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1 2 3 DEDICATÓRIA Este livro busca resgatar a história do QAE nos seus 30 anos, como um presente especial para todos os servidores do quadro: os do passado e os do presente - que ajudaram a construir o quadro e o mantém vivo - e, principalmente, os do futuro, que terão nessas páginas o suporte que aqueles não tiveram. Após a leitura deste livro, espero que você tenha percebido que as últimas três décadas de trabalho desses profissionais foram dedicadas à Educação e não existe motivo algum para não considerá-los como que eles são: educadores. Esperamos firmemente que estas páginas sejam um motor para o surgimento de outras mais, para que as trajetórias desses educadores inspirem as futuras gerações e que os projetos e iniciativas se multipliquem e deem frutos que representem a categoria e a sua importância. Este é apenas o começo. Vamos juntos! 4 AGRADECIMENTOS A todos autores desta obra. A revisora e historiadora Jaqueline de Oliveira. A designer gráfica Thaís Alencar. E a todos os profissionais do QAE que acreditaram e acreditam que é possível sermos protagonistas da nossa história. 5 AOE - Agente de Organização Escolar ATPC - Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo CTC - Certidão de Tempo de Contribuição ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio GDAE - Gestão Dinâmica de Administração Escolar GOE - Gerente de Organização Escolar IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica IDH - Índice de Desenvolvimento Humano INSS - Instituto Nacional do Seguro Social PROUNI - Programa Universidade Para Todos QAE - Quadro de Apoio Escolar da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo QSE - Quadro de Secretaria do Estado RMSP - Região Metropolitana de São Paulo SED - Secretaria Escolar Digital SEDUC - Secretaria de Educação TJSP - Tribunal de Justiça de São Paulo UNIFACCAMP - Centro Universitário Campo Limpo Paulista EFAPE – Escola de Formação dos Profissionais da Educação do Estado de São Paulo LISTA DE Abreviacoes, ~ 6 PREFÁCIO ............................................................................. INTRODUÇÃO ..................................................................... Capítulo 1 • POR QUE ESCREVER UMA HISTÓRIA DO QUADRO DE APOIO ESCOLAR DE SÃO PAULO O papel da história oral e das trajetórias para a construção da memória do QAE ............................................................................................................ O não-dito e a invisibilidade do QAE ............................................................... Capítulo 2 • UM BREVE HISTÓRICO DA TRAJETÓRIA DOS “FUNCIONÁRIOS DA ESCOLA” NO BRASIL ............................................................................................ Os antecedentes dos “funcionários de escola”: do período colonial a Proclamação da República .............................................................. Os antecedentes dos “funcionários de escola”: do Cidadãos e profissionais da Educação: do início da República a redemocratização ......................................................................................................... Da redemocratização aos dias de hoje ........................................................... Capítulo 3 • O QUADRO DE APOIO ESCOLAR DO ESTADO DE SÃO PAULO ............................................................. Os “funcionários de escola” do estado de São Paulo antes da Lei do QAE: memórias ......................................................................................................... Os “funcionários de escola” do QAE do Estado de São Paulo: memórias ............................................................................................................................ 08 09 10 15 19 22 25 28 31 35 40 43 SUMÁRIO 7 Capítulo 4 • INICIATIVAS DOS EDUCADORES DO QAE ............................................................................................................ QAE&QSE: O Blog da Cidadania .......................................................................... Projetos “Leitura para quê te quero?” e Redação ENEM .................... Dentro e fora da escola ............................................................................................... Contando e ouvindo histórias ................................................................................ Pioneira ................................................................................................................................. Informação na palma da mão ............................................................................... Representatividade e a Profaci ............................................................................. Capítulo 5 • DESAFIOS E SONHOS ...................................... Presente e futuro: algumas discussões ........................................................... Para não concluir ............................................................................................................ Capítulo 6 • MANIFESTO DOS EDUCADORES DO QAE ............................................................................................................ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................ ANEXOS ................................................................................. 56 58 60 64 67 68 75 76 83 84 96 97 101 108 8 PREFÁCIO Um legado. Esse é o meu objetivo na organização e publicação do segundo livro sobre os profissionais do Quadro de Apoio Escolar. É a minha contribuição para uma categoria tão importante na vida da comunidade escolar e essencial para que a escola funcione. Olhando para trás, lá em junho de 2009 no meu ingresso, vejo o quanto a luta pela valorização profissional – envio de ofícios para a SEDUC- SP e em mãos aos secretários da educação relatando nossas demandas, participação na reunião de polos pela valorização dos servidores e no congresso estadual de gestão democrática, live com o secretário da educação, participação no CMSP em defesa da categoria, participação efetiva nas orientações técnicas de GOEs da Diretoria de Ensino Região Guarulhos Sul, criação da Profaci, publicação dos livros, criação da pósgraduaçãoexclusiva ao QAE, entre outras ações - valeu a pena. As conquistas são fruto de engajamento, networking, persistência, paixão e muita paciência. É claro que estamos longe do que acreditamos ser o ideal para a categoria, mas é certo que houve um significativo avanço nos últimos anos. Os próximos passos, passam pelo reconhecimento e valorização dos Secretários de Escola, Agentes de Serviços Escolares e Assistentes de Administração Escolar, incluí-los no reenquadramento funcional como os AOEs é fundamental para a continuidade desse avanço. A chegada de um novo governo reacende uma nova janela de oportunidades, diálogo e a esperança de conquistas para todos os profissionais do Quadro de Apoio Escolar. Vamos juntos nessa! Rodrigo Gabriel da Silva Ex-Agente de Organização Escolar CEO da Escola Profaci 9 “Nós temos saberes e contribuições importantes. Temos conhecimentos. O que sofremos é uma violência epistêmica que invalida, apaga e tenta dizimar a nossa contribuição intelectual pelo simples fato de não nos encaixarmos em um certo modelo - equivocado - do que é ser educador. Precisamos enquanto grupo, enquanto coletivo que somos, reivindicar o direito a sermos reconhecidos. Sermos vistos como o que de fato somos: sujeitos do processo. Este livro é uma grande oportunidade, ferramenta da instituição de uma nova perspectiva, de resistência e de estabelecimento de uma identidade que já existe, mas que não é reconhecida e, até por nós, desconhecida.” Edson Ferreira da Silva INTRODUÇÃO 10 CAPÍTULO 1 Por que escrever uma história do Quadro de Apoio Escolar de São Paulo A Lei 7.698/1992 - que criou o Quadro de Apoio Escolar da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (QAE) - completou 30 anos no último mês de janeiro.projetos como, por exemplo, o coral, o sarau, o Silvia2 TV (canal no YouTube), o projeto de leitura, dentre outros. A cidade em que atuo, Francisco Morato, localizada na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), é a cidade com o menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da região, segundo o IBGE. Para a maioria dos estudantes, a escola é o único espaço que eles têm para frequentar, realizar as interações sociais e, inclusive, ter lazer. Não se pretende aqui confundir o papel da escola de dar conta da aprendizagem do educando, o que ela faz em um processo sistematizado e com profissionais qualificados para atender essa demanda. Contudo, existem muitas realidades locais, que muitas vezes são ignoradas ou são incentivadas e bem-sucedidas, a depender da Direção da Escola, que poderá incluir ou não, 61 a comunidade escolar como um todo no processo de ensino- aprendizagem, diferenciando as funções de cada segmento escolar, mas aproximando os sujeitos para o trabalho em equipe, sucesso dos projetos e melhora significativa dos índices oficiais, por exemplo, o IDEB, o caso exitoso do trabalho coletivo e articulado sob a gestão democrática do Diretor Ismar Pusti de Azevedo, na E.E. Jardim Silvia II. Trabalhar com projetos já um desafio em si, pois um projeto não funciona como aula, não acontece em sala, geralmente ele é temático, mas isto não quer dizer que ele é um trabalho planejado nos espaços escolares e com objetivos claros: incentivar a leitura (no Ensino Fundamental) e a leitura interessada em provas (Ensino Médio). O projeto está dentro de um tempo estipulado, possui número de alunos e cada faixa etária tem textos ou obras literárias específicas. Além disso, um projeto precisa ser uma demanda da comunidade e discutido pela equipe escolar. No caso do projeto Leitura para quê te quero? houve adesão dos estudantes, apoio da comunidade e ele foi discutido e organizado em vários ATPCS. A implantação de um projeto enfrenta várias dificuldades: é nova a ideia de trabalhar com projetos na rede estadual de ensino regular, há dificuldades em articular o projeto entre a equipe, falta de materiais adequados para atividades etc. Com a saída do Diretor de Escola Ismar Pusti e no contexto da pandemia de Covid-19, o projeto de leitura, além das dificuldades, passou a enfrentar problemas com a nova Direção da Escola, mesmo que ele estivesse respaldado legalmente (Resolução SE nº 52/2011). A Direção divulgou que o funcionário que estava à frente do projeto de leitura, dentro do seu horário de trabalho, estava cometendo desvio de função. A situação se agravou com vários problemas de ordem processuais (judiciais e funcionais) e o projeto teve seu curso interrompido. No entanto, eu não desisti e mantive o contato com os alunos a distância para cumprir o ciclo do plano de trabalho autorizado pela Direção anterior. 62 Faltavam apenas três meses para o término da última fase quando ele foi suspenso pela nova Direção da Escola. Mesmo ganhando um Mandado de Segurança no TJSP, o projeto de leitura não retornou. O mais importante no serviço público não são os interesses pessoais dos servidores que nele trabalham, é dever de todo servidor público seguir o critério da impessoalidade. Em relação ao projeto de leitura eu garanti o meu papel de educador enquanto funcionário de escola e o direito à leitura dos alunos que procuraram o projeto e nele depositaram suas expectativas. Assim, continuei as atividades do projeto com as dificuldades apresentadas e busquei acreditar que o desafio era o de fazer os alunos do terceiro ano entrarem na faculdade. Uma delas passou com bolsa de estudos 100% no PROUNI na Universidade Paulista, no curso de Fisioterapia, outra também ingressou com bolsa de 100% na UNIFACCAMP, no curso de Nutrição. Elas foram aprovadas com notas do ENEM e, devido ao projeto de leitura, obtiveram notas altas em suas redações. Uma terceira estudante foi incentivada a conhecer os vestibulares das universidades estaduais. Em relação ao Ensino Fundamental, com a proibição de falar com os alunos e suspensão do projeto de leitura, não dei continuidade, mantive contato e atividades de leitura inclusiva apenas com uma estudante com Síndrome de Down. Ela demorou para retornar às aulas presenciais porque esperava tomar a vacina contra Covid-19. O objetivo era aproximar a escola dela, mesmo com leitura e acompanhamento a distância, garantindo o direito da estudante à educação. Por fim, vale ressaltar a importância da gestão democrática da escola em todos os sentidos: gestão, acadêmico e acolhimento da comunidade escolar para uma efetiva colaboração de todos com objetivo de construir uma escola que, para além de cumprir metas e preparar estudantes para o trabalho, os torne cidadãos que compreendam seu papel na sociedade e sejam protagonistas 63 de suas histórias. Claudio Adão dos Santos 64 Dentro e fora da escola “Alguns me conhecem, outros não. Sou Wilmar, iniciei no Estado em 2008 como Agente de Organização Escolar, em 2010 me efetivei e em 2011 virei Secretário Designado, já em 2011 Gerente de Organização Escolar. Iniciei no Orkut onde foram as minhas primeiras contribuições para a categoria, aprendendo e ensinando. Muitos ainda não confiavam em mim. Foi no Facebook, ajudando o Edson e alguns outros, que ganhei visibilidade na categoria. Por um tempo ajudei o Edson no blog, mas não estava muito “afiado” para falar a mesma linguagem e acabei saindo. Os grupos de ajuda criados principalmente no Orkut foram fundamentais para a evolução profissional na carreira; ali tornamos uma só família em busca do mesmo objetivo, uma vez que cada diretoria orientava de formas diferentes, os grupos eram a mesma linguagem; posso dizer que ali trabalhamos 24 horas diárias, 7 dias por semana, 30 dias por mês e 365 dias no ano; não tínhamos horário fixo para responder e ajudar os colegas, então respondíamos sempre que conseguíamos, seja final de semana, férias, feriados, enfim, nos doávamos para fazer para os colegas o que o Estado carecia, que era o de ensinar o serviço ou mesmo o de esclarecer nossas dúvidas. Como temporário, entrei na E.E.T.I. Brigadeiro Eduardo Gomes, uma escola pequena de 1º ao 5º ano, onde os alunos frequentavam das 7h às 16h10. Escola tranquila com alunos carentes das comunidades ao redor e do bairro da Vila Formosa, desempenhei a função com maestria. Fazia entrada e saída, olhava os intervalos e principalmente colaborava com os professores. Como as verbas do Estado nunca eram suficientes, fora do horário de serviço colaborava com a escola voluntariamente realizando pequenos 65 reparos, instalação de ventiladores, telas de pombos, tomadas e computadores. Percebi que o Governo havia enviado computadores novos e os antigos ficaram esquecidos e empoeirados, resolvi formatar e recuperar eles montando uma sala de computadores com jogos educativos para os alunos usarem na hora do intervalo. Além do projeto Jogos Educativos, também criei outros projetos no horário de almoço como TV educativa, jogos como cordas, damas e um pequeno stand de livros e gibis para leitura, criando um ambiente com pufes doados pela comunidade para que os alunos pudessem estar confortáveis. No ano de 2009, o governo encerrou todos os contratos no mês de maio, o que ocasionou na falta de funcionários para atuarem nas escolas. O concurso estava em andamento, mas ainda em fase de perícias médicas. Para colaborar com a escola, permaneci por um mês atuando como AOE sem receber pelo estado. No ano de 2010, após o encerramento do meu contrato temporário, me efetivei no cargo de AOE, 01/03/2010 foi a data que mudou a minha vida. Já gostava de atuar como temporário, como efetivo poderia fazer muito mais pela Educação de São Paulo. Em 2012, consegui a primeira Audiência Pública junto ao deputado Carlos Giannazi, e posteriormente mais duas. Na segunda já sentei à mesa de tribuna juntamente com o André e uma Agente de OrganizaçãoEscolar cujo nome não me recordo. Foi muito importante e trouxe mais visibilidade para a categoria. Falei um pouco da nossa luta na TV ALESP, fui convidado para um programa ao vivo e enviei a Ângela no meu lugar. Em 2013, junto com a Maria, Ângela e Selma, fizemos uma reunião com a Secretária Adjunta, Cleide, e o Chefe de Gabinete, Fernando Padula. Nessa ocasião, levamos o entendimento do artigo 133 que era recusado para os Gerentes de Organização Escolar e ali conquistamos a incorporação do mesmo. Em 2015, em uma paralisação independente do sindicato, junto com o Giannazi conseguimos entrar na SEDUC. Na época, fomos 66 recebidos pelo Secretário de Educação José Renato Nalini e pelo Chefe de Gabinete Wilson Levi. Sem muito sucesso em termos de conquistas. Porém, quando os que paralisavam me elegeram para entrar, senti a obrigação de defender a categoria. Ainda em 2013, iniciei a luta para levar o administrativo para a Secretaria Escolar Digital - SED, até então criada apenas para ser um diário de classe virtual, e o André, Coordenador na época, me ouviu e iniciamos a transferência do Administrativo para a plataforma. De lá para cá ainda faço sugestões que, aos poucos, se solidificam em mudanças. A maior conquista foi o BFE que ainda não está concluído. Fiquei Gerente de Organização Escolar até 2019, e fui elaborando planilhas automatizadas e quadros de legislação que atualizo até hoje gratuitamente a fim de otimizar o tempo das escolas. A partir de segunda-feira vou atualizar a Calculadora de Readaptado. Em 2019, exonerei e assumi o cargo de Professor PEB I. Nessa trajetória ajudei e contribuí em quase todos os grupos do Nilton, e às vezes respondo às pessoas até mesmo em nossas mensagens privadas. Hoje estou atuando no CEPEA que pertence ao DEPLAN, CGRH, e ajudo “de dentro”, trazendo ainda soluções para a categoria. Nós fazemos o estudo de possíveis progressões ou promoções de toda Educação, impacto financeiro na folha mensal e anual, incluindo patronal. Estou à disposição para contribuir mais uma vez para uma categoria que está em meu coração. Fundei o grupo de WhatsApp para GOEs, o “amiGOES”, e dois grupos SED.” Wilmar Galdêncio de Oliveira Júnior 67 Contando e ouvindo histórias “Como tenho uma formação em Psicologia, sempre tive projetos que giravam ao redor disso. Eu tinha um projeto de orientação vocacional aos sábados, durante duas horas. Além disso, durante um tempo tive a iniciativa de organizar uma roda de escuta, com que as meninas se interessaram e trouxeram uma série de temas importantes e delicados, como bulimia, automutilação… Isso me deu a ideia de um projeto para o Setembro Amarelo, mas infelizmente a escola não tinha para onde encaminhar os alunos com algum problema. No Ensino Fundamental I, eu comecei a fazer um curso de contação de histórias na biblioteca. Essa experiência me fez escrever um conto sobre bullying, que eu gostaria de publicar e depois disponibilizar para utilização nas escolas.” Carolina Soares Manfio 68 Pioneira “Eu fiquei, então, designada Secretária e acabei saindo da escola em que eu estava, que era em Mauá, e fui para uma escola em São Paulo. E lá eu tinha bastante autonomia para fazer o que eu quisesse, a diretora era super tranquila, e eu comecei a me engajar mais nas coisas fora daquela coisa só da secretaria. Então, por exemplo: o primeiro bônus foi feito só para professores, e aí eu estava ali, olhando o Diário Oficial e de vez em quando eu olhava o site da Secretaria de Educação, para dar uma olhada mesmo, ver o que tinha de novo, até que um dia eu vi lá “Bônus para os profissionais da Educação”, aí eu fiquei feliz, fui ler todo o texto e era para os professores. “Profissionais da educação” só eram os professores, e era R$500 sei lá, na época. Eu sei que eu fiquei muito, mas muito, muito, brava. E o que eu fiz? Na hora eu entrei lá no e-mail e mandei para a Secretária de Educação toda a minha indignação, dizendo que eu trabalhava mais de oito horas por dia, que eu tinha mais contato com o pessoal da escola do que com a minha própria família, que eu passava muito mais tempo na escola resolvendo os problemas da escola… Que a Diretoria, como sempre, tudo pedia para ontem… Eu fiquei muito brava. Sei que eu escrevi um monte de coisa e mandei o e-mail. Eu encaminhei o e-mail para todas as escolas da minha Diretoria, dizendo assim: “Pessoal, olha o que eu mandei para a [Secretaria de] Educação”, e aí o pessoal “Ai, parabéns!” e tal, e ficavam mandando coisas, só que a gente era muito novo na internet e ninguém se deu conta de que a gente estava enviando para todos. Então todas as vezes que alguém mandava alguma resposta, respondia para todos, aí a caixa de correio congestionou, a Diretoria de Ensino ficou muito brava, a dirigente me chamou, 69 mas antes ela escreveu um e-mail dizendo “é justa a causa, porém não deveria ter feito pelos computadores da rede”. Quando o pessoal leu “é justa a causa”, todo mundo parou de responder porque imaginou assim “é justa causa”, vão demitir todo mundo! [risos] Eu fui chamada, tive que assinar uma advertência, porque eu congestionei tudo… Mas, e até hoje eu não sei se foi por tudo isso ou se não foi, no mês seguinte a gente teve o primeiro bônus de R$500, então, assim: eu não sei, tá? Não sei dizer se foi isso ou se não foi, mas eu fiquei muito feliz. Passado isso, em 2003 teve lá um concurso, foi o primeiro concurso para secretários, como eu já estava designada desde sempre eu prestei esse concurso e acabei passando. E é aquilo, né? Infelizmente, o Estado não disponibiliza um curso, não dá nada para a gente, tudo a gente aprende na raça. Aí o que acontece? Na própria Legislação dizia: quem já era designado, caso passasse, tinha que ser admitido, no caso nomeado, no nível em que estivesse do cargo, na época. E eu já estava no nível III, mas como não entendia nada disso, fui na [Secretaria de] Fazenda: “Olhem isso aqui, eu não tinha que estar no nível III?”, então o rapaz da Fazenda disse para mim que não, e ele foi mal-educado comigo, gritou e falou um monte, disse que era o primeiro concurso, que eu não tinha que querer estar no nível III… Em resumo: sentei lá na escada da Fazenda e só chorei, mas tudo bem, passou. Com o tempo eu descobri que não era na Fazenda, eu tinha que ter ido na [Secretaria de] Educação para reclamar, porque na minha Diretoria, na época, ninguém sabia o que fazer, mas na Educação eles iam rever e podiam ter feito alguma coisa, mas eu fiquei lá no nível inicial. Após isso, eu comecei a fazer parte, a ser atuante dentro das coisas da Educação. Inclusive, quando abriu o GDAE, convocando quem quisesse participar, eu me inscrevi. Só que, assim, eu não entendia muito também que precisava ter curso de informática, e acabou que nem me deram resposta porque eu tinha essa lacuna 70 no meu currículo. Mas eu sempre fiquei ali, tentando fazer as coisas funcionarem, porque eu achava que era uma coisa legal... Em 2011, veio a nova alteração na Legislação e nós estávamos conversando pelo Twitter, que era uma rede nova, e o pessoal começou a falar com o [Fernando] Padula, que era o Chefe de Gabinete. Foi quando em uma brincadeira falamos para ele: “E aí, dá para nos atender? Vamos tomar um café?” e ele aceitou. Eram para ser apenas 30 minutos, mas nós ficamos 4 horas com ele. Conversamos, ele explicou a Legislação e disse todos os motivos pelos quais estava realizando todas as mudanças e a gente não tinha o que fazer. Nós tentamos 102 emendas para o projeto de lei, mas nada foi aceito. Inclusive a Afuse ficou brava porque nós éramos Secretários de Escola e eles achavam que deveriam ser os responsáveis, por fim a gente entrou em um acordo e colocamos que foram eles que tiveram essa ideia de fazer as emendas. Na verdade, foram 103. Uma delas foi feita por uma pessoa que não tinha nada a ver com a gente e que pedia, inclusive, que alteração fosse feita para o pessoal daSaúde. Não sabia nem o que estava falando, mas tudo bem. A partir de 2011, quando veio o secretário Herman [Voorwald], ele abriu uma rede de conversas, dando o pontapé inicial para deixar o funcionário participar. Na época, eu fui representante das Diretorias Leste de 1 até 5. Quando ele veio ele foi para São Mateus, para aquelas reuniões onde ele conversava e ouvia funcionários, diretores, professores e supervisores, para tentar fazer esse “bem-bolado” e propor a reestruturação, que foi quando ele fez a [Lei] 1144 e a [Lei] 1143 que era dos professores, ou melhor, do pessoal docente. Então, a gente foi lá, conversou, falou a respeito do que a gente precisava, do que a gente podia mudar, teve muita coisa que eles atenderam: às nossas necessidades de informática e de informatizar a Administração Escolar - eles criaram a SED para dar uma melhorada -, porém como tudo no Estado, é bem complicado. Eles criam, tem ideias, mas eles não fazem no dia a 71 dia, então eles não têm a prática, só tem a teoria. Muitas coisas eram propostas para dar certo e quando chegava na escola não funcionavam, porque existem barreiras, existem várias coisas que tem que ser feitas para chegar naquele resultado. Então era bem difícil. O que aconteceu: eu pedi remoção da escola em que eu estava, para uma escola mais perto da minha casa e quando eu cheguei lá, eu já tinha um GOE. Como eu era secretária efetiva, a menina tinha medo que eu quisesse a função dela, pela qual eu não tinha interesse nenhum, porque eu já estava saindo da outra escola porque eu não queria mais ser GOE e você só não tinha prejuízo se você se removesse. Então eu me mudei, fui para aquela escola, e como ela tinha muito medo porque ela sabia que eu tinha muitos anos de experiência e o Diretor já me conhecia, acabou que eles me deixaram meio que de escanteio, não me deram nada, nenhum papel específico, eu ficava lá sentada, atendia um pai, um telefone, assim, não fazia nada. E como eu não tinha nada de tão importante para fazer, comecei a me engajar mais com o pessoal da SED. Fazíamos os testes, até que a Selma conseguiu autorização da diretora dela para levar as crianças para fazer as fotos para o sistema. Na época, para fazer os testes da Secretaria Escolar Digital, eles queriam saber se dava para colocar todas as crianças, se era demorado, como era que fazia… E fizeram até uma reportagem na escola da Selma, na Diretoria Centro, com o [Cesar] Tralli, mostrando como é que fazia foto para colocar na SED. E quando recebi esse convite, porque todos nós no grupo recebemos esse convite, fui perguntar para o diretor se a nossa escola poderia participar, mas ele não estava. Então eu liguei na Diretoria e falei: “olha, eu queria saber se pode” e responderam, “olha, primeiro, você não deveria estar perguntando, você teria que perguntar para o diretor que ele perguntava para a gente, e outra: que negócio é esse de SED que vocês têm acesso e a gente da Diretoria não?” Então ficou 72 uma situação meio [incômoda] assim, então eu deixei para lá. Na época, na reportagem diziam que as fotos iam servir para caso uma criança desaparecesse, para fazer projeções de envelhecimento e coisas assim, então esse era o intuito principal. Depois disso, nunca mais nada foi comentado e tudo bem. Então nós começamos a criar coisas na SED, criamos diversos modelos para facilitar questões nas escolas. Então, assim: nós tínhamos modelo de autorização para tirarmos fotos das crianças na escola, nós tínhamos o modelo de cadastro do responsável, criamos vários modelos de acordo com o que está na SED para que a gente pudesse facilitar o trabalho na escola, para que a gente pudesse preencher. Então, assim, uma das primeiras coisas que eu fiz, já que eu não tinha o que fazer na minha escola, foi colocar o responsáveis nas turmas de 1ª a 4ª série, mas não consegui colocar todos porque estava sozinha naquele projeto e só podia me dedicar a ele quando realmente não tinha outras coisas para fazer. Quando eu pedi a remoção de volta para a escola em que eu estava anteriormente, conversei com a diretora e com o pessoal e esse projeto realmente ganhou uma repercussão. Fizemos um mutirão e na época, como era uma escola de Ensino Médio, o coordenador, o professor-mediador, o pessoal de secretaria, o pessoal do pátio, todo mundo aprendeu a colocar as fotos no sistema. Então a gente fazia assim: em um dia, a gente colocava foto de duas turmas do período da manhã, duas da tarde e duas da noite. Colocávamos as fotos dos alunos, avisávamos aos pais e pedíamos as autorizações. As fotos e o preenchimento do responsável a gente fez na rematrícula, a partir do documento para o qual tínhamos o modelo, então os pais preencheram telefone, e-mail e CPF. Quem não tinha e-mail a gente criava na hora, tinha algumas professoras readaptadas, três, na verdade, e elas também auxiliaram bastante. Depois que já tínhamos conseguido informatizar todos os alunos, recebemos o contato da Secretaria de Educação nos parabenizando e querendo os detalhes de como tínhamos feito tudo, foi bem legal. Para a 73 gente foi bem gratificante. Eu fui mantendo contato com o pessoal da SED, e nesse meio todo tinha o pessoal que também manteve, como a Selma, o Wilmar, a Maria, enfim, várias pessoas foram para a SEEDUC conversar. Falamos com o Padula, com a professora Cleide, foi quando a gente pediu que na próxima evolução, quando tivesse, para eles aproveitarem a pós-graduação. Por quê? O Assistente de Administração entrou no Estado em 1992, com a necessidade de ter o nível superior. Se não tivesse nível superior, não era Assistente de Administração Escolar. E eles nunca puderam ter um reenquadramento porque o máximo que tinha era até o Ensino Superior. Então a nossa luta era essa: pedir que eles acrescentassem a pós-graduação para que eles tivessem uma única evolução, um reenquadramento, porque eles estavam sempre ali [sem evolução salarial]. Então a gente conversou com a Cleide, com o Padula, e eles “ai, um dia vai ter e tal”. Teve, mas não para eles, porque os funcionários que são considerados extintos não entraram para os reenquadramentos, então eu acho interessante que a Lei 888/2000, ela trata que o Agente de Serviços Escolares, por exemplo, é extinto, já a nova, de 2011, não fala. Só que o Agente de Serviços não existe, não tem cargo para ele mais, não tem concurso para ele, ele não faz parte, não tem nada. Só o Agente de Organização Escolar que conseguiu alguma coisa, o resto está considerado extinto, mesmo não estando no papel, e não teve nada de aumento e nem nada. [...] Então a gente foi, conversou com o Padula, fui junto com o Wilmar, e a gente levou o modelo do livro-ponto. O modelo do livro-ponto foi feito pelo Claudio Lux e mais um menino do interior que eu não lembro o nome, então a gente tinha vários colegas, de vários lugares tanto do interior quanto da capital, que iam criando os documentos que a gente fazia. Por exemplo: eu fiz a ficha 100 em 1999, só que eu fiz só a ficha 100 e eu não tinha muita noção de fórmula e tal e alguém foi lá, pegou o modelo que eu tinha feito, 74 e modificou, colocou fórmula, deu uma aprimorada e ficou bem legal, então com o tempo a gente foi atualizando os documentos e aqueles documentos que a gente fazia manual, nós próprios fomos criando e transmitindo uns para os outros. Em muitas Diretorias eles não usavam os documentos porque não era oficiais, mas as Diretorias que eram mais flexíveis deixavam a gente usar. Começamos a fazer a ata final e outras coisas, todas elas dentro da informática. Hoje, se você procurar na rede, tem muito documento informatizado, mas que foi criado pelo pessoal, pelos próprios funcionários para facilitar o nosso trabalho. Por exemplo: em 2017, eu tinha contato com o pessoal da SED, a gente tinha os e-mails e WhatsApp, então quando tínhamos qualquer problema conseguíamos falar diretamente para eles. Os testes que foram feitos como Diário de Classe Online, dependeram muito desse contato que nós estabelecemos. A SED foi organizando tudo ao vivo, in loco, graças à nossa colaboração. O salto que a SED teve se deveu em grande parte aos funcionários de escola que se interessaram o suficiente para manter contato com as pessoas de lá de dentro. Então assim, eu tenho muito orgulho de ter participado de tudo isso, infelizmente eu vim embora para Portugal, infelizmente no sentido de que eu amava muito o que eu fazia, mas felizmente porque eu estou aqui, estou bem, estou com o meu marido, mas eu acabei saindo do Estado, pedi exoneração, porque a própria Diretoria não soube fazer a minha contagem juntando o tempo de Portugal, que era um direito meu, e eu não achei nenhum advogado que tratasse de previdência estadual, o pessoal é todo do INSS, ninguém conhece nada do Estado, acabei deixando para lá e por vinte e tantos dias eu não me aposentei, acabei me exonerando, mas eu estou aguardando agora a minha CTC para poder fazer então pelo INSS.” Ângela de Paula 75 Informação na palma da mão “Em 2012, eu formei um grupo regional em Ribeirão Preto, chamado Agente de Organização Escolar de Ribeirão Preto, foi quando eu conheci o Edson por causa do blog dele. Houve muito sucesso do grupo e todo o material que o Edson postava eu lia, aprendia, porque não tínhamos nenhum material para trabalhar. Ele foi uma escola para mim. Hoje eu administro dezessete grupos da Facebook e mais oito pelo WhatsApp, fora os grupos do sindicato.” Nilton Cesar Amorim 76 Representatividade e a Profaci “O meu interesse fez com que eu construísse um laço com a Diretoria de Ensino Guarulhos Sul (DERGSUL) que aumentou consideravelmente após a minha designação como Gerente de Organização Escolar (GOE). Aproveitando essa relação, comecei a propor soluções como a criação do grupo de GOEs no WhatsApp que se tornou uma excelente ferramenta de trabalho. Com a chegada da Daniele Inacio, Analista Administrativo, ao CRH da Diretoria de Ensino, atuando no treinamento e desenvolvimento dos profissionais da equipe administrativa das escolas, consolidou- se a boa parceria. Sob a coordenação da Teresa Emiko, Diretora do Centro de Recursos Humanos, e comando da Dirigente Maria Aparecida do Nascimento Barretos, as orientações técnicas tiveram um salto, sendo a DE com o maior número de Orientações de Trabalho do Estado. Foram realizadas muitas intervenções ligadas à qualidade de vida e promoção do bem-estar dos servidores, com foco na melhoria contínua das práticas dos profissionais envolvidos, às quais tive oportunidade de participar ativamente. Durante os estudos, comecei a entender melhor a carreira e ver que existiam poucas possibilidades para a valorização salarial e profissional. Naquele momento éramos regidos pela Lei Complementar nº 888/2000 que trazia a Evolução Funcional como grande oportunidade de crescimento. Mas no ano de 2011, o então Secretário da Educação, Herman Voorwald, realizou diversas reuniões de polos no estado inteiro com o objetivo de ouvir os profissionais da rede em relação às demandas e críticas para construirmos de forma coletiva uma educação de qualidade para São Paulo, algo inédito até aquele momento. Eu tive a grande oportunidade, por indicação da Diretoria de Ensino, de 77 participar desses encontros, levando também as demandas da categoria para melhorias. Conforme fui absorvendo esse conhecimento da legislação, percebi que tinha um caminho árduo pela frente para a valorização profissional através dos processos internos de Certificação de Gerente de Organização Escolar e Concurso de Promoção do QAE, ambas provas com muito conteúdo para estudar. Mas essas eram as tão aguardadas oportunidades, então decidi não desanimar e buscar as minhas próprias realizações. Entre abril e maio de 2012 aconteceu o primeiro processo de certificação para Gerente de Organização Escolar, uma prova realizada de forma online em um dos polos da FGV, com um conteúdo bem extenso. Para você ter ideia, o conteúdo programático da prova de Conhecimentos e Habilidades Técnicas tinha 85 itens para estudo divididos em: Conhecimentos Básicos (Interpretação de Texto; Informática Básica e Administração Pública) e Conhecimentos Específicos (Gestão da Vida Escolar; Gestão de Recursos Humanos; Gestão do Atendimento e Gestão de Recursos Internos) e, por fim, o Inventário Comportamental. Além de tudo isso, para ser certificado era preciso aproveitamento geral igual ou superior a 60% e, em cada área de conhecimento, um percentual mínimo para aprovação. Após muito estudo, realizei a prova e fui aprovado e, portanto, obtive a Cerificação do GOE. Percebi que nesta nova função como GOE, minha influência seria ainda maior em benefício dos colegas da categoria e poderia liderar um movimento de valorização, independente do sindicato, a Afuse, no caso do QAE (que já obteve muitas conquistas para a classe). Uma das ideias que sempre trouxe muito firme comigo ao longo da minha vida é que podemos ser, cada um, protagonistas de nossa trajetória e que juntos - nessa mentalidade - conseguimos mudar o rumo das coisas. Continuei nessa jornada, enviando inúmeros ofícios à Secretaria de Educação com propostas de melhorias para o Quadro de Apoio 78 Escolar, com demandas vindas dos próprios colegas do quadro e obtivemos respostas e muitos resultados positivos. De 2014 para cá, tive a oportunidade de entregar em mãos um desses ofícios aos então Chefes de Gabinete Fernando Padula e Wilson Levy, ao último Secretário João Cury Neto que embora com uma passagem curta, foi fundamental para o avanço e cumprimento dos direitos do QAE, como a regulamentação da Progressão e realização do Concurso de Promoção do QAE em 2018, e ao atual Secretário Rossieli Soares da Silva, através da minha dirigente de ensino. Neste mesmo ano, percebi que já tinha o conhecimento necessário para ajudar os colegas do QAE a também serem aprovados na certificação de GOE que aconteceria em 14 de dezembro de 2014, pois havia entendido o caminho das pedras. Foi então que tive a ideia de criar um grupo de estudos, para que pudéssemos ajudar uns aos outros. Chamei um amigo, o Cláudio Adão, para me ajudar na facilitação e liderança dos estudos e iniciamos, em novembro, o grupo de estudos com aproximadamente 20 profissionais que demonstraram interesse. As aulas foram realizadas em quatro domingos, na EE Parque Jurema III, com a autorização da dirigente, visto que a unidade fazia parte do programa Escola da Família. Criamos fóruns de discussão, realizamos simulados, revisamos o edital, compartilhamos o conhecimento e o resultado foi a aprovação de 80% do grupo. Foi sensacional! Ao final dos encontros, recebi um bom feedback dos colegas que expressaram a importância dos nossos encontros, não apenas pelo conhecimento teórico, mas também pela motivação que todos adquiriram coletivamente. Naquele momento eu compreendi que não poderíamos parar, ou nos restringir apenas aos colegas de Guarulhos, mas a todos os integrantes do QAE no estado de São Paulo. Nascia ali um grande objetivo, ir além, que mais tarde se transformaria no projeto chamado Profaci. Mas como eu atingiria todo esse público? Realizar os encontros de maneira presencial seria inviável, foi quando parti para a internet. 79 No início do ano de 2015 estava realizando um curso online e as primeiras aulas apresentavam a plataforma de estudas, o Moodle, muito utilizada por diversas universidades. Naquele momento tive um insight, “Por que não criar uma plataforma online de estudos exclusiva para os profissionais do QAE?!. Teríamos conteúdo online para a Certificação GOE e Promoção do QAE facilitando, assim, o acesso mesmo de quem morasse no interior do estado, aumentando muito as possibilidades de aprovação para esses profissionais tão desvalorizados. A plataforma seria uma forma de democratizar o acesso ao conhecimento, informar quais os requisitos para participardos certames e criar uma comunidade de ajuda mútua. Fiz uma consulta online de interesse em alguns grupos de Facebook dos AOE-s e tive uma boa devolutiva que serviria de base para dar sequência à ideia. Alguns meses depois, 100 dos colegas consultados se transformaram nos primeiros alunos da Profaci. Mas como criei essa plataforma? Após algumas pesquisas no Google, encontrei o Leandro Maiotte, consultor de Moodle, e após explicar a ideia da Profaci, fechei a contratação do site, logomarca e implantação da plataforma de estudos. Contudo, ele me disse: “Rodrigo, vou te ensinar através de vídeos tutoriais como incluir os conteúdos de videoaulas, PDF’s sobre esses conteúdos, simulados, enfim, a organização de toda a plataforma é por sua conta”. Foi então que passei madrugadas e madrugadas assistindo os tutoriais dele e implantando na plataforma da Profaci, naquele momento era toda a bibliografia da Promoção do QAE, contida na Portaria CGRH 03-2013, ou seja, mais de 40 conteúdos. Em três meses estava tudo pronto. Lançamos o projeto em 20 de agosto de 2015 e o maior retorno que tive foi a gratidão das pessoas ao me relatarem que o curso foi fundamental para sua aprovação e que isso representou um resgate de autoestima, um aumento na autoconfiança e um leque de novas possibilidades que se abriam. Minha assertividade com a 80 Profaci foi grande devido ao fato de eu estar na mesma posição dos alunos, sentindo as mesmas dores, sofrendo com a invisibilidade da categoria, com a falta de valorização, com a baixíssima remuneração salarial e com a ausência de representatividade na Secretaria da Educação para o QAE. Em todo momento em que eu pensava em desistir do projeto, recebia mensagens de gratidão e via que estava fazendo a diferença na vida de milhares de profissionais, e eu não tinha o direito de interromper esse ciclo que até hoje dá excelentes frutos. Hoje, a Profaci possui um Polo EAD na FECAF e conta com graduação e pós-graduação cujo público- alvo são os profissionais do QAE que vão poder ter, assim, o maior aproveitamento do reenquadramento e dos futuros processos de promoção do QAE. No final de 2016, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo lançou um projeto para discutir a modernização da gestão democrática nas escolas públicas paulistas. A ideia foi unir todos os interessados: estudantes, servidores, professores, gestores, pais/responsáveis e sociedade civil para um esforço coletivo de aperfeiçoamento de Grêmios Estudantis, Escola da Família, Conselhos de Escolas e Associações de Pais e Mestres com o objetivo de ampliar a cultura democrática no cotidiano das escolas e de sua comunidade. Todo esse esforço culminou no Congresso de Gestão Democrática realizado em novembro de 2017 em São Paulo. Fui convidada para participar deste congresso representando os profissionais do QAE, mas naquele momento como ouvinte. Lembro que a Dani Inacio recomendou que eu interviesse caso houvesse a possibilidade falar em nome dos funcionários, foi ali que eu decidi criar essa oportunidade. Logo no primeiro encontro, enquanto agradecia à Raquel Fávero, Coordenadora Executiva do Projeto, por dar voz aos profissionais do Quadro de Apoio Escolar, a mesma, após indagar se eu era AOE, me perguntou se gostaria de participar do segundo encontro como expositor, pois um dos participantes não estaria presente. Eu vi a oportunidade 81 bem na minha frente e mais que depressa a agarrei, podendo mais uma vez ser bem-sucedido representando os profissionais do QAE. Exonerei em maio de 2021, para me dedicar ao empreendedorismo com a Profaci e mantenho comigo o desejo de lutar pela valorização dos profissionais do QAE. O sonho de atuar de forma mais intensa em prol dos profissionais do QAE foi realizado a partir da minha contratação como consultor da EFAPE exclusivamente para a formação continuada dos profissionais do quadro. Ano passado organizei e lancei “Prazer, somos AOE’s”, livro que conta as trajetórias de alguns dos profissionais do Quadro de Apoio Escolar do Estado de São Paulo, “Perseguindo o inconformismo”, a minha autobiografia e, agora este livro, que busca resgatar a história do QAE nos seus 30 anos, como um presente especial para todos os servidores do quadro: os do passado e o do presente - que ajudaram a construir o quadro e o mantém vivo - e, principalmente, os do futuro, que terão nessas páginas o suporte que aqueles não tiveram. Rodrigo Gabriel da Silva 82 83 Pelo que vimos até aqui, podemos sem dúvidas afirmar que a história do QAE é marcada por limites e possibilidades. Neste capítulo, você vai conhecer um pouco sobre as maiores dificuldades do quadro e de seus profissionais, assim como as expectativas deles para o futuro. A seguir, nos confrontaremos com questões espinhosas, com dores, receios e conformismos. Entretanto, descobriremos que, para alguns, ainda existe espaço para sonhar. CAPÍTULO 5 Desafios e sonhos 84 Presente e futuro: algumas discussões “A terceirização pulverizou muito os cargos e, hoje, não sabemos quem é concursado e faz parte do QAE ou do QSE e quem não é. Isso foi uma mudança muito profunda que vivi nesses anos. Eu acredito que o que a gente precisa é de identidade. A gente tem um lado muito legal, afetivo, que apresentamos para muita gente, para os estudantes, pais e comunidade, mas não temos reconhecimento enquanto profissionais da Educação. No futuro, gostaria que nos dessem uma nova nomenclatura, profissionais ou educadores de apoio. Eu espero que o caminho para essa valorização e reconhecimento seja bem curto, pois já são trinta anos esperando e lutando por isso.” Edson Ferreira da Silva 85 _______________________________________________ 14 SANTOS; CAMARGOS. Op cit. 2012, p. 372 Em alguns estados e cidades brasileiras, como no Rio de Janeiro por exemplo, os profissionais que se enquadram nas funções desempenhadas pelos AOE’s são denominados “Agentes Educadores”. Obviamente, a nomenclatura do cargo/ função não é o único fator determinante para a construção da identidade do funcionário de escola como educador. Mas, sem dúvidas, é um referencial importante para a construção de uma memória coletiva mais semelhante à realidade e ao cotidiano desses profissionais. A questão da terceirização, também abordada, é determinante. A construção do coletivo e da clara identificação de um grupo é hoje dificultada pelo avanço da terceirização de funcionários. Essa “pulverização”, bem destacada pelo Edson, dificulta a identificação do coletivo e auxilia no esvaziamento de pautas. Em entrevista ao Instituto Humanitas Unisinos (IHU), em maio de 2012, o sociólogo Ricardo Antunes disse que a terceirização é, atualmente, a porta de entrada para a precarização e intensificação da jornada de trabalho. Enquanto alguns apontam a terceirização como algo benéfico e inevitável, que reduz os gastos e aumenta a qualidade, para Antunes ela “é, em si e por si, nefasta e tem que ser combatida”, tendo em vista que é utilizada para reduzir “custos e para aumentar a divisão e, com isso, dificultar a organização e a resistência de trabalhadores”14. Monlevade destaca que “na contramão da luta travada no campo educacional pela valorização dos trabalhadores em educação, os processos de terceirização rompem a lógica 86 _______________________________________________ 15 MONLEVADE. Op cit., p. 373. que os move, baseada na busca pela valorização, por meio da formação inicial e continuada, remuneração condigna e condições de trabalho, de modo que possam contribuir política e pedagogicamente para a construção de uma escola pública de qualidade socialmente referenciada.” 15 “Desta vez, atuando em uma escola maior, com 3 turnos de funcionamento, atendendo o Ciclo II e o Ensino Médio, E.E. Maria Montessori, contávamos com 44 classes formadas. Único funcionário da manhã, tinha que dar conta de 3 andares. Foram momentos difíceis, pois a clientela da escola não colaborava. Naminha primeira semana recebi ameaças de morte ou mesmo que iriam me agredir, simplesmente porque não aceitavam ordens. Entre idas e vindas, em janeiro de 2011 fui convidado pelo Diretor da Escola Sr. Luiz a ser designado Secretário de Escola, e ali começou meu primeiro desafio. Nunca havia entrado na secretaria; não conhecia os sistemas que na época eram muitos como: PortalNet, JCAA, JBOE, PAEC, PAPC, JATI, enfim, teria que aprender tudo isso em em uma escola grande que vivia o caos funcional, pois tudo estava atrasado e os professores já não tinham muita paciência para esperar. Entrei nos grupos de Secretários do Yahoo e em diversos grupos do QAE espalhados pelo ORKUT. Em minha região, Leste 5, muitos secretários se recusavam a ensinar; os poucos e raros que me ajudaram eram de escolas muito longe, então dificultava muito o aprendizado. Por essa razão, para dar conta de tudo, minha jornada ampliou de 8 horas diárias 87 para 16 horas, ou seja, entrava às 7 horas da manhã e saía às 23 horas, e muitas vezes saía meia-noite. Tudo para aprender e conseguir tirar as demandas do atraso e posso dizer que sou muito grato às Secretárias de Escola Silvana do Brigadeiro e Ivanir do Congonhas do Campo que deram o combustível para iniciar a subida na função. No ano de 2012 sofri o primeiro impacto de estar na SEDUC- SP, dedicar-me ao trabalho e, como já mencionei, sem horário para sair do serviço. Deixei muitas e muitas vezes minha família em segundo plano, o que ocasionou minha primeira separação. Com isso, fiquei depressivo, tomando remédios como Fluoxetina, Sertralina, passando por psiquiatras, psicólogos, e ao mesmo tempo cuidando da escola. Com a chegada da primeira certificação de GOE, entrei em colapso. Mudei para outra cidade e gastava muito para chegar a minha escola, além do financeiro, demorava de 3 a 4 horas para chegar ao trabalho, e isso foi desanimando. Cheguei a pensar em exoneração por diversas vezes até que fiz amizade com a Diretora da escola vizinha, a Regina, que se tornou uma irmã. Ela mora na mesma cidade que fui morar e passou a me dar carona sem me conhecer, sem pedir ajuda em combustível, enfim, foi meu alicerce para poder me levantar. No ano de 2015 consegui a segunda certificação e voltei a exercer a função de GOE na E.E. Senador Paulo Egydio de Oliveira Carvalho. Mais uma escola enorme e na época tinham mais de 100 professores lotados e classificados ou com exercício na Unidade Escolar. Essa escola, que poderia ser a ascensão da minha carreira, quase se tornou um pesadelo. Na minha DE e em outras, era considerado um funcionário exemplar, com muitos conhecimentos e dominância em coisas relacionadas a SEDUC. Administrava junto com o Nilton Cesar Amorim diversos Grupos do Facebook, bem como era o dono de alguns grupos. No WhatsApp, criador do SED 1.0 e SED 2.0, entre outros; grupos os quais convidei pessoas da SED (envolvidas diretamente com a construção do sistema) 88 para participarem ativamente e escutar a Base das Escolas ou mesmo para agilizar na correção de possíveis erros de sistema. Mas por que seria um pesadelo? Foi quando iniciou por parte de uma pessoa que covardemente se escondia atrás do anonimato (quando se trata de denúncias inverídicas não se tem coragem de mostrar a verdadeira face), comecei a sofrer denúncias e denúncias por todo tipo de assunto inimagináveis; vivenciei por quase dois anos assédio moral dessa pessoa covarde, onde a cada semana, mês, tinha que ficar respondendo as acusações e provando que eram inverídicas. A inveja do ser humano não tem limites, e passar por uma humilhação de ter sempre 1, 2 ou 3 supervisores perguntando sobre você para outras pessoas, me deixava muito triste e arrasado, pois sempre lutei para ajudar as pessoas não importasse o dia e horário, e ter que sofrer por conta de uma pessoa problemática. Das mais de 30 acusações, consegui uma a uma, mês a mês, provar que eram inverídicas e que a pessoa autora apenas estava perseguindo a minha pessoa por estar sempre em evidência nos assuntos da educação. Cansado de tantas acusações, não poderia mais viver “pisando em ovos”; foi quando “comi” literalmente a legislação de Gerente de Organização Escolar e encontrei uma brecha; e em dezembro de 2015, fui o primeiro funcionário a conseguir esse feito de não ficar impedido de ser designado Gerente de Organização Escolar após a cessação. Em toda minha vivência em termos de Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, fiz muito pela categoria que vai desde ensinamentos, capacitações, construção de planilhas denominadas calculadoras automatizadas como: Auxílio Transporte, Readaptação, Evolução Funcional pela via não acadêmica, imposto de Renda Retido na Fonte, ou para controle como Cadastro de Alunos, Cadastro de Servidores, referências de legislação, entre muitas outras, enfim, todas elas as quais são atualizadas até atualmente. Como já citado anteriormente, nem tudo são flores, existem muitas pessoas invejosas e maldosas que 89 querem te derrubar gratuitamente, pessoas essas que plagiam seu trabalho copiando ou mesmo substituindo o nome dos arquivos e se autointitulando autores. É triste e deplorável que pessoas assim ainda estejam atuando na Secretaria da Educação, essas não são dignas de estarem nessa classe que muito faz pela Educação do Estado de São Paulo. Por fim, no ano de 2019, exonerei do cargo de Agente de Organização Escolar, para ingressar na rede como Professor de Educação Básica I. E mesmo estando em outra classe, ainda contribuo muito com o QAE, apesar desses contratempos, amo de coração essa categoria que merece muito a valorização do Governo do Estado de São Paulo. Hoje, estou atuando no CGRH, precisamente no CEPEA.” Wilmar Galdêncio de Oliveira Júnior 90 “ A teoria é boa mas geralmente não atinge a prática. Sou secretária de escola e não tenho perspectiva de mudança financeira. Outra questão do quadro é a robotização da ação, as pessoas deixam de mudar. A pessoa bate um carimbo por trinta e cinco anos, continua o mesmo carimbo, o mesmo papel. As gerações mudaram e o quadro precisa ser mudado. Quando o Rodrigo falou que a tentativa do livro era achar uma identidade para o QAE, eu fiquei pensando… A gente não constrói uma identidade sem o reconhecimento do outro. Vem alguém e fala que você é “tio”, vem alguém e fala que você é o “inspetor”, ou o “tio da secretaria” e tal… Mas é que é tão ampla e tão importante a atuação do QAE como educador, só que é um educador que não tem esse nome porque não é reconhecido entre os pares. No geral, não é reconhecido pelo professor que o secretário ou o agente é um educador, por exemplo. Mas pelas crianças é, e precisamos levar em consideração que é uma educação, que na verdade é um cuidado. O agente é um ponto de cuidado e de apoio muito importante. As pessoas se reduzem. Quem se considera um nada, como trabalha? E se quando me esforço, não tenho o reconhecimento dos demais, como seguir? Eu sempre trabalhei em livrarias, então comecei a fazer Pedagogia e um amigo meu falou que tinham aberto um concurso na área da educação. Fiz o de Agente e o de Secretária. Optei pelo segundo. O problema é que eu entrava sempre para assumir o lugar que já era de alguém, o que nunca me deixou confortável e fazia com a equipe não se sentisse confortável comigo, não foi fácil e nem simples.” Carolina Soares Manfio 91 “De todos os cargos que tive, o mais complicado foi o de secretária. No primeiro mês, quando eu estava fazendo uma substituição, perdi cerca de quatro quilos devido ao volume de trabalho.” Audineia Almeida dos Santos 92 _______________________________________________ 16 SANTOS; CAMARGOS. Op cit. 2012, p. 366. Os três relatos acima abordam, de alguma forma, adoecimentos físicos e psicológicos que são, em última instância, provocados pela sobrecarga e pela falta de reconhecimento sofrida pelos educadores do QAE. Santos e Camargos destacam que: “se a categoriatrabalho torna-se referência na constituição do modo de vida do homem, no estabelecimento das suas relações afetivas e na construção das suas habilidades e competências, ela também assume papel fundamental em sua saúde física e mental.” 16 Por isso, é extremamente importante que o reconhecimento e a valorização do quadro passe por uma abordagem global e que pensem os mais diversos sujeitos da categoria. 93 “Iniciei em 2010 como AOE, o reenquadramento me ajudou muito porque cheguei até a faixa 6C. Estive com o Rodrigo auxiliando desde o início da Profaci. É possível ter melhoras, apesar de tantas dificuldades e diante do governo e SEDUC deixarem o QAE sempre por último na prioridade das ações da Educação. No cargo de secretário de escola ou de GOE as demandas são extremamente extenuantes. Muitas vezes, fiquei para além do meu horário. Quanto mais problemas a escola tem, mais difícil se torna o trabalho, nesse quesito eu dei sorte. A escola, assim como a Diretoria de Ensino, não tinham grandes problemas. Um dos problemas que temos é da regulamentação das nossas atividades, ainda que elas estejam juridicamente muito bem definidas. Falta supervisão e modernização da carreira. Exonerei em Agosto para assumir o cargo de Professor do Ensino Médio e Técnico na ETEC CEPAM e ETEC Perus.” Claudio Adão dos Santos 94 “Iniciei como Inspetor de Alunos em 1986, em um processo seletivo. No início foi difícil, foi havendo vários concursos. Eu não tenho como falar muito em mudanças negativas. Eu gosto muito do trabalho na escola, para mim sempre foi extremamente gratificante, é o tipo da coisa que me completa. Claro que tem uma parte boa em termos funcionais que eu melhorei bastante, eu fui atrás de graduação, de pós-graduação. A melhor parte para mim é a energia da escola, a energia move a gente. Eu sou formada em Ciências Biológicas e em Pedagogia, com uma pós-graduação em gestão escolar. Eu espero que sejamos melhor reconhecidos na Educação. A Educação não se faz só com o professor, a Educação passa pelo portão da escola, passa pela servente que varre o pátio, passa pela secretaria, passa por todos nós.” Virginia Pupolim 95 “O que eu espero? Eu costumo dizer que eu sou um sonhador, eu respiro a Educação, eu faço com amor, mas nem só de sonhos vive a realidade. Nós sempre esperamos mudança. Hoje, estamos em uma fase. O AOE está no seu ano.” Nilton Cesar Amorim 96 Para não concluir A construção de identidade é, como dissemos no início deste livro, um processo complexo e que não depende apenas de uma decisão autônoma, mas de um reconhecimento social. Após a leitura destas páginas, espero que você tenha percebido que as últimas três décadas de trabalho desses profissionais foram dedicadas à Educação e não existe motivo algum para não considerá-los como que eles são: educadores. Esperamos firmemente que estas páginas sejam um motor para o surgimento de outras mais, para que as trajetórias desses educadores inspirem as futuras gerações e que os projetos e iniciativas se multipliquem e deem frutos que representem a categoria e a sua importância. Este é apenas o começo. Vamos juntos! 97 CAPÍTULO 6 Manifesto dos educadores do QAE Nós, autores e profissionais do QAE que contamos nossas histórias neste livro, acreditamos que ainda chegará o tempo no qual todos os funcionários do Quadro de Apoio Escolar (QAE) e do Quadro de Servidores da Educação (QSE) serão considerados e, principalmente, tratados como EDUCADORES, sem distinção do lugar que ocupam dentro ou fora das escolas. Todos os profissionais da Educação - desde os da limpeza até os dirigentes de ensino - sejam eles professores, funcionários administrativos ou operacionais são EDUCADORES, e nossos Governantes precisam aprender, entender e saber a respeito. 98 Nós, servidores do QAE e do QSE, somos fundamentais para o processo ensino-aprendizagem. Somos nós que conhecemos como a palma de nossas mãos toda a comunidade escolar, alunos, pais e responsáveis, professores e gestores. Somos nós que conhecemos também toda rotina para que a engrenagem escolar funcione. Sabemos que os prédios escolares representam o coração da rede estadual de ensino e que toda a estrutura advinda das diretorias regionais e órgãos centrais colaboram com os trabalhos desenvolvidos nas salas de aula, secretarias, pátios e demais ambientes das unidades escolares. Somos autores, sujeitos e aprendizes sempre, do Secretário da Educação do Estado de São Paulo ao terceirizado da limpeza, numa escala que, sem o peso do juízo e de valor hierárquico, devem representar o destino da Educação que não é outro senão o da LIBERTAÇÃO. A última década foi marcada por avanços significativos para a nossa carreira, mas esses ainda são insuficientes para refletir a valorização que merecemos. Na rede estadual de São Paulo devemos concretizar e legitimar essas vitórias no dia a dia, de forma a assegurar nossos direitos frente um Governo que trabalha para retirá-los nos mais diversos âmbitos, sejam eles previdenciários, trabalhistas e/ou sociais. Não podemos nos calar e não devemos deixar que nos calem! A luta é constante e devemos nos manter combativos em direção a uma carreira mais justa e ao reconhecimento de nosso papel enquanto EDUCADORES. Hoje, mais do que nunca, é necessário carimbar nossa condição. É importante que destaquemos que cada profissional da área da Educação, dentro e fora da escola, tem um papel muito próprio na vida de cada aluno, mas que o nosso olhar é extremamente especial. Quantas vezes nos dispusemos a ouvir e aconselhar? Quantas vidas vimos mudadas após um 99 olhar diferenciado para o aluno “problemático”? Muitas crianças, jovens e até adultos têm nesses profissionais um confidente que, por vezes, chega a ocupar o lugar que deveria ser assumido por um familiar ou amigo, mas que infelizmente não é. Valendo-nos de uma citação ouvida numa reunião de Diretoria de Ensino “somos todos anjos de uma única asa, que precisamos do outro para conseguir voar...” e relembrando várias situações vivenciadas nas escolas pelas quais passamos, conseguimos crer que SOMOS TODOS EDUCADORES e é necessário que haja esse reconhecimento. Diante de tudo o que já vivenciamos, vimos e ouvimos, é necessário que, no mínimo, tenhamos um piso salarial justo, em semelhança com o que ocorreu com os profissionais do Magistério ainda em 2008. Além disso, é necessário que mais ações sejam dirigidas para a valorização da nossa categoria, entre elas: o oferecimento de capacitações, cursos de nível técnico, superior e pós superior, além de uma jornada de trabalho mais justa e com condições mais dignas para que possamos ter um papel ainda mais significativo na formação de nossos estudantes. Ser educador vai além do conhecimento acadêmico (que, inclusive, muitos de nós também possuímos, ainda que isso seja completamente ignorado), ser educador é ser presente, empático e principalmente saber fazer a diferença. E nós fazemos a diferença. Sabemos disso e os alunos e alunas que veem em nós um firme alicerce para a sua sobrevivência física e emocional no ambiente escolar também o sabem. O famoso escritor brasileiro Rubem Alves dizia que “há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas”, nós estamos aqui para nos certificar que, para os nossos estudantes, a segunda opção seja a verdadeira. O conhecimento liberta e temos a certeza de 100 que contar as nossas experiências enquanto profissionais da Educação abre caminhos para conhecermos outras situações que acontecem cotidianamente nas escolas. Valorizar os profissionais do QAE e a memória do quadro é, sobretudo, acreditar no potencial humano de cada um que está engajado na luta de fazer a diferença. Recordemos e sigamos! Ângela de Paula Aparecida Moreira Gomes Audineia Almeida dos Santos Carolina Soares Manfio Claudio Adão dos Santos Edson Ferreira da Silva Ivanete Aparecida Guimarães Camilo Nilton Cesar AmorimRodrigo Gabriel da Silva Tânia da Conceição Moutinho Santos Valmir Barbosa Virginia Pupolim Wilmar Galdêncio de Oliveira Júnior 101 ALVES, Vinicius Prado. 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Altera a Resolução SE 52, de 9- 8-2011, que dispõe sobre as atribuições dos integrantes das classes do Quadro de Apoio Escolar - QAE da Secretariada Educação, 2017a. Disponível em: http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/11_17. HTM?Time=13/07/2020%2016:26:49. SÃO PAULO. (Estado). Resolução SE n.º 12, de 17- 2-2017. Dispõe sobre módulo e movimentação dos integrantes do Quadro de Apoio Escolar e do Quadro da Secretaria da Educação, e dá providências correlatas, 2017b. Disponível em: http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/ arquivos/12_17.HTM?Time=13/07/2020%2016:27:24. 105 SÃO PAULO. (Estado). Resolução SE n.º 54, de 28-8-2018. Dispõe sobre o processo de progressão, relativo aos anos de 2015 e 2018, 20, aplicável aos integrantes do Quadro de Apoio Escolar abrangidos pela Lei Complementar n.º 1.144, de 11-07-2011, e dá providências correlatas, 2018b. Dis- ponível em: http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/ arquiv- os/54_18.HTM?Time=13/07/2020%2016:28:30. SÃO PAULO. (Estado). Resolução SE n.º 70, de 14-11- 2018. Altera a Resolução SE 54, de 28-8-2018, que dispõe sobre o processo de progressão, relativo aos anos de 2015 e 2018, aplicável aos integrantes do Quadro de Apoio Escolar abrangidos pela Lei Complementar n.º 1.144, de 11-07- 2011, e dá providências correlatas, 2018c. Disponível em: http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/ arquivos/70_2018. HTM? Time=13/07/ 2020% 2016:29:43. SÃO PAULO. (Estado). Secretaria da Fazenda. Prestação de serviços de limpeza em ambiente escolar. In: Regras e dire- trizes para contratações de serviços terceirizados para órgãos e entidades da administração pública estadual. CadT@erc, v. 15. jan. 2019. São Paulo: Estudos Técnicos de Serviços Terceirizados. Disponível em: http://www.cadterc.sp.gov.br/ BEC_Servicos_UI/ cadterc/ui_CadTercApresentacao.aspx. Acesso em: 26 jun. 2020. SÃO PAULO. (Estado). Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Novo Fundeb. Perguntas e Respostas. Mar. 2021a. 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Institui Bonificação por Resultados - BR, no âmbito da administração direta e autarquias, cria a Contro- 106 ladoria Geral do Estado, dispõe sobre a Assistência Técnica em Ações Judiciais, altera as Leis nº 10.261, de 28 de out- ubro de 1968, e nº 500, de 13 de novembro de 1974, as Leis Complementares nº 180, de 12 de maio de 1978, nº 367, de 14 de dezembro de 1984, nº 432, de 18 de dezembro de 1985, nº 907, de 21 de dezembro de 2001, nº 1.034, de 4 de janeiro de 2008, nº 1.059, de 18 de setembro de 2008, nº 1.079, de 17 de dezembro de 2008, nº 1.080, de 17 de dezembro de 2008, nº 1.093, de 16 de julho de 2009, nº 1.104, de 17 de março de 2010, nº 1.122, de 30 de junho de 2010, nº 1.144, de 11 de julho de 2011, nº 1.157, de 2 de dezembro de 2011, nº 1.164, de 4 de janeiro de 2012, nº 1.195, de 17 de janeiro de 2013, nº 1.245, de 27de junho de 2014, nº 1.317, de 21 de março de 2018, e nº 1.354, de 6 de março de 2020, revoga a Lei nº 1.721, de 7 de julho de 1978, as Leis Complementares nº 1.078, de 17 de dezembro de 2008, nº 1.086, de 18 de fevereiro de 2009, e nº 1.121, de 30 de junho de 2010, e dá providências correlatas. Diário Oficial do Estado de São Paulo: Seção I, São Paulo, 131 (203), p. 1-5, 22 out. 2021b. Disponível em: http://dobus- cadireta.imprensaoficial.com.br/default.aspx?DataPublica- cao=20211022&Cadern o=DOE-I&NumeroPagina=1. SÃO PAULO. (Estado). Lei Complementar n.º 1363, de 13/12/2021. Dispõe sobre a concessão do Abono-FUNDEB aos profissionais da educação básica da rede estadual de ensino, na forma que especifica, e altera a Lei Complementar nº 1.144, de 11 de julho de 2011. Diário Oficial do Estado de São Paulo: Seção I, São Paulo, 131 (237), p. 1, 14 dez. 2021c. Disponível em: http://dobuscadireta.imprensaoficial. com.br/default.aspx?DataPublicacao=20211214&Cadern o=DOE-I&NumeroPagina=1. 107 SÃO PAULO (Estado). Subsecretaria de Gestão Legisla- tiva da Casa Civil. Lei n.º 17.372, de 26 de maio de 2021. Cria o Programa Bolsa do Povo e dá outras providências. Diário Oficial do Estado de São Paulo: Seção I, São Paulo, 131 (101), p. 01, 27 mai. de 2021d. Disponível em https:// www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/2021/lei-17372- 26.05.2021.html. 108 ANEXOS Última capa (e layout) do www.qaeqse.blogspot.com 109 Reunião na SEDUC-SP wn 2014 que culminou na conquista da incorporação dos décimos de GOE. Agentes de Organização Escolar lotam Audiência na Alesp (vídeo youtube) Agentes de Organização Escolar pedem socorro (vídeo youtube) 110 Agentes de Organização Escolar cria podcast para judar alunos a se prepararem para o ENEM (Matéria) Agente de Organização lança livro contando trajetórias destes profissionais nas escolas estaduais (Matéria) Gestão Democrática juntos somos melhores (vídeo youtube) Período daTarde - Planejamento & Formação QAE & SEDUC - Centro de Mídias (vídeo youtube) Live Diálogo com a Rede - Secretário Rossieli e AOE Rodrigo (vídeo youtube) Agora o Quadro de Apoio Escolar tem uma pósgraduação exclusiva! (vídeo youtube) 111 112 113 114É uma feliz oportunidade que essa data coincida com um momento tão importante para os mais diversos tipos de debates em nosso país. Aproveitando a ocasião, organizamos este livro, que é uma obra comemorativa que se propõe a resgatar a memória do QAE, de forma a colaborar com o processo de reconhecimento e valorização da categoria, posto em marcha após anos de lutas e de mobilizações, muitas vezes independentes, como as que deram origem a estas linhas que você está lendo. 11 Este livro foi escrito por muitas mãos e busca, talvez de maneira ambiciosa, ser uma ferramenta importante na construção de uma identidade para o QAE, fator primordial para a maior parte dos trabalhadores e trabalhadoras que o compõem. O fortalecimento do sentimento de pertencimento e do reconhecimento da prática vinculada à Educação é sumamente importante para a valorização dos profissionais do quadro e, consequentemente, para a conquista de novos direitos, espaços na sociedade e, principalmente, na comunidade escolar. Mas como essa história poderia ser contada? Como a memória de um quadro tão amplo e diverso pode ser resgatada em poucas páginas? Essas foram questões pensadas cuidadosamente e de forma coletiva: Como você viu acima, se chegou à conclusão de que a história do QAE está de forma definitiva vinculada às trajetórias dos profissionais que o construíram nestes últimos 30 anos. De fato, leis, decretos e disposições burocráticas 1 moldam os cargos e funções públicas, mas nada é tão factual e real quanto o cotidiano, o chão da escola, a vivência. Como sabemos, as projeções e teorias caminham, muitas vezes, longe da prática. É por isso que ao mesmo tempo em que procuramos privilegiar os pontos de partida inaugurados por legislações e que buscamos abordar as análises dos poucos especialistas que tematizaram o papel e a importância dos funcionários da educação não-docentes, optamos por dar protagonismo às nossas histórias que, de fato, foram as que construíram a trajetória do QAE. _______________________________________________ 1 As principais legislações referentes ao Quadro de Apoio Escolar serão abordadas ao longo de todo o livro, principalmente nos relatos dos profissionais consultados. Para ter acesso a uma tabela sistematizada, consulte o anexo ao fim do livro. 12 Assim, tivemos a ideia de reunir de forma remota diversos profissionais do quadro - da ativa, aposentados e exonerados - para conversarmos um pouco sobre as suas trajetórias e, principalmente, sobre os antecedentes, a formação, os desafios e os sonhos do QAE. Construímos este livro a partir de longos debates, desabafos e ideias em um grupo de WhatsApp e em reuniões por videoconferência, partindo de um ponto que privilegiava um resgate do passado do Quadro de Apoio Escolar da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Em 2021 publicamos Prazer, somos AOE’s, em que alguns Agentes de Organização Escolar do QAE contaram as suas trajetórias pessoais e, principalmente, profissionais. Esta obra teve e continua alcançando uma repercussão extremamente positiva e tem atingido o nosso principal objetivo: contribuir para a valorização do Quadro de Apoio Escolar, através de “A história do quadro pode se confundir com a história dos profissionais, quero dizer, se formos nos ater aos fatos das reformas, dos reenquadramentos, que identidade poderemos construir? Algo que tenha a cara de todos? É possível?” Carolina Soares Manfio 13 uma busca por maior visibilidade para a categoria. Dessa vez, fizemos um pouco diferente: demos preferência aos relatos que nos ajudem, de forma mais objetiva, a resgatar a história daqueles que realizam as atividades de secretaria escolar, acompanhamento dos estudantes nos momentos em que não estão com atividades executadas pelos professores, atividades de limpeza, merenda e vigilância, ou seja, aqueles e aquelas que são o coração da escola. Ao longo deste livro, contaremos com as contribuições inestimáveis de diversos profissionais do QAE, as quais serão destacadas no texto assim como as passagens acima, de Edson Ferreira da Silva e Carolina Soares Manfio, profissionais que aparecerão novamente nas próximas páginas. É a história do QAE contada por quem a construiu e a constrói todos os dias, destinada especialmente às próximas gerações de educadores do quadro. Entretanto, este não é um livro definitivo e nem acabado sobre a história do QAE. É o ponto de partida para resgatar uma memória que precisa, ainda que aos poucos, ser conhecida e apropriada pela coletividade. O reconhecimento das potencialidades desses profissionais não cabem nas palavras “tio” e “tia” e, na escola moderna, a Educação não acontece apenas na sala de aula. Queremos e precisamos ser reconhecidos como sujeitos do processo e sabemos que o primeiro passo para isso é contarmos a nossa história. 14 “Vamos escrever esta história e disputar a narrativa, mostrando nossa importância para a Educação.” Claudio Adão dos Santos 15 O papel da história oral e das trajetórias para a construção da memória do QAE Conforme destacamos, este livro tem uma base metodológica: a história oral. Essa metodologia, tomada de empréstimo do campo da História, foi a nossa aposta para contarmos a trajetória do Quadro de Apoio Escolar embasados, principalmente, nos desafios enfrentados ao longo dessas três décadas de existência. Ainda que compreendamos que a desvalorização do QAE se enquadra em um contexto de descaso generalizado com a Educação, não é segredo que representamos a parcela mais marginalizada e excluída desse todo. Ainda que tenhamos avançado nos últimos anos, nada nos foi dado de forma gratuita e todos os resultados são reflexos de mobilizações dos profissionais e, muitas vezes, de suas iniciativas pessoais. Além disso, devido ao nosso extenso rol de atividades, a tarefa de resgate da memória do quadro e, consequentemente, da construção de uma nova identidade para ele, se torna muito complexa: 16 “Quando falamos em identidade, falamos em algo que não é construído autonomamente, toda construção identitária parte de um reconhecimento que o outro oferece, que o outro reforça. Neste sentido, percebemos que não houve a construção da identidade do Quadro de Apoio como um quadro de educadores, pois nunca nos reconheceram como tal e aqui não é uma reclamação, é um fato. O Agente de Organização Escolar foi identificado como um agente escolar, parece redundante, mas é completamente diferente de dizer que era um agente educador. Também há uma confusão, aquela que diminui uma condição mais digna e genuína da posição do agente, a de que o agente é um cuidador. O cuidador tem um papel importantíssimo de apoio, apoio no sentido de base mesmo, para que a escola funcione. O agente é a escuta da mãe, o braço do professor e o colo do aluno. Mas tudo isso ainda é menosprezado e está preso numa narrativa de falta de valor, seja moral ou econômico. Sempre escutei pessoas do quadro se dizendo e se reconhecendo, que é o mais grave, sem esse tal valor. Pelo que vi esse livro tem esse propósito… Estou curiosa para saber como pensam em fazer isso. Resgatar ou criar uma identidade para esse pessoal no seu rol é um e no seu cotidiano é outro.” Carolina Soares Manfio 17 O sociólogo austríaco Michel Pollak, em seu texto Memória, Esquecimento, Silêncio destaca que: A memória coletiva que tentaremos desconstruir é a de que o QAE é composto, basicamente, por “tios” e “tias” que contribuem apenas de forma superficial com o processo educativo. Ainda que a função do QAE se restringisse ao “cuidado” e ao “apoio”, estas são por si, em um ambiente escolar, práticas educadoras. Limitar o conceito de educação ou o ato de educar somente ao que pode ser quantificado ou medido através de avaliações, não é compatível com a escola Ao privilegiar a análise dos excluídos, dos margin- alizados e das minorias, a história oral ressaltou a importânciade memórias subterrâneas que, como parte integrante das culturas minoritárias e dom- inadas, se opõem à “memória oficial”, no caso a memória nacional. Num primeiro momento, essa abordagem faz da empatia com os grupos domi- nados estudados uma regra metodológica e reabil- ita a periferia e a marginalidade. Ao contrário de Maurice Halbwachs, ela acentua o caráter destrui- dor, uniformizador e opressor da memória coletiva nacional. Por outro lado, essas memórias subter- râneas que prosseguem seu trabalho de subversão no silêncio e de maneira quase imperceptível aflo- ram em momentos de crise em sobressaltos bruscos e exacerbados. A memória entra em disputa. Os objetos de pesquisa são escolhidos de preferência onde existe conflito e competição entre memórias concorrentes 2. _______________________________________________ 2 POLLAK, Michel. “Memória, esquecimento, silêncio”. In: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 2, n. 3, 1989, p. 4. 18 do século XXI, que deve ser apta a formar indivíduos em um contexto em que as habilidades socioemocionais são mais importantes do que em qualquer outro momento de nossa história. A escola é um eixo fundamental e todas as suas engrenagens giram em torno de um único objetivo: educar. Logo os seus funcionários são, em essência, educadores, principalmente quando consideramos os moldes do QAE, em que os profissionais estão definitivamente ligados ao espaço escolar, não podendo exercer suas funções em qualquer outro lugar. Além disso, nos próximos capítulos conheceremos alguns projetos de educadoras e educadores do QAE que deixam ainda mais clara a complexidade e importância do quadro para a construção de uma educação de qualidade no estado de São Paulo. Obviamente, isto só é possível a partir da História Oral, através da análise de trajetórias pessoais que ressaltam a realidade, por trás da expectativa instituída pela Legislação. Sabemos, todavia, que mesmo a partir de uma metodologia assertiva não é possível construir uma análise ou uma pretensa identidade que tenha a “cara de todos”. O QAE é múltiplo. É invisibilizado. Possuímos histórias de profissionais extremamente engajados, inconformados, combativos e criativos. Do outro lado, temos aqueles que não possuem perspectivas, são conformados, territoriais e burocráticos. O Quadro de Apoio Escolar é complexo como todos os coletivos, mas há algo que sempre os une: a memória, a história. E por que, em 30 anos, ela nunca foi contada? Por que, em três décadas de existência, uma organização coletiva em direção a um resgate como esse nunca foi realizada? Se o maior remédio para uma crise de identidade é a construção da memória, por que esse caminho nunca foi traçado antes? Tentaremos responder nas próximas linhas. 19 O não-dito e a invisibilidade do QAE “Se apagarmos a chama da indignação, não conseguiremos nenhuma mudança. Nós temos uma inteligência que talvez os amedronte.” Edson Ferreira da Silva O esquecimento, o silenciamento e o apagamento são importantes armas de poder. O “não-dito” tem uma função importante, principalmente quando tratamos de grupos que estão, por algum motivo, à margem dos que recebem visibilidade cotidianamente. A dificuldade de articulação de um coletivo passa pela ausência de identidade, quando definido nos termos colocados pelos pedagogos Catarina Santos e Edmilson Camargos: Entende-se por constituição de identidade, neste estudo, o processo de construção de simbologias, ressignificação de palavras e ritos, fazeres e afazeres característicos de um determinado grupo social e perceptíveis por outros setores da sociedade com os quais convive. Um grau mais elevado na constitu- ição da identidade de um determinado segmento social ocorre quando, ao praticar uma ação inten- cional e específica conjugando saberes históricos com fazeres práticos específicos, estabelecidos pelas suas atribuições funcionais, ele se percebe autôno- 20 mo, para se defender e lutar por seus direitos em todos os aspectos, organiza-se em torno de uma pessoa jurídica, associação ou sindicato, para rep- resentá-lo nos embates com o governo, no caso dos servidores públicos3. _______________________________________________ 4 Dado retirado do Cadastro Funcional da Educação da SEE-SP. In: BARBOSA, Andreza. et al. “Contratação, carreira, vencimento e jornada dos profissionais da educação estadual paulista (1995-2018). In: Educ. Soc., Campinas, v. 43, e245702, 2022, p. 2. _______________________________________________ 5 ALVES, Vinicius Prado. Funcionários de escola: um novo sujeito na disputa pelas políticas educacionais. Dissertação (Mestrado em Educação) - Setor de Educação, Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2018, 112 p. _______________________________________________ 3 SANTOS, Catarina de Almeida; CAMARGOS, Edmilson Ramos. “Terceirização e adoecimento dos funcionários de escola”. In: Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 6, n. 11, jul./dez. 2012, p. 64. Disponível em: . Acesso em: jul. 2022. Logo, nesse contexto, a construção de uma identidade para o QAE se faz necessária para as conquistas mais almejadas pela categoria: valorização profissional e econômica, com uma política ampla - e que contemple todo o quadro - de salários e progressão de carreira, qualificação e formação continuada que reconheça este grupo e suas especificidades enquanto sujeitos do processo de ensino-aprendizagem, atores do espaço escolar e, claro, gestores. O poder de mobilização de quase 45 mil profissionais4 , se organizados, é gigantesco. O pedagogo Vinícius Prado Alves5 coloca que os funcionários de escola tendem a constituir, cada vez mais, sujeitos coletivos importantes no campo de disputas por políticas educacionais, o que pode ser, para muitos, considerado um risco. 21 Mais a frente vocês vão perceber que não raras foram as medidas disciplinares sofridas por profissionais do QAE que, de alguma forma, criavam algum núcleo de mobilização individual e/ou coletiva, ou simplesmente que se destacavam em seus trabalhos, rompendo o ciclo interminável de apatia. Afinal, é importante manter alguns silêncios e certas rotinas pré-estabelecidas. O ideal é o que os funcionários sejam dóceis e conformados, caso contrário, poderão ser alvo de advertências, isolamentos, perseguições, dentre outras práticas infelizmente comuns: Nós esperamos, entretanto, que este livro contribua para a mobilização da categoria e para a criação de uma identidade que gere sentimentos verdadeiros de pertencimento, distanciados de qualquer temor ou repreensões. Talvez, ao fim da leitura, você sinta falta de alguns personagens, instituições ou associações que não fizeram parte da fala e das reminiscências dos profissionais-escritores deste livro, mas esses serão “não-ditos” e “silêncios” sobre os quais poderemos tratar em outras oportunidades literárias. Por enquanto, esperamos que aproveitem a leitura. Essa tipologia de discursos, de silêncios, e também de alusões e metáforas, é moldada pela angústia de não encontrar uma escuta, de ser punido por aqui- lo que se diz, ou, ao menos, de se expor a mal-en- tendidos.6 _______________________________________________ 6 Op. cit.,1989, p. 8. 22 CAPÍTULO 2 Um breve histórico da trajetória dos “Funcionários da Escola” no Brasil O Quadro de Apoio Escolar faz parte de um espectro muito mais amplo: o de “funcionários de escola’’ ou “profissionais da educação”. É por isso que não é possível realizar uma tentativa de resgate da memória do QAE/São Paulo sem traçar um breve panorama sobre a história da atuação dos “profissionais de escola” no Brasil. Entretanto, aqui cabe destacar que, assim como no estado de São Paulo, a categoria sofre um processo de desvalorização e invisibilidade a nível nacional, o que pode ser destacado através de, entre outros mecanismos, da escassa produção intelectual sobre o tema. 23 Mas por que a produção acadêmicasobre o tema é importante se é algo “distante” do cotidiano da escola? É porque é importante, de certa forma, que os intelectuais assumam a vanguarda de assuntos como este, porque auxiliam na pauta para estudos o que, de fato, é fundamental a nível de estabelecimento de políticas públicas. Ao realizarmos as pesquisas para a confecção deste livro, chegamos a um dado extremamente alarmante: pouco se fala, a nível literário e acadêmico, da importância da atuação dos profissionais da educação não-docentes. De fato, dos mais de 800 mil resultados reportados pelo Google Acadêmico a partir das chaves “educadores não docentes” e “funcionários de escolas”, apenas 0,01% desse contingente - cerca de 80 trabalhos - abordam de forma tangencial a memória, a história e a atuação desses profissionais. Ainda mais preocupante: não há nenhum retorno para “quadro de apoio escolar” que diga, de fato, respeito ao QAE/SP 7. De forma geral, há pouco esforço em resgatar a memória desses profissionais até mesmo por pesquisadores da História da Educação. A referência mais corrente, encontrada nos poucos artigos, dissertações e teses que tematizam a trajetória desses profissionais são as obras do filósofo, sociólogo e doutor em Educação brasileiro, João Antonio Cabral de Monlevade._______________________________________________ 7 Entretanto, defendida em inícios de 2022, temos a dissertação de mestrado em Educação pela UNIFESP de Erick Dantas da Gama, Somos todos educadores? A ideia de “profissionais da Educação” entre os trabalhadores não docentes da rede estadual paulista. A dissertação, que será muito referenciada nos próximos capítulos, traz uma análise muito bem estruturada sobre a atuação e o papel do QAE para a Educação do estado, bem como problematiza o que é ser educador na contemporaneidade. Vale, sem dúvidas, a leitura. In: GAMA, Erick Dantas da. Somos todos educadores? A ideia de “profissionais da educação” entre os trabalhadores não docentes da rede estadual paulista. Guarulhos, 2022. 201 p. Dissertação (Mestrado em Educação). Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade Federal de São Paulo. 24 Monlevade começou os seus estudos sobre o tema em meados dos anos de 1990, acentuando a sua atuação na área após a conclusão de seu Doutorado, no ano 2000. É autor, dentre outras obras, de apostilas do Profuncionário, projeto elaborado pelo Ministério da Educação para os funcionários de escola, em 2005. Nas próximas páginas, contaremos com a contribuição dos estudos do filósofo e sociólogo para traçar um breve panorama da história dos funcionários de escola durante a história. 25 Os antecedentes dos “funcionários de escola”: do período colonial a proclamação da República A história dos “funcionários da educação” no Brasil está atrelada à própria história da educação. As primeiras agrupações de ensino remontam ao período colonial por iniciativa da Ordem dos Jesuítas (1540-1759), portanto tinham um caráter estreitamente vinculado à religião católica. No período das escolas jesuíticas, as funções secundárias eram exercidas pelos “irmãos coadjutores” (auxiliares), que, mesmo tendo instrução, viviam em posição de subalternidade em relação aos padres dentro dos colégios e seminários. Eles desenvolviam suas atividades na cozinha, na sacristia das igrejas, na horta, no pomar e na fazenda, na enfermaria, na biblioteca, nas oficinas de costura, de marcenaria, de ferraria, de trabalho em couro, etc. Esse período foi também marcado pela divisão social do trabalho no interior da educação jesuítica: professores (padres) e irmãos coadjutores (auxiliares), que, por sua vez, eram auxiliados por escravos. A partir de 1759, com a expulsão dos jesuítas ordenada pelo Marquês de Pombal, o ensino passou a ser realizado em espaços privados, nas chamadas aulas régias. Sobre esse período, Monlevade destaca que: 26 Pouquíssimo se tem pesquisado acerca do pessoal que compunha o “corpo de educadores” do período das aulas régias (1772-1834). A visão reducionista dos estudiosos da educação escolar, que só conseg- uem perceber em cena, nas escolas, professores e alunos, torna os demais “invisíveis”. A realidade, entretanto, é que sempre estiveram presentes nas escolas outros trabalhadores [...] Quem limpava a sala depois das aulas? Quem mantinha a provisão de água de beber e de lavar as mãos de mestres e discípulos? Quem “rondava” a sala para impedir a entrada de estranhos e controlar a saída dos estu- dantes? Quem executava os “mandados” externos dos professores? A resposta, muda e invisível, mas que contribuía eficazmente para a manutenção do status quo no espaço escolar e no tempo social era: os escravos e escravas.8 _______________________________________________ 9 MONLEVADE, Op. cit, 2009, p. 361. _______________________________________________ 8 MONLEVADE, João Antonio Cabral de. “História e construção da identidade: compromissos e expectativas”. In: Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 3, n. 5, p. 341, jul./dez. 2009. Disponível em: . Acesso em: jul. 2022. Monlevade coloca também que a ampliação do atendimento à educação e a criação de novas instituições educativas, como liceus, colégios e escolas normais, com a construção de prédios grandes e vários tipos de dependência, trouxeram à baila a necessidade de um quadro de pessoal diferenciado, além dos professores; “foi aí que nasceu a categoria dos funcionários da educação, não mais escravos, nem religiosos, mas funcionários públicos, assalariados.”9. 27 Em fins do século XIX, esse processo se intensificou e se espalhou de forma definitiva para outras províncias, além da capital da Corte. O modelo exportado para as capitais era o do Colégio Pedro II, fundado em 1837 no Rio de Janeiro, berço da elite imperial. A expansão alcança novos patamares com a Proclamação da República, como veremos a seguir. 28 Os antecedentes dos “funcionários de escola”: do Cidadãos e profissionais da Educação: do início da República a redemocratização João Antonio Monlevade destaca que os funcionários da educação como conhecemos hoje são, indiscutivelmente, produto da complexificação dos ambientes de ensino, o que só ocorreu após a proclamação da República, com a separação entre Igreja e Estado. No ensino primário, surgem os grupos escolares nas redes de ensino urbano das antigas províncias, que passaram a ser chamadas de “estados”. No ensino secundário, se disseminaram os colégios estaduais e as escolas normais, ou institutos de educação, primeiro nas capitais e cidades mais populosas e, depois de 1930, na maioria dos municípios. A rede federal assume a oferta da educação profissional, dotando cada capital de uma escola de “artes e ofícios”. Não admira que, nas décadas de 1910 e 1920, surja uma legislação inovadora sobre o “pessoal administrativo” das escolas, além de seus professores e diretores. Nesse momento aparecem as primeiras referências em portarias e diários oficiais das funções de porteiros, zeladores, secretários, escriturários, arquivistas, contínuos, inspetores de alunos, copeiros, serventes (agentes de manutenção e limpeza), auxiliares de biblioteca e de laboratórios. Para o provimento desses “funcionários” – palavra que se dissemina como designação da categoria dos não-docentes, embora não de forma exclusiva – ou se improvisam acessos por “livre nomeação” ou se organizam concursos públicos, da mesma forma como se fazia com os professores. Em outras palavras, mesmo que houvesse admissões por indicação política, foi construído um arcabouço legal funcional para organizar e 29 prover o quadro de funcionários, inclusive por orientação do Governo Federal, seja no tempo em que a Instrução fazia parte da Pasta dos Negócios do Interior, seja no período Vargas, com Gustavo Capanema no Ministério da Educação e Saúde. No tempo da reforma Sampaio Dória, em São Paulo, em 1920, Oscar Thompsonrecomendava a ampliação dos quadros “docente e administrativo”, distinguindo-os dos gestores do sistema: “inspetores e orientadores pedagógicos”. Neste livro, a partir da referência de Monlevade, chamamos de “era da democratização do acesso escolar” o período de 1946 a 1986, quando convergem três movimentos: urbanização, aceleração do fluxo escolar e produção dos recursos humanos, materiais e financeiros na área da educação. Resultou daí uma explosão de matrículas na educação básica pública. Nesse momento, a escola passa a receber um grande quantitativo de crianças e adolescentes, incluindo as da população mais pobre nas médias e grandes e cidades. Ocorre aqui uma grande virada: a escola deixa de ser um mero espaço de instrução e passa a dividir com as famílias a tarefa mais complexa e ampla de educar. Neste período de democratização do ensino, o ingresso dos funcionários passou a ser feita por indicação, principalmente vinculada ao apadrinhamento político- partidário de fazendeiros, coronéis ou autoridades locais, eram os chamados “servidores clientelísticos”. Sobre esse momento, João Monlevade destaca: Foi assim restabelecido um continuum histórico entre o trabalho escravo e os “serviços de apoio” na educação, que tinha sido até certo ponto inter- rompido pela imposição de alguma meritocracia entre 1889 e 1945. Não é preciso dizer que muitos 30 desses subempregos eram trocados por votos dos funcionários e de suas famílias nas eleições munic- ipais e estaduais, em favor de seus “empregadores”. Reforça-se então a invisibilidade dos funcionários. Um dos mais consagrados cientistas da educação brasileira, M.B. Lourenço Filho, autor de muitas obras sobre política e administração escolar, em seu livro Organização e Administração Escolar, verdadeira bíblia dos estudiosos da educação nesse período, com mais de trezentas páginas, embora reconheça a existência de “outros profissionais”, dedica-se somente a analisar o papel dos diretores e professores, como que passando uma borracha nas múltiplas funções executadas pelos “demais”.10 _______________________________________________ 10 MONLEVADE, Op cit, p. 366. A categoria dos funcionários de escola firmou-se, portanto, com a expansão educacional, no período entre 1934 e 1988, no qual a população passou de 35 para 150 milhões de habitantes e tornou-se 75% urbana. Essa explosão populacional levou à criação de muitas escolas primárias e secundárias de grande porte, que passaram a exigir a presença de “novos tipos de trabalhadores” para a educação escolar: porteiros, auxiliares nas secretarias, bibliotecários, preparadores de experiências em laboratórios, vigias, agentes de limpeza, inspetores de alunos e merendeiras. Com o processo de redemocratização e, consequentemente, com a promulgação da Constituição de 1988, a chamada Cidadã, muitas mudanças ocorreram no campo das mobilizações e lutas dos profissionais da educação que, nesse momento, passaram a reivindicar o seu status de elemento educador. 31 Da redemocratização aos dias de hoje Monlevade destaca que a década de 1980, período da chamada “redemocratização” do País, também foi marcada pela eclosão de vários movimentos sociais organizados, com destaque para o dos educadores, que lutaram em prol da escola pública, gratuita, laica e de qualidade. Com a realização das Conferências Brasileiras de Educação (CBE), esses movimentos articularam-se no Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, por ocasião da tramitação da atual Lei de Diretrizes e Bases (LDB), e intensificaram suas lutas sindicais. A luta pela valorização dos profissionais da educação foi ponto de convergência, incluindo os professores de todos os níveis de ensino e os “funcionários de escola”, gerando muitos debates, propostas e intervenções, com o objetivo de resgatar o valor social dos intelectuais trabalhadores e a garantia de uma educação pública crítica e comprometida com a transformação social. No final do período anterior, durante a abertura, que coincide com o aumento da inflação e as mobilizações dos trabalhadores para tentar segurar o poder de compra dos salários, também os professores e funcionários se “agitam” em fortes movimentos, com reivindicações e greves. Os professores públicos, impedidos constitucionalmente de se sindicalizarem, passaram a dar um caráter sindical a suas associações. Os funcionários de escola, vítimas de maior opressão, começaram a se “abrigar” em associações de professores, algumas com novas denominações: União dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais, Associação Mato-grossense de Profissionais da Educação, para ficar em dois exemplos. Ou então, partiram para fundar organizações próprias – o que aconteceu em São Paulo (Afuse), no Paraná e no Distrito Federal (SAE). 32 A criação da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), em 1990, tornou-se um marco na trajetória de lutas em defesa da unificação e fortalecimento dos trabalhadores da educação básica. Foi no âmbito da CNTE que os funcionários de escola pública organizaram-se e se unificaram, desencadeando um processo de luta para tornar todos os funcionários da educação básica educadores, que devem trabalhar articuladamente com os professores e demais especialistas. A partir da Constituição de 1988, os funcionários da educação passaram a ingressar nos quadros via concurso público, o que trouxe a eles a desvinculação do apadrinhamento político, permitindo a busca, por meio da luta e da legislação, do reconhecimento como profissional da educação. Nos últimos anos, um movimento do governo em direção a uma maior valorização do educador não docente vem ganhando, cada vez mais, contornos mais delineados. A sociedade ainda não assimilou que os funcionári- os são educadores profissionais – e não meros ajudantes dos professores ou apoios das escolas. Embora admitidos como membros dos conselhos escolares, por conquista dos sindicatos de 1988 para cá, seu papel como gestores ainda é muito frágil. Sua influência nas decisões das propostas pedagógicas se faz à revelia. Nas escolas privadas, ainda que muitas vezes tenham um reconhecimen- to social pelos alunos e famílias, são quase sempre desvalorizados nas relações de trabalho. 11 _______________________________________________ 11 MONLEVADE, Op cit, p. 367. 33 Uma mudança da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) inseriu os funcionários de escola, que exercem funções técnico-administrativas nas redes de ensino, como profissionais da área de Educação. Para que essa categoria profissional fosse reconhecida e valorizada, foi criada a lei federal 13.054/2014 12, que instituiu o dia 6 de agosto como o Dia Nacional dos Profissionais de Educação. Esse reconhecimento beneficiou cerca de um milhão de trabalhadores que atuam nas escolas de ensino básico. Nesta mesma linha, a lei estadual nº 17.566 de 02 de setembro de 2022 institui o “Dia do Servidor Público” do Quadro de Apoio Escolar (QAE) e do Quadro da Secretaria de Educação (QSE), também a ser comemorado em 6 de agosto. Sobre essas leis, apesar de estabelecer um ponto de referência importante, visto que datas comemorativas são agentes sensíveis da memória coletiva, fica apenas no plano de discurso, pouco atingindo a prática. Em termos materiais, a aprovação do novo FUNDEB, a partir da Lei 14.113 de 25 de dezembro de 2020, trouxe importantes alterações em relação ao antigo fundo (Lei 11.494 de 20 de junho de 2007). Uma das mais importantes foi a inclusão de todos os não-docentes no processo. De acordo com a Emenda Constitucional n° 108, de 27 de agosto de 2020, que inseriu no rol de investimentos do fundo, o investimento a todos os profissionais da educação escolar não deve ser inferior a 70%, no que diz respeito à valorização/ _______________________________________________ 12 BRASIL. Lei nº 13.054, de 22 de dezembro de 2014. Institui o dia 6 de agosto como Dia Nacional dos Profissionaisda Educação. Brasília: Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível em: . Acesso em 5 de julho de 2022 34 _______________________________________________ 13 Para mais informações, acesse: . Acesso em 5 de agosto de 2022. remuneração. No modelo antigo, somente os profissionais do magistério tinham direito a este investimento, que possuía o mínimo de 60% de investimentos13. Em resumo, o que se observa é que apesar dos avanços observados a partir da Constituição de 1988, o cotidiano ainda é, quase 35 anos depois, muito distante da realidade que se pretendeu instituir. A luta por reconhecimento e pela reversão do processo de desvalorização histórica é uma constante para todos os funcionários de escola do Brasil ainda nos dias de hoje, e isso não é diferente no Estado de São Paulo. 35 CAPÍTULO 3 O quadro de Apoio Escolar do Estado de São Paulo O Quadro de Apoio Escolar - QAE foi criado pela Lei 7.698/92, e neste ano completou três décadas. Até a promulgação da lei, os funcionários de escola eram nomeados ou admitidos, respectivamente, nos termos da Lei n.º 180/78 e da Lei n.º 500/74 e integravam o Quadro da Secretaria de Educação (QSE). Foram estabelecidos cinco cargos a partir da Lei 7698/92: Secretário de Escola, Servente de Escola, Inspetor de Alunos, Oficial de Escola e Assistente de Administração Escolar. 36 Em termos de escolaridade mínima, o Assistente de Administração Escolar deveria ter o Ensino Superior Completo; o Secretário de Escola o Ensino Médio; o Inspetor de Alunos e o Oficial de Escola o Fundamental Completo; e, para o Servente de Escola, era admitido o Fundamental Incompleto. A partir da criação do QAE, os inspetores de alunos que eram do QSE passaram a fazer parte do quadro, dessa vez admitidos pela Lei 500/74 (mesmo quem era nomeado), o mesmo ocorreu com o secretário de escola, já os escriturários (agora com a designação do cargo de auxiliar administrativo) e auxiliares de serviços puderam permanecer nas escolas ou pedir transferência para as Delegacias de Ensino. A criação do Quadro de Apoio Escolar consolidou a função dos funcionários desse quadro como profissionais da Educação. O anterior QSE ou contratação a partir de outras vias, fazia com que esses trabalhadores não tivessem, necessariamente, uma relação intrínseca com a Educação. Como vai ser ressaltado por diferentes educadores que construíram este livro, esses profissionais poderiam exercer funções em diversas secretarias, não apenas na Educação. A partir do momento em que o QAE é criado, esses profissionais passam a ser, essencialmente, funcionários de escola, ou seja, estariam mais ou menos envolvidos em processos pedagógicos de suporte das mais diversas naturezas e imbuídos do papel Com o advento da Lei Complementar 888/2000, foram extintas as funções e vagas de Inspetor de Alunos e as demais, juntamente com os cargos, foram unificadas com o cargo de Oficial de Escola e transformadas em cargos de Agente de Organização Escolar (AOE) e os cargos/funções de 37 Servente de Escola passaram a Agente de Serviços Escolares (ASE). Em 2011 a Lei Complementar nº 1.144/11, instituiu o Plano de Cargos, Vencimentos e Salários para os integrantes do Quadro de Apoio Escolar, da Secretaria da Educação, e extinguiu (em sua vacância) os cargos de Secretário de Escola e Assistente de Administração Escolar, mantendo os cargos de Agente de Organização Escolar e Agente de Serviços Escolares e criou a função de Gerente de Organização Escolar (GOE). Para ser designado GOE é necessário que o Agente de Organização Escolar, o Secretário de Escola ou o Assistente de Administração Escolar passem por processo de certificação, regulamentada pelo Decreto nº 64.902/2020 e Resolução SEDUC 93/2020. A Lei Complementar nº 1.144/2011, trouxe a possibilidade de “Promoção” (a mudança de faixa) uma forma de aumentar o salário base em até 35%, desde que o interessado realize uma prova, apresente certificado de conclusão de curso de nível superior ao necessário para o ingresso (ASE e AOE - Certificado de Ensino Médio, e Secretário de Escola - Certificado de Ensino Superior), e tenha cinco anos de efetivo exercício no cargo (ou seja, contar com cinco anos da data da nomeação do cargo em exercício, independentemente de ter tido outro cargo/função anteriormente). Para a classe dos AOE’s, a Lei Complementar nº 1.361/21 trouxe uma valorização no processo de promoção, passando de 3 para 6 faixas, de acordo com a titulação, a saber: 38 E para o ano de 2022, devido a transição desta legislação, os Agentes de Organização Escolar tiveram a possibilidade de serem reenquadrados nas referidas faixas de acordo com sua titulação, a partir de requerimento, sem a necessidade da realização da prova de promoção e nem do interstício mínimo que também sofreu alteração, conforme tabela acima. Além da promoção, a Lei Complementar nº 1.144/11, trouxe também a progressão (mudança de nível). A primeira progressão ocorre a partir da confirmação na investidura do cargo, ou seja, após o estágio probatório. Por isso, todos os funcionários que na promulgação da lei tinham mais de três anos de trabalho, passaram do nível A para o B automaticamente. A progressão foi normatizada pelo Decreto nº 63.471 de 2018 e Resolução SE 54 de 2018, para que a cada três anos exista a possibilidade de o funcionário progredir no nível superior. Assim, hoje nas escolas, apesar da terceirização, ainda existem alguns funcionários do QSE (auxiliares de serviços e auxiliares administrativos); alguns AOE’s categoria F (que fazem parte do QAE por integração, ou seja, prestaram concurso para Inspetor de Alunos antes de 1992) e poucos Assistentes de Administração Escolar e Secretários de Escola, 39 cujo cargo deixará de existir na vacância (aposentadoria, exoneração ou óbito), e a cada vacância do cargo de Secretário de Escola será criado um cargo de Agente de Organização Escolar para o Estado. Pode-se, então, dividir a história dos “funcionários de escola” de São Paulo em dois momentos: pré e pós QAE. A seguir vamos conhecer histórias desses dois períodos que conquistam, em um primeiro momento, pela multiplicidade. Apesar de, muitas vezes, ocuparem os mesmos cargos, estes são desempenhados em cidades, escolas e realidades completamente diferentes. As mais diversas experiências acentuam a face complexa e múltipla do QAE, que deve ser uma marca da identidade que se pretende construir para esses educadores. 40 Os “funcionários de escola” do estado de São Paulo antes da Lei do QAE: memórias “Eu tinha uma vizinha que era funcionária pública e aí me avisou que ia ter o concurso. Eu me inscrevi para inspetor porque eu não tinha o curso de datilografia, exigido para o cargo de escriturário. O quadro era o QSE - Quadro da Secretaria de Estado. Com exceção do Inspetor de Alunos, os funcionários dos demais cargos e funções do QSE poderiam atuar em qualquer instância, por exemplo: um auxiliar de limpeza, poderia trabalhar na Educação, na Saúde, na Justiça, em qualquer secretaria, desde que fosse do Estado. Entrei como Inspetor, em um concurso regionalizado por Diretoria de Ensino. No meu caso, no bairro em que eu morava só havia duas escolas, uma eu conhecia porque era na rua de casa e a outra eu não sabia nem onde ficava. E eu acabei conseguindo vaga para essa que eu não sabia onde ficava. Eu fiquei nervosa porque eu não conhecia nada (morava a pouco tempo no bairro) e foi a maior torcida da supervisão “Não, você vai conseguir, porque é um bairro longe que ninguém de fora quer, só quem é de lá mesmo, então você vai conseguir!”. Por fim consegui mesmo nessa escola. A escola contava com mais de cinco mil alunos e só tinha vaga à noite e fazia doisou três meses que alguém tinha sido assassinado na porta da escola e eu achava distante, tinha medo, mas tudo bem, acabei ficando à noite mesmo. No QSE, havia o servidor contratado livro-QAE30anos.indd 50 27/01/2023 12:27:14 51 pela Lei 500/74 e o funcionário efetivo. No meu caso, eu fui contratada pela Lei 500. Eu não sabia as diferenças de um para outro, mas com o tempo eu fui descobrir que pela Lei 500 não era efetivo, mas que você ficava, 41 teoricamente, efetivo, porque não era mandado embora. Então a diferença do efetivo para o Lei 500 é que eu não teria, na época, direito à remoção, à licença-prêmio, sexta parte, por exemplo, mas isso mudou na Legislação que criou a SPPREV, que tornou o admitido pela Lei 500, efetivo para fins previdenciários, dando a eles quase todas as vantagens do efetivo. Ingressei em julho de 1991 e como não tinha direito as férias, ajudei na secretaria da escola no final do ano. Em 1992 pedi a exoneração da função de Inspetor de Alunos e prestei o concurso para Oficial de Escola. Meu primeiro dia foi substituindo o Secretário de Escola e praticamente nunca realizei o serviço de Oficial, pois estive designada Secretário de Escola até prestar o primeiro concurso de Secretário de Escola do QAE em 2003, quando fui aprovada.” Angela de Paula 42 “Eu sou secretária de cargo e ingressei no Estado em 1991 pela PRODENPAR como escriturária. Eu estava procurando emprego e fiquei sabendo que tinha uma vaga na secretaria de uma escola. Pediram para que eu fizesse um teste de datilografia, respondi a algumas perguntas e consegui a vaga. Nos primeiros dias fiquei muito assustada porque foram logo dizendo que não tinham tempo para me ensinar nada e que eu deveria “me virar” e aprender enquanto fazia as demandas da secretaria. A diretora cobrava bastante para que não usássemos muito material e como, no início, eu errava muito a datilografia, ficava sempre muito nervosa.” Tânia da Conceição Moutinho Santos 43 Os “funcionários de escola” do QAE do Estado de São Paulo: memórias “A lei foi criada em janeiro, eu entrei em agosto em um concurso diferente de todos os outros, foi regionalizado e feito por unidade escolar, a inscrição era realizada na própria escola, de forma bastante informal. Como candidato, tive que ajudar a organizar as fichas, acreditam? Claro que o processo foi idôneo, porque eu não conhecia ninguém, mas isso é para que vocês vejam o quão diferente era do que acontece hoje. A educação para mim não era estranha, porque eu fui aluno da primeira turma do CEFAM (Centro de Formação e Aperfeiçoamento para o Magistério), então eu conhecia a estrutura de uma escola. Entrei conhecendo muito o ambiente, mas ainda assim tive um grande impacto. Eu ingressei em uma unidade que não tinha funcionário nenhum, então foi muito estranho. A escola tinha sido recém- inaugurada, em janeiro. Eu entrei como Oficial de Escola e três ou quatro meses depois fui designado Secretário. Na verdade eu já cuidava da parte administrativa desde agosto porque, como já disse, eu era o único funcionário, então já estava acostumado. Era uma escola de periferia, por que eu nutro bastante afeto até hoje. A grande mudança que não foi muito legal para a gente, mas que resolveu uma questão funcional do Estado, foi a fusão, no ano 2000, das funções de Inspetor de Alunos e Oficial de Escola. Isso porque os Oficiais de Escola, ao ingressarem, passavam para um rol de atividades que não contava, necessariamente, com as funções de pátio - não que a gente não fizesse, já que éramos responsáveis pela entrada e saída de alunos… Mas a Lei 888/2000 fez com que muitos Oficiais de Escola, acostumados com suas atividades originais na secretaria, tivessem que ir para o pátio sem preparo 44 nenhum. Foi um impacto muito grande para muita gente. Eu não cheguei a ir para o pátio, mas foi a mudança mais profunda que vivi nesses últimos anos, além da terceirização, que pulverizou muito os cargos e, hoje, não sabemos quem é concursado e faz parte do QAE e quem não é.” Edson Ferreira da Silva 45 “Em 1992 criou-se o QAE. Então, o que acontece: quando houve a legislação que criava o QAE, quem era Inspetor de Alunos QSE veio automaticamente para o QAE, só que ficou como Lei 500, independente de como ele estava. Ele era outro quadro, ele entrou como Lei 500. Todos os antigos Inspetores de Alunos passaram a fazer parte do QAE. Foi criado, então, o Oficial de Escola e o Secretário de Escola, que já existia na Lei de 1986, mas passaram a fazer parte também do QAE. Porque o QAE como seria só para escola, deixou de poder ter funcionários remanejados para outras secretarias. E aí eles criaram também o Assistente de Administração Escolar. No caso, na época, o Assistente tinha que ter o Ensino Superior para ingressar, para o Secretário era necessário ter o Ensino Médio, para o Oficial de Escola ou para o Inspetor de Alunos tinha que ter o Ensino Fundamental Completo. E aí veio o Servente de Escola no lugar do Auxiliar de Serviços, porque o Auxiliar de Serviços não veio diretamente para o QAE como foi o caso do Inspetor de Alunos. Ele teve um concurso próprio. Quem ficou como Auxiliar de Serviços QSE está assim até hoje… E esse precisava ter o Ensino Fundamental Incompleto. Quando foi ali no ano 2000, teve a primeira alteração na legislação de 1992, a Lei Complementar 888/2000, que passou então a nomear o Oficial de Escola e o Inspetor de Alunos como Agente de Organização Escolar. Então quem era Inspetor e quem era Oficial de Escola passou a fazer o mesmo trabalho. No início foi complicado porque alguns diretores mantiveram tudo como era, então a pessoa que era Inspetor continuou lá fora [no pátio], cuidando das crianças, e o pessoal que era da secretaria continuou na secretaria. Mas quando começaram as primeiras remoções, aí teve problema, porque teve gente que só trabalhava na secretaria e acabou, quando teve remoção, que ir para o pátio… E tinha 46 aquela coisa: você tinha escolha quando você optava na hora do concurso, você escolhia: “Eu quero trabalhar na secretaria ou eu quero trabalhar no pátio”… Então, no meu caso, eu entrei como Inspetor e, em 1992, assim que mudou para o QAE, eu optei por trabalhar na secretaria, porque eu não me dava bem como Inspetora, eu não gostava de lidar com as crianças, não que fosse algo assim: “Ah, eu não suporto!”, não, mas eu achava muito mais interessante lidar com papéis. E aí eu prestei esse concurso para tentar ir para a secretaria, porque quando eu era Inspetora, como eu entrei no meio do ano de 1991, eu não tinha direito a férias no fim do ano, porque era um ano para você ter direito a férias. Aí eu fiquei na secretaria, em dezembro e janeiro, ajudando a fazer histórico, a fazer ficha 100, essas coisas… E aí eu fiquei apaixonada pelo trabalho, então quando teve a inscrição para o QAE eu tentei, e apesar de eu não ter a datilografia, a diretoria viu o meu trabalho e falou “não, não, não tem problema, a gente vai receber os livrinhos que vão ensinar a datilografia” e eu, bobinha, acreditei e prestei o concurso, acabei passando e fui para a secretaria. Então quando juntou o inspetor e o pessoal de secretaria, para mim não teve problema, porque eu já estava designada a secretaria. Apesar de ser Oficial, eu já estava designada secretária já havia algum tempo porque o concurso foi em julho e aí eu ingressei em agosto, dia 3 de agosto, e eu já fui direto para substituir a secretária. Então eu nunca exerci o papel de Oficial, sempre fui Secretária desde o primeiro dia que eu passei a Oficial de escola. Então, era mais difícil de trabalhar? Era. Porque você fazia tudo, era tudo manual, se tivesse hora-extra, você tinha que calcular a hora-extra… Na época, as pessoas que trabalhavam na secretaria e no pátio, todos os funcionários em geral, tinham direito a 210 horas-extras por ano, então era publicado em Diário Oficial que você tinha direito às 210 horas, saía o seunome, e você fazia essas horas-extra e então recebia. Depois isso foi retirado, já não 47 tinha mais direito. Mas essas horas-extras quando fazíamos, a gente tinha que calcular de forma manual, era bem complicado. O BFE era feito manualmente, enviado para a Diretoria e da Diretoria que eles davam andamento nos pagamentos. E aí você tinha que colocar o 09 em vermelho, né? Era uma coisa assim que era de praxe, e o resto era em azul. Então a gente tinha que assinar o BFE, o diretor assinava o BFE para ele ver que estava tudo “certinho”, então ia para Diretoria e era lá que eles resolviam se eles digitavam ou se eles mandavam lá para a SEEDUC, né? Na época eu não sei como chamava a SEEDUC. Mas, então era assim. E as horas-extras, no geral, a gente fazia aos sábados, quando tinha alguma reposição ou alguma outra coisa, então a gente recebia essas horas-extras. O Diário Oficial a gente lia no papel e precisávamos saber cada detalhe de cada coisa, como é que era confeccionada cada coisa, era complicado. Hoje não, hoje tá tudo mastigadinho lá, você só preenche os formulários, coloca a informação lá na internet e fica tudo resolvido.” Ângela Fátima de Paula 48 “Houve a criação do QAE em 1992, com sua legislação própria, assim separando os funcionários da educação do QSE, o que limita os funcionários a circularem apenas entre escolas não há mais a possibilidade de atuação em outras secretarias, com pequenas exceções, ganhamos e perdemos, ganhamos pois até o presente momento a Secretaria de Educação concede mais benefícios ao QAE em relação ao QSE, porém dividiu a classe dos servidores, sendo que atendem a mesma secretaria; fizemos uma prova em nível de Unidade Escolar e passamos de escriturário para Oficial de Escola, o que abriu oportunidade para novas contratações de funcionários principalmente de candidatos que moravam nas adjacências da escola, cargo que posteriormente foi transformado no atual Agente de Organização Escolar e ficou mantido o cargo de Secretário, com Lei 1.144, fomos agraciados com alguns benefícios como a promoção por mérito e a progressão, institui- se a função de GOE que trás um certo retorno financeiro para alguns mas em certos aspectos condicionou servidor por tratar-se de função de confiança. Com o passar dos anos e a criação de novas Resoluções, Decretos e o aprimoramento do sistema as coisas foram se transformando, foi um avanço quando começaram a implantar os computadores com internet nas escolas, me recordo que quando disponibilizaram a Prodesp e passamos a contar com a impressora Laser Jet, ficamos entusiasmados com as novidades e nos ofereceram um curso; aqui na minha cidade, São José dos Campos, foi no SENAC, mas considero que foi apenas uma introdução, pois o curso foi de um mês para o Word, Excel, Power Point, Internet, comandos da Prodesp e mais um que não me lembro, acho que Access, tempos mais tarde fiz um cursinho básico com os meus próprios recursos. Também promoviam alguns encontros 49 presenciais para darem treinamento principalmente quando ocorria alterações nos formulários, como forma de atualização em acordo com as Resoluções e Decretos vigentes.” Valmir Barbosa “Eu ingressei como inspetor de alunos, em 1996. Quando houve a fusão, nos anos 2000, devido ao esvaziamento que estava sendo observado nas funções, eu fiquei praticamente sozinho na escola, então realizava funções de secretaria e atendimento de aluno no pátio. Em 2009 houve o primeiro concurso de AOE e eu entrei, foi quando passei a ter um cargo efetivo no Estado. Em 2011, eu assumi a função de GOE.” Nilton Cesar Amorim 50 “Entrei em 1991 e fiz um concurso público que era para uma categoria função/atividade (Lei 500). Hoje eu estou muito informada devido à tecnologia, mas quando ocorreu a mudança com a criação do QAE, ainda era distante o pessoal de pátio e secretaria. O que mudou para mim é que me falaram que eu iria para outra escola porque a partir daquele momento eu teria um cargo efetivo. Mas nenhuma outra alteração porque se ainda hoje não chamam os profissionais para falar sobre a Legislação, naquela época ainda era mais complicado. A diferença é muita de quando eu entrei. Ingressei em 1991, como Inspetor de Alunos, passando como Agente. As dificuldades eram muitas. Não existia telefone na escola em que eu trabalhava, nós utilizávamos o orelhão em Nazaré Paulista. Comprávamos várias fichas na rodoviária e de lá ligar ou ir na casa do professor. Não tínhamos tecnologia, tampouco informação. Eu sempre fui do pátio, sempre me identifiquei nessa função. Uma coisa que me deixou triste lá atrás foi que em setembro de 1997 a escola em que eu estava foi municipalizada e todos tiveram que sair. Alunos e funcionários foram mandados para outra escola em meio ao ano letivo. Até hoje não aceitei. O que eu acho do trabalho aqui: paciência, paciência, paciência. Gosto muito de trabalhar com alunos e fico triste, por um lado, de pensar em aposentadoria. Vou sentir falta da correria e do contato com os jovens.” Ivanete Aparecida Guimarães Camilo 51 “Eu tenho 31 anos de Estado, ingressei em maio de 1991. Fiquei sabendo do concurso por uma prima minha. O concurso tinha 20 vagas, eu fiquei em 22º lugar, mas como houve desistências, eu consegui entrar. O cargo era para escriturário, depois passei a ser Oficial de Escola, que depois se tornou o Agente de Organização Escolar. Em seguida, fui designada secretária de escola e, hoje em dia, sou Gerente de Organização Escolar. Quando ocorreu a mudança para o QAE, precisei fazer uma prova interna para que houvesse a efetivação. A maior diferença que vejo é o fato de que, antigamente, era tudo manual, o que tornava o trabalho muito mais difícil. Utilizávamos máquina de datilografia, fax e telefone de discar! Prometeram que os computadores chegariam às escolas em 1998 e todos nós ficamos muito apreensivos porque não sabíamos nada sobre informática e o Estado não ofereceu nenhum curso ou treinamento, então aprendemos tudo sozinhos e, com o tempo, acostumamos. Em 2009 me transferi para uma escola nova que não tinha internet. Durante dois anos, eu precisava me deslocar para outros lugares, como a Diretoria de Ensino e outras unidades escolares para realizar todas as atividades burocráticas que dependiam de rede.” Audineia Almeida dos Santos 52 “Eu comecei no Estado em 1991, por intermédio da PRODENPAR. Fiz o concurso para escriturária e depois para oficial de escola. Eu fiquei sabendo da criação do QAE pelo Diário Oficial e todos ficaram logo focados em estudar. Em 1994, pedi remoção para outra escola, e depois disso fui designada secretária. As dificuldades dos anos em que tudo era “manual” eram muito grandes, precisei fazer até mesmo um curso de datilografia. Fazíamos documentos enormes, declarações, portarias… Se errássemos uma letra, precisávamos começar tudo de novo. No meu caso, quando chegaram os computadores, recebemos um curso da própria Diretoria de Ensino, mas ainda assim precisei pagar um curso “por fora” para acompanhar as frequentes atualizações. É importante lembrar que apesar de os computadores terem chegado em 1998, a internet só iria chegar muito tempo depois. Fiquei fora da escola por um tempo e voltei em 2017, sem nenhuma designação e foi um pouco difícil. Agora, com essa nova lei do reenquadramento de 2022, estou feliz da vida!” Aparecida Moreira Gomes 53 “Em 1992, com a criação do QAE, o que ocorreu foi uma espécie de concurso interno e fui efetivada como oficial de escola. Mas não houve uma grande divulgação da lei, apenas da oportunidade de efetivação e aumento de salário. Em 2006, fiz outra prova e me tornei secretária. Com todas as mudanças ocasionadas pela legislação de 2011, fiz todas as certificações e hoje estou como GOE. Estou há 31 anos na mesma escola, diferente de muitos outros colegas, nunca pedi remoção ou fui transferida para outro lugar. Acabei de concluir a pós-graduação e estou aguardandoa oportunidade de reenquadramento.” Tânia da Conceição Moutinho Santos 54 “Era dezembro de 2008, eu estava trabalhando na secretaria da Faculdade Torricelli em Guarulhos, quando uma notícia em um site de concursos saltou aos meus olhos: era o concurso para Agente de Organização Escolar do Estado de São Paulo. No mesmo dia fiz a inscrição pela internet e paguei a taxa na última hora, em 31 de dezembro do mesmo ano. Fui aprovado e, em abril de 2009, já estava escolhendo a unidade de trabalho. A minha primeira opção era a EE Profª Maria Aparecida Rodrigues, pela memória afetiva, visto que foi onde eu estudei desde a primeira série até a conclusão do Ensino Médio. Porém, um pouco antes da minha escolha, as vagas para esta escola acabaram, fazendo com que eu optasse pela EE Profª Lindamil Barbosa de Oliveira, por indicação de um colega, também na escolha que aconteceu na EE Conselheiro Crispiniano. Foi tudo muito rápido e em 21 de junho de 2009 entrei em exercício após a posse no cargo de AOE. A entrada naquele ambiente escolar, onde eu sempre me senti muito bem, foi muito prazerosa e era, na época, exatamente o que eu buscava. Pelo edital, eu já sabia que o valor do salário-base era penas de R$654,86. Mas também tinha em mente outros benefícios que um servidor público possui - estabilidade, licença- prêmio, quinquênios, progressão funcional, etc - e pensei: “Não é possível que seja só isso, R$654,86… Acho que dá para crescer na carreira, dá para ganhar muito mais, então vou com tudo!”. Mas quando cheguei dentro da unidade escolar para trabalhar, me deparei com um cenário estarrecedor, quase um banho de água fria no inverno: as pessoas estavam desanimadas, com a autoestima muito baixa, se sentiam muito desvalorizadas… O único sinal de paixão que ainda existia, transparecia somente durante as críticas ao governo! Quase tudo estava ruim, até o 55 café estava amargo (risos)! Brincadeiras à parte, mesmo com a boa vontade dos servidores veteranos e a motivação dos colegas que ingressaram comigo, parece que o ambiente de trabalho não permitia ir além - seja pela burocracia do Estado ou pela falta de visibilidade da categoria, mesmo com a enorme importância para a comunidade escolar. Para complicar ainda mais, não temos nenhum tipo de treinamento para começar a trabalhar, portanto é necessário aprender com os profissionais da própria unidade escolar (ou seja, não tinha para onde correr!). Dei sorte de ingressar em uma escola em q as pessoas gostavam de ensinar e tinham boa vontade, mas sei que nem todos os lugares são assim e isso é algo muito deficitário no Estado. Embora exista a EFAPE (Escola de Formação dos Profissionais de Educação), 99% de suas ações são voltadas para os profissionais do Quadro do Magistério. Então, logo na minha entrada nessa escola, procurei saber como poderia ter a oportunidade de crescer, Foi quando percebi que no Estado tudo é legislação, resolução, decreto… Comecei, naquele momento e por conta própria, a estudar as legislações do cargo para entender como tudo funcionava. Lembro que aprendi muito com o Nilton Cesar Amorim em suas postagens no Facebook sobre a carreira dos profissionais do QAE.” Rodrigo Gabriel da Silva 56 CAPÍTULO 4 Iniciativas dos educadores do QAE Devido ao processo de invisibilização por que passa a categoria, é comum que muitos profissionais do QAE se encontrem estagnados, com baixa autoestima, ou simplesmente confortáveis e conformados com as rotinas que levam. Apesar de essa ser uma das faces tristes de toda essa história, é real e compreensível. Não deve ser apagada. É uma marca, uma consequência, além de ser extremamente comum. 57 Entretanto, alguns educadores do QAE conseguiram, ao longo dos anos, gerenciar projetos das mais diversas naturezas dentro e fora de suas escolas, com os mais diferentes objetivos. Obviamente, muitos deles tiveram que lidar com obstáculos, perseguições, cansaço, desânimo… Mas, indubitavelmente, deixaram marcas na história do quadro que não poderiam ficar de fora desse resgate de memória. Desde iniciativas nas redes sociais - blogs, grupos no Orkut, Yahoo! e, mais recentemente, no Facebook e WhatsApp - que lograram conectar e informar uma comunidade tão grande, passando por mobilizações pela informatização dos dados, ações políticas, por projetos educacionais e até mesmo pela construção de uma empresa voltada para a valorização dos educadores do QAE. Temos de tudo! Nesse, que é um dos capítulos mais bonitos dessa história, conheceremos algumas das muitas iniciativas incríveis de profissionais profundamente capacitados, de uma potência sem tamanho e de um compromisso claro com a Educação: os educadores do Quadro de Apoio Escolar do Estado de São Paulo. Aproveitem! 58 QAE&QSE: O Blog da Cidadania “A informação para o QAE era muito escassa. A gente nunca teve uma representação que não fosse a Secretaria da Educação, nós não tínhamos um espaço em que pudéssemos conversar, porque ocupamos vários espaços, mas na verdade não temos um lugar específico para a gente. A legislação nos pede que ocupemos vários locais e várias funções ao mesmo tempo, mas não temos de fato um lugar. Hoje, está tudo mais fácil, mas até 2009 nós não tínhamos muitas coisas. As Diretorias não tinham site… Quem entra hoje imagina que sempre foi assim. Eu sou da época em que as reuniões eram informadas via telefone, escola por escola. Quando as redes sociais se cristalizaram, eu pensei em um espaço, criei um blog, mas ainda restrito a mim. Aos poucos fui abrindo para pessoas amigas, mas eu me sentia inseguro porque ainda estava descobrindo como fazer e gerir o espaço. Quando eu já estava mais confortável, uma pessoa aqui da cidade me deu a ideia de abrir o blog para todo público, isso foi em 2009 ou 2011. O blog ficou grande e comecei a me dedicar a ele, como eu não tinha dinheiro para adquirir um domínio, ele ficou como blog mesmo, acessível como “qaeqse.blogspot.com.br”. No blog eram postadas apostilas, normativos, manuais… Havia um vídeo fixo na página que representava o melhor dos ensinamentos: a voz e a fala das pessoas do povo. Eu comecei a postar também sobre os concursos, sobre remoções, e nos comentários sempre ocorriam discussões extremamente construtivas sobre a legislação. Em 2011, abri também a página do Facebook, começou tímida e em uma semana já estava com 500 seguidores e, no fim, já estávamos com 15 mil seguidores. 59 As mudanças legislativas me desanimaram um pouco. A página estava interessante, mas sofri muito hate e muitas ameaças. Eu era muito crítico. Eu tinha um e-mail que era vinculado à página e passei por muitos problemas. Foi o desgaste pessoal que me fez parar com o projeto. Ainda assim, O blog “QAE&QSE: O Blog da Cidadania” foi finalista na categoria Governo Aberto na 9ª Edição do Prêmio Mária Covas (São Paulo, maio de 2013). Inscrevi a página no concurso por ideia da Tathiana Santos, a nossa intenção nunca foi ganhar - ainda que tivesse sido muito legal - mas sim dar maior visibilidade para a categoria.” Edson Ferreira da Silva 60 Projetos “Leitura para quê te quero?” e Redação ENEM “O reconhecido projeto de incentivo à leitura para estudantes do Ensino Fundamental, o Leitura para quê te quero?, bem como o de leitura e redação para ENEM e vestibulares para os alunos do Ensino Médio, ocorreram entre 2019 e 2022. O trabalho em equipe é fundamental para construirmos projetos na rede estadual de educação de São Paulo, isso porque o Agente de Organização participa deles de forma conjunta com professores e outros funcionários. Porém, um trabalho coletivo e que busque sucesso em colaboração, só é possível na escola regular se existir de fato uma gestão democrática. Neste sentido, sobre a experiência de desenvolvimento de projetos, a gestão democrática do Diretor de Escola Ismar Pusti de Azevedo (2018-2021) na Escola Estadual Jardim Silvia II possibilitou o sucesso de diversos