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ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 109 MAIS AMOR SEM FAVOR: A POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO JURÍDICO DO POLIAMOR FRENTE AOS VALORES MONOGÂMICOS NO BRASIL Yllen Garcia Gomes de Albuquerque1 RESUMO: O presente artigo tem por escopo analisar a possibilidade dos indivíduos adeptos ao poliamorismo serem reconhecidos pelo Direito como entidade familiar, obtendo a regulamentação de suas relações, frente aos valores monogâmicos brasileiro. No decorrer de sua abordagem, é usado o método dedutivo, com o procedimento histórico e analítico, bem como as técnicas de pesquisa bibliográfica e documental. Nesse contexto, será aludida a evolução história vivenciada pelo instituto familiar, seus conceitos e atributos, além de explanar a doutrina do Poliamor, vista por diferentes óticas científicas e por fim, discutir sobre a possível legalização dessas relações plúrimas em um ordenamento que tem por base a monogamia. Observa-se um impasse relacionado à matéria: a omissão do sistema jurídico em debater sobre a existência das uniões poliafetivas e como proceder em tal situação. Assim sendo, o tema apresentado mostra-se de profunda relevância, pois objetiva resguardar a liberdade e a proteção de pessoas que se encontram à margem da sociedade, além de trazer importantes reflexos nas áreas do direito familiar e sucessório e ainda no âmbito cultural e social. Portanto, a referente temática, mesmo sendo uma realidade estampada, não se encontra discutida na atual jurisprudência, nem avaliada pelo aparato legislativo deste país, demonstrando a urgente necessidade de enxergá-los, iniciar estudos aprofundados e inseri-los no ordenamento sócio-jurídico, no intuito de solucionar tal insegurança legal. Palavras-chaves: Entidade familiar. Monogamia. Reconhecimento jurídico do Poliamor. INTRODUÇÃO A família sempre foi um organismo de grande importância jurídica, econômica, cultural e social, sendo então, inclusa na rede de proteção estatal. A Constituição Federal deixa expresso seu valor, considerando-a “base da sociedade”, conforme o artigo 226. Atualmente, no Brasil, assim como nos demais países ocidentais, o modelo familiar padrão e predominante é o monogâmico, deixando desamparados indivíduos que não se enquadram nos parâmetros impostos por tais diretrizes. Deste modo, aqueles que não seguem a doutrina monogâmica, encontram-se discriminados e sem respaldo legal, a exemplo dos adeptos ao poliamorismo, uma ideologia que defende a vivência do amor de uma forma não convencional e poliafetiva, ou seja, os envoltos estabelecem um relacionamento afetuoso com mais de uma pessoa ao mesmo tempo, onde ambos livremente concordam com tal prática. Pode-se observar uma relação não exclusiva, consentida e de boa-fé, todavia, passa despercebida pelo 1 Pós-graduanda em Direito Civil e Processo Civil pela Faculdade Sucesso- FACSU. Graduada no curso de Direito pelo Centro Universitário de Patos- UNIFIP. ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 110 sistema jurídico-estatal, tornando-se um grande problema. Destarte, o presente artigo propõe uma discussão teórica dentro do ramo do Direito de Família, acerca da possibilidade dos relacionamentos poliamoristas serem reconhecidos pelo aparato legal brasileiro como uma das formas de entidade familiar, com o objetivo de cessar esta insegurança jurídica. Os argumentos aqui utilizados não possuem a intenção de criticar a monogamia como escolha pessoal, tampouco tomar partido por um dos lados. O real intuito, diante da diversidade das uniões afetivas contemporâneas, é refletir sobre a imposição normativa do valor monogâmico na construção familiar, fato este que o torna único e excludente, confrontando com direitos individuais, a liberdade e dignidade da pessoa humana. Utilizou-se de recortes bibliográficos para confecção da presente pesquisa, extraídos de diversas fontes como: a doutrina, leis e jurisprudência atual, bem como faz uso do procedimento histórico, para melhor compreender a temática. No desenvolvimento, pretende-se, primeiramente, elucidar a conceituação, características e a evolução histórica do instituto familiar. Na segunda sessão descreve a doutrina poliamorista com suas peculiaridades, estudada por diversas áreas científicas, sendo finalizado com a terceira sessão, a qual discute a possibilidade da legalização do poliamor como entidade familiar, frente à predominância dos valores monogâmicos. Portanto, o estudo da temática em comento é de fundamental importância para o ordenamento jurídico e todo meio social, visto que abrange a unidade familiar, bastante resguardada pelo Estado, além de mostrar a evolução dos variados modelos de família baseados na afetividade, associada à necessidade do Direito em acompanhar tais alterações, não restando assim, omissões e inseguranças legislativas. DEFINIÇÕES DO TERMO FAMÍLIA: CARACTERÍSTICAS E EVOLUÇÃO DO INSTITUTO FAMILIAR Ao se avaliar as especificidades acerca da família, é necessário apreciar inicialmente os traços históricos, compreender os conceitos e funções, a possibilidade do seu reconhecimento jurídico e a relevância da família para a humanidade. O termo “família” não pode ser considerado apenas um instituto com diretriz unicamente biológica ou natural, contudo deve analisá-lo de forma associada, como um ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 111 artefato cultural, uma vez que está em processo de construção contínua e possui reflexos no meio social, econômico e jurídico. Considerada uma instituição, bem como um mecanismo de socialização essencial, a família é necessária à sociedade, manifestando-se como algo mais significativo que apenas um agrupamento de indivíduos enlaçados pelo matrimônio ou por uma ligação parental; é uma comunhão de vidas, marcados pela afetividade, contendo em seu interior relações particulares, como também, financeiras. Não há como o sujeito existir independente do seu espaço social, visto que a “representação de si constrói-se no cruzamento de interações diversas [...]: tornamo-nos nós mesmos na troca com aqueles que nos envolvem, que nos fazem aquilo que somos” (KAUFMANN, 2002, p. 84). Em âmbito econômico, a família perdura como importante peça de produção desde antes da época industrial, tendo em vista um maior destaque na efetuação de alguns planejamentos e atividades quando existe no seio familiar um incentivo e a parceria entre os membros, comparado a situações que os mesmo atuam de forma isolada. (BÉNABENT, 2003, p. 01) Em relação ao aspecto forense, a entidade familiar se encontra presente nos ordenamentos jurídicos, de forma que gera efeitos para o Direito, tendo o Estado o encargo de zelar pela proteção da estrutura familiar e ainda de regulamentá-la perante os valores e normas que a cercam, fazendo jus a uma ampla e merecedora proteção jurídico-estatal. Lembrando que essa intercessão por parte do Estado, em detrimento de assuntos familiares, deve ser refletida e discutida com cautela. (BIROLI, 2014) Nessa linha de pensamento, reforça Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 23) ao afirmar que “Em qualquer aspecto em que é considerada, aparece a família como uma instituição necessária e sagrada, que vai merecer a mais ampla proteção do Estado.” É inegável o modo como o instituto familiar se faz presente em todas as dimensões da vida, desde os assuntos individuais aos coletivos. A família demarca sua força e influência, atravessando todas as épocas, vivências e searas de proteção legal. Destarte, a estrutura familiar carrega uma notável importância, de modogeral e especialmente quando se trata de sua evolução, assim FARIAS e ROSENVALD (2013, p. 41) apresenta o seguinte posicionamento: [...] a família tem o seu quadro evolutivo atrelado ao próprio avanço do homem e da sociedade, mutável de acordo com as novas conquistas da humanidade e descobertas científicas, não sendo crível, nem admissível, que ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 112 esteja submetida a ideias estáticas, presas a valores pertencentes a um passado distante, nem a suposições incertas de um futuro remoto. É realidade viva, adaptada aos valores vigentes. Deste modo, a mutação dos meios familiares que é revelada no cotidiano, se mostra descrita no próprio progresso da humanidade, a qual vive em constante mudança, não sendo a família, portanto, uma estrutura fixa, presa aos ditames do passado ou até mesmo a uma possibilidade incerta de futuro. Sendo reconhecido como o elemento social mais antigo da humanidade, a família e o vasto ramo do direito que dela nasce, encaminham todos a buscar compreender melhor seu conceito e sua evolução no decorrer dos séculos. (GONÇALVES, 2014) No decurso de muitos anos, a definição de família estava interligada à sagrada união matrimonial, formando um modelo de família tradicional, composto por um homem, uma mulher e seu(s) filho(s), sendo então o homem considerado o patriarca, enquanto a esposa e filhos eram hierarquicamente inferiores, devendo àquele obediência. (DIAS, 2017). Essas referências perduraram no transcorrer do tempo, até esbarrar no período da Revolução industrial, onde o casamento ganhou uma maior liberdade entre os nubentes, de forma que passou de algo arranjado para um laço de amor duradouro como principal projeto. Posto isto, o sentimento ganha espaço e relevância, chegando ao que está sendo construído hoje em dia, onde o afeto é o foco principal. (MELLO, 2017) Assim sendo, atualmente vivenciamos o período da pós-modernidade, o qual é representado por relacionamentos afetuosos, os quais possuem como objetivo o bem estar próprio e de seu parceiro, contudo, demonstra-se presente uma facilidade e naturalidade para romper, caso não queiram continuar juntos, assim como é para iniciar a relação amorosa. De acordo com Zygmunt Bauman (2004, p.35), os relacionamentos contemporâneos caracterizam-se pela inexistência de um compromisso com mais seriedade, de modo que a preservação de uma relação estável, fundada no amor duradouro e íntegro, é rejeitada em comparação às uniões líquidas, termo este usado pelo autor para descrever as atuais relações, sendo estas então, compostas por uma grande instabilidade e fragilidade. Conseguinte, Enézio de Deus Silva Júnior, 2007, retrata que “a família hodierna escapa ao normatizável (...)”, restando necessário observar a diversificação que existe ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 113 hoje em dia nos seios familiares, produto de uma série de modificações advindas de vários eixos na sociedade. Consequentemente, “a família é anterior ao Direito e a sua configuração não pode estar aprisionada nos moldes jurídicos postos em dado momento histórico, com base na ideologia dominante à época. A família é cultural e afetiva (…)” (BRUNET, 2001, p. 82 apud JÚNIOR, 2007, p. 39-40). A família ganhou previsão constitucional, sem deixar dúvidas sobre sua importância para o direito, sendo tratada no artigo 226 da Carta Magna como “base da sociedade”, recebendo uma visão despatrimonializada, enfatizando a pessoa como objeto central, pois como afirma GAGLIANO e PAMPLONA (2012, p.63), “a família deve existir em função dos seus membros, e não o contrário”. Percorrendo esse processo de constitucionalização e acompanhando o desenvolvimento dos seres em sociedade, o Direito de Família se distancia daquela posição conservadora, presente em épocas passadas. “[...] Agora, qualquer norma jurídica de direito das famílias exige a presença de fundamento de validade constitucional. Essa é a nova tábua de valores da Constituição Federal [...]” (DIAS, 2013, p. 36). Sendo isto exposto, levanta-se a discussão acerca de quais tipos familiares a Constituição Federal considera como agente detentor da custódia estatal. Além do padrão de família conservadora, encontra-se expresso em parágrafos do artigo 226 da Lei Maior, a união estável e a família monoparental. Entretanto, a doutrina discorre a cerca da existência de outros novos arranjos familiares, de forma que, os expressos no presente artigo são apenas exemplificativos. Neste sentido, dispõe Paulo Lobo, apud Pablo Stolze ( 2016, pg 48): Os tipos de entidades familiares explicitados nos parágrafos do art. 226 da constituição são meramente exemplificativos, sem embargo de serem os mais comuns, por isso mesmo merecendo referencia expressa. As demais entidades familiares são tipos implícitos incluídos no âmbito de abrangência do conceito amplo e indeterminado de família indicado no caput. Como todo conceito indeterminado, depende de concretização dos tipos, na experiência da vida, conduzindo a tipicidade aberta, dotada de ductilidade e adaptabilidade. Atualmente, o conceito de família recebeu novas fórmulas em sua composição, deixando de ser exclusivo perante a sociedade o modelo patriarcal, “(...) é impraticável um formato único que dê conta da família e das relações humanas.” (VALENTE & WAIDEMAN, 2005, p.119). Ao discorrer sobre a família moderna, Maria Berenice Dias (2015, p.43) explana que “O novo modelo de família funda-se sobre os pilares da repersonalização, da ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 114 afetividade, da pluralidade e do eudemonismo, impingindo nova roupagem axiológica ao Direito de Família”, demonstrando assim, que o Direito deve acompanhar a mudança temporal do instituto familiar. A título de exemplo, podem ser citadas estruturas que não estão descritas no texto constitucional: as famílias homossexuais, as simultâneas ou paralelas e ainda as poliafetivas. As uniões poliafetivas, por sua vez, destacam-se como base deste trabalho, sendo descrito por Rodrigo da Cunha Pereira (2016, p. 233) como a “a união afetiva estabelecida entre mais de duas pessoas em uma interação recíproca, constituindo família ou não”. Ligada a poliafetividade, um fenômeno societário conhecido como “Poliamor”, em especial, tem sido alvo de discussões doutrinárias, jurídicas e sociais, por fugir do tipo tradicional e convencional de união amorosa comumente adotada no âmbito jurídico brasileiro, sendo o mesmo, portanto, objeto de estudo a seguir. CONSIDERAÇÕES ACERCA DA DOUTRINA POLIAMORISTA Investigadas as peculiaridades sentimentais, manifestadas desde os antepassados até o século atual, a ideologia do poliamor se posiciona pelo amparo à multiplicidade do afeto, como uma opção diferente da monogamia e do romantismo. Os apreciadores deste referido movimento defendem sua realidade como uma ponte para a desestruturação do “amor romântico” (FREIRE, 2013). Os vínculos humanos praticados de forma não-monogâmica, consentidos pelos envolvidos, não é uma construção recente, existe há muito tempo, não sendo, entretanto, possível estipular onde se originou essa conduta. Enquanto que o termo “poliamor”, na qualidade de identificação relacional, nasce nos Estados Unidos em 1990, sendo, portanto, considerado atual (CARDOSO, 2010, p. 10-11). À vista disso, a poliafetividade retrata uma nova perspectiva no que concerne à prática e compreensão das uniões amorosas e sexuais. Sob a ótica da Psicologia, o poliamor é considerado um atributoque alguns indivíduos dispõem em se relacionar de modo afetuoso com mais de uma pessoa num mesmo período temporal. Há um ponto que diferencia o poliamor da traição: o consentimento. As partes poliamoristas comprometidas concordam em realizar essa prática amorosa paralela, ao passo que não sentem a fidelidade conjugal ferida. ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 115 Inexistem confrontos entre os referidos indivíduos, visto que consentem pela liberdade do parceiro convive intimamente com outras pessoas (MAZZO; ANGELUCI, 2014). Pablo Stolze Gagliano (2008, p. 51) discorre: O poliamorismo ou poliamor, teoria psicológica que começa a descortinar- se para o Direito, admite a possibilidade de coexistirem duas ou mais relações afetivas paralelas, em que os seus partícipes conhecem e aceitam uns aos outros, em uma relação múltipla e aberta. Percebe-se a ausência de uma cobrança por exclusividade, uma vez que acordam entre eles pelo livre envolvimento com outros indivíduos. De modo sucinto, falta apego ao passo que sobra amor. Seguindo nesta linha de raciocínio, Jade Aguilar (2013, p.109) esclarece que a doutrina poliamorosa nasceu através do realce em possuir diferentes companheiros amorosos, o que não implica em “dormir com qualquer um”, mas sim, no enlace de uma relação não exclusiva, confiável, terna e em pé de igualdade. Nesta perspectiva, o poliamor acautela também o apreço da individualidade em detrimento da posse. O vínculo se firma na união de seres completos, e não pela junção de metades (LINS, 2014). Conforme entendimento de Giovana Pelagio Melo (2010), no poliamorismo existe a possibilidade de maior troca entre os sujeitos envolvidos, reproduzindo, portanto, uma forte harmonia na relação de modo a evitar frustações, ou seja, é como uma visão mais desprendida do próprio amor. Fazer parte desta prática não pressupõe uma busca desenfreada por novos relacionamentos íntimos tentando substituir outros afetos, mas alcançar e manter uma liberdade pessoal, a qual desencadeia na evolução de elos sentimentais, a exemplo da amizade. Posto isto, Antônio Cerdeiro Pilão (2017, p. 09) pormenoriza o presente termo estudado, dando-lhe uma classificação: O termo poliamor, criado nos anos 1990, nos Estados Unidos, se refere à possibilidade de estabelecer múltiplas relações afetivo- sexuais de forma concomitante, consensual e igualitária. É possível classificar três modelos básicos de relação poliamorista que se dividem em “abertas” e “fechadas”. Isso é, no primeiro caso, há a possibilidade de novos amores e, no segundo, temos a “polifidelidade”, ou seja, a restrição das experiências amorosas: 1- “Em grupo”. Quando mais de duas pessoas têm relações amorosas entre si; 2- “Rede de relacionamentos interconectados”. Quando cada poliamorista tem mais de um relacionamento em casal – ou seja – os parceiros de uma pessoa não o são entre si; 3- “Mono/poli”. Quando um dos parceiros tem mais de um relacionamento e o outro, por opção, limita-se a um único parceiro. ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 116 Cabe evidenciar que a pluralidade relacional entre pessoas ou grupos, apresentada anteriormente, em suas variadas formas, onde os próprios envoltos nessa rede afetiva optam por compartilhar e viver essa experiência amorosa, demonstra um ponto de diversificação na sociedade dos dias atuais. Defender a prática da poliafetividade constitui um grande valor moral, ao passo que se busca resguardar a oportunidade de viver esse vínculo sexual e íntimo, sob uma diferente ótica sentimental, verificando-se, assim, uma escolha revolucionária. Freire explica que “a filosofia adotada no poliamor considera que amar uma única pessoa pelo resto da vida é algo inconcebível”, visto isso, os praticantes protegem o interesse pela multiplicidade afetiva e ainda defendem que “o caráter ético do poliamor deriva de sua forte ênfase sobre o amor, a intimidade, o compromisso de consenso e a honestidade” (FREIRE, 2013, p. 43). Contrapondo esta visão, pode-se destacar a doutrina religiosa, a qual carrega forte influência perante a população, uma vez que condenam os enlaces não- monogâmicos presumindo serem estes um afronte às escrituras divinas. Mazzo e Angeluci (2014) discorrem: Percebe-se, porém, que além dos entraves jurídico-sociais, as relações não- monogâmicas defrontam-se, ainda, com dogmas religiosos. A religião que, sem dúvida alguma, exerce bastante influência em nossa sociedade, julgam- nas imorais, promíscuas e repletas de pecado, vez que são, supostamente, contrárias à vontade Divina. A multiplicidade dos institutos familiares, apesar de possuir força constitucional em detrimento das normas infraconstitucionais presentes no ordenamento jurídico, todavia, é influída pelos valores religiosos e morais, levando em conta a predisposição do legislador em enveredar pela proteção dos bons costumes, almejando o resguardo de princípios tradicionalistas. Embasado em prejulgamentos, o parlamentar usando de sua autoridade, regulamenta a melhor forma das pessoas agirem, fixando condutas ajustadas à moralidade atual (DIAS, 2015, p. 56). De acordo com Pablo Stolze Gangliano (2008, p. 51-61) a aprovação social ao que se refere à liberdade privada em escolher os modelos de união afetiva está interligada aos estudiosos da Doutrina Civilista, os quais precisam abordar o tema de modo cauteloso, coerente e sem descriminação, e, essencialmente, em conformidade com o Princípio da Dignidade Humana, sendo este utilizado como base para os relacionamentos afetuosos. ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 117 Em vista disso, nota-se uma forte anunciação da dignidade da pessoa humana, sendo então, a definição de família posta de maneira mais receptiva, permitindo aos sujeitos uma maior liberdade na procura de sua felicidade afetiva, de modo que melhor assista sua intimidade (FISCHER, 2017). Para os grupos de famílias poliafetivas a dignidade humana se encontra desprotegida quando há negação da legitimidade desses indivíduos na qualidade de entidade familiar. A falta de reconhecimento jurídico ocasiona instabilidade, além de priva-los de direitos fundamentais, a exemplo disto, o da livre escolha afetiva, sendo acrescentada ainda a exposição dos mesmos a situações de caráter preconceituoso, pois obstaculiza o acolhimento e aceitação popular (OLIVEIRA, 2018). Destarte, frente à realidade sofrida devido à imposição da natureza monogâmica das relações, os membros que vivem a ideologia poliamorosa, em busca da validação de sua identidade, seguem à mercê das diretrizes legais estabelecidas, as quais não fornecem esclarecimentos sob suas condições enquanto família, e principalmente, um respaldo que ponha fim a esta insegurança jurídica. POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO JURÍDICO DO POLIAMOR FRENTE À MONOGAMIA Atualmente no ordenamento pátrio, o instituto da monogamia prevalece perante os vínculos matrimoniais, seja no âmbito do próprio direito cível, o qual rege o casamento, impedindo a realização de um novo casório àqueles que são nubentes, conforme descrição do artigo 1.521, inciso VI, do Código Civil, seja na seara criminal, com previsão no artigo 235 do Código Penal, transcrito neste o crime de bigamia. Elisa de Assis Freire (2013, p. 27) expõe que “A monogamia é o padrão aceito para as relações amorosas na cultura ocidental.” Considerada assim, modelo de estruturação familiar, em virtude dos costumes e de toda uma construção histórica e religiosa prevalente, o que de fato reflete na construção legislativae jurisprudencial, a exemplo do Brasil. Entretanto, os adeptos ao Poliamorismo seguem uma convicção diversa, mantendo relacionamentos plúrimos no intuito de constituir uma entidade familiar, contrariando o sistema conservador. Cumpre registrar a diferenciação entre o Poliamor e os relacionamentos simultâneos ou paralelos, visto que em ambos residem a multiplicidade de membros e ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 118 podem ser confundidos na prática, sendo este último comumente discutido nos tribunais. Assim discorre Maria Berenice Dias (2014): (...) Em face da estrutura monogâmica da sociedade brasileira, a bigamia é criminalizada e o casamento impõe o dever de fidelidade. Ainda que alvo do repúdio social, vínculos afetivos concomitantes nunca deixaram de existir, e em larga escala. Mais frequentes são as famílias paralelas, quando o homem mantém duas entidades familiares de forma simultânea. Quando a convivência forma uma única entidade familiar, chama-se de união poliafetiva, ou, mais precisamente, de poliamor. Enquanto o poliamorismo abarca o consentimento dos envoltos referente às particularidades amorosas e sexuais e o intuito de construir um núcleo familiar singular, a relação simultânea trata de vínculos mantidos de modo paralelo por aquele que já possui laços matrimoniais ou de companheirismo, sendo o dever de fidelidade violado, visto a outra parte não aceitar ou conhecer a relação extraconjugal do parceiro. Desta maneira, os Tribunais, de modo majoritário, indeferem pedidos de reconhecimento de união estável quando um dos indivíduos é casado com outrem e mantem o vínculo conjugal de fato, impossibilitando que relações concomitantes sejam juridicamente legalizadas, conforme pode ser observado no julgado do Supremo Tribunal de Justiça abaixo: “RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PEDIDO DE ARROLAMENTO E PARTILHA DE BENS. UNIÃO ESTÁVEL CONCOMITANTE A CASAMENTO SEM SEPARAÇÃO DE FATO. 1. À luz do disposto no § 1º do artigo 1.723 do Código Civil de 2002, a pedra de toque para o aperfeiçoamento da união estável não está na inexistência de vínculo matrimonial, mas, a toda evidência, na inexistência de relacionamento de fato duradouro concomitante àquele que pretende proteção jurídica. Nesse viés, apesar de a dicção da referida norma também fazer referência à separação judicial, é a separação de fato (que, normalmente, precede a separação de direito e continua após tal ato formal) que viabiliza a caracterização da união estável de pessoa casada. 2. Consequentemente, mantida a vida em comum entre os cônjuges (ou seja, inexistindo separação de fato), não se poderá reconhecer a união estável de pessoa casada. Nesse contexto normativo, a jurisprudência do STJ não admite o reconhecimento de uniões estáveis paralelas ou de união estável concomitante a casamento em que não configurada separação de fato. 3. No caso dos autos, procedendo-se à revaloração do quadro fático delineado no acórdão estadual, verifica-se que: (a) a autora e o réu (de cujus) mantiveram relacionamento amoroso por 17 anos; (b) o demandado era casado quando iniciou tal convívio, não tendo se separado de fato de sua esposa; e (c) a falta de ciência da autora sobre a preexistência do casamento (e a manutenção da convivência conjugal) não foi devidamente demonstrada na espécie, havendo indícios robustos em sentido contrário. 4. Desse modo, não se revela possível reconhecer a união estável alegada pela autora, uma vez que não foi atendido o requisito objetivo para sua configuração, consistente na inexistência de relacionamento de fato duradouro ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 119 concomitante àquele que pretende proteção jurídica. 5. Uma vez não demonstrada a boa-fé da concubina de forma irrefutável, não se revela cabida (nem oportuna) a discussão sobre a aplicação analógica da norma do casamento putativo à espécie. 6. Recursos especiais do espólio e da viúva providos para julgar improcedente a pretensão deduzida pela autora. (REsp 1754008/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 13/12/2018, DJe 01/03/2019) A validação de uniões estáveis concomitantes enquanto entidade familiar encontra-se incabível pelo fato da natureza monogâmica presente no referido instituto. Deste modo, esse vínculo paralelo é descrito como concubinato, segundo artigo 1.727 do Código Civil, o qual não dispõe de repercussões jurídicas, seja nas questões particulares ou ainda quanto aos efeitos patrimoniais, em virtude da sua falta de proteção pelo direito de família (MONTEIRO e TAVARES DA SILVA, 2012, p. 63/64, 68 e 71). Os julgados oriundos dos tribunais pertinentes ao direito de família, ainda que mais evoluídos e em sintonia com a realidade, em comparação ao aparato legislativo, enrijecem assim como a maior parte da doutrina, a preponderância da mononormatividade. O protótipo monogâmico que repercute nos sistemas jurídicos sociais revela a ligação entre mononormatividade e a monogamia, ao passo que esta é a base que aquela encontra para se estruturar e consequentemente tornar-se respeitada enquanto preceito que rege os laços conjugais, repercutindo nas leis e no ordenamento jurídico brasileiro (NAMUR, 2008 apud TEIXEIRA; RODRIGUES, 2010, p. 121-122). Desta maneira, os indivíduos que optam pela multiconjugalidade, como os poliamoristas, buscam aberturas no aparato legal, visando à regulamentação de suas relações, pois inexiste, no presente momento, jurisprudência consolidada pelas cortes superiores do país que trate a respeito. Posto isto, é necessário destacar um episódio: a oficialização em cartório de uniões não-monogâmicas, onde o primeiro caso se deu em Tupã-SP no ano de 2012, no qual foi lavrada uma “escritura declaratória de união estável” entre um homem e duas mulheres, com o intuito de assegurar garantias aos envolvidos conforme demonstra o seguinte trecho do documento: “Os declarantes, diante da lacuna legal no reconhecimento desse modelo de união afetiva múltipla e simultânea, intentam estabelecer as regras para garantia de seus direitos e deveres, pretendendo vê- las reconhecidas e respeitadas social, econômica e juridicamente, em caso de questionamentos ou litígios surgidos entre si ou com terceiros, tendo por base os princípios constitucionais da liberdade, dignidade e igualdade”.(Notícia disponível em http://www.ibdfam.org.br/noticias/4862/novosite). http://www.ibdfam.org.br/noticias/4862/novosite) ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 120 Consoante matéria publicada na plataforma do IBDF- Instituto Brasileiro do Direito de Família (2016), o 15° Ofício de Notas do Rio de Janeiro oficializou ainda outras escrituras deste mesmo teor, possibilitando algumas uniões poliafetivas, no decorrer dos anos de 2015 e 2016. Este fato provocou uma representação judicial da Associação de Direito de Família e das Sucessões – ADFAS, com o objetivo de obter a proibição das lavraturas de uniões poliafetivas, alegando a inconstitucionalidade da conduta, resultando assim na recomendação do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, a qual suspendeu novas escrituras públicas dessa natureza, além das já existentes, até que houvesse regulamentação da matéria (MANSUR, 2016). Consequentemente, as feituras destas escrituras de união poliafetiva foram cessadas e no dia 26 de junho de 2018 o plenário do CNJ deliberou de modo definitivo pelo impedimento das mesmas no Brasil e este posicionamento se mantém até o momento atual (Notíciadisponível em https://www.cnj.jus.br/cartorios-sao- proibidos- de-fazer-escrituras-publicas-de-relacoes-poliafetivas/). Parte da doutrina sustenta o não reconhecimento jurídico das uniões poliafetivas, como expressa Tavares da Silva (2014), ao declarar que o fato de existir relacionamentos pluriconjugais na prática não vincula a legitimação dos mesmos, usando para ratificar seu argumento, a excêntrica comparação com o ato de matar e roubar, que se faz presente na realidade e mesmo assim não devem ter amparo jurídico. É notório que a concepção tradicionalista resiste, persistem os prejulgamentos, atropelando a liberdade de escolha de alguns indivíduos, tornando as ideologias poliamorosas pouco discutidas no cenário sócio jurídico, permitindo que os adeptos continuem sofrendo discriminação no ambiente que estão inseridos. Na visão de França (2016, p. 20): “talvez o desafio de poliamoristas seja justamente o de mostrar para a sociedade, por vias também políticas, que eles e elas existem” bem como, que o amor “não pode ser visto no singular, como um sentimento que deve ser praticado socialmente de um único modo e vivido apenas com uma única pessoa” e por este motivo, segue o predomínio da monogamia como único e aceitável modelo familiar basilar. Por conseguinte, Maria Berenice Dias (2013, p. 54) descreve que: [...] justificativas não faltam a quem quer negar efeitos jurídicos [...] [ao poliamor]. A alegação primeira é afronta ao princípio da monogamia, https://www.cnj.jus.br/cartorios-sao-proibidos-de-fazer-escrituras-publicas-de-relacoes-poliafetivas/ https://www.cnj.jus.br/cartorios-sao-proibidos-de-fazer-escrituras-publicas-de-relacoes-poliafetivas/ https://www.cnj.jus.br/cartorios-sao-proibidos-de-fazer-escrituras-publicas-de-relacoes-poliafetivas/ ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 121 desrespeito ao dever de fidelidade – com certeza, rejeição que decorre muito mais do medo das próprias fantasias. O fato é que descabe realizar um juízo prévio e geral de reprovabilidade frente a formações conjugais plurais e muito menos subtrair qualquer sequela à manifestação de vontade firmada livremente pelos seus integrantes. A monogamia tornou-se um modelo amoroso fixo e inflexível, “[...] um pacto público socialmente aceito, vigiado e aplicado pela civilização cristã- monogâmica, que insiste em fechar os olhos para as relações não monogâmicas” (VIEGAS, 2017, P. 167). Demonstra-se mais cômodo manter os padrões engessados de uma sociedade conservadora ao invés de dar abertura aos reais parâmetros familiares pós-modernos. Essa reprovabilidade impositiva retira a liberdade de escolha de muitos sujeitos, que mesmo manifestando seu desejo e havendo a concordância de todos os inclusos na relação, precisam da aprovação social e do reconhecimento legal de um sistema que segue sem enxergá-los. Maria Berenice Dias (2013, p. 54) aponta que: “[...] Negar a existência de famílias poliafetivas como entidade familiar é simplesmente impor a exclusão de todos os direitos no âmbito do direito das famílias e sucessório”. Dentro de um ordenamento jurídico que preserva a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental, “[...] é indigno dar tratamento diferenciado às várias formas de filiação ou aos vários tipos de constituição de família” (PEREIRA, 2012, p. 121). Negar o reconhecimento das uniões plúrimas demonstra o descaso com a autonomia privada, a liberdade e ainda o desrespeito com a dignidade da pessoa humana. Hoje, enxerga-se como inapropriado seguir um modelo familiar que não seja o monogâmico, a legislação não oferta outra escolha, mesmo sabendo que existem, permitindo que esse impasse seja sustentado sem nenhuma resposta. A sociedade pós-moderna tem firmado cada vez mais a busca pela felicidade e a afetividade como base para as relações familiares, portanto, se faz necessário abraçar a realidade vivida, admitir a dimensão familiar multifacetada contemporânea, como o poliamor, abarcar a diversidade plúrima das uniões e inseri-las sob a proteção estatal, assegurando a todos, por igual, o direito de amar. CONCLUSÃO Ao longo do presente artigo buscou-se analisar o desenvolvimento do instituto familiar no transcorrer do tempo, visto a aparição de novos modelos afetivos, como o ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 122 poliamor, além de discutir a expectativa de legitimação dessa ideologia contemporânea e multifacetada diante da imposição normativa monogâmica no Brasil. A família apresenta-se como um universo de proteção progressiva do próprio ser humano, assim como da máquina estatal. Todo indivíduo tem sua função no centro familiar, de modo que cada qual oferta sua parcela de contribuição, criando vínculos recíprocos, alimentando o sustento afetivo e material de todos os membros. Deste modo, o instituto familiar consolida suas ramificações no âmbito social, econômico e jurídico, por isso é sempre alvo de importantes debates. Atravessando a evolução histórica da família brasileira, é evidente a preminência da monogamia como modelo exclusivo, sustentada por poderosos dogmas religiosos e culturais conservadores. No entanto, nas últimas décadas, formas alternativas de vínculos afetivos tem buscado seu reconhecimento diante da sociedade, amparadas pela a afetividade como base da construção familiar. O referido Poliamor, é um exemplo vivo da suplantação dos preceitos monogâmicos como único modo aceitável de união afetiva. Entidades familiares poliamoristas são reais, as relações plúrimas amorosas precisam ser notadas e acolhidas como igualmente válidas, ao invés de sofrer repressão social e das instituições políticas. Precisam-se expandir os debates em todas as esferas públicas, pois os afetos humanos extrapolam a obrigatoriedade em seguir um rígido padrão imutável. O mundo contemporâneo convida todos a revisar os protótipos absolutos estabelecidos, os quais não se harmonizam com os povos, nem com o tempo, acentuando a inviabilidade de se eleger verdades homogêneas, em virtude de sua relatividade e parcialidade. Além disso, o Estado deve intervir minimamente no instituto familiar, fato este que obstaculiza interferências impertinentes e injustificadas, até porque esta intercessão deve se dar com o objetivo de protegê-lo. O Direito de Família caminha de forma mais humanizada, o que traduz sua repersonalização. Não é digno permanecer nessa negativa de direitos fundamentais a indivíduos que constroem seus arranjos familiares firmado na boa-fé, liberdade, afetividade e respeito. É mais plausível flexibilizar valores e normas jurídicas, ao invés da dignidade da pessoa humana. O Direito existe não somente para criar regras, mas especialmente para preservar tal dignidade. É visível a carência jurisprudencial, as cortes superiores do país ainda não possuem posicionamento sobre a matéria e a última resposta que se tem foi proferida em ISSN: 2763-6704 REDES-Revista Educacional da Sucesso Vol 1, n.1, 2021 123 2018 com a decisão do Conselho Nacional de Justiça suspendendo as escrituras de uniões poliafetivas. Desde então, prevalece uma insegurança jurídica escancarada, comprovando o quanto essa temática e as pessoas nela envoltas carecem de atenção por parte do ordenamento jurídico, político e social. Portanto, visto que o Poliamor traduz um relacionamento composto por pessoas livres e iguais que, consensualmente, se unem no intuito de edificar uma família, fundada nos mesmo valores constitucionais das demais, é incabível impor entraves, limitando a afetividade destes indivíduos. Manter o valor monogâmico compulsório,reconhecido como o único válido, é ilegítimo. O sistema jurídico brasileiro necessita despir-se dos preceitos inflexíveis, acompanhar os arranjos familiares pós-modernos e enfim, reconhecer o poliamor como uma identidade relacional, concedendo-os proteção normativa e honrando os princípios da afetividade e dignidade da pessoa humana. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUILAR, Jade. Situational sexual behaviors: the ideological work of moving toward polyamory in communal living groups. Journal of Contemporary Ethnography. Londres. v. 42. n. 01. p. 104-129. fev. 2013. BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. (Carlos Alberto Medeiros, trad). 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