein 3 ), TNF-alfa, citocromo P450 e glutationa S- transferase também parecem exacerbar o risco, facilitando a ocorrência de DHA em faixas de consumo etílico inferiores às que citamos anteriormente. Quando nenhum fator adjuvante está presente, a chance de cirrose alcoólica é significativamente reduzida, mesmo em pacientes que bebem muito: algo em torno de 5% apenas! O fato é que a maioria das pessoas que desenvolve DHA possui um ou mais fatores adicionais de agressão hepática e, quanto maior a ingestão etílica diária, maior o risco e mais rápida a evolução da doença... QUADRO DE CONCEITOS II De um modo geral, a influência de fatores adicionais de agressão hepática é necessária para que o paciente passe do estágio de “esteatose alcoólica” assintomática para a “esteato-hepatite” e, posteriormente, para a “cirrose”. Na ausência de tais fatores, a probabilidade de surgir DHA avançada é muito baixa, em torno de 5% apenas. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Um detalhe interessante que todo médico precisa conhecer diz respeito à quantidade de álcool presente em cada tipo de bebida. No entanto, apesar das diferenças na concentração etílica, a DOSE PADRÃO de cada tipo de bebida contém sempre a mesma quantidade absoluta de etanol, que é cerca de 12–15 g. Isso facilita na comparação entre elas. Observe a . Tab. 1: conteúdo etílico das diferentes bebidas, dose padrão e limites hepatotóxicos. Mas como exatamente o álcool produz lesão hepática? Em resumo, o que acontece é o seguinte : o excesso de etanol absorvido pela circulação porta é metabolizado predominantemente na região centrolobular do lóbulo hepático, local onde existe a maior concentração da enzima álcool desidrogenase. Durante tal processo, o oxigênio acaba sendo intensamente consumido, o que gera hipóxia centrolobular . A hipóxia prejudica o funcionamento das mitocôndrias, bloqueando a oxidação dos ácidos graxos que, desse modo, se acumulam no interior da célula na forma de gotículas de gordura (esteatose). O principal metabólito do etanol é o acetaldeído , molécula que, logo após ser formada, se liga covalentemente a diversas proteínas teciduais, criando “neoantígenos”. Estes induzem uma resposta autoimune que compõe o processo necroinflamatório do parênquima hepático (hepatite). O acetaldeído também é diretamente tóxico, promovendo peroxidação das membranas celulares e necrose hepatocitária... Outro fator contribuinte é o aumento de permeabilidade da mucosa intestinal induzido diretamente pelo álcool, o que faz aumentar a absorção de toxinas bacterianas como o lipopolissacarídeo (LPS ou “endotoxina”). A translocação de LPS para o fígado através da veia porta estimula as células de Kupffer (macrófagos hepáticos) a produzir citocinas como o TNF-alfa , que amplifica todos os processos já descritos! A persistência ou recorrência desses insultos pode culminar em fibrose e desestruturação do parênquima hepático (cirrose) caso as células estreladas sejam ativadas e comecem a produzir colágeno. PATOLOGIAPATOLOGIA Como vimos, existem três “estágios” na evolução da DHA: esteatose, esteato-hepatite e cirrose. Histologicamente, os três predominam na região central (perivenular) do lóbulo hepático (zona 3), o que ajuda a diferenciar a DHA de outras hepatopatias crônicas, como as hepatites virais, que predominam na região periportal (zona 1). Tabela 1 _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ESTEATOSE HEPÁTICAESTEATOSE HEPÁTICA Devido à hipóxia celular gerada na metabolização do etanol, os ácidos graxos não conseguem ser oxidados pelas mitocôndrias e acabam se acumulando no citoplasma do hepatócito, onde formam gotículas de gordura. Tal lesão, inclusive, já pode aparecer algumas horas após uma única libação alcoólica… A esteatose da DHA costuma ser MACROvesicular, mas pode ser microvesicular ou "mista" ( ). É importante reconhecer que a esteatose não é patognomônica de DHA — existem diversas outras causas para este achado histopatológico ( ) . A esteatose hepática induzida pelo álcool é prontamente reversível com a cessação do etilismo. Tab. 2: Causas de esteatose hepática de acordo com o tamanho das gotículas de gordura. Macrovesicular Microvesicular ● Álcool ● Desnutrição ● Figura 2 _ Tabela 2 _ Fig. 2: Esteatose hepática "mista", macro e microvesicular. Geralmente, a esteatose hepática alcoólica é apenas MACROvesicular. A presença de microvesículas associadas (padrão misto) denota pior prognóstico. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Obesidade ● Diabetes mellitus ● Corticosteroides ● Nutrição parenteral total ● Álcool ● Esteatose aguda da gravidez ● Síndrome de Reye ● Ácido valproico ● Tetraciclina ● “Doença dos vômitos da Jamaica” ESTEATO-HEPATITEESTEATO-HEPATITE Aqui há o video de apostila 3.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'. Dizemos que a esteatose hepática está sendo complicada por um quadro de "hepatite alcoólica" sobreposta quando todas as alterações a seguir forem notadas na biópsia hepática: ● Necrose hepatocitária; ● Infiltrado neutrofílico; ● Distribuição perivenular (central) do infiltrado; ● Corpúsculos de Mallory.* *Alguns autores argumentam que os corpúsculos de Mallory não são "obrigatórios" para o diagnóstico, uma vez que na prática eles raramente são encontrados. O s corpúsculos de Mallory ( também chamados de “hialino de Mallory”) são acúmulos intracitoplasmáticos de material eosinofílico. Não parecem ter papel direto no dano hepático, representando, na verdade, apenas uma consequência da lesão induzida pelo etanol. Apesar de clássicos da hepatite alcoólica, também podem aparecer em outras condições, como: outras formas de esteatose; doença de Wilson; colangite biliar primária; desnutrição grave; após cirurgia de derivação medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Wilson; colangite biliar primária; desnutrição grave; após cirurgia de derivação jejunoileal para obesidade mórbida ; e após uso de certas drogas, como amiodaronatransplante hepático é obrigatória, e múltiplos estudos demonstraram sua grande eficácia. Um esquema preconizado consiste na HBIG intramuscular com o seguinte protocolo: ● Dose inicial na fase anepática da cirurgia; ● Dose diária na primeira semana pós-transplante; ● Do s e mensal nos primeiros seis meses. Os níveis de anti-HBs devem ser monitorados regularmente daí em diante, e toda vez que seu valor cair abaixo de 500 UI/ml, uma dose de HBIG é ministrada. A HBIG neutraliza as partículas virais circulantes, evitando que o vírus infecte os hepatócitos do fígado novo... Drogas antivirais, em conjunto com a HBIG, são recomendadas para os pacientes com DNA viral detectável e/ou HBeAg positivo antes do transplante. As mais utilizadas na atualidade são o tenofovir e o entecavir. HEPATITE CHEPATITE C A hepatite C é a principal etiologia que motiva o transplante hepático nos EUA, no Brasil e em diversos países do Mundo Ocidental. A recidiva da doença no enxerto era a regra até pouco tempo atrás, sendo descritas diversas estratégias visando sua prevenção (ex.: tratamento antiviral pré, peri ou pós-transplante), todas apresentando sucesso variável, em geral pouco expressivo. De fato, com os antigos esquemas terapêuticos nunca houve uma estratégia preventiva comprovadamente eficaz, e muitos pacientes evoluíam com morbimortalidade medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina significativa em função da recorrência da lesão no "fígado novo"... O diagnóstico da recidiva é feito pela detecção do HCV-RNA no sangue, aliado à presença de alterações histopatológicas na biópsia hepática compatíveis com hepatite viral. Atualmente, o tratamento com drogas antivirais de ação direta está indicado para todos os indivíduos infectados pelo vírus C (anti-HCV+ e HCV-RNA+), propiciando elevadas taxas de CURA da infecção, com segurança e comodidade posológica. Para pacientes que já desenvolveram cirrose hepática e se enquadram nos critérios de indicação de transplante, o tratamento também está indicado... Este pode ser iniciado antes do transplante, nos casos menos avançados de cirrose (MELD 27). As mesmas drogas empregadas no tratamento habitual podem ser usadas em qualquer uma dessas estratégias. A literatura tem mostrado excelentes taxas de resposta, evitando a recidiva da infecção no enxerto, o que aumenta a sobrevida do paciente e do próprio enxerto. APÊNDICEAPÊNDICE MANEJO CIRÚRGICO DA HIPERTENSÃO PORTAMANEJO CIRÚRGICO DA HIPERTENSÃO PORTA INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO O principal objetivo do tratamento cirúrgico da hipertensão porta é a descompressão das varizes esofagogástricas. Para isso, o cirurgião realiza procedimentos derivativos (os shunts ); nestas cirurgias, o sangue porta é desviado para a circulação cava (sistêmica), a pressão porta é reduzida e as varizes descomprimidas. Outros procedimentos empregados para a redução da pressão no sistema porta são as cirurgias de desvascularização ázigo-portal com esplenectomia, na qual o sistema porta é "desconectado" do sistema cava. As principais indicações de tratamento cirúrgico da hipertensão porta incluem: ● Falência do tratamento endoscópico e medicamentoso (na impossibilidade de utilizar o TIPS). ● Sangramento de varizes gástricas ou gastropatia hipertensiva portal. ● Dúvidas Acadêmicas do CapítuloTESTE SEU CONHECIMENTOConfira as dúvidas acadêmicas do capítulo clicando aqui medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Cirurgia de urgência: falência do tratamento endoscópico e farmacológico na fase aguda (na impossibilidade de utilizar o TIPS), com a persistência do sangramento. Antes de qualquer procedimento cirúrgico, uma avaliação do sistema porta, por meio de ultrassonografia com Doppler e angiografia, é recomendada. Quais são as consequências de um shunt (desvio) portossistêmico? Para entendermos os principais efeitos colaterais das cirurgias derivativas, é importante que tenhamos alguns conceitos em mente: apesar de ser uma veia, a porta drena o mesentério e carreia para o fígado sangue rico em hormônios hepatotróficos e nutrientes; além disso, o sangue porta leva também ao parênquima hepático substâncias provenientes do intestino para serem detoxificadas. O maior exemplo é a amônia (proveniente do metabolismo proteico de bactérias colônicas), que vai até o fígado para ser transformada em ureia. Sendo assim, o sangue porta é fundamental para um bom funcionamento do hepatócito. Quando desviamos o fluxo porta do fígado por algum procedimento cirúrgico, realmente reduzimos a pressão neste território, mas o preço que se paga por isso é a possibilidade de deterioração da função hepática e precipitação de encefalopatia portossistêmica . PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOSPROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS Existem três métodos cirúrgicos empregados no manejo da hipertensão porta: 1. As derivações ou shunts descompressivos; 2. Os procedimentos de desvascularização; 3. Transplante de fígado. As derivações cirúrgicas são divididas em três grupos: 1. Derivações portossistêmicas não seletivas (ou totais) , que descomprimem a hipertensão presente em todos os territórios do sistema porta; 2. Derivações portossistêmicas parciais , que reduzem a pressão porta para níveis próximos a 12 mmHg; 3. Derivações portossistêmicas seletivas (compartimentalizados), que descomprimem as varizes na medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Derivações portossistêmicas seletivas (compartimentalizados), que descomprimem as varizes na região esofagogástrica, mas mantêm a hipertensão porta nas demais regiões. DERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS NÃO SELETIVASDERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS NÃO SELETIVAS Diversas opções cirúrgicas estão desenhadas na . Elas incluem: ● Derivação porto-cava terminolateral ou fístula de Eck (não mais utilizado em procedimentos eletivos). ● Figura 1 _ _ Fig. 1: Opções cirúrgicas. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Derivação porto-cava laterolateral . ● Derivação mesocava . ● Derivação esplenorrenal central . As derivações porto-cava representam os procedimentos de maior eficácia no controle e prevenção do sangramento varicoso e da ascite. Contudo, apresentam dois grandes inconvenientes: (1) alto índice de encefalopatia e piora da função hepática; e (2) dificultam ou impossibilitam a técnica cirúrgica do transplante. A derivação mesocava (veja a imagem do canto inferior esquerdo, item 2 da ) e outros tipos de interposição também são bastante efetivos na descompressão varicosa e na ascite, e também têm alto índice de encefalopatia e disfunção hepática. A interposição geralmente é feita com próteses artificiais. As vantagens sobre as derivações porto-cava são a mais fácil confecção e o fato de não atrapalhar a cirurgia do transplante. A derivação esplenorrenal central tem as mesmas características das demais derivações não seletivas totais. A esplenectomia é realizada de rotina, talvez uma pequena vantagem, pela resolução do hiperesplenismo. As derivações não seletivas podem ser usadas como cirurgias de urgência no sangramento varicoso, especialmente nos pacientes com ascite. Todavia, em pacientes candidatos ao transplante hepático, a tendência atual é dar preferência ao TIPS, pois este procedimento não dificulta a realização do transplante, ao contrário da derivação não seletiva (que modifica a anatomia da veia cava inferior). DERIVAÇÕES PORTOSSISDERIVAÇÕES PORTOSSIS TÊMICAS PARCIAISTÊMICAS PARCIAIS Tais cirurgias também são conhecidas como derivações porto-cava calibradas ( ). Figura 1 Figura 2 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Enquanto nas derivações não seletivas (totais) a comunicação portossistêmica tem um diâmetro médio de 16 mm, o segredo das derivações parciais é a interposição de uma prótese com diâmetro de 8–10 mm, restringindo o fluxo derivativo. Assim, embora haja descompressão varicosa, o fluxo portal hepatopetale griseofulvina. Perceba que, para receber o diagnóstico de “esteato-hepatite”, é preciso que, além de esteatose, exista também necrose hepatocitária e infiltração do parênquima por leucócitos. A infiltração por neutrófilos (leucócitos polimorfonucleares ) é um dos grandes marcos da esteato-hepatite alcoólica! O TNF-alfa produzido pelas células de Kupffer (em resposta ao aumento da translocação intestinal de LPS) é uma citocina que “recruta e estimula” esse tipo celular! Nas hepatites virais, bem como em outras hepatopatias, o parênquima hepático geralmente é infiltrado por leucócitos mononucleares . Vale dizer que a esteato-hepatite alcoólica também é potencialmente reversível com a abstenção do etilismo. Observe a . QUADRO DE CONCEITOS III O que define a existência de "esteato-hepatite" é a presença de necrose hepatocitária e infiltração por leucócitos num parênquima esteatótico. Na esteato- hepatite alcoólica, o tipo de leucócito predominante é o neutrófilo polimorfonuclear . Figura 3 _ _ Fig. 3: Esteatose macrovesicular e corpúsculos de Mallory (setas) num paciente com hepatite alcoólica. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina CIRROSE HEPÁTICACIRROSE HEPÁTICA Assim como acontece em outras formas de cirrose, na etiologia alcoólica, a deposição de colágeno no parênquima hepático é mediada pelas células estreladas perissinusoidais (ou células de Ito ), que fisiologicamente servem como armazenadoras de vitamina A, mas, quando o fígado é exposto a insultos necroinflamatórios persistentes ou repetitivos, podem ser ativadas e conduzir à cirrotização. Na DHA, a fibrose se inicia na região centrolobular , tornando-se panlobular num segundo momento. No começo o processo é potencialmente reversível, porém, nos indivíduos que mantêm uma ingesta etílica elevada, a evolução para fibrose panlobular é normalmente definitiva. MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A esteatose hepática "pura" costuma ser assintomática, com o paciente apresentando apenas hepatomegalia ao exame físico. Alguns portadores de esteatose muito intensa referem desconforto no quadrante superior direito do abdome além de náuseas e discreta icterícia. Já a esteato-hepatite alcoólica geralmente se manifesta com uma ampla gama de sinais e sintomas! Anorexia, hepatomegalia dolorosa, febre e icterícia acentuada constituem a síndrome clássica de apresentação. Nesses casos, pode até mesmo fazer diagnóstico diferencial com a colangite bacteriana. Cumpre ressaltar que a hepatite alcoólica também pode ser assintomática, sendo reconhecida apenas por alterações laboratoriais sugestivas (ver adiante), num paciente com história de etilismo importante. Ascite e hemorragia digestiva por rotura de varizes esofagogástricas complicam até 30% dos casos de hepatite alcoólica aguda, mesmo na ausência de cirrose preestabelecida! Tal fato é explicado por uma hipertensão porta “transitória”, decorrente do edema hepatocelular difuso. Casos graves de hepatite alcoólica aguda são mais propensos a desenvolver infecções bacterianas intercorrentes (ex.: pneumonia, ITU, bacteremia), e a falência hepática fulminante pode ser a primeira manifestação em alguns doentes. Na cirrose alcoólica , o paciente cursa com manifestações clínicas inerentes a qualquer quadro d e cirrose, isto é, sinais e sintomas das síndromes de falência hepatocelular (icterícia, encefalopatia, hipoalbuminemia, coagulopatia, ginecomastia, aranhas vasculares) e hipertensão porta (esplenomegalia, ascite, varizes esofagogástricas). Uma lesão independente do dano hepático, porém clássica do alcoolismo (e, por conseguinte, altamente sugestiva de etiologia alcoólica para a cirrose), é a contratura palmar de Dupuytren ( ).Figura 4 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina LABORATÓRIOLABORATÓRIO A esteatose hepática "pura" promove aumentos inespecíficos e flutuantes das aminotransferases, com o restante do hepatograma normal ou levemente "tocado". N a esteato-hepatite alcoólica , por outro lado, a elevação das aminotransferases é a regra, apresentando, contudo, uma curiosa peculiaridade: relação AST/ALT > 2 (sempre)! É digno de nota que raramente a AST ultrapassa 300 U/L em valores absolutos. Fosfatase alcalina e gama GT também aumentam na hepatite alcoólica, mas nunca > 3x o LSN! Entre 60–90% dos casos cursam com hiperbilirrubinemia direta, e níveis > 10 mg/dl indicam hepatite alcoólica “grave”. Mesmo na ausência de cirrose, pode haver prolongamento do TAP (> 5 segundos acima do controle) e hipoalbuminemia severa (mais de 2,5 g/dl), e tais achados também denotam “gravidade”. Até 75% dos pacientes apresentam hipergamaglobulinemia policlonal. No hemograma, é comum leucocitose com desvio à esquerda, que às vezes se manifesta como “reação leucemoide” (leucocitose neutrofílica extrema). Cerca de 10% dos portadores de hepatite alcoólica têm também plaquetopenia, devido ao efeito mielotóxico do álcool e/ou a um hiperesplenismo secundário à hipertensão porta “transitória” (ver anteriormente). Anemia macrocítica é comum, novamente por conta da mielotoxicidade do etanol, com ou sem carência de folato associada. Com relação às outras alterações, vale destacar que o fígado secreta ácido úrico na bile, Fig. 4: Contratura palmar de Dupuytren. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Com relação às outras alterações, vale destacar que o fígado secreta ácido úrico na bile, eliminando parte deste metabólito pela via intestinal. Logo, na disfunção hepática, é comum hiperuricemia. O fígado também é um sítio de armazenamento e metabolização de triglicerídeos. Logo, na disfunção hepática, é comum haver hipertrigliceridemia. A hipergama policlonal, por sua vez, ocorre devido à hiperativação exagerada e generalizada do sistema imune humoral. Observe a . Tab. 3: Alterações laboratoriais sugestivas de hepatite alcoólica. Enzimas Hepáticas ● Relação AST/ALT > 2. ● AST geralmente ≤ 300 U/L. ● FAL e GGT aumentadas até 3x o LSN. Provas de Função Hepática ● Hiperbilirrubinemia direta. ● Hipoalbuminemia. ● TAP/INR alargados. Alterações Metabólicas ● Hiperglicemia. ● Hipertrigliceridemia. ● Hiperuricemia. ● Hipocalemia, hipomagnesemia e hipofosfatemia (desnutrição). ● Ácido fólico reduzido. Alterações Hematológicas ● Anemia macrocítica. ● Leucocitose com desvio à esquerda (às vezes reação leucemoide). ● Plaquetopenia (10%). ● Hipergamaglobulinemia policlonal (até 75%). As alterações laboratoriais encontradas na cirrose alcoólica s ã o indistinguíveis daquelas observadas em outras causas de cirrose hepática. Tabela 3 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina observadas em outras causas de cirrose hepática. QUADRO DE CONCEITOS IV O achado laboratorial mais clássico das formas graves de DHA é relação AST/ALT > 2, com níveis de AST geralmente abaixo de 300 U/L. BIÓPSIA HEPÁTICABIÓPSIA HEPÁTICA A biópsia hepática NÃO É OBRIGATÓRIA para estabelecer o diagnóstico de DHA em nenhuma de suas formas. A história e o exame físico, em associação aos achados laboratoriais característicos que descrevemos, costumam permitir um diagnóstico essencialmente “clínico”, em particular quando outras etiologias de doença hepática puderem ser afastadas. No entanto, podemos (e devemos) indicar a biópsia hepática em determinadas circunstâncias, por exemplo:: (1) dúvida diagnóstica; (2) quando necessário para descartar a coexistência de outros processos patológicos; e (3) avaliação acurada do prognóstico. TRATAMENTOTRATAMENTO SAIBA MAIS… Achados laboratoriais que denunciam consumo excessivo de álcool. Uma pergunta de extrema importância para quem trata o alcoolismo é: como ter certeza de que o paciente está falando a verdade quando ele afirma estar abstêmio? Não raro, na prática, o paciente mente para o médico! Felizmente, alguns indícios laboratoriais sugerem que o paciente continua bebendo muito. As principais "pistas" são: ● Relação AST/ALT > 2; ● GGT persistentemente elevada; ● Macrocitose (VCM > 100 fl); ● Pancitopenia;● Aumento sérico da "Transferrina Deficiente em Carboidratos" (TDC). Todas essas alterações podem ser explicadas por um único fenômeno: a toxicidade direta do etanol (hepatotoxicidade, mielotoxicidade, e toxicidade "bioquímica", na qual o próprio etanol reage e modifica a estrutura de certas proteínas plasmá ticas, como a transferrina). medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina TRATAMENTOTRATAMENTO MEDIDAS GERAISMEDIDAS GERAIS A principal é a abstinência ao álcool , indicada para todos os pacientes. Diversos medicamentos podem "ajudar" o paciente a parar de beber, reduzindo a "fissura" da dependência, desde que tomados no contexto de um programa multidisciplinar de tratamento do alcoolismo: (1) naltrexona; (2) acamprosato; e (3) baclofeno. A abstinência reverte a esteatose hepática e a esteato-hepatite, podendo reverter também a cirrose alcoólica (fibrose) em suas fases iniciais. Nos portadores de DHA grave (hepatite/cirrose), o suporte nutricional é imprescindível, já que a maioria desses indivíduos apresenta desnutrição. Temos que fornecer um adequado aporte calórico ( 40 kcal/kg de peso/dia ) a fim de evitar complicações potencialmente fatais, como hipoglicemia, cetoacidose alcoólica e catabolismo muscular esquelético acelerado, garantindo também uma reposição proteica vigorosa ( 1,5 a 2 g/kg de peso/dia ), além de repor micronutrientes ( ácido fólico, tiamina, zinco etc. ) conforme a necessidade. A terapia nutricional melhora as alterações hepáticas (clínicas, laboratoriais e histopatológicas), porém nunca foi confirmado se ela consegue ou não prolongar a sobrevida. TRATAMENTO ESPECÍFICO DA HEPATITE ALCOÓLICATRATAMENTO ESPECÍFICO DA HEPATITE ALCOÓLICA AGUDAAGUDA Além das medidas gerais já citadas, portadores de hepatite alcoólica aguda que apresentam ENCEFALO PATIA e/ou um ÍNDICE DE FUNÇÃO DISCRIMINANTE DE MADDREY ≥ 32 se beneficiam da corticoterapia por um mês (com redução da mortalidade em curto prazo). O esquema de escolha é: prednisolona 32 mg/dia VO ( o u doses equivalentes de outras formulações de glicocorticoide). A prednisolona é preferida por alguns autores em relação à tradicional prednisona porque esta última requer conversão hepática à prednisolona (forma ativa), um processo que pode estar comprometido na hepatite alcoólica grave. O Índice de Função Discriminante de Maddrey (IFD) foi especificamente validado na literatura para avaliar a probabilidade de óbito num paciente com hepatite alcoólica. Valores ≥ 32 identificam pacientes nos quais o risco da doença supera o risco do tratamento, servindo, portanto, como "ponto de corte" para indicar a corticoterapia. Sua fórmula é: IFD = 4,6 x (TAP do paciente - TAP do controle) + bilirrubina total Se houver alguma contraindicação ao corticoide, a droga de escolha passa a ser a pentoxifilina medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Se houver alguma contraindicação ao corticoide, a droga de escolha passa a ser a pentoxifilina (400 mg VO 3x/dia durante um mês), que também reduz mortalidade em curto prazo, principalmente por reduzir a ocorrência de síndrome hepatorrenal. Cumpre ressaltar que alguns estudos demonstraram que a associação de glicocorticoide com pentoxifilina não oferece qualquer vantagem terapêutica quando comparado ao tratamento com glicocorticoide isolado — logo, esta associação não deve ser usada! Existem ainda múltiplas abordagens experimentais para o tratamento da hepatite alcoólica — nenhuma delas foi adequadamente validada na literatura. As principais são: propiltiouracil, oxandrolona (esteroide anabolizante), Same (S-Adenosil-L-Metionina), infliximabe, antioxi‐ dantes e "diálise hepática". TRATAMENTO ESPECÍFICO DA CIRROSE ALCOÓLICATRATAMENTO ESPECÍFICO DA CIRROSE ALCOÓLICA Durante muito tempo, considerou-se que a colchicina seria capaz de bloquear ou reverter a evolução da fibrose hepática. Todavia, devido à falta de evidências consistentes de benefício, tal conduta não é mais utilizada... Assim, o tratamento da cirrose alcoólica é semelhante ao tratamento genérico de outras formas de cirrose hepática: controle das complicações e sempre que possível, nas cirroses que apresentam dano funcional significativo ou franca descompensação basal (Child B ou C, respectivamente), encaminhar o paciente para o transplante ortotópico de fígado. Lembre-se de que, na DHA, o transplante tem como pré- requisito a abstinência alcoólica por pelo menos seis meses . Os resultados costumam ser satisfatórios, comparáveis aos do transplante em outras hepatopatias. PROGNÓSTICOPROGNÓSTICO Curto prazo : a mortalidade em curto prazo num quadro de hepatite alcoólica gira em torno de 34% em poucos meses (20% no primeiro mês). Os principais fatores de mau prognóstico são: ● Idade avançada; ● Bilirrubina > 10 mg/dl; ● Coagulopatia; ● Encefalopatia hepática; ● Azotemia; ● Grau de leucocitose; ● medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Coexistência de infecção/sepse; ● Não responsividade ao corticoide; ● Escassez de esteatose na biópsia; ● Reversão do fluxo portal na USG com Doppler. A falta de resposta após sete dias de tratamento com glicocorticoide indica péssimo prognóstico! Vários escores foram validados com o intuito de estimar a probabilidade de resposta ao tratamento: (1) escore de Lille; (2) escore de Glasgow para hepatite alcoólica; (3) “ABIC” ( Age, Bilirubin, INR, Creatinine ) ; e (4) o próprio MELD. O surgimento de injúria renal aguda num paciente com hepatite alcoólica tem sido considerado o melhor preditor isolado da chance de óbito nos próximos 90 dias. Longo prazo : pacientes que se recuperam de um episódio de hepatite alcoólica aguda têm chance de óbito nos próximos três anos até 10x maior do que a população geral de mesma faixa etária. O risco persiste após esse período e depois de cinco anos, inclusive, a mortalidade pode chegar a 85%… A chance de hepatocarcinoma está aumentada em portadores de cirrose alcoólica, sendo ainda maior naqueles que possuem extensos depósitos de ferro na biópsia hepática (ex.: coexistência de hemocromatose, com mutações no gene C282Y). O risco de neoplasias extra-hepáticas após o transplante ortotópico de fígado é maior em alcoolistas em comparação com outros pacientes. Os motivos são: (1) o álcool também lesa outros órgãos; e (2) com frequência esses indivíduos também são fumantes. ESTEATOSE HEPÁTICA ESTEATOSE HEPÁTICA METABÓLICA (MASLD)METABÓLICA (MASLD) A esteatose hepática metabólica (MASLD em inglês — doença hepática esteatótica associada à disfunção metabólica) se refere à existência de esteatose hepática (acúmulo de gordura no fígado) em indivíduos que apresentam pelo menos um fator de risco cardiometabólico (obesidade, diabetes mellitus , dislipidemia e/ou hipertensão arterial). Trata-se de uma condição comum, que pode evoluir para cirrose ao longo do tempo. O acúmulo de gordura no fígado pode ter outras etiologias (drogas, etilismo, doença celíaca) e, no passado, isso gerou uma enorme confusão quanto à terminologia, pois só se considerava o diagnóstico de MASLD quando outras causas de esteatose eram excluídas. Contudo, sabemos que a MASLD pode coexistir com outras etiologias de esteatose, ou seja, não se trata de um diagnóstico de exclusão, desde que seus critérios diagnósticos sejam respeitados (esteatose hepática + pelo menos um fator de risco cardiometabólico). medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Para se dizer que um paciente é portador de esteatose , basta identificar um excesso de gordura no parênquima hepático através de exames de imagem (USG, TC, RM) ou mesmo na biópsia ( ).Figura 5 _ _ medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina NOMENCLATURA ATUALNOMENCLATURA ATUAL O excesso de gordura no fígado pode ou não causar inflamação do parênquima hepático (esteato-hepatite), e alguns pacientes com inflamação persistente podem evoluir para fibrose/cirrose. Assim, são propostos os seguintes termos: EPIDEMIOLOGIAEPIDEMIOLOGIA A MASLD afeta cerca de 30% da populaçãomundial , com variações a depender da localidade geográfica (maior na América do Sul e menor na Europa), sendo mais comum no sexo masculino . Sua prevalência vem aumentando com o passar dos anos, devido à pandemia de obesidade e síndrome metabólica. FATORES DE RISCOFATORES DE RISCO Como já dissemos, a MASLD é definida pela presença de esteatose hepática e pelo menos um fator de risco cardiometabólico. Logo, estes representam os principais fatores de risco para MASLD, mas também há outros. São eles: ● Sobrepeso/obesidade, isto é, IMC ≥ 25 kg/m ² (ou IMC ≥ 23 kg/m ² em asiáticos). ● Hipertensão arterial. ● Fig. 5: Observe a ecotextura do parênquima hepático normal — (A) comparada à ecotextura difusamente aumentada de um fígado esteatótico (o fígado “brilha” mais) — (B) . medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Dislipidemia (HDL reduzido + triglicerídeos aumentados). ● Diabetes mellitus . ● Fatores de risco adicionais: ovários policísticos, apneia obstrutiva do sono, doença renal crônica e história de colecistectomia. Quanto mais fatores o paciente tiver, maior o risco de evoluir com MASH. É interessante que, apesar de esses fatores também aumentarem o risco cardiovascular global, ainda não está claro se a presença de MASLD em si constitui um fator de risco cardiovascular adicional e independente. Nos últimos anos, têm surgido evidências apontando que sim, isto é, a MASLD talvez seja mesmo um fator de risco cardiovascular independente. A principal causa de óbito em pacientes com MASLD são as doenças cardiovasculares... PATOGÊNESEPATOGÊNESE A exata patogênese da MASLD ainda não foi totalmente esclarecida. A teoria mais aceita implica a resistência à insulina como alteração básica para o desenvolvimento da lesão hepática, num contexto de hábitos de vida onde o consumo de energia é maior do que o gasto metabólico, levando à formação de estoques de gordura nos hepatócitos. A inflamação sistêmica crônica (que costuma acompanhar os principais fatores de risco cardiometabólicos) também exerce papel central no surgimento da doença. Já foram identificadas algumas variantes genéticas associadas à progressão da MASLD para MASH e cirrose. Os principais genes envolvidos seriam o PNPLA3 e o IFNL4 . A obesidade e uma dieta rica em gorduras e carboidratos são fatores que ativam a expressão desses genes. MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A maioria dos portadores de MASLD é assintomática . Eventualmente, poderemos atribuir queixas como fadiga e um vago desconforto no abdome superior direito à MASLD... A doença é tipicamente descoberta após o encontro de um aumento leve a moderado das aminotransferases e/ou presença de esteatose hepática em exames de imagem solicitados por outros motivos. De forma incomum, o paciente pode se apresentar com cirrose hepática e suas complicações, após anos de doença silenciosa. Nestes casos, uma investigação minuciosa (que afasta outras hepatopatias) acaba concluindo que a provável causa da cirrose é a MASLD se o paciente possuir fatores de risco cardiometabólico! Antigamente — quando o conceito de MASLD ainda não havia sido desenvolvido —, a maior parte desses pacientes era taxada como “cirrose criptogênica”. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina como “cirrose criptogênica”. Tab. 4 Esteatose Hepática Metabólica (MASLD) Esteatose hepática (> 5% do fígado é “gorduroso” em métodos de imagem ou biópsia) na presença de pelo menos um fator de risco cardiometabólico, e na ausência de outras causas de esteatose (sem uso de drogas associadas à esteatose, doença celíaca e etilismo ausente ou mínimo*). Esteato-hepatite Metabólica (MASH) Esteatose hepática + evidência histológica de inflamação e injúria hepatocelular (ex.: balonização dos hepatócitos) com ou sem fibrose associada. Cirrose por MASH Cirrose hepática com histologia atual ou prévia de MASH ou história de MASLD, na ausência de outras etiologias para cirrose. Esteatose Hepática por Disfunção Metabólica e Álcool (MetALD) Esteatose hepática + pelo menos um fator de risco cardiometabólico + consumo “moderado” de álcool (20–50 g/d para mulheres e 30–60 g/dia para homens). Nesta faixa de etilismo, a presença de esteatose hepática é igualmente atribuída às duas causas... Por outro lado, indivíduos com consumo “pesado” de álcool (> 50 g/d para mulheres e > 60 g/d para homens), mesmo que tenham fatores de risco cardiometabólicos, serão diagnosticados apenas com esteatose hepática alcoólica. Esteatose Hepática Criptogênica Esteatose hepática na ausência de fatores de risco cardiometabólico ou qualquer outra etiologia identificável. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina *Considera-se como “etilismo mínimo” um consumo de álcool inferior a 20g/dia para mulheres e 30 g/d para homens. Obs.: a dose “padrão” de qualquer bebida alcoólica tem em média 14 g de álcool (ex.: uma lata de cerveja, uma taça de vinho, uma dose de uísque etc.). O exame físico costuma ser normal na MASLD sem cirrose, mas alguns pacientes podem apresentar discreta hepatomegalia (> 16 cm) na palpação ou ultrassonografia abdominal (5– 18% dos casos). Portadores de cirrose hepática apresentarão os estigmas habituais desta condição (eritema palmar, ginecomastia, telangiectasias, icterícia, ascite etc.). LABORATÓRIOLABORATÓRIO Como dissemos, pode haver aumento leve a moderado (2–5x o LSN) das aminotransferases (ALT e AST, com predomínio da primeira). As enzimas canaliculares (FAL e GGT) também podem estar discretamente aumentadas (2–3x o LSN). Outros parâmetros como bilirrubina e albumina em geral são normais, exceto na presença de cirrose. Contudo, o hepatograma pode ser completamente normal em indivíduos com MASLD... O fato é que as alterações do hepatograma, quando presentes, não predizem a existência de esteato-hepatite! O único método capaz de identificar esteato-hepatite e estimar sua gravidade é a biópsia hepática (análise histopatológica). Outro parâmetro laboratorial que costuma estar alterado nesses pacientes é a ferritina sérica e, às vezes, a saturação de transferrina (ambos podem estar elevados). Existem evidências de que ferritina > 1.5x o LSN em pacientes com MASLD sinaliza maior risco de esteato-hepatite e fibrose hepática avançada . AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICAAVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA Devemos suspeitar de MASLD em pacientes que apresentem pelo menos um dos critérios a seguir: ● Esteatose hepática em métodos de imagem; SAIBA MAIS... Porque a ferritina aumenta na MASLD? O processo de acúmulo de gordura nos hepatócitos geralmente é acompanhado por deposição local de ferro. Como a ferritina é o marcador dos estoques de ferro, seus níveis séricos se elevam em proporção direta a este acúmulo. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina ● Aumento inexplicado das aminotransferases; ● Dois ou mais fatores de risco cardiometabólicos; ● Parentes de primeiro grau com cirrose hepática por MASH. Observe na u m fluxograma de avaliação diagnóstica comumente utilizado na prática. Em todo paciente suspeito para MASLD, devemos pesquisar a existência de outras possíveis etiologias para esteatose, firmando-se o diagnóstico de MASLD quando nenhuma outra causa for encontrada... Conforme observado no fluxograma e já comentado anteriormente, um dilema clínico frequente é a diferenciação entre MASLD, MetALD e doença hepática Figura 6 _ _ Fig. 6: Fluxograma para avaliação diagnóstica da esteatose hepática. medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina dilema clínico frequente é a diferenciação entre MASLD, MetALD e doença hepática alcoólica. Essa diferenciação é facilmente estabelecida após uma análise cuidadosa do grau de etilismo do paciente (sem etilismo = MASLD; etilismo leve a moderado = MetALD; etilismo pesado = doença hepática alcoólica). As principais drogas associadas à esteatose hepática são: ● Amiodarona. ● Glicocorticoides. ● Metotrexato. ● Tamoxifeno. A investigação de esteatose hepática deve incluir a solicitaçãodos seguintes exames laboratoriais, com o objetivo de avaliar a função hepática e pesquisar outras causas de hepatopatia: ● Hepatograma “completo” (aminotransferases, enzimas canaliculares, bilirrubina, albumina e TAP/INR). ● Hemograma. ● Glicemia de jejum. ● Lipidograma (colesterol total, HDL, LDL e TG). ● Sorologias virais (hepatites A, B e C). ● Ferro sérico, TIBIC, saturação de transferrina e ferritina. ● Anticorpo antimitocôndria (AMA). SAIBA MAIS... Outro dado que ajuda a diferenciar a MASLD da doença hepática alcoólica é a relação AST/ALT , que é caracteristicamente > 2 desde o início da lesão hepática pelo álcool e 2 independentemente da etiologia). medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Anticorpo antimitocôndria (AMA). ● Alfa-1-antitripsina. ● Anti-TGT IgA (pesquisa de doença celíaca). Exames solicitados em cenários específicos: ● FAN, dosagem de IgG e anticorpo antimúsculo liso (para mulheres jovens, pacientes com aminotransferases > 5x LSN e/ou história de doença autoimune); ● Ceruloplasmina (para pacientes 5% dos hepatócitos estão repletos de gordura (“esteatóticos”) na amostra coletada. Ressalte-se que é bastante comum o encontro concomitante de aumento do ferro hepático nesses indivíduos. MASLD e MASH são bastante distintas em termos histopatológicos e, por este motivo, a biópsia representa a única forma de se fazer essa diferencia- ção (exames de imagem ou laboratoriais não são capazes de distinguir entre uma entidade e outra)! Veja a .Tabela 5 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina Tab. 5 MASLD ● Esteatose isolada. ● Esteatose + inflamação lobular ou portal, mas sem balonização dos hepatócitos. ● Esteatose + balonização dos hepatócitos, mas sem inflamação lobular ou portal. MASH ● Esteatose + balonização dos hepatócitos + inflamação lobular (predomínio na zona 3, isto é, na região centrolobular). Não é obrigatório ter fibrose (ela pode ou não estar presente). Existe um sistema de classificação histológica da MASH ( ): Tab. 6 Grau Leve (grau 1) Macrovesículas de gordura em mais de 2/3 da amostra. Eventuais hepatócitos balonizados na zona 3 (centrolobular). Infiltrado inflamatório escasso, composto por polimorfonucleares e linfócitos no interior do ácino hepático, com pouca ou nenhuma inflamação crônica na região portal. Moderada (grau 2) Qualquer grau de esteatose, balonização evidente de hepatócitos (predominante na zona 3), infiltrado inflamatório evidente com predomínio de polimorfonucleares, pode haver fibrose pericelular na zona 3 além de se notar inflamação crônica leve a moderada nas regiões intra-acinar e portal. Severa (grau 3) Esteatose pan-acinar, balonização grosseira e desarranjo da arquitetura do lóbulo, predominantemente na zona 3, infiltrado inflamatório evidente com predomínio de polimorfonucleares, inflamação crônica leve a moderada Tabela 6 medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicina polimorfonucleares, inflamação crônica leve a moderada intra-acinar e portal. Estágio F0 Ausência de fibrose. Fibrose F1 Fibrose perisinusoidal na zona 3. Fibrose F2 Fibrose perisinusoidal na zona 3 + fibrose portal. Fibrose F3 Fibrose perisinusoidal na zona 3 + fibrose portal “em ponte”. Fibrose F4 Cirrose. Vamos repetir este conceito, para você não se confundir... Não é obrigatório fazer biópsia hepática em todos os pacientes, dados os riscos e custos elevados do procedimento. Já mencionamos anteriormente as situações em que a biópsia pode ser considerada... ESTADIAMENTO DA MASLDESTADIAMENTO DA MASLD O estadiamento da MASLD visa determinar o grau de fibrose hepática do paciente . Para tanto, vamos preferir métodos não invasivos capazes de estimar a “rigidez” do parênquima hepático, como a elastografia , reservando-se a biópsia para os casos inconclusivos. O tipo de elastografia mais utilizado é a ultrassonográfica. A seguir, um guia para a conduta a ser adotada após este exame: ● Uma rigidez hepática 12 kPa sugere fibrose avançada ou cirrose; ● Uma rigidez hepática entre 8–12 kPa é inconclusiva, devendo-se complementar o estadiamento com elastografia por RM. A conduta subsequente em função deste último exame é: � Rigidez hepática 3.63 kPa sugere fibrose avançada ou cirrose. Também é possível fazer o estadiamento inicial da MASLD com escores que se baseiam em exames laboratoriais, como o FIB-4 (que utiliza idade, contagem plaquetária e níveis de ALT e AST). Um FIB-4 > 3.25 identifica portadores de cirrose. A partir de um valor maior ou igual a 1.3, recomenda-se realizar a elastografia (por USG ou RM). TRATAMENTOTRATAMENTO MEDIDAS GERAISMEDIDAS GERAIS São indicadas para todos os pacientes... Abstenção do etilismo; imunização contra as hepatites A e B se paciente suscetível, além de atualização do calendário vacinal como um todo; controle de cada um dos fatores de risco cardiovascular existentes (HAS, DM, dislipidemia). PERDA PONDERALPERDA PONDERAL A perda de peso é a principal medida terapêutica para os portadores de MASLD/MASH , uma vez que quase todos têm sobrepeso (IMC ≥ 25 kg/m ² ) ou obesidade (IMC ≥ 30 kg/m ² ). A redução do peso corpóreo (5–7% do peso inicial para portadores de MASLD e 7–10% para portadores de MASH) comprovadamente melhora as alterações do hepatograma e da histologia hepática, além de reduzir a resistência insulínica e aumentar a qualidade de vida do paciente. Inicialmente, recomenda-se mudanças no estilo de vida, com dieta + atividades físicas . Também podemos recorrer aos tratamentos farmacológicos ou cirúrgicos da obesidade, de acordo com suas recomendações habituais. Pacientes obesos (IMC ≥ 30 kg/m²) com MASH que não atingem a meta de perda ponderal após 6 meses de tratamento conservador geralmente são encaminhados à cirurgia bariátrica . É interessante que pode haver uma piora transitória da lesão hepática após a cirurgia, devido justamente à perda ponderal acelerada (que temporariamente pode agravar a esteatose hepática). Assim, é mandatório monitorar o hepatograma de forma regular nos primeiros seis meses de pós-operatório, bem