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ALÉM DO QUE OS OLHOS PODEM VER: LINFOMA RETROBULBAR EM FELINO DOMÉSTICO COM REMISSÃO TOTAL APÓS QUIMIOTERAPIA – RELATO DE CASO JORDÃO, A.C.S.J.1; SÁ, M.S.2; LIMA, M.L.O.L.3; PONTES, L.M.S.3; SANTOS, I.G.L.3 1Universidade Federal Rural de Pernambuco; Departamento de Medicina Veterinária; anaclaudia.jordao@ufrpe.br 2 Universidade Federal Rural de Pernambuco; Departamento de Medicina Veterinária; 3Médica Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco; Departamento de Medicina Veterinária. RESUMO O linfoma é a forma mais comum de neoplasia em gatos, representando mais de 70% dos casos, especialmente em animais infectados com Fiv e/ou FeLV. Objetivou-se com este trabalho o relato de um caso de linfoma retrobulbar em uma gata jovem adulta, proveniente de abrigo na cidade do Recife/PE, FIV positivo, com sinais clínicos como desidratação, baixo escore de condição corporal e aumento de volume no plano nasal comprimindo o globo ocular esquerdo. O tratamento empírico do felino foi instituído com prednisolona 1mg/kg SID, seguido do protocolo CHOP e gabapentina 100 mg/gato antes das sessões de quimioterapia. Atualmente, está em remissão, com manutenção da quimioterapia a cada 28 dias usando doxorrubicina. Diante do exposto, evidencia-se que o tratamento para linfoma pode ser eficaz, proporcionando qualidade de vida e longevidade aos pacientes. Palavras-chaves: Extranodal; FeLV; FIV; Neoplasia hematopoiética; Protocolo CHOP. INTRODUÇÃO A neoplasia é uma das principais causas de óbito em cães e gatos, sendo responsável por cerca de 30% das mortes em gatos domésticos (Collette et al., 2016; Versteegh et al., 2023). Essa incidência se deve à maior expectativa de vida dos gatos, resultado da medicina preventiva, melhores cuidados nutricionais, controle de doenças infecciosas e avanços nos métodos diagnósticos. O linfoma, um câncer hematopoiético que se desenvolve a partir de células linfóides em órgãos sólidos como linfonodos, fígado e intestino (Horta et al., 2020), constitui entre 50% e 90% dos tumores hematopoiéticos em gatos e cerca de um terço de todas as neoplasias nessa espécie (Horta et al., 2020). Estudos indicam que 70% dos gatos com linfoma estão infectados pelo vírus da leucemia felina (FeLV), enquanto cerca de 20% possuem infecção pelo vírus da imunodeficiência felina (FIV) (Cristo et al., 2019; Jung, 2024). Gatos infectados com FIV têm até cinco vezes mais risco de desenvolver linfoma, e aqueles coinfectados com FeLV e FIV são mais de 75 vezes mais suscetíveis. O FeLV tem um papel direto na formação de tumores, enquanto o FIV contribui indiretamente, suprimindo o sistema imunológico (Couto, 2001; Horta et al., 2020). O linfoma felino pode ser classificado conforme sua forma anatômica em intestinal/alimentar, mediastinal, nodal e extranodal, com sinais clínicos variando conforme a localização e extensão da lesão (Couto, 2001). Locais extranodais comuns incluem rins, olhos, região nasal, sistema nervoso central e pele. Os linfomas retrobulbares são raros em gatos, sem predisposição quanto ao sexo ou raça, mais comuns em animais idosos, dos quais mais de 90% são malignos. Sinais clínicos típicos incluem exoftalmia progressiva, conjuntiva hiperêmica, protusão da membrana nictitante, ceratite por exposição, desvio e dificuldade na retropulsão do globo ocular e edema periocular, enquanto a enoftalmia é rara (Carvalho, 2016; Miller e Dubielzig, 2013). O diagnóstico do linfoma felino deve incluir anamnese, exame físico, análises hematológicas, exames de imagem, além do diagnóstico citológico e histopatológico, permitindo determinar a extensão da doença e o estado clínico do paciente para uma melhor estratégia terapêutica (Couto, 2001), geralmente baseada em quimioterapia, radioterapia ou remoção cirúrgica. À vista disso, o objetivo deste trabalho é relatar um caso de linfoma retrobulbar em uma gata jovem adulta, soropositiva para FIV e em remissão após quimioterapia. RELATO DE CASO Uma felina, fêmea, pelo curto brasileiro, idade não informada (adulta jovem), castrada, foi atendida numa clínica privada na cidade do Recife/PE no dia 19/01/2024 por uma médica veterinária especializada em felinos. A paciente havia iniciado há 3 meses um quadro de espirros, secreção nasal e ocular, com aumento de volume, além de rouquidão. Em outro serviço foi realizado antibioticoterapia com amoxicilina e doxiciclina, sendo observado resposta parcial. Segundo a tutora, a paciente mora em abrigo com mais de 60 gatos, não havia sido testada para FIV/FELV, sem acesso à rua, porém contactante de outros felinos positivos para ambos os vírus. Apresentava normofagia, alimentando-se de ração seca e sachê, apesar do emagrecimento progressivo; apresentava normúria, normodipsia e normoquesia. A tutora nega vômitos, tosse, desmaios e convulsões. A paciente não era vacinada e não fazia uso de ectoparasiticidas. No exame físico, a paciente apresentou mucosas normocoradas, desidratação 5%, Escore de Condição Corporal (ECC) 3/9, Índice de Massa Muscular (IMM) 1/3 e ausência de lesões em cavidade oral. A ausculta cardiopulmonar não apresentou alterações, no entanto possuía estertores respiratórios de vias aéreas superiores e aumento de volume em plano nasal e retrobulbar, comprimindo o globo ocular esquerdo, com leve sensibilidade à palpação. Além disso, observou-se ausência de dor abdominal, linfonodos sem alterações, pelos opacos e com leves falhas. O animal estava extremamente agitado, não permitindo palpação de tireóide, aferição de temperatura e pressão arterial sistêmica - PAS. Dentre os exames complementares solicitados foram realizados hemograma, bioquímicos (ALT, FA, glicose, albumina, creatinina e T4 total) e teste rápido para FIV/FELV. Enquanto se aguardava os resultados dos exames, a paciente foi liberada com protocolo analgésico à base de Dipirona (12,5 mg/kg BID). O resultado do hemograma indicou alterações como hiperproteinemia, leucocitose por neutrofilia, monocitose e eosinofilia absoluta. Também foram identificados baixas dosagens de albumina, creatinina e fosfatase alcalina. Devido a não autorização e não haver janela ultrassonográfica para coleta de amostra, a ultrassonografia abdominal e a citologia da neoformação não foram realizadas, respectivamente. O teste imunocromatográfico para FIV/FeLV foi realizado e indicou sorologia positiva para FIV. Após a coleta dos exames, iniciou-se o uso de Prednisolona 1mg/Kg SID. Devido a dificuldade do diagnóstico definitivo da condição, optou-se pelo diagnóstico terapêutico, sugestivo de linfoma, com instituição do Protocolo CHOP (Vincristina - 0,5 - 0,7 mg/m² IV ou IP; Ciclofosfamida - 200 mg/m² IV ou VO; Doxorrubicina - 1 mg/kg IV; Prednisolona 2 mg/kg VO SID - 1ª e 2ª semana; 1 mg/kg VO SID - 3ª e 4ª semana; 1 mg/kg VO QID - 5ª semana). Além disso, ela fez uso de Gabapentina 100 mg/gato - 12h e 2h antes de cada sessão quimioterápica. Atualmente, a paciente encontra-se em remissão da neoplasia, realizando a manutenção da quimioterapia a cada 28 dias com a administração de Doxorrubicina (1 mg/kg). DISCUSSÃO O linfoma é uma neoplasia frequente em felinos de causas multifatoriais, incluindo FIV e FeLV, que promovem imunossupressão associada à sua ocorrência (Batista e Griebeler, 2023). O linfoma retrobulbar é raro em gatos, apresenta alta taxa de malignidade e seu diagnóstico pode ser confundido com doenças inflamatórias não neoplásicas (Carvalho, 2016). O diagnóstico definitivo é realizado por análise histológica de citologias obtidas por aspiração com agulha fina, preferencialmente guiada por ultrassom, evitando o globo ocular, as principais veias orbitais e o nervo óptico. Se necessário, pode-se recorrer a uma biópsia excisional e/ou orbitotomia exploratória com biópsia (Carvalho, 2016; Miller e Dubielzig, 2013). Além disso, a citologia conjuntival tem-se mostrado um método diagnóstico acessível e não invasivo, melhorando a assertividade diagnóstica, tratamento e prognóstico, uma vez que a conjuntiva palpebral se une à conjuntiva bulbar (Jung, 2024). Entretanto, a coleta citológica não foi realizada nesta paciente devido à falta de autorização da tutora e à ausência de janela ultrassonográfica. Para casos de linfoma extranodais, além do protocolo CHOP, utilizado neste estudo, tem-se o protocolo COP, muito indicado por apresentar resultados promissores, com regressão de até 100% das lesões mensuráveis e dos sinais clínicos (Versteegh et al., 2023). Mesmo que outros protocolos estejam disponíveis e sejam adequados para o tratamento desta condição, respostas variáveis podem ser observadas a depender do indivíduo e do tumor, como a lomustina (inclusa no Protocolo LOPH) para uso em protocolo de resgate (Horta et al., 2020). O sucesso da utilização do CHOP foi observado na paciente do estudo devido aos seis meses de sobrevida até o momento. Portanto, o diagnóstico preciso e precoce, além da escolha do protocolo quimioterápico adequado são essenciais para um prognóstico favorável. CONSIDERAÇÕES FINAIS O linfoma é uma das neoplasias mais frequentes em felinos, com suas apresentações geralmente relacionadas à manifestações de FeLV e/ou FIV, sendo imprescindível o diagnóstico precoce e preciso para a obtenção de um prognóstico favorável. A medicina felina, como especialidade consolidada e em ascensão, tem a oncologia em destaque pela alta frequência de casos. A conduta terapêutica é fundamental e acessível, proporcionando uma qualidade de vida significativa, tanto durante o tratamento quanto no período de sobrevida. REFERÊNCIAS BATISTA, Jéssica Carolina; GRIEBELER, Neide Maria. Linfoma nasal em felino doméstico: relato de caso. Revista JRG de Estudos Acadêmicos, v. 6, n. 13, p. 820-832, 2023. Disponível em: https://revistajrg.com/index.php/jrg/article/view/626. Acesso em: 10 jul. 2024 CARVALHO, Daniela da Silva. Tumores oculares e perioculares em gatos. 2016. Disponível em: https://repositorio.utad.pt/entities/publication/0a9a0507-dfaa-44a9-86fc-462c0147b85c. Acesso em: 09 jul. 2024 COLLETTE, Sarah. A. et al. Treatment of feline intermediate‐to high‐grade lymphoma with a modified university of Wisconsin–Madison protocol: 119 cases (2004–2012). Veterinary and comparative oncology, v. 14, p. 136-146, 2016. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/vco.12158. Acesso em: 10 jul. 2024 COUTO, C. Guillermo. What is new on feline lymphoma?. Journal of Feline Medicine and Surgery, v. 3, n. 4, p. 171-176, 2001. Disponível em: https://journals.sagepub.com/doi/full/10.1053/jfms.2001.0146. Acesso em: 09 jul. 2024 CRISTO, Thierry Grima et al. Feline lymphoma and a high correlation with feline leukaemia virus infection in Brazil. Journal of comparative pathology, v. 166, p. 20-28, 2019. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0021997518302524. Acesso em: 08 jul. 2024 HORTA, Rodrigo S. et al. LOPH: a novel chemotherapeutic protocol for feline high-grade multicentric or mediastinal lymphoma, developed in an area endemic for feline leukemia virus. Journal of feline medicine and surgery, v. 23, n. 2, p. 86-97, 2021. Disponível em: https://journals.sagepub.com/doi/full/10.1177/1098612X20926893. Acesso em: 10 jul. 2024 MILLER, Paul E.; DUBIELZIG, Richard R. Ocular tumors. Withrow and MacEwen's small animal clinical oncology, p. 597-607, 2013. Disponível em: Acesso em: 01 jul. 2024 VERSTEEGH, Hannah et al. Feline Lymphoma: Patient Characteristics and Response Outcome of the COP-Protocol in Cats with Malignant Lymphoma in The Netherlands. Animals, v. 13, n. 16, p. 2667, 2023. Disponível em: Acesso em: 08 jul. 2024