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Sumário
1. CONCEITOS GERAIS
2. INTRODUÇÃO
3. QUADRO CLÍNICO
4. DIAGNÓSTICO
5. ANAMNESE E EXAME FÍSICO
6. EXAMES LABORATORIAIS
7. DIAGNÓSTICO POR EXAMES DE IMAGEM
8. BIÓPSIA HEPÁTICA
9. CLASSIFICAÇÃO FUNCIONAL
10. ETIOLOGIA
11. TRATAMENTO
12. CAUSAS DE CIRROSE
13. DOENÇA HEPÁTICA ALCOÓLICA (DHA)
14. INTRODUÇÃO
15. PATOGÊNESE
16. PATOLOGIA
17. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
18. BIÓPSIA HEPÁTICA
19. TRATAMENTO
20. PROGNÓSTICO
21. NOMENCLATURA ATUAL
22. EPIDEMIOLOGIA
23. FATORES DE RISCO
24. PATOGÊNESE
25. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
26. LABORATÓRIO
27. AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA
28. ESTADIAMENTO DA MASLD
29. INTRODUÇÃO
30. EPIDEMIOLOGIA
31. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
32. MANIFESTAÇÕES LABORATORIAIS
33. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS
34. TRATAMENTO
35. PROGNÓSTICO
36. COLANGITE BILIAR PRIMÁRIA (CBP)
37. INTRODUÇÃO
38. EPIDEMIOLOGIA E ETIOPATOGENIA
39. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
40. MANIFESTAÇÕES LABORATORIAIS
41. DIAGNÓSTICO
42. TRATAMENTO
43. DOENÇA DE WILSON (DW)
44. INTRODUÇÃO
45. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
46. DIAGNÓSTICO
47. TRATAMENTO
48. INTRODUÇÃO
49. FISIOPATOLOGIA
50. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
51. DIAGNÓSTICO
52. TRATAMENTO
53. PROGNÓSTICO
54. COMPLICAÇÕES DA CIRROSE
55. INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICA
56. INTRODUÇÃO
57. ACHADOS PERIFÉRICOS
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58. DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS
59. MANIFESTAÇÕES HEMATOLÓGICAS
60. HIPERTENSÃO PORTA
61. INTRODUÇÃO
62. FISIOPATOLOGIA
63. ETIOLOGIA
64. DIAGNÓSTICO
65. MEDIDAS HEMODINÂMICAS
66. COMPLICAÇÕES E SEU MANUSEIO
67. VARIZES ESOFAGOGÁSTRICAS
68. VARIZES ESOFAGIANAS
69. VARIZES GÁSTRICAS (VG) E GASTROPATIA HIPERTENSIVA PORTAL (GHP)
70. CONDUTA NO SANGRAMENTO
71. PROFILAXIA PRIMÁRIA DO SANGRAMENTO
72. PROFILAXIA SECUNDÁRIA DO SANGRAMENTO
73. PROFILAXIA DE INFECÇÕES
74. PROFILAXIA DA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA
75. ASCITE
76. DEFINIÇÃO
77. O EXAME FÍSICO
78. EXAMES COMPLEMENTARES
79. RADIOGRAFIA
80. EXAME DO LÍQUIDO ASCÍTICO
81. ETIOLOGIA DAS ASCITES
82. ABORDAGEM DIAGNÓSTICA
83. MANEJO DAS ASCITES
84. PERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEA
85. OUTRAS COMPLICAÇÕES
86. ENCEFALOPATIA HEPÁTICA
87. SÍNDROME HEPATORRENAL
88. SÍNDROME HEPATOPULMONAR E HIPERTENSÃO PORTOPULMONAR
89. APÊNDICE: HEPATOPATIA MEDICAMENTOSA
90. INTRODUÇÃO
91. PRINCÍPIOS DE DIAGNÓSTICO E MANUSEIO
92. PRINCIPAIS MEDICAMENTOS ENVOLVIDOS
93. PARACETAMOL (ACETAMINOFENO)
94. ESQUEMA RIPE
95. AMIODARONA
96. ALFAMETILDOPA
97. AMOXICILINA + ÁCIDO CLAVULÂNICO
98. ERITROMICINA
99. HALOTANO
100. FENITOÍNA
101. ÁCIDO VALPROICO
102. ANTICONCEPCIONAIS ORAIS (ACO)
103. APÊNDICE: ETIOLOGIAS MENOS FREQUENTES DE CIRROSE
104. DEFICIÊNCIA DE ALFA-1-ANTITRIPSINA
105. CIRROSE CARDÍACA
106. GALACTOSEMIA
107. TIROSINEMIA
108. FIBROSE CÍSTICA
109. ATRESIA CONGÊNITA DAS VIAS BILIARES
110. CISTOS DE COLÉDOCO
111. COLESTASE INTRA-HEPÁTICA FAMILIAR PROGRESSIVA
112. RAREFAÇÃO DE DUCTOS BILIARES INTERLOBULARES (RDBIL)
113. APÊNDICE: TRANSPLANTE HEPÁTICO
114. INTRODUÇÃO
115. INDICAÇÕES DO TRANSPLANTE
116. CRITÉRIOS DE SELEÇÃO
117. INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES
118. TIPOS DE TRANSPLANTE HEPÁTICO
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119. TRANSPLANTE INTERVIVOS
120. TRANSPLANTE DO TIPO "SPLIT LIVER"
121. TRANSPLANTE EM "DOMINÓ"
122. SELEÇÃO DO DOADOR
123. TÉCNICA CIRÚRGICA
124. IMUNOSSUPRESSÃO
125. COMPLICAÇÕES DO TRANSPLANTE
126. NÃO FUNCIONAMENTO DO ENXERTO
127. COMPLICAÇÕES TÉCNICAS
128. REJEIÇÃO AGUDA E CRÔNICA
129. TRANSPLANTE NAS HEPATITES B E C
130. HEPATITE B
131. HEPATITE C
132. APÊNDICE: MANEJO CIRÚRGICO DA HIPERTENSÃO PORTA
133. INTRODUÇÃO
134. PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS
135. DERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS NÃO SELETIVAS
136. DERIVAÇÕES PORTOSSIS​TÊMICAS PARCIAIS
137. DERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS SELETIVAS
138. PROCEDIMENTOS DE DESVASCULARIZAÇÃO
139. TRANSPLANTE HEPÁTICO
140. ÁREA DE TREINAMENTO
141. QUESTÕES DA APOSTILA
142. TABELA DE EXAMES
143. BÔNUS APOSTILA
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Aqui há o video de apostila 1.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
CAPÍTULO 1CAPÍTULO 1
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CAPÍTULO 1CAPÍTULO 1
CONCEITOS GERAISCONCEITOS GERAIS
Aqui há o video de apostila 2.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
O termo cirrose hepática não se refere apenas ao surgimento de fibrose hepática . Na verdade,
p a r a haver cirrose, é necessário um profundo remodelamento da citoarquitetura do
parênquima hepático, além, é claro, da presença de extensa fibrose tecidual. Neste capítulo,
definiremos o que vem a ser cirrose hepática, mas para tanto é preciso antes uma rápida revisão
sobre a histologia do fígado e suas relações funcionais. Então, vamos lá!
Os sinusoides conduzem o sangue das circulações porta e sistêmica (ramos da veia porta e
artéria hepática presentes nos espaços porta) para a veia centrolobular (pertencente ao sistema
cava) — Durante esta passagem, substâncias provenientes do sangue são captadas
pelos hepatócitos para serem metabolizadas. É válido ressaltar que este último fato depende de
duas características fundamentais dos sinusoides hepáticos, que os distinguem dos demais
capilares do corpo: (1) eles são altamente fenestrados ( fenestra = “janela”, isto é, contêm
verdadeiros “buracos” em sua parede); e (2) são desprovidos de membrana basal (facilitando a
saída de macromoléculas para fora do vaso). Assim, todas as substâncias presentes no sangue
podem atravessar livremente as fenestras sinusoidais e alcançar o espaço de Disse , que fica
entre o sinusoide e o hepatócito. Tal espaço representa o interstício lobular e contém as células
mais importantes para a gênese da cirrose hepática — as células estreladas ou células de Ito (
 ).
Figura 1. _
Figura 2 _
_
Fig. 1: Funcionamento dos sinusoides.
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As células estreladas normalmente são “quiescentes” (isto é, apresentam pouca atividade
metabólica) e têm a função primordial de armazenar vitamina A. Entretanto, na presença de
certos estímulos (ex.: atividade necroinflamatória crônica no parênquima), podem se
transformar em células altamente capazes de sintetizar matriz extracelular (em particular,
colágeno tipo I e III). Essa transformação é induzida por efeitos parácrinos de citocinas pró-
inflamatórias, secretadas pelas células de Kupffer ativadas e outras células do sistema
imunológico.
A deposição de fibras colágenas no espaço de Disse leva ao fenômeno de capilarização dos
sinusoides , no qual uma camada de colágeno, pouco permeável, oblitera as fenestras e impede
o contato entre os hepatócitos e as substâncias oriundas do sangue, inclusive fazendo
desaparecer as microvilosidades na membrana hepatocitária (o que reflete a diminuição na
captação celular). Com isso, a capacidade de metabolização hepática — bem como a secreção,
no sangue, de macromoléculas produzidas pelos hepatócitos — vai se tornando
progressivamente comprometida. A capilarização dos sinusoides também diminui seu calibre, o
que aumenta a resistência vascular intra-hepática (fator crucial na gênese da hipertensão porta).
E as próprias células estreladas, em seu processo de transformação patogênica, acabam por
adquirir capacidade contrátil (tornando-se miofibroblasto s), o que reduz ainda mais o diâmetro
sinusoidal.
Perceba que o processo de deposição de fibras colágenas e consequente capilarização dos
sinusoides, em meio a segmentos de necrose hepatocitária, nada mais é do que a famosa fibrose
em ponte (porta-centro). O sangue passa a circular por dentro dessas traves fibróticas sem
entrar em contato com as placas de hepatócitos, numa espécie de shunt intra-hepático, indo
Fig. 1: Funcionamento dos sinusoides.
_
Fig. 2: Processo de transformação das células que dãocomo avaliar o paciente quanto à presença de sinais e sintomas
de cirrose hepática descompensada. Apesar dessa preocupação, a relação risco-benefício em
longo prazo é favorável à realização do procedimento.
Das drogas utilizadas para tratamento da obesidade, os agonistas do GLP-1 (liraglutida,
semaglutida) são os preferíveis na presença de MASLD ou MASH.
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TRATAMENTO FARMACOLÓGICOTRATAMENTO FARMACOLÓGICO
ESPECÍFICOESPECÍFICO
Algumas drogas parecem exercer ação direta sobre a esteatose hepática metabólica. No
entanto, não existe uma recomendação formal para o seu emprego em todos os pacientes... A
principal intervenção terapêutica continua sendo a mudança no estilo de vida (dieta +
atividades físicas) aliada às medidas gerais anteriormente citadas!
Não obstante, podemos considerar seu uso para pacientes que não atingem a meta de perda
ponderal com tratamento conservador e apresentam MASH confirmada por biópsia e fibrose
estágio F ≥ 2 . A escolha do medicamento depende da presença ou não de diabetes mellitus tipo
2 — .
Tab. 7
MASH sem DM 2
Vitamina E 800 UI/dia.
MASH com DM 2
Pioglitazona 30-45 mg/dia.
O efeito benéfico da vitamina E parece ser secundário às suas propriedades antioxidantes . Já o
efeito benéfico da pioglitazona parece ser o aumento da sensibilidade à insulina , além do que tal
droga ajuda no controle glicêmico (a pioglitazona é o antidiabético preferencial em portadores
de DM 2 que têm MASH e já estão em uso de metformina ou que não toleram a metformina).
Vale lembrar que os agonistas de GLP-1, além de serem úteis para promover perda de peso,
também ajudam a controlar a glicemia. Logo, pacientes diabéticos com MASLD/MASH e
sobrepeso/ obesidade, quando precisam associar drogas antidiabéticas, têm como esquema
preferencial a combinação de metformina, pioglitazona e agonistas de GLP-1 (Obs.: a
metformina não melhora diretamente a esteatose hepática!).
A literatura médica afirma que, quando o paciente não é portador de DM 2, não há
benefício em prescrever pioglitazona. Por outro lado, quando o paciente é portador
de DM 2, não há benefício em prescrever vitamina E. Logo, a escolha entre uma
droga e outra é pautada pela presença ou não de DM 2... O motivo para isso é
simples: os estudos que validaram a vitamina E no tratamento da MASH não
incluíram pacientes diabéticos, logo, não há evidências científicas de benefício
neste grupo. Já os estudos que validaram a pioglitazona não incluíram pacientes
Tabela 7
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neste grupo. Já os estudos que validaram a pioglitazona não incluíram pacientes
não diabéticos, e a mesma conclusão pode ser obtida.
A conduta terapêutica para portadores de cirrose por MASH segue as mesmas diretrizes para a
cirrose em geral.
HEPATITE AUTOIMUNE (HAI)HEPATITE AUTOIMUNE (HAI)
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
Aqui há o video de apostila 4.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
A Hepatite Autoimune (HAI) é uma doença típica de mulheres jovens em que um processo de
hepatite crônica caracterizado pela “hepatite de interface” ( ) se acompanha de
hipergamaglobulinemia e positividade para certos marcadores sorológicos, como F A N e
antimúsculo liso (HAI tipo 1 — forma mais comum da doença), anti-LKM (HAI tipo 2 —
variante que predomina em crianças) ou anti-SLA (HAI tipo 3 — forma mais agressiva).
Manifestações extra-hepáticas de autoimunidade também podem ocorrer (ex.: artrite,
glomerulonefrite, Sjögren etc.)... Esta condição costuma responder ao tratamento imunossu‐
pressor, feito inicialmente com glicocorticoide e azatioprina. Na ausência de tratamento e nos
n ã o respondedores, a evolução para cirrose/falência hepática costuma ser a regra, com
mortalidade que pode chegar a 40% em seis meses. Com tratamento adequado, no entanto, a
sobrevida em dez anos é de 80–90%.
SAIBA MAIS...
Muitos autores evitam o uso de vitamina E em indivíduos com história pessoal ou
familiar de câncer de próstata, pois há indícios de que a reposição dessa vitamina
possa aumentar o risco dessa neoplasia.
Figura 7 _
_
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Acredita-se que a HAI seja a etiologia de uma boa parte dos casos de cirrose
hepática “criptogênica” (definida após a exclusão de infecções por vírus
hepatotrópicos, doenças metabólicas e genéticas e exposição a hepatotoxinas)!
Nestes pacientes, a biópsia hepática mostra apenas fibrose e nódulos de
regeneração, sem qualquer achado que dê pistas da patologia inicial. Em fases
avançadas, os marcadores sorológicos de autoimunidade podem desaparecer e
dificultar o diagnóstico.
EPIDEMIOLOGIAEPIDEMIOLOGIA
Apesar da preferência por mulheres jovens (HAI tipo 1) ou crianças (HAI tipo 2), a hepatite
autoimune pode aparecer em qualquer sexo e faixa etária! Trata-se de uma doença incomum,
com incidência de 8,5 casos por milhão de pessoas e prevalência de 107 casos por milhão. A
maioria dos doentes possui pelo menos um dos marcadores genéticos a seguir: HLA-B8 e
HLA-DR3 (mais comum em jovens) ou HLA- DR4 (mais comum em idosos).
Existem evidências de que a HAI seja desencadeada pela interação entre fatores
de predisposição genética e fatores ambientais. Já foi documentado, por exemplo,
que infecções agudas e autolimitadas por vírus hepatotrópicos (ex.: hepatite A)
podem servir de “gatilho” para o surgimento de uma resposta autoimune persis‐
tente, direcionada contra os hepatócitos. Exposição a certas substâncias (ex.:
nitro ​furantoína, infliximabe) também pode iniciar o quadro.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Em 40% dos casos, a doença se apresenta de forma aguda, assumindo, ocasionalmente, um
padrão “fulminante”. No restante, a HAI segue um curso tipicamente insidioso, evoluindo com
Fig. 7: " Hepatite de interface”. Observe o infiltrado inflamatório concentrado no espaço porta formando uma
“linha de frente” com as arestas do lóbulo hepático. Os hepatócitos mais periféricos vão sendo progressiva​‐
mente destruídos na medida em que o processo avança na direção centrolobular.
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padrão “fulminante”. No restante, a HAI segue um curso tipicamente insidioso, evoluindo com
queixas progressivas de fadiga, anorexia, icterícia e artralgia. Em mulheres, são comuns ainda
as queixas de amenorreia (que pode ser a primeira manifestação clínica da doença), hirsutismo
e acne.
Alguns pacientes permanecem assintomáticos por longos períodos, procurando auxílio médico
somente em fases avançadas de dano hepático, já com estigmas de cirrose, por exemplo: sinais e
sintomas de falência hepatocelular (encefalopatia, hipoalbuminemia, alarga​mento do TAP/INR)
e/ou sinais e sintomas de hipertensão porta (esplenomegalia, varizes de esôfago, ascite). O risco
de carcinoma hepatocelular em portadores de HAI com cirrose hepática é de cerca de 1% ao
ano (inferior ao da cirrose causada por hepatites virais crônicas).
Também podem ocorrer manifestações extra-hepáticas de autoimunidade, como: rash
maculopapular, vasculite cutânea, eritema nodoso, artrite, glomerulonefrite, pericardite, pleurite,
tireoidite, síndrome de Sjögren, colite ulcerativa e anemia hemolítica Coombs-positivo . Tais
achados geralmente se associam à deposição tecidual de imunocomplexos circulantes,
acompanhan ​do-se de ativação e consumo do complemento.
MANIFESTAÇÕES LABORATORIAISMANIFESTAÇÕES LABORATORIAIS
O hepatograma é semelhante ao das hepatites virais crônicas: aminotransferases variavelmente
aumentadas e “flutuantes” (em geral, entre 100–1.000 U/L), icterícia à custa de bilirrubina
direta (que costuma ficar entre 3–10 mg/dl), hipoalbuminemia e alargamento do TAP/INR em
casos muito intensos ou avançados. É digno de nota que as enzimas canaliculares (fosfatase
alcalina e gama GT), em geral, são normais ou discretamente aumentadas. Quando tais
enzimas têm aumentos proeminentes, temos que pensar numa síndrome de superposição entre
HAI e colangite biliar primária ou entre HAI e colangiteesclerosante primária!
Um achado laboratorial característico é a hipergamaglobulinemia (> 2,5 g/dl). Trata-se de uma
hipergama “policlonal”, que pode justificar um resultado “falso-positivo” na pesquisa do fator
reumatoide , bem como em diversas sorologias virais, incluindo hepatite C (o RIBA e o PCR
para HCV-RNA serão negativos nestes casos).
Em relação aos autoanticorpos que aparecem na HAI, descrevem-se padrões sorológicos
associados a determinadas características clínicas distintivas, o que permite a subdivisão da
doença ( ).
Tab. 8
HAI Tipo I
Anticorpos
Tabela 8
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Características
FAN (padrão homo ​gêneo), antimúsculo
liso, antiactina, p-ANCA "atípico".
Forma mais comum da doença, de
predomínio em mulheres jovens, sendo
acompanhada por hipergamaglobu ​linemia e
manifestações extra-hepáticas de auto ​‐
imunidade (justificando a antiga
denominação "hepatite lupoide").
HAI Tipo II
Anticorpos
Características
Apenas anti-LKM.
Forma predominante em meninas com
menos de 14 anos de idade, geralmente de
ascendência medi ​terrânea. O FAN costuma
ser negativo, e pode não haver
hipergamaglo ​bulinemia. Alguns pacientes
têm também o autoanticorpo "anticitosol
hepático-1 ".
HAI Tipo III (?)
Anticorpos
Características
Apenas anti-SLA.
Quadro clínico semelhante ao tipo I, porém
o FAN e o antimúsculo liso são negativos,
e a evolução tende a ser mais grave e
recidivante. Muitos consideram que o anti-
SLA define uma variante mais agressiva da
HAI tipo I, não aceitando a denominação
"HAI tipo III".
Legenda
Obs.: ( 1 ) p-ANCA “atípico” é aquele que mostra padrão “perinuclear” na pesquisa de ANCA por
imunofluorescência, porém não se associa ao autoanticorpo antimieloperoxidase; (2) LKM = Liver-
Kidney Microsome ; (3) SLA = Soluble Liver Antigen . 
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOSCRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS
A biópsia hepática é sempre indicada na avaliação de um caso suspeito de HAI: o achado de
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A biópsia hepática é sempre indicada na avaliação de um caso suspeito de HAI: o achado de
“hepatite de interface” não é patognomônico, pois pode ser observado em outras hepatites
crônicas. No entanto, num contexto clinicolaboratorial sugestivo de HAI, tal achado confere
especificidade ao diagnóstico (ver adiante)!
QUADRO DE CONCEITOS V
O que caracteriza os quadros de HAI na biópsia hepática é a lesão conhecida como
hepatite de interface . Laboratorialmente, a maioria dos casos de HAI (representados
pelo tipo I) cursa com hipergamaglobulinemia e presença de determinados
autoanticorpos .
Em casos típicos em que nenhuma outra hepatopatia pode ser identificada, o diagnóstico de
HAI costuma ser estabelecido sem dificuldade. Contudo, para os casos duvidosos, foi
desenvolvido um escore que auxilia na decisão diagnóstica ( ). Com 6 pontos, o
diagnóstico de HAI é “provável”; com 7 ou mais pontos, o diagnóstico é “definitivo”.
Tab. 9
Obs.: LSN = Limite Superior da Normalidade.
TRATAMENTOTRATAMENTO
A imunossupressão representa a base da conduta terapêutica e comprovadamente induz
melhora dos sintomas, do laboratório (hepatograma, hipergamaglobulinemia) e das alterações
histopatológicas. As principais indicações de tratamento farmacológico para a HAI são listadas
a seguir:
●
Aminotransferases > 10x o LSN;
●
Aminotransferases > 2x o LSN com:
Tabela 9
_
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Aminotransferases > 2x o LSN com:
�
Sintomas;
�
Aumento dos níveis de IgG;
�
Aumento da bilirrubina direta;
�
Hepatite de interface na biópsia.
●
Cirrose hepática com ou sem inflamação ativa (em qualquer grau) na biópsia hepática;
●
Idadepor acaso quando há demonstração de níveis séricos elevados de fosfatase
alcalina em indivíduos assintomáticos. O antigo nome “cirrose biliar” acabou sendo
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alcalina em indivíduos assintomáticos. O antigo nome “cirrose biliar” acabou sendo
substituído, pois o diagnóstico precoce e o início do tratamento em fases inicias conseguem
prevenir ou pelo menos atrasar a evolução para cirrose hepática. 
QUADRO DE CONCEITOS IV
Na CBP, os ductos biliares intra-hepáticos são destruídos, levando à colestase
progressiva e à cirrose. A doença predomina em mulheres de meia-idade, possuindo
como marcador diagnóstico o antimitocôndria. O prognóstico não é bom, com a
maioria evoluindo para falência hepática na ausência de tratamento. Este é feito
atualmente com ácido ursodesoxicólico.
EPIDEMIOLOGIA E ETIOPATOGENIAEPIDEMIOLOGIA E ETIOPATOGENIA
Nos EUA, a incidência de CBP em mulheres gira em torno de 4,5 casos por 100.000 e 0,7 casos
por 100.000 em homens. Por motivos desconhecidos, sua frequência parece estar aumentando
nos últimos anos.
Nota-se uma clara predisposição genética. Até 6% dos parentes de primeiro grau de um
indivíduo acometido também desenvolvem CBP, e a concordância entre gêmeos monozigóticos
é alta, sugerindo a participação de fatores de predisposição genética. De fato, já foi
demonstrado que a CBP se associa aos alelos do HLA-DRB1 e DQB1, além de polimorfismos
nos genes IL12A, IL12RB2 e IRF5-TNPO3 (todos envolvidos na regulação de citocinas pró-
inflamatórias). Portadores de monossomia do cromossomo X ( síndrome de Turner ) parecem
especialmente propensos a desenvolver CBP na vida adulta.
Alguns fatores ambientais são capazes de desencadear a doença em indivíduos geneticamente
predispostos, por exemplo: (1) infecções por Chlamydophila pneumoniae, E. coli, Novosphin ​go ​‐
bium aromaticivorans e Betaretrovirus humano; (2) vacinação com Lactobacillus na prevenção
da vaginite recorrente; (3) tabagismo; (4) terapia de reposição hormonal; e (5) exposição a tintas
de cabelo. Existem relatos de "surtos" de CBP, com casos agrupados no tempo e no espaço, o
que corrobora a existência de fatores ambientais em sua gênese.
A CBP muitas vezes coexiste com uma ou mais das seguintes condições: síndrome de Sjögren,
tireoidite de Hashimoto, doença de Graves, doença celíaca, esclerose sistêmica e fenômeno de
Raynaud.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Boa parte dos pacientes permanece assintomática por anos, sendo o início da doença
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Boa parte dos pacientes permanece assintomática por anos, sendo o início da doença
tipicamente insidioso. Os primeiros sintomas que costumam ser notados são a fadiga e o prurido
. Ao exame físico, notam-se hepatoesplenomegalia e uma típica alteração cutânea indicativa de
hipercolesterolemia acentuada (consequência da colestase intra-hepática): a s lesões
xantomatosas ( xantoma = “tumor amarelo”), que são depósitos de colesterol na pele. Os
xantomas se formam no rosto, geralmente nas pálpebras ( ) , e também podem se
depositar nos tendões dos músculos esqueléticos. Icterícia, esteatorreia e sinais e sintomas de
hipertensão porta costumam ser manifestações tardias, indicativas de cirrose hepática.
Desmineralização óssea (osteopenia/osteoporose) pode acontecer em decorrência da deficiência
de vitamina D. Muitos pacientes desenvolvem quadros de disautonomia c o m hipotensão
ortostática e agravamento da sensação de fadiga, além de deficit cognitivo , ambos de
mecanismo pouco compreendido.
Figura 8 _
_
Fig. 8 : Os "xantelasmas" (depósitos de colesterol nas pálpebras) típicos da hipercolesterolemia que
acompanha a CBP.
SAIBA MAIS…
A origem do prurido na CBP.
O prurido desses pacientes é secundário ao acúmulo de ácido lisofosfatídico no
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MANIFESTAÇÕES LABORATORIAISMANIFESTAÇÕES LABORATORIAIS
INESPECÍFICASINESPECÍFICAS
A primeira alteração laboratorial observada na CBP (geralmente com o paciente ainda
assintomático) é o aumento da fosfatase alcalina sérica . Na medida em que a colestase intra-
hepática evolui, é muito comum o surgimento de hipercolesterolemia, com aumento particular‐
mente pronunciado dos níveis de HDL (lipoproteína de alta densidade). Somente em estágios
avançados é que sobrevém a hiperbilirrubinemia (com predomínio da fração direta).
ESPECÍFICASESPECÍFICAS
O autoanticorpo antimitocôndria está presente em 95% dos casos , sendo sensível e específico
para o diagnóstico de CBP (S = 95%; E = 98%). Ele tem como antígeno-alvo uma porção da
enzima piruvato desidrogenase mitocondrial (a fração “di-hidrolipoamida acetiltransferase”). O
antimitocôndria é uma imunoglobulina da classe IgM, explicando o aumento de IgM na
eletroforese de proteínas do paciente. Existe ainda outra alteração sorológica específica: o FAN
(Fator Antinuclear) com padrão de reatividade contra o “complexo do poro nuclear”
(anticorpos contra a gp210 presente no envelope nuclear). Tal exame, no entanto, não é feito
de rotina, somente por laboratórios especializados.
QUADRO DE CONCEITOS VII
A CBP possui um marcador sorológico específico: o autoanticorpo antimitocôndria .
Os níveis séricos de IgM encontram-se aumentados, e o FAN pode ser positivo num
padrão de reatividade contra o "complexo do poro nuclear".
DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO
Segundo a AASLD ( American Association for the Study of Liver Diseases ), a hipótese de CBP
deve ser aventada em todo paciente que apresenta níveis séricos elevados de fosfatase alcalina.
Se outras etiologias mais comuns para este achado puderem ser afastadas (ex.: álcool, colestase
por obstrução da árvore biliar e medicamentos indutores de colestase intra-hepática — ex.:
clorpromazina, esteroides androgênicos sintéticos, trimetoprima-sulfametoxazol, tolbutamida),
a dosagem do autoanticorpo antimitocôndria deve ser solicitada. Títulos ≥ 1:80 são altamente
específicos. Para confirmar o diagnóstico, é preciso ter, pelo menos, dois dos três critérios a
seguir ( ).
organismo. Tal fenômeno, por sua vez, é decorrente de um aumento na atividade da
enzima autotaxina , o que é diretamente induzido pela doença.
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seguir ( ).
Tab. 10
Critérios Diagnósticos de CBP (AASLD)
●
Presença do antimitocôndria.
●
Hepatograma sugestivo de colestase (comumen ​te aumento isolado da fosfatase
alcalina).
●
Biópsia hepática mostrando colangite destrutiva não supurativa, com lesão dos
ductos biliares interlobulares.
Como deu pra perceber, a biópsia hepática atualmente NÃO É CONSIDERADA OBRIGA‐
TÓRIA para confirmar o diagnóstico! No entanto, vale dizer que, graças às importantes
informações que este exame fornece (estadiamento da doença), a maioria dos hepatolo ​gis​tas
acaba optando por sua realização. Observe, na , uma representação esquemática
das alterações histológicas evolutivas da CBP. Estude, na , o sistema de
estadiamento.
Tabela 10
Figura 9 _
Tabela 11
_
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Tab. 11
Estadiamento Histológico da CBP 
●
Inflamação restrita aos espaços porta, com formação de granulomas.
●
Inflamação atingindo a região periportal, com proliferação de ductos biliares.
●
Septos fibrosos interlobulares.
●
Cirrose hepática.
TRATAMENTOTRATAMENTO
O prurido é tradicionalmente abordado com colestiramina (4 g diluído em água, 3x/dia). Este
quelante de ácidos biliares atua aumentando a eliminação intestinal de substâncias relaciona​das
ao prurido que se acumulam no corpo do paciente. Outros fármacos que se mostraram
benéficos no controle do prurido da CBP são: ondansetrona (4 mg VO conforme necessidade,
até 3x/dia) e a sertralina (75–100 mg/dia). O primeiro é um antiemético antagonista do receptor
5-HT3 de serotonina; o segundo é um antidepressivo inibidor seletivo da recaptação de
serotonina no SNC. Casos refratários e insuportáveis podem ser submetidos à plasmaférese .
Em pacientes que cursamcom esteatorreia, deve-se repor, conforme a necessidade, as vitaminas
lipossolúveis do grupo “ADEK” , principalmente se o paciente fizer uso de colestiramina, que
diminui ainda mais a absorção intestinal desses nutrientes.
Fig. 9: Representação esquemática das alterações histológicas evolutivas da CBP.
SAIBA MAIS…
CBP e antimitocôndria negativo.
Raros pacientes apresentam quadro clinicolaboratorial compatível com CBP, exceto
pela negatividade do antimitocôndria. Alguns autores se referem a esta entidade
através da denominação genérica “colangite autoimune”. Sabemos que os níveis
séricos de IgM não são tão altos nesses doentes e que, com frequência, eles são
positivos para o autoanticorpo antimúsculo liso . Muitos apresentam, na realidade,
uma síndrome de superposição com hepatite autoimune ou colangite esclerosante
primária.
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A droga que se mostrou mais eficaz em tratar especificamente a CBP é o ácido ursodesoxicólico
(13–15 mg/kg/dia, dividido em 1–2 tomadas). Ele comprovadamente atrasa a progressão da
doença, em particular se iniciado em fases precoces, estabilizando a histologia hepática e
aumentando a sobrevida em longo prazo. A necessidade de um transplante hepático pode ser
protelada e até mesmo evitada em muitos indivíduos. O fato é que 20% dos pacientes tratados
com ácido ursodesoxicólico apresentam normalização do hepatograma dentro de dois anos,
proporção que aumenta para 40% após cinco anos. O principal efeito colateral é o ganho de
peso e, eventualmente, diarreia .
Recentemente, um novo fármaco foi aprovado para tratamento da CBP: trata-se do ácido
obeticólico . Esta droga pode ser associada ao ácido ursodesoxicólico em pacientes com cirrose
compensada (Child A) e resposta insatisfatória a este último. Também pode substituir o ácido
ursodesoxicólico nos pacientes intolerantes, sendo utilizado em monoterapia, desde que a
doença hepática esteja compensada (Child A). Seu uso na cirrose descompensada (Child B ou
C) ainda não foi adequadamente estudado.
Diversos outros fármacos já foram testados no tratamento da CBP, mas nenhum obteve os
mesmos benefícios que o ácido ursodesoxicólico. No entanto, vale mencionar que a colchicina
(0,6 mg VO 2x/dia) e o metotrexato (15 mg VO 1x/semana) também são eficazes para melhorar
as manifestações clínicas da doença. Tais drogas só não são usadas de rotina porque acarretam
muito mais efeitos colaterais que o ácido ursodesoxicólico, além de não serem tão eficazes
quanto ele.
Por fim, para pacientes que atingem estágios avançados (fibrose/cirrose hepática), apenas o
transplante de fígado pode prolongar a sobrevida. Além da presença de cirrose estabelecida,
também devem ser encaminhados para o transplante pacientes com níveis de bilirrubina > 5
mg/dl, albuminade hepatócitos determina
uma liberação súbita de cobre na circulação, originando hemólise . Os anéis de Kayser-
Fleischer podem estar ausentes (ver adiante). As medidas de cobre, urinário e plasmático, estão
elevadas, e a ceruloplasmina sérica costuma estar reduzida.
Cirrose: todo paciente jovem que se apresentar com quadro de cirrose inexplicada, com
marcadores virais negativos e sem história de alcoolismo, especialmente se também houver
alguma anormalidade neurológica, deve ser cuidadosamente investigado para doença de
Wilson.
FORMA NEUROLÓGICAFORMA NEUROLÓGICA
Embora quase metade dos pacientes se apresente com algum distúrbio psiquiátrico, geralmente
alterações de personalidade, a função cognitiva costuma ser preservada. Podem ocorrer
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alterações de personalidade, a função cognitiva costuma ser preservada. Podem ocorrer
síndromes indistinguíveis da esquizofrenia ou do transtorno bipolar. Em relação aos sinais e
sintomas neurológicos, estes estão sempre relacionados, de forma ampla, aos movimentos
(tipicamente, o paciente apresenta manifestações de distonia — ver ) . Não são
descritas alterações sensoriais.
Tab. 12
Sinais e Sintomas Neurológicos na Doença de Wilson: Distúrbios do Movimento
●
Distonia.
●
Hipertonia.
●
Rigidez.
●
Tremores.
●
Espasmos.
●
Contraturas.
●
Disartria.
●
Disfonia.
●
Disfagia.
Os distúrbios neurológicos e psiquiátricos ocorrem no adulto jovem e podem ser os primeiros
sinais clínicos em alguns pacientes. São sempre acompanhados pelos anéis de Kayser-Fleischer (
 ). Estes anéis são formados por depósitos de cobre na membrana de Descemet da
córnea, que adquirem uma coloração verde-dourada. Nunca interferem na visão, mas indicam
que o cobre hepático foi liberado e produziu lesão cerebral. Quando um paciente com doença
neurológica ou psiquiátrica não apresenta os anéis de Kayser-Fleischer ao exame clínico, pode-
se praticamente excluir a DW do diagnóstico diferencial!
Tabela 12
Figura 10 _
_
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O quadro, na maioria das vezes, é crônico e insidioso, mas pode também ser agudo e
rapidamente progressivo. A morte pode ser resultante dos efeitos da toxicose cúprica sobre o
sistema nervoso central, com pouca ou nenhuma evidência de disfunção hepática. Entretanto,
a hepatopatia costuma ocorrer em algum período durante a evolução da doença. Os pacientes
com sobrevida aumentada quase sempre apresentam cirrose hepática.
Os estudos de imagem do sistema nervoso central, como a ressonância nuclear magnética,
costumam evidenciar comprometimento bilateral dos gânglios da base, às vezes com lesão
associada em ponte, tálamo e/ou cerebelo.
ENVOLVIMENTO RENALENVOLVIMENTO RENAL
Os rins também podem ser afetados pela doença de Wilson. Depósitos de cobre nos túbulos
proximais podem justificar glicosúria, aminoacidúria, acidose tubular renal tipo II, ou mesmo
todas em conjunto, no espectro da síndrome de Fanconi .
Os efeitos patológicos do excesso de cobre em outros órgãos são mínimos, mas vale ressaltar
que é descrita uma maior incidência de abortamentos de repetição em mulheres jovens.
DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO
O diagnóstico da DW deve ser suspeitado em todo paciente com menos de 40 anos de idade
que apresente uma ou mais das seguintes alterações:
●
Hepatite crônica ativa sem causa aparente;
●
Cirrose hepática sem causa aparente;
●
Anemia hemolítica na presença de hepatite aguda;
Fig. 10: O anel de Kayser-Fleischer na doença de Wilson.
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●
Distúrbios inexplicados do sistema nervoso central (principalmente os quadros de distonia
associados a alterações de personalidade).
A avaliação inicial de um paciente com suspeita de doença de Wilson se dá por métodos não
invasivos. Um dos mais valiosos, como já vimos, seria a pesquisa dos anéis de Kayser-Fleisher .
Sabemos que eles podem ser visíveis a olho nu, mas se recomenda que sua presença seja
SEMPRE confirmada por um exame de lâmpada de fenda (biomicroscopia), realizado por
oftalmologista experiente. Os anéis de KF estão presentes em mais de 99% dos indivíduos com
sintomas neuropsiquiátricos, porém somente cerca de 30–50% dos indivíduos na fase pré-
sintomática ou com sintomas exclusivamente hepáticos os possuem. 
Entre os exames laboratoriais, a ceruloplasmina é normalmente o primeiro a ser solicitado.
Trata-se de uma proteína sintetizada no fígado que se responsabiliza pelo transporte de cobre
no sangue, evitando que este metal circule em sua forma livre. Os níveis normais de
ceruloplasmina variam de 20–50 mg/dl. Nos pacientes com doença de Wilson, estes níveis estão
caracteristicamente reduzidos ( 100 mcg/dia, num paciente com sintomas
compatíveis, são muito sugestivos do diagnóstico! Na fase pré-sintomática (isto é, crianças
ainda sem manifestações neurológicas ou cirrose hepática estabelecida), podemos encontrar
valores entre 60–100 mcg/dia, e nos indivíduos heterozigotos para mutações no gene ATP7B, a
excreção urinária de cobre pode chegar a 80 mcg/dia. De toda forma, em pessoas hígidas a
excreção urinária de cobre não ultrapassa 20–50 mcg/dia.
Mais recentemente, passamos a ter disponíveis métodos de análise genética para identificar
mutações específicas do gene ATP7B. Recomenda-se, ainda, que parentes de primeiro grau de
portadores da doença sejam rastreados.
Enfim, o método padrão-ouro para a confirmação diagnóstica é a biópsia hepática , com
quantificação da quantidade de cobre (em microgramas) por grama de peso seco de tecido.
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Valores > 200 mcg/g confirmam o diagnóstico na ausência de colestase obstrutiva prolongada
(esta última situação também aumenta o cobre hepático e pode justificar o surgimento dos
anéis de Kayser-Fleischer). Métodos histoquímicos para coloração do cobre no parênquima
hepático NÃO são confiáveis e não devem ser empregados!
Nos dias de hoje, a demonstração de níveis reduzidos de ceruloplasmina não deve ser
considerada "obrigatória" para o diagnóstico, pois se viu que cerca de 10% dos pacientes possui
ceruloplasmina normal. Além do mais, em cerca de 20% dos heterozigotos para alelos mutantes
do ATP7B (portadores do "traço" da DW, que não desenvolvem a doença), a ceruloplasmina
pode estar reduzida…
Em suma, o diagnóstico da DW é confirmado pela combinação entre quadro clínico
e dados bioquímicos e histoquímicos compatíveis. A ceruloplasmina costuma ser
utilizada como teste inicial, seguida de exame ocular com a lâmpada de fenda e/ou
da excreção urinária de cobre nas 24h. Testes genéticos podem ser utilizados e já
existem alguns disponíveis no mercado. Em caso de dúvida ou para a
determinação prognóstica mais exata da quantidade de cobre hepático, fica
indicada a biópsia hepática. 
TRATAMENTOTRATAMENTO
TRATAMENTO FARMACOLÓGICOTRATAMENTO FARMACOLÓGICO
O tratamento da DW visa à remoção do excesso de cobre do organismo. A droga mais utilizada
no passado era a D-penicilamina, ministradapela via oral na dose de 1,5–2 g/dia, fracionada em
quatro tomadas diárias (antes das refeições). Como esta droga apresenta efeito antipiridoxí‐
nico, recomenda-se sempre a coadministração de 25–50 mg/dia de vitamina B6 (piridoxina).
Nos dias de hoje, a D-penicilamina tornou-se uma medicação de segunda linha no tratamento
da DW, pois a experiência mostrou que ela se associa a elevadas taxas de efeitos adversos (ex.:
proteinúria nefrótica por glomerulopatia membranosa). Além do mais, a D-penicilamina
paradoxalmente piora as manifestações neuropsiquiátricas quando utilizada como primeira
droga em pacientes que apresentam acometimento do SNC.
A estratégia terapêutica moderna se baseia no tipo de manifestação que o paciente apresenta no
momento do diagnóstico.
Para pacientes em fase pré-sintomática ou em terapia de manutenção, a estratégia de escolha
pode ser apenas a suplementação diária de zinco pelo resto da vida. O z i n c o é
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comprovadamente eficaz na DW, sendo em geral bem tolerado. Ele atua principalmente pela
inibição da absorção intestinal de cobre, favorecendo um balanço negativo deste elemento
(pela eliminação urinária do excesso de cobre). Outro efeito do zinco é a indução da síntese
hepática de metalotioneína , um quelante endógeno de cobre expresso no citoplasma do
hepatócito, que ajuda a reduzir o cobre livre.
Quando o indivíduo se apresenta com doença sintomática , a literatura atual recomenda uma
avaliação especificamente padronizada da gravidade do quadro. Um método sugerido é
chamado de índice de Nazer ( ) e consiste num escore capaz de predizer o prognóstico
da falência hepática induzida pela DW.
Tab. 2
Um índice de Nazer 9 indica péssimo prognóstico e baixa probabilidade de resposta ao
tratamento clínico, sendo recomendável proceder diretamente ao Transplante Ortotópico de
Fígado (TOF) . Aqui também se encaixariam aqueles com formas fulminantes da DW. Nazer
entre 7–9 requer avaliação individualizada da conduta, podendo-se tentar o tratamento clínico
sem obrigatoriedade de listar o paciente para transplante.
Pacientes com manifestações neuropsiquiátricas da DW vêm sendo satisfatoriamente tratados
com uma droga experimental, o tetratiomolibdato , que se mostrou capaz de reduzir
agudamente a toxicidade do cobre sérico livre, sem agravar as manifestações neurológicas da
doença (ao contrário da penicilamina e da trientina). Como o tetratiomolibdato ainda não se
encontra amplamente disponível, na sua ausência, a droga de escolha para pacientes com
manifestações neuropsiquiátricas passa a ser o zinco (que também é inócuo do ponto de vista
neurológico).
Tabela 13
_
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A indica os principais esquemas terapêuticos para a DW. Vale lembrar que o
tratamento farmacológico deve ser permanente! Qualquer interrupção resultará em recidiva.
Uma dieta pobre em cobre não resulta concretamente em nenhum benefício, entretanto
devemos orientar os pacientes a evitar a utilização excessiva de alimentos ricos neste metal,
como chocolate, ostras e amendoim. 
Tab. 14
Gestantes portadoras da DW podem ser tratadas com zinco ou trientina durante a
gravidez, mas a intensidade do tratamento deve ser rigorosamente monitorada (ver
adiante), uma vez que a carência de cobre possui efeitos teratogênicos.
Tabela 14
_
SAIBA MAIS...
Monitoração da terapia redutora de cobre.
Usuários de quelantes de cobre, como trientina e D-penicilamina, devem ser
monitorados com dosagens seriadas do cobre sérico livre. O cobre sérico livre é
calculado através da fórmula:
Cobre sérico total - Cobre ligado à ceruloplasmina
Considera-se que cada 10 mg/dl de ceruloplasmina contêm 3 mcg/dl de cobre, e tal
valor deve ser substituído na fórmula exposta. O valor normal do cobre sérico livre
varia entre 10–15 mcg/dl e, em pacientes com DW, este valor comumente
ultrapassa 50 mcg/dl. O objetivo do tratamento com quelantes de cobre é manter o
cobre sérico livre 200 mcg/dia. O tratamento efetivo
com zinco, após 1–2 anos, deve reduzir a excreção urinária para valores( ))Figura 11 Figura 11 __
_
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É fácil percebermos, analisando o metabolismo do ferro, que a etapa intestinal é a grande
divisora de águas para a circulação do metal no organismo. Ao mesmo tempo em que é
responsável diretamente pela absorção do ferro, é também a sua principal via de excreção.
Várias anormalidades metabólicas têm sido sugeridas para a patogênese do superacúmulo
tissular de ferro na HH. A hipótese mais aceita é a que descreve um aumento no transporte
intestinal de ferro dos enterócitos para a corrente sanguínea.
O aumento é provavelmente consequência de uma programação equivocada das células duodenais
superficiais quando ainda se encontravam nas criptas, fazendo com que elas captassem ferro
avidamente (como se houvesse uma deficiência orgânica de ferro). Além disso, foi demonstrado
que a absorção de ferro é regulada por um transportador duodenal de metais chamado DMT1 ou
NRAMP2. Zoller e colaboradores detectaram uma maior expressão do RNA-mensageiro do
transportador DMT1 na mucosa duodenal de indivíduos com HH, o que promoveria a maior
captação duodenal de ferro. 
Em indivíduos sem a doença, o conteúdo total de ferro no organismo é muito estável: cerca de
4 a 5 g. Entretanto, nos pacientes homozigóticos C282Y sintomáticos, o que geralmente ocorre
entre os 40 e 60 anos de idade, os estoques de ferro oscilam entre 20 e 40 g. Isso ocorre porque
na HH há uma hiperabsorção intestinal de ferro, muito acima das necessidades orgânicas. Os
pacientes com HH têm, assim, uma absorção aumentada de ferro a despeito de ingesta dietética
com conteúdo normal do metal .
Embora existam várias teorias fisiopatogênicas que se propõem a elucidar o mecanismo exato
do descontrole na absorção intestinal de ferro da hemocromatose, ainda hoje muitas dúvidas
persistem, até porque grande parte do conhecimento acerca do metabolismo do ferro advém de
estudos experimentais, carecendo, portanto, de confirmação de estudos em humanos.
A deposição excessiva de ferro nas células parenquimatosas, em especial do fígado , pâncreas e
coração , acaba por estimular a peroxidação lipídica e a produção de radicais livres, lesando-as
e promovendo fibrose progressiva.
Tab. 16
Sintomas Inespecíficos (apresentação da doença)
●
Astenia.
Fig. 11: Fisiopatologia da HH.
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●
Letargia.
●
Fadiga.
●
Artralgias.
●
Perda da libido.
●
Impotência sexual.
●
Amenorreia.
●
Hepatomegalia.
Aqui há o video de apostila 7.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
A HH é raramente diagnosticada antes dos 20 anos. A maioria dos pacientes sintomáticos
encontram-se entre os 40–50 anos de idade ao diagnóstico. Embora o gene defeituoso seja
igualmente distribuído entre homens e mulheres, a maioria das séries tem identificado mais
homens do que mulheres em taxas que variam de 4 a 10:1, o que pode ser explicado pelas
"perdas fisiológicas" de ferro através das menstruações e gestações. A doença também
predomina em populações caucasianas.
O início da HH é insidioso, com sintomas inespecíficos que incluem astenia, letargia, fadiga,
artralgias, perda da libido ou impotência sexual entre os homens, e amenorreia entre as
mulheres.
A hepatomegalia está presente em cerca de 95% dos pacientes sintomáticos e geralmente precede
o desenvolvimento de sintomas ou alterações dos testes de função hepática.
Com o decorrer do tempo, outros sintomas e sinais aparecem, tais como os que serão descritos
a seguir:
DOR ABDOMINALDOR ABDOMINAL
Geralmente de caráter crônico, pode localizar-se em epigástrio e/ou quadrante superior direito,
provavelmente em virtude da hepatomegalia e distensão da cápsula hepática que se instalam. A
dor abdominal como sintoma inicial tem sido identificada nas diversas séries com frequências
que variam entre 10–50%.
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Casos raros de dor abdominal intensa aguda associada a choque circulatório têm sido
relatados. Várias etiologias já foram implicadas, incluindo peritonite bacteriana e sepse por
bactérias Gram-negativas.
DIABETES MELLITUSDIABETES MELLITUS
Embora depósitos de hemossiderina e fibrose sejam quase invariavelmente presentes no
parênquima pancreático, e os maiores depósitos sejam encontrados nas células exócrinas,
nenhuma evidência de insuficiência pancreática exócrina já foi documentada.
Por outro lado, 30–60% dos pacientes com HH avançada têm diabetes mellitus , sendo 70%
insulino-dependentes. Tanto a resistência à insulina quanto a sua diminuição de produção são
encontradas. A presença de diabetes piora o prognóstico.
OUTRAS ANORMALIDADES ENDÓCRINASOUTRAS ANORMALIDADES ENDÓCRINAS
A perda da libido e a atrofia testicular são comuns em indivíduos sintomáticos e podem
anteceder outras manifestações clínicas, principalmente em jovens. Da mesma forma, outros
sintomas de hipogonadismo (como amenorreia) também podem ocorrer antes que se altere a
função hepática.
MANIFESTAÇÕES CARDÍACASMANIFESTAÇÕES CARDÍACAS
As manifestações cardíacas são aparentes em 20 a 30% dos portadores de HH. Em pacientes
jovens, geralmente estão presentes no quadro inicial e constituem causa de morte frequente
entre eles.
Clinicamente, constituem Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC) com dilatação ventricular
bilateral, embora características restritivas tenham sido descritas. Arritmias também ocorrem,
sendo as extrassístoles ventriculares as mais frequentes. Entretanto, taquicardias ventricular e
supraventricular, fibrilação ventricular e vários graus de bloqueios não são incomuns.
Mesmo nos casos avançados de ICC, pode-se obter boa resposta clínica após depleção de ferro
através de programa de flebotomias em associação com deferoxamina.
HIPERPIGMENTAÇÃO CUTÂNEAHIPERPIGMENTAÇÃO CUTÂNEA
A hiperpigmentação cutânea está presente na maioria dos pacientes sintomáticos, mas está
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ausente nos estádios mais precoces do acúmulo de ferro. A pigmentação geralmente é
generalizada, mas comumente é mais acentuada na face, pescoço, faces extensoras dos
antebraços, dorso das mãos, pernas, região genital e antigas cicatrizes. Ocorre principalmente
por deposição de melanina na derme. Os depósitos de hemossiderina, quando presentes, são
mais óbvios nas glândulas sudoríparas.
ARTROPATIA HEMOCROMATÓTICAARTROPATIA HEMOCROMATÓTICA
Ocorre em torno de 50% dos indivíduos sintomáticos e pode representar a queixa inicial. Deve-
se sempre suspeitar de HH nos casos de sinais e sintomas de osteoartrite antes de 40 anos de
idade. Não está associada à extensão ou duração da sobrecarga de ferro e pode surgir ou se
agravar mesmo após a remoção do excesso dos estoques férricos. É idêntica à osteoartrite
degenerativa, exceto pelo achado frequente (50%) de deposição de pirofosfato cálcico
(condrocalcinose — ).Figura 12 _
_
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Qualquer articulação pode ser envolvida, mas o comprometimento mais característico se faz
nas metacarpofalangianas, principalmente na segunda e terceira articulações ( 
). Embora o envolvimento seja geralmente simétrico, pode ser unilateral. A incidência e a
gravidade aumentam com a idade, a despeito das flebotomias.
Fig. 12: Condrocalcinose.
Figura 13 _
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SINAIS DE INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICASINAIS DE INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICA
Nas fases mais tardias da doença, podem ocorrer esplenomegalia, edemas, ascite, icterícia e
outros sinais de insuficiência hepática crônica e hipertensão porta.
Sinais como eritema palmar, telangiectasias, rarefação de pelos e ginecomastia são descritos,
embora sejam menos comuns do que em cirroses de outras etiologias. As manifestações de
hipertensão porta podem também ocorrer, mas são menos frequentes do que na cirrose
hepática alcoólica. A função hepática é geralmente bem conservada, e os testes de função
hepática podemser normais, a despeito de grandes concentrações de ferro hepático e fibrose.
PREDISPOSIÇÃO A INFECÇÕESPREDISPOSIÇÃO A INFECÇÕES
Há uma maior predisposição a infecções, notadamente por Yersinia enterocolitica, Vibrio
vulnificus, Listeria monocytogenes e Pasteurella pseudotuberculosis .
Especula-se que a maior oferta de ferro não ligado a transferrina e uma possível disfunção dos
linfócitos CD8 e macrófagos possam ter algum papel nesta predisposição.
A frequência dos achados clínicos em 212 pacientes italianos com HH, na presença ou ausência
de cirrose hepática está relatada, na . A hepatomegalia e a pigmentação cutânea
foram os sinais mais prevalentes tanto em cirróticos como entre os não cirróticos. Por outro
lado, o diabetes, o hipogonadismo, o envolvimento cardíaco e a artropatia foram bem mais
comuns nos pacientes cirróticos.
Tab. 17
Fig. 13: Condrocalcinose nas metacarpofalangianas.
Tabela 17
_
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DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO
Primeiro passo: há suspeita clínica de hemocromatose hereditária?
O diagnóstico de HH em um homem de meia-idade com sinais de cirrose, com
hiperpigmentação cutânea e diabetes (chamado pelos franceses de "diabetes bronzeado"),
possivelmente associado com insuficiência gonadal ou ICC, é relativamente simples, mas deve
ser considerada uma falha diagnóstica.
Na verdade, a suspeita diagnóstica de HH deverá ser considerada em homens ou mulheres, em
qualquer idade na vida adulta, quando estiverem presentes Astenia crônica imotivada e/ou
Artralgia e/ou Aminotransferases elevadas sem motivo aparente, principalmente quando a
elevação for inferior a três vezes o limite superior da normalidade: é a "regra dos 3 As" . A
"regra dos 3 As" é uma simplificação de raciocínio clínico cujo maior ensinamento é ampliar a
noção de inespecificidade da apresentação clínica inicial dos pacientes com HH, visando ao
aumento da sensibilidade do exame clínico para o diagnóstico daquela doença.
Segundo passo: há anormalidades bioquímicas do metabolismo do ferro?
Uma vez identificado o paciente com suspeita clínica de HH, é necessário investigar os três
principais parâmetros do metabolismo do ferro, que são: o ferro sérico, o Índice de Saturação
da Transferrina (IST) e a ferritina sérica.
1.
Ferro sérico: o ferro sérico, cujos níveis normais situam-se em torno de 20 µmol/L, tendendo a
maiores valores entre os homens, geralmente possui níveis acima de 30 µmol/L nas sobrecargas
de ferro. Entretanto, por ser um índice muito sensível a variações por alterações
intralaboratoriais, circadianas e ao longo do ciclo menstrual, praticamente só tem utilidade para
o cálculo do IST.
2.
Índice de Saturação da Transferrina (IST): o IST é o teste isolado mais sensível para a
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identificação fenotípica de homozigotos para HH. É calculado a partir do quociente entre o
ferro sérico e a capacidade total de ligação do ferro, multiplicado por 100. O valor normal do
IST situa-se entre 30–40%, sendo geralmente maior que 60% nos homens e maior que 50% nas
mulheres com HH clínica. É um índice mais estável que o ferro sérico e mais precoce, já que
frequentemente se eleva já na adolescência dos pacientes com HH. É sabido que o IST é mais
sensível para o diagnóstico de HH do que a ferritina sérica, a qual só se torna elevada na
presença de grandes acúmulos de ferro.
3.
Ferritina sérica: a ferritina sérica reflete os estoques de ferro, estando, em indivíduos normais, na
faixa entre 10–300 µg/L. Não há variação diurna significativa, e os valores são maiores nos
homens. Devemos lembrar, entretanto, que na HH, principalmente em adolescentes, a ferritina
sérica poderá estar normal... Quando em níveis superiores a 1.000 µg/L, a ferritina pode sugerir a
presença de fibrose, principalmente quando há história de ingesta etílica superior a 60 g de etanol
por dia, hepatomegalia e/ou aumento de transaminases. Também é importante ressaltar que a
ferritina sérica é uma proteína de reação de fase aguda, podendo estar elevada em infecções,
processos inflamatórios ativos e neoplasias malignas.
A combinação de IST aumentado e ferritina sérica também aumentada em um indivíduo saudável
tem sensibilidade de 93% para o diagnóstico de HH. Por outro lado, em um indivíduo com mais
de 35 anos, o valor preditivo negativo dos dois testes associados é de 97%. Em um estudo
australiano, a sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo de um IST acima de 50%
para a detecção de homozigose para C282Y foi, respectivamente, 94%, 96% e 6%.
Terceiro passo: há hemocromatose?
O terceiro passo consiste em provar a existência de HH, o que poderá ser feito através de duas
vias confirmatórias, na dependência da disponibilidade de testes genéticos.
1.
Via confirmatória clássica: é baseada na realização de biópsia hepática naqueles indivíduos com
indícios clínicos e/ou laboratoriais de sobrecarga de ferro. A histologia hepática é essencial para:
(1) confirmar a sobrecarga férrica (ferro hepático corável pela coloração de Perls ou “azul da
Prússia” graus 3/4+); ( 2 ) identificar o padrão característico de distribuição periportal e
hepatocítica dos depósitos de ferro; (3) promover uma avaliação semiquantitativa do excesso de
ferro (concentração hepática de ferro superior a 80 μmol/g de tecido hepático seco; índice
hepático de ferro superior a 1,9); e (4) detecção de lesões pré-malignas potenciais, como por
exemplo, focos livres de depósitos de ferro.
2.
Nova via confirmatória: é baseada na detecção da mutação C282Y por técnica baseada em
reação de cadeia de polimerase (PCR). A genotipagem para a mutação C282Y é um teste útil no
diagnóstico de HH na prática clínica, com uma sensibilidade de cerca de 90% e uma
especificidade de 100%. Quando é determinada a homozigose para a mutação C282Y, isto é,
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especificidade de 100%. Quando é determinada a homozigose para a mutação C282Y, isto é,
C282Y +/+, é feito o diagnóstico de HH.
Nesse caso, a avaliação do nível de sobrecarga de ferro se pautaria no grau de hiperferritinemia
e, se disponível, em dados de ressonância nuclear magnética (RM — hipossinal hepático em
T2). A biópsia hepática ficaria então restrita aos casos nos quais haja suspeita significativa de
uma sobrecarga de ferro suficientemente grande que possibilite a existência de dano hepático:
fibrose ou mesmo cirrose.
Dessa forma, a maior mudança estratégica entre as duas vias confirmatórias é a
realização de biópsia hepática, na nova via, mais com objetivos prognósticos do
que diagnósticos. Na prática, é importante ressaltar que a biópsia hepática deverá
sempre ser considerada quando houver suspeitas suficientes de superacúmulo de
ferro, a despeito de testes genéticos negativos. 
Veja, nas e , os exames de imagem confirmando a hemocromatose.Figuras 14 _ 15 _
_
Fig. 14: HH vista à RM. Imagens axiais e sagitais em T1 e T2 do abdome superior, mostrando hipossinal
evidente em todo o parênquima hepático.
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Tab. 18: Exames complementares na hemocromatose.
*É calculado dividindo-se o ferro hepático (em mmol/g) pela idade do paciente em anos.
RASTREAMENTORASTREAMENTO
O screening familiar entre parentes de primeiro grau e, se possível, entre os de segundo grau de
pacientes sabidamente portadores de HH deverá ser feito com teste genético para a detecção da
mutação C282Y e, em caso de homozigose, avaliar-se-iam os índices do metabolismo do ferro e
Fig. 15: TC de abdome superior mostrando grande atenuação do parênquima hepático, o qual normalmente
possui uma atenuação semelhante ao parênquima esplênico. Sinais semelhantes são vistos na toxicidade por
amiodarona.
_
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enzimas hepáticas. Não se justifica o teste genético em parentes com idade inferior a dez anos.
O rastreamento para HH na população geral é uma questão mais controversa. Aparentemente,
ainda não foidefinido o papel dos testes genéticos no diagnóstico populacional da doença, em
virtude da ausência de análises adequadas de custo-benefício e as recentes dúvidas quanto à
possibilidade de discriminação genética. Uma abordagem mais prática e consensual é a de
analisar o metabolismo do ferro através do IST e ferritina sérica como exames iniciais.
Provavelmente, a faixa etária ideal para esse rastreamento encontra-se entre 18–30 anos, faixa
na qual a doença é provavelmente detectável por testes séricos do ferro na maioria dos
pacientes antes de haver fibrose hepática significativa ou outros danos orgânicos. Assim, o teste
genético estaria reservado àqueles com IST maior que 45% e/ou ferritina sérica maior que 300
µg/L.
Apesar de alguns autores defenderem a pesquisa ostensiva em subgrupos supostamente com
maior risco de HH, como os diabéticos e os pacientes com miocardiopatia dilatada ou artrite de
origem desconhecida, este “ screening dirigido” sofre algumas críticas por outros autores.
Como exemplo, citamos um recente estudo neozelandês que demonstrou prevalências
equivalentes de mutações do gene HFE entre diabéticos e a população geral, não referendando
o rastreamento dirigido para pacientes diabéticos.
TRATAMENTOTRATAMENTO
Além das medidas direcionadas à retirada do excesso corporal de ferro, que serão descritas a
seguir, o tratamento das disfunções cardíacas pode requerer glicosídeos, o diabetes pode
necessitar de insulina em cerca de 70% dos pacientes, o hipotireoidismo requer reposição de
hormônio tireoidiano, a impotência sexual pode ser aliviada com o uso de andrógenos, e a
artropatia poderá ser tratada com anti-inflamatórios não hormonais.
ORIENTAÇÕES GERAISORIENTAÇÕES GERAIS
Os pacientes com hemocromatose devem evitar suplementos de ferro (antianêmicos ou
polivitamínicos enriquecidos com ferro), vitamina C (que aumenta a absorção intestinal de
ferro) e ingesta excessiva de carne vermelha (uma rica fonte de ferro ligado ao heme). Além
disso, estes pacientes não devem ingerir bebidas alcoólicas (que podem acelerar o dano
hepático) e frutos do mar, principalmente ostras cruas, já que têm sido descritos casos de
infecções fatais por ostras contaminadas com Vibrio vulnificus em pacientes com HH.
FLEBOTOMIASFLEBOTOMIAS
A remoção de ferro através de flebotomias (sangrias) ainda é a principal ferramenta terapêutica
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A remoção de ferro através de flebotomias (sangrias) ainda é a principal ferramenta terapêutica
para a HH , com indícios evidentes de melhora da sobrevida em vários estudos. O tratamento
visa apenas os homozigotos e tem por finalidade esgotar os estoques aumentados de ferro,
procurando levá-los aos seus níveis normais.
A maioria dos autores preconiza um programa semanal ou quinzenal de flebotomias, de
acordo com a tolerância de cada indivíduo (menor nos indivíduos idosos). O programa terá a
duração de alguns meses até dois a três anos, conforme a precocidade do diagnóstico e do
tratamento. Cada sangria de 500 ml de sangue total proporciona uma perda de cerca de 250
mg de ferro. Realizam-se uma a duas flebotomias por semana até que os estoques em excesso
de ferro sejam esgotados. É aconselhável proceder-se à dosagem de ferritina sérica e IST a cada
dois a três meses ou a cada 1 a 2 g de ferro removido (1 g ferro corresponde, aproximadamente,
a quatro sangrias), a fim de acompanhar o retorno ao normal dos estoques férricos. No início,
a ferritina pode oscilar muito, para em seguida cair progressivamente. Já o IST não é um bom
parâmetro para avaliação durante o programa de sangrias, já que tem uma tendência a se
manter elevado até que os estoques se aproximem dos limites inferiores da normalidade.
Quando isso ocorre, a ferritina apresenta-se abaixo de 50 ng/ml, o IST é inferior a 50%, e a
hemoglobina (que deverá ser dosada a cada sangria) encontra-se em torno de 11 g/dl, sem
tendência a se elevar de imediato com a suspensão do tratamento. Quando esses parâmetros
são alcançados, o objetivo passa a ser o de evitar o reacúmulo, sendo suficiente, em geral, uma
sangria de 500 ml a cada três a quatro meses por toda a vida, embora alguns indivíduos possam
requerê-las em intervalos mais curtos. Os níveis de ferritina devem ser mantidos entre 50–100
ng/ml , evitando-se a deficiência de ferro.
O sangue retirado poderá ser utilizado em bancos de sangue, desde que sejam excluídas as
doenças hemotransmissíveis potenciais.
Em pacientes cirróticos e com hipoproteinemia, a eritrocitaférese (retirada através de um
equipamento automatizado de eritrócitos do sangue) com reinfusão de plasma centrifugado
representa uma válida alternativa.
DEFEROXAMINA/DEFERIPRONADEFEROXAMINA/DEFERIPRONA
A deferoxamina é um agente quelante do ferro introduzido na prática clínica há mais de 20
anos. Entretanto, não é recomendada habitualmente no tratamento da HH, já que é uma
droga de alto custo, de administração trabalhosa (geralmente como infusão subcutânea
contínua em um período de 12 horas, por quatro a seis dias por semana, através de uma
bomba especial portátil) e, sozinha, é praticamente ineficaz neste tipo de doença, pois
possibilita a excreção diária de apenas 20 a 90 mg de ferro. Além disso, existem complicações
potenciais com o uso crônico da deferoxamina, tais como infecções por Yersinia spp., lesões
retinianas e de nervo acústico.
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A deferoxamina poderá ser útil, todavia, como coadjuvante das flebotomias em alguns casos de
HH com cardiopatia ou naqueles indivíduos que não toleram o programa de sangrias.
A deferiprona, um quelante oral do ferro, é atualmente liberado para uso clínico somente na
Índia, para o tratamento das sobrecargas secundárias de ferro, principalmente nos casos
associados à talassemia major . A eficácia em curto prazo é similar à da deferoxamina, mas a
eficácia em longo prazo é controversa. Alguns estudos têm relatado diminuição na ferritina
sérica, outros não mostraram benefício algum ou mostraram até mesmo uma aceleração da
fibrose hepática com o seu uso em pacientes com talassemia major . Por esse motivo e por
potenciais efeitos colaterais graves, não é recomendado seu uso no tratamento da HH.
TRANSPLANTE HEPÁTICOTRANSPLANTE HEPÁTICO
O Transplante Ortotópico de Fígado (TOF) tem sido recomendado para os casos de cirrose
terminal. Entretanto, é importante ressaltar que vários estudos têm demonstrado que os
hemocromatóticos apresentam uma mortalidade pós-transplante muito maior que os outros
tipos de cirrose, provavelmente em decorrência de cardiopatias concomitantes e intercorrências
infecciosas. A sobrevida em um ano após TOF para pacientes com HH é de cerca de 50%, o
que é muito inferior à sobrevida após TOF por outras etiologias.
RESPOSTA AO TRATAMENTORESPOSTA AO TRATAMENTO
O tratamento não reverte a cirrose já estabelecida, mas proporciona uma nítida melhora clínica
e laboratorial da disfunção hepática presente. Ele reduz também a dependência à insulina dos
pacientes com diabetes mellitus , melhora a pigmentação anormal da pele, os distúrbios
cardíacos determinados pela síndrome, o mal-estar geral, a astenia e as dores abdominais, se já
presentes.
Por outro lado, as flebotomias não melhoram o hipogonadismo e suas consequências, não
impedem o aparecimento e a progressão da artropatia nem o surgimento de Carcinoma
Hepatocelular (CHC).
PROGNÓSTICOPROGNÓSTICO
O prognóstico da HH parece depender diretamente da quantidade (e, provavelmente, da
duração) do acúmulo de ferro. Pacientes que são depletados durante os primeiros 18 meses de
tratamento têm melhor prognóstico.
A expectativa de vida é normal se as flebotomias forem iniciadas antes do surgimento de cirrose
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A expectativa de vida é normal se as flebotomias forem iniciadas antes do surgimento de cirrose
e, mesmo nos cirróticos, a taxa de sobrevida em dez anos, após normalização dos estoques de
ferro, é de 80%, superior ao que ocorre em outras formas decirrose hepática.
O prognóstico é mais grave quando há cirrose hepática ao diagnóstico, diabetes mellitus , mas
não é influenciado pelo sexo ou pela existência de artropatia.
Existem várias evidências provenientes de estudos experimentais e em humanos que sustentam
o papel carcinogênico do ferro, tanto a forma livre do íon quanto o ferro ligado à transferrina.
O risco de morte por CHC de um indivíduo com HH é 100 vezes maior que o risco na
população geral. Além disso, muitos casos de CHC ocorrem vários anos após a depleção
adequada dos estoques de ferro por flebotomias.
Vale ressaltar que a sobrecarga de ferro parece contribuir para o desenvolvimento de CHC em
indivíduos com cirrose hepática causada por infecção crônica pelo vírus da hepatite C.
O rastreamento ideal de CHC em portadores de HH ainda está por ser definido. Entretanto,
estudos preliminares prospectivos multinacionais têm mostrado que o rastreamento semestral
com USG e dosagem de alfafetoproteína pode detectar tumores de até 1 cm de diâmetro.
CAPÍTULO 3CAPÍTULO 3
COMPLICAÇÕES DA CIRROSECOMPLICAÇÕES DA CIRROSE
INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICAINSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICA
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
Aqui há o video de apostila 8.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
Como vimos, qualquer doença crônica que acometa o fígado pode resultar em cirrose a partir
da instalação de necrose hepatocelular difusa e da consequente tentativa de regeneração dos
hepatócitos. Este processo dinâmico de destruição e regeneração leva a modificações na matriz
extracelular que culminam em deposição progressiva de tecido fibrótico em substituição ao
parênquima funcionante. Surge, assim, uma significativa desorganização arquitetônica e
vascular dos lóbulos hepáticos que acaba por gerar graves danos funcionais.
Dúvidas Acadêmicas do CapítuloTESTE SEU CONHECIMENTOConfira as dúvidas acadêmicas do capítulo clicando aqui
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vascular dos lóbulos hepáticos que acaba por gerar graves danos funcionais.
O termo “insuficiência hepática crônica” é utilizado para descrever as complicações sistêmicas
decorrentes de uma queda lenta e gradual na função dos hepatócitos, tal como acontece na
cirrose. A esse conjunto de sinais e sintomas, podemos caracterizar a “síndrome de insuficiência
hepatocelular”. Reservamos o termo “insuficiência hepática aguda” para os casos de lesão
hepatocelular fulminante, em que a função dos hepatócitos é abruptamente perdida.
Quais são as consequências da cirrose hepática?
A perda progressiva de hepatócitos funcionantes leva a uma série de alterações que se instalam
de maneira insidiosa. Assim, podemos dividir a evolução do dano hepático em duas fases
principais. A primeira é a “fase compensada”, em que predominam distúrbios endócrinos e
hemodinâmicos . Os distúrbios endócrinos são caracterizados pelo hiperestrogenismo e
hipoandrogenismo, explicando (pelo menos em parte) vários achados semiológicos da cirrose
(ex.: telangiectasias e ginecomastia). As alterações hemodinâmicas da cirrose são complexas: ao
lado de um estado hiperdinâmico de alto débito cardíaco e retenção hidrossalina, observa-se
uma “hipovolemia relativa”, na qual o volume circulante efetivo, e, portanto, o fluxo sanguíneo
para os órgãos, está reduzido.
Num segundo momento, teríamos a “fase descompensada”, caracterizada por complicações da
hipertensão porta (varizes esofagogástricas, ascite) ou da disfunção hepática (encefalopatia
hepática, hipoalbuminemia e coagulopatia). A resume as complicações da cirrose.
Tab. 1
Principais Complicações da C irrose Hepática
Insuficiência Hepática Crônica
Hiperestrogenismo/hipoandrogenismo
●
Eritema palmar.
●
Telangiectasias do tipo "aranha vascular".
●
Ginecomastia.
●
Redução da massa muscular.
●
Atrofia interóssea.
●
Rarefação de pelos.
●
Atrofia testicular.
●
Perda da libido, disfunção erétil.
Tabela 1
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Perda da libido, disfunção erétil.
Distúrbios hemodinâmicos
●
Resistência vascular periférica diminuída (vasodilatação).
●
Alto débito cardíaco.
●
Retenção hidrossalina (ascite, anasarca).
●
Hipovolemia relativa — redução do volume circulante efetivo.
Outras alterações
●
Baqueteamento (ou hipocratismo) digital.
●
Aumento de parótidas.
Hipertensão Porta (“sinusoidal”)
●
Ascite.
●
Varizes esofagogástricas (sangramento digestivo).
●
Esplenomegalia congestiva (hiperesplenismo: plaquetopenia, leucopenia, anemia).
●
Circulação colateral visível no abdome (“cabeça de medusa”).
Insuficiência Hepatocelular
●
Icterícia.
●
Encefalopatia hepática.
●
Coagulopatia.
●
Hipoalbuminemia (anasarca).
●
Desnutrição.
●
Imunodepressão.
●
Síndromes hepatorrenal e hepatopulmonar.
Hepatocarcinoma
Certamente, esta divisão é muito mais de cunho didático e vai mudando conforme novos
conceitos são agregados. Nos consensos atuais, por exemplo, podemos encontrar termos um
pouco mais específicos como “Doença Hepática Crônica Avançada compensada (DHCAc)”,
definido pela ausência de complicações da cirrose no presente ou no passado que pode vir
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definido pela ausência de complicações da cirrose no presente ou no passado que pode vir
acompanhada de hipertensão porta clinicamente significativa ou não (veremos adiante). Já
para a doença descompensada, a definição inclui critérios como ascite evidente (ou derrame
pleural com GASA ≥ 1,1), encefalopatia hepática evidente (> grau II de West Haven) ou
sangramento varicoso. 
ACHADOS PERIFÉRICOSACHADOS PERIFÉRICOS
SINAIS DE HIPERESSINAIS DE HIPERES ​TROGETROGE ​NISMO/HIPOANDRONISMO/HIPOANDRO ​GENISMOGENISMO
Por mecanismos pouco compreendidos, a cirrose hepática altera a homeostase dos hormônios
sexuais. Nas fases iniciais, sabe-se que a metabolização do estrogênio pode estar prejudicada.
Além disso, detecta-se um aumento dos níveis séricos de estrona, devido à maior conversão
periférica de androgênios em estrogênios no tecido adiposo. O aumento da SHBG (globulina
ligadora de hormônio sexual) também é característico da cirrose e pode contribuir para a
detecção de níveis altos de estrogênios nesses pacientes. Com o avançar da hepatopatia, caem
os níveis séricos de testosterona. Embora a maior parte seja transformada na forma ativa por
ação da 5-alfa-redutase na próstata, uma parte também se dá na pele e no fígado. Ainda se
pode observar a diminuição na síntese do hormônio nas gônadas. Dessa forma, podemos dizer
que o achado característico da cirrose hepática é a associação de hiperestrogenismo com
hipoandrogenismo . 
Cirrose hepática
Hiperestrogenismo + Hipoandrogenismo
O hiperestrogenismo é o responsável pelas alterações vasculares cutâneas da cirrose,
representadas pelo eritema palmar e pelas telangiectasias do tipo “aranha vascular”. Sabe-se
que altos níveis de estrogênio causam proliferação e dilatação de vasos cutâneos, especialmente
na porção superior do corpo. As telangiectasias do tipo “aranha vascular” (ou spider angioma )
são caracterizadas por uma dilatação arteriolar central ligando-se a capilares dilatados com
disposição radial — .Figura 1 _
_
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O enchimento após a compressão da lesão ocorre do centro para a periferia, sendo específico
desse tipo de telangiectasia. São encontradas no pescoço, na porção superior do tronco e dos
membros superiores. O eritema palmar é decorrente da vasodilatação cutânea restrita à região
palmar, principalmente nas regiões tenar e hipotenar. O fluxo sanguíneo para essa região pode
aumentar em até seis vezes.
Não era de se estranhar o aparecimento dessas lesões cutâneas do hiperestrogenismo... Durante
a gestação, uma condição fisiológica de hiperestrogenismo, observamos o aparecimento de
telangiectasias do tipo “aranha vascular” e eritema palmar em até 70% dos casos! Essas lesões
costumam desaparecer, em média, três meses após o parto. Na doença hepática aguda e,
eventualmente, em pessoas normais, tais lesões tambémorigem à cirrose hepática.
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entrar em contato com as placas de hepatócitos, numa espécie de shunt intra-hepático, indo
diretamente dos espaços porta para as veias centrolobulares. E como existe uma doença
hepática crônica, com atividade necroinflamatória persistente, os ciclos de necrose, fibrose e
regeneração celular continuam se alternando, até que a regeneração hepatocitária fique restrita
aos espaços formados entre diversas traves fibróticas interligadas. Temos então os chamados “
nódulos de regeneração ” 
Ao contrário dos lóbulos hepáticos normais, onde as placas de hepatócitos e a rede de
sinusoides são rigorosamente coordenadas, de modo a fazer o sangue fluir em direção à veia
centrolobular (sistema cava), os nódulos de regeneração são constituídos por uma massa de
hepatócitos desprovida de funcionalidade, uma vez que tais nódulos não possuem relação com
uma veia centrolobular . Assim, os nódulos de regeneração representam uma tentativa
(frustrada) do fígado de reestabelecer sua citoarquitetura funcional em meio à fibrose intensa e
disseminada secundária ao processo necroinflamatório crônico! Lembra da incrível capacidade
( Figura 3 ) . _
_
Fig. 3: Tentativa de regeneração do fígado. 
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que o fígado tem de se regenerar? Pois é... O desarranjo estrutural que caracteriza a cirrose
hepática pode ser decorrente de qualquer doença hepática crônica e, quando bem estabelecido,
infelizmente, é irreversível.
QUADRO DE 
CONCEITOS I
O que é cirrose hepática?
Cirrose hepática é um processo patológico irreversível do parênquima hepático
caracterizado por dois componentes: (1) fibrose hepática "em ponte" , com formação
de shunts vasculares no interior dessas traves fibróticas; e (2) rearranjo da
arquitetura lobular nos chamados nódulos de regeneração , desprovidos de
comunicação com uma veia centrolobular. É a resposta comum do parênquima
hepático a qualquer estímulo lesivo persistente, representado geralmente por
inflamação e necrose hepatocitária.
A apresenta uma peça de biópsia hepática de um paciente cirrótico, visualizada à
microscopia de menor aumento. Observe os vários nódulos regenerativos (em vermelho)
circundados por tecido fibrótico (em azul). Obs.: o formato cilíndrico da peça corresponde à
luz da agulha de biópsia.
Figura 4 _
_
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O encontro desse “panorama histopatológico” (fibrose em ponte + nódulos) tem o poder de
confirmar o diagnóstico de cirrose hepática (logo, método “padrão-ouro” = biópsia). Mas é
válido ressaltar que, apesar de ser o exame “padrão-ouro”, na maioria das vezes, a biópsia não
é necessária para o DIAGNÓSTICO de cirrose, bastando uma análise conjunta do quadro
clínico, laboratorial e radiológico. A biópsia seria reservada aos casos de dúvida diagnóstica
persistente, assim como em situações específicas, por exemplo: no acompanhamento das
hepatites virais crônicas, para avaliar a indicação de tratamento em alguns pacientes e estimar o
prognóstico. 
O fígado com cirrose em estágio avançado também é diferente, à macroscopia, do fígado
normal. Por exemplo: quando o cirurgião opera o abdome de um cirrótico, pode-se notar um
aspecto macro ou micronodular na superfície do órgão. O tamanho do fígado depende do grau
de cirrose: nos casos mais avançados, a tendência é sua redução e atrofia como um todo! Por
outro lado, um dado semiológico patognomônico de cirrose é o encontro de redução do lobo
hepático direito ( 1. A partir do momento em que a cirrose se instala, é típica
uma inversão desse padrão, com o paciente apresentando ALT/AST AST
(TGO), enquanto que, na cirrose, temos o oposto: AST (TGO) > ALT (TGP).
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(TGO), enquanto que, na cirrose, temos o oposto: AST (TGO) > ALT (TGP).
Exceção à regra é a doença hepática alcoólica , onde AST (TGO) > ALT (TGP)
desde o início do quadro.
BILIRRUBINASBILIRRUBINAS
A hiperbilirrubinemia é um fator de mau prognóstico na cirrose hepática, ocorrendo
principalmente à custa da fração direta. Na colangite biliar primária, por exemplo, bilirrubina
total superior a 10 mg/dl indica a necessidade de transplante ortotópico de fígado!
HIPOALBUMINEMIAHIPOALBUMINEMIA
Denota insuficiência crônica de síntese hepatocelular. O deficit de síntese costuma se associar à
desnutrição proteicocalórica, comum no paciente cirrótico, o que piora ainda mais a
hipoalbuminemia. Isto é particularmente frequente nos etilistas crônicos portadores de cirrose
alcoólica.
ALARGAMENTO DO TEMPO DE PROTROMBINA EALARGAMENTOpodem ser encontradas...
O hipoandrogenismo é responsável pela queda da libido, impotência masculina, atrofia
testicular, redução importante da massa muscular (evidenciada pela atrofia dos músculos
interósseos das mãos) e rarefação de pelos (cuja distribuição passa a respeitar o padrão
feminino). A ginecomastia — — é decorrente do hipoandrogenismo associado ao
hiperestrogenismo.
Fig. 1: Telangiectasias do tipo "aranha vascular".
Figura 2 _
_
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BAQUETEAMENTO (OU HIPOCRATISMO) DIGITALBAQUETEAMENTO (OU HIPOCRATISMO) DIGITAL
O que é baqueteamento (ou hipocratismo) digital? Quem já viu nunca mais esquece... A ponta
dos dedos torna-se "abaulada" na base da unha, dando ao dedo um aspecto de "baqueta de
tambor" — . O que ocorre é um aumento volumétrico do tecido subcutâneo
vascularizado da extremidade digital, por mecanismos ainda desconhecidos. A sinonímia
"hipocratismo digital" vem do fato de esta anomalia ter sido inicialmente reconhecida pelo
lendário Hipócrates no século IV a.C.
Fig. 2: Ginecomastia.
Figura 3 _
_
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A enumera as principais condições relacionadas ao baqueteamento digital. É
importante lembrar que existe o baqueteamento digital hereditário , de herança autossômica
dominante. Este deve ser suspeitado quando o indivíduo tem baqueteamento desde criança e
existem outros familiares com a mesma alteração. Entretanto, a forma hereditária é rara
quando comparada à forma adquirida.
Tab. 2
Causas de Baqueteamento (ou hipocratismo) Digital
Doenças intratorácicas e pulmonares
●
CA broncogênico.
●
Outros CA intratorácicos (metástase, mesotelioma, tumor de mediastino).
●
Supurações crônicas (empiema pleural, abscesso pulmonar).
●
Bronquiectasias.
●
Fibrose cística.
●
Fibrose pulmonar idiopática.
Doenças cardíacas
●
Cardiopatia congênita cianótica (ex.: tetralogia de Fallot).
●
Endocardite bacteriana subaguda.
Doenças gastrointestinais
●
Cirrose hepática.
●
Esquistossomose.
●
Doença inflamatória intestinal (Crohn, retocolite).
●
Diarreia crônica.
●
Fig. 3: Baqueteamento (ou hipocratismo) digital.
Tabela 2
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Uso de laxantes.
DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOSDISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS
Embora os distúrbios hemodinâmicos da cirrose hepática sejam altamente dependentes da
hipertensão porta, a disfunção hepatocelular também pode contribuir para sua gênese, uma vez
que um distúrbio semelhante é identificado nos pacientes com insuficiência hepática fulminante
(quando não há hipertensão porta).
Uma teoria clássica, chamada " Teoria do Underfilling ", diz o seguinte: a hipertensão porta da
cirrose provoca o extravasamento de líquido intravascular para a cavidade peritoneal, através
dos sinusoides hepáticos. Essa pequena queda da volemia estimula os barorreceptores a ativar
o sistema renina-angiotensina-aldosterona, o sistema nervoso simpático e a liberação de ADH
(hormônio antidiurético). A ativação desses sistemas, por sua vez, promove a retenção de
líquido pelos rins, na tentativa de restaurar a volemia. Porém todo o líquido retido volta a
extravasar para a cavidade peritoneal e, assim, forma-se um círculo vicioso no qual “quanto
mais líquido extravasa, maior a tendência hipovolêmica” e “quanto maior a tendência
hipovolêmica, maior a retenção hidrossalina renal” e “quanto maior a retenção hidrossalina
renal, mais líquido extravasa para o peritônio”. Com isso, o paciente vai formando a sua ascite
e mantém-se sempre com uma tendência hipovolêmica.
Entretanto, essa teoria simplória pode explicar a ascite relacionada à cirrose, mas não explica
uma série de outras alterações hemodinâmicas encontradas nesses pacientes. Entre elas,
podemos destacar a vasodilatação sistêmica (queda da resistência arterial periférica), o aumento
do débito cardíaco e o aumento real da volemia total (volume sanguíneo presente em toda a
circulação: venosa + arterial). E agora? Como resolver essa questão?
Pois é... Para explicar todas essas alterações, surgiu uma outra teoria: a " teoria da vasodilatação
". Esta é a mais aceita atualmente!
Os passos dessa teoria serão descritos de forma sequencial, para que você não perca a linha de
raciocínio. Acompanhe...
●
1 º passo : uma das primeiras alterações hemodinâmicas que surgem na cirrose
hepática é a vasodilatação arteriolar esplâncnica (hiperemia mesentérica). O
mecanismo dessa vasodilatação provavelmente é o aumento da síntese local de
óxido nítrico ( NO ) pelo endotélio vascular, um potente vasodilatador endógeno. A
hipertensão porta contribui para a gênese desse fenômeno — ao desviar o sangue
mesentérico para a circulação cava, sem passar pelo fígado, perde-se o “filtro
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mesentérico para a circulação cava, sem passar pelo fígado, perde-se o “filtro
hepático” contra as bactérias Gram-negativas provenientes da translocação
intestinal. A endotoxina das bactérias Gram-negativas (LPS) estimula a síntese
endotelial de NO.
●
2º passo : a vasodilatação esplâncnica desloca uma parte da volemia para este
território vascular, reduzindo, por conseguinte, o volume sanguíneo que perfunde
os outros órgãos e tecidos — chamado “volume arterial efetivo”. A queda desse
volume estimula os barorreceptores renais e carotídeos, tendo como resultado a
ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, sistema nervoso simpático e
liberação de ADH. Estes sistemas neuro-hormonais estimulam os rins a reterem
sal e água, na tentativa de restaurar o “volume arterial efetivo”.
●
3 º passo : a retenção hidrossalina, na verdade, aumenta a volemia total, porém
esse volume sanguíneo adicional está quase todo “sequestrado” nos vasos
esplâncnicos dilatados e, portanto, não corrige o deficit de “volume arterial efetivo”.
O processo então se perpetua... A retenção hidrossalina continua e progride, e o
paciente começa a formar ascite, pois o excesso de líquido presente no território
mesentérico começa a transudar diretamente para a cavidade peritoneal em
consequência ao aumento de permeabilidade que acompanha a vasodilatação,
fenômeno potencializado pela hipoalbuminemia (queda na pressão coloidosmótica
do plasma) que tipicamente está presente neste momento...
●
Conclusão : no final das contas, o paciente apresenta: (1 ) redução do “volume
arterial efetivo”, comportando-se como um paciente hipovolêmico, inclusive com
tendência à hipotensão arterial e azotemia pré-renal; (2) aumento da volemia total,
só que distribuída basicamente no território esplâncnico e portal; (3 ) aumento do
sódio e da água corporal total, que se distribui principalmente no peritônio (ascite)
e no interstício (edema); (4) redução da resistência vascular periférica, pela intensa
vasodilatação; e (5) aumento do débito cardíaco, já que o coração está bombeando
contra uma baixa resistência — um fenômeno semelhante ao que ocorre na sepse.
Observe a , que esquematiza a fisiopatologia da cirrose hepática.Figura 4 _
_
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DEFICIT DEFICIT DE SÍNTESE HEPÁTICADE SÍNTESE HEPÁTICA
Os hepatócitos possuem a importante função de sintetizar proteínas e fatores da coagulação.
Entre as proteínas sintetizadas pelo fígado, a albumina é sem dúvida a mais importante, em
termos quantitativos, mas as alfaglobulinas, betaglobulinas, ferritina e a proteína C reativa
também são outros exemplos de peso. Com exceção do fator VIII , que é produzido pelas
células endoteliais hepáticas, todos os demais fatores da coagulação são sintetizados pelos
hepatócitos, como o fibrinogênio (fator I), a protrombina (fator II) e os fatores V, VII, IX, X e
XI. Vale lembrar que quatro desses fatores dependem da vitamina K para a sua síntese. São os
fatores II (protrombina), VII, IX e X — o chamado complexo protrombínico .
HIPOALBUMINEMIAHIPOALBUMINEMIA
A albumina é a proteína presente no plasma em maior concentração, sendo a principal
responsável pelapressão oncótica ou coloidosmótica do plasma. Esta é a pressão que “prende”
o líquido no compartimento intravascular. Nos vasos capilares, existe um balanço de forças no
qual a pressão hidrostática “empurra” o líquido para fora do vaso, enquanto a pressão
oncótica “puxa” o líquido para o interior do vaso. Na hipoalbuminemia, existe uma tendência
à saída de líquido para o interstício, predispondo o paciente ao edema. As condições de maior
potencial edemigênico são aquelas em que encontramos ao mesmo tempo hipoalbuminemia
com aumento da pressão hidrostática capilar, tal como ocorre na cirrose hepática e na
síndrome nefrótica.
O fígado é o único órgão capaz de sintetizar albumina. Graças a ele, mantemos uma
albuminemia na faixa normal, que se situa entre 3,5–5,5 g/dl , à custa da produção de cerca de
15 g/dia de albumina. Nas hepatopatias agudas, a hipoalbuminemia não é um evento comum
(pois a meia-vida da albumina é relativamente longa — vinte dias em média — em comparação
com a dos fatores de coagulação); por isso, a presença de uma albumina plasmática 1,7.
Como os demais fatores da coagulação também acabam sendo reduzidos na insuficiência
hepática, o outro exame que avalia a coagulação — o PTT (Tempo de Tromboplastina Parcial)
— também pode alterar. Este exame avalia a via intrínseca da coagulação. 
No paciente hepatopata, o TP alargado (com atividade de protrombina baixa e INR alto)
também pode ter outra explicação, diferente da insuficiência hepatocelular: coléstase! A
coléstase intra ou extra-hepática reduz a secreção biliar e, portanto, há menos sais biliares
chegando ao intestino para auxiliar na absorção das vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K). A má
absorção da vitamina K pode causar uma coagulopatia pela redução na síntese dos fatores II,
VII, IX e X, mais uma vez predominando a depleção do fator VII... O coagulograma é muito
parecido com o da insuficiência hepática!
E quando suspeitar de col é stase?
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Geralmente, o paciente está ictérico (predomínio importante da bilirrubina direta), com colúria
e hipocolia fecal; a fosfatase alcalina e a gama GT estão elevadas, porém tais achados não são
obrigatórios. Por isso, todo hepatopata com TP alargado deve ser submetido a uma prova
terapêutica com vitamina K exógena, dose única, ou por até três dias, de 10 mg SC ou IV,
obtendo-se novo TP (INR) 24h depois. Se houver resposta significativa do coagulograma, há
uma grande chance de o paciente ter coléstase!
QUADRO DE CONCEITOS I
O paciente hepatopata que está sangrando por coagulopatia deve ser tratado com
reposição de plasma fresco congelado (o único hemoderivado que fornece todos os
fatores da coagulação). Não adianta fazer só vitamina K (pois o problema pode não
ser coléstase e, mesmo se for, o efeito da vitamina K demora mais de 12h para
acontecer), nem adianta fazer crioprecipitado (que contém apenas fibrinogênio, FvW
e os fatores VIII e XIII). Existe controvérsia a respeito do uso de fator VII ativado
recombinante : apesar de ser eficaz na restauração da reserva hemostática, tal
droga pode “ir além da conta”, aumentando o risco de trombose aguda! O fator VIIa
recombinante tem sido reservado para os casos de hemorragia refratária.
Um conceito interessante e recém-elucidado é o de que, na cirrose hepática, o INR não possui
correlação direta com o risco de sangramento ! Isso é explicado pela diminuição concomitante da
fibrinólise endógena (mediada pelo plasminogênio, que também é produzido no fígado). Assim,
mesmo com INR alargado, podem ocorrer fenômenos tromboembólicos, principalmente em
pacientes hospitalizados por infecções agudas (pois nesta situação soma-se o efeito pró-
trombótico sistêmico das citocinas pró-inflamatórias e o fato de o paciente geralmente estar
acamado).
MANIFESTAÇÕES HEMATOLÓGICASMANIFESTAÇÕES HEMATOLÓGICAS
Além da coagulopatia já explicada anteriormente, uma série de manifestações hematológicas
acompanha o paciente cirrótico. Entre elas, destacam-se a anemia da hepatopatia crônica e o
hiperesple​nismo.
ANEMIA DA HEPATOPATIA CRÔNICAANEMIA DA HEPATOPATIA CRÔNICA
A hepatopatia crônica frequentemente cursa com anemia, em geral leve ou moderada. Apesar
de a prevalência de anemia nos hepatopatas crônicos girar em torno de 75%, na maioria das
vezes, o mecanismo é meramente dilucional, em resposta à retenção hidrossalina característica
da hipertensão porta. Apenas 40% desses indivíduos possuem redução verdadeira na massa de
hemácias circulantes!
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hemácias circulantes!
PATOGÊNESEPATOGÊNESE
Como dito, o mecanismo mais comum de anemia na hepatopatia crônica é a hemodiluição.
Contudo, vários são os fatores que podem induzir uma "anemia verdadeira", isto é, a redução
da massa de hemácias. Dois fatores costumam estar associados: (1) redução da meia-vida das
hemácias de 120 para 20–30 dias; e (2) redução da resposta eritropoiética à anemia.
A justificativa para uma menor vida média do eritrócito é multifatorial, estando entre os
principais fatores: (1) o hiperesplenismo (devido à esplenomegalia congestiva); (2) alterações no
metabolismo eritrocitário, tornando as hemácias instáveis; e (3 ) alterações da composição
lipídica de suas membranas, com aumento do teor de colesterol e lecitina.
A menor resposta eritropoiética pode ser explicada por: (1) efeito direto do álcool na medula
óssea (quando a etiologia da hepatopatia é alcoólica); (2) anemia megaloblástica por carência
de folato (secundária à desnutrição que quase sempre acompanha o cirrótico); (3 ) anemia
ferropriva por sangramento crônico, geralmente proveniente do trato digestivo alto (varizes,
doença ulcerosa); e (4) provável queda na produção de eritropoetina hepática. Na verdade, a
anemia da hepatopatia crônica pode até ser diretamente resultante da doença hepática em si,
mas com frequência tem como causa principal algum distúrbio associado (etilismo, ferropenia
pelo sangramento, megaloblastose pela carência de folato).
●
Síndrome de Zieve : episódios de anemia hemolítica aguda autolimitada podem se desenvolver
em etilistas crônicos com hepatopatia gordurosa ou cirrose. Os pacientes apresentam dor
abdominal intensa em quadrante superior direito, icterícia, hiperlipidemia e anemia hemolítica,
quadro que conhecemos como síndrome de Zieve . A patogênese desta anemia é desconhecida.
●
Anemia hemolítica com acantócitos : cerca de 5% dos pacientes com disfunção hepatocelular
avançada desenvolvemuma anemia hemolítica grave, marcada pela presença de múltiplos
acantócitos na periferia. O mecanismo parece estar relacionado ao aumento do teor de colesterol
na membrana eritrocítica, sem um aumento correspondente da lecitina. A esplenectomia pode
corrigir apenas parcialmente esta anemia.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E LABORATORIAISMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E LABORATORIAIS
Como, na maioria das vezes, a anemia é leve ou moderada, o quadro clínico é marcado apenas
pelos sinais e sintomas da hepatopatia crônica. Os achados laboratoriais característicos são de
uma anemia normocítica ou macrocítica, geralmente com o índice de reticulócitos corrigido
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elevado. A macrocitose ocorre em 30–50% dos casos, geralmente não excedendo o limite de 115
fL. O esfregaço do sangue periférico pode mostrar uma série de alterações sugestivas: (1)
macrócitos finos — hemácias com diâmetro aumentado, porém com volume corpuscular
normal — este achado é comum, ocorrendo em cerca de 60% dos casos; (2) hemácias em alvo (
 ) — idênticas àquelas encontradas nas hemoglobinopatias e na esplenectomia — o
mecanismo de sua formação é o aumento da superfície da hemácia, devido ao acúmulo de
lipídios na membrana, em relação ao volume corpuscular; e (3) acantócitos — a presença de
múltiplas células como esta indica hemólise grave, ocorrendo em apenas 5% dos pacientes —
uma pancitopenia ou bicitopenia não são incomuns, devido ao hiperesplenismo
frequentemente coexistente.
HIPERESPLENISMOHIPERESPLENISMO
O baço é um órgão encarregado de diversas funções, e uma delas é denominada hemocaterese ,
que significa a destruição de hemácias senescentes ou defeituosas. Além disso, o baço também
funciona como uma espécie de "armazenador" de plaquetas e, em menor grau, de leucócitos.
Na cirrose, a instalação da hipertensão porta determina uma esplenomegalia congestiva. O
baço destes pacientes aumenta o seu poder de hemocaterese, pois o sangue passa com maior
morosidade pelos cordões esplênicos congestos. O resultado é a hemólise extravascular, um dos
componentes da anemia da hepatopatia crônica. Este tipo de anemia hemolítica tende a ser
leve, pois o poder de destruição do baço congesto geralmente é contrabalançado pelo aumento
Figura 5 _
_
Fig. 5: Hemácias em alvo nas hepatopatias.
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na produção de hemácias pela medula óssea. Os pacientes então desenvolvem reticulocitose .
Mais importante do que a anemia é a trombocitopenia do hiperesplenismo, uma de suas
principais consequências. Um baço normal “armazena” ou “sequestra” cerca de 1/3 das
plaquetas circulantes. Um baço congesto é capaz de “sequestrar” um percentual muito maior,
acarretando plaquetopenia. Nos casos de cirrose com hipertensão porta grave, o
hiperesplenismo cursa com plaquetopenia na faixa de 30.000–60.000/mm 3 . Uma
plaquetopenia inferior deve levar à suspeita de outras patologias associadas. A neutropenia por
“sequestro esplênico” pode acompanhar a plaquetopenia em alguns casos. Geralmente é uma
neutropenia leve a moderada. Nos raros casos de citopenias graves, pode ser indicada a
esplenectomia. Cabe destacar que a plaquetometria nem sempre será por sequestro, sugerindo
a presença de outros fatores relacionados como a redução de trombopoetina.
HIPERTENSÃO PORTAHIPERTENSÃO PORTA
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
Aqui há o video de apostila 9.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
A veia porta compõe um sistema vascular muito especial! Ele difere dos demais sistemas
vasculares do corpo por ligar estrategicamente duas importantes redes capilares — mesentérica
e hepática. Assim, todas as substâncias que vêm do intestino e do baço chegam ao fígado pelo
sistema porta, penetrando neste órgão através dos espaços-porta interlobulares e ganhando a
circulação sinusoidal que banha os hepatócitos. Veja a .Figura 6 _
_
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Veremos neste tópico sobre hipertensão porta (ou portal):
●
A sua fisiopatologia;
●
As suas causas;
●
As suas complicações;
●
O seu tratamento.
VASCULARIZAÇÃO VASCULARIZAÇÃO HEPÁTICA E ANATOMIA HEPÁTICA E ANATOMIA DO SISTEMADO SISTEMA
PORTAPORTA
O fígado recebe seu aporte sanguíneo basicamente de duas fontes: a veia porta e a artéria
hepática. A artéria hepática é um dos três ramos do tronco celíaco. Ela origina as artérias
hepáticas direita e esquerda após a emergência da artéria gastroduodenal. Antes da origem
deste ramo, a artéria denomina-se “hepática comum” e, após a origem deste ramo, “hepática
própria”. Em cerca de 20% dos casos, a artéria hepática direita origina-se da artéria mesentérica
superior; em 15% dos casos, a artéria hepática esquerda origina-se da artéria gástrica esquerda.
Ambas as anomalias podem coexistir, e o conhecimento desta variação anatômica pelo
cirurgião é importantíssimo no manejo do transplante. A circulação arterial hepática possui
uma riqueza de vias colaterais (cerca de 20 pequenas artérias), dez ramos provenientes do
território celíaco (gastroduodenal e mesentérica superior) e dez ramos oriundos de território
não celíaco (artérias diafragmáticas). 
A veia porta é formada atrás do colo do pâncreas, pela confluência das veias mesentérica
superior e esplênica . Ela segue um trajeto na borda livre do ligamento gastro-hepático até
alcançar o porta hepatis , onde se divide em ramos esquerdo e direito.
A veia gástrica esquerda ou coronária drena a porção distal do esôfago e a pequena curvatura
gástrica. Ela entra na veia porta em cerca de 2/3 dos casos e drena para a veia esplênica no
terço restante. A veia coronária é uma das principais responsáveis pela gênese das varizes
Fig. 6: Circulação colateral portossistêmica. 
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terço restante. A veia coronária é uma das principais responsáveis pela gênese das varizes
esofagogástricas (ver adiante). A veia mesentérica inferior drena para a veia esplênica em cerca
de 2/3 dos indivíduos normais e para veia mesentérica superior no terço restante.
O fluxo sanguíneo hepático corresponde a 1.500 ml/min, o que representa cerca de 25% do
débito cardíaco. A veia porta contribui com cerca de 75% dessa quantidade, e a artéria hepática
, com os 25% restantes.
O volume carreado pelo sistema porta é regulado, de maneira indireta, pela vasoconstrição ou
vasodilatação do leito venoso esplâncnico. Quando, por alguma razão, como choque
hipovolêmico ou derivações cirúrgicas, o sangue no interior da veia porta é insuficiente, existe
uma compensação da perda, determinada por um fluxo aumentado de sangue pela artéria
hepática.
Apesar do rótulo de “veia”, a veia porta carreia mais da metade do suprimento de oxigênio
necessário para o fígado, além de transportar hormônios hepatotróficos esplâncnicos que
mantêm a integridade e a função dos hepatócitos. Por outro lado, este vaso leva também para
o fígado toxinas que precisam ser devidamente depuradas pelos hepatócitos. Dessa forma, não
é de se estranhar que, em casos avançados de hipertensão porta e em pacientes com derivações
cirúrgicas, o sangue “reduzido” na circulação porta venha a agravar a insuficiência
hepatocelular e desviar as “toxinas” para a circulação sistêmica, determinando piora ou
surgimento de encefalopatia.
VEIAS COLATERAIS PORTO-CAVAVEIAS COLATERAIS PORTO-CAVA
O sistema porta, em condições normais, possui baixa pressão. Uma resistência aumentada a seu
fluxo determina uma diferença de pressão (geralmente superior a 5 mmHg) entre a circulação
porta e a sistêmica, representada pela veia cava inferior. Imediatamente, vasos colaterais se
desenvolvem, numa tentativa de equalizar as pressões em ambos os sistemas e escoar o sangue
porta. A rede colateral constituída pela veia coronária (diretamente da veia porta) e pelas veias
gástricas curtas (pela veia esplênica), que drenam, através das veias esofagianas e
paraesofagianas, para a veia ázigos (no tórax), é a mais importante clinicamente, pois determina
a formação das “temidas” varizesesofagogástricas.
Outros sítios de importância em que ocorre a formação de colaterais incluem:
●
Recanalização da veia umbilical , ligando o ramo esquerdo da veia porta com as veias epigástricas
(sistema cava). A acentuação desta rede colateral dá origem ao sinal semiológico conhecido
como "cabeça de medusa" ( caput medusae — ). É a chamada "circulação colateral
abdominal tipo porto-cava";
Figura 7 _
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●
Plexo venoso hemorroidário , conectando as veias hemorroidárias superiores (tributárias da
mesentérica superior e, logo, do sistema portal) com as hemorroidárias médias e inferiores (que
drenam para o sistema cava). A acentuação do fluxo sanguíneo nestes vasos colaterais, em
consequência à hipertensão porta, justifica o surgimento de varizes anorretais . É importante
compreender que varizes retais não são a mesma coisa que hemorroidas !!! Os vasos que dão
origem às hemorroidas não apresentam comunicação com o sistema porta, logo, a incidência de
hemorroidas não está aumentada na hipertensão porta.
●
_
Fig. 7: Caput medusae . 
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●
Vasos retroperitoneais.
FISIOPATOLOGIAFISIOPATOLOGIA
Tecnicamente, a hipertensão porta é definida por uma pressão na veia porta ≥ 10 mmHg
(normal = 5 a 10 mmHg). No entanto, como a mensuração direta da pressão na veia porta é
muito complicada, outra definição habitualmente utilizada se refere a uma forma indireta de
avaliação: o chamado gradiente de pressão venosa hepática (HVPG, em inglês), que, quando ≥
5 mmHg, identifica a existência de hipertensão porta (normal = 1–5 mmHg). O HVPG é
aferido através da cateterização da veia hepática (após punção da veia jugular interna). Guiado
por fluoroscopia, um cateter com balão na ponta é colocado no interior de uma das veias
hepáticas (com o balão vazio), obtendo-se a chamada “pressão venosa hepática livre”.
Posteriormente, o balão é inflado até ocluir aquele segmento vascular, obtendo-se a “pressão
encunhada” da veia hepática. No fígado cirrótico, a pressão encunhada corresponde à pressão
intrassinusoidal que, por sua vez, corresponde à pressão no interior da veia porta. O HVPG,
então, é calculado pela diferença entre a pressão “encunhada” e a pressão venosa hepática
“livre”...
A literatura demonstrou que o HVPG é um bom preditor prognóstico: as varizes
esofagogástricas começam a se formar quando o HVPG ultrapassa o valor de 10 mmHg,
tornando-se o risco de sangramento clinicamente significativo a partir de valores de HVPG ≥
12 mmHg. Valores ≥ 20 mmHg preveem hemorragia incontrolável ou chance elevada de
ressangramento em pacientes submetidos à terapia endoscópica durante um episódio de
hemorragia aguda. Em suma, quanto maior o HVPG, maior o risco de hemorragia e de
mortalidade! Quando o tratamento farmacológico da hipertensão porta consegue promover
reduções do HVPG > 10–20% do valor inicial (colocando o valor absolutoálcool, autoimune etc.), a presença dos nódulos de regeneração comprimindo os
sinusoides, a fibrose do espaço de Disse e a contração dos miofibroblastos se encarregam de
aumentar a resistência ao fluxo portal hepático. 
HEPATITE AGUDAHEPATITE AGUDA
A hepatite aguda também pode cursar com hipertensão porta transitória; esse fenômeno é mais
frequentemente encontrado nos pacientes com hepatite alcoólica ou hepatite viral fulminante,
tendo relação com o grau de colapso dos sinusoides resultante da compressão gerada pela
necrose hepática.
HEPATITE CRÔNICAHEPATITE CRÔNICA
As lesões iniciais localizam-se mais comumente na fronteira entre os espaços-porta e o lóbulo
hepático ("hepatite de interface"). Com a progressão da doença, notamos hepatite lobular, com
aumento da deposição de colágeno nos espaços de Disse (espaço entre os sinusoides e os
hepatócitos) e comprometimento sinusoidal. Dessa forma, temos um componente pré-
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hepatócitos) e comprometimento sinusoidal. Dessa forma, temos um componente pré-
sinusoidal e, com o avançar da doença, um comprometimento sinusoidal. Devemos ter em
mente que a hipertensão porta pode surgir eventualmente na ausência de cirrose, embora seja
bastante incomum.
QUADRO DE CONCEITOS III
A esquistossomose é a causa mais comum de HP intra-hepática pré-sinusoidal !
HP INTRA-HEPÁTICA PRÉ-SINUSOIDALHP INTRA-HEPÁTICA PRÉ-SINUSOIDAL
ESQUISTOSSOMOSE HEPATOESPLÊNICAESQUISTOSSOMOSE HEPATOESPLÊNICA
Esta desordem é uma das principais causas de hipertensão porta em países subdesenvolvidos,
principalmente no Brasil, onde a doença é endêmica em Minas Gerais e no Nordeste. Nas fases
precoces da esquistossomose hepática, a HP é decorrente de uma reação granulomatosa nas
vênulas hepáticas (localizadas nos espaços-porta), provocada pela deposição de ovos do
parasita. Essa resposta inflamatória leva à fibrose e obliteração das vênulas portais, com
manifestações de HP na ausência de injúria hepatocelular importante, determinando uma HP
pré-sinusoidal . Sabemos que, ao longo do tempo, os espaços-porta tornam-se intensamente
fibrosados ( fibrose de Symmers )...
HIPERTENSÃO PORTA IDIOPÁTICA (SÍNDROME DE BANTIHIPERTENSÃO PORTA IDIOPÁTICA (SÍNDROME DE BANTI
OU FIBROSE OU FIBROSE PORTAL NÃO PORTAL NÃO CIRRÓTICA IDIOPÁTICA)CIRRÓTICA IDIOPÁTICA)
Esta síndrome, inicialmente descrita na Ásia (especialmente Índia e Japão), agora é reconhecida
em outros países, como os EUA. Predomina em pessoas jovens e tem exatamente as mesmas
características clínicas e patológicas da esquistossomose hepatoesplênica (esplenomegalia,
hiperesplenismo, varizes esofagogástricas, sem insuficiência hepática importante).
OUTRASOUTRAS
Sarcoidose: o envolvimento apenas histológico do fígado, sem sintomas clínicos, é muito
frequente na sarcoidose. Dessa forma, a HP é uma manifestação rara da sarcoidose hepática.
Quando ela ocorre, geralmente é decorrente da localização dos granulomas sarcoides na
periferia do lóbulo, próximo às vênulas dos espaços-porta, determinando uma HP pré-
sinusoidal.
Hiperplasia nodular regenerativa: esta desordem tem sido descrita em condições associadas à
diminuição do fluxo de sangue, de maneira não uniforme, para o parênquima hepático. Temos
como característica anatomopatológica uma transformação nodular do parênquima hepático
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como característica anatomopatológica uma transformação nodular do parênquima hepático
sem tecido fibroso unindo essas estruturas. Os ácinos com suprimento sanguíneo inadequado
se atrofiam, enquanto outros, com fluxo em excesso, se hipertrofiam, nos dando a aparência de
verdadeiros nódulos. A HNR é causada mais comumente por doenças do colágeno (artrite
reumatoide, síndrome de Felty), aterosclerose, vasculites, insuficiência cardíaca congestiva,
diabetes mellitus e idade avançada. Todas estas condições têm em comum uma diminuição, em
maior ou menor grau, do fluxo sanguíneo hepático. Estes nódulos e a obstrução (ou hipofluxo)
das vênulas comprometem, com maior frequência, os espaços-porta, determinando HP pré-
sinusoidal. Entretanto, os sinusoides podem também ser acometidos na HNR.
Colangite biliar primária — fase pré-cirrótica: nas fases iniciais desta doença, a inflamação dos
ductos bilíferos nos espaços-porta compromete também as vênulas hepáticas, determinando
HP pré-sinusoidal. Com a cirrose hepática estabelecida, o componente sinusoidal passa a ser
mais importante.
Doença de Wilson — fase pré-cirrótica: as lesões que causam HP na doença de Wilson são
consideradas pré-sinusoidais. Entretanto, como ocorre em várias doenças associadas a esta
categoria de HP, um componente sinusoidal também pode ser observado.
Malignidade hepática: como vimos acima, as neoplasias malignas do fígado podem determinar
hipertensão porta por diversos mecanismos. Quando o comprometimento é intra-hepático,
podemos observar o surgimento de fístula entre a artéria hepática e a veia porta, compressão
do tronco porta, trombose das vênulas porta etc. Nesses casos, varizes gastroesofágicas e ascite
transudativa são encontradas. Por outro lado, o hepatocarcinoma pode surgir na evolução de
uma cirrose hepática. Em alguns pacientes, o agravamento de uma HP já existente pode
representar a manifestação clínica inicial. Por exemplo, ascite de difícil manejo, em um paciente
cirrótico previamente compensado.
Peliosis hepatis : a peliose é uma lesão histológica rara do fígado caracterizada pelo surgimento
de pequenos cistos cheios de sangue, que ocupam espaço nos lóbulos hepáticos. Esta desordem
pode originar-se de lesões aos sinusoides, resultando em dilatação de seu lúmen e alargamento
dos espaços de Disse. Devemos ter em mente que as manifestações referentes à HP raramente
dominam o quadro clínico nesses pacientes. As principais causas de peliose hepática incluem os
tumores hepáticos, icterícia colestática e a toxicidade por drogas (azatioprina, vitamina A,
contraceptivos orais, tamoxifeno...) e o uso de esteroides anabolizantes. A síndrome da
imunodeficiência adquirida, a tuberculose, a doença de Hodgkin também são causas descritas.
HP INTRA-HEPÁTICA PÓS-SINUSOIDALHP INTRA-HEPÁTICA PÓS-SINUSOIDAL
 DOENÇA HEPÁTICA VENO-OCLUSIVADOENÇA HEPÁTICA VENO-OCLUSIVA
A doença veno-oclusiva hepática acomete pequenas veias hepáticas. Observamos deposição de
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A doença veno-oclusiva hepática acomete pequenas veias hepáticas. Observamos deposição de
uma matriz rica em fibronectina em torno das veias centrais dos lóbulos (portanto pós-
sinusoidal). A doença se manifesta de forma aguda com icterícia, hepatomegalia congestiva e
dolorosa, ascite e varizes gastroesofágicas. A elevação das aminotransferases e da bilirrubina
são achados laboratoriais frequentes. Esta condição é mais comumente observada na doença
enxerto vs. hospedeiro, sendo uma complicação comum no transplante alogênico de células-
tronco. Outras causas incluem irradiação hepática e uso de um chá ( bush tea disease)
jamaicano, que contém alcaloides de determinadas plantas (crotalaria).
HP PRÉ-HEPÁTICAHP PRÉ-HEPÁTICA
Neste grupo, incluímos todas as causas de aumento de pressão na veia porta não associadas a
desordens de estruturas localizadas no interior do parênquima hepático. Alguns autores
classificam este grupo como hipertensão porta pré-sinusoidal extra-hepática, porém preferimos
a primeira classificação. Vamos descrever os principais distúrbios encontrados.
 TROMBOSE DE VEIA PORTATROMBOSE DE VEIA PORTA
É a principal causa de hipertensão porta pré-hepática. Esta desordem é mais frequentemente
encontrada na população pediátrica, tendo sua origem a partir de uma infecção na veia
umbilical. Na população adulta, encontramos como causa importante a cirrose hepática e as
desordens trombofílicas (presentes em 60% dos casos). O carcinoma hepatocelular,
complicando uma cirrose preestabelecida, também pode se apresentar como trombose de veia
porta. Outras condições associadasincluem a doença intestinal inflamatória, as síndromes
mieloproliferativas, hemoglobinúria paroxística noturna, complicação de escleroterapia,
gravidez, uso de contraceptivos etc. A trombose crônica da veia porta pode levar à
transformação cavernosa da veia porta : dilatação de veias colaterais hepatopetais (em direção
ao fígado), dando a aparência de “dilatações cavernosas”. O diagnóstico geralmente é feito por
USG-Doppler da porta, sendo a RM ou a TC reservadas para os casos duvidosos. O
tratamento na fase aguda é feito com anticoagulação, enquanto que na crônica é assunto
controverso...
 FÍSTULA ARTERIOVENOSA ESPLÂNCNICAFÍSTULA ARTERIOVENOSA ESPLÂNCNICA
As fístulas arteriovenosas no baço e leito vascular esplâncnico podem se manifestar como
hipertensão porta, ascite e hemorragia digestiva por varizes gastroesofágicas. Outros achados
clínicos incluem dor abdominal no quadrante superior direito e sopro abdominal. Esta rara
condição pode ser congênita, representada pela telangiectasia hemorrágica hereditária
(síndrome de Rendu-Osler-Weber), ou adquirida. Neste último grupo, incluímos os
traumatismos abdominais, procedimentos hepáticos (como a biópsia hepática), a ruptura de
aneurismas de artéria hepática e o carcinoma hepatocelular. A hipertensão porta é decorrente
■
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do aumento importante de fluxo nesse vaso. Este fenômeno, se não corrigido, pode levar, ao
longo do tempo, à esclerose dos espaços-porta, ocasionando uma desordem intra-hepática pré-
sinusoidal. O tratamento pode ser feito com a embolização arterial percutânea da fístula.
 TROMBOSE DE VEIA ESPLÊNICA (HIPERTENSÃO PORTATROMBOSE DE VEIA ESPLÊNICA (HIPERTENSÃO PORTA
SEGMENTAR)SEGMENTAR)
Causa a chamada hipertensão porta segmentar . Devemos suspeitar de trombose de veia
esplênica quando nos deparamos com sinais de hipertensão porta, particularmente hemorragia
por varizes gástricas, em pacientes com função hepatocelular normal. A principal causa desta
condição é representada pelas doenças do pâncreas. A pancreatite crônica é responsável pela
grande maioria dos casos, com o câncer de pâncreas em segundo lugar! Devido à anatomia do
sistema porta, este distúrbio geralmente cursa com varizes de fundo gástrico isoladas (HP
segmentar ou HP esquerda ou sinistra). Entretanto, a identificação de varizes gastroesofágicas
não é incomum. O diagnóstico desta variedade de HP torna-se fundamental, uma vez que a
esplenectomia corrige inteiramente o distúrbio.
Hipertensão porta segmentar = Patologias pancreáticas
 ESPLENOMEGALIA DE GRANDE MONTAESPLENOMEGALIA DE GRANDE MONTA
Este fenômeno ocorre em uma minoria de pacientes com aumento do baço. Entre as condições
encontradas, citamos a leucemia mieloide crônica, os linfomas, a doença de Gaucher, a
policitemia v e r a e a metaplasia mieloide. Nesses casos, a HP é decorrente do fluxo
hiperdinâmico proveniente da veia esplênica a partir do baço absurdamente aumentado. A
esplenectomia pode normalizar a pressão porta em alguns pacientes. Entretanto, na maioria
das desordens hematológicas, observamos aumento da resistência ao fluxo porta hepático
devido à infiltração do parênquima por células neoplásicas. Outras causas também frequentes
de HP nesse grupo seriam as tromboses de veias porta e hepática.
HP PÓS-HEPÁTICAHP PÓS-HEPÁTICA
Estes distúrbios determinam um aumento da pressão porta como um reflexo de elevações da
pressão em sistemas venosos localizados “acima” do fígado, principalmente a veia cava inferior.
Qualquer doença que eleve as pressões em câmaras cardíacas direitas pode estar envolvida.
Uma vez que a circulação hepática não contém valvas, qualquer obstrução ou aumento de
pressão de outra etiologia, distal aos sinusoides, resulta em hipertensão sinusoidal, fluxo
retrógrado na veia porta e acentuação de colaterais. O achado histológico da obstrução pós-
hepática é representado por congestão sinusoidal com áreas de infarto centrolobular.
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SÍNDROME DE BUDD-CHIARISÍNDROME DE BUDD-CHIARI
Esta síndrome, assim como a doença veno-oclusiva, não possui achados histológicos de cirrose.
Nesta desordem, observamos obstrução de caráter insidioso ou agudo das veias hepáticas.
Como causas mais frequentes, citam-se as desordens mieloproliferativas ( policitemia vera ), a
hemoglobinúria paroxística noturna, outras trombofilias (fator V de Leiden, SAAF, deficiência
de antitrombina III), a gravidez, o uso de contraceptivos orais e malignidades em geral. A
síndrome de Budd-Chiari aguda manifesta-se com dor intensa em quadrante superior direito,
associada à hepatomegalia, com rápido desenvolvimento de ascite e icterícia; sangramento
gastrointestinal por ruptura de varizes esofágicas pode ocorrer. Na forma crônica/subaguda, o
quadro álgico e a hepatomegalia são menos comuns, com o aparecimento insidioso da
sintomatologia (principalmente ascite).
Síndrome de Budd-Chiari
Ocorre em consequência à trombose das veias hepáticas, levando a um
mecanismo de hipertensão porta pós-sinusoidal e franca ascite e hepatomegalia.
Está muito associada às síndromes trombofílicas (de hipercoagulabilidade), como
as neoplasias e síndromes mieloproliferativas (classicamente a policitemia vera ).
OBSTRUÇÃO DA VEIA CAVA INFERIOR (VCI)OBSTRUÇÃO DA VEIA CAVA INFERIOR (VCI)
As causas de obstrução mecânica da VCI incluem trombose venosa, tumores, cistos, abscessos
e obstrução membranosa por uma “teia”. Esta última condição é tipicamente encontrada em
alguns países da África e do Oriente. O quadro clínico se caracteriza por desenvolvimento lento
e progressivo de manifestações de hipertensão porta, associado a uma hepatomegalia dolorosa.
A trombose da VCI, quando associada à oclusão da veia hepática (síndrome de Budd-Chiari),
possui apresentação clínica mais abrupta, com o surgimento de sangramento por varizes rotas e
ascite de maneira mais precoce. Independentemente da causa de obstrução da cava inferior,
encontramos somente nestes pacientes achados como edema de membros inferiores e
circulação colateral no dorso.
DOENÇAS CARDÍACASDOENÇAS CARDÍACAS
Como vimos acima, qualquer aumento de pressão em cavidades direitas do coração, seja
decorrente de pericardite constritiva , cardiopatias orovalvares ou cardiomiopatias, transmite-se
para a cava inferior, daí para a veia hepática, sinusoides e, finalmente, veia porta. Os pacientes
com esta síndrome possuem evidências de ascite intratável e disfunção hepatocelular, que são
muitas vezes difíceis de distinguir de outras causas de hipertensão porta. Embora os pacientes
com sobrecarga de cavidades direitas desenvolvam ascite, as varizes gastroesofágicas são
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com sobrecarga de cavidades direitas desenvolvam ascite, as varizes gastroesofágicas são
detectadas somente naqueles indivíduos com doença hepática intrínseca que produza um
gradiente significativo entre o sistema porta e a veia ázigos.
DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO
Devemos suspeitar de hipertensão porta em todo paciente que apresente uma combinação dos
seguintes achados: ascite, esplenomegalia, encefalopatia ou varizes esofagogástricas. Os exames
laboratoriais iniciais nos ajudam a identificar a existência ou não de disfunção hepatocelular
associada e incluem a dosagem sérica de albumina, o hemograma completo, as provas de
função hepática e a determinação do TAP.
ULTRASSONOGRAFIA-DOPPLERULTRASSONOGRAFIA-DOPPLER
A USG é o método tradicionalmente utilizado na avaliação inicial do sistema porta em
pacientes com suspeita de HP. Possui elevada acurácia em distinguir uma veia porta
trombosada de uma patente. Além disso, as colaterais do sistema porta em torno da veia
ázigos, estômago, baço e retroperitônio são também visualizadas. O tamanho do baço é
determinado com clareza e constitui dado diagnóstico adicional. O calibre da veia porta, em
casos de hipertensão, acha-se em torno de 15 mm , entretanto, um valor normal (até 12 mm)
não afasta esta condição. Uma veiaporta normal aumenta seu calibre em resposta à
alimentação (hiperemia reativa). A ausência desse fenômeno é sugestiva de hipertensão porta...
A inabilidade de visualizar a veia porta é sugestiva de trombose deste vaso. O uso concomitante
da fluxometria pelo Doppler permite uma estimativa do fluxo porta. Um sentido hepatopetal
(em direção ao fígado) é observado em indivíduos normais e nos casos menos severos de HP. O
fluxo hepatofugal (contrário ao fígado) revela a existência de hipertensão porta grave.
ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTAENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA
A endoscopia digestiva está sempre indicada na suspeita ou após o diagnóstico de HP. A
presença de varizes esofagogástricas (esofagianas e/ou gástricas) sela o diagnóstico de hipertensão
porta! Uma proporção variável de pacientes com HP não possui varizes. A presença de outras
complicações da hipertensão porta, como encefalopatia e ascite, não é capaz de indicar, com
confiabilidade, se um indivíduo já tem ou não varizes.
Uma contagem plaquetária inferior a 140.000/mm³ e um diâmetro da veia porta superior a 13
mm na USG têm se correlacionado melhor com a presença de varizes. Uma vez identificadas, a
graduação das varizes de acordo com o seu tamanho é útil para indicarmos profilaxia primária
(antes do primeiro episódio) ou não. Outros achados endoscópicos que se correlacionam com o
risco de ruptura incluem manchas vermelho-cereja ( cherry-red spots ) e manchas
hematocísticas.
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hematocísticas.
As varizes gástricas são de reconhecimento um pouco mais difícil, uma vez que se assemelham
às pregas da mucosa. A coexistência de outras lesões, como gastrite e úlceras pépticas, é
frequente em pacientes com cirrose.
A gastropatia hipertensiva portal é descrita como uma mucosa com áreas esbranquiçadas
reticulares entremeadas a áreas róseas (por vezes sangrantes), dando o aspecto de “pele de
cobra”. Seu reconhecimento, através da endoscopia, é difícil, porém útil no diagnóstico
diferencial de hemorragias digestivas altas nessa população.
ANGIO-TC E RESSONÂNCIA MAGNÉTICAANGIO-TC E RESSONÂNCIA MAGNÉTICA
A angio-TC e a RM são métodos não invasivos capazes de delinear o sistema porta. Estes
exames radiológicos diagnosticam com elevada acurácia a trombose de veia porta, além de
determinar a patência de derivações cirúrgicas. São indicados em casos de dúvida diagnóstica
ao USG-Doppler de sistema porta. Ao contrário da USG, não apresentam limitações devido à
obesidade, experiência do examinador e presença de gás intestinal, embora sejam exames de
alto custo.
ANGIOGRAFIAANGIOGRAFIA
Este método radiológico invasivo é útil para delinear a anatomia das colaterais do sistema
porta, a patência dos vasos, a presença de aneurismas, fístulas e lesões vasculares intra-
hepáticas. A angiografia de fase venosa pode ser realizada após a injeção seletiva de contraste
na artéria mesentérica superior e esplênica. Este exame nos permite uma definição correta da
anatomia, sendo utilizado no planejamento cirúrgico da hipertensão porta.
MEDIDAS HEMODINÂMICASMEDIDAS HEMODINÂMICAS
A cateterização da veia hepática para medida do HVPG atualmente é empregada apenas em
casos duvidosos, nos quais os demais métodos não invasivos não conseguem firmar o
diagnóstico de HP, ou então após implantação do TIPS ou cirurgia de derivação porto-cava, a
fim de avaliar a eficácia do tratamento (cujo objetivo é a obtenção de um HVPG 15 kPa . O exame também
se revelou ser um bom preditor da ocorrência de complicações relacionadas à cirrose, como a
formação de varizes de esôfago e hemorragia digestiva. Vale lembrar que o padrão-ouro para a
confirmação diagnóstica de cirrose ainda é a biópsia hepática.
COMPLICAÇÕES E SEU MANUSEIOCOMPLICAÇÕES E SEU MANUSEIO
Aqui há o video de apostila 10.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
As consequências clínicas mais importantes da HP estão associadas à formação de colaterais
portossistêmicos . A dilatação de canais embrionários preexistentes consiste no mecanismo
principal na formação destes vasos colaterais. A importância clínica do fenômeno vai depender
de sua localização e a frequência com que ocorre.
●
As colaterais gastroesofágicas se desenvolvem entre as veias gástricas curtas, as
veias esofagianas e a veia ázigos e veias intercostais, determinando o
aparecimento de varizes gástricas e esofagianas , que possuem importância
clínica em razão de sangramentos de vulto que podem ocorrer.
●
As colaterais retais podem determinar o aparecimento de varizes anorretais que se
desenvolvem através da conexão da veia retal superior (sistema porta) com as
veias retais média e inferior (sistema cava). Estas varizes podem sangrar, embora
isso não seja muito comum.
●
O remanescente da veia umbilical pode se dilatar e servir como conexão entre o
ramo esquerdo da veia porta e as veias epigástricas (sistema cava), fenômeno
responsável pela “ cabeça de medusa ” observada à ectoscopia, constituindo-se
em um sinal que nos indica a presença de hipertensão porta.
●
Colaterais podem se desenvolver entre o sistema porta e a parede abdominal
posterior e através da cápsula do fígado e diafragma.
●
Grandes e espontâneas anastomoses podem se desenvolver entre o sistema porta
e a veia renal esquerda. Estas podem ser tão grandes que simulam algumas vezes
uma derivação cirúrgica. Estas colaterais nunca sangram e são raramente
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uma derivação cirúrgica. Estas colaterais nunca sangram e são raramente
identificadas.
Sendo assim, devido à importância do tema, daremos destaque ao manejo das varizes
esofagogástricas a seguir. Um dos principais marcadores prognósticos dos pacientes com
hemorragia digestiva alta por varizes de esôfago é o grau de insuficiência hepática. Existe uma
relação direta: quanto maior a pontuação pelo escore de Child, maior a mortalidade.
Enquanto nos pacientes Child A encontra-se em torno de 15%, no Child C é em média 50%. 
Além disso, muitas causas de hipertensão porta, como a cirrose hepática (a principal), também
cursam com outro sinal importante — a ascite . Também pela sua importância, ele será
abordado na sequência. 
Tab. 3: Classificação de Child-Pugh.
Tab. 4 
VARIZES ESOFAGOGÁSTRICASVARIZES ESOFAGOGÁSTRICAS
VARIZES ESOFAGIANASVARIZES ESOFAGIANAS
A prevalência de varizes esofagianas em pacientes recém-diagnosticados com cirrose hepática
encontra-se em torno de 50%, sendo de 40% nos pacientes Child A e 85% nos Child C.
As varizes esofagianas evoluem para sangramento em pelo menos 30–40% dos casos e são a
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As varizes esofagianas evoluem para sangramento em pelo menos 30–40% dos casos e são a
causa mais comum de hemorragia digestiva alta em pacientes com hipertensão porta. Para os
pacientes que sobrevivem à hemorragia inicial, cerca de 70% voltam a sangrar novamente em
um período de um ano, com uma letalidade de 30%. A mortalidade decorrente de um primeiro
episódiode sangramento é de 25–30% . O risco é máximo após os primeiros dias e diminui
gradativamente nas próximas seis semanas. A mortalidade está principalmente relacionada com
o grau de disfunção hepática. Pacientes com Child C possuem mortalidade precoce de 50% (
versus 15% nos Child A) e de até 90% em um ano após um episódio de hemorragia. Mesmo os
pacientes com Child A possuem uma sobrevida de apenas 50% em cinco anos. Os índices
prognósticos de ressangramento incluem o grau de disfunção hepática e o tamanho, as
características (presença ou não de sinais vermelhos) e a espessura da parede das varizes. A
 a seguir mostra a classificação das varizes em estágios.
Tab. 5
Classificações das Varizes Esofagianas
F1 (pequeno calibre)
Varizes minimamente elevadas, sem tortuosidades ( 20 mm de
diâmetro).
VARIZES GÁSTRICAS (VG) E GASTROPATIA HIPERTENSIVAVARIZES GÁSTRICAS (VG) E GASTROPATIA HIPERTENSIVA
PORTAL (GHP)PORTAL (GHP)
As varizes gástricas podem ser isoladas ou associadas às esofágicas (achado mais comum),
sendo mais frequentes na hipertensão porta pré-hepática. São responsáveis por até 10% de
todos os episódios de hemorragia digestiva alta no paciente cirrótico. O diagnóstico requer,
além da endoscopia convencional, o uso de ultrassonografia endoscópica . As varizes gástricas
são alimentadas pelas veias gástricas curtas e posteriores, sendo geralmente associadas a uma
pressão portal menor do que a encontrada nas varizes esofágicas. Shunts gastrorrenais
espontâneos através da veia esplênica ocorrem em 60–85% dos casos, explicando dois achados:
menor risco de sangramento (quando comparado às esofagianas) e maior incidência de
encefalopatia.
Após um primeiro episódio de sangramento por VG, a recidiva varia de 25–90%. A
mortalidade relacionada ao sangramento encontra-se em torno de 20%. A Gastropatia
Tabela 5
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mortalidade relacionada ao sangramento encontra-se em torno de 20%. A Gastropatia
Hipertensiva Portal (GHP) é caracterizada por alterações na mucosa do estômago relacionadas
à hipertensão porta. Histologicamente, observam-se dilatações dos capilares e vênulas da
mucosa. O sangramento da GHP é difuso por toda a mucosa gástrica, sendo conhecido como
sangramento "em lençol"; o sangramento pode ser crônico e insidioso, sendo uma causa de
anemia ferropriva nos pacientes cirróticos, ou agudo, apresentando-se com melena. Vale
ressaltar que o tratamento endoscópico NÃO é eficaz na GHP (ver adiante).
CONDUTA NO SANGRAMENTOCONDUTA NO SANGRAMENTO
CONTROLE RESPIRATÓRIO E HEMODINÂMICOCONTROLE RESPIRATÓRIO E HEMODINÂMICO
A estabilização da pressão arterial é a primeira medida em qualquer hemorragia digestiva. A
reposição de solução cristaloide e, mesmo sangue, é recomendada. Um cuidado a ser tomado é
evitar a reposição excessiva de líquidos, que pode aumentar a pressão portal, aumentando o
sangramento! O emprego de plasma fresco congelado está indicado quando o INR está acima
de 1,7, e a transfusão de plaquetas quando a plaquetometria for inferior a 50.000/mm³. Os
pacientes que se apresentam confusos ou com rebaixamento do nível de consciência merecem
ser intubados, até mesmo para proteger a via aérea durante a realização de endoscopia
digestiva alta. A EDA deve ser realizada o mais rapidamente possível, mesmo com o doente
estabilizado do ponto de vista respiratório e hemodinâmico.
TERAPIA ENDOSCÓPICATERAPIA ENDOSCÓPICA
Uma vez estabilizada a hemodinâmica, o estômago deve ser lavado vigorosamente, e uma
endoscopia digestiva alta realizada, de preferência, dentro das primeiras 12h. Este
procedimento permite a localização adequada do sítio de sangramento, confirmando ou
afastando o sangramento por varizes esofagogástricas rotas. Sabemos que cerca de 30–40% dos
pacientes com hipertensão porta possuem sangramentos decorrentes de outras lesões, como a
síndrome de Mallory-Weiss e a esofagite ou gastrite erosiva.
A terapia endoscópica é a conduta de escolha para hemorragia digestiva alta
decorrente de sangramento de varizes esofagianas, mas não as gástricas. A técnica
hemostática de escolha é a ligadura elástica (preferencial à escleroterapia ). Cerca
de 60% dos episódios de hemorragia por varizes cessam de maneira espontânea.
Entretanto, a hemostasia endoscópica torna-se sempre necessária, mesmo em vasos
que já pararam de sangrar, devido ao elevado risco de ressangramento precoce. O
tratamento endoscópico controla o sangramento das varizes em 85 – 90% dos casos.
Aqui há o video de apostila 11.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
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Aqui há o video de apostila 11.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
Aqui há o video de apostila 12.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
A escleroterapia tem como princípio a injeção de substâncias esclerosantes no interior das
varizes ou na região paravariceal, provocando irritação na parede vascular e subsequente
trombose. As drogas empregadas são o oleato de etanolamina a 2,5–5%, o polidocanol a 0,5–
1%, tetradecilsulfato de sódio a 1–3%, ou o morruato de sódio a 5%. Na ligadura elástica ou
Ligadura Endoscópica de Varizes (LEV), ocorre estrangulamento do vaso varicoso, e o
sangramento cessa. A ligadura elástica encontra-se associada a uma obliteração mais rápida
das varizes. Os dispositivos atuais permitem o posicionamento de cinco a seis faixas elásticas
por vez. A ligadura elástica apresenta menor potencial de complicações que a escleroterapia!
As complicações da escleroterapia incluem febre, disfagia temporária, derrame pleural
assintomático e dor torácica retroesternal. A principal e incomum complicação esofagiana
clinicamente significativa, que requer uma mudança na estratégia terapêutica, inclui a ulceração
mucosa, que pode provocar sangramento em 20% dos casos. A perfuração esofágica é rara,
mas é a mais temida das complicações.
O tratamento das varizes de fundo gástrico e cárdia é tecnicamente mais difícil. Nesta situação,
uma nova droga vem despontando para ser aplicada na lesão sangrante durante a endoscopia:
o cianoacrilato , uma substância gelatinosa que endurece em contato com o meio,
transformando-se em material plástico. Outra terapia que vem sendo estudada é a injeção de
trombina nas varizes. Todavia, como veremos adiante, o tratamento padrão-ouro, na
atualidade, para combater a hemorragia por varizes gástricas, é a infusão de vasoconstritores
esplâncnicos .
TERAPIA FARMACOLÓGICATERAPIA FARMACOLÓGICA
É realizada com vasoconstritores esplâncnicos intravenosos, que reduzem o fluxo sanguíneo
porta e, portanto, a pressão portal. Citamos a terlipressina (análogo da vasopressina),
atualmente considerada a droga de escolha por alguns autores; a somatostatina (pouco
disponível no mercado); o octreotida e seus derivados (análogos da somatostatina). Estes
últimos inibem a ação vasodilatadora esplâncnica do glucagon. A terapia com estas medicações
deve ser iniciada de imediato, uma vez diagnosticado o sangramento por varizes, sendo
considerada adjuvante à terapia endoscópica ou terapia isolada nas varizes gástricas e na
gastropatia hipertensiva portal sangrante. O potencial de controle da hemorragia é de 80% ,
quando em terapia isolada. A terapia farmacológica é a conduta de primeira linha para a
hemorragia das varizes gástricas ou da gastropatia hipertensiva portal.
Antigamente, a vasopressina era considerada uma opção terapêutica, porém, devido a seus
efeitos colaterais, como vasoconstrição coronariana, hiponatremia e insuficiência renal aguda,
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efeitos colaterais, como vasoconstrição coronariana, hiponatremia e insuficiência renal aguda,
tornou-se uma droga obsoleta. A terlipressina apresenta menor potencial de efeitos adversos
cardiovasculares e maior eficácia do que a vasopressina.Observe as doses dos principais
esquemas utilizados (ambos de uso intravenoso):
●
Terlipressina 250–500 mcg/h;
●
Octreotida 50 mcg em bolo e 50 mcg/h.
A terlipressina é a droga de escolha no controle da hemorragia das varizes esofagogástricas por
ser a única que, além de melhorar o sangramento, demonstrou reduzir a mortalidade. A
somatostatina e o octreotida e seus análogos melhoram o sangramento, porém, de acordo com
a literatura, não se mostraram capazes de reduzir a mortalidade. A terapia com essas drogas é
mantida por 2 – 5 dias .
BALÃO DE SENGSTAKEN-BLAKEMOREBALÃO DE SENGSTAKEN-BLAKEMORE
Na ausência de procedimentos endoscópicos de urgência ou nos pacientes que permanecem
sangrando a despeito da terapia endoscópica e farmacológica, podemos empregar o
tamponamento com Balão de Sengstaken-Blakemore (BSB).
Técnica: o BSB possui três lúmens (para encher o balonete gástrico, o balonete
esofágico e para aspiração gástrica). Modelos novos possuem um quarto lúmen
para aspiração esofágica... O dispositivo deve ser passado até o estômago e
inflado o balonete gástrico com 250 ml de ar, sendo duplamente pinçado; após
devida tração do BSB, é colocado um peso com 500 ml de soro para mantê-lo
tracionado. O balonete esofágico então é inflado com 40 mmHg de pressão de ar,
sendo também pinçado. Parece que o efeito hemostático mais importante do BSB
deve-se ao balonete intragástrico tracionado!
O balão deve ser mantido por curta permanência (idealmente 10 mm. A encefalopatia costuma se instalar
Fig. 9: TIPS — Shunt portossistêmico intra-hepático transjugular, unindo a circulação porta e sistêmica "por
dentro" do parênquima do fígado.
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Fig. 10: Detalhe na inserção da agulha com o guia na veia porta direita, durante a colocação de um TIPS.
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2–3 semanas após a implantação do TIPS e geralmente responde às medidas convencionais,
como o uso de lactulose. Outro problema comum é a estenose . O mecanismo principal é a
hiperplasia da chamada pseudo-íntima em seu lúmen. A estenose do stent era observada em
50–75% dos casos após 6–12 meses de acompanhamento e, após dois anos, ocorria
virtualmente em todos os pacientes. Atualmente, porém, com o uso de stents recobertos pelo
politetrafluoretileno, a taxa de estenoses caiu bastante, para cerca de 8% após um ano. A
estenose dificulta a vazão do shunt , permitindo a recidiva das complicações da hipertensão
porta. A estenose pode ser adequadamente revertida com angioplastia ou com a colocação de
um novo stent . A patência do TIPS pode ser monitorizada com USG-Doppler seriados, de seis
em seis meses, pelo menos nos primeiros dois anos.
A atual indicação do TIPS é para os pacientes que ressangraram apesar da terapia endoscópica
e do tratamento medicamentoso otimizado, principalmente nos que aguardam transplante de
fígado. Ao contrário da cirurgia de derivação portossistêmica, o TIPS não altera a anatomia
dos sistemas porta e cava, daí a importância de utilizá-lo nos indivíduos com transplante
programado. Em pacientes sem previsão ou perspectiva de transplante, a cirurgia é a melhor
opção, pela chance de recidiva da hipertensão porta com o TIPS, porém é um procedimento de
maior risco e só deve ser realizado nos pacientes com boas condições clínicas (Child A — ou
seja, cirróticos Child B ou C, devido à elevada morbimortalidade peroperatória, não devem ser
submetidos ao tratamento cirúrgico da hipertensão porta).
QUADRO DE CONCEITOS IV
Quais são as principais indicações de TIPS na cirrose?
●
Hemorragia refratária ou recorrente por varizes esofagogástricas apesar de
tratamento clínico endoscópico.
●
Ascite refratária.
Quais são as principais complicações?
●
Encefalopatia hepática.
●
Estenose do stent (com retorno dos sintomas de hipertensão porta).
Quais são as contraindicações ao procedimento?
(1) Insuficiência cardíaca congestiva; (2) múltiplos cistos hepáticos; (3) hipertensão
pulmonar moderada/severa; (4) neoplasias muito vascularizadas; (5) trombose de
porta ou de todas as veias hepáticas; (6) encefalopatia hepática refratária; e (7)
dilatação da árvore biliar.
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CIRURGIA DE URGÊNCIACIRURGIA DE URGÊNCIA
A taxa de sucesso no controle dos episódios agudos de sangramento por varizes
esofagogástricas rotas "refratárias" ao tratamento convencional (ligadura elástica +
farmacoterapia) supera os 95%. Além disso, o TIPS tem sido bastante indicado nos casos de
hemorragia refratária, substituindo, na prática, as cirurgias descompressivas de emergência
(que antigamenterepresentavam a única opção terapêutica disponível) e a passagem de um
BSB.
Assim, a cirurgia é reservada para os casos de sangramento incontrolável pela endoscopia e/ou
terapia farmacológica em hospitais que não dispõem do TIPS. A cirurgia de urgência mais
utilizada é a derivação porto-cava (não seletiva) . Esta cirurgia é rápida e extremamente eficaz,
porém acarreta mortalidade de até 25% quando realizada em condições de emergência. A
transecção esofágica com grampeador é um método cirúrgico bem mais simples e fácil de
executar, embora tenha um risco alto de ressangramento. Pode ser a alternativa em centros que
contam com cirurgiões de urgência sem experiência na confecção da derivação porto-cava.
O a seguir resume a conduta diante de uma hemorragia digestiva alta por varizes
de esôfago rotas.
Fluxograma 1
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PROFILAXIA PRIMÁRIA DO SANGRAMENTOPROFILAXIA PRIMÁRIA DO SANGRAMENTO
A presença de hipertensão porta por si só não necessariamente está associada a um risco
elevado de sangramento por varizes, mas sim os casos de Hipertensão Porta Clinicamente
Significativa (HPCS) . A HPCS é definida pelo Gradiente de Pressão Venosa Hepática
(GPVH) ≥ 10 mmHg (padrão-ouro) ou pela presença de manifestações clínicas da HP (ex.:
ascite, circulação colateral). A recomendação atual é para que todo paciente com cirrose e
HPCS receba profilaxia primária medicamentosa com betabloqueadores para sangramento,
independentemente da presença de varizes ou do seu calibre .
Entre os betabloqueadores, os mais estudados são os não seletivos propranolol e o nadolol . O
grande efeito é levar à vasoconstrição esplâncnica (bloqueia o efeito beta, predominando o
efeito alfavasoconstritor), isto é, dos órgãos mesentéricos. A consequência é uma redução do
fluxo venoso que chega ao sistema porta e da pressão portal. Lembre-se d e que, além da
obstrução, um dos mecanismos da HP é o aumento do fluxo! Mais recentemente, o carvedilol
(que também bloqueia atividade alfa-1-vasoconstritora com redução do tônus vascular
hepático e da resistência hepática) foi integrado a esta lista. Inclusive, por ser mais efetivo na
redução da pressão porta e por apresentar melhor tolerância que os demais, já é considerada a
droga de escolha .
Mas, e nos demais pacientes, precisamos fazer rastreamento de varizes para antecipar o
sangramento?
Depende! Em teoria, TODO paciente com cirrose hepática deve ser submetido à endoscopia
digestiva alta para rastrear as varizes esofagogástricas. Contudo, o rastreio poderia ser adiado,
a partir da realização de seguimento anual com a Elastografia Hepática Transitória (EHT) e a
contagem de plaquetas. Sabe-se atualmente que tais testes não invasivos são acurados para
estimar a HCPS. O rastreio endoscópico ficaria indicado então para aqueles com EHT ≥ 20
kPa ou contagem de plaquetas ≤ 150.000/mm³.
Além disso, os pacientes que já estiverem compensados em uso de betabloqueadores (titulados
para FC de repouso de 50–55 bpm ou pelo GPVH) não necessitam de rastreamento
endoscópico para detecção de varizes! Afinal, a conduta não sofrerá modificações.
Uma vez indicado, o rastreamento deve ser repetido a cada 2–3 anos na ausência de varizes, 1–
2 anos na presença de pequenas varizes e anualmente se Child-Pugh B/C. Nesse contexto, a
profilaxia primária estaria indicada em caso de:
Fluxograma 1: Conduta diante de uma hemorragia digestiva alta por varizes de esôfago rotas.
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profilaxia primária estaria indicada em caso de:
●
Varizes de médio e grande calibre (F2/F3); ou
●
Varizes de pequeno calibre em pacientes com alto risco de sangrar (Child B/C ou “pontos
averme​lhados” na EDA).
Caso não possam receber betabloqueadores (contraindicação ou tolerância), a escolha recai
sobre a Ligadura Endoscópica de Varizes (LEV). Esta deve ser realizada a cada 1–2 semanas
até obliteração do vaso. Em seguida, faz-se vigilância endoscópica com EDA 1–3 meses depois
e, consecutivamente, a cada seis meses.
Além dos betabloqueadores, outras drogas potencialmente benéficas também já foram
descritas. Entre elas, nitrato e sinvastatina (pela elevação do óxido nítrico na circulação intra-
hepática), prasozin/clonidina (pelo bloqueio adrenérgico) e captopril/losartan (pelo bloqueio da
angiotensina). O grande problema dos venodilatadores, no entanto, é agravar a retenção de
sódio e a vasoconstrição renal.
Terapia de escolha na profilaxia primária = betabloqueio (preferência) ou ligadura
elástica 
Obs.: a escleroterapia não deve ser usada como profilaxia primária.
RESUMINDO...
Indica ​ções de pro ​filaxia primá ​ria de sangra ​mento.
●
Hipertensão Porta Clinicamente Significativa (HPCS).
●
Varizes de grosso e médio calibre.
●
Varizes de pequeno calibre:
�
Com sinais vermelhos;
�
Cirróticos Child B e C.
PROFILAXIA SECUNDÁRIA DO SANGRAMENTOPROFILAXIA SECUNDÁRIA DO SANGRAMENTO
A profilaxia secundária é aquela realizada após o primeiro episódio de hemorragia já
controlada. Em um ano, sem a profilaxia, 25% dos pacientes Child A, 50% dos Child B e 75%
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controlada. Em um ano, sem a profilaxia, 25% dos pacientes Child A, 50% dos Child B e 75%
dos Child C terão um novo sangramento varicoso. Idealmente, a prevenção de novos
sangramentos é feita pela combinação de: (1) terapia endoscópica ; e (2) betabloqueadores .
Os melhores resultados são obtidos com a redução monitorizada do gradiente de pressão
venosa hepática (DO TEMPO DE PROTROMBINA E
DIMINUIÇÃO DA ATIVIDADE DE DIMINUIÇÃO DA ATIVIDADE DE PROTROMBINAPROTROMBINA
Considerando que o fígado é a principal sede da síntese de fatores de coagulação, incluindo a
síntese dos fatores vitamina K-dependentes (II, VII, IX e X), fica fácil entender que uma
redução significativa da função hepática resulta em coagulopatia (tendência hemorrágica).
HIPERGAMAGLOBULIHIPERGAMAGLOBULI ​NEMIANEMIA
O cirrótico apresenta tendência aumentada à ocorrência do fenômeno de translocação intestinal
bacteriana (bacteremia espontânea a partir do trato gastrointestinal). O menor clearance
hepático de bactérias presentes no sangue portal bem como a “fuga” dessas bactérias pelos
shunts portossistêmicos explicam tal fato. Assim, o braço humoral do sistema imunológico
(linfócitos B) sofre um certo grau de hiperestimulação constante na cirrose hepática, o que
pode resultar em hipergamaglobulinemia policlonal quando há presença de cirrose hepática
avançada e hipertensão porta grave. Lembrar também que, na doença hepática alcoólica, há
típico aumento da fração IgA (as células de Kupffer, responsáveis pela remoção de complexos
contendo IgA, possuem sua função prejudicada); na colangite biliar primária, há aumento
característico da fração IgM e, na hepatite autoimune, há elevação de IgG.
SÓDIO SÉRICOSÓDIO SÉRICO
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A hiponatremia é um marcador de péssimo prognóstico na cirrose avançada com ascite. Seu
mecanismo é a incapacidade de excretar água livre, decorrente do excesso de hormônio
antidiurético (ADH). Este excesso, por sua vez, é estimulado pela redução do volume circulante
efetivo (secreção “não osmótica” de ADH).
PANCITOPENIAPANCITOPENIA
Na cirrose avançada complicada por hipertensão porta, há esplenomegalia e hiperesplenismo,
com consequente redução não só do número de plaquetas circulantes (sinal mais precoce), mas
também da hematimetria e da contagem de leucócitos (sinais mais tardios). A anemia do
paciente cirrótico, na verdade, costuma ser multifatorial (ex.: desnutrição, sangramento
digestivo crônico, supressão medular pelo álcool ou por vírus), sendo muito comum, ainda, a
ocorrência de anemia de doença crônica , secundária à doença de base. Na hepatite C, a
plaquetopenia pode surgir mesmo na ausência de hiperesplenismo.
MARCADORES SÉRICOS DIRETOS E INDIRETOS DE FIBROSEMARCADORES SÉRICOS DIRETOS E INDIRETOS DE FIBROSE
AVANÇADA/CIRROSEAVANÇADA/CIRROSE
Grandes progressos têm sido feitos no sentido de criar métodos não invasivos para diagnóstico,
quantificação e acompanhamento da fibrose hepática. Todavia, até o momento, nenhum
desses exames suplantou a acurácia da biópsia, e não existe nenhuma recomendação oficial
para o seu uso na prática clínica diária. A maioria vem sendo aplicada em centros de pesquisa.
Um exemplo de marcadores sorológicos de fibrose validados é o teste ELF, que combina três
deles: ( 1 ) ácido hialurônico (HA); ( 2 ) pró-colágeno III peptídeo com terminação amino
(PIIINP); e (3) o inibidor tissular de metaloproteinase I (TIMP-1). A dosagem de lâmina e de
uma molécula chamada “chondrex” (YKL 40) também pode vir a ter um papel importante no
futuro. Alguns índices multivariados — que se propõem a avaliar indiretamente a existência de
fibrose hepática — também vêm sendo estudados. O FibroIndex , por exemplo, que gera um
escore a partir dos valores de AST, plaquetas e gamaglobulinas; o Hepascore , que combina
idade, sexo, GGT, bilirrubina, ácido hialurônico sérico e níveis de alfa-2-macroglobulina; o
índice PGA , que avalia o tempo de protrombina, a GGT e os níveis séricos de apolipoproteína
A1, e demonstrou ter acurácia de 66 a 72% para detecção de cirrose no contexto da doença
hepática alcoólica. 
DIAGNÓSTICO POR EXAMES DE IMAGEMDIAGNÓSTICO POR EXAMES DE IMAGEM
O papel da radiologia na avaliação da cirrose hepática inclui: ( 1 ) avaliar as alterações
morfológicas da doença; (2) avaliar a vascularização hepática e extra-hepática; (3) detectar e
estimar os efeitos da hipertensão porta; e (4) identificar tumores hepáticos, diferenciando o
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estimar os efeitos da hipertensão porta; e (4) identificar tumores hepáticos, diferenciando o
Carcinoma Hepatocelular (CHC) de outros tipos de tumor.
Tendo estes objetivos em mente, várias técnicas de imagem podem ser utilizadas:
●
Ultrassonografia convencional do abdome (USG);
●
Ultrassonografia do abdome com Doppler (USGD);
●
Tomografia Computadorizada do abdome (TC);
●
Ressonância Magnética (RM) — ;
●
Angiorressonância Magnética (ARM);
●
Elastografia Transitória por USG ou RM (ET);
●
Arteriografia com ou sem lipiodol (AG).
Nas fases iniciais da cirrose hepática, todos esses exames podem ser normais! Por outro lado,
nas fases mais avançadas, a USG, TC e a RM costumam detectar alterações sugestivas da
doença. Desse modo, podemos dizer que o papel da radiologia na avaliação do hepatopata
crônico é corroborar uma forte suspeita clínica de cirrose!!! Quando a suspeita é de cirrose em
fases iniciais, mesmo os métodos radiológicos mais modernos (ex.: RM) não têm resolução
suficiente para detectar graus menores de fibrose. Observe as alterações mais encontradas na
Figura 6 _
_
Fig. 6: RM de abdome.
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suficiente para detectar graus menores de fibrose. Observe as alterações mais encontradas na
cirrose hepática bem estabelecida:
●
Nodularidade da superfície hepática;
●
Heterogeneidade do parênquima hepático;
●
Alargamento da porta hepatis e da fissura interlobar;
●
Redução volumétrica do lobo hepático direito e do segmento médio do lobo hepático esquerdo;
●
Aumento volumétrico do lobo caudado e do segmento lateral do lobo hepático esquerdo;
●
Identificação de nódulos regenerativos. Neste caso, a RM constitui método superior aos demais.
Além disso, o carcinoma hepatocelular pode ser identificado pelos exames de imagem, algumas
vezes de maneira tão precoce que permita sua ressecção curativa ou transplante hepático. Nesse
sentido, a USG (e com menor frequência, a TC) é utilizada no rastreamento semestral de CHC
em pacientes sabidamente cirróticos, juntamente com a dosagem sérica da alfafetoproteína . Em
caso de dúvida diagnóstica, a AG com lipiodol pode ser empregada, dada sua alta
especificidade para o diagnóstico de CHC! Este último método torna-se particularmente útil na
presença de um nódulo parenquimatoso com características intermediárias entre CHC e
nódulo regenerativo.
A AG, a USG com Doppler e a ARM também podem ser usadas para o estudo do sistema
porta e identificação de possíveis shunts portossistêmicos secundários à hipertensão porta.
Com relação à elastografia, o FibroScan ® é um dos exames mais utilizados e o que consegue
quantificar a fibrose medindo a velocidade da onda que o tecido reproduz, sendo essa
diretamente relacionada à rigidez hepática. Chega a ter 94% de sensibilidade e 89% de
especificidade na determinação de fibrose hepática significativa. 
BIÓPSIA HEPÁTICABIÓPSIA HEPÁTICA
Como vimos no início do capítulo, o padrão-ouro para o diagnóstico de cirrose hepática é a
histopatologia, com base no achado de espessos e completos septos fibrosos porta-centro e
porta-porta, os quais delimitam nódulos, resultando em uma completa desorganização da
arquitetura lobular e vascular . 
Quando os dados clínicos, laboratoriais e radiológicos são extremamente
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Quando os dados clínicos, laboratoriais e radiológicos são extremamente
sugestivos de cirrose avançada (ex.: ascite, esplenomegalia, hipoalbuminemia,
INR alargado, fígado atrofiado, heterogêneo e nodular), a biópsia geralmente é
desnecessária (e até arriscada).
A biópsia hepática, além de confirmar o diagnóstico de cirrose, também pode fornecer pistas
quanto a sua etiologia (ex.: através de métodos imuno-histoquímicos). Vale lembrar que a
biópsia hepática percutânea não deve ser realizada em pacientes com atividadejá na admissão, idealmente antes mesmo da endoscopia digestiva.
Seu uso mostrou diminuição na mortalidade, baseado principalmente na diminuição da
incidência de infecções (como, por exemplo, a peritonite bacteriana espontânea). Estudos
mostraram também uma redução na taxa de ressangramento pelas varizes.
Tradicionalmente, o antibiótico de escolha tem sido o norfloxacino, na dose de 400 mg 12/12h,
por sete dias. Casos graves em que o paciente esteja impossibilitado de utilizar a via oral podem
ser manejados com ceftriaxona IV ou IM (1 g 1x/dia), trocando-se posteriormente para
norfloxacino oral até completar sete dias. Em locais onde a prevalência de resistência dos
Gram-negativos às quinolonas está aumentando, o esquema com ceftriaxona 1 g/dia vem sendo
considerado preferencial a o tradicional norfloxacino como profilaxia da PBE em cirróticos
com hemorragia digestiva alta.
PROFILAXIA DA ENCEFALOPATIA HEPÁTICAPROFILAXIA DA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA
Embora não haja recomendação formal para serem iniciadas de rotina, a lactulose e a
rifaximina poderiam ser usadas como profilaxia para a encefalopatia hepática após episódio de
sangramento digestivo, segundo os benefícios apresentados por alguns estudos.
ASCITEASCITE
DEFINIÇÃODEFINIÇÃO
Aqui há o video de apostila 13.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
Ascite quer dizer derrame líquido na cavidade peritoneal e não representa uma doença, mas
uma manifestação comum a várias doenças. Não devemos esquecer, entretanto, que (1) existe
um transudato fisiológico (até 100 ml), responsável pela lubrificação das membranas
peritoneais; e (2) os derrames de sangue ou pus na cavidade peritoneal não representam ascite,
mas, respectivamente, hemoperitônio e pioperitônio. A hipertensão portal relacionada à cirrose
hepática é a principal causa de ascite no Brasil e no mundo.
O EXAME FÍSICOO EXAME FÍSICO
Quando a ascite é volumosa, o abdome apresenta-se globoso, tanto com o paciente em pé
quanto deitado. A cicatriz umbilical pode se aplanar ou até everter (ao contrário da gravidez e
do meteorismo, em que isso em geral não ocorre). Se a ascite for devido à hipertensão porta
(ver adiante), é comum a presença de circulação colateral evidente no abdome ("cabeça de
medusa").
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medusa").
Quando a ascite não é muito volumosa e o tônus da musculatura abdominal está reduzido:
●
No paciente em pé, o abdome pode "cair" sobre o púbis, configurando a forma "em avental";
●
No paciente deitado, o abdome se alarga para os flancos, configurando a forma de "batráquio".
Sinal do Piparote (Morgani): o sinal do Piparote deve ser pesquisado no paciente em decúbito
dorsal — o médico dá um "peteleco" em um dos flancos do paciente e tenta sentir a propagação
da força no outro flanco. Para evitar a propagação de uma onda superficial da parede
abdominal que confundiria o diagnóstico, o médico deve colocar a borda cubital da mão na
região mediana ou pedir para que o próprio paciente o ajude ( ). Cumpre ressaltar
que este sinal só é positivo quando a ascite é muito grande, geralmente superior a cinco litros, e
ainda pode ser negativo se houver tensão da parede abdominal.
Macicez móvel de decúbito: é o melhor método semiológico para detecção de ascite; baseia-se na
análise diferencial dos sons da percussão abdominal, quando o paciente se posiciona em várias
angulações de decúbito lateral. Mas como é a técnica? Inicialmente se faz a percussão do
paciente em decúbito dorsal, marcando o local do flanco em que o som fica maciço. Pede-se
então que o paciente adote uma angulação de decúbito lateral. Percute-se no local marcado e,
se este estiver timpânico agora, configura-se a macicez móvel de decúbito. Geralmente detecta
ascite a partir de 1,5 litros.
Alguns autores mais clássicos chegam a dizer que poderíamos lançar mão de manobras “mais
sensíveis”, como o toque retal e pesquisa do sinal da “poça”, quando faríamos a percussão da
barriga com o paciente apoiado sobre quatro apoios. Certamente, não é preciso explicar por
que tais manobras se tornaram obsoletas...
Figura 11 _
_
Fig. 11: O sinal do Piparote — útil somente para as grandes ascites, superiores a cinco litros.
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É importante chamar a atenção para o fato de que o líquido peritoneal, principalmente nos
processos inflamatórios ou neoplásicos do abdome, pode estar contido em cavidades septadas,
dificultando a interpretação dos métodos propedêuticos utilizados. Nesse caso, a pesquisa dos
semicírculos de Skoda constitui um método útil para diferenciar líquido livre na cavidade de
líquido septado. Com o paciente em decúbito dorsal, percute-se todo o abdome a partir de
linhas convergentes para o mesmo ponto, de modo a delimitar os limites entre o timpanismo e a
macicez. Se a concavidade for voltada para cima, estaremos diante de um líquido livre. No caso
contrário, trata-se de um derrame septado, cisto anexial, bexigoma ou aumento uterino.
Tab. 6: Classificação da ascite.
*PGV: Paracentese de Grande Volume.
EXAMES COMPLEMENTARESEXAMES COMPLEMENTARES
RADIOGRAFIARADIOGRAFIA
As radiografias têm pouco valor para o diagnóstico de ascite. Descreveremos a seguir apenas
algumas considerações a título de curiosidade (se preferir, passe direto para o próximo exame:
USG).
A presença de líquido livre na cavidade peritoneal pode ser demonstrada na região da pequena
bacia, nos flancos e na parte média do abdome, entre as alças. Na região da pequena bacia, o
líquido livre se localiza nos espaços pararretais, vesicorretal, pélvico e extensão inferior das
goteiras paracólicas. Quando o derrame peritoneal, mesmo que pequeno, se insinua nos
espaços pélvicos-laterais, obtém-se a configuração em "orelha de cachorro". Nos flancos, o
líquido ocupa os espaços entre as alças intestinais, alargando-os. O aspecto que se forma é o de
um "pente". Outro sinal é a obliteração do ângulo hepático (segmento inferior da borda lateral
direita do fígado). A interposição de líquido entre o fígado e o gradil costal separa estas duas
_
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direita do fígado). A interposição de líquido entre o fígado e o gradil costal separa estas duas
estruturas — tal fenômeno pode ser mais percebido nas radiografias oblíquas. A borda
hepática identificada num RX oblíquo posterior direito, com baixa quilovoltagem, permite
diagnosticar o afastamento do fígado do gradil costal, e é considerado por alguns
patognomônico de ascite. Grandes quantidades de líquido podem dar aspecto homogêneo ao
abdome, fazendo desaparecer os contornos dos órgãos abdominais. Em quantidades ainda
maiores, há separação do fundo gástrico e cólon transverso do diafragma.
ULTRASSONOGRAFIA (USG)ULTRASSONOGRAFIA (USG)
A USG é o método de escolha para se detectar pequenas coleções líquidas no abdome , que
aparecem como imagens anecoicas (livres de ecos). A USG também diz se o derrame peritoneal
está encistado ou faz parte de massas complexas, isto é, ao mesmo tempo sólidas e líquidas
(hematomas, abscessos e tumores necrosados). A USG pode ainda frequentemente diagnosticar
a causa da ascite, demonstrando alterações compatíveis com cirrose, uma massa abdominal ou
pélvica, metástases, cistos pancreáticos etc. Por fim, este exame também é importante na
realização de punções diagnósticas ou terapêuticas de coleções abdominais.
TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA (TC)TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA (TC)
A TC permite o diagnóstico de ascite com segurança e também diferencia as coleções líquidas
livres das massas sólidas ou císticas, uma vez que o líquido ascítico apresenta menor densidade
radiológica que as estruturas sólidas adjacentes. As ascites de pequeno volume podem ser
detectadas pela tomografia axial computadorizada, na região da ponta do fígado, e na goteira
paracólica esquerda e na pelve. Como é um método caro, a TC não costuma ser usada no
diagnóstico de ascite — entretanto, é frequentemente utilizada para o seu diagnóstico
etiológico.
PARACENTESEPARACENTESEA paracentese abdominal tem as seguintes finalidades principais:
●
Obtenção de material para análise (diagnóstico etiológico da ascite);
●
Aliviar o doente dos sintomas compressivos.
A paracentese diagnóstica é exame obrigatório no paciente com ascite! É a melhor maneira de se
começar a investigação etiológica. Em pacientes cirróticos com ascite, uma paracentese sempre
deve ser realizada numa internação hospitalar (por qualquer motivo) para procurar o
diagnóstico da importante síndrome da peritonite bacteriana espontânea, eventualmente
diagnosticada em cirróticos ascíticos assintomáticos.
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diagnosticada em cirróticos ascíticos assintomáticos.
A paracentese deve ser realizada com o paciente em decúbito dorsal, após anestesia local, com
assepsia cuidadosa da área a ser puncionada. Para determinar o ponto de punção, devemos
traçar uma linha imaginária do umbigo à espinha ilíaca anterossuperior esquerda e dividi-la em
três partes. Na junção entre o terço médio e o terço inferior, procede-se à inserção da agulha
para realização da paracentese. Mas por que deve ser feita do lado esquerdo? Por um motivo
simples: o ceco (localizado à direita) é mais fixo em sua posição do que as alças contralaterais,
aumentando o risco de perfuração do lado direito.
As complicações da paracentese abdominal são muito raras e incluem perfuração intestinal e
hemorragia. A perfuração pode ser evitada se a paracentese for realizada apenas naqueles que
sabidamente tenham ascite e não tenham obstrução intestinal ou acentuada distensão de alças
— também não deve ser realizada próximo a cicatrizes cirúrgicas, devido à possibilidade de,
nesses locais, existirem alças aderidas à parede abdominal. Embora aumente o risco de
hemorragia, o distúrbio da coagulação (comum em hepatopatas) não contraindica o
procedimento, pois o risco continua sendo pequeno, contanto que se utilize a técnica
corretamente...
Obs.: após a punção, pode ocorrer saída constante de líquido (principalmente se a ascite for
grande), o que pode ser evitado realizando-se a técnica em "Z" (desloca-se a pele para o lado e
realiza-se a punção, perfurando a pele e o peritônio em locais diferentes). Após a punção, deve-se
aplicar um curativo compressivo.
BIÓPSIA PERITONEALBIÓPSIA PERITONEAL
Este procedimento é utilizado para o diagnóstico de casos selecionados de ascite. Idealmente,
deve ser feito por via laparoscópica , reduzindo riscos e orientando o melhor local para a
biópsia. A inspeção do peritônio pode fornecer pistas importantes para o diagnóstico!
EXAME DO LÍQUIDO ASCÍTICOEXAME DO LÍQUIDO ASCÍTICO
Fundamental para a elucidação diagnóstica da ascite, o exame do líquido colhido na primeira
paracentese deve incluir: ( 1 ) aspecto macroscópico; ( 2 ) exames bioquímicos como LDH,
proteínas, glicose, amilase, lipídios, marcadores tumorais e outros; (3) citologia convencional e
oncótica; (4) bacterioscopia (Gram/​Ziehl-Nielsen); e (5) cultura (bactérias/fungos/BK).
MACROSCOPIAMACROSCOPIA
Quanto ao aspecto macroscópico, o líquido ascítico pode ser:
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●
Seroso: mais comum — o líquido é claro e transparente ou amarelo-citrino e decorre de várias
causas. É o aspecto clássico da cirrose não complicada;
●
Hemorrágico: aspecto serossanguinolento, róseo ou de cor sanguínea mais viva — pode ser
observado nas neoplasias e, mais raramente, na peritonite tuberculosa. É importante não se
confundir com hemoperitôneo. Mas como diferenciar a ascite hemorrágica de um acidente de
punção? Pode ser feito associando-se duas informações: ( 1 ) normalmente, no acidente de
punção, o líquido ascítico vai clareando durante a drenagem; e (2) o sangue presente na ascite
hemorrágica não coagula, ao contrário do sangue do acidente de punção;
●
Turvo: sugestivo de infecção. Pode haver odor fétido;
●
Lactescente: constituído por líquido branco-amarelado, de aparência leitosa, distinguindo-se em
duas variedades: (1) quiloso — caracterizado pela presença de linfa, resulta da obstrução ou
ruptura do canal torácico ou de vasos linfáticos quilíferos. As causas mais frequentes são as
neoplasias e os traumatismos; e ( 2 ) quiliforme — caracterizado pela presença de células
endoteliais e leucócitos em estados de degeneração gordurosa (tumores do peritônio) ou de
lipídios em abundância (nefrose lipídica). Eventualmente (0,5% dos casos), os pacientes cirróticos
podem se apresentar com ascite quilosa;
●
Bilioso: de coloração esverdeada, observado nos traumatismos das vias biliares (inclusive
cirúrgicos);
●
Gelatinoso: amarelado e espesso, de viscosidade semelhante à da gelatina — observado nos
tumores mucinosos e no pseudomyxoma peritonei.
BIOQUÍMICABIOQUÍMICA
A análise bioquímica do líquido ascítico é de extrema importância para a abordagem inicial de
qualquer forma de ascite. Atualmente o exame de maior destaque, por ser um "divisor de
águas" para o início das investigações, envolve a dosagem de albumina (no líquido ascítico e ao
mesmo tempo no plasma): é o gradiente de albumina soroascite . Detalharemos este exame mais
adiante.
Outros parâmetros bioquímicos que podem ser bastante úteis em situações específicas são a
proteína total, a glicose e o L DH (para diferenciar a peritonite bacteriana espontânea da
peritonite secundária), os triglicerídeos (bastante aumentados nas ascites quilosas), as
bilirrubinas (presentes nas ascites biliares), os níveis de ureia (elevados na ascite urinária) e a
amilase (presente na ascite pancreática).
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CITOMETRIACITOMETRIA
A citometria também é um importante exame no diagnóstico etiológico das ascites — veja:
●
O encontro de um grande número de hemácias orienta para o diagnóstico de neoplasia e, em
menor grau, para o de tuberculose. Outras causas possíveis são patologia pancreática e trombose
mesentérica;
●
A contagem de leucócitos elevada sugere fortemente a presença de um processo inflamatório do
peritônio — a predominância de Polimorfonucleares (PMN) sugere infecção bacteriana aguda,
enquanto a presença de mononucleares (linfócitos/monócitos) sugere tuberculose peritoneal,
neoplasia e colagenoses.
Tab. 7: Orientações na paracentese diagnóstica em pacientes com cirrose.
O diagnóstico da peritonite bacteriana espontânea é dado pela presença de mais de 250
polimorfonucleares (neutrófilos) por mm³. A contagem é feita de forma manual, mas deve ser a
mais precisa possível. Um fator de erro ocorre nos derrames hemorrágicos: o sangue tem
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mais precisa possível. Um fator de erro ocorre nos derrames hemorrágicos: o sangue tem
leucócitos e, portanto, a leucometria do líquido ascítico estará falsamente elevada. Pode-se
corrigir a leucometria do líquido ascítico subtraindo-se 1 PMN para cada 250 hemácias por
mm³ encontradas.
CITOLOGIA ONCÓTICACITOLOGIA ONCÓTICA
É o principal exame para o diagnóstico da ascite carcinomatosa (cânceres gastrointestinais,
câncer de ovário), apresentando alta sensibilidade. No hepatocarcinoma, a citologia oncótica é
quase sempre negativa.
BACTERIOLOGIABACTERIOLOGIA
Os exames bacteriológicos incluem a bacterioscopia e as culturas — deve-se saber que a
bacterioscopia, seja pelo Gram, seja pelo Ziehl-Nielsen, é de valor limitado (baixa
sensibilidade): são positivos em apenas 2% dos pacientes com peritonite tuberculosa e 10% dos
pacientes com peritonite bacteriana espontânea. Esse percentual aumenta bastante nos casos de
perfurações intestinais. As ascites fúngicas são muito raras; desta forma, não são geralmente
pedidas culturas para fungos. Para confirmar o diagnóstico bacteriológico da peritonite
bacteriana espontânea, o material colhido deve ser imediatamente introduzido em um frasco de
hemocultura. O ideal é colocar 10 ml num frasco de 100 ml: neste caso, a sensibilidade pode
chegar a 80%.
ETIOLOGIA DAS ASCITESETIOLOGIA DAS ASCITES
HIPERTENSÃO PORTA (HP)HIPERTENSÃO PORTA (HP)
O aumento da pressãono sistema venoso porta-hepático gera sabidamente ascite. Uma
pergunta que devemos responder é: de onde vem o líquido que preenche toda a cavidade
abdominal? De onde surge o líquido ascítico? Você alguma vez já se fez esta pergunta? Veja, é
fundamental compreender isso, pois, caso contrário, teremos que decorar (sem entender)
diversas situações clínicas que envolvem este tema. É o caso, por exemplo, de algumas formas
de HP (como a esquistossomose), que originam níveis pressóricos altíssimos no sistema porta
sem resultar em ascite, ou então das condições que, mesmo gerando aumentos apenas discretos
da pressão porta, conseguem produzir um quadro clássico de ascite grave e refratária, como
acontece na síndrome de Budd-Chiari.
Analise atentamente a e observe um detalhe microanatômico muito importante da
circulação porta: existem "válvulas de segurança" no meio deste sistema venoso que permitem
que haja um "escape" pressórico toda vez que a pressão porta se eleva muito — exatamente
como em uma panela de pressão. Os sinusoides hepáticos são esta válvula . Eles são
Figura 12 _
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como em uma panela de pressão. Os sinusoides hepáticos são esta válvula . Eles são
extremamente fenestrados, de forma que qualquer aumento de pressão porta resulta em
extravasamento de líquido (linfa hepática) para a cavidade peritoneal.
Conclusão: em condições de HP, o fígado literalmente "goteja" linfa para a cavidade peritoneal,
formando a ascite.
Nesse exato momento, vem uma dúvida: mas e se a obstrução porta estiver localizada em um
ponto anterior (em relação ao sentido do fluxo sanguíneo) aos sinusoides hepáticos? Como não
há aumento da pressão no interior dos sinusoides, haveria mesmo assim ascite? Pois bem,
chegamos ao ponto mais importante sobre conceitos que envolvem hipertensão porta e ascite.
Todo quadro de hipertensão porta deve obrigatoriamente ser classificado em:
●
Pré-sinusoidal;
●
Pós-sinusoidal;
●
Intrassinusoidal.
_
Fig. 12: Representação esquemática da gênese das ascites pós-sinusoidais.
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Intrassinusoidal.
As obstruções pré-sinusoidais dificilmente geram ascite porque não envolvem os sinusoides
hepáticos — é o caso da esquistossomose, em que a obstrução ocorre nos espaços-porta. Como
não há "válvulas de escape", estes pacientes acabam desenvolvendo um quadro clínico marcado
por manifestações graves de HP, como circulação colateral, varizes de esôfago sangrantes e
esplenomegalia severa, mas sem ascite. Menos comumente surge ascite naqueles que
desenvolvem concomitantemente hipoalbuminemia grave ou mesmo cirrose.
As obstruções pós-sinusoidais , como a síndrome de Budd-Chiari, produzem um quadro de
hipertensão porta completamente diferente, marcado principalmente pela ascite — aliás, grave
e de difícil controle. É menos frequente nestes pacientes encontrarmos varizes de esôfago
sangrantes, esplenomegalia grave ou circulação colateral abundante.
Mas veja: 85% dos casos de hipertensão porta são resultantes de cirrose hepática, que na
verdade origina ambos os mecanismos patogênicos (pré e pós-sinusoidal) — assim, muitos
classificam o mecanismo da cirrose como " intrassinusoidal ". Nos cirróticos, em geral,
encontramos em conjunto tanto a ascite quanto todos os outros sinais clínicos de HP grave.
Por ser formada por um mecanismo que envolve apenas o aumento da pressão
vascular (no sistema porta), o líquido formado, ou seja, a ascite, é do tipo
transudativa, pobre em proteínas .
DOENÇA PERITONEALDOENÇA PERITONEAL
As doenças peritoneais que resultam em ascite são as neoplasias (primárias ou mesmo
metástases para o peritônio) e as infecções, mais especificamente a tuberculose peritoneal .
Estas formas de ascite têm uma fisiopatogênese diferente, resultando basicamente das seguintes
causas:
●
Aumento da permeabilidade dos capilares do peritônio (processo inflamatório);
●
Obstrução, pelas células tumorais, dos canais linfáticos que ligam a cavidade peritoneal aos
plexos linfáticos subdiafragmáticos, impedindo, assim, a sua drenagem adequada;
●
Tumores podem liberar substâncias angiogênicas, que também aumentam diretamente a
permeabi​lidade peritoneal.
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Em função desses mecanismos, a ascite resultante de uma doença do peritônio,
seja neoplasia ou tuberculose, é classicamente do tipo exsudativa , ou seja, com
elevado teor de proteínas (numa composição bem mais próxima da do plasma).
ASCITE NEOPLÁSICAASCITE NEOPLÁSICA
É a segunda causa mais comum de ascite . Embora, na maioria dos casos, a ascite neoplásica
revele-se um líquido amarelo-citrino, não raramente se torna hemorrágica ou mesmo quilosa . A
presença deste tipo de ascite (hemorrágica ou quilosa) sugere fortemente uma etiologia
neoplásica, principalmente se houver suspeita clínica.
As neoplasias malignas mais comumente associadas à ascite incluem o tumor de ovário, o
câncer colorretal, do estômago, do pâncreas e, menos comumente, linfoma, mama, pulmão,
útero, mesotelioma, próstata, colangiocarcinoma e neoplasia maligna do esôfago.
O líquido ascítico possui citologia positiva em amostra única em pouco mais de 80% dos
pacientes com carcinomatose, chegando, porém, a 97% quando realizadas três paracenteses de
grande volume. Outras características incluem elevados níveis de proteínas, LDH e colesterol,
além, é claro, do gradiente albumina S-Ada presença da micobactéria através do PCR (
Polymerase Chain Reaction — detecta o RNA do patógeno), tendo mostrado excelentes
resultados em estudos pequenos.
Finalmente, a laparoscopia é um exame de grande valia na tuberculose peritoneal, já que, além
de poder identificar as características granulações de natureza tuberculosa (dispersas pela
membrana peritoneal) e as típicas aderências entre o peritônio visceral e o parietal, também
pode viabilizar a biópsia destas lesões, chegando-se a uma sensibilidade de quase 100% .
FORMAS MENOS COMUNS DE ASCITEFORMAS MENOS COMUNS DE ASCITE
As formas de ascite descritas a seguir, além de raras, não costumam entrar no diagnóstico
diferencial das ascites clínicas, ou seja, dos pacientes que se apresentam com abdome globoso
devido ao acúmulo de líquido. São formas de ascite, em sua maioria, ditas "ultrassonográficas",
pois só conseguem ser percebidas por métodos de imagem.
ASCITE PANCREÁTICAASCITE PANCREÁTICA
A ascite é uma complicação rara da pancreatite. Ela resulta de extravasamento de um
pseudocisto ou da formação de fístula com o peritônio a partir de ducto pancreático rompido.
O acúmulo de fluido se dá ao longo de semanas a meses e pode ser maciço. Como as enzimas
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O acúmulo de fluido se dá ao longo de semanas a meses e pode ser maciço. Como as enzimas
não estão ativadas, não ocorre uma peritonite aguda, e a ascite pancreática costuma ser indolor
(só eventualmente há uma leve irritação peritoneal).
O exame do líquido ascítico é fundamental para o diagnóstico — em geral ele é um exsudato
amarelo-citrino, eventualmente hemorrágico. Sua análise evidencia proteína elevada (maior do
que 3 g/dl), gradiente soroascite baixo, elevação variável dos leucócitos e uma amilase maior do
que 1.000 IU/L associada à amilasemia praticamente normal. As lipases também podem estar
aumentadas, mas este teste tem pouco valor prático devido às dificuldades técnicas. Nem os
outros exames bioquímicos nem a laparoscopia são muito úteis na ascite pancreática. A USG e
a TC só são úteis se evidenciarem um cisto pancreático ou um pâncreas aumentado de volume,
com ou sem calcificações. O tratamento desta condição consiste de nutrição parenteral total e
uso de octreotida, visando o fechamento da fístula pancreática.
ASCITE BILIARASCITE BILIAR
A ascite biliar, ou coleperitônio, é uma condição pouco frequente e resulta necessariamente da
lesão da vesícula ou de um de seus ductos. Tal processo pode ocorrer a partir da erosão da
árvore biliar por um cálculo ou então por traumatismo, cirurgia das vias biliares, biópsia
hepática e colangiografia trans-hepática percutânea.
O extravasamento de bile pode se fazer de forma aguda, caracterizando a peritonite biliar (com
dor), ou de forma lenta, oligossintomática, o que chamamos de "ascite biliosa". Pode haver
também peritonite bacteriana secundária, que passa a dominar o quadro clínico (das
complicações, esta é a mais frequente) — deve-se guardar a seguinte associação: ascite biliar =
peritonite infecciosa.
O líquido ascítico, como se deveria esperar, é caracteristicamente esverdeado, e a absorção da
bile do derrame peritoneal eventualmente determina icterícia. A dosagem de bilirrubina é
diagnóstica (os níveis de bilirrubina no líquido ascítico são maiores que 6 mg/dl), e os outros
testes bioquímicos são de pouco valor. A colangiografia endoscópica retrógrada e a
colangiografia trans-hepática só são utilizadas quando se pretende localizar a lesão para uma
cirurgia posterior.
ASCITE QUILOSAASCITE QUILOSA
A ascite quilosa (quiloperitônio) apresenta aspecto leitoso, possui triglicerídeos elevados (> 200
mg/dl e comumente acima de 1.000 mg/dl!) e é mais comumente associada à malignidade,
particularmente linfoma. Outras causas incluem tuberculose, injúria aos linfáticos do peritônio
por irradiação e ascite pancreática (que, às vezes, pode ser quilosa). No paciente com aids, o
sarcoma de Kaposi e a infecção pelo Mycobacterium avium-intracellulare são as principais
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causas.
O tratamento consiste na correção da desordem subjacente, emprego de triglicerídeos de cadeia
média na dieta (os quais, após absorção intestinal, são transferidos diretamente para o sangue
venoso porta, sem passar pela linfa) e repouso intestinal com NPT. A terapia diurética
geralmente é ineficaz, pois a hipertensão porta dificilmente se encontra presente.
ASCITE NEFROGÊNICAASCITE NEFROGÊNICA
Destaca-se a síndrome nefrótica , uma síndrome edemigênica na qual tanto a hipoalbuminemia
quanto a retenção hidrossalina renal contribuem para a anasarca. Ao contrário do que muitos
pensam, a ascite nefrótica tem um gradiente de albumina soroascite baixo (costuma
dominar o quadro na pericardite constritiva , na cardiomiopatia restritiva e na insuficiência
tricúspide grave. A ascite cardiogênica é classicamente transudativa, inclusive com gradiente de
albumina soroascite elevado, com proteína total também aumentada.
ABORDAGEM DIAGNÓSTICAABORDAGEM DIAGNÓSTICA
De agora em diante, toda vez que você se deparar com um paciente com um quadro ascite
(clínica) a esclarecer, antes de mais nada, faça para si mesmo a seguinte pergunta: será que é
hipertensão porta ou será que é alguma doença do peritônio? Confirme se a ascite não faz parte de
um quadro de anasarca; as outras possibilidades são mais remotas...
Mas como esclarecer objetivamente essa dúvida?
É simples: se for doença do peritônio, o líquido ascítico será exsudativo ; e se for hipertensão
porta, será transudativo — é só realizar a paracentese e uma análise bioquímica simples.
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O parâmetro principal e atualmente recomendado para diferenciação é o "Gradiente de
Albumina Soroascite (GASA)" . Veja, é um gradiente (subtração) e não uma relação (divisão).
É feito da seguinte forma: pegamos a concentração plasmática de albumina e subtraímos o
valor da sua concentração no líquido ascítico. Exemplo: albumina sérica: 4 g/dl; albumina na
ascite: 2 g/dl. Logo, gradiente = (4 - 2) = 2. É simples assim. Devemos só ter o cuidado de
colher o soro logo antes ou logo após a paracentese.
Se o valor do gradiente de albumina soroascite for inferior a 1,1 g/dl, o líquido ascítico é
classificado como exsudato, e um valor maior ou igual a 1,1 g/dl o classifica como transudato.
A ideia é: quanto maior a concentração de albumina na ascite, menor será o resultado da
subtração, ou seja, menor o gradiente. Tecnicamente, quanto mais proteína passar do plasma
para a ascite, menor o gradiente. Assim, os exsudatos são caracterizados por um gradiente
baixo. Como os transudatos se caracterizam por uma concentração pequena de proteínas
(albumina) na ascite, o valor da subtração será alto.
RESUMINDO...
Memorize para sempre!!!
Aqui há o video de apostila 14.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
●
Gradiente menor que 1,1 g/dl = exsudato = doença peritoneal .
●
Gradiente maior que 1,1 g/dl = transudato = hipertensão porta . 
De forma objetiva, se o gradiente de albumina soroascite for menor que 1,1 g/dl, devemos
direcionar a investigação diagnóstica da ascite para a existência de câncer ou tuberculose
peritoneal. Se o gradiente de albumina soroascite for maior ou igual a 1,1 g/dl, estamos diante
de uma das causas de hipertensão porta (com 85% de chance para o diagnóstico de cirrose
hepática).
Outro dado que pode ser útil é a dosagem da proteína total do líquido ascítico. Sabemos que o
gradiente soroascite de albumina reflete, em linhas gerais, a pressão hidrostática dos sinusoides
hepáticos (gradiente alto indica hipertensão porta). Por outro lado, os níveis de proteína total
no líquido ascítico são indicativos da integridade sinusoidal propriamente dita. Sinusoides
"capilarizados" (como ocorre na cirrose) são menos permeáveis às proteínas, e por isso o
líquido ascítico na cirrose hepática tipicamente possui baixos níveis de proteína total.
Devido à fibrose do espaço de Disse, apenas líquido e uma pequena quantidade de proteínas
de baixo peso molecular (albumina) passam para a cavidade peritoneal. No caso da síndrome
nefrótica, a origem de uma proteína baixa é ainda mais simples. Como há pouca proteína no
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plasma (houve perda urinária), haverá ainda menos proteína nos líquidos transudados.
Já em etiologias de ascite em que a barreira sinusoidal encontra-se íntegra e permeável (ex.:
ICC), os níveis de proteína total no líquido ascítico tendem a estar altos, mesmo que exista
hipertensão porta. Apesar de manter um GASA alto, proporcionalmente há mais proteínas de
peso molecular maior, o que justifica valores de proteína total entre 2,5–3,0 mg/dl.
Observe a seguir o fluxograma diagnóstico das ascites.
MANEJO DAS ASCITESMANEJO DAS ASCITES
Aqui há o video de apostila 15.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
O tratamento da ascite exsudativa, originada, portanto, por uma doença peritoneal, depende
exclusivamente do tratamento da doença de base, seja tuberculose, seja neoplasia. Tratada (se
_
Fluxograma . 2: Diagnóstico simplificado das ascites.
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exclusivamente do tratamento da doença de base, seja tuberculose, seja neoplasia. Tratada (se
possível) a doença de base, a ascite reverte. Todas as considerações terapêuticas a respeito deste
tema terão como foco a única forma de ascite que necessita de um manejo específico: as
originadas por hipertensão porta, em especial na cirrose hepática.
Existem diferentes formas de tratar a ascite. As questões relevantes à terapia dizem respeito, em
primeiro plano, à reversibilidade ou não da doença hepática subjacente (geralmente, não
existe...) e, em segundo, se existe ou não colaboração e aderência ao tratamento por parte do
paciente. A qualidade de vida e as expectativas quanto à sobrevida também influenciam o
tratamento.
TRATAMENTO DA DOENÇA HEPÁTICA DE BASETRATAMENTO DA DOENÇA HEPÁTICA DE BASE
Em determinadas doenças, existe uma pequena regressão histológica da lesão hepática que
favorece a terapia da ascite. Como exemplos, poderíamos citar o tratamento antiviral nas
hepatites crônicas B e C, a terapia da doença de Wilson e da hepatite autoimune e a cessação
do consumo de álcool na cirrose alcoólica.
REPOUSO, RESTRIÇÃO DE SAL E DE ÁGUAREPOUSO, RESTRIÇÃO DE SAL E DE ÁGUA
O repouso facilita a mobilização de fluidos no paciente com ascite, por melhorar o fluxo renal
(deslocado do fluxo muscular). A função renal e a resposta aos diuréticos pioram na posição
ortostática devido a um aumento dos hormônios retentores hidrossalinos. Uma restrição de
sódio é aconselhável (2 g de sódio ao dia = equivalente a 4 g de sal (NaCl) ou duas colheres de
chá rasas). A restrição salina é mandatória para se induzir um balanço negativo de sódio (sódio
urinário maior que sódio ingerido) e é a única maneira de se controlar a ascite na terapia
conservadora. Pacientes que excretam mais de 80 mEq/dia de Na na urina podem controlar a
ascite apenas com restrição de sal na dieta... Somente na presença de hiponatremia importante
(Nacuidado com a hipercalemia, pois este diurético é
poupador de potássio... A ginecomastia dolorosa é indicação de suspensão da droga; a
amilorida e o triantereno, através do fechamento dos canais de sódio sensíveis à aldosterona,
são alternativas nestes casos. A eplerenona, outro antagonista da aldosterona altamente
específico com menos efeitos colaterais, é uma droga já estudada nos pacientes com ICC,
porém ainda não avaliada nos pacientes cirróticos.
A furosemida deve ser acrescentada ao esquema terapêutico em indivíduos não responsivos às
doses iniciais de espironolactona. Nestes pacientes, geralmente, observamos uma maior
absorção de sódio nas porções proximais do néfron (geralmente alça de Henle), daí a utilidade
do diurético de alça, em combinação com a espironolactona. A dose varia de 40–160 mg/dia.
Geralmente se utiliza o esquema combinado de furosemida + espironolactona, mantendo-se a
relação espironolactona 100 mg/furosemida 40 mg, com aumento a cada 3–5 dias (ex.: 200
mg/80 mg, 300 mg/120 mg).
TERAPIA DA ASCITE REFRATÁRIATERAPIA DA ASCITE REFRATÁRIA
Consideramos uma ascite como refratária quando observamos intolerância ou resistência à
associação diurética com 160 mg de furosemida e 400 mg de espironolactona, ou quando se
apresenta ascite recorrente (pelo menos 3x/ano). Ela é observada em 10% dos pacientes
cirróticos ascíticos. Nestes casos, um período de observação de pelo menos 12 semanas é
recomendado antes de rotularmos o paciente como "não responsivo". A ascite refratária deve
ser diferenciada da má adesão terapêutica, especialmente à dieta de restrição salina. Neste caso,
é só dosar o sódio na urina de 24h. Se este estiver acima de 80 mEq/dia, e o paciente não estiver
perdendo peso, certamente se trata de má adesão! Mas por quê? Porque, na dieta restritiva de
sódio, o paciente ingere em torno de 88 mEq/dia, sendo que 10 mEq ele perde por via não
urinária (suor, fezes...). Logo, se a urina contém mais de 80 mEq/dia, deveria haver um balanço
negativo de sódio, com diminuição obrigatória do líquido ascítico... Na ascite refratária, o
sódio urinário é caracteristicamente inferior a 80 mEq/dia!
Até pouco tempo, havia indícios de que betabloqueadores poderiam ser deletérios para
pacientes com ascite refratária, o que acabou não se confirmando. Assim, não são
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pacientes com ascite refratária, o que acabou não se confirmando. Assim, não são
medicamentos contraindicados, mas se recomenda cautela na sua utilização.
PARACENTESE DE GRANDE VOLUMEPARACENTESE DE GRANDE VOLUME
A paracentese de grande volume, cerca de 5–15 litros, pode ser realizada de maneira eficaz e
segura, sendo apenas necessária uma infusão de coloides para a manutenção do volume
intravascular.
Além de ser uma opção terapêutica para a ascite refratária, a paracentese de grande volume
pode ser realizada como medida inicial na ascite tensa (seguida do uso do diurético + restrição
salina), visando uma estabilização mais rápida do quadro clínico e da resposta à terapia
conservadora.
Para a ascite verdadeiramente refratária, recomenda-se a retirada de 5–9 litros a cada duas
semanas. No intuito de evitar a instabilidade hemodinâmica e renal associada à paracentese, é
necessária a infusão de coloides em paracenteses superiores a cinco litros. Recomenda-se a
infusão de 6–8 g de albumina para cada litro retirado, quando a paracentese é superior a cinco
litros (ex.: se retirarmos seis litros de líquido ascítico, a dose de albumina a ser reposta é 6 x 6 =
36 g). Estudos recentes trouxeram resultados conflitantes na tentativa de provar a real eficácia
desta reposição. Mesmo assim, ela tem sido feita de rotina.
TIPS ( TIPS ( TRANSJUGULAR INTRAHEPATIC PORTOSYSTEMICTRANSJUGULAR INTRAHEPATIC PORTOSYSTEMIC
SHUNT SHUNT ))
Você já estudou o TIPS no tópico de hipertensão porta. Saiba que este dispositivo possui um
excelente efeito no tratamento da ascite refratária, com resultados superiores à paracentese de
repetição, porém sem melhora importante na sobrevida. O inconveniente do TIPS é a
encefalopatia hepática que se instala em 30% dos casos, mais comum em pacientes Child C,
além das complicações inerentes ao procedimento. Lembre-se de que o TIPS é uma derivação
portossistêmica não seletiva... Atualmente, indica-se o TIPS (se disponível) nos pacientes
cirróticos com ascite refratária Child A ou B e na ausência de história prévia de encefalopatia
hepática espontânea. É também uma ótima escolha nos pacientes Child C que estão
aguardando o transplante e tiveram hemorragia por varizes esofagogástricas apesar da terapia
endoscópica e do uso de betabloqueadores.
SHUNT SHUNT PERITÔNIO-VENOSO PERITÔNIO-VENOSO (SPV)(SPV)
É também chamado shunt de Le Veen . Neste procedimento, um cateter é utilizado para drenar
o líquido ascítico para a veia jugular interna direita. Ele possui trajeto no subcutâneo, sendo
visível a olho nu, como mostra a . Este procedimento foi praticamente substituídoFigura 13 _
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pelo TIPS, pela sua menor eficácia e pelo maior risco de complicações (coagulação
intravascular disseminada, infecção, oclusão do shunt , obstrução intestinal e sangramento
varicoso, este último pela expansão volêmica). A existência de lesões da mucosa
gastroduodenal não tratadas, a presença de um episódio prévio de peritonite bacteriana
espontânea e a doença renal crônica avançada constituem contraindicações.
_
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É recomendado, atualmente, para pacientes não candidatos ao transplante ou ao TIPS, com
abdome inadequado para paracenteses de repetição (ex.: múltiplas cicatrizes cirúrgicas).
CIRURGIA DE DERIVAÇÃO PORTOSSISTÊMICACIRURGIA DE DERIVAÇÃO PORTOSSISTÊMICA
As derivações portossistêmicas não seletivas ou parciais são eficazes no tratamento da ascite
refratária, embora possam causar encefalopatia hepática e piora da função hepática. Tem-se
dado preferência ao TIPS ou às paracenteses de repetição, pela mortalidade relativamente
elevada dessas cirurgias em pacientes com ascite refratária.
TRANSPLANTE HEPÁTICOTRANSPLANTE HEPÁTICO
É a terapia definitiva, indicada nos pacientes com reserva hepática mais comprometida. Este
tema é abordado em apêndice desta apostila.
PERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEAPERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEA
Aqui há o video de apostila 16.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
Embora qualquer paciente com ascite, independentemente de sua origem, esteja sob risco de
desenvolver uma complicação chamada Peritonite Bacteriana Primária ou Espontânea (PBE),
este risco é sabidamente muito mais alto naqueles com ascite associada à cirrose hepática.
Conceitualmente, a PBE é a infecção da ascite que surge na ausência de uma fonte contígua de
contaminação, tal como abscessos intra-abdominais ou perfuração de víscera oca. Em sua
fisiopatogênese, está envolvida a translocação bacteriana a partir do tubo digestivo e a
deficiência de opsoninas (proteínas do complemento) no líquido ascítico (comum em
cirróticos). Mas como ocorre a translocação? A bactéria migra do lúmen intestinal para os
linfonodos mesentéricos, ocorrendo então bacteremia, com posterior deposição do patógeno
no líquido ascítico; auxiliado pela defesa precária do organismo na ascite, inicia a replicação,
provocando uma PBE. A proteína total do líquido ascítico encontra-se caracteris​ticamente
baixa na PBE, inferior a 1 g/dl. Outros mecanismos que podem estar envolvidos na gênese da
PBE são um supercrescimento bacteriano intestinal, frequentemente encontrado em cirróticos e
u m a disfunção do sistema fagocítico reticuloendotelial, permitindo uma bacteremia mais
Fig. 13: Shunt peritônio-venoso — observar o cateter utilizado para drenar o líquido ascítico para o sistema
venoso.
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u m a disfunção do sistema fagocítico reticuloendotelial, permitindo uma bacteremia mais
prolongada. A síndrome nefrótica é uma outra causa de ascite relacionada à PBE...Caracteristicamente, a PBE é monobacteriana, sendo que a maioria dos casos de PBE (70%) é
causada por Gram-negativos entéricos, com destaque para a Escherichia coli seguida da
Klebsiella pneumoniae , que chegam ao peritônio a partir de disseminação linfo-hematogênica
após translocação bacteriana intestinal. Os Gram-positivos, como o Streptococcus pneumoniae
(pneumococo), também podem causar PBE, sendo geralmente provenientes de um foco à
distância.
QUADRO DE CONCEITOS VI
Atenção, não se confunda! A Escherichia coli é o principal patógeno da PBE na
cirrose hepática, enquanto o pneumococo é o agente mais comum da PBE na ascite
nefrótica.
A presença de infecção polimicrobiana (Gram-negativos entéricos, Enterococcus faecalis e
anaeróbios) e a ausência de resposta clínica à antibioticoterapia padrão devem levantar
suspeitas quanto à possibilidade de peritonite bacteriana secundária, devido a abscesso intra-
abdominal ou perfuração de víscera oca. Dos casos de peritonite bacteriana nos cirróticos com
ascite, 90% são PBE e 10% peritonite secundária...
Quando da sua descrição, a mortalidade da PBE era de aproximadamente 90%. Atualmente,
com o diagnóstico precoce e a facilidade de antibioticoterapia adequada, esta taxa foi reduzida
para cerca de 20%. Entretanto, a recorrência de PBE nos sobreviventes do primeiro episódio é
de 70% em um ano.
QUADRO CLÍNICOQUADRO CLÍNICO
Os sinais e sintomas mais comuns de apresentação da PBE são (percentual de ocorrência entre
parênteses): febre em torno de 38ºC (70%), dor abdominal difusa (60%), alteração do estado
mental por encefalopatia hepática (55%), dor à palpação abdominal (50%) e outros (diarreia,
íleo paralítico, hipotensão arterial). Pela presença da ascite, os sinais de peritonite são
praticamente inexistentes. Em até 1/3 dos casos, porém, o paciente está com ascite
assintomática, e o diagnóstico da PBE é feito apenas pelo exame do líquido ascítico.
DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO
Mas como deve ser feito o diagnóstico desta complicação? É simples e arbitrário: o diagnóstico
de PBE é definido pela contagem de polimorfonucleares (PMN) no líquido ascítico ≥ 250/mm³ ,
com cultura positiva monobacteriana. Como a cultura demora 48h para revelar o resultado, e
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com cultura positiva monobacteriana. Como a cultura demora 48h para revelar o resultado, e
o tratamento não pode esperar, o diagnóstico já pode ser considerado apenas pelo critério dos
leucócitos! Se o resultado da cultura for negativo, estamos diante de uma entidade chamada
ascite neutrofílica , que geralmente é tratada como PBE. 35% desses pacientes se tornaram
cultura positiva durante acompanhamento em estudos. Não se esqueça de um detalhe: se
houver hemácias na amostra, a cada 250 hemácias, deve-se subtrair um leucócito do total.
Para o diagnóstico de PBE, precisamos da presença de mais de 250 polimorfo ​‐
nucleares e não de mais de 250 leucócitos!!! Esta é uma armadilha frequente nas
provas de residência!!!
Uma variante da PBE, chamada bacterascite , é definida pela cultura positiva monobacteriana
na ausência do critério leucocitário. A bacterascite é uma fase muito precoce na patogênese da
PBE (representando a "chegada" da bactéria ao líquido ascítico) e, em 60% dos casos, resolve
espontaneamente, sem evoluir para a peritonite espontânea. A recomendação atual é que os
pacientes com bacterascite sintomáticos (febre, dor abdominal etc.) sejam tratados, enquanto os
assintomáticos devem ser apenas observados.
O diagnóstico diferencial mais importante da PBE é a Peritonite Bacteriana Secundária (PBS).
Mesmo na presença de uma peritonite fecal, por exemplo, a ascite oculta os sinais de irritação
peritoneal. Se não for feito o tratamento cirúrgico, praticamente 100% dos pacientes cirróticos
ascíticos com PBS irão falecer! Enquanto isso, uma cirurgia abdominal traz uma mortalidade
de até 80% na PBE... Conclusão: não podemos confundir essas duas entidades!!!
O diagnóstico diferencial é feito pela dosagem de proteína total , glicose e L DH do líquido
ascítico. Dois ou mais dos seguintes critérios indicam peritonite secundária e, portanto,
provável laparotomia:
●
Proteína total > 1,0 g/dl.
●
Glicose 5 ng/ml) e fosfatase alcalina (> 240 U/L) no líquido ascítico. A
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dosagem aumentada de CEA (> 5 ng/ml) e fosfatase alcalina (> 240 U/L) no líquido ascítico. A
não melhora clínica do paciente associada a uma piora na contagem dos polimorfonucleares
são as grandes dicas para a forma não perfurada.
A peritonite bacteriana secundária também é caracterizada por uma infecção polimicrobiana e
identificação de numerosas bactérias na bacterioscopia do líquido ascítico; o achado de
número muito elevado de polimorfonucleares (usualmente milhares) também sugere a origem
secundária da peritonite.
Os casos suspeitos de peritonite secundária devem ser submetidos a exames de imagens, como
tomografia computadorizada de abdome. Pneumoperitônio ou extravasamento do contraste
selam o diagnóstico, indicando pronta laparotomia.
PROGNÓSTICO E TRATAMENTOPROGNÓSTICO E TRATAMENTO
Deve-se ressaltar que a chave para o sucesso terapêutico é o diagnóstico precoce. Dessa forma,
todo paciente cirrótico admitido com ascite no hospital deve ser submetido a uma paracentese
diagnóstica, independentemente da presença de sintomas sugestivos de PBE, como febre e dor
abdominal. O mesmo procedimento deve ser adotado na vigência de encefalopatia hepática,
insuficiência renal ou deterioração súbita da função hepática em um paciente cirrótico,
considerando-se que a PBE é um dos fatores mais frequentemente associados à
descompensação clínica nesses doentes.
Fatores preditivos de boa evolução na PBE:
●
PBE adquirida na comunidade;
●
Ausência de encefalopatia;
●
Ureia 2 mg/dl) e síndrome hepatorrenal;
●
Albumina 8 mg/dl.
No tratamento da PBE, é fundamental que a antibioticoterapia seja iniciada anteriormente ao
resultado dos estudos microbiológicos do líquido ascítico. Se iniciado precocemente, reduz
sobremaneira a mortalidade!
A terapia de escolha é uma cefalosporina de terceira geração venosa: cefotaxima 2 g IV 12/12h.
A ceftriaxona é uma alternativa. A duração é de cinco dias , quando então o paciente é
reavaliado. Em pacientes com PBE adquirida na comunidade, sem encefalopatia e com função
renal normal, a ofloxacina oral é uma alternativa válida.
Se houver melhora sintomática dramática, a terapia está encerrada; se não, uma nova
paracentese deve ser realizada.
●
Se PMN 250/mm³, porém menor que a contagem da paracentese anterior: completar sete dias e
realizar nova paracentese;
●
Se PMN aumentar em relação à paracentese anterior: reavaliar possibilidade de peritonite
secundária.
Se existir qualquer suspeita de peritonite secundária (não confirmada na investigação na
admissão), a paracentese deve ser repetida mais precocemente, com 48 horas do tratamento. A
paracentese de acompanhamento (em 48 horas) não está indicada em todos os pacientes com
PBE, sendo reservada apenas para os casos de evolução inicial insatisfatória!
PROFILAXIA DA PBEPROFILAXIA DA PBE
Todos os pacientes que desenvolveram PBE devem receber profilaxia secundária com
norfloxacino 400 mg/dia ou sulfametoxazol + trimetoprima (800/160 mg/dia) por tempo
indeterminado. Vale lembrar que, quando estes pacientes desenvolvem novo episódio de PBE
duranteo uso de norfloxacino, a chance de que haja um germe Gram-positivo ou um Gram-
negativo resistente às quinolonas é muito maior.
A profilaxia primária aguda é indicada após qualquer hemorragia por varizes esofagogástricas
em um paciente cirrótico e não há necessidade de que se tenha confirmado a presença de ascite,
já que o esquema também reduz outras infecções, como as urinárias e respiratórias. Cabe
lembrar que a hemorragia digestiva facilita o processo de translocação de bactérias do trato
gastrointestinal, o que predispõe à ocorrência de PBE. A profilaxia é feita pela administração
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gastrointestinal, o que predispõe à ocorrência de PBE. A profilaxia é feita pela administração
de norfloxacino 400 mg 12/12h por sete dias ou ceftriaxona 1 g/dia, de preferência pela via IV,
pelo mesmo período.
Já a profilaxia primária crônica é geralmente utilizada em pacientes cirróticos com níveis de
proteína total no líquido ascítico ≤ 1,5 g/dl e pelo menos um dos seguintes achados: (1)
creatinina ≥ 1,2 mg/dl ou BUN ≥ 25 mg/dl (ureia ≥ 53,5 mg/dl) ou sódio ≤ 130 mg/dl; ou (2)
Child-Pugh ≥ 9 pontos e bilirrubina total ≥ 3 mg/dl. Em pacientes com cirrose, hospitalizados
por outras condições, e que tenham apenas uma proteína total no líquido ascítico ≤ 1 g/dl,
pode-se utilizar norfloxacino ou sulfametoxazol + trimetoprima nas mesmas doses, até a alta
do paciente.
Uma vez que a sobrevida média após o primeiro episódio de PBE é de cerca de nove meses,
esta infecção deve motivar a colocação do paciente em lista de espera para o transplante
hepático .
PROFILAXIA DA SÍNDROME HEPATORRENALPROFILAXIA DA SÍNDROME HEPATORRENAL
A expansão plasmática com albumina , usada como terapia adjuvante à antibioticoterapia, faz
parte do tratamento padrão da PBE, diminuindo a incidência de insuficiência renal (incluindo
de síndrome hepatorrenal) e melhorando substancialmente a sobrevida dos cirróticos com
PBE. A dose recomendada é de 1,5 g/kg no primeiro dia de tratamento e 1 g/kg no terceiro dia.
OUTRAS COMPLICAÇÕESOUTRAS COMPLICAÇÕES
ENCEFALOPATIA HEPÁTICAENCEFALOPATIA HEPÁTICA
O termo “encefalopatia hepática” se refere a uma síndrome neuropsiquiátrica potencialmente
reversível que pode surgir em pacientes portadores de hepatopatia crônica avançada ou mesmo
na insuficiência hepática aguda. A encefalopatia é causada pela passagem de substâncias
tóxicas (provenientes do intestino) para o cérebro, que, em uma pessoa normal,seriam
depuradas pelo fígado. A disfunção hepatocelular grave é um elemento primordial para o
desenvolvimento da síndrome, porém, na cirrose hepática avançada, outro fator também deve
ser considerado: a hipertensão porta, que desvia o sangue mesentérico para a circulação
sistêmica “bypassando” os sinusoides hepáticos. Por isso a sinonímia — encefalopatia
portossistêmica .
Uma das substâncias mais implicadas na gênese da encefalopatia hepática é a amônia (NH 3 )!
As principais fontes de amônia intestinal são: (1) enterócitos — metabolismo do aminoácido
glutamina; e (2) bactérias colônicas — catabolismo de proteínas alimentares e da ureia secretada
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no lúmen intestinal. É importante ressaltar que o fígado normal depura quase toda a amônia
presente no sistema porta. Os hepatócitos transformam esse composto de alta toxicidade no
aminoácido glutamina ou numa substância bem menos tóxica para o organismo — a ureia.
QUADRO DE CONCEITOS VII
Para compreender a patogênese da encefalopatia hepática, deve-se ter em mente o
seguinte conceito: uma das principais funções do fígado é a depuração de toxinas
provenientes da absorção intestinal. Estas substâncias são absorvidas pelos
enterócitos, ganham a circulação venosa mesentérica e em seguida a veia porta,
para então penetrar nos espaços-porta, atingindo os sinusoides hepáticos. Entre tais
substâncias, a mais importante é a amônia , derivada dos enterócitos e do
metabolismo das bactérias colônicas. Sua não depuração (tanto pela insuficiência
hepatocelular quanto pela hipertensão porta, que desvia o sangue do sistema porta
para a circulação sistêmica) causa a encefalopatia hepática.
PATOGÊNESEPATOGÊNESE
Existem inúmeros fatores supostamente incriminados na gênese da encefalopatia hepática. Em
primeiro lugar, a natureza “metabólica” da disfunção cerebral é revelada pela sua
reversibilidade (pelo menos parcial) e pela ausência de alterações neuropatológicas orgânicas
que, por si só, poderiam explicar a síndrome. Apesar desse conceito irrefutável, a encefalopatia
hepática crônica pode, de fato, produzir alterações orgânicas degenerativas no cérebro, as
quais provavelmente são consequências (e não causas) do processo patológico. A principal
alteração descrita consiste em mudanças morfológicas e funcionais dos astrócitos tipo II,
decorrentes de edema celular (astrocitose tipo II de Alzheimer) .
Surge, nesses casos, degeneração de células nervosas e de fibras axonais do cérebro, cerebelo e
medula espinhal, com áreas de cavitação microscópicas, conferindo uma aparência esponjosa.
Para esse tipo de alteração patológica, emprega-se o termo “degeneração hepatocerebral
adquirida”.
Muito bem... Voltemos aos mecanismos causais da encefalopatia hepática. Quais são as
substâncias incriminadas? Veja a .
Tab. 8
Substâncias Incriminadas na Encefalopatia Hepática
●
Amônia.
●
Mercaptanos.
Tabela 8
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Mercaptanos.
●
Manganês.
●
Oxindoles.
●
Ácidos graxos de cadeia curta.
●
“Falsos neurotransmissores” (octopamina, feniletanolamina).
●
Aminoácidos aromáticos (triptofano, fenilalanina, tirosina).
●
Benzodiazepinas endógenas.
A hiperamonemia é um achado quase universal na insuficiência hepática grave. A amônia é
uma importante neurotoxina e provavelmente o mais importante “vilão” da encefalopatia
hepática! Outras neurotoxinas, como os mercaptanos e os ácidos graxos de cadeia curta ,
potencializam o efeito neurotóxico da amônia. Vejamos alguns efeitos da amônia no
metabolismo cerebral: ( 1 ) aumenta a captação de aminoácidos aromáticos pela barreira
hematoencefálica; (2) aumenta a osmolaridade das células gliais (astrócitos), fazendo com que
estas células se tornem edemaciadas — edema cerebral do tipo celular; (3) inibe a atividade
elétrica neuronal pós-sináptica; e (4) estimula a produção de GABA, um importante depressor
da atividade cortical (ver adiante). Os aminoácidos aromáticos dão origem a
neurotransmissores inibitórios do tipo serotonina e aos falsos neurotransmissores (octopamina,
fenileta​nolamina), caracteristicamente aumentados na encefalopatia hepática.
Um ponto importante da patogênese da encefalopatia hepática é a hiperatividade do sistema
neurotransmissor GABAérgico. O GABA (ácido gama-aminobutírico) é um neurotransmissor
inibitório cujo receptor pós-sináptico pode ser estimulado pelos benzodiazepínicos e
barbitúricos. Neurotoxinas como a amônia aumentam indiretamente a atividade desse sistema,
através da estimulação da síntese de neuroesteroides, os mais poderosos moduladores do
GABA. Um fato curioso: foram identificadas benzodiazepinas endógenas que se acumulariam
em pacientes com encefalopatia hepática!!! Isso explica o porquê de alguns pacientes obterem
melhora dos sintomas com o flumazenil — um antagonista benzodiazepínico.
CLASSIFICAÇÃOCLASSIFICAÇÃO
A EH pode ser classificada de diferentes maneiras, de acordo com o aspecto observado:
1. Mecanismo de origem: 
●
Tipo A : EH associada à falência hepática aguda;
●
Tipo B : EH associada à falência hepática aguda;
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Tipo B : EH associada à falência hepática aguda;
●
Tipo C : EH associada à cirrose e à hipertensão porta.
2.
Evolução: 
●
Episódica : aguda, esporádica;
●
Recorrente : ocorre em intervalos de seis meses ou menos;
●
Persistente : crônica, continuamente sintomática, com períodos de exacerbação.
3.
Manifestações clínicas (classificação de West Haven):
Estaé a mais frequentemente citada nas provas e dividida em graus. Veja a .
Essencialmente ela pode ser diferenciada em mínima (subclínica) ou manifesta (graus I a IV).
Tab. 9: Critérios da encefalopatia hepática — critérios de West Haven.
Obs.: os graus II,III e IV são considerados como EH franca ou aberta.
ENCEFALOPATIA HEPÁTICA MÍNIMA (OU SUBCLÍNICA)ENCEFALOPATIA HEPÁTICA MÍNIMA (OU SUBCLÍNICA)
É definida pela presença de alterações neuropsiquiá- tricas só detectadas pelos testes
neuropsicométricos, pelo fato de serem sutis. Tais alterações geralmente não são percebidas
nem pelo paciente nem pelo médico, mas estão presentes em até 70% dos cirróticos! Exames
complementares como o eletroencefalograma podem reforçar o diagnóstico, mas, na prática,
em geral NÃO se recomenda a pesquisa deste tipo de encefalopatia em todos os cirróticos, pois
seus critérios diagnósticos não são bem estabelecidos, e o risco do tratamento pode ser superior
aos benefícios. A conduta perante o paciente com “encefalopatia mínima” deve ser
individualizada. Como a dificuldade para dirigir vem sendo considerada a principal
complicação associada a esse tipo de encefalopatia, pacientes e familiares devem ser orientados
quanto a este risco.
Tabela 9
_
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quanto a este risco.
ENCEFALOPATIA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA MANIFESTAHEPÁTICA MANIFESTA
Aqui está o que você está acostumado a ver nas enfermarias de clínica médica ou
gastroenterologia! O paciente é trazido ao hospital por familiares, com um quadro de
desorientação, agitação psicomotora, torpor ou mesmo estado de coma (“coma hepático”). A
boa notícia é que a grande maioria destes pacientes melhora do quadro neurológico com a
terapia voltada para a encefalopatia hepática e com o controle do fator precipitante (é
importante ter em mente que, em cerca de 80% dos casos de encefalopatia hepática aguda, se
possui um fator precipitante detectável). Eventualmente, nenhum fator precipitante é detectado
— para este caso, reservamos o termo “EH aguda esporádica espontânea”.
A encefalopatia hepática “manifesta” compreende várias anormalidades neurológicas e
psiquiátricas, tais como: distúrbios de comportamento (agressividade, agitação),
sonolência/letargia, inversão do ciclo sono-vigília (insônia noturna com sonolência diurna), fala
arrastada com bradipsiquismo, “hálito hepático” (ou fetor hepaticus ), asterixis (= flapping ),
incoordenação muscular e hipertonia, escrita irregular, reflexos tendinosos exacerbados ou
alentecidos, sinal de Babinski, crises convulsivas e postura de descerebração.
Um ponto importante é saber avaliar a presença de flapping . Deve-se solicitar ao
paciente que estenda o braço para frente e faça a dorsoflexão da mão (mão aberta
e com os dedos bem separados). A pessoa normal mantém a posição estável,
enquanto no paciente com encefalopatia a mão cai repetidamente, em movimentos
ritmados, devido a relaxamentos rápidos (perda do tônus) seguidos de retomada da
contração muscular. Se não for desencadeado espontaneamente, o médico pode
hiperestender o punho do paciente, causando o chamado “ flapping induzido”.
QUADRO DE CONCEITOS VIII
O asterixis (ou flapping ) não é patognomônico da encefalopatia hepática! Pode
ocorrer em outras condições importantes na prática médica, como a encefalopatia
urêmica, a carbonarcose da DPOC, a pré-eclâmpsia grave ou eclâmpsia e a
intoxicação pelo lítio.
E quais seriam os fatores precipitantes mais importantes da encefalopatia hepática? 
●
Hemorragia digestiva alta.
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●
Hipocalemia.
●
Alcalose metabólica ou respiratória.
●
Desidratação/hipovole ​mia.
●
Diuréticos tiazídicos ou de alça (furosemida).
●
Infecções (incluindo a peritonite bacteriana espontânea).
●
Uso de sedativos (benzodiazepínicos e barbitúricos).
●
Dieta hiperproteica.
●
Procedimentos cirúrgicos.
●
Constipação intestinal.
●
Hipóxia.
●
Shunts portossistêmicos: espontâneos (ex.: esplenorrenal) e cirúrgicos (incluindo o
TIPS — Transjugular Intrahepatic Portosystemic Shunt ).
O paciente cirrótico é propenso à hemorragia digestiva por vários motivos: (1) distúrbio da
hemostasia — plaquetopenia + coagulopatia; ( 2 ) presença das varizes esofagogástricas,
clássicas da hipertensão porta; e (3) aumento do risco de úlcera péptica. O sangue liberado no
tubo digestivo é digerido pelas bactérias colônicas. Do metabolismo da hemoglobina
(proteína), forma-se mais amônia. Esta amônia é prontamente absorvida pelos enterócitos,
desencadeando a EH.
A alcalose metabólica desencadeia encefalopatia hepática pelo seguinte mecanismo: o pH
plasmático mais alcalino converte a forma ionizada NH 4 + (amônio) na forma não ionizada
N H 3 (amônia). Esta última, por ser lipossolúvel, passa livremente pela barreira
SAIBA MAIS...
Mas por que os pacientes cirróticos apresen ​tam maior incidência de úlceras
pépticas?
A explicação é bem simples... A histamina produzida no organismo é depurada pelo
fígado. Com o desenvolvimento da insuficiência hepatocelular, há um aumento dos
níveis de histamina circulante. Relembrando o bloco de Gastro, a histamina
estimula diretamente as células parietais do estômago a produzirem ácido
clorídrico, justificando a propensão ao surgimento de doença ulcerosa péptica.
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N H 3 (amônia). Esta última, por ser lipossolúvel, passa livremente pela barreira
hematoencefálica, aumentando a impregnação cerebral da neurotoxina. A hipocalemia
aumenta a produção renal de NH 3 , por reduzir o pH intracelular das células tubulares
proximais (saem íons K + em troca da entrada de íons H + ). A maior produção de NH 3 e a
precipitação de uma alcalose fazem da hipocalemia um fator desencadeante de encefalopatia
hepática!
Perceba que os diuréticos de alça (furosemida) e os tiazídicos podem causar encefalopatia em
cirróticos (se usados indiscriminadamente), por provocarem hipocalemia, alcalose metabólica e,
eventualmente, desidratação.
As infecções são importantes fatores precipitantes de EH, por mecanismos pouco conhecidos.
O destaque é para a peritonite bacteriana espontânea . Todo paciente com ascite e
encefalopatia deve ter sua ascite investigada para infecção, mesmo na ausência de sinais
infecciosos! As infecções uriná- rias e respiratórias também são importantes, pela sua elevada
frequência.
A dieta hiperproteica pode desencadear EH por aumentar a produção de amônia pelas
bactérias colônicas que metabolizam a proteína alimentar. A constipação intestinal , ao
aumentar a proliferação dessas bactérias e o tempo de contato entre a amônia produzida com a
mucosa intestinal (aumentando sua absorção), também pode precipitar o evento mórbido.
DIAGNÓSTICODIAGNÓSTICO
O diagnóstico de encefalopatia hepática é eminentemente clínico, mas existem exames
complementares que podem corroborá-lo. A dosagem sérica de amônia, por exemplo, não é
recomendada de rotina; geralmente se encontra elevada na encefalopatia hepática, porém sua
especificidade é baixa (existem diversas patologias que podem elevar a amônia). E mais: seus
níveis séricos não têm boa correlação com o grau de encefalopatia!!! As alterações
eletroencefalográficas encontradas na EH (alentecimento global, ondas theta na fase pré-
comatosa e ondas delta nas fases avançadas) não são patognomônicas nem possuem valor
prognóstico, mas podem ser úteis na avaliação da resposta terapêutica. Um exame bastante
promissor é a ressonância nuclear magnética com espectroscopia, no qual se avalia o
metabolismo cerebral. Estudos ainda estão em andamento para definir sua função no manejo
da encefalopatia hepática. De uma forma geral, os exames auxiliares são empregados apenas
em estudos científicos, sendo o diagnóstico, na prática, fundamentado no reconhecimento
puramente clínico da síndrome.
QUADRO DE CONCEITOS IX
Sempre que um paciente cirrótico interna com encefalopatia hepática deve ser feita
medicina livre, venda proibida, twitter @livremedicinaSempre que um paciente cirrótico interna com encefalopatia hepática deve ser feita
a seguinte pergunta: qual foi o fator precipitante? A busca deve ser ativa, com a
anamnese (uso de medicamentos, libação alimentar, constipação...), investigação
de quadro infeccioso (com paracentese diagnóstica se ascite presente), exames
laboratoriais (com avaliação hidroeletrolítica) e observação do aspecto das fezes
(pesquisa de melena).
TRATAMENTOTRATAMENTO
O tratamento da encefalopatia hepática se baseia primariamente no controle dos fatores
precipitantes e na redução da produção e da absorção de amônia pelo cólon. Sabemos que a
amônia é produzida pelo metabolismo das bactérias colônicas, ao degradar os compostos
nitrogenados (ureia e proteínas) presentes no lúmen intestinal.
●
Restrição proteica: durante muito tempo a restrição proteica foi advogada como medida
essencial na abordagem terapêutica da EH aguda. Todavia, o impacto nutricional dessa medida
provavelmente acarreta mais riscos para o estado geral do paciente do que quaisquer benefícios
quanto ao controle do quadro neuropsiquiátrico! Desse modo, a restrição proteica na dieta não
está indicada de rotina no tratamento da EH aguda!!! Contudo, nos pacientes com encefalopatia
hepática aguda ou crônica refratária ao tratamento com lactulose e/ou antibióticos — ver a
seguir —, a manipulação dietética tem papel adjuvante: nestes casos recomenda-se substituir
fontes proteicas animais (ex.: carnes, ovos, leite) por fontes proteicas vegetais (ex.: soja). Vale
lembrar que pacientes com EH estágio III ou IV devem ficar em dieta zero pelo menos nas
primeiras 24–48h e tão logo comecem a se recuperar, a dieta deve ser reintroduzida.
●
Corrigir a constipação: como vimos, a constipação aumenta a proliferação bacteriana no cólon.
Para combatê-la, o laxante mais utilizado é a lactulose oral (ver adiante), mas, nos casos
refratários, recomenda-se que a lactulose seja feita sob a forma de clister (com lactulose a 20%).
Para fazer este clister, misturamos 300 ml de lactulose com 700 ml de água. A resposta costuma
ser muito boa.
●
Lactulose: a lactulose (ou betagalactosidofrutose) é considerada a “pedra mestra” na terapia da
encefalopatia hepática aguda esporádica, tendo uma eficácia oscilando entre 70–80% . A
lactulose tem uma grande vantagem sobre os outros açúcares dissacarídeos (como a sacarose, a
lactose e a frutose): ela não é “quebrada” pelas dissacaridases presentes nas microvilosidades dos
enterócitos do intestino delgado e, portanto, consegue atingir o cólon de forma intacta. Seu
principal mecanismo de ação vem do fato de ser metabolizada pelas bactérias colônicas em
ácidos graxos de cadeia curta (ácido láctico e ácido acético), reduzindo o pH do lúmen colônico
para em torno de 5,0. Com o pH mais ácido, o NH 3 (amônia) é convertido em NH 4 +
(amônio), este último inabsorvível pela mucosa intestinal. O resultado é a menor absorção de
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amônia e a melhora do quadro da EH. A lactulose também age pelo seu efeito catártico
(laxante). Uma opção à lactulose é o lactitol, com efeitos semelhantes, porém com sabor mais
palatável. Veja os principais efeitos da lactulose na .
Tab. 10
Mecanismo de Ação da Lactulose 
●
Reduz o pH do lúmen colônico, transformando NH 3 em NH 4 +, forma não
absorvível da amônia.
●
Aumenta a flora de Lactobacillus , bactérias que não produzem NH 3 em seu
metabolismo, substituindo as bactérias produtoras de NH 3 .
●
Efeito catártico — ao elevar a osmolaridade do cólon, aumenta a eliminação de água
nas fezes.
●
Aumenta a incorporação de amônia em algumas bactérias.
A dose da lactulose deve ser 20–30 g (30–45 ml da solução disponível no mercado) de duas a
quatro vezes por dia. A “meta” é fazer com que o paciente tenha de 2–3 evacuações pastosas
por dia .
●
Antibióticos: certos antibióticos orais podem ser administrados com o intuito de reduzir a flora
bacteriana colônica produtora de amônia. O mais tradicional é a neomicina , na dose 2–8 g/dia
VO, em quatro tomadas (6/6h). Ou seja, uma dose inicial de 500 mg VO 6/6h e máxima de 2 g
VO 6/6h. Mesmo sendo pouco absorvido (menos de 4% da dose), este aminoglicosídeo pode ser
ototóxico e nefrotóxico, principalmente quando tomado por longo tempo. Outro antibiótico
clássico é o metronidazol , na dose 250 mg VO 8/8h, porém apresenta um grande limitante ao seu
uso crônico: o desenvolvimento de neuropatia periférica. A rifaximina 550 mg VO 12/12h
recentemente ganhou espaço no tratamento da EH, após alguns estudos terem sugerido que ela é
tão ou mais eficaz que os antimicrobianos anteriormente citados, com a vantagem de não
apresentar efeitos colaterais significativos. Existem evidências de que seu uso crônico pode
reduzir a recorrência de EH, além de aumentar a eficácia do tratamento agudo quando
ministrada em conjunto com a lactulose. Seja como for, os antibióticos costumam ser reservados
para os pacientes intolerantes ou refratários à lactulose. Nestes últimos, vale dizer, o antibiótico
NÃO deve substituir a lactulose: tais pacientes utilizam lactulose + antibiótico para o controle da
EH.
Tabela 10
SAIBA MAIS...
Síndrome de abstinência alcoólica + encefalopatia hepática.
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●
Outros tratamentos: a L-Ornitina-L-Aspartato (LOLA) aumenta a depuração hepática e, em
menor grau, muscular da amônia! Estudos mostraram benefícios em relação ao placebo, porém
o LOLA ainda não foi comparado ao tratamento padrão (lactulose), e faltam estudos em
pacientes graves. A administração oral de PROBIÓTICOS, como o extrato de bactérias
sacarolíticas não produtoras de urease, pode modificar a flora colônica do paciente para uma
flora menos produtora de amônia. Alguns pacientes também melhoram com a suplementação de
ZINCO. O FLUMAZENIL (antagonista dos benzodiazepínicos) pode ser tentado na
encefalopatia grave para evitar intubação orotraqueal, mas a resposta é imprevisível. O
BENZOATO DE SÓDIO apareceu como droga promissora em um estudo indiano, agindo
através do aumento da excreção renal de nitrogênio com efetividade semelhante à lactulose, mas
seu uso ainda não foi corroborado por estudos norte-americanos e europeus.
Aqui há o video de apostila 17.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
SÍNDROME HEPATORRENALSÍNDROME HEPATORRENAL
Aqui há o video de apostila 18.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
A Síndrome Hepatorrenal (SHR) é uma forma de insuficiência renal funcional (isto é, não
acompanhada de alterações histopatológicas renais), que ocorre geralmente em indivíduos com
hepatopatia crônica avançada, insuficiência hepática grave e hipertensão porta. É caracterizada
pela perda progressiva da função renal, secundária à vasoconstrição renal (com consequente
Portadores de cirrose alcoólica que ainda bebem podem se apresentar com quadros
de alteração do estado mental que têm componentes tanto de encefalopatia
hepática quanto de abstinência alcoólica. O tratamento da abstinência alcoólica
envolve o uso de benzodiazepínicos , porém sabemos que esta classe de drogas
deve ser evitada no contexto da encefalopatia hepática (já que os
benzodiazepínicos podem desencadear ou agravar esta última). Como proceder
então??? Veja: os benzodiazepínicos são excelentes sedativos e até podem ser
usados em quadros de agitação psicomotora (APM) mesmo em portadores de
encefalopatia hepática “pura”, quando se julga que o paciente põe em risco sua
integridade física e a de terceiros, e principalmente quando ele não responde ao
tratamento farmacológico padrão da APM, que consiste no uso de antipsicóticos
(ex.: haloperidol ) em baixas doses. Logo, perante a suspeita das duas síndromes
combinadas, principalmente se houver APM importante e refratariedade ao
antipsicótico, com risco à integridade física, podemos e devemos lançar mão dos
benzodiazepínicos! O detalhe está na escolha da droga específica : em cirróticos, o
benzodiazepínico de escolha é o lorazepam , que, de todos os fármacos destade protrombina
 1,30 O U plaquetas 3,5 = 1 ponto; 2,8–3,5 = 2 pontos; 3,5 = 1 ponto; 2,8–3,5 = 2 pontos;classe, é o que apresenta maior eliminação RENAL.
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pela perda progressiva da função renal, secundária à vasoconstrição renal (com consequente
diminuição da Taxa de Filtração Glomerular — TFG) e vasodilatação extrarrenal
(principalmente no leito mesentérico), havendo queda da resistência vascular periférica e,
eventualmente, hipotensão arterial. Contudo, veja um conceito: nos últimos anos, novos dados
apareceram sobre a SHR, sobretudo em relação a sua patogênese! Atualmente, ela tem sido
cada vez mais reconhecida não apenas como um distúrbio “funcional”, mas que também conta
com a participação de inflamação sistêmica, estresse oxidativo e dano tubular por sais biliares.
Ou seja, a SHR teria um componente estrutural adicional.
PATOGÊNESEPATOGÊNESE
A vasodilatação esplâncnica parece ser um evento precoce na gênese da SHR. Essa
vasodilatação leva a uma diminuição do volume circulante efetivo, com ativação dos sistemas
renina-angiotensina-aldosterona e noradrenérgico (simpático), cuja ação, por sua vez, ocorrerá
predominantemente nos rins, levando à vasoconstrição renal. Estudos mostram que a causa da
vasodilatação esplâncnica é a translocação bacteriana intestinal . Germes Gram-negativos do
lúmen intestinal atravessam a mucosa lesada (cuja predisposição é maior no cirrótico),
alcançando linfonodos mesentéricos e induzindo a secreção de citocinas como IL-6 e TNF-alfa
por macrófagos locais. Tais citocinas estimulam o endotélio dos vasos mesentéricos a produzir
quantidades absurdas de óxido nítrico, levando à vasodilatação nesta região. Assim, a SHR
reflete um desequilíbrio entre os fatores vasodilatadores e vasoconstritores, resultando no
aumento significativo da resistência vascular renal, na diminuição da TFG e numa ávida
retenção de sódio e água (o sódio urinário desses pacientes geralmente é 1,5
mg/dl e/ ou o clearance de creatinina é 1,5 mg/dl ou aumento > 0,3 mg/dl em 48h ou > 50% do valor
basal em até sete dias*.
●
Ausência de melhora da creatinina sérica após dois dias de retirada de diuréticos e
expansão volêmica com albumina (1 g/kg/dia).
●
Ausência de choque.
●
Ausência de uso recente ou atual de drogas nefrotóxicas.
●
Ausência de doença parenquimatosa renal, definida por: (1) proteinúria > 500 mg/dia;
(2) hematúria > 50 células por campo de grande aumento; e (3) USG renal anormal.
A USG com Doppler, ao avaliar a resistência arterial renal, fornece também informações
importantes para compreendermos o que de fato acontece na SHR. Valores aumentados são
encontrados em pacientes cirróticos sem ascite ou uremia, mas valores ainda maiores são
evidenciados nos ascíticos com SHR. Tal achado, inclusive, indica um pior prognóstico.
TRATAMENTOTRATAMENTO
O tratamento conservador compreende medidas gerais, tais como: repouso, manutenção do
estado euvolêmico e retirada de agentes nefrotóxicos (principalmente aminoglicosídeos e anti-
inflamatórios). Paracenteses de alívio (de pequeno volume) podem ser necessárias para
amenizar o desconforto da ascite.
O tratamento farmacológico está baseado na combinação de drogas com ação vasoconstritora
esplâncnica + infusão de albumina (1 g/kg no primeiro dia seguido de 20–40 g/dia). O
vasoconstritor de escolha é a terlipressina , com taxas de resposta completa (creatinina sérica
abaixo de 1,5) de aproximadamente 60%. Alternativas possíveis são: (1) noradrenalina; e (2) a
combinação de midodrina (um agonista �-1-adrenérgico seletivo) com octreotida (um análogo
da somatostatina). A resposta inicial à terapia deve ser observada em três dias, podendo se
manter o esquema por 14 dias ou até a resolução completa do quadro. A sobrevida em longo
prazo infelizmente não é alterada com essas medidas, visto que o paciente mantém-se portador
de uma insuficiência hepática grave.
O TIPS, que veremos com mais detalhes adiante, é uma alternativa nos pacientes que não
obtiveram boa resposta com o tratamento farmacológico (principalmente na SHR tipo II),
porém seu uso é limitado devido ao risco de encefalopatia e da exclusão para o procedimento
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porém seu uso é limitado devido ao risco de encefalopatia e da exclusão para o procedimento
dos pacientes com história de encefalopatia severa, bilirrubina > 5 mg/dl, Child-Pugh > 11 e
disfunção cardíaca ou pulmonar importante. A terapia de substituição renal não aumenta a
sobrevida, mas pode ser usada como ponte para o transplante hepático.
O transplante hepático é considerado o tratamento de escolha da SHR, sendo o único
tratamento que efetivamente aumenta a sobrevida. Em indivíduos com SHR, a taxa de
sobrevida em três anos é de cerca de 60%, uma taxa discretamente menor quando comparada
aos pacientes sem SHR (70–80%). A reversão da SHR com o tratamento farmacológico antes
do transplante parece melhorar a sobrevida deste último.
O desenvolvimento da SHR pode ser prevenido em dois contextos clínicos: (1) n a peritonite
bacteriana espontânea, através da infusão de albumina (1,5 g/kg de peso no primeiro dia,
depois 1 g/kg de peso no terceiro dia) — ver tópico de ascite — e (2) n a hepatite alcoólica
aguda, através do uso da pentoxifilina, um inibidor do TNF-α .
SÍNDROME HEPATOPULMONAR E HIPERTENSÃOSÍNDROME HEPATOPULMONAR E HIPERTENSÃO
PORTOPULMONARPORTOPULMONAR
SÍNDROME HEPATOPULMONARSÍNDROME HEPATOPULMONAR
Aqui há o video de apostila 19.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
Os distúrbios da troca gasosa secundários à cirrose hepáticaincluem um amplo espectro de
alterações, desde aquelas que são só detectadas em investigação laboratorial, em pacientes
totalmente assintomáticos, até hipoxemia arterial grave, incapacitante, em pacientes cianóticos
(com baqueteamento digital) e dependentes de oxigênio.
O termo Síndrome Hepatopulmonar (SHP) se refere a uma tríade clínica composta por:
1.
Doença hepática crônica;
2.
Hipoxemia: com gradiente alvéolo arterial aumentado (indicando a presença de shunt
arteriovenoso) e;
3.
Evidências de alterações vasculares intrapulmonares, referidas como "dilatações vasculares
intrapulmonares (DVIP) ".
A disfunção respiratória depende basicamente da presença das DVIP, que funcionam como
shunt arteriovenoso pulmonar. O sangue dessaturado “bypassa” alguns alvéolos ao prosseguir
pelos vasos dilatados, misturando-se ao restante do sangue que sai dos pulmões. A mistura do
sangue dessaturado (vindo das DVIP) com o sangue do restante do parênquima determina
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sangue dessaturado (vindo das DVIP) com o sangue do restante do parênquima determina
hipoxemia. Vamos falar em números para que você entenda melhor. Os capilares pulmonares
normais têm geralmente um diâmetro de 8–15 µm, sendo as hemácias levemente menores que 8
µm, havendo a passagem de uma ou poucas células por vez, para que haja tempo adequado
para troca gasosa. Na SHP, os capilares podem ficar absurdamente dilatados! Onde passava
uma hemácia, agora passam dezenas. Obviamente, muitas passam sem ser oxigenadas,
explicando o shunt direita-esquerda. Observe a .
Esse shunt não é considerado verdadeiro (como na SARA), pois responde à suplementação de
oxigênio inalatório. O oxigênio em grande quantidade consegue se difundir dos alvéolos
adjacentes para o interior das DVIP.
A fisiopatogênese da SHP não é conhecida, mas a principal hipótese é o aumento na circulação
pulmonar de vasodilatadores endógenos (ex.: NO), resultante do deficit d e detoxificação
hepática (por insuficiência hepatocelular e por formação de anastomoses portossistêmicas).
Uma vez que a SHP tem sido descrita em doenças que cursam com hipertensão porta e função
hepática preservada, deduz-se que a pressão portal elevada constitui uma condição suficiente
para o seu desenvolvimento.
A SHP pode ocorrer em 5–10% dos pacientes com cirrose hepática independentemente da
etiologia, mas também pode se desenvolver em doenças não cirróticas tais como
esquistossomose, fibrose hepática congênita e hipertensão porta não cirrótica. Além disso, a
Figura 14 _
_
Fig. 14: Vasodilatação do capilar pulmonar na síndrome hepatopulmonar. 
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esquistossomose, fibrose hepática congênita e hipertensão porta não cirrótica. Além disso, a
síndrome já foi descrita após derivação porto-cava e derivação esplenorrenal assim como na
vigência de hepatite fulminante e na rejeição pós-transplante hepático.
Clinicamente, a SHP pode se manifestar através de dispneia, cianose de lábios e extremidades,
baqueteamento digital, aranhas vasculares e platipneia (dispneia que piora com a posição
sentada ou em pé). A platipneia é um achado clássico!!! É acompanhada da ortodeoxi a:
hipoxemia desencadeada ou agravada pela posição ortostática, outro achado clássico! Pode ser
explicada pela localização preferencial das DVIP nas bases pulmonares.
Platipneia + cirrose hepática + ortodeoxia = síndrome hepatopulmonar 
Em cerca de 80% dos pacientes adultos com SHP, os sintomas da hepatopatia antecedem à
queixa pulmonar. A história natural da SHP não é bem conhecida. A deterioração da
oxigenação arterial pode surgir a despeito de uma função hepática estável. A síndrome se
associa a uma mortalidade de pelo menos 40% em um período aproximado de 2,5 anos, sendo
que a causa de morte nem sempre está associada à hipoxemia. A melhora ou reversão
espontânea da SHP constitui um evento raro.
A coexistência de anormalidades pulmonares, tais como derrame pleural ou obstrução ao fluxo
expiratório, comuns em pacientes com doenças hepáticas, não exclui o diagnóstico de SHP.
AVALIAÇÃO CLÍNICA E DIAGNÓSTICOAVALIAÇÃO CLÍNICA E DIAGNÓSTICO
A gasometria arterial permite avaliar a presença ou não de hipoxemia, hipocapnia, alcalose
respiratória e ortodeoxia (redução da PaO 2 na posição ortostática). É importante lembrar que
a saturação de O 2 pode estar falsamente diminuída nos pacientes com hiperbilirrubinemia. A
hipoxemia arterial pode ser definida como PaO 2 em ar ambiente e em posição supinafígado, as artérias pulmonares
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acúmulo de substâncias endotélio-tóxicas não depuradas pelo fígado, as artérias pulmonares
periféricas sofrem remodelamento , com vasoconstrição, hiperplasia da média, espessamento da
íntima e formação de trombos in situ . Existe a hipótese (não comprovada) de que pequenas
embolias pulmonares de repetição, com pequenos trombos provenientes do sistema porta
submetido à estase, possam contribuir para a hipertensão arterial pulmonar destes pacientes.
QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICOQUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO
O quadro clínico é marcado por dispneia progressiva aos esforços e sinais de sobrecarga de VD
no exame clínico, além de hiperfonese do componente P2 da segunda bulha. Pode haver
síncope e dor torácica.
A radiografia de tórax pode mostrar um abaulamento do segundo arco da silhueta cardíaca
esquerda (correspondente ao tronco da artéria pulmonar) e um aumento da área cardíaca à
custa de VD. O diagnóstico começa pelo ecocardiograma , para mostrar a sobrecarga do VD e
estimar a pressão sistólica da artéria pulmonar (PAPsist); depois passa pela
cintilografia pulmonar V / Q (para afastar tromboembolismo pulmonar recorrente) e é
confirmado pelo cateterismo cardíaco direito , com mensuração direta da pressão sistólica da
artéria pulmonar (PAPsist), que deve estar superior a 25 mmHg. Um teste com vasodilatadores
locais é feito, para ver se há reversão, pelo menos parcial, da PAPm (pressão média da artéria
pulmonar) e/ ou da resistência vascular pulmonar. A resposta terapêutica é proporcional ao
resultado desse teste.
TRATAMENTOTRATAMENTO
O tratamento da hipertensão portopulmonar é semelhante ao da hipertensão arterial pulmonar
primária. Na ausência de contraindicações, pode-se instituir anticoagulação crônica com
warfarin , objetivando manter o INR em torno de 1,5 , isto é, faz-se uma anticoagulação de
"baixa intensidade", devido ao risco aumentado de hemorragia em hepatopatas crônicos. O
anticoagulante visa reverter e prevenir a formação dos trombos in situ ou dos microêmbolos.
Deve-se associar também um vasodilatador arterial pulmonar, sendo a primeira escolha na
atualidade o epoprostenol (prostaciclina), ministrado em infusão contínua por uma bomba
implantada no subcutâneo. Dado o limitado benefício e o alto custo da terapia conservadora,
bem como a curta sobrevida desses doentes, pode-se indicar o transplante hepático em casos
selecionados. Para tanto, é preciso que a PAPsist atinja níveis inferiores a 35 mmHg — acima
deste valor, a mortalidade do transplante torna-se proibitiva...
Aqui há o video de apostila 20.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
Dúvidas Acadêmicas do CapítuloTESTE SEU CONHECIMENTOConfira as dúvidas acadêmicas do capítulo clicando aqui
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APÊNDICEAPÊNDICE
HEPATOPATIA MEDICAMENTOSAHEPATOPATIA MEDICAMENTOSA
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
O objetivo primordial deste capítulo é que o aluno tenha conhecimento das principais drogas
capazes de causar lesão hepática, sabendo algumas particularidades de cada uma, como o tipo
de lesão instalada.
Por exemplo, o paracetamol em altas doses pode provocar necrose de hepatócitos na região
centrolobular, eventualmente levando à insuficiência hepática fulminante; já os
anticoncepcionais podem ser associados à colestase intra-hepática, por alterarem os mecanismos
de secreção dos sais biliares na membrana dos canalículos biliares.
A definição de "hepatopatia medicamentosa" é bastante abrangente: qualquer grau de alteração
hepática que tenha relação com o uso de alguma droga deve ser inserido neste conceito! Assim,
podemos afirmar que o número de drogas e toxinas que podem levar à injúria hepática é muito
grande.
Em termos epidemiológicos, a real incidência de hepatopatia farmacoinduzida não pode ser
determinada, pois, na maioria das vezes, essas alterações são assintomáticas e passam
despercebidas (acredita-se que menos de 10% dos casos sejam detectados). Lesões mais
significativas, por outro lado, recentemente tiveram sua incidência estimada em países como a
Inglaterra: estima-se que ocorram cerca de 22 casos de hepatopatia medicamentosa para cada 1
milhão de pacientes-ano naquele país. Mas atenção: não podemos generalizar esta última cifra!
Em países em desenvolvimento (como o Brasil), acredita-se que o número de casos de
hepatopatia farmacoinduzida seja ainda menor, e se relacione a um número mais restrito de
drogas.
Os agentes químicos industriais, os alcaloides vegetais, as microtoxinas de ocorrência natural e
as drogas utilizadas no tratamento das diversas doenças (tanto em doses farmacológicas
quanto na overdose ) são os principais agentes implicados. Os hepatócitos (lesão hepatocelular),
o fluxo biliar (lesão colestática) e as estruturas vasculares podem ser comprometidos em
combinações variadas.
Os mecanismos que levam à lesão envolvem efeito direto do agente ou reação "idiossincrásica"
(própria) do indivíduo. Esta última resposta pode ser desencadeada por reação imunológica
"contra" o fígado, induzida pela formação de neoantígenos compostos por moléculas do
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"contra" o fígado, induzida pela formação de neoantígenos compostos por moléculas do
parênquima hepático combinadas à droga em questão ou seus metabólitos, ou por diferenças
individuais na metabolização do agente (componente genético), fenômeno que induz a
formação de metabólitos tóxicos. Por motivos desconhecidos, as hepatopatias medicamentosas
são mais frequentes no sexo feminino.
A apresentação clinicolaboratorial pode variar desde anormalidades assintomáticas nas provas
de função hepática até a necrose hepática maciça e fatal. A hepatite viral e a obstrução biliar
podem ser simuladas pelas reações medicamentosas hepatotóxicas, e a exposição a
determinados agentes também pode resultar em hepatite crônica, cirrose e tumores hepáticos.
QUADRO DE CONCEITOS I
O que é "hepatopatia medicamentosa"?
Por hepatopatia medicamentosa entendemos QUALQUER alteração hepática
relacionada ao uso de uma droga (ex.: aumento de aminotransferases ou enzimas
biliares), tenha esta alteração um caráter assintomático ou mesmo se expresse na
forma de uma insuficiência hepática fulminante, subfulminante ou crônica. As
hepatopatias medicamentosas podem ser decorrentes de toxicidade direta (dose-
dependente e previsível) ou então serem mediadas pelo fenômeno de idiossincrasia,
isto é, dose-independentes, imprevisíveis e, em geral, geneticamente determinadas.
Tab. 1: Classificação da hepatopatia farmacoinduzida.
Categoria
Exemplos
Necrose zonal .
Acetaminofeno, tetracloreto de carbono,
sinvastatina.
Hepatite inespecífica .
AAS, oxacilina.
Semelhante à hepatite viral .
Halotano, isoniazida, fenitoína, diclofenaco.
Semelhante à hepatite autoimune (FAN,
antimúsculo liso) .
Metildopa, nitrofurantoína, diclofenaco,
fenofibrato, fenitoína, propiltiouracil,
levostatina.
Colestase não inflamatória .
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Colestase não inflamatória .
Estrogênios, esteroides 17-alfa-
substituídos.
Lesão inflamatória dos pequenos ductos
(síndorme do evanescimento dos ductos
biliares) .
Amoxicilina + clavulanato, piroxicam,
tiabendazol, haloperidol.
Lesão dos grandes ductos (colangite
esclerosante) .
Fluorodesoxiuidina.
Esteatose hepática :
●
Grandes gotículas;
●
Pequenas gotículas.
Etanol, corticosteroides.
Tetraciclina, ácido valproico, didanosina,
amiodarona.
Fosfolipídios e esteato-hepatite .
Amiodarona, maleato de perexilina.
Granulomas .
Fenilbutazona, alopurinol, carbamazepina,
diltiazem, hidralazina, fenitoína,
rosiglitazona, sulfonamidas, penicilamina.
Fibrose .
Metotrexato, hipervitaminose A, etanol,
metildopa.
Tumores :
●
Adenoma;
●
Angiocarcinoma.
Estrogênios.
Cloreto de vinila.
Trombose de veia hepática .
Agente antineoplásicos (ex.: bussulfano),
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azatioprina.Doença veno-oclusiva .
Esteroides anabolizantes, estrogênio,
cloreto de vinila.
Peliose hepática .
Alopurinol, fluorodesoxiuridina.
Hiperplasia regenerativa nodular .
Azatioprina, agentes antineoplásicos.
PRINCÍPIOS DE DIAGNÓSTICO E MANUSEIOPRINCÍPIOS DE DIAGNÓSTICO E MANUSEIO
O s medicamentos podem produzir anormalidades semelhantes às observadas em outros
distúrbios comuns, como hepatite viral ou doença biliar, e alguns podem provocar lesões
mistas. Contudo, em 90% das vezes, o padrão é hepatocelular, com aumento predominante de
ALT/AST em relação aos demais marcadores hepáticos. Desse modo, o fator decisivo para o
diagnóstico é o alto grau de suspeição por parte do médico, o que está baseado no
estabelecimento de uma "linha do tempo" entre a introdução do (s) fármaco (s) e o surgimento
de lesão hepática: em geral, a maioria das drogas inicia sua hepatotoxicidade entre 5 – 90 dias .
Isso torna a história clínica detalhada a peça fundamental para o diagnóstico, e as informações
sobre qualquer exposição anterior a um agente suspeito podem ser de grande valia (toxicidade
mais tardia). Como numerosas substâncias químicas industriais são hepatotóxicas, também é
imprescindível obter detalhes relativos à profissão e ao ambiente de trabalho do paciente. O
exame físico costuma oferecer pouca ajuda, exceto nos casos onde se detecta um rash cutâneo
(que corrobora, por exemplo, a hipótese de toxicidade da fenitoína — ver adiante).
Evidentemente, outras etiologias devem ser descartadas através de uma rotina geral de
investigação das hepatopatias (ex.: sorologias virais). A negatividade desses exames, associada à
resolução das alterações hepáticas em semanas a meses após a suspensão do fármaco, é o
principal meio de diagnóstico das hepatopatias medicamentosas!
Vale ressaltar que a biópsia hepática costuma ser de pouca valia neste processo. Em geral,
encontramos alterações histopatológicas indistinguíveis de uma hepatite viral! Entretanto, casos
em que múltiplas possibilidades etiológicas são aventadas poderiam ser resolvidos pelo
encontro de certos achados (incomuns) bastante sugestivos de hepatopatia farmacoinduzida:
infiltração eosinofílica hepática ou formação de granulomas no parênquima.
Em vista da típica dificuldade diagnóstica, um conceito prático muito importante deve ser
enfatizado: à menor suspeita de hepatotoxicidade após a introdução de um novo medicamento
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enfatizado: à menor suspeita de hepatotoxicidade após a introdução de um novo medicamento
(ex.: aumento de ALT > 3x o LSN), este medicamento deve ser imediatamente suspenso!!! Não
s e deve aguardar resultados de exames laboratoriais para confirmar ou descartar outras
hipóteses. A suspensão precoce da droga tem o potencial de evitar a evolução para insuficiência
hepática na grande maioria das vezes!
Em alguns casos, quando apenas um agente é envolvido e se encontra um tipo histológico
característico de lesão, o diagnóstico com base em achados laboratoriais e de biópsia é
relativamente simples. São exemplos a esteatose hepática microvesicular causada pela
tetraciclina , ou a necrose centrolobular provocada pelo acetaminofeno (paracetamol). O
diagnóstico se torna mais complexo quando vários fármacos estão sendo utilizados ao mesmo
tempo, e qualquer um deles pode ser responsável por uma lesão hepática inespecífica ou
semelhante à hepatite viral. Eventualmente, até mesmo os distúrbios subjacentes para os quais
os medicamentos foram prescritos também podem causar lesão hepática (EHNA, no portador
de diabetes mellitus ).
A hepatopatia farmacoinduzida costuma ser controlada pela interrupção do (s) fármaco (s)
implicado (s) e, muito raramente, o curso clínico pode ser progressivo a despeito da suspensão
do agente envolvido. Com exceção da toxicidade pelo paracetamol — em que um antídoto
específico é comprovadamente benéfico (N-acetilcisteína) — e da toxicidade pela tetraciclina —
onde a L-carnitina se mostrou benéfica. Nos demais casos, oferecemos essencialmente
tratamento de suporte e o Transplante Ortotópico de Fígado (TOF), quando indicado. E, diga-
se de passagem, em mais de 50% dos casos de falência hepática associada à idiossincrasia, o
transplante será necessário (pois, nesta situação, a mortalidade sem transplante gira em torno
de 80%). Os glicocorticoides não têm valor no tratamento da hepatopatia farmacoinduzida,
embora possam suprimir manifestações de hipersensibilidade, como a síndrome semelhante à
doença do soro que ocorre em decorrência de certas reações idiossincrásicas.
QUADRO DE CONCEITOS II
Como estabelecer o diagnóstico de uma "hepatopatia medicamentosa"?
Em suma, o diagnóstico de hepatopatia farmacoinduzida depende de:
●
História de exposição, em geral, entre 5 e 90 dias;
●
Achados clínicos e laboratoriais e, ocasionalmente, de biópsia hepática
consistentes;
●
Eliminação de outras possibilidades diagnósticas;
●
Resolução da lesão hepática após a interrupção da toxina suspeita.
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PRINCIPAIS MEDICAMENTOS ENVOLVIDOSPRINCIPAIS MEDICAMENTOS ENVOLVIDOS
PARACETAMOL (ACETAMINOFENO)PARACETAMOL (ACETAMINOFENO)
E sse analgésico e antipirético é um exemplo clássico de hepatotoxina intrínseca (dose-
dependente) que provoca necrose hepatocitária e insuficiência hepática aguda, frequentemente
associada à insuficiência renal. Em geral, ocorre lesão hepática significativa com doses acima de
10–15 g, tomadas quase sempre como tentativa de suicídio. Trata-se da principal causa
farmacológica de Insuficiência Hepática Fulminante (IHF) no mundo.
Em algumas horas o paciente apresenta náuseas, vômitos e diarreia, manifestações iniciais que
regridem rapidamente, sendo seguidas por uma fase assintomática. Os sinais clínicos e
laboratoriais de dano hepático tornam-se evidentes 24–48 horas após a ingestão do fármaco.
São comuns níveis séricos de aminotransferases > 5.000 UI/L, e a lesão hepática grave pode
resultar em insuficiência hepática progressiva, com encefalopatia, coagulopatia, hipoglicemia e
acidose láctica.
O tratamento inicial da superdosagem do paracetamol consiste em medidas d e suporte e
descontaminação gástrica , como o uso de carvão ativado pela via oral (1 g/kg de peso, dose
máxima 50 g), dentro das primeiras 4h da ingestão tóxica. Deve-se administrar N-acetilcisteína
(NAC) a pacientes de alto risco, isto é, aqueles que ingeriram quantidades previsivelmente
tóxicas do fármaco!
Nestes casos, a NAC reduz a gravidade da necrose hepática e a taxa de mortalidade,
principalmente se administrada ANTES da elevação das aminotransferases. Como regra geral,
recomenda-se que a NAC seja administrada, nestes indivíduos, dentro das primeiras 8h da
ingestão! Dosar o nível plasmático de paracetamol não é a melhor forma de avaliar o
prognóstico, o fator mais importante é a dose total ingerida, pois a droga é previsivelmente tóxica !
Todavia, níveis superiores a 200 mg/L em 4h, 100 mg/L em 8h ou 50 mg/L em 12h após a
ingestão do fármaco são preditivos de lesão hepática grave e também constituem indicações
para o tratamento com N-acetilcisteína.
A NAC parece atuar através do fornecimento de cisteína para a síntese da glutationa, o que
regenera este importante agente antioxidante endógeno. Seu benefício após 24h da ingestão
tóxica não foi estabelecido. A dose oral recomendada é de 140 mg/kg inicialmente, seguida por
doses de manutenção de 70 mg/kg a cada 4h, durante 72h. Também é possível utilizar um
protocolo de administração endovenosa da NAC, que consiste numa etapa de infusão rápida
de 150 mg/kg em 60min, seguida de infusão 50 mg/kg ao longo de 4h e, por fim, 6,25 mg/kg/h
em 16h. A principal desvantagem da via endovenosa é que 10–20% dos indivíduos
desenvolvem reação anafilactoide quando o fármaco é feito por esta via. Em pacientes
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desenvolvem reação anafilactoide quando o fármaco é feito por esta via. Em pacientes
gravemente enfermos (falência hepática franca,vômitos incoercíveis, íleo paralítico), esta pode
ser a única maneira de administrar a NAC.
De forma geral, pacientes com intoxicação aguda por paracetamol que são tratados a tempo
conseguem se recuperar por completo, sem qualquer lesão hepática residual.
ESQUEMA RIPEESQUEMA RIPE
Três drogas do esquema RIPE (Rifampicina, Isoniazida e Pirazinamida) apresentam potencial
para lesão hepática aguda. A associação isoniazida + rifampicina tem sinergismo hepatotóxico.
Das três, a isoniazida é a mais estudada. Essa droga tem um metabólito chamado acetil-
hidrazina — o verdadeiro responsável pela lesão hepática, formado pelo sistema do citocromo
P450. As drogas indutoras deste sistema enzimático, como a rifampicina, aumentam os níveis
do metabólito, aumentando a chance de hepatotoxicidade. Os indivíduos acetiladores lentos
são mais suscetíveis ao acúmulo desse metabólito, pois a sua transformação para a substância
atóxica diacetil-hidrazina está lentificada.
A isoniazida isoladamente pode induzir um leve aumento das aminotransferases em 10–20%
dos casos, surgindo geralmente nas primeiras semanas do tratamento. Essa elevação reflete
uma hepatite focal transitória. Entretanto, cerca de 1% dos pacientes que tomam a droga
desenvolvem lesão hepática grave, cuja histopatologia é muito semelhante à da hepatite aguda
viral. Esse tipo de hepatite costuma ocorrer dentro dos primeiros 2–3 meses do uso da droga,
manifestando-se com mal-estar, anorexia, náuseas e vômitos. A icterícia chama atenção. O
quadro laboratorial é típico de uma lesão hepatocelular (elevação das aminotransferases).
Alguns pacientes podem evoluir com hepatite crônica e até mesmo cirrose hepática. A
hepatotoxicidade pela isoniazida é mais frequente em pessoas com mais de 50 anos de idade.
Quando o paciente está em uso do esquema RIPE, um aumento de até 250 UI/ml das
aminotransferases, estável ou em involução, não justifica a suspensão das drogas. Porém, se
houver icterícia ou elevação de aminotransferases acima desses níveis, a conduta deve ser
suspender todo o esquema RIPE e introduzir droga por droga, com intervalo de quatro dias.
Será que é hepatotoxicidade da pirazinamida? Se não for, provavelmente trata-se de lesão
hepática propiciada pelo sinergismo entre isoniazida + rifampicina.
AMIODARONAAMIODARONA
Diversos pacientes que recebem amiodarona apresentam discretos aumentos dos níveis séricos
de aminotransferases, que se podem normalizar mesmo com a continuação da terapia,
acompanhados de ingurgitação dos lisossomos com fosfolipídios. 1 a 3% dos pacientes que
recebem amiodarona desenvolvem lesão hepática mais grave, que se assemelha,
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recebem amiodarona desenvolvem lesão hepática mais grave, que se assemelha,
histologicamente, à hepatite alcoólica aguda, com infiltração gordurosa dos hepatócitos,
necrose focal, fibrose, infiltrados de leucócitos Polimorfonucleares (PMN) e corpúsculo de
Mallory. Essa lesão, também conhecida como esteato-hepatite não alcoólica, pode progredir
para cirrose micronodular com hipertensão porta e insuficiência hepática. Tal lesão
pseudoalcoólica e sua progressão para cirrose ocorrem, geralmente, de modo clinicamente
insidioso, com elevação mínima dos níveis séricos de aminotransferases. Hepatomegalia pode
ser encontrada, porém icterícia é rara. As evidências de hepatotoxicidade podem persistir por
vários meses após a interrupção do fármaco.
A biópsia hepática se mostra útil no estabelecimento do diagnóstico, devendo ser considerada
em pacientes em uso de amiodarona que desenvolvem elevações persistentes ou significativas
(mais de duas vezes) dos níveis séricos de aminotransferases ou hepatomegalia. A decisão de
suspender a amiodarona, quando há evidências histológicas de hepatotoxicidade é
frequentemente difícil em pacientes que foram tratados com amiodarona após fracasso de
outras medicações menos tóxicas, sobretudo se o uso de cardioversor/desfibrilador implantado
automático não for apropriado.
ALFAMETILDOPAALFAMETILDOPA
Até 6% dos pacientes tratados com este agente anti-hipertensivo desenvolvem alterações
assintomáticas nas provas de função hepática. A hepatotoxicidade clinicamente óbvia, que
habitualmente se assemelha à hepatite viral aguda ou à hepatite ativa crônica, é muito menos
comum e surge, em geral, nas 20 semanas após o início da administração de metildopa. O teste
de Coombs pode se tornar positivo nos usuários desse fármaco, porém não se correlaciona
com o desenvolvimento de lesão hepática. Além disso, as manifestações clínicas de
hipersensibilidade medicamentosa são incomuns na hepatopatia induzida por metildopa, que
pode ser mediada por um metabólito tóxico do fármaco. Em geral, a hepatite regride quando o
fármaco é interrompido; entretanto, a recuperação pode ser retardada de vários meses e, em
alguns casos, ocorre progressão para um desfecho fatal a despeito da interrupção do
medicamento.
AMOXICILINA + ÁCIDO CLAVULÂNICOAMOXICILINA + ÁCIDO CLAVULÂNICO
A amoxicilina em si tem pouco potencial hepatotóxico; todavia, em combinação com o inibidor
da �-lactamase (ácido clavulânico), produz lesão hepática colestática, cujas manifestações
frequentemente surgem várias semanas após o término do tratamento. Os homens idosos são
afetados com mais frequência. A icterícia constitui uma característica consistente, e o exame
histológico do fígado revela colestase com necrose ou inflamação mínima. As manifestações de
hipersensibilidade são incomuns. A evolução clínica tem sido benigna na maioria dos casos,
com recuperação completa em quatro a seis meses.
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ERITROMICINAERITROMICINA
Seu uso pode ser complicado pelo desenvolvimento de uma reação colestática com
componentes de infiltração das células inflamatórias e necroses dos hepatócitos. Na maioria
dos casos, essa reação é observada com o estolato de eritromicina, enquanto as outras
eritromicinas, como o etilsuccinato e o lactobionato, implicadas com menos frequência.
Tipicamente, a hepatotoxicidade se manifesta como síndrome aguda de dor no hipocôndrio
direito, febre e sintomas colestáticos variáveis. O quadro clínico pode imitar bastante o da
colecistite aguda ou colangite e, em alguns casos, exige exploração cirúrgica. O prognóstico é
sempre excelente, porém a reação pode sofrer recidiva alguns dias após a readministração do
fármaco.
HALOTANOHALOTANO
Esse anestésico raramente provoca uma reação semelhante à hepatite viral e, nos casos graves,
pode progredir para necrose hepática maciça fatal. A suscetibilidade à hepatite por halotano
parece ser aumentada em indivíduos idosos, mulheres e indivíduos obesos; em geral, ocorrem
reações graves após exposições anteriores ou múltiplas a esse anestésico. Os sintomas surgem de
sete a dez dias após a anestesia; esse intervalo pode ser reduzido após exposição repetida. A
febre com calafrios e sudorese, precede comumente o início da icterícia. A evolução pode levar
à morte em alguns dias, ou pode ocorrer recuperação rápida e completa. Alguns pacientes têm
uma evolução mais prolongada antes da sua recuperação ou do desenvolvimento de
insuficiência hepática. Os metabólitos do halotano formados pelo sistema do citocromo P450
são claramente importantes no mecanismo da lesão hepática. Alguns desses metabólitos podem
ser diretamente tóxicos, outros podem formar haptenos com as proteínas da membrana celular,
provocando um ataque ao fígado imunologicamente mediado. Pode ocorrer sensibilização
cruzada entre o halotano, o metoxiflurano e o enflurano, embora a lesão hepática pareça ser
menos comum com os dois últimos agentes anestésicos.
FENITOÍNAFENITOÍNA
Este anticonvulsivante pode estar raramente associado a um quadro de injúria hepática grave,
semelhante à hepatite viral (em termos de histopatológico e laboratório), porém, cursando
também com sinais proeminentes de "hipersensibilidade" (do tipo "doença do soro"). Os
sintomas começam dentro de seis semanas do seu uso, apresentando-se com mal-estar, febrealta, linfadenopatia e rash cutâneo. O hemograma revela leucocitose neutrofílica, linfocitose
atípica e eosinofilia. A hepatite difere da hepatite viral aguda apenas por conter eosinófilos no
infiltrado portal. A predisposição à hepatotoxicidade pela fenitoína é geneticamente
predeterminada — uma incapacidade inata de metabolizar os óxidos arenos altamente reativos
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predeterminada — uma incapacidade inata de metabolizar os óxidos arenos altamente reativos
provenientes da biotransformação do fármaco.
ÁCIDO VALPROICOÁCIDO VALPROICO
Este anticonvulsivante de amplo espectro é utilizado no tratamento do pequeno mal e no
grande mal epilépticos. A hepatotoxicidade pode ser grave, especialmente em crianças com
idadeclínicas diferentes de tirosinemia hereditária (tipos 1, 2 e 3), um erro inato do
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Existem três formas clínicas diferentes de tirosinemia hereditária (tipos 1, 2 e 3), um erro inato do
metabolismo , de caráter autossômico recessivo, causado por mutações nos genes envolvidos
com o catabolismo da tirosina, que resulta em níveis séricos aumentados desse aminoácido...
O tipo 1 ( tirosinemia hepatorrenal — a forma mais grave de todas) é o que nos interessa aqui,
por acometer o fígado... A enzima deficiente, neste caso, é a Fumarilacetoacetato Hidrolase
(FAH), que normalmente se localiza nos hepatócitos e células do túbulo proximal, justificando
seu quadro clínico ser caracterizado por lesão hepática crônica (que evolui para cirrose) e lesão
tubular renal (que evolui com disfunção completa do túbulo proximal, gerando a síndrome de
Fanconi ). Tais lesões são decorrentes do acúmulo intracelular de substratos tóxicos que seriam
metabolizados pela FAH.
As manifestações clínicas tendem a ser precoces, com o paciente apresentando hepatomegalia,
baixo ganho ponderoestatural e elevados níveis séricos de tirosina já na primeira infância. Se
não reconhecida e tratada pode levar à falência hepática no segundo ano de vida ou — nos
sobreviventes — gera cirrose hepática e carcinoma hepatocelular ainda na infância.
O diagnóstico é feito pela documentação da presença de ácidos orgânicos na urina,
particularmente a substância Succinilacetona (SA), que é patognomônica da tirosinemia
hereditária tipo 1. O padrão-ouro para confirmação do diagnóstico é a cultura de fibroblastos
cutâneos, com demonstração de baixa atividade da FAH.
Atualmente existe um tratamento específico: a nitisinona (previamente chamada de NTBC).
Usuários desse medicamento devem complementar a estratégia terapêutica, fazendo restrição
dietética de fenilalanina e tirosina. Casos refratários (ou aqueles que evoluem com cirrose
hepática/carcinoma hepatocelular) devem ser manejados com transplante ortotópico de fígado.
FIBROSE CÍSTICAFIBROSE CÍSTICA
A fibrose cística é uma doença genética autossômica recessiva causada por mutações no gene
do CFTR ( Cystic Fibrosis Transmembrane Conductance R egulator ), uma proteína
transmembrana responsável pelo transporte de cloreto para as secreções exócrinas de vários
órgãos. Esses pacientes produzem secreções espessas e viscosas no pulmão, pâncreas, fígado
(neste caso, a bile), intestino e trato reprodutivo, podendo, por este motivo, desenvolver lesão
crônica de um ou todos esses órgãos.
A cirrose hepática é responsável por virtualmente todas as mortes de causa não pulmonar em
pacientes com fibrose cística! O acúmulo de material eosinofílico amorfo nos pequenos ductos
biliares gera uma reação inflamatória progressiva que culmina em Cirrose Biliar Focal
(CBF). A CBF pode evoluir para cirrose biliar multilobular. A cirrose biliar também pode
surgir em decorrência da obstrução persistente do colédoco terminal por fibrose da cabeça do
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surgir em decorrência da obstrução persistente do colédoco terminal por fibrose da cabeça do
pâncreas. A obstrução do ducto cístico, encontrada em 15–20% dos pacientes, pode causar
atrofia da vesícula biliar.
Outras lesões hepatobiliares comuns incluem: esteatose hepática; colestase neonatal (30% dos
casos); colangite esclerosante; colelitíase (principalmente à custa de bilirrubinato de cálcio); e
colecistite litiásica. A função hepática é preservada e o paciente se mantém sem sinais de
insuficiência hepatocelular até que a obstrução dos ductos biliares culmine em hipertensão
porta e substituição fibrótica substancial do parênquima hepático.
O Ácido Ursodesoxicólico (UDCA) em altas doses melhora a bioquímica hepática e o estado
nutricional dos pacientes (fornece proteção contra ácidos biliares que se acumulam em doses
tóxicas no interior do sistema canalicular), embora seu benefício seja incerto em termos de
melhora de sobrevida. A hipertensão porta pode ser tratada com escleroterapia, derivações
cirúrgicas ou transplante hepático. A terapia gênica poderá ser usada no futuro no sentido de
prevenir as complicações hepatobiliares da fibrose cística.
ATRESIA CONGÊNITA DAS VIAS BILIARESATRESIA CONGÊNITA DAS VIAS BILIARES
Na população caucasiana, a atresia congênita das vias biliares extra-hepáticas surge em
1:13.000 a 1:8.000 nascimentos, com incidência equivalente entre os sexos. O padrão de
anormalidade mais comum é a atresia completa de todas as estruturas biliares extra-hepáticas.
Atualmente, se acredita que a etiologia da doença seja multifatorial (genética, autoimune,
infecciosa).
Outras malformações congênitas, notadamente as vasculares, surgem em 20–30% dos casos. A
associação mais comum é a síndrome de poliesplenia : situs inversus , veia porta pré-duodenal,
interrupção da veia cava inferior, poliesplenia e fígado deslocado para a linha média.
Clinicamente , manifesta-se por icterícia tipicamente iniciada após duas a três semanas de vida,
embora possa surgir mais precocemente. Hipocolia fecal, hepatomegalia, esplenomegalia,
prurido, baqueteamento digital, xantomas, rosário raquítico e insuficiência de crescimento
compõem o quadro. Ascite e hemorragia por hipertensão porta são eventos tardios. Os testes
hepáticos revelam aumento das enzimas colestáticas e discreto aumento de aminotransferases.
A USG sugere o diagnóstico e a biópsia hepática pode diferenciar causas de colestase intra-
hepática da atresia biliar extra-hepática em mais de 90% dos casos. Naqueles casos em que o
diagnóstico não pode ser definido até 60 dias de vida, a laparotomia exploradora com biópsia
hepática e colangiografia peroperatória se torna necessária.
Na ausência de tratamento adequado, a insuficiência hepática causa a morte da criança entre
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Na ausência de tratamento adequado, a insuficiência hepática causa a morte da criança entre
18–24 meses de idade. A estratégia cirúrgica de correção, tradicionalmente indicada, é o
procedimento de Kasai (hepatoportoenterostomia), o qual deverá ser realizado o mais
precocemente possível (seis a dez semanas de vida). O sucesso desta técnica, em crianças com
mais de quatro meses de idade, é bastante incomum. Neste caso e nos casos que evoluem com
cirrose biliar terminal, o transplante deve ser considerado (a sobrevida em cinco anos é de 60–
80%).
CISTOS DE COLÉDOCOCISTOS DE COLÉDOCO
Os cistos de colédoco respondem por 2–5% das colestases extra-hepáticas neonatais,
principalmente nos países asiáticos. Suas manifestações clínicas, laboratoriais e histológicas são
indistinguíveis dos achados na atresia biliar. Na verdade, os cistos sintomáticos neonatais são
geralmente associados à atresia do colédoco. Eventualmente, pode-se palpar uma massa
subepática, a qual deve motivar a confirmação diagnóstica através de USG. Icterícia
obstrutiva, colangites de repetição e dor abdominal são comuns. Uma vez que 5–15% dos cistos
sofrem degeneração maligna na vida adulta, a excisão precoce do cisto é mandatória. A técnica
cirúrgica de escolha é a excisão com anastomose coledocojejunal.
COLESTASE INTRA-HEPÁTICA FAMILIAR PROGRESSIVACOLESTASE INTRA-HEPÁTICA FAMILIAR PROGRESSIVA
A colestase intra-hepática familiar progressiva (sigla em inglês, PFIC), também chamada de
doença de Byler, é uma doença de herança autossômica recessiva que constitui a segunda causa
mais frequente de colestase intra-hepática familiar, perdendo somente para a síndrome de
Alagille (ver a seguir).
A PFIC se inicia nos primeiros 6–12 meses de idade, com icterícia de intensidade variável,
prurido intenso e persistente, colúria e hipocolia fecal. Há hepatomegalia com ou sem
esplenomegalia. Em consequência da colestase crônica, surgem deficit de crescimento, síndrome
de má absorção, deficiência de vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K). Não há tratamento que
evite a evolução da doença: a maioria dos afetados evolui com cirrose e insuficiênciahepática,
necessitando de transplante.
RAREFAÇÃO DE DUCTOS BILIARES INTERLOBULARESRAREFAÇÃO DE DUCTOS BILIARES INTERLOBULARES
(RDBIL)(RDBIL)
A RDBIL pode ser subdividida didaticamente em duas formas: a forma sindrômica ( síndrome
d e Alagille ) — associada a várias outras malformações congênitas — e a variedade não
sindrômica — caracterizada pela presença isolada de colestase intra-hepática congênita sem
anomalias extra-hepáticas.
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anomalias extra-hepáticas.
A síndrome de Alagille constitui a causa mais comum de colestase intra-hepática familiar, sendo
também chamada de displasia artério-hepática. É uma doença autossômica dominante que
acomete mais comumente crianças do sexo masculino, as quais geralmente nascem pequenas
para a idade gestacional. As principais manifestações clínicas da síndrome são:
●
Fácies típico: fronte e orelhas proeminentes, olhos fundos e com hipertelorismo e hipognatismo;
●
Voz estridente e aguda;
●
Colestase com icterícia variável, prurido (com três a seis meses de vida) e xantomas tardios. As
enzimas hepáticas estão elevadas e as aminotransferases discretamente aumentadas, com síntese
hepática preservada;
●
Cardiopatias congênitas, principalmente estenose de um ramo periférico da artéria pulmonar ou
estenose da valva pulmonar. Outras anomalias que podem surgir incluem defeito de septo atrial,
coarctação da aorta e tetralogia de Fallot;
●
Defeitos do arco vertebral, com fusão incompleta de corpos vertebrais ou do arco anterior
(deformidade em borboleta);
●
Anomalias oculares, notadamente o embriotoxon posterior;
●
Anomalias renais: rins displásicos, ectasia tubular renal, rim único, hematúria;
●
Alterações neurológicas e retardo mental: arreflexia, ataxia e oftalmoplegia, associadas à
deficiência de vitamina E;
●
Hipogonadismo com micropênis.
O tratamento da RDBIL é baseado no suporte nutricional com reposição de vitaminas
lipossolúveis e no uso de Ácido Ursodesoxicólico (UDCA). São alternativas a colestiramina e o
fenobarbital. O prognóstico é melhor na variante sindrômica. Nesta, apenas 30–40%
desenvolvem complicações graves da doença, o que ocorre em mais de 70% dos portadores da
forma não sindrômica, os quais frequentemente evoluem com cirrose hepática.
Na síndrome de Alagille, a sobrevida adulta com mínima fibrose é comum, embora muitos
casos de carcinoma hepatocelular tenham sido descritos. Nesta síndrome, nos poucos casos
cuja colestase grave torna-se fator limitante da sobrevida, o transplante hepático pode ser
realizado.
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APÊNDICEAPÊNDICE
TRANSPLANTE HEPÁTICOTRANSPLANTE HEPÁTICO
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
Foi em 1963 que Starzl e seu grupo realizaram o primeiro transplante hepático com sucesso em
seres humanos. No início, é claro, os resultados não eram tão bons como são atualmente. Hoje
em dia, com a evolução da técnica cirúrgica, a experiência dos cirurgiões e com a terapia
imunossupressora, o transplante hepático oferece uma sobrevida de > 90% em um ano, 85–
Dúvidas Acadêmicas do CapítuloTESTE SEU CONHECIMENTOConfira as dúvidas acadêmicas do capítulo clicando aqui
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Fig. 1: Este paciente com cirrose alcoólica descompensada respeitou o critério de ficar sem beber há > 6
meses e recebeu um transplante ortotópico de fígado ("um fígado novo no lugar do velho, que foi
removido"). Observe à esquerda o preparo do fígado retirado do doador cadavérico e, abaixo, o aspecto
final da cirurgia, com o enxerto bem vascularizado, mostrando sinais de vitalidade tecidual.
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imunossupressora, o transplante hepático oferece uma sobrevida de > 90% em um ano, 85–
90% em cinco anos e 60% em dez anos. Sem o transplante, estes pacientes teriam a sobrevida
contada em poucos meses.
Neste capítulo, estudaremos resumidamente as indicações, tipos e complicações relacionadas ao
transplante hepático...
INDICAÇÕES DO TRANSPLANTEINDICAÇÕES DO TRANSPLANTE
O paciente candidato ao transplante deve ter uma doença hepática avançada, progressiva e
irreversível. Deve ter uma qualidade de vida bastante comprometida pela hepatopatia, com
expectativa de vida inferior a um ano.
CRITÉRIOS DE SELEÇÃOCRITÉRIOS DE SELEÇÃO
Nos EUA, a procura é bem maior que a oferta, problema também observado em outros
transplantes de órgãos sólidos. Em média, naquele país, os pacientes com cirrose avançada
esperam de 6–12 meses para ganhar um fígado novo. É a chamada "fila do transplante".
O critério de seleção não é dado simplesmente pela ordem de chegada, mas sim pela gravidade
da doença: quanto menor a expectativa de sobrevida, mais rapidamente o indivíduo é alocado
para receber o transplante. Por exemplo, na insuficiência hepática fulminante e em casos
selecionados de hepatocarcinoma, o transplante tem que ser realizado de imediato, enquanto
os cirróticos crônicos toleram esperar mais tempo.
A indicação de transplante hepático deve ser decidida por uma junta multidisciplinar, em
conjunto com o paciente e sua família. Os riscos do procedimento e a necessidade de
imunossupressão para o resto da vida são dados que devem ser ponderados.
O critério atualmente adotado para alocar pacientes na fila do transplante hepático é o escore
MELD ( Model for End-Stage Liver Disease ) , mais simples e com melhor capacidade de prever
a sobrevida dos hepatopatas. Tal escore se baseia em apenas três variáveis: bilirrubina, INR e
creatinina .
O paciente adulto poderá ser inscrito na lista nacional de transplante de fígado quando seu
MELD for maior ou igual a 11 . Hoje em dia, o MELD substituiu os antigos status de
prioridade, sem, entretanto, modificar certas diretrizes básicas, como a necessidade de se
transplantar rapidamente uma hepatite fulminante e um hepatocarcinoma curável. Veja como
funciona o MELD ( ).Tabela 1
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Tab. 1
Escore MELD (cálculo)
●
3,78 x log e (bilirrubina) + 11,2 x log e (INR) + 9,57 x log e (creatinina) + 6,43*.
*A constante 6,43 é desconsiderada nos casos de cirrose alcoólica ou cirrose biliar
(primária ou secundária). Obs.: log e = logaritmo neperiano (presente em qualquer
calculadora científica).
●
No Brasil, o paciente entra na lista de transplante hepático quando seu MELD é ≥ 11.
Você pode calcular o MELD no seguinte site: www.unos.org/resources .
É óbvio que você não precisa decorar a fórmula, mas é importante conhecer suas variáveis... Os
pacientes com diagnóstico de hepatocarcinoma recebem inicialmente 20 pontos no MELD,
com elevação progressiva com o passar do tempo. Os portadores de hepatocarcinoma podem
receber um transplante hepático somente se obedecerem aos critérios de Milão : (1) lesão única
≤ 5 cm; (2) lesões múltiplas (até três), todas menores que 3 cm; e (3) ausência de metástases a
distância ou invasão do pedículo vascular hepático.
INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕESINDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES
Quanto à etiologia da hepatopatia, teoricamente, qualquer causa de cirrose hepática pode ser
incluída na lista das indicações de transplante. De uma forma geral, os resultados são melhores
na cirrose alcoólica, na colangite biliar primária e na cirrose secundária à colangite esclerosante.
Contraindicações absolutas ao transplante incluem: tumores aparentemente incuráveis pelo
transplante (doença hepática metastática, colangiocarcinoma), não adesão à abstinência
alcoólica, infecções não controladas, doenças extra-hepáticas limitadoras de vida, entre outras.
Veja na as principais indicações e contraindicações ao transplante hepático. Fatores
que atrapalham o resultado do transplante, mas não o inviabilizam, são considerados
contraindicações relativas: idade > 70 anos, anastomose porto-cava prévia, cirurgia
hepatobiliar complexa prévia, trombose da veia porta, retransplante, transplante de múltiplos
órgãos, insuficiência renal, obesidade, HIV positivo ainda não na fase aids, incompatibilidade
CMV etc.
Tab. 2
Indicações de Transplante HepáticoAdultos
Crianças
Tabela 2
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Crianças
●
Hepatite crônica com cirrose (viral,
autoimune, doença de Wilson,
hemocromatose, NASH).
●
Cirrose alcoólica.
●
Cirrose biliar primária.
●
Colangite esclerosante com cirrose.
●
Cirrose criptogênica.
●
Trombose de veia hepática (Budd-Chiari).
●
Hepatite fulminante.
●
Adenoma hepático.
●
Câncer primário do fígado.
●
Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF).
●
Doença de Caroli.
●
Metástases hepáticas irressecáveis de
tumor neuroendócrino com tumor primário
ressecado ou indetectável.
●
Atresia biliar (causa mais comum de
transplante hepático em crianças).
●
Fibrose hepática congênita.
●
Doença de Alagille.
●
Doença de Byler.
●
Deficiência de alfa-1-antitripsina.
●
Doença de Wilson.
●
Tirosinemia.
●
Doença de Crigler-Najjar tipo I.
Contraindicações ao Transplante Hepático
●
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Colangiocarcinoma.
●
Doença sistêmica ameaçadora à vida.
●
Sepse ativa, não tratada.
●
Infecção extra-hepatobiliar não controlada.
●
Doença metastática para o fígado (exceto
alguns tumores neuroendócrinos).
●
Câncer extra-hepatobiliar.
●
Aids (contraindicação relativa na
atualidade).
●
Uso de álcool ou drogas nos últimos seis
meses.
●
Anomalias congênitas incorrigíveis e
limitantes.
●
Doença cardiopulmonar avançada.
TIPOS DE TRANSPLANTE HEPÁTICOTIPOS DE TRANSPLANTE HEPÁTICO
Transplante hepático ortotópico : é o tipo mais utilizado na prática. Refere-se à retirada do
fígado doente, seguida do transplante de um fígado inteiro do doador, neste caso, um doador
cadavérico (morto). A coleta do fígado cadavérico é realizada por equipe cirúrgica
especializada em captação de fígado. O doador deve ter morte cerebral documentada. Adiante
veremos os critérios de seleção do doador...
Transplante hepático heterotópico : refere-se ao transplante de um fígado novo em um outro
sítio anatômico, mantendo-se o fígado do receptor. Esta técnica pode ser usada em casos de
insuficiência hepática fulminante, quando existe uma chance de recuperação do fígado doente.
Transplante de fígado reduzido : refere-se à retirada do fígado doente, seguida do transplante de
uma parte do fígado do doador (lobo esquerdo ou lobo direito). Neste caso, o doador pode ser
cadavérico ou vivo.
Um dos principais problemas do transplante de órgãos é o fato de a demanda ser muito maior
do que a oferta. Por isso, muita gente morre na "fila do transplante", simplesmente pela
indisponibilidade de um doador no momento em que se mais precisa. No caso do transplante
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hepático, algumas estratégias estão sendo criadas para minimizar este problema. Vejamos
quais...
TRANSPLANTE INTERVIVOSTRANSPLANTE INTERVIVOS
Essa técnica, teoricamente, só é possível em transplantes de órgãos duplos, como os rins.
Entretanto, devido a sua alta capacidade regenerativa, pode-se retirar um lobo hepático de
uma pessoa viva e transplantar no paciente que precisa receber um fígado novo.
No caso dos adultos , o transplante do lobo hepático direito (o maior lobo hepático) é suficiente
para garantir uma plena função hepática no receptor; no caso da criança , o transplante do
lobo esquerdo costuma funcionar bem.
A o aceitar doadores vivos (neste caso, aparentados), a disponibilidade de órgãos torna-se
maior. A principal desvantagem do transplante intervivos é a possibilidade de complicações da
cirurgia de retirada no doador, com taxas de 5% de complicações biliares; 10–20% de hérnia
incisional; sem falar da infecção da ferida operatória; obstrução intestinal e ainda com uma
mortalidade registrada de 0,2–0,4%. O doador vivo precisa ainda se afastar do trabalho por
uma média de dez semanas.
Outro problema é o risco maior de complicações biliares (15–30%) e vasculares (10%) no
receptor, já que este receberá parte de um fígado, em vez de um fígado inteiro, dificultando a
técnica das anastomoses vasculares e biliares. Mesmo assim, o transplante intervivos tem sido
cada vez mais realizado...
TRANSPLANTE DO TIPO "SPLIT LIVER"TRANSPLANTE DO TIPO "SPLIT LIVER"
Neste caso, o fígado de um cadáver pode beneficiar dois receptores: um adulto recebe o lobo
direito; e uma criança, o lobo esquerdo.
TRANSPLANTE EM "DOMINÓ"TRANSPLANTE EM "DOMINÓ"
É um tipo raramente utilizado. Nesta estratégia, um paciente recebe um transplante hepático e
o seu próprio fígado, que foi retirado, é transplantado num outro receptor. O seu primeiro
pensamento foi: mas se o primeiro precisou de um transplante hepático, é porque o seu fígado era
doente — como este fígado pode ser aproveitado por outra pessoa?
A explicação é a seguinte: só existe uma doença em que isso pode ser feito — a polineuropatia
amiloide familiar ... Esta doença é de herança autossômica dominante, ocorrendo
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amiloide familiar ... Esta doença é de herança autossômica dominante, ocorrendo
principalmente em Portugal ("doença dos pezinhos"), mas também no Brasil, Argentina, Suécia
e Japão.
Nela, o fígado produz um mutante da proteína transtirretina que possui propriedades
amiloidogênicas, isto é, a capacidade de se depositar irreversivelmente nos tecidos, em especial
os nervos periféricos, sob a forma de fibrilas amiloides.
O único tratamento possível é o transplante hepático, que pode curar a doença, caso contrário,
a morte ocorrerá numa média de 15–20 anos depois do diagnóstico. Como a deposição ocorre
de forma muito lenta, a doença só começa a se manifestar cerca de 30–40 anos depois.
Agora, entenda o "transplante dominó": um paciente com polineuropatia amiloide familiar
recebe um fígado transplantado, enquanto o seu fígado retirado é doado a outro receptor. Este
fígado é normal do ponto de vista anatômico e funcional — o seu único defeito é produzir a
transtirretina amiloidogênica. Como demora 30–40 anos para o desenvolvimento da
polineuropatia, o receptor deste fígado terá uma vida normal durante todo este período.
Portanto, o "transplante dominó" pode beneficiar pacientes hepatopatas graves, mas que
apresentam uma sobrevida média limitada por outros fatores, como doença cardiovascular
extensa ou idade avançada...
SELEÇÃO DO DOADORSELEÇÃO DO DOADOR
O doador cadavérico deve estar comprovadamente em morte cerebral, sem ter evoluído com
instabilidade hemodinâmica ou respiratória mal controladas, ou sepse grave. Além disso, deve
ter as provas de função hepática adequadas e, idealmente, a sorologia para vírus B e C
negativas. Obviamente, o anti-HIV tem que ser negativo...
O grupo sanguíneo ABO deve ser compatível, como se fosse uma transfusão de sangue.
Curiosamente, o sistema HLA não precisa ser compatível, já que o enxerto hepático é pouco
imunogênico quando comparado ao rim (é claro que não tão pouco imunogênico a ponto de
prescindir da terapia imunossupressora).
TÉCNICA CIRÚRGICATÉCNICA CIRÚRGICA
A cirurgia do transplante hepático é um dos procedimentos mais difíceis da cirurgia abdominal,
exigindo ampla experiência e treinamento específico do cirurgião. Nos grandes centros, esta
cirurgia tem sido realizada com uma mortalidade operatória de 5–7% .
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O pós-operatório deve ser sempre feito numa UTI, observando-se a recuperação da função
hepática e tratando qualquer tipo de complicação (ver adiante).
O tempo cirúrgico médio é de oito horas. A perda de sangue é variável, desde mínima até
maciça. As estruturas hilares e a veia cava, acima e abaixo do fígado, são dissecadas. Os vários
vasos são grampeados e seccionados para permitir a remoção do fígado.
Durante o implante do novo fígado, deve-se interromper a circulação no território esplâncnico
e da veia cava, durante o qual uma derivação venovenosa pode ser instalada para prevenir a
congestão da metade inferior do corpo (as cânulas são colocadas na veia cava inferior, via veia
femoral e na veia porta, desviando o sangue para a veia subclávia).Durante esta fase
operatória, o organismo do paciente não conta com a função hepática: fase anepática .
O anestesista deve estar preparado para contornar possíveis complicações nesta fase... O
líquido de conservação é drenado do enxerto, e as anastomoses começam a ser confeccionadas.
Estas últimas são a parte mais complicada da cirurgia e são realizadas na seguinte ordem: veia
cava supra-hepática, veia cava infra-hepática, veia porta, artéria hepática e sistema biliar. Essas
anastomoses são feitas diretamente e são terminoterminais. Um dreno de Kehr deve ser
colocado na via biliar.
É fundamental que o cirurgião conheça as variações anatômicas, especialmente as do sistema
arterial e do sistema biliar . Estas variações podem tornar a anastomose tecnicamente
complicada.
IMUNOSSUPRESSÃOIMUNOSSUPRESSÃO
O grande avanço nos resultados em curto e longo prazos com o transplante hepático advém do
surgimento dos inibidores da calcineurina. O primeiro a ser usado foi a ciclosporina e depois
surgiu o tacrolimo . Essas drogas agem basicamente nos linfócitos T helper, inibindo a
calcineurina, proteína importante para a função de fatores de transcrição gênica, implicados na
produção de citocinas. O resultado é a inibição da síntese dessas citocinas, em especial a
Interleucina-2 (IL-2), implicada na ativação e proliferação de linfócitos e monócitos. Este efeito
é capaz de evitar, ou pelo menos reduzir, a incidência da rejeição ao fígado transplantado.
Existem vários protocolos diferentes para a imunossupressão pós-transplante hepático! Não
vamos entrar aqui em pormenores sobre este tópico, porém cumpre ressaltar que a maioria
desses protocolos emprega uma imunossupressão mais agressiva no pós-transplante imediato
(ex.: corticoide + ciclosporina + tacrolimo + micofenolato + azatioprina durante o primeiro
mês), desmamando medicações (ex.: ao longo dos primeiros seis meses) até que o paciente se
mantenha em uso apenas da combinação de ciclosporina e tacrolimo , na menor dose possível,
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por longo prazo.
O principal efeito adverso da ciclosporina e do tacrolimo é a nefrotoxicidade , levando à
insuficiência renal aguda por vasoconstrição renal e necrose tubular aguda. Apesar de o
tacrolimo ser um imunossupressor mais moderno e potente, está mais associado a efeitos
colaterais. A lesão renal pode reverter com a redução da dose ou com a suspensão do
medicamento. O monitoramento dos níveis séricos pode ajudar a prevenir a complicação.
Outros efeitos adversos relatados são: neurotoxicidade (cefaleia, borramento visual, crise
epiléptica, encefalopatia, tremores, mutismo acinético), crise hipertensiva e hiperglicemia/
diabetes mellitus.
As infecções oportunistas podem ocorrer, destacando-se a citomegalovirose e a pneumocistose.
O SMX-TMP em dose profilática está indicado para prevenção da pneumocistose, assim como
o uso de aciclovir, ganciclovir ou valganciclovir profiláticos para CMV. O uso de fluconazol
oral também pode ser feito nas primeiras seis semanas do pós-transplante para evitar infecções
fúngicas. Ao longo dos próximos anos, há um aumento do risco de linfoma não Hodgkin de
células B, geralmente associado ao vírus Epstein-Barr.
COMPLICAÇÕES DO TRANSPLANTECOMPLICAÇÕES DO TRANSPLANTE
NÃO FUNCIONAMENTO DO ENXERTONÃO FUNCIONAMENTO DO ENXERTO
Ocorre em 5 % dos casos, entre as primeiras 24–48h e está relacionado à conservação
inadequada do enxerto, geralmente um tempo de esfriamento longo (> 20–30h) ou um tempo
prolongado de isquemia, por complicações hemodinâmicas. Já podemos suspeitar deste
diagnóstico durante o ato operatório: o primeiro sinal de funcionamento do enxerto é a
produção de bile! Assim, quando o fígado recém-transplantado não apresentar produção imediata
de bile, deve-se considerar a falência primária do enxerto e listar o paciente para o retransplante.
Enquanto este não for feito, o quadro será semelhante ao de uma insuficiência hepática
fulminante, com elevada morbimortalidade.
COMPLICAÇÕES TÉCNICASCOMPLICAÇÕES TÉCNICAS
As complicações vasculares são mais comuns nas crianças e podem ser a trombose da artéria
hepática ou da veia porta. A trombose arterial pode causar febre, elevação das
aminotransferases e, eventualmente, isquemia e necrose do enxerto. É diagnosticada por
métodos de imagem como USG-Doppler, angio-RM ou mesmo arteriografia. O tratamento
pode ser feito por trombólise química, angioplastia percutânea ou reanastomose cirúrgica.
As complicações biliares estão associadas ao extravasamento de bile pela anastomose. Podem
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As complicações biliares estão associadas ao extravasamento de bile pela anastomose. Podem
s e r diagnosticadas pela colangiografia e tratadas por inserção de stent ou reconstrução
cirúrgica. Em ambos os casos, a falência dos tratamentos de resgate pode indicar o
retransplante .
REJEIÇÃO AGUDA E CRÔNICAREJEIÇÃO AGUDA E CRÔNICA
Embora o fígado seja um órgão privilegiado imunologicamente em relação ao transplante,
talvez pelo fato de os hepatócitos carregarem menos antígenos de superfície, os episódios de
rejeição de fato acontecem, especialmente a rejeição aguda.
A rejeição aguda ocorre em 25–50% dos casos, geralmente entre 5–20 dias após o transplante. A
rejeição aguda não tem um efeito adverso sobre a sobrevida do paciente ou do enxerto, exceto
os casos mais graves. A complicação se manifesta com febre, taquicardia, hepatomegalia
dolorosa, elevação das aminotransferases e icterícia. O INR pode se elevar.
O diagnóstico deve ser confirmado pela biópsia hepática, que irá revelar a tríade clássica da
inflamação portal linfocítica, lesão dos ductos biliares e inflamação subendotelial das vênulas
porta e vênulas hepáticas (endotelite). Pelos critérios histopatológicos, a rejeição aguda é
classificada em leve (A1), moderada (A2) e grave (A3). Os casos graves podem contribuir para a
morte precoce do paciente e necessidade de retransplante.
O tratamento é eficaz em 90% dos casos. Deve ser feito com pulsoterapia, com metilprednisolona
1 g/dia por três dias. Os casos não responsivos devem ser resgatados com a imunoglobulina
antitimócito (OKT3). Recentemente, foram introduzidos os agentes biológicos daclizumabe e
basiliximabe, anticorpos monoclonais que inibem o receptor de IL-2.
A rejeição crônica é um processo insidioso, observada atualmente em 1–4% dos casos, pela
melhora da terapia imunossupressora de manutenção (antigamente, na década de 80, era
observada em 15% dos pacientes). É chamada de "rejeição crônica ductopênica", devido à sua
principal característica histopatológica, a perda dos ductos biliares interlobulares e septais em
pelo menos 50% dos espaços-porta.
O epitélio do ducto biliar é invadido por células mononucleares, resultando em necrose focal e
ruptura epitelial. O paciente começa a apresentar colestase progressiva, seguida pela perda
paulatina da função hepática. O aumento da imunossupressão pode não reverter o processo,
necessitando, muitas vezes, do retransplante.
TRANSPLANTE NAS HEPATITES B E CTRANSPLANTE NAS HEPATITES B E C
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HEPATITE BHEPATITE B
Antigamente, a recidiva da infecção hepática pelo vírus B após o transplante hepático em
pacientes com cirrose pós-hepatite B oscilava entre 80–100%. A maioria desses pacientes
apresentava recidiva clínica e laboratorial da hepatite, incluindo uma forma mais grave
(hepatite colestática fibrosante), trazendo, portanto, resultados precários. Atualmente, esses
problemas se tornaram RAROS devido ao uso de esquemas profiláticos.
O vírus B possui reservatórios fora do fígado, como os monócitos circulantes e o baço, e sofre
acelerada reativação por conta dos imunossupressores utilizados de rotina no transplante
hepático. O diagnóstico da recidiva ou reinfeção é estabelecido pelo HBsAg positivo. Estes
pacientes costumam ter alta dosagem do DNA viral e HBeAg positivo (alta replicação).
A profilaxia da recidiva/reinfecção pelo vírus B noesteatose
assintomática (“fígado gorduroso”); ( 2 ) esteato-hepatite aguda (“hepatite alcoólica”); e (3)
cirrose alcoólica ( cirrose de Laennec ). A maioria dos alcoolistas “inveterados” desenvolve
esteatose, mas somente uma pequena fração evolui com hepatite alcoólica que, quando
persistente ou recorrente, pode levar à cirrose hepática. Observe a .
QUADRO DE CONCEITOS I
A DHA evolui através de três estágios sucessivos: esteatose, esteato-hepatite e
cirrose.
PATOGÊNESEPATOGÊNESE
Figura 1 _
_
Fig. 1: Progressão da DHA em alcoolistas.
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PATOGÊNESEPATOGÊNESE
O principal determinante do surgimento de DHA é a quantidade de álcool ingerida. Em homens
, as formas graves da doença em geral só aparecem quando o consumo é > 80 g/dia por mais de
dez anos , ao passo que, nas mulheres , este limiar é um pouco mais baixo: > 30–40 g/dia por
mais de dez anos .
A maior suscetibilidade do sexo feminino ao dano hepático induzido pelo álcool é
explicada em parte pela menor concentração da enzima álcool desidrogenase na
mucosa gástrica. É por isso, inclusive, que os níveis séricos de etanol são
maiores nas mulheres, em comparação com os homens, após a ingestão de uma
mesma dose de bebida alcoólica!
Existem dúvidas se o tipo de bebida interfere no risco de DHA: alguns estudos sugeriram que o
vinho acarretaria menos risco que a cerveja e os destilados, porém tal assunto é controverso…
Talvez o vinho também possua substâncias que protejam contra a DHA!
Diversos cofatores modulam o risco de DHA. As hepatites virais crônicas (B e C) bem como a
presença de obesidade e outras hepatopatias (ex.: hemocromatose ) representam os principais
amplificadores do risco !!! A desnutrição (com deficiência de calorias e de múltiplas vitaminas) é
outra comorbidade que potencializa o dano hepático alcoólico por mecanismos pouco
compreendidos. Fatores genéticos como polimorfismos nos genes do PNPLA3 ( patatin-like
phospholipase domain-containing protein 3 ), TNF-alfa, citocromo P450 e glutationa S-
transferase também parecem exacerbar o risco, facilitando a ocorrência de DHA em faixas de
consumo etílico inferiores às que citamos anteriormente.
Quando nenhum fator adjuvante está presente, a chance de cirrose alcoólica é
significativamente reduzida, mesmo em pacientes que bebem muito: algo em torno de 5%
apenas! O fato é que a maioria das pessoas que desenvolve DHA possui um ou mais fatores
adicionais de agressão hepática e, quanto maior a ingestão etílica diária, maior o risco e mais
rápida a evolução da doença...
QUADRO DE CONCEITOS II
De um modo geral, a influência de fatores adicionais de agressão hepática é
necessária para que o paciente passe do estágio de “esteatose alcoólica”
assintomática para a “esteato-hepatite” e, posteriormente, para a “cirrose”. Na
ausência de tais fatores, a probabilidade de surgir DHA avançada é muito baixa, em
torno de 5% apenas.
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Um detalhe interessante que todo médico precisa conhecer diz respeito à quantidade de álcool
presente em cada tipo de bebida. No entanto, apesar das diferenças na concentração etílica, a
DOSE PADRÃO de cada tipo de bebida contém sempre a mesma quantidade absoluta de
etanol, que é cerca de 12–15 g. Isso facilita na comparação entre elas. Observe a .
Tab. 1: conteúdo etílico das diferentes bebidas, dose padrão e limites
hepatotóxicos.
Mas como exatamente o álcool produz lesão hepática?
Em resumo, o que acontece é o seguinte : o excesso de etanol absorvido pela circulação porta é
metabolizado predominantemente na região centrolobular do lóbulo hepático, local onde
existe a maior concentração da enzima álcool desidrogenase. Durante tal processo, o oxigênio
acaba sendo intensamente consumido, o que gera hipóxia centrolobular . A hipóxia prejudica o
funcionamento das mitocôndrias, bloqueando a oxidação dos ácidos graxos que, desse modo,
se acumulam no interior da célula na forma de gotículas de gordura (esteatose). O principal
metabólito do etanol é o acetaldeído , molécula que, logo após ser formada, se liga
covalentemente a diversas proteínas teciduais, criando “neoantígenos”. Estes induzem uma
resposta autoimune que compõe o processo necroinflamatório do parênquima hepático
(hepatite). O acetaldeído também é diretamente tóxico, promovendo peroxidação das
membranas celulares e necrose hepatocitária... Outro fator contribuinte é o aumento de
permeabilidade da mucosa intestinal induzido diretamente pelo álcool, o que faz aumentar a
absorção de toxinas bacterianas como o lipopolissacarídeo (LPS ou “endotoxina”). A
translocação de LPS para o fígado através da veia porta estimula as células de Kupffer
(macrófagos hepáticos) a produzir citocinas como o TNF-alfa , que amplifica todos os
processos já descritos! A persistência ou recorrência desses insultos pode culminar em fibrose e
desestruturação do parênquima hepático (cirrose) caso as células estreladas sejam ativadas e
comecem a produzir colágeno.
PATOLOGIAPATOLOGIA
Como vimos, existem três “estágios” na evolução da DHA: esteatose, esteato-hepatite e cirrose.
Histologicamente, os três predominam na região central (perivenular) do lóbulo hepático (zona
3), o que ajuda a diferenciar a DHA de outras hepatopatias crônicas, como as hepatites virais,
que predominam na região periportal (zona 1).
Tabela 1
_
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ESTEATOSE HEPÁTICAESTEATOSE HEPÁTICA
Devido à hipóxia celular gerada na metabolização do etanol, os ácidos graxos não conseguem
ser oxidados pelas mitocôndrias e acabam se acumulando no citoplasma do hepatócito, onde
formam gotículas de gordura. Tal lesão, inclusive, já pode aparecer algumas horas após uma
única libação alcoólica… A esteatose da DHA costuma ser MACROvesicular, mas pode ser
microvesicular ou "mista" ( ). É importante reconhecer que a esteatose não é
patognomônica de DHA — existem diversas outras causas para este achado histopatológico (
 ) . A esteatose hepática induzida pelo álcool é prontamente reversível com a cessação
do etilismo.
Tab. 2: Causas de esteatose hepática de acordo com o tamanho das
gotículas de gordura.
Macrovesicular
Microvesicular
●
Álcool
●
Desnutrição
●
Figura 2 _
Tabela 2
_
Fig. 2: Esteatose hepática "mista", macro e microvesicular. Geralmente, a esteatose hepática alcoólica é
apenas MACROvesicular. A presença de microvesículas associadas (padrão misto) denota pior prognóstico.
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●
Obesidade
●
Diabetes mellitus
●
Corticosteroides 
●
Nutrição parenteral total 
●
Álcool
●
Esteatose aguda da gravidez
●
Síndrome de Reye
●
Ácido valproico
●
Tetraciclina
●
“Doença dos vômitos da Jamaica”
ESTEATO-HEPATITEESTEATO-HEPATITE
Aqui há o video de apostila 3.mp4, ele está na pasta 'videos apostila'.
Dizemos que a esteatose hepática está sendo complicada por um quadro de "hepatite alcoólica"
sobreposta quando todas as alterações a seguir forem notadas na biópsia hepática:
●
Necrose hepatocitária;
●
Infiltrado neutrofílico;
●
Distribuição perivenular (central) do infiltrado;
●
Corpúsculos de Mallory.*
*Alguns autores argumentam que os corpúsculos de Mallory não são "obrigatórios" para o
diagnóstico, uma vez que na prática eles raramente são encontrados.
O s corpúsculos de Mallory ( também chamados de “hialino de Mallory”) são
acúmulos intracitoplasmáticos de material eosinofílico. Não parecem ter papel
direto no dano hepático, representando, na verdade, apenas uma consequência da
lesão induzida pelo etanol. Apesar de clássicos da hepatite alcoólica, também
podem aparecer em outras condições, como: outras formas de esteatose; doença de
Wilson; colangite biliar primária; desnutrição grave; após cirurgia de derivação
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Wilson; colangite biliar primária; desnutrição grave; após cirurgia de derivação
jejunoileal para obesidade mórbida ; e após uso de certas drogas, como amiodaronatransplante hepático é obrigatória, e
múltiplos estudos demonstraram sua grande eficácia. Um esquema preconizado consiste na
HBIG intramuscular com o seguinte protocolo:
●
Dose inicial na fase anepática da cirurgia;
●
Dose diária na primeira semana pós-transplante;
●
Do s e mensal nos primeiros seis meses. Os níveis de anti-HBs devem ser monitorados
regularmente daí em diante, e toda vez que seu valor cair abaixo de 500 UI/ml, uma dose de
HBIG é ministrada.
A HBIG neutraliza as partículas virais circulantes, evitando que o vírus infecte os hepatócitos
do fígado novo...
Drogas antivirais, em conjunto com a HBIG, são recomendadas para os pacientes com DNA
viral detectável e/ou HBeAg positivo antes do transplante. As mais utilizadas na atualidade são
o tenofovir e o entecavir.
HEPATITE CHEPATITE C
A hepatite C é a principal etiologia que motiva o transplante hepático nos EUA, no Brasil e em
diversos países do Mundo Ocidental. A recidiva da doença no enxerto era a regra até pouco
tempo atrás, sendo descritas diversas estratégias visando sua prevenção (ex.: tratamento
antiviral pré, peri ou pós-transplante), todas apresentando sucesso variável, em geral pouco
expressivo. De fato, com os antigos esquemas terapêuticos nunca houve uma estratégia
preventiva comprovadamente eficaz, e muitos pacientes evoluíam com morbimortalidade
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significativa em função da recorrência da lesão no "fígado novo"... O diagnóstico da recidiva é
feito pela detecção do HCV-RNA no sangue, aliado à presença de alterações histopatológicas
na biópsia hepática compatíveis com hepatite viral.
Atualmente, o tratamento com drogas antivirais de ação direta está indicado para todos os
indivíduos infectados pelo vírus C (anti-HCV+ e HCV-RNA+), propiciando elevadas taxas de
CURA da infecção, com segurança e comodidade posológica. Para pacientes que já
desenvolveram cirrose hepática e se enquadram nos critérios de indicação de transplante, o
tratamento também está indicado... Este pode ser iniciado antes do transplante, nos casos
menos avançados de cirrose (MELD 27).
As mesmas drogas empregadas no tratamento habitual podem ser usadas em qualquer uma
dessas estratégias. A literatura tem mostrado excelentes taxas de resposta, evitando a recidiva
da infecção no enxerto, o que aumenta a sobrevida do paciente e do próprio enxerto.
APÊNDICEAPÊNDICE
MANEJO CIRÚRGICO DA HIPERTENSÃO PORTAMANEJO CIRÚRGICO DA HIPERTENSÃO PORTA
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
O principal objetivo do tratamento cirúrgico da hipertensão porta é a descompressão das
varizes esofagogástricas. Para isso, o cirurgião realiza procedimentos derivativos (os shunts );
nestas cirurgias, o sangue porta é desviado para a circulação cava (sistêmica), a pressão porta é
reduzida e as varizes descomprimidas. Outros procedimentos empregados para a redução da
pressão no sistema porta são as cirurgias de desvascularização ázigo-portal com esplenectomia,
na qual o sistema porta é "desconectado" do sistema cava.
As principais indicações de tratamento cirúrgico da hipertensão porta incluem:
●
Falência do tratamento endoscópico e medicamentoso (na impossibilidade de
utilizar o TIPS).
●
Sangramento de varizes gástricas ou gastropatia hipertensiva portal.
●
Dúvidas Acadêmicas do CapítuloTESTE SEU CONHECIMENTOConfira as dúvidas acadêmicas do capítulo clicando aqui
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Cirurgia de urgência: falência do tratamento endoscópico e farmacológico na fase
aguda (na impossibilidade de utilizar o TIPS), com a persistência do sangramento.
Antes de qualquer procedimento cirúrgico, uma avaliação do sistema porta, por meio de
ultrassonografia com Doppler e angiografia, é recomendada.
Quais são as consequências de um shunt (desvio) portossistêmico?
Para entendermos os principais efeitos colaterais das cirurgias derivativas, é importante que
tenhamos alguns conceitos em mente: apesar de ser uma veia, a porta drena o mesentério e
carreia para o fígado sangue rico em hormônios hepatotróficos e nutrientes; além disso, o
sangue porta leva também ao parênquima hepático substâncias provenientes do intestino para
serem detoxificadas. O maior exemplo é a amônia (proveniente do metabolismo proteico de
bactérias colônicas), que vai até o fígado para ser transformada em ureia.
Sendo assim, o sangue porta é fundamental para um bom funcionamento do hepatócito.
Quando desviamos o fluxo porta do fígado por algum procedimento cirúrgico, realmente
reduzimos a pressão neste território, mas o preço que se paga por isso é a possibilidade de
deterioração da função hepática e precipitação de encefalopatia portossistêmica .
PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOSPROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS
Existem três métodos cirúrgicos empregados no manejo da hipertensão porta:
1.
As derivações ou shunts descompressivos;
2.
Os procedimentos de desvascularização;
3.
Transplante de fígado.
As derivações cirúrgicas são divididas em três grupos:
1.
Derivações portossistêmicas não seletivas (ou totais) , que descomprimem a hipertensão presente
em todos os territórios do sistema porta;
2.
Derivações portossistêmicas parciais , que reduzem a pressão porta para níveis próximos a 12
mmHg;
3.
Derivações portossistêmicas seletivas (compartimentalizados), que descomprimem as varizes na
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Derivações portossistêmicas seletivas (compartimentalizados), que descomprimem as varizes na
região esofagogástrica, mas mantêm a hipertensão porta nas demais regiões.
DERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS NÃO SELETIVASDERIVAÇÕES PORTOSSISTÊMICAS NÃO SELETIVAS
Diversas opções cirúrgicas estão desenhadas na . Elas incluem:
●
Derivação porto-cava terminolateral ou fístula de Eck (não mais utilizado em
procedimentos eletivos).
●
Figura 1 _
_
Fig. 1: Opções cirúrgicas.
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Derivação porto-cava laterolateral .
●
Derivação mesocava .
●
Derivação esplenorrenal central .
As derivações porto-cava representam os procedimentos de maior eficácia no controle e
prevenção do sangramento varicoso e da ascite. Contudo, apresentam dois grandes
inconvenientes: (1) alto índice de encefalopatia e piora da função hepática; e (2) dificultam ou
impossibilitam a técnica cirúrgica do transplante.
A derivação mesocava (veja a imagem do canto inferior esquerdo, item 2 da ) e outros
tipos de interposição também são bastante efetivos na descompressão varicosa e na ascite, e
também têm alto índice de encefalopatia e disfunção hepática. A interposição geralmente é feita
com próteses artificiais. As vantagens sobre as derivações porto-cava são a mais fácil confecção
e o fato de não atrapalhar a cirurgia do transplante.
A derivação esplenorrenal central tem as mesmas características das demais derivações não
seletivas totais. A esplenectomia é realizada de rotina, talvez uma pequena vantagem, pela
resolução do hiperesplenismo.
As derivações não seletivas podem ser usadas como cirurgias de urgência no
sangramento varicoso, especialmente nos pacientes com ascite. Todavia, em
pacientes candidatos ao transplante hepático, a tendência atual é dar preferência
ao TIPS, pois este procedimento não dificulta a realização do transplante, ao
contrário da derivação não seletiva (que modifica a anatomia da veia cava inferior).
DERIVAÇÕES PORTOSSISDERIVAÇÕES PORTOSSIS ​TÊMICAS PARCIAISTÊMICAS PARCIAIS
Tais cirurgias também são conhecidas como derivações porto-cava calibradas ( ).
Figura 1
Figura 2 _
_
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Enquanto nas derivações não seletivas (totais) a comunicação portossistêmica tem um diâmetro
médio de 16 mm, o segredo das derivações parciais é a interposição de uma prótese com
diâmetro de 8–10 mm, restringindo o fluxo derivativo. Assim, embora haja descompressão
varicosa, o fluxo portal hepatopetale griseofulvina.
Perceba que, para receber o diagnóstico de “esteato-hepatite”, é preciso que, além de esteatose,
exista também necrose hepatocitária e infiltração do parênquima por leucócitos. A infiltração
por neutrófilos (leucócitos polimorfonucleares ) é um dos grandes marcos da esteato-hepatite
alcoólica! O TNF-alfa produzido pelas células de Kupffer (em resposta ao aumento da
translocação intestinal de LPS) é uma citocina que “recruta e estimula” esse tipo celular! Nas
hepatites virais, bem como em outras hepatopatias, o parênquima hepático geralmente é
infiltrado por leucócitos mononucleares . Vale dizer que a esteato-hepatite alcoólica também é
potencialmente reversível com a abstenção do etilismo. Observe a .
QUADRO DE CONCEITOS III
O que define a existência de "esteato-hepatite" é a presença de necrose
hepatocitária e infiltração por leucócitos num parênquima esteatótico. Na esteato-
hepatite alcoólica, o tipo de leucócito predominante é o neutrófilo polimorfonuclear .
Figura 3 _
_
Fig. 3: Esteatose macrovesicular e corpúsculos de Mallory (setas) num paciente com hepatite alcoólica.
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CIRROSE HEPÁTICACIRROSE HEPÁTICA
Assim como acontece em outras formas de cirrose, na etiologia alcoólica, a deposição de
colágeno no parênquima hepático é mediada pelas células estreladas perissinusoidais (ou
células de Ito ), que fisiologicamente servem como armazenadoras de vitamina A, mas, quando
o fígado é exposto a insultos necroinflamatórios persistentes ou repetitivos, podem ser ativadas
e conduzir à cirrotização. Na DHA, a fibrose se inicia na região centrolobular , tornando-se
panlobular num segundo momento. No começo o processo é potencialmente reversível, porém,
nos indivíduos que mantêm uma ingesta etílica elevada, a evolução para fibrose panlobular é
normalmente definitiva.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
A esteatose hepática "pura" costuma ser assintomática, com o paciente apresentando apenas
hepatomegalia ao exame físico. Alguns portadores de esteatose muito intensa referem
desconforto no quadrante superior direito do abdome além de náuseas e discreta icterícia.
Já a esteato-hepatite alcoólica geralmente se manifesta com uma ampla gama de sinais e
sintomas! Anorexia, hepatomegalia dolorosa, febre e icterícia acentuada constituem a síndrome
clássica de apresentação. Nesses casos, pode até mesmo fazer diagnóstico diferencial com a
colangite bacteriana. Cumpre ressaltar que a hepatite alcoólica também pode ser assintomática,
sendo reconhecida apenas por alterações laboratoriais sugestivas (ver adiante), num paciente
com história de etilismo importante. Ascite e hemorragia digestiva por rotura de varizes
esofagogástricas complicam até 30% dos casos de hepatite alcoólica aguda, mesmo na ausência
de cirrose preestabelecida! Tal fato é explicado por uma hipertensão porta “transitória”,
decorrente do edema hepatocelular difuso. Casos graves de hepatite alcoólica aguda são mais
propensos a desenvolver infecções bacterianas intercorrentes (ex.: pneumonia, ITU,
bacteremia), e a falência hepática fulminante pode ser a primeira manifestação em alguns
doentes.
Na cirrose alcoólica , o paciente cursa com manifestações clínicas inerentes a qualquer quadro
d e cirrose, isto é, sinais e sintomas das síndromes de falência hepatocelular (icterícia,
encefalopatia, hipoalbuminemia, coagulopatia, ginecomastia, aranhas vasculares) e hipertensão
porta (esplenomegalia, ascite, varizes esofagogástricas). Uma lesão independente do dano
hepático, porém clássica do alcoolismo (e, por conseguinte, altamente sugestiva de etiologia
alcoólica para a cirrose), é a contratura palmar de Dupuytren ( ).Figura 4 _
_
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LABORATÓRIOLABORATÓRIO
A esteatose hepática "pura" promove aumentos inespecíficos e flutuantes das
aminotransferases, com o restante do hepatograma normal ou levemente "tocado".
N a esteato-hepatite alcoólica , por outro lado, a elevação das aminotransferases é a regra,
apresentando, contudo, uma curiosa peculiaridade: relação AST/ALT > 2 (sempre)! É digno de
nota que raramente a AST ultrapassa 300 U/L em valores absolutos. Fosfatase alcalina e gama
GT também aumentam na hepatite alcoólica, mas nunca > 3x o LSN! Entre 60–90% dos casos
cursam com hiperbilirrubinemia direta, e níveis > 10 mg/dl indicam hepatite alcoólica “grave”.
Mesmo na ausência de cirrose, pode haver prolongamento do TAP (> 5 segundos acima do
controle) e hipoalbuminemia severa (mais de 2,5 g/dl), e tais achados também denotam
“gravidade”. Até 75% dos pacientes apresentam hipergamaglobulinemia policlonal. No
hemograma, é comum leucocitose com desvio à esquerda, que às vezes se manifesta como
“reação leucemoide” (leucocitose neutrofílica extrema). Cerca de 10% dos portadores de
hepatite alcoólica têm também plaquetopenia, devido ao efeito mielotóxico do álcool e/ou a um
hiperesplenismo secundário à hipertensão porta “transitória” (ver anteriormente). Anemia
macrocítica é comum, novamente por conta da mielotoxicidade do etanol, com ou sem
carência de folato associada.
Com relação às outras alterações, vale destacar que o fígado secreta ácido úrico na bile,
Fig. 4: Contratura palmar de Dupuytren.
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Com relação às outras alterações, vale destacar que o fígado secreta ácido úrico na bile,
eliminando parte deste metabólito pela via intestinal. Logo, na disfunção hepática, é comum
hiperuricemia. O fígado também é um sítio de armazenamento e metabolização de
triglicerídeos. Logo, na disfunção hepática, é comum haver hipertrigliceridemia. A hipergama
policlonal, por sua vez, ocorre devido à hiperativação exagerada e generalizada do sistema
imune humoral. Observe a .
Tab. 3: Alterações laboratoriais sugestivas de hepatite alcoólica.
Enzimas Hepáticas
●
Relação AST/ALT > 2.
●
AST geralmente ≤ 300 U/L.
●
FAL e GGT aumentadas até 3x o LSN.
Provas de Função Hepática
●
Hiperbilirrubinemia direta.
●
Hipoalbuminemia.
●
TAP/INR alargados.
Alterações Metabólicas
●
Hiperglicemia.
●
Hipertrigliceridemia.
●
Hiperuricemia.
●
Hipocalemia, hipomagnesemia e hipofosfatemia (desnutrição).
●
Ácido fólico reduzido.
Alterações Hematológicas
●
Anemia macrocítica.
●
Leucocitose com desvio à esquerda (às vezes reação leucemoide).
●
Plaquetopenia (10%).
●
Hipergamaglobulinemia policlonal (até 75%).
As alterações laboratoriais encontradas na cirrose alcoólica s ã o indistinguíveis daquelas
observadas em outras causas de cirrose hepática.
Tabela 3
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observadas em outras causas de cirrose hepática.
QUADRO DE CONCEITOS IV
O achado laboratorial mais clássico das formas graves de DHA é relação AST/ALT
> 2, com níveis de AST geralmente abaixo de 300 U/L.
BIÓPSIA HEPÁTICABIÓPSIA HEPÁTICA
A biópsia hepática NÃO É OBRIGATÓRIA para estabelecer o diagnóstico de DHA em
nenhuma de suas formas. A história e o exame físico, em associação aos achados laboratoriais
característicos que descrevemos, costumam permitir um diagnóstico essencialmente “clínico”,
em particular quando outras etiologias de doença hepática puderem ser afastadas. No entanto,
podemos (e devemos) indicar a biópsia hepática em determinadas circunstâncias, por exemplo::
(1) dúvida diagnóstica; (2) quando necessário para descartar a coexistência de outros processos
patológicos; e (3) avaliação acurada do prognóstico.
TRATAMENTOTRATAMENTO
SAIBA MAIS…
Achados laboratoriais que denunciam consumo excessivo de álcool.
Uma pergunta de extrema importância para quem trata o alcoolismo é: como ter
certeza de que o paciente está falando a verdade quando ele afirma estar abstêmio?
Não raro, na prática, o paciente mente para o médico! Felizmente, alguns indícios
laboratoriais sugerem que o paciente continua bebendo muito. As principais "pistas"
são:
●
Relação AST/ALT > 2;
●
GGT persistentemente elevada;
●
Macrocitose (VCM > 100 fl);
●
Pancitopenia;●
Aumento sérico da "Transferrina Deficiente em Carboidratos" (TDC).
Todas essas alterações podem ser explicadas por um único fenômeno: a toxicidade
direta do etanol (hepatotoxicidade, mielotoxicidade, e toxicidade "bioquímica", na
qual o próprio etanol reage e modifica a estrutura de certas proteínas plasmá ​ticas,
como a transferrina).
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TRATAMENTOTRATAMENTO
MEDIDAS GERAISMEDIDAS GERAIS
A principal é a abstinência ao álcool , indicada para todos os pacientes. Diversos medicamentos
podem "ajudar" o paciente a parar de beber, reduzindo a "fissura" da dependência, desde que
tomados no contexto de um programa multidisciplinar de tratamento do alcoolismo: (1)
naltrexona; (2) acamprosato; e (3) baclofeno. A abstinência reverte a esteatose hepática e a
esteato-hepatite, podendo reverter também a cirrose alcoólica (fibrose) em suas fases iniciais.
Nos portadores de DHA grave (hepatite/cirrose), o suporte nutricional é imprescindível, já que a
maioria desses indivíduos apresenta desnutrição. Temos que fornecer um adequado aporte
calórico ( 40 kcal/kg de peso/dia ) a fim de evitar complicações potencialmente fatais, como
hipoglicemia, cetoacidose alcoólica e catabolismo muscular esquelético acelerado, garantindo
também uma reposição proteica vigorosa ( 1,5 a 2 g/kg de peso/dia ), além de repor
micronutrientes ( ácido fólico, tiamina, zinco etc. ) conforme a necessidade. A terapia nutricional
melhora as alterações hepáticas (clínicas, laboratoriais e histopatológicas), porém nunca foi
confirmado se ela consegue ou não prolongar a sobrevida.
TRATAMENTO ESPECÍFICO DA HEPATITE ALCOÓLICATRATAMENTO ESPECÍFICO DA HEPATITE ALCOÓLICA
AGUDAAGUDA
Além das medidas gerais já citadas, portadores de hepatite alcoólica aguda que apresentam
ENCEFALO ​PATIA e/ou um ÍNDICE DE FUNÇÃO DISCRIMINANTE DE MADDREY ≥
32 se beneficiam da corticoterapia por um mês (com redução da mortalidade em curto prazo).
O esquema de escolha é: prednisolona 32 mg/dia VO ( o u doses equivalentes de outras
formulações de glicocorticoide).
A prednisolona é preferida por alguns autores em relação à tradicional prednisona
porque esta última requer conversão hepática à prednisolona (forma ativa), um
processo que pode estar comprometido na hepatite alcoólica grave.
O Índice de Função Discriminante de Maddrey (IFD) foi especificamente validado na literatura
para avaliar a probabilidade de óbito num paciente com hepatite alcoólica. Valores ≥ 32
identificam pacientes nos quais o risco da doença supera o risco do tratamento, servindo,
portanto, como "ponto de corte" para indicar a corticoterapia. Sua fórmula é:
IFD = 4,6 x (TAP do paciente - TAP do controle) + bilirrubina total
Se houver alguma contraindicação ao corticoide, a droga de escolha passa a ser a pentoxifilina
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Se houver alguma contraindicação ao corticoide, a droga de escolha passa a ser a pentoxifilina
(400 mg VO 3x/dia durante um mês), que também reduz mortalidade em curto prazo,
principalmente por reduzir a ocorrência de síndrome hepatorrenal. Cumpre ressaltar que
alguns estudos demonstraram que a associação de glicocorticoide com pentoxifilina não
oferece qualquer vantagem terapêutica quando comparado ao tratamento com glicocorticoide
isolado — logo, esta associação não deve ser usada!
Existem ainda múltiplas abordagens experimentais para o tratamento da hepatite alcoólica —
nenhuma delas foi adequadamente validada na literatura. As principais são: propiltiouracil,
oxandrolona (esteroide anabolizante), Same (S-Adenosil-L-Metionina), infliximabe, anti​oxi​‐
dantes e "diálise hepática".
TRATAMENTO ESPECÍFICO DA CIRROSE ALCOÓLICATRATAMENTO ESPECÍFICO DA CIRROSE ALCOÓLICA
Durante muito tempo, considerou-se que a colchicina seria capaz de bloquear ou reverter a
evolução da fibrose hepática. Todavia, devido à falta de evidências consistentes de benefício, tal
conduta não é mais utilizada... Assim, o tratamento da cirrose alcoólica é semelhante ao
tratamento genérico de outras formas de cirrose hepática: controle das complicações e sempre
que possível, nas cirroses que apresentam dano funcional significativo ou franca
descompensação basal (Child B ou C, respectivamente), encaminhar o paciente para o
transplante ortotópico de fígado. Lembre-se de que, na DHA, o transplante tem como pré-
requisito a abstinência alcoólica por pelo menos seis meses . Os resultados costumam ser
satisfatórios, comparáveis aos do transplante em outras hepatopatias.
PROGNÓSTICOPROGNÓSTICO
Curto prazo : a mortalidade em curto prazo num quadro de hepatite alcoólica gira em torno de
34% em poucos meses (20% no primeiro mês). Os principais fatores de mau prognóstico são:
●
Idade avançada;
●
Bilirrubina > 10 mg/dl;
●
Coagulopatia;
●
Encefalopatia hepática;
●
Azotemia;
●
Grau de leucocitose;
●
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●
Coexistência de infecção/sepse;
●
Não responsividade ao corticoide;
●
Escassez de esteatose na biópsia;
●
Reversão do fluxo portal na USG com Doppler.
A falta de resposta após sete dias de tratamento com glicocorticoide indica péssimo
prognóstico! Vários escores foram validados com o intuito de estimar a probabilidade de
resposta ao tratamento: (1) escore de Lille; (2) escore de Glasgow para hepatite alcoólica; (3)
“ABIC” ( Age, Bilirubin, INR, Creatinine ) ; e (4) o próprio MELD. O surgimento de injúria
renal aguda num paciente com hepatite alcoólica tem sido considerado o melhor preditor
isolado da chance de óbito nos próximos 90 dias.
Longo prazo : pacientes que se recuperam de um episódio de hepatite alcoólica aguda têm
chance de óbito nos próximos três anos até 10x maior do que a população geral de mesma
faixa etária. O risco persiste após esse período e depois de cinco anos, inclusive, a mortalidade
pode chegar a 85%… A chance de hepatocarcinoma está aumentada em portadores de cirrose
alcoólica, sendo ainda maior naqueles que possuem extensos depósitos de ferro na biópsia
hepática (ex.: coexistência de hemocromatose, com mutações no gene C282Y). O risco de
neoplasias extra-hepáticas após o transplante ortotópico de fígado é maior em alcoolistas em
comparação com outros pacientes. Os motivos são: (1) o álcool também lesa outros órgãos; e
(2) com frequência esses indivíduos também são fumantes.
ESTEATOSE HEPÁTICA ESTEATOSE HEPÁTICA METABÓLICA (MASLD)METABÓLICA (MASLD)
A esteatose hepática metabólica (MASLD em inglês — doença hepática esteatótica associada à
disfunção metabólica) se refere à existência de esteatose hepática (acúmulo de gordura no
fígado) em indivíduos que apresentam pelo menos um fator de risco cardiometabólico (obesidade,
diabetes mellitus , dislipi​demia e/ou hipertensão arterial). Trata-se de uma condição comum, que
pode evoluir para cirrose ao longo do tempo.
O acúmulo de gordura no fígado pode ter outras etiologias (drogas, etilismo, doença celíaca) e,
no passado, isso gerou uma enorme confusão quanto à terminologia, pois só se considerava o
diagnóstico de MASLD quando outras causas de esteatose eram excluídas. Contudo, sabemos
que a MASLD pode coexistir com outras etiologias de esteatose, ou seja, não se trata de um
diagnóstico de exclusão, desde que seus critérios diagnósticos sejam respeitados (esteatose
hepática + pelo menos um fator de risco cardiometabólico).
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Para se dizer que um paciente é portador de esteatose , basta identificar um excesso de gordura
no parênquima hepático através de exames de imagem (USG, TC, RM) ou mesmo na biópsia (
 ).Figura 5 _
_
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NOMENCLATURA ATUALNOMENCLATURA ATUAL
O excesso de gordura no fígado pode ou não causar inflamação do parênquima hepático
(esteato-hepatite), e alguns pacientes com inflamação persistente podem evoluir para
fibrose/cirrose. Assim, são propostos os seguintes termos:
EPIDEMIOLOGIAEPIDEMIOLOGIA
A MASLD afeta cerca de 30% da populaçãomundial , com variações a depender da localidade
geográfica (maior na América do Sul e menor na Europa), sendo mais comum no sexo
masculino . Sua prevalência vem aumentando com o passar dos anos, devido à pandemia de
obesidade e síndrome metabólica.
FATORES DE RISCOFATORES DE RISCO
Como já dissemos, a MASLD é definida pela presença de esteatose hepática e pelo menos um
fator de risco cardiometabólico. Logo, estes representam os principais fatores de risco para
MASLD, mas também há outros. São eles:
●
Sobrepeso/obesidade, isto é, IMC ≥ 25 kg/m ² (ou IMC ≥ 23 kg/m ² em asiáticos).
●
Hipertensão arterial.
●
Fig. 5: Observe a ecotextura do parênquima hepático normal — (A) comparada à ecotextura difusamente
aumentada de um fígado esteatótico (o fígado “brilha” mais) — (B) .
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●
Dislipidemia (HDL reduzido + triglicerídeos aumentados).
●
Diabetes mellitus .
●
Fatores de risco adicionais: ovários policísticos, apneia obstrutiva do sono, doença
renal crônica e história de colecistectomia.
Quanto mais fatores o paciente tiver, maior o risco de evoluir com MASH. É interessante que,
apesar de esses fatores também aumentarem o risco cardiovascular global, ainda não está claro
se a presença de MASLD em si constitui um fator de risco cardiovascular adicional e
independente. Nos últimos anos, têm surgido evidências apontando que sim, isto é, a MASLD
talvez seja mesmo um fator de risco cardiovascular independente. A principal causa de óbito
em pacientes com MASLD são as doenças cardiovasculares...
PATOGÊNESEPATOGÊNESE
A exata patogênese da MASLD ainda não foi totalmente esclarecida. A teoria mais aceita
implica a resistência à insulina como alteração básica para o desenvolvimento da lesão hepática,
num contexto de hábitos de vida onde o consumo de energia é maior do que o gasto
metabólico, levando à formação de estoques de gordura nos hepatócitos. A inflamação
sistêmica crônica (que costuma acompanhar os principais fatores de risco cardiometabólicos)
também exerce papel central no surgimento da doença.
Já foram identificadas algumas variantes genéticas associadas à progressão da MASLD para
MASH e cirrose. Os principais genes envolvidos seriam o PNPLA3 e o IFNL4 . A obesidade e
uma dieta rica em gorduras e carboidratos são fatores que ativam a expressão desses genes.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICASMANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
A maioria dos portadores de MASLD é assintomática . Eventualmente, poderemos atribuir
queixas como fadiga e um vago desconforto no abdome superior direito à MASLD...
A doença é tipicamente descoberta após o encontro de um aumento leve a moderado das
aminotransferases e/ou presença de esteatose hepática em exames de imagem solicitados por
outros motivos. De forma incomum, o paciente pode se apresentar com cirrose hepática e suas
complicações, após anos de doença silenciosa. Nestes casos, uma investigação minuciosa (que
afasta outras hepatopatias) acaba concluindo que a provável causa da cirrose é a MASLD se o
paciente possuir fatores de risco cardiometabólico! Antigamente — quando o conceito de
MASLD ainda não havia sido desenvolvido —, a maior parte desses pacientes era taxada
como “cirrose criptogênica”.
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como “cirrose criptogênica”.
Tab. 4
Esteatose Hepática
Metabólica
(MASLD)
Esteatose hepática (> 5% do fígado é “gorduroso” em
métodos de imagem ou biópsia) na presença de pelo
menos um
fator de risco cardiometabólico, e na ausência de outras
causas de esteatose (sem uso de drogas associadas à
esteatose,
doença celíaca e etilismo ausente ou mínimo*).
Esteato-hepatite Metabólica
(MASH)
Esteatose hepática + evidência histológica de inflamação
e injúria hepatocelular (ex.: balonização dos hepatócitos)
com ou sem fibrose associada.
Cirrose por MASH
Cirrose hepática com histologia atual ou prévia de MASH
ou história de MASLD, na ausência de outras etiologias
para cirrose.
Esteatose Hepática por
Disfunção
Metabólica e Álcool
(MetALD)
Esteatose hepática + pelo menos um fator de risco
cardiometabólico + consumo “moderado” de álcool (20–50
g/d para mulheres e 30–60 g/dia para homens). Nesta
faixa de etilismo, a presença de esteatose hepática é
igualmente atribuída às duas causas... Por outro lado,
indivíduos com consumo “pesado” de álcool (> 50 g/d
para mulheres e > 60 g/d para homens), mesmo que
tenham fatores de risco cardiometabólicos, serão
diagnosticados apenas com esteatose hepática alcoólica.
Esteatose Hepática
Criptogênica
Esteatose hepática na ausência de fatores de risco
cardiometabólico ou qualquer outra etiologia identificável.
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*Considera-se como “etilismo mínimo” um consumo de álcool inferior a 20g/dia para mulheres e 30
g/d para homens. 
Obs.: a dose “padrão” de qualquer bebida alcoólica tem em média 14 g de álcool (ex.: uma lata de
cerveja, uma taça de vinho, uma dose de uísque etc.).
O exame físico costuma ser normal na MASLD sem cirrose, mas alguns pacientes podem
apresentar discreta hepatomegalia (> 16 cm) na palpação ou ultrassonografia abdominal (5–
18% dos casos). Portadores de cirrose hepática apresentarão os estigmas habituais desta
condição (eritema palmar, ginecomastia, telangiectasias, icterícia, ascite etc.).
LABORATÓRIOLABORATÓRIO
Como dissemos, pode haver aumento leve a moderado (2–5x o LSN) das aminotransferases
(ALT e AST, com predomínio da primeira). As enzimas canaliculares (FAL e GGT) também
podem estar discretamente aumentadas (2–3x o LSN). Outros parâmetros como bilirrubina e
albumina em geral são normais, exceto na presença de cirrose.
Contudo, o hepatograma pode ser completamente normal em indivíduos com MASLD... O
fato é que as alterações do hepatograma, quando presentes, não predizem a existência de
esteato-hepatite! O único método capaz de identificar esteato-hepatite e estimar sua gravidade é
a biópsia hepática (análise histopa​tológica).
Outro parâmetro laboratorial que costuma estar alterado nesses pacientes é a ferritina sérica e,
às vezes, a saturação de transferrina (ambos podem estar elevados). Existem evidências de que
ferritina > 1.5x o LSN em pacientes com MASLD sinaliza maior risco de esteato-hepatite e
fibrose hepática avançada .
AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICAAVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA
Devemos suspeitar de MASLD em pacientes que apresentem pelo menos um dos critérios a
seguir:
●
Esteatose hepática em métodos de imagem;
SAIBA MAIS...
Porque a ferritina aumenta na MASLD?
O processo de acúmulo de gordura nos hepatócitos geralmente é acompanhado por
deposição local de ferro. Como a ferritina é o marcador dos estoques de ferro, seus
níveis séricos se elevam em proporção direta a este acúmulo.
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●
Aumento inexplicado das aminotransferases;
●
Dois ou mais fatores de risco cardiometabólicos;
●
Parentes de primeiro grau com cirrose hepática por MASH.
Observe na u m fluxograma de avaliação diagnóstica comumente utilizado na
prática.
Em todo paciente suspeito para MASLD, devemos pesquisar a existência de outras possíveis
etiologias para esteatose, firmando-se o diagnóstico de MASLD quando nenhuma outra causa
for encontrada... Conforme observado no fluxograma e já comentado anteriormente, um
dilema clínico frequente é a diferenciação entre MASLD, MetALD e doença hepática
Figura 6 _
_
Fig. 6: Fluxograma para avaliação diagnóstica da esteatose hepática.
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dilema clínico frequente é a diferenciação entre MASLD, MetALD e doença hepática
alcoólica. Essa diferenciação é facilmente estabelecida após uma análise cuidadosa do grau de
etilismo do paciente (sem etilismo = MASLD; etilismo leve a moderado = MetALD; etilismo
pesado = doença hepática alcoólica).
As principais drogas associadas à esteatose hepática são:
●
Amiodarona.
●
Glicocorticoides.
●
Metotrexato.
●
Tamoxifeno.
A investigação de esteatose hepática deve incluir a solicitaçãodos seguintes exames
laboratoriais, com o objetivo de avaliar a função hepática e pesquisar outras causas de
hepatopatia:
●
Hepatograma “completo” (aminotransferases, enzimas canaliculares, bilirrubina,
albumina e TAP/INR).
●
Hemograma.
●
Glicemia de jejum.
●
Lipidograma (colesterol total, HDL, LDL e TG).
●
Sorologias virais (hepatites A, B e C).
●
Ferro sérico, TIBIC, saturação de transferrina e ferritina.
●
Anticorpo antimitocôndria (AMA).
SAIBA MAIS...
Outro dado que ajuda a diferenciar a MASLD da doença hepática alcoólica é a
relação AST/ALT , que é caracteristicamente > 2 desde o início da lesão hepática
pelo álcool e 2
independentemente da etiologia).
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Anticorpo antimitocôndria (AMA).
●
Alfa-1-antitripsina.
●
Anti-TGT IgA (pesquisa de doença celíaca).
Exames solicitados em cenários específicos:
●
FAN, dosagem de IgG e anticorpo antimúsculo liso (para mulheres jovens,
pacientes com aminotransferases > 5x LSN e/ou história de doença autoimune);
●
Ceruloplasmina (para pacientes 5% dos
hepatócitos estão repletos de gordura (“esteatóticos”) na amostra coletada. Ressalte-se que é
bastante comum o encontro concomitante de aumento do ferro hepático nesses indivíduos.
MASLD e MASH são bastante distintas em termos histopatológicos e, por este motivo, a
biópsia representa a única forma de se fazer essa diferencia- ção (exames de imagem ou
laboratoriais não são capazes de distinguir entre uma entidade e outra)! Veja a .Tabela 5
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Tab. 5
MASLD
●
Esteatose isolada.
●
Esteatose + inflamação lobular ou portal, mas sem balonização
dos hepatócitos.
●
Esteatose + balonização dos hepatócitos, mas sem inflamação
lobular ou portal.
MASH
●
Esteatose + balonização dos hepatócitos + inflamação lobular
(predomínio na zona 3, isto é, na região centrolobular). Não é
obrigatório ter fibrose (ela pode ou não estar presente).
Existe um sistema de classificação histológica da MASH ( ):
Tab. 6
Grau
Leve (grau 1)
Macrovesículas de gordura em mais de 2/3 da amostra.
Eventuais hepatócitos balonizados na zona 3
(centrolobular). Infiltrado inflamatório escasso, composto
por polimorfonucleares e linfócitos no interior do ácino
hepático, com pouca ou nenhuma inflamação crônica na
região portal.
Moderada (grau 2)
Qualquer grau de esteatose, balonização evidente de
hepatócitos (predominante na zona 3), infiltrado
inflamatório evidente com predomínio de
polimorfonucleares, pode haver fibrose pericelular na
zona 3 além de se notar inflamação crônica leve a
moderada nas regiões intra-acinar e portal.
Severa (grau 3) 
Esteatose pan-acinar, balonização grosseira e desarranjo
da arquitetura do lóbulo, predominantemente na zona 3,
infiltrado inflamatório evidente com predomínio de
polimorfonucleares, inflamação crônica leve a moderada
Tabela 6
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polimorfonucleares, inflamação crônica leve a moderada
intra-acinar e portal.
Estágio
F0
Ausência de fibrose.
Fibrose F1
Fibrose perisinusoidal na zona 3.
Fibrose F2
Fibrose perisinusoidal na zona 3 + fibrose portal.
Fibrose F3
Fibrose perisinusoidal na zona 3 + fibrose portal “em
ponte”.
Fibrose F4
Cirrose.
Vamos repetir este conceito, para você não se confundir... Não é obrigatório fazer biópsia
hepática em todos os pacientes, dados os riscos e custos elevados do procedimento. Já
mencionamos anteriormente as situações em que a biópsia pode ser considerada...
ESTADIAMENTO DA MASLDESTADIAMENTO DA MASLD
O estadiamento da MASLD visa determinar o grau de fibrose hepática do paciente . Para tanto,
vamos preferir métodos não invasivos capazes de estimar a “rigidez” do parênquima hepático,
como a elastografia , reservando-se a biópsia para os casos inconclusivos.
O tipo de elastografia mais utilizado é a ultrassonográfica. A seguir, um guia para a conduta a
ser adotada após este exame:
●
Uma rigidez hepática 12 kPa sugere fibrose avançada ou cirrose;
●
Uma rigidez hepática entre 8–12 kPa é inconclusiva, devendo-se complementar o estadiamento
com elastografia por RM. A conduta subsequente em função deste último exame é:
�
Rigidez hepática 3.63 kPa sugere fibrose avançada ou cirrose.
Também é possível fazer o estadiamento inicial da MASLD com escores que se baseiam em
exames laboratoriais, como o FIB-4 (que utiliza idade, contagem plaquetária e níveis de ALT e
AST). Um FIB-4 > 3.25 identifica portadores de cirrose. A partir de um valor maior ou igual a
1.3, recomenda-se realizar a elastografia (por USG ou RM).
TRATAMENTOTRATAMENTO
MEDIDAS GERAISMEDIDAS GERAIS
São indicadas para todos os pacientes... Abstenção do etilismo; imunização contra as hepatites
A e B se paciente suscetível, além de atualização do calendário vacinal como um todo; controle
de cada um dos fatores de risco cardiovascular existentes (HAS, DM, dislipidemia).
PERDA PONDERALPERDA PONDERAL
A perda de peso é a principal medida terapêutica para os portadores de MASLD/MASH , uma
vez que quase todos têm sobrepeso (IMC ≥ 25 kg/m ² ) ou obesidade (IMC ≥ 30 kg/m ² ). A
redução do peso corpóreo (5–7% do peso inicial para portadores de MASLD e 7–10% para
portadores de MASH) comprovadamente melhora as alterações do hepatograma e da
histologia hepática, além de reduzir a resistência insulínica e aumentar a qualidade de vida do
paciente.
Inicialmente, recomenda-se mudanças no estilo de vida, com dieta + atividades físicas . Também
podemos recorrer aos tratamentos farmacológicos ou cirúrgicos da obesidade, de acordo com
suas recomendações habituais.
Pacientes obesos (IMC ≥ 30 kg/m²) com MASH que não atingem a meta de perda ponderal
após 6 meses de tratamento conservador geralmente são encaminhados à cirurgia bariátrica . É
interessante que pode haver uma piora transitória da lesão hepática após a cirurgia, devido
justamente à perda ponderal acelerada (que temporariamente pode agravar a esteatose
hepática). Assim, é mandatório monitorar o hepatograma de forma regular nos primeiros seis
meses de pós-operatório, bem

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