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Maria da Graça Costa Val Redação e Textualidade 3º Edição Ano 2006

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TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM
W30Vn0Nll 3 01X31 W39VnONH 3 01X31 W30VD0NI1 3 01X31 W30Vn0N!l 3 01X31 W39VnONIl 3 01X31
TEXTO E LINGUAGEM
C oleção d irig ida por Maquira O sakabe, 
Maria Laura M ayrink-Sabinson c 
Raquel Salck Fiad
A coleção destina-se 
principalmente a professores 
do ensino médio, na área de 
língua e literatura. As obras 
pretendem contribuir para a 
atuação na sala de aula, trazendo 
resultados de pesquisas e 
propondo métodos muitas vezes 
inovadores, sempre com sólido
embasamento teórico.
CAPA
Projeto gráfico Alexondre Martins Fontes 
Ilustração Rex Design
REDAÇÃO E TEXTUALIDADE
REDAÇÃO E TEXTUALIDADE*
Maria da Graça Costa Vai
martins
Martins Fontes
SUMÁRIO
A p re se n ta ç ã o ................................................................ VII
PRIM EIRA PARTE 
PRESSUPOSTOS
CAPITULO J
Texto e tex tualidade ................................................ 3
CAPITULO 2
Como ava lia r a tex tualidade? .............................. 17
SEGUNDA PARTE 
RELATO DE UMA ANÁLISE
CAPITULO 3
As condições de produção ..................................... 43
CAPITULO 4
A coerência, a coesão e a informatividade:
breve es tudo quantita tivo ................................ 53
CAPITULO 5
A coerência, a coesão e a informatividade:
análise qualitativa ................................................ 59
CAPITULO 6
Uma visão global do c o r p u s .................................. 111
Conclusão ..................................................................... 121
Noias .............................................................................. 129
B ib lio g ra fia ................................................................... 131
*
Copyright O 1991. I jvm n a M anm \ Fkmtt% FAttofa lida .. 
Sâo M/wfe /* i/n /j presente edição.
1T ed ição / v y /
3 ! edição 2006 
2! tiragem 2009
iV rpan^ã*) do original
Múuricto Buhhítzar Leal 
Revi w s gráficas 
Edunnio Angelo Batista 
Mau r im t tUilthnzar Leal 
P rodução gráfica 
GrrnIJo Abes
l>ados Internacionais ck ( aUfci&v*’ na Pubbcaçáo (C IP» 
iC áfm ra Brasüdna do 1 j \ ru . SP. Braâl)
Comi Vai. Mana da Gi as,a
Kedaçãn e textualiiladc / M ana da (Jraça C m ta Vai. - 3* ed SAn 
Paulo M anias Fontes. 2006. - (Tcxio c linguagem»
ISBN 85-336-2*40-2
I Português - Redação 2. K edaçjo flaleratunO 1 Titulo. II Sér»e
06 8407 __________________________________________ CDI>-X0 H
índices p u ra catalogo sistem ático:
I RedaçAo Liicratura S0 K 
2 . Texto : ProduçJko : R ctom a 808
Todos os direitos desta edição para a lingua iwrtuguesa re senados à 
IJvraria Martins Fontes Editora lida.
Rua Ctmxelheiro Ramalho. 330 01325 OPO Sá o Paulo SP Rrasil 
Tel <li) 3241.3677 Fax {11) 3105.6993 
C-rnail: infot&maninsforucseditora.tom.hr hnp:/M*ww.murimsfonteseditora.< om.br
APRESENTAÇÃO
A lingüística textual, desenvolvida sob re tudo 
na E u ro p a a p a r t i r do final da década de 60, tem 
se ded icado a e s tu d a r a n a tu re z a do texto e os fa­
to res envolvidos em sua p ro d u ção e recepção. Es­
sa teoria, na m edida em q u e b u sc a esc la recer o 
q u e é e co m o se produz u m texto, m erece se r co­
nhecida e con s id e rad a p o r quem se in teressa pe­
lo t rab a lh o com a exp ressão e sc r i ta na escola.
Este livro p rocura condensar algumas das no­
ções mais relevantes da teoria e relacioná-las com 
os resu ltados de um a análise de cem redações ela­
b o ra d a s po r cand ida tos ao cu rso de Letras da 
UFMG no ves t ibu la r de 1983, na tentativa de e s ­
tabe lecer um diagnóstico e lev an ta r a lgum as s u ­
gestões p a r a o ensino esco la r de red ação 1.
PRIMEIRA PARTE
PRESSUPOSTOS
CA PITULO I
T E X T O E T E X T U A L ID A D E
1. O q u e é t e x t o
Para se com preender melhor o fenômeno da 
produção de textos escritos, im porta entender 
previamente o que caracteriza o texto, escrito ou 
oral, unidade lingüística comunicativa básica, já 
que o que as pessoas têm para dizer umas às 
o u tras não são palavras nem frases isoladas, são 
textos.
Pode-se definir texto ou discurso como ocor­
rência lingüística falada ou escrita, de qualquer 
extensão, do tada de unidade sociocomunicativa, 
sem ântica e formal.
Antes de mais nada, um texto c uma uni­
dade de linguagem em uso2, cum prindo uma 
função identificável num dado jogo de a tuação
3
a) o pragmático, que tem a ver com seu f un­
cionamento enquanto atuação informacio- 
nal e comunicativa;
b)o semãntico-conceitual, de que depende 
sua coerência;
c) o lormal, que diz respeito à sua coesão.
2. O que é textualidade
Chama-se textualidade ao conjunto de carac­
terísticas que fazem com que um texto seja um 
texto, e não apenas uma seqüência de frases. 
Beaugrande e Dressler (1983) apontam sete fato­
res responsáveis pela textualidade de urn discur­
so qualquer: a coerência e a coesão, que se rela­
cionam com o material conceituai e lingüístico 
do texto, e a intencionalidade, a aceitabilidade, 
a situacionalida.de, a informatividade e a intertex- 
malidade, que têm a ver com os fatores pragmá­
ticos envolvidos no processo sociocomunicativo.
2.1. Coerência e coesão
A coerência resulta da configuração que as­
sumem os conceitos e relações subjacentes à su­
perfície textual. É considerada o fator fundamen­
tal da textualidade, porque c responsável pelo 
sentido do texto. Envolve não so aspectos lógicos 
e semânticos, mas também cognitivos, na medi­
da em que depende do partilhar de conhecimen­
tos entre os interlocutores.
Um discursoé aceito como coerente quando
5
apresen ta um a configuração conceituai com pa­
tível com o conhecim ento dc m undo do reccbe- 
dor. Essa questão é fundamental. 0 texto não sig­
nifica exclusivam ente por si mesmo. Seu senti­
do é cons tru ído não só pelo p ro d u to r com o tam ­
bém pelo reccbedor, que precisa de te r os conhe­
cimentos necessários à sua in terpretação . O pro­
d u to r do d iscurso não ignora essa par t ic ipação 
do in te r locu to r e con ta com ela. É fácil verificar 
que grande parte dos conhecimentos necessários 
à com preensão dos textos Aão vem explícita, mas 
fica dependente da capacidade de pressuposição 
e inferência do recebedor.
Assim, a coerência do texto deriva de sua ló­
gica in terna , resu ltan te dos significados que sua 
rede de conceitos e relações põe em jogo, mas 
tam bém da com patib ilidade en tre essa rede con­
ceituai — o m undo textual — e o conhecim ento 
de m undo dc quem processa o discurso.
A coesão é a m anifestação lingüística da coe­
rência; advém da m aneira como os conceitos e re­
lações sub jacen tes são expressos na superfície 
textual. Responsável pela unidade formal do tex­
to, constrói-se a través de m ecanism os g ram a t i ­
cais c lexicais.
E n tre os prim eiros estão os p ronom es ana- 
fóricos, os artigos, a elipse, a concordância, a cor­
relação en tre os tem pos verbais, as conjunções, 
por exemplo. Todos esses recursos expressam re­
lações não só en tre os elem entos no in te r io r de 
um a frase, mas também entre frases e seqüências 
dc frases den tro de um texto.
Já a coesão lexical se faz pela re iteração, pe­
la substitu ição e pela associação. A re ite ração se
6
dá pela simples repetição de um item léxico e tam ­
bém por processos como a nominalização (ex.: a re­
tomada, a través de u m substan tivo cognato, da 
idéia expressa por um verbo, como em adiar/adia­
mento ou promover/promoção). A substitu ição in­
clui a sinonímia, a antonímia, a hiponímia (quando 
o term o substi tu ído rep resen ta u m a parte ou umelem ento e o su b s t i tu id o r rep resen ta o todo ou a 
classe — ex.: carroça/veículo), e a h iperoním ia 
(quando o te rm o substi tu ído represen ta o todo ou 
a classe e o substitu idor um a parte ou um elemen­
to — ex.: objeto/caneta). Finalmente, a associação 
é o processo que perm ite relacionar itens do voca­
bulário pertinentes a um mesmo esquema cogniti­
vo (por exemplo, se falam os aniversário, podemos 
em seguida m enc ionar bolo, velinha, presentes, e 
esses termos serão interpretados como alusivos ao 
m esmo evento).
A coerência e a coesão têm cm com um a ca­
racterís tica de p rom over a inter-relação sem ân­
tica en tre os e lem entos do discurso, responden­
do pelo que se pode ch am ar de conectividade 
tex tua l8. A coerência diz respeito ao nexo en tre 
os conceitos c a coesão, à expressão desse nexo 
no plano lingüístico. È im portan te reg is tra r que 
o nexo é indispensável para que u m a seqüência 
de frases possa ser reconhecida como texto. En­
tretanto , esse nexo nem sem pre precisa e s ta r ex­
plícito na superfíc ie do texto por um m ecanismo 
de coesão gram atica l. Vejamos um exemplo:
(1 )0 Pedro vai buscar as bebidas. A Sandra tem 
que ficar com os meninos. A Tereza a r ru m a 
a casa. Hoje eu vou p rec isar da a juda de to­
do mundo.
7
Unia íala como (1) é perfe itamente aceitável, 
tem coerência, Iaz sentido. E n tre tan to não ap re ­
senta m arcadores sintáticos específicos que de­
notem sua coesão. 0 nexo entre as frases se cons­
trói não no nível gramatical, mas no nível semán- 
tico-cognitivo.
Por ou tro lado, um a seqücncia de frases in­
terligadas por marcadores lingüísticos de coesão 
que não correspondessem a relações efetivas es­
tabe lec idas na e s t ru tu r a lógico-semântico- 
cognitiva subjacente não seria um texto. É pos­
sível forjar artificialmente' um exemplo para ilus­
t ra r (normalmente, a com petência textual intui­
tiva impede que as pessoas produzam seqüências 
desse tipo):
(2) No rádio toca um rock. O rock é um rit­
mo moderno. O coração também tem rit­
mo. Ele é um músculo oco composto de 
duas aurículas e dois ventrículos.
Em (2), a presença dc recursos coesivos in- 
terfrasais (a recorrência de item lexical assi­
nalada por artigo definido, o ar t icu lador tam ­
bém e o pronom e anafórico ele) não é suficien­
te para garan ti r textualidade à seqüência, já que 
ela não funciona como um todo significativo coe­
rente.
Entre tanto , é inegável a utilidade dos meca­
nismos dc coesão como fatores da eficiência do 
discurso. Alem de to r n a r a superfície textual es­
tável e econômica, na medida em que fornecem 
possibilidades variadas de se promover a conti­
nuidade e a progressão do texto, também perm i­
8
tem a explicitação de relações que, implícitas, po­
deriam ser de difícil interpretação, sobretudo na 
escrita.
Nas seqüências (3) e (4) abaixo, por exemplo, 
o nexo é facilmente recobrável pelo leitor, embora 
não manifesto na superfície:
(3) A máquina parou. Está faltando energia 
elétrica.
(4)Choveu. O chão está molhado.
O mesmo não acontece, porem, com as frases 
de (5a) a (51). Nesses casos, se a relação pretendi­
da não vier expressa, o recebedor poderá a tribuir 
ao enunciado sentido diferente do que o autor que­
ria, sobretudo se, não se tratando de produção 
oral, não for possível depreender as intenções do 
produtor através da entonação. Veja-se:
(5a) Paulo saiu. João chegou.
(5b) Paulo saiu assim que João chegou.
(5c) Paulo saiu, mas João chegou.
(5d) Paulo saiu, porque João chegou.
(5e) Paulo saiu, apesar de João ter chegado.
(5f )Sc Paulo saiu, João deve ter chegado.
Casos similares a (3) e (4) foram estudados 
por Isenberg (1968), que os interpretou como pos­
sibilidades de "textualização" entre frases assin- 
délicas. O prim eiro exemplifica a textualização 
por "conexão causai" (a máquina parou porque 
está faltando energia clétrica) e o segundo, por 
"interpretação diagnostica" (pode-se verificar que 
choveu pelo fato de o chão e s ta r molhado).
9
Ao contrário , os exemplos (5b-f), inspirados 
em Garcia (1977: 18-20, 262-264), não podem dis­
pensar a conjunção, porque o nexo conceituai e n ­
tre as informações é, digamos, mais frouxo e, por­
tanto, de processamento não imediato. Há diferen­
tes possibilidades de articulação e, por isso, a o p ­
ção por um a delas precisa ser explícita.
Além disso, os recursos coesivos, quando pre­
sentes, devem obedecer a padrões prévios, caso 
contrário seu em prego será percebido como " in ­
fração textual”9, tornando “ irregular" a seqüên­
cia em que ocorrem . Alguns dos princípios que 
orientam o em prego desses recursos serão lem­
brados mais adiante.
Resumindo o que foi dito, o fundamental para 
a textualidade é a relação coerente entre as idéias. 
A explicitação dessa relação através de recursos 
coesivos é útil, m as nem sem pre obrigatória . E n ­
tretanto, uma vez presentes, esses recursos devem 
ser usados de acordo com regras específicas, sob 
pena de reduzir a aceitabilidade do texto.
2.2. Os fatores p ragm áticos da textualidade
Entre os cinco fatores pragmáticos estudados 
por Beaugrande e Dressler (1983), os dois p r im ei­
ros se referem aos protagonistas do ato de c o m u ­
nicação: a intencional idade e a aceitabilidade.
A intencionalidade concerne ao em penho do 
produtor em cons tru ir um discurso coerente, coe­
so e capaz de sa tisfazer os objetivos que tem em 
mente num a determ inada situação comunicativa. 
A meta pode ser inform ar, ou impressionar, ou
10
ala rm ar , ou convencer, ou pedir, ou ofender, ctc., 
e é ela que vai o r ien tar a confecção do texto.
Em ou tras palavras, a intcncionalidade diz 
respeito ao valor ilocutório do discurso, elemen­
to da m aior importância no jogo de atuação co­
municativa.
O outro lado da moeda c a aceitabilidade, que 
concerne à expectativa do recebedor dc que o con­
junto de ocorrências com que se defronta seja um 
texto coerente, coeso, útil c relevante, capaz de 
levá-lo a ad qu ir ir conhecim entos ou a cooperar 
com o.s objetivos do produtor.
Grice (1975, 1978)10 estabelece máximas con- 
versacionais, que seriam es tra tég ias norm alm en­
te adotadas pelos produtores para alcançar a acei­
tabilidade do recebedor. Tais es tra tég ias se refe­
rem à necessidade de cooperação (no sentido de 
o p ro d u to r responder aos in teresses dc seu inter­
locutor) c à qualidade (autenticidade), quan tida­
de (informatividade), pertinência e relevância das 
informações, bem como à m ane ira como essas in­
formações são apresentadas (precisão, clareza, o r­
denação, concisão, ctc).
Mas é possível que, deliberadam ente , o pro­
d u to r queira ap resen ta r um texto que desrespei­
te alguma(s) dessas máximas. Tal intenção, reco­
nhecida pelo recebedor, ganhará função significa­
tiva c resu ltará em efeito de sentido im portante 
no jogo interativo. É o que-Grice cham a de “ im- 
plicatura conversacional”: o recebedor prefere su­
por que a infração aos princípios conversacionais 
seja intencional e tenha alguma significação do que 
sim plesm ente aceitar que seu in terlocu tor possa 
produzir um discurso impertinente e sem sentido.
11
Charollcs (1978:38) afirma que, em geral, o rc- 
ccbedor dá um "crédito de coercncia" ao produ­
tor: supõe que seu discurso seja coerente e se em­
penha em captar essa coerência, recobrindo lacu­
nas. fazendo deduções, enfim, colocando a servi­
ço da compreensão do texto todo conhecimento 
de que dispõe.
Assim, a comunicação se efetiva quando se es­
tabelece um contrato de cooperação entre os in­
terlocutores, de tal modo que as eventuais falhas 
do produtor são percebidas como significativas (as 
vezes, o sentido do texto çstá na suaaparente fal­
ta de sentido — cf. a piada), ou são cobertas pela 
tolerância do recebedor. A margem de tolerância 
e tanto maior quanto mais conhecido é o assunto 
e mais informal ê a situação. O produtor sabe da 
existência dessa tolerabil idade e conta com ela, 
assim como conta a capacidade de pressuposição 
e inferência do recebedor. Essa “cumplicidade" 
do recebedor para com o texto é que possibilita 
que a produção não seja tarefa excessivamente di­
fícil e tensa e, assim, viabiliza o jogo comunicativo.
O terceiro fator de textualidade, segundo 
Beaugrandc e Dresslcr (1983), é a situacionalida- 
de, que diz respeito aos elementos responsáveis 
pela pertinência e relevância do texto quanto ao 
contexto em que ocorre. E a adequação do texto 
a situação sociocomunicativa.
O contexto pode, realmente, del in ir o senti­
do do discurso e, normalmente, orienta tanto a 
produção quanto a recepção. Em determinadas 
circunstâncias, um texto menos coeso e aparen­
temente menos claro pode funcionar melhor, ser 
mais adequado do que outro de configuração mais 
completa. Se n e m de exemplo as inscrições lacó-
12
nicas das p lacas de trânsito, m a is ap ro p r iad as à 
s i tuação específ ica cm que são u sadas do que um 
longo texto explicativo ou persuas ivo que os mo­
to r is ta s seq u e r tivessem tem po de ler.
A con junção dos três fa to res já mencionados 
resu l ta n u m a série de conseqüências p a ra a prá­
tica com unicativa.
Em p r im e iro lugar, é im p o r tan te p a ra o pro­
d u to r saber com que conhecimentos do recebedor 
clc pode co n ta r c que, portan to , não p rec isa ex­
p lic ita r no seu discurso. Esses conhecim entos po­
dem adv ir do contexto imediato ou podem pree- 
x is t ir ao a to comunicativo. Assim, um a inform a­
ção apa ren tem en te absu rda com o o exemplo a se­
guir, ex tra ído de Elias (1981: 45), fa rá sentido pa­
ra quem souber que Maria sofre de problemas gás­
tr icos de fundo nervoso e que passa mal sem pre 
que come tensa, p reocupada com o horário:
(6) M aria teve um a ind iges tão em b o ra o re­
lógio es tivesse es trag ad o .
Daí vem a noção de coerência pragmática, ou 
seja, a necessidade de o texto se r reconhecido pe­
lo recebedoi com o um em prego norm al da lingua­
gem num d e te rm in ad o contexto .
O u tra conseqüênc ia da con jugação desses 
três fa to res de tex tualidade é a existência dos di­
versos tipos de d iscurso . A p rax e acab a p o r e s ta ­
belecer que, n u m a dada c i rcu n s tân c ia , tendo-sc 
em m en te d e te rm in a d a in ten ção ilocucional, 
deve-se c o m p o r o texto dessa ou daque la m ane i­
ra. Assim, há convenções que regem o func iona­
m en to da linguagem na in te ração social e que de­
te rm inam , especif icam ente , qual o tipo p a r t ic u ­
13
la r de d isc u rso ad eq u ad o a cada ato co m u n ica t i­
vo. Essa ques tão é da m aio r im portânc ia para 
quem traba lha com o ensino de redação, pois vem 
dai o la to de que a tex tualidade de cada tipo de 
d iscu rso envolve e lem entos diferentes. O que c 
qua lidade num texto a rgum en ta iivo form al po­
derá se r defeito num poema, ou n um a es tó r ia de 
suspense, ou n u m a conversa de botequim , por 
exemplo.
O in te resse do recebedor pelo texto vai de­
pender do grau de in form aliv idade de que o u lt i­
mo é po r tador . Esse é mais um fa to r de tex tua li­
dade apon tado por B eaugrande e D ress lc r (1983) 
e diz respeito á m edida na qual as oco rrênc ias de 
um texto são e sp e ra d a s ou não, conhecidas ou 
não, no plano conceituai e no formal. O corre que 
um d iscu rso menos previsível é m ais in fo rm ati­
vo, porque a sua recepção, e m b o ra m ais t rab a ­
lhosa, resu lta m ais in teressan te , m ais envolven­
te. E n tre tan to , se o texto sc m o s t ra r in te iram e n ­
te inusitado, te n d e rá a ser re je i tado pelo recebe­
dor, que não consegu irá processá-lo. Assim, o 
ideal é o texto se m a n te r num nível m ediano de 
informatividade, no qual se a l te rnam ocorrências 
de p rocessam ento imediato, que falam do conhe­
cido, com ocorrências de processam ento mais t ra ­
balhoso, que trazem a novidade.
P ara mim, o texto com bom índice de infor- 
matividade p rec isa a inda a te n d e r a o u t ro req u i­
sito: a suficiência de dados. Isso significa que o 
texto tem que a p re s e n ta r todas as inform ações 
necessárias para que seja co m p reen d id o com o 
sentido que o p ro d u to r p re tende . Não é possível 
nem desejável que o d iscu rso explicite todas as
14
informações necessárias ao seu processamento, 
mas c preciso que ele deixe inequívocos todos os 
dados necessários à sua compreensão aos quais 
o recebedor não conseguirá chegar sozinho.
Bcaugrande e Drcssler (1983) lalam ainda de 
um outro componente de textualidade: a intertcx- 
tua!idade, que concerne aos fatores que fazem a 
utilização dc um texto dependente do conhecimen­
to de outro(s) texto(s). De fato, "um discurso não 
vem ao mundo numa inocente solitude, mas 
contrói-se através de um já-dito em relação ao qual 
ele toma posição”11. Inúmeros textos só fazem 
sentido quando entendidos em relação a outros 
textos, que funcionam como seu contexto. Isso é 
verdade tanto para a fala coloquial, em que se re­
tomam conversas anteriores, quanto para os pro­
nunciamentos políticos ou o noticiário dos jornais, 
que requerem o conhecimento de discursos e no­
tícias já divulgadas, que são tomados como pon­
to de partida ou são respondidos.
Há aqui uma questão interessante que não é 
mencionada pelos autores. É que o mais freqüen­
te interlocutor de todos os textos, invocado e res­
pondido consciente ou inconscientemente, é o dis­
curso anônimo do senso comum, da voz geral cor­
rente. Assim, avaliar a intertextualidade, em sen- 
tido lato, pode significar analisar a presença des­
sa fala subliminar, de todos e de ninguém, nos tex­
tos estudados12. Por ou tro lado, como esse dis­
curso é de conhecimento geral, pode-se também 
considerá-lo como informação previsível e avaliar 
sua presença como elemento que faz baixar o grau 
de informatividade. Foi essa a minha opção na 
análise de redações que apresento adiante.
15
Relacionando os conceitos dc texto e textua­
lidade, poder-se-ia dizer, cm princípio, que a uni­
dade textual se constrói, no aspecto sociocomu- 
nicativo, através dos fatores pragmáticos (inten- 
cionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, in­
formatividade e intertextualidade); no aspecto se­
mântico, através da coerência; e, no aspecto for­
mal, através da coesão.
É possível, no entanto, repensar esse a rran ­
jo, se se considerar que a informatividade e a in- 
tertextualidade dizem respeito, também, à maté­
ria conceituai do discursô, na medida em que li­
dam com conhecimentos partilhados pelos inter­
locutores. Ao mesmo tempo que contribuem pa­
ra a eficiência pragmática do texto, conferindo- 
lhe interesse e relevância, esses dois fatores tam­
bém se colocam como constitutivos da unidade 
lógico-semântico-cognitiva do discurso, ao lado 
da coerência. Assim, poder-se-ia situá-los a cava­
leiro, parte no plano sociocomunicativo, parte no 
plano semântico-conceitual. Foi dessa maneira 
que os considerei neste trabalho.
16
CAPÍTULO 2
COMO AVALIAR A TEXTUALIDADE?
1. Questões preliminares
Um dos pontos-chave da lingüística textual 
é a discussão sobre o que faz de um texto um tex­
to, isto é, em que consiste a essência de um tex­
to, que propriedade distingue textos de não- 
textos. A essa discussão grande número de estu­
dos recentes responde apontando a coerência co­
mo fator fundamental da textualidade e, em fun­
ção dessa resposta, tenta esclarecer o que ée de 
que é feita a coerência de um texto. A conceitua- 
ção teórica, que busca estabelecer em que nível 
se situa e com que elementos lida a coerência, se 
mostra, muitas vezes, fruto da análise empírica, 
empenhada em descobrir que características 
usualmente apresentam os textos coerentes. Es­
17
sas características são chamadas por alguns dc 
condições ou requisitos de coerência, porque, se 
um texto coerente tem qualidades específicas que 
o distinguem dos incoerentes, pode-se afirmar 
que, para ser coerente, um texto precisa apresen­
tar tais qualidades. Assim, a observação empíri­
ca possibilita a descrição, que, por sua vez, per­
mite a formulação de critérios para a análise 
textual.
Neste trabalho, tomo como ponto de parti­
da a descrição fornecida por estudiosos da ques­
tão e utilizo como instriimcnto critérios de ava­
liação que considerei adequados ao modelo teó­
rico adotado. Para avaliar a coerência e a coesão 
das redações do corpus, tomei como base as cha­
madas "meta-regras” formuladas por Charollcs 
(1978) e, para os demais fatores de textualidade, 
orientei-me pelo que propõem Beaugrandc e 
Dressler (1983).
Antes de apresentar e discutir os critérios de 
avaliação adotados, é preciso deixar claros alguns 
pontos.
Primeiro quero registrar que a intenção aqui 
não é, de maneira alguma, prescritiva. Não se está 
aqui fornecendo mais uma receita, ou uma nova 
lista de macetes, à qual as redações escolares de­
vam se conformar para obter boas notas e se apro­
ximar do modelo que garante aprovação no vesti­
bular. 0 que se pretende é, a partir de um quadro 
de características identificadas em textos que "fun­
cionam’', construir um quadro adequado para bali­
zar a avaliação do funcionamento de outros textos.
Em segundo lugar, quero delimitar a aplica­
bilidade dos critérios a serem adotados. Confor-
18 %
me acertadamente observa Widdowson (1981: 56), 
a aceitabilidade de um texto se prende à sua iden­
tificação como “um emprego normal da língua". 
Ora, em situações diferentes, são diferentes as ex­
pectativas quanto ao que seja “normal" e aceitá­
vel. Assim, os critérios aplicáveis ao corpus des­
ta pesquisa podem não ser adequados para o ju l­
gamento da textualidade de discursos de outro 
tipo c construídos com outros objetivos. 0$ tex­
tos por mim analisados, por exigência da natu­
reza e do programa do concurso vestibular, se re­
vestem de peculiaridades que não sc podem dei­
xar de levar cm conta: são textos escritos, for­
mais, de função referencial dominante, compos­
tos de introdução, desenvolvimento e conclusão, 
através dos quais os candidatos buscam demons­
tra r sua habilidade de expor idéias c argumen­
tar em torno de determinado problema. Os requi­
sitos a que esse tipo específico de texto deve res­
ponder para angariar aceitabilidade são ce rta ­
mente impraticáveis para uma conversa descon­
traída. um poema ou um romance, por exemplo.
Resta ainda uma observação a fazer, quanto 
á organização dada ao grupo de fatores levados 
em conta no julgamento das redações. Como to­
das elas loram produzidas sob as mesmas condi­
ções (o vestibular) e não me era possível ter acesso 
a cada produtor individualmente, examinei em 
bloco a interferência dos fatores pragmáticos em 
sua textualidade. Quero dizer: a intencional ida- 
de, a aceitabilidade e a situacionalidade não fo­
ram analisadas cm cada redação particular; foi 
feita uma análise desses três fatores para o con­
junto das redações. Por outro lado, ampliei o con-
19
ccito de informatividade, dc modo a incluir nele 
a suficiência de dados c a intertextualidade (já que 
os textos requeridos para a interpretação do texto 
“X" constituem informações prévias necessárias 
ao texto "X"). Assim, entendendo a informativi­
dade, bem como a coerência e a coesão como fa­
tores centrados no texto, concernentes a elemen­
tos constitu tivos do texto, avaliei a presença e o 
funcionamento desses três com ponentes da tex­
tualidade em cada redação do corpus.
f
2. Critérios p a ra a análise da coerência 
e da coesão
Entendida a coerência como a configuração 
conceituai subjacente e responsável pelo sentido 
do texto, e a coesão como sua expressão no pla­
no lingüístico, é preciso esm iuçar essas noções, 
para perceber de que são feitos esses fatores e 
como se apresen tam ou deixam de se ap resen tar 
em produções lingüísticas reais tais como as re­
dações dos alunos na escola.
É in teressante a proposta do lingüista fran­
cês Charolles (1978), porque parte exatamente da 
análise de redações de es tudan tes da escola ele­
m entar e do ensino médio. Nessa tentativa de ex­
plicitar o s is tem a implícito de regras referentes 
à composição e à in te rp re tação de textos, que 
constitui a com petência textual presente em to­
do falante, o a u to r se vale também das interven­
ções feitas pelos professores, de modo a perce­
ber o fenômeno em seus dois m om entos funda­
mentais — a p rodução e a recepção.
20
Para Charolles (1978), um texto coerente e 
coeso satisfaz a qua tro requisitos: a repetição, a 
progressão, a não-contradição e a relação. Vou 
chamá-los, aqui, dc continuidade, progressão, não- 
con tradição e articulação.
2.1. A continuidade
A continuidade diz respeito à necessária re­
tomada de elementos no decorrer do discurso. 
Tem a ver com sua unidade, pois um dos fatores 
que fazem com que se perceba um texto como um 
todo único c a permanência, em seu desenvolvi­
mento, dc elementos constantes. Uma seqüência 
que trate a cada passo de um assunto diferente 
certam ente não será aceita como texto.
Quanto à coerência, esse requisito se mani­
festa pela retomada de conceitos, de idéias. Quan­
to à coesão, pelo em prego de recursos lingüísti­
cos específicos, tais como a repetição de palavras, 
o uso de artigos definidos ou pronomes dem ons­
trativos para determ inar entidades já menciona­
das, o uso de pronomes anafóricos e de outros ter­
mos vicários (como os pró-verbos s e r e fazer e os 
pró-advérbios lá, ali, então, etc.), a elipse de te r­
mos facilmente recobráveis, en tre outros me­
canismos.
O emprego desses m ecanism os de coesão 
obedece a regras específicas, como já disse. Por 
exemplo, os pronomes anafóricos devem concor­
da r em gênero e núm ero com o term o que subs­
tituem. Assim, uma seqüência como a que se se­
gue conterá um a infração textual, se ocorrer em
21
d isc u rso e sc r i to formal, cm cu ja recepção a ex­
pecta tiva é de respeito ao d ia le to pad rão :
(7) O m en o r abandonado p re o cu p a a popula­
ção das g ran d es c idades p o rq u e a m arg i­
na l idade ac ab a os levando ao crime.
O u tra exigência cabível q u an to a esse tipo de 
d iscu rso é que só podem r e c o b ra r p o r pronom e 
elem entos exp ressos na superfíc ie textual. 0 a lu ­
no a u to r da f rase abaixo infringiu essa exigência 
ao p re fe r i r a ex p ressão Areação h u m a n a ” a “rea­
ção do h o m e m ” , porque sua opção acabou dei­
xando sem an teced en te exp resso o p ro n o m e que 
vem em seguida:
(8) Pode-se def in ir conhecim ento com o a rea­
ção h u m a n a ao meio que o ce rca .
Um caso m u ito freqüen te de “desvio de coe­
são", no d izer de El ias (1981: 59-60), é aquele em 
que o em prego do p ronom e an a fó r ico c r ia a m b i­
güidade, p o rq u e h á mais de u m te rm o que pode 
lhe se rv ir de an teceden te . A seqüênc ia abaixo 
exemplifica o problem a:
(9) Ana es tava conversando com Teresa e Ro­
sa chegou. Aí ela con tou que e s tá nam o­
rando João.
Assim, a v a l ia r a co n t inu idade de um texto c 
verificar, no p la n o conceituai, se há elem entos 
que p e rc o r re m todo o seu desenvolvimento, 
confcrindo-lhe unidade; e, no plano lingüístico,I
22
se esses elementos são retomados conveniente­
mente pelos recursos adequados. Não cabe aqui 
lazer o levantamento e a descrição de todas as 
regras que governam o emprego desses recursos, 
mas posso afirm ar que elas fazem parte da gra­
mática intuitiva de todo falante, que é capaz não 
so de empregá-los naturalmente como de reconhe­
cer as eventuais falhas no seu uso (tendo em vis­
ta, é claro, as contingências pragmáticas da atua­
ção comunicativa).
Na análise das redações do corpus, conside­
rei a continuidade requisito da coerência e obser­
vei se os recursos lingüísticos que servem à ex­
pressão desse requisito foram empregados de mo­
do a favorecer a coesão textual.
2.2. A progressão
Para Charolles (1978), a progressão, contra­
partida da repetição ou continuidade, é a segun­
da condição de coerência e coesão. O texto deve 
retom ar seus elementos conceituais e formais, 
mas não pode se limitar a essa repetição. É pre­
ciso que apresente novas informações a propósi­
to dos elementos retomados. São esses acrésci­
mos semânticos que fazem o sentido do texto pro­
gredir e que, afinal, o justificam.
No plano da coerência, pcrcebe-se a progres­
são pela soma de idéias novas às que já vinham 
sendo tratadas» No plano da coesão, a língua dis­
põe de mecanismos especiais para manifestar as 
relações entre o dado e o novo13. Por exemplo, o 
dado, que costuma coincidir com o tópico, em
23
geral c retomado anaforicamente e aparece no ini­
cio de frases ou mesmo parágrafos ou seqüências 
de frases. Já a informação nova com freqüência 
se expressa pelo comentário e figura no final das 
frases. A progressão pode se fazer pelo acrésci­
mo de novos comentários a um mesmo tópico, ou 
pela transformação dos comentários em novos tó­
picos. A mudança dc tópico deve se apresentar 
inequívoca para o recebedor, sob pena de causar 
dificuldades de compreensão, visto que a tendên­
cia mais comum é interpretar as anáforas de uma 
passagem como referentes ao tópico dessa pas­
sagem. O texto que não deixa claro, a cada pas­
so, de que está tratando pode levar o recebedor 
a um processamento indevido que, na melhor das 
hipóteses, precisará ser refeito. Há. no português, 
construções, palavras e locuções que servem pa­
ra destacar de maneira especial o tópico de uma 
passagem, colocando-o em posição de foco: quan­
to a, a respeito de, no que se refere a; ser Sn que 
X, é que, até, mesmo, o próprio, etc.
A progressão foi considerada como condi­
ção de coerência na análise das redações. Para­
lelamente, foi observado se essa condição foi 
bem expressa, através dos recursos disponíveis 
no português, de maneira a dar ao texto mais 
coesão.
2.3. A não-contradição
O terceiro requisito proposto por Charollcs 
(1978) é o da não-contradição, que deve ser 
observado tanto no âmbito interno quanto no
24
âm bito das relações do texto com o mundo a que 
se refere.
Para se r in ternam ente coerente, o texto p re ­
cisa, cm p r im eiro lugar, respeitar princípios ló­
gicos elem entares. Não pode, por exemplo, afir­
m ar A e o con trá r io dc A. Suas ocorrências não 
podem se contradizer, têm que se r compatíveis 
entre si, não só no que trazem explícito como tam­
bém no que delas se pode concluir por pressupo­
sição ou inferência.
Por ou tro lado, para ser coerente, o texto não 
pode contradizer o mundo a que se refere. O m un­
do textual tem que scr compatível com o mundo 
que o texto representa. Assim, um discurso refe­
rente ao m undo real não pode deixar de conside­
ra r algumas pressuposições básicas que integram 
a m an e ira com um de pensar esse mundo c que 
subjazem à com unicação textual: as causas têm 
efeitos; os objetos têm identidade, peso e massa; 
dois corpos não podem ocupar, ao mesmo tem­
po, o m esm o lugar no espaço, etc.
A exigência de não-contradição se aplica não 
só ao plano conceituai (da coerência), mas tam ­
bém ao plano da expressão (da coesão). Por exem­
plo, a través do em prego dos tempos e aspectos 
verbais, o texto ins taura um sis tem a próprio de 
situação dos fatos a que alude, tomando por re­
ferência o mom ento da com unicação ou um mo­
m ento de term inado pelo texto mesmo. A moda­
lidade é o u tro elemento do s is tem a de funciona­
m ento discursivo. Trata-se da a t i tude do p rodu­
to r tanto em relação ao conteúdo proposicional 
c ao valor de verdade dc seu enunciado quanto 
em relação ao próprio recebedor. Essa atitude se
25
manifesta lingüisticamcnte pelo emprego dos mo­
dos verbais e de itens específicos, com o os ver­
bos modais, alguns advérb ios (talvez, certam en­
te) c os cham ados verbos ilocutórios (achar, acei­
tar, considerar, admitir, exigir, deplorar, declarar, 
negar, etc.). As contradições relativas a esses dois 
elementos do que Charolles (1978: 23) chama “re­
gime enuncia tivo", a menos que intencionais e vi­
sando a efeitos estilísticos, podem causa r em ba­
raço ou es tranheza ao reccbedor.
A configuração do m undo textual pode se ex­
p ressa r lingüisticamente a través do emprego de 
verbos, expressões e construções “criadores de 
m u n d o ”, no dizer de Charolles (1978: 28): sonhar, 
imaginar, pensar, acreditar, gostar (no condicio­
nal, gostaria que\, no caso de, na lupotese de; se­
ja..., (az. de conta que, era um a vez. etc. A não ser 
que objetivando efeitos intencionais específicos,
o emprego contraditório desses recursos também 
pode aca rre ta r d is tú rb ios à in te rp re tação do dis­
curso, na m edida em que co n tra r ia as expectati­
vas do reccbedor.
Um problem a concernen te à exigência da 
não-contradição, ao qual Charolles (1978) não faz 
referência, consiste no que eu chamei de constra- 
dição Icxico-semántica. Trata-se de inadequação 
muito 1 requente nas redações escolares e que diz 
respeito ao uso do vocabulário: muitas vezes o sig- 
nificante em pregado não condiz com o significa­
do pretendido ou cabível no texto. Tal con trad i­
ção resulta do desconhecimento, por parle do 
usuário , do vocábulo a que recorreu . Um exem ­
plo elucidativo é o de um vestibulando que recla­
mava, em sua redação, contra "o desvelo das auto-
26
i idades pelo menor abandonado". Casos desse ti­
po situam-se, a meu ver, na região limítrofe cn- 
t re a coesão e a coerência, porque, embora sc ma­
nifestem no nível da expressão, concernem à vei- 
culação de conceitos e têm implicações sobre a 
e s t ru tu ra lógico-semântica do texto.
Nas redações do corpus, a não-contradição in­
terna e externa foi tomada como condição dc coe­
rência. Quanto à coesão, foi verificado se os re­
cursos lingüísticos empregados serviram ao bom 
funcionamento discursivo, tornando o todo tex­
tual livre de contradição.
2.4. A articulação
O quarto e último requisito de coerência pro­
posto por Charollcs (1978) é a relação, que eu cha­
mo aqui de articulação. O autor, considerando va­
go o te rm o relação, p ro c u ra delimitá-lo, 
rebatizando-o dc congruência e estabelecendo que 
dois latos serão congruentes quando um for uma 
causa, condição ou conseqüência pertinente do 
outro.
Neste trabalho, o termo articulação não co­
brirá apenas essas três relações. Com ele estarei 
me referindo á m aneira como os fatos e concei­
tos apresentados no texto se encadeiam, como se 
organizam, que papéis exercem uns com relação 
aos outros, que valores assum em uns em relação 
aos outros. Avaliar a articulação das idéias de um 
texto, para mim, significa verificar se elas têm 
a ver umas com as outras e que tipo específico 
de relação sc estabelece entre elas (além das rc-
27
lações de con t inu idade , p ro g ressão e não- 
con trad içâo , já cobertas pelas o u tra s condições 
de coerência). São dois aspectos a se rem verifi­
cados: a presença e a pertinência das relações en­
tre os fatose conceitos ap resen tados . O texto po­
de ap resen ta r fatos c conceitos rclacionáveis sem 
es tab e lece r ligações en tre eles, ou pode es tabe­
lecer relações não per t inen tes e n t re os fatos e 
conceitos que den o ta (porque não são rc lacioná­
veis, ou porque se re lac ionam de o u tro modo).
E ssas relações, como vimos, não precisam 
ser necessariam ente explicitadas por mecanismos 
lingüísticos formais. Podem perfe itam ente se es­
tabelecer ap en as no plano lógico-scmântico- 
conceitual (o da coerência). Entre tan to , há recur­
sos específicos para sua expressão formal, no pla­
no da coesão. E n tre eles podem-sc m en c io n a r os 
mecanismos de junção (tradicionalm ente cham a­
dos de conjunção), os articuladores lógicos do dis­
cu rso (expressões como por exem plo, dessa for­
ma, por outro lado, etc.) e os recu rsos lingüísti­
cos que perm item estabelecer relações temporais 
en tre os e lem entos do texto (a o rdem linear de 
ap resen tação desses elementos, as conjunções 
tem pora is , a lguns advérbios e expressões de va­
lor adverbial, os num era is o rd ina is e a lguns ad­
jetivos, com o anterior, posterior, subseqüente).
Na análise das redações foram avaliadas a 
presença e a pertinência da articulação como con­
dição de coerência e foi observado se, q u an d o ne­
cessários, os m ecanism os lingüísticos que expli­
c itam as relações en tre os e lem entos tex tua is cs- 
tavam presen tes e foram ad eq u ad am en te em pre­
gados, con tr ibu indo para a coesão do discurso.
28
2.5. P a ra e n c e r r a r
Aceita a proposta de Charolles (1978) — com 
a ressalva feita quanto à sua não-uni versai idade 
—, avaliar a coerência de um texto denotativo, es­
crito e formal, será verificar se, no plano 
lógico-scmântico-cognitivo, ele tem continuidade 
e progressão, não se contradiz nem contradiz o 
mundo a que se refere e apresenta os fatos e con­
ceitos a que alude relacionados de acordo com 
as relações geralmente reconhecidas entre eles 
no mundo referido no texto. Avaliar a coesão se­
rá verificar se os mecanismos lingüísticos utili­
zados no texto servem à manifestação da conti­
nuidade, da progressão, da não-contradição e da 
articulação.
Dado o grande número de marcadores lin­
güísticos de coesão e dada a tremenda complexi­
dade que envolveria a tarefa de formular restri­
ções pertinentes e exaustivas com relação ao em­
prego de cada um, meu julgamento das redações, 
sobretudo neste particular, vai se basear na in­
tuição e no bom senso. Será considerada infra­
ção textual a ocorrência que acarre ta r em bara­
ços à leitura, tendo em mente as expectativas re­
sultantes do tipo de texto analisado.
A esse propósito, é bom lembrar o papel de­
terminante dos fatores pragmáticos na comuni­
cação efetiva. 0 contexto e a imagem do interlo­
cutor podem autorizar lacunas na configuração 
textual não possíveis noutras circunstâncias. É 
relevante o fato de o produtor contar com os co­
nhecimentos prévios do recebedor e com sua ca­
pacidade de pressuposição e inferência.
29
Daí advem uma conseqüência importante pa­
ra o trabalho com redação na escola. São freqüen­
tes, por exemplo, os casos de aparente incoerên­
cia resultante da não-explicitação de fatos ou de 
relações entre fatos do mundo representado no 
texto. Se o professor consegue reconhecer esse 
mundo e refazer os cios ausentes, percebe o sen­
tido do texto e pode apontar ao aluno o problema 
e a forma de saná-lo. Esse tipo dc intervenção, de­
ve ficar claro, não obedece a imperativos cogniti­
vos, uma vez que o sentido do texto foi captado, 
mas obedece ao que Charolles (1978: 37) chama de 
" razões ílc deonlologia discursiva superior”. Em 
outras palavras, o que funcionaria na comunica­
ção real c vetado na redação escolar em virtude 
da preocupação do professor de ensinar a redigir.
Charolles (1978: 37) tem essa pr eocupação co­
mo legítima e a justifica pelo fato de o professor 
considerar que nem todo leitor será capaz de reali­
zar a mesma operação por ele efetuada para recu­
perar o sentido do texto e julgar-se, então, na obri­
gação de apontar o problema ao aluno, por enten­
der que todo discurso, se não for imediatamente 
coerente e coeso, deve, pelo menos, ter o sentido 
facilmente recobrável por qualquer recebedor. Pa­
ra mim, tal atitude será pertinente sc explicitada 
pelo professor e se levar em conta, também, o tipo 
textual e as intenções do aluno produtor do texto.
3. Critérios para a análise da informatividade
A informatividade é entendida pelos estudio­
sos como a capacidade do texto dc acrescentar ao
30
conhecimento do recebedor informações novas 
e inesperadas. Neste trabalho, esse termo c en­
tendido como a capacidade que tem um texto de 
efetivamente inform ar seu recebedor. Não c to­
mado apenas como sinônimo de originalidade, 
m as ganha o u tra acepção.
Por um lado, no que tange à necessidade de 
imprevisibilidade, o conceito foi ampliado e pas­
sou a abranger o aspecto mais geral do fator in- 
lertextualidade, na medida em que se tomou co­
mo informação conhecida e previsível a voz do 
senso comum, da ideologia dominante, presente 
nas redações estudadas. Por ou tro lado, o termo 
passou a recobrir a exigência do que se chamou 
suficiência de dados, na medida em que se consi­
derou que, para ser informativo, o texto, além de 
se m ostra r relativamente imprevisível, precisa 
apresen tar todos os elementos necessários à sua 
compreensão, explícitos ou inferíveis das infor­
mações explícitas.
Para avaliar a imprevisibilidade, Beaugran- 
de e Dressler (1978: 140-141) propõem uma esca­
la de três ordens, aplicável (e efetivamente apli­
cada) pelo falante comum. Na primeira ordem os 
autores enquadram as ocorrências de elevada 
previsibilidade e, conseqüentemente, baixa infor­
matividade, como os clichês e estereótipos, as fra­
ses feitas, as afirmações sobre o óbvio. Os textos 
que não ultrapassam esse patamar, ainda que do­
tados de coerência e coesão, resultam pragmati- 
camente ineficientes, porque desprovidos de in­
teresse. Na segunda ordem ficam as ocorrências 
em que o original c o previsível se equilibram, an­
gariando boa aceitabilidade, porquanto apresen­
31
tam novidade sem provocar es tranhe/a . São dc 
terceira ordem as ocorrências que, aparentem en­
te pelo menos, não figuram no leque de a l te rna­
tivas possíveis c que, por isso mesmo, desorien­
tam, ainda que temporariamente, o reccbedor. 
Postulam os au tores que, na comunicação efeti­
va, o processam ento dos textos se faz através do 
alçamento para a segunda ordem das ocorrências 
de baixa informatividade c do rebaixamento, tam­
bém para essa ordem mediana, daquelas que pro­
vocam estranheza, de modo a atribuir sentido tan­
to a um as quan to a outras . Assim, no todo tex­
tual, o óbvio ganhará razão de ser c o inusitado 
se explicará, passando a ter, um e outro, rendi­
mento eficaz dentro do texto. O discurso em que 
esse processamento, cm um a ou outra direção, 
não for possível, tenderá a se r rejeitado: no p r i­
meiro caso, porque sc m ostra rá pouco informa­
tivo e desinteressante; no segundo caso, porque 
se m ostra rá difícil de ser entendido, impene­
trável.
De outra parte, avaliar a suficiência dc dados 
é examinar sc o texto fornece ao reccbedor os ele­
mentos indispensáveis a um a in terpretação que 
corresponda ás intenções do produtor, sem se 
mostrar, por isso, redundante ou rebarbativo. Os 
dados cuja explicitação é necessária são aqueles 
que não podem ser tomados como dc domínio 
prévio do recebedor nem podem ser deduzidos 
a partir dos conhecimentos que o texto ativa.
Assim, avaliar a informatividade significa, 
para mim, m ed ir o sucesso do texto em levar co­
nhecimento ao recebedor, configurando-se como 
ato de comunicação efetivo. Esse sucesso depen-
32
de, em parte, da capacidade do discurso de acres­
cen ta r alguma coisa à experiência do recebedor, 
1 1 0 plano conceituai ou no plano da expressão (im- 
previsibilidade). De ou tra parte, resu lta do equi­
líbrio en tre o que o texto oferece e o que confia 
ã partic ipação de quem o in terpreta (suficiência 
de dados).
Um texto informativo pode não ser de pro­
cessam ento imediato e dem andar algum esforço 
de interpretação. Em contrapart ida , é um texto 
que se mostra apto a engajar o recebedor, a con­
qu is ta r a adesão dele, viabilizando, assim, o es­
tabelecimento dc uma relação comunicativa ver­
dadeira.
Um texto com baixo poder informativo, que 
não fornccc os elementos indispensáveis a uma 
in terpretação livre dc ambigüidades, ou que se 
limita a repetir coisas que nada somam à expe­
riência do recebedor, tem corno efeito desorientá- 
lo ou irritá-lo, ou simplesmente não a lcançar sua 
atenção. Tende a se r rejeitado. Mesmo que não 
chegue a ser tomado como não-texto, é avaliado 
como produção de má qualidade, com a qual não 
vale a pena perder tempo. Em suma, mesmo pa­
ra textos coerentes e coesos, um baixo poder in­
formativo tem como correlata uma baixa eficiên­
cia pragmática.
4. A subjetividade da avaliação
Segundo Hallidaye Hasan(1978: 25), "texture 
is really a more-or-less affair" A mim parece que 
a natureza do texto é melhor compreendida se se
33
abre mão do rigor c da exatidão tecnicista e se 
dá espaço p a ra a intuição e o bom senso.
Os c r i té r io s adotados neste trabalho p a ra o 
julgamento das redações são, inegavelmente, flui­
dos c subjetivos. Não vejo como fugir disso. A coe­
rência, a coesão e a informatividade estão em es­
treita dependência dos conhecimentos par t i lha ­
dos pelos interlocutores. O que faz sentido para 
um recebedor pode parecer absurdo para outro; 
o nexo en t re os elementos textuais pode ser fa­
cilmente percebido por um, através das relações 
lógico-semàntico-cognitivas implícitas, e pe rm a­
necer irrecobrável para outro, sc não for expresso 
lingüisticamente; o que c “ba t ido” para um po­
de ser abso lu ta novidade para outro.
Em ou tras palavras, o que estou dizendo é 
que a textualidade de uma produção lingüística 
qualquer depende, em grande parte, do recebe­
dor (seus conhecim entos prévios, sua capacida­
de dc pressuposição e inferência, sua adesão ao 
discurso) e do contexto (o que é texto num a s i tua­
ção pode não o ser em outra, e vice-versa). Como, 
então, fixar cr i té r ios rígidos e objetivos p a ra de­
m arcar os limites da textual idade: daqui p a ra lá, 
texto; daqui p a ra cá, não-texto? (!) T en ta r fazê-lo 
seria ignorar ou falsear as relações que de fato 
se estabelecem no processo de interação com u­
nicativa.
Por isso neste trabalho não foi ado tada qual­
quer tabela objetiva para m edir a textualidade 
das redações do corpus. O julgamento, ainda que 
balizado pelos critérios já definidos, passou pe­
la subjetividade de minha percepção com o leito­
ra. Não há como evitar. Não vejo com o ca lcu lar
34
objetivam ente a d im ensão da gravidade de um a 
talha relativa, por exemplo, à condição de não 
contradição com o mundo real. Fazé-lo correspon­
deria a pretender a existência dc verdades inques­
tionáveis das quais se pudesse m ed ir num erica­
mente o afastamento; significaria adm itir um a 
única possibilidade de leitura do real; seria igno­
rar a participação do recebedor na construção do 
sentido do texto; seria desprezar todos os elemen­
tos pragmáticos que interferem decisivamente na 
textualidade.
A necessidade de p reestabelecer parâm etros 
para o r ien ta r a avaliação técnica de um texto po­
de ser a tend ida através da definição de critérios 
qualitativos (e não quantitativos) que busquem 
cap ta r e s is tem atizar as condições na tu ra is de 
aceitabilidade dos discursos.
Assim, acred ito que um ju lgam ento que p re ­
tenda respe i ta r a natureza do objeto avaliado e 
percebê-lo na sua to ta lidade pode se pe rgun ta r 
o seguinte; d ada a situação com unicativa, as ca­
racterís t icas e as disposições dos interlocutores 
e o tipo textual efetivo, essa produção lingüísti­
ca se m ostra aceitável? Tem continuidade? Apre­
senta progressão? Mostra-se não-contraditória e 
bem ar t icu lada? Faz uso adequado dos recursos 
coesivos que servem à expressão dessas qualida­
des? É suficientemente c lara e explícita na a p re ­
sentação das inform ações? Com porta um m íni­
mo de novidade que possibilite reconhecê-la co­
mo m anifestação personalizada e capaz dc a t ra i r 
a atenção dc um recebedor médio?
As respostas a essas p erg u n tas não são redu- 
tíveis à exatidão de valores quantitativos. Antes,
35
passam inapelavelmente pela intuição e o bom 
senso, aplicados com na tu ra l idade pelo falante 
com um na com unicação cotidiana. São questões 
que têm a ver com a competência textual, que de­
te rm ina a capacidade das pessoas dc produzir e 
in te rp re ta r textos.
A preocupação dc julgar com objetividade as 
redações escolares tem resu ltado cm esquem as 
de correção e a tr ibu ição de notas através dos 
quais se t i ram pontos por desrespeito às regras 
do dialeto padrão ou por desobediência às con­
venções relativas ao uso da escrita , como a o r to ­
grafia c a pontuação. Q uer dizer: o ju lgam ento 
acaba privilegiando os aspectos mais superficiais 
do texto escrito, que nada têm a ver com sua es­
sência, isto é, sua textualidade, mas que são os 
únicos suscetíveis dc mensuração objetiva. A mim 
parece que o ensino de redação só te ria a ganhar 
se se p rocurasse respe i ta r na cscola o que acon­
tece na vida. A interação com unicativa cie verda­
de é um processo essencialm ente intersubjetivo: 
são pessoas que p roduzem /in te rp re tam textos, e 
e n t ram nesse jogo com toda a sua individua­
lidade.
5. A necessidade de um a avaliação global
Um texto é um a unidade dc sentido, na qual 
os elementos significam uns em relação aos ou ­
tros e em relação ao todo. O significado de cada 
um isolado pode não coincidir com o sentido que 
assum e cm relação ao conjunto, ou pode não scr 
relevante para esse sentido global. Decorre que
36
as ocorrências dc um texto não devem ser anali­
sadas per si, mas o texto deve ser percebido c in­
terpre tado integralmente, cada elemento sendo 
avaliado em função do todo. Por isso, os critérios 
cie julgamento aqui definidos conduzem a um exa­
me global do texto.
No plano da coerência, não há como avaliar 
fragmentos: a continuidade, a progressão, a não- 
contradição e a articulação só podem ser perce­
bidas quando se analisa a redação por inteiro, 
examinando-se as relações do texto com seu te­
ma e as relações das par tes entre si e com o to­
do. O não-cumprimento de uma dessas condições 
num a determ inada passagem vai com prom eter 
todo o conjunto. A ordem, aqui, é macrocs- 
trutural.
O plano da coesão, linear, m icroestrutural, 
oferece possibilidade cie percepção individuali­
zada das ocorrências: um pronome anafórico em­
pregado de maneira ambígua, uma conjunção que 
estabelece relações incabíveis, etc. Entretanto, o 
que importa é considerar o efeito dessas ocorrên­
cias no conjunto, é avaliar se os recursos lingüís­
ticos utilizados servem ou não à conexão das 
idéias, sc o texto como um todo se mostra coeso 
ou desconexo.
Não interessa, também, ju lgar a informati­
vidade de cada seqüência, examinando, como 
quer a teoria física da informação, a probabili­
dade de ocorrência dos seus integrantes. O que 
conta é verificar se, em sua realização global, o 
texto equilibrou satisfatoriamente o explícito e 
o implícito, o previsível e o inesperado, de modo 
a seconstituir num todo informativo c atraente.
37
Além da inconveniência de uma análise frag­
mentária de cada componente textual considera­
do, há a Improcedência de um exame dos três co­
mo fatores absolutamente estanques. O que se de­
preende da conceituaçào estabelecida e dos cri­
térios esboçados é que eles são faces imbricadas 
de mesmo corpo. O que afeta um deles, em ge­
ral, tem implicação sobre os outros também. Sua 
separação só se obtém artificialmente, para aten­
der á necessidade dc análise (“dividir para domi­
nar").
Vejamos: a coesão é a manifestação lingüís­
tica da coerência e, assim, a ela está inquestio­
navelmente associada; a informatividade se aplica 
tanto sobre uma quanto sobre a outra e, mais que 
isso, localizada no terreno cognitivo, guarda pon­
tos de interseção com a coerência. Há problemas 
de difícil delimitação que se espraiam por mais 
de uma área. Por exemplo: até que ponto um a la­
cuna na configuração conceituai do texto é pro­
blema de informatividade (insuficiência de dados) 
ou de coerência (falta de articulação)? Ou. ainda, 
em que medida a rup tu ra com modelos cogniti­
vos usuais representa ganho para a informativi­
dade (imprevisibilidade) ou perda para a coerên­
cia (contradição entre o mundo textual e o m un­
do real)? Problemas semelhantes podem ser apon­
tados também no que respeita à coesão: qual o 
limite entre um arran jo sintático inusitado, que 
favorece a originalidade, e uma infração, que pre­
judica a coesão textual?
Em razão do que foi apresentado, o que me 
preocupou na análise das redações foi identifi­
car com a maior nitidez possível os problemas
38
existentes, com a finalidade de tentar comprccn- 
der as reais dificuldades que eles representam. 
Assim, foi mais importante para mim perccbcr 
todas as ramificações e implicações de um mes­
mo problema do que buscar, artificialmente, 
isolá-lo do conjunto em que figura para identificá- 
lo c computá-lo como ocorrência individual. O ob­
jetivo foi perceber cada texto como um todo c che­
gar a um julgamento mais legítimo, mais próxi­
mo do que se passa dc fato no proccsso comuni­
cativo. Um julgamento que não se funda em pa­
râmetros rígidos, mas na realidade que o texto 
propõe; porem, um julgamento com inevitável 
margem dc subjetividade.
39
SEGUNDA PARTE
RELATO DE UMA ANALISE
CAPITULO 3
AS C O N D IÇ Õ E S DE PRODUÇÃO
Antes de passar à análise da coerência, coe­
são e informatividade das redações estudadas, é 
preciso deter a atenção sobre as condições de pro­
dução desses discursos, o que significa avaliar o 
papel dos fatores pragmáticos (situacionalidade, 
intencional idade e aceitabilidade) sobre a textua­
lidade desses textos específicos.
I. As contingências histórico-políticas
As redações que compõem o corpus foram 
produzidas no vestibular/UFMG realizado em ja­
neiro de 1983.
Nessa época o Brasil vivia o início do proces­
so de redemocratização. No âmbito federal, ea-
43
minhava para o fim o último governo de um a fa­
se de 21 anos de au to ri ta r ism o. No âm bito es ta ­
dual, tom avam posse os governadores eleitos di­
re tam ente em novem bro de 1982, depois de lon­
go período cm que esses cargos e ram preenchi­
dos por escolha pessoal e exclusiva do prim eiro 
m anda tá r io do país. A anistia política fora con­
quistada, já se p renunciava a Nova República e 
a cam panha pelas eleições diretas para presiden­
te começava a g an h a r as ruas.
Economicam ente, no entanto , o Brasil en ­
frentava u m a crise cujos reflexos mais dolorosos 
e ram a recessão e o desemprego. Essas dificul­
dades não e ram exclusivamente nacionais. Afe­
tavam, naquele momento, até os Estados Unidos 
c os países ricos da Europa. Aqui, a s i tuação sc 
mostrava particularmente grave c, em função dis­
so, caracterizava-se com nitidez um processo de 
ac irram en to da violência, sobre tudo nos centros 
urbanos. A população via-se, então, dup lam ente 
ameaçada, pelo desemprego e pela insegurança.
Todos esses co m p o n en te s do con tex to 
histórico-político-social são im portan tes porque 
integram o conjunto de conhecim entos e vivên­
cias par ti lhados pelos p rodu to res dos textos, os 
candidatos ao vestibular, e pelos seus recebedo- 
res compulsórios, os examinadores. Esses dados 
assum em p a r t icu la r relevância quando se sabe 
que o tema proposto para a redação foi violên­
cia social, assun to d ire tam en te dependente des­
sas contingências históricas. Não seria possível 
um a avaliação consistente da coerência ex terna 
e da inform atividade das redações sem levar em 
conta esse quadro político-cconômico-social.
44
2. O c o n te x to im ed ia to : o v e s t ib u la r
As redações analisadas fizeram parte da pro­
va de Língua Portuguesa e L itera tura Brasileira, 
aplicada na segunda e tapa do vestibular, de ca­
rá te r classificatório. Todas as provas dessa e ta­
pa foram compostas de questões abertas; as ques­
tões de múltipla escolha se lim itaram à primei­
ra etapa, eliminatória.
É fundam ental o fato de se t ra ta r de prova 
de vestibular, situação fortemente impregnada de 
carga ideológica, que lhe a tr ibui o papel mágico 
dc porta dc felicidade: u l t rap assa r esse umbral 
significa ob ter garantia absoluta de sucesso pro­
fissional e financeiro. O exame ganhou a dimen­
são de um rito de passagem, através do qual o jo ­
vem adolescente atinge a categoria de adulto res­
ponsável, socialmente integrado e bem-sucedido.
Em função desse mito, o concurso se realiza 
sob grande tensão c é, em geral, muito competi­
tivo. Em 1983, na UFMG, foram selecionados pa­
ra a segunda etapa, para todos os cursos, dois pre­
tendentes para cada vaga. N um a situação como 
essa, o candidato tem consciência de que seu de­
sempenho c decisivo e realiza um grande esfor­
ço dc auto-superação. Não bas ta fazer boas pro­
vas, é preciso fazer provas m elhores que as dos 
concorrentes, pois a segunda etapa é classifi-
catória.
Outra conseqüência do mito em que se trans­
formou o vestibular é a ncurotizante preparação 
a que se submetem os candidatos. A realidade 
atual é que praticamente todo o ensino, desde o 
1? grau, se orienta pela filosofia adm itida c pelo
45
modelo de provas adotado no vestibular. No 2? 
grau a situação se agrava e o último ano imedia­
tamente anterior ao exame é, de modo geral, de­
dicado a ele de maneira intensa e exclusiva. Há, 
então, nos colégios e nos cursinhos preparatórios, 
a preocupação de, além de dotar os alunos dos co­
nhecimentos e habilidades necessários a quem se 
destina a um curso universitário, fornecer-lhes os 
truques c macetes considerados indispensáveis a 
um bom êxito nas provas.
No caso em loco, a preparação específica se 
orienta por parâmetros previamente delimitados. 
Sabe-se que, além da redação, o candidato deve­
rá responder a questões discursivas nas quais o 
seu desempenho lingüístico, em termos de "cor­
reção gramatical", também estará em julgamen­
to. Isso significa que, normalmente, os competi­
dores se submetem a um intenso treinamento pa­
ra obter o domínio da língua padrão na modali­
dade escrita. O próprio programa do concurso ves­
tibular estabelece os critérios de avaliação e, quan­
to à redação, estipula que tipo de texto os candi­
datos deverão elaborar:
O que sc espera em termos de reda- 
çào são habilidades de exposição de 
idéias e de argumentação em tomo dc de­
terminado problema. O tema será, pois, 
de tal natureza que conduza o candida­
to a demonstrar tais habilidades.
Revela desempenho satisTatório do 
candidato em expressão escrita um tex­
to com as seguintes características:
— organização adequada cm torno 
de uma idéia central;
— estruturação das idéias de tal ma­
neira que se identifique uma in­trodução. um desenvolvimento c 
uma conclusão;
46
— divisão adequada das idéias cm 
parágrafos, c, em cada parágrafo, 
divisão adequada das idéias cm 
períodos;
— ordenação lógica e coerente das 
idéias, com uso apropriado das 
partículas de transição e palavra 
de referência;
— expressão das idéias com clareza 
e concisão, sem pormenores ex­
cessivos, redundâncias, palavras 
e expressões desnecessárias;
— uso de vocabulário exato, preciso 
e adequado;
— uso conveniente dos processos de 
coordenação e da subordinação 
de idéias;
— adequação da modalidade de lín­
gua usada ao tratamento escolhi­
do para o tema;
— uso adequado e correto dos sinais 
de pontuação;
— uso correto das estruturas da lín­
gua escrita (morfologia e sintaxe);
— correção ortográfica.
(MEC/UFMG. Normas gerais. Pro­
gramas das provas de Língua Portugue­
sa e Literatura Brasileira íl ? e 2? etapas). 
Guia dc. inscrição do vestibular 1983, p. 7)
Quanto à relação entre intencional idade e si- 
tuacionalidade, o que se pode supor é que o forte 
desejo de ser aprovado e a competitividade do con­
curso levarão o vestibulando a se empenhar para 
produzir um texto de acordo c o n as exigências 
do programa.
3. Os produtores dos textos
A p a r t i r de um Questionário de Informações 
Sócio-econômicas elaborado pelo MEC e aplicado
47
a todos os inscritos no vestibular UFMG/1983, foi 
possível delinear o perfil da amostra de cem can­
didatos ao curso de Letras cujas redações anali­
sei. Seus integrantes, em sua maioria indivíduos 
com idade entre 17 e 22 anos, trabalhavam e con­
tribuíam para a renda familiar na ocasião do con­
curso. A maior parte deles provém de famílias em 
que o pai e a mãe têm nível médio de escolarida­
de, o pai é profissional dc nível médio c a mãe é 
dona-de-casa. No 2? grau, a maioria deles estudou 
em escola particular, duran te o dia, fazendo cur­
so regular (c não supletivo ou madureza), e não 
freqüentou cursinho.
Foi possível também confrontar esse perfil 
com o do universo dos concorrentes à UFMG na 
segunda etapa do vestibular (6.914 candidatos) e 
constatar que os dois grupos apresentavam carac­
terísticas sócio-econômicas equivalentes, à exce­
ção de dois fatores: a participação na renda fami­
liar e a freqüência a cursinho. A maioria dos ves- 
tibulandos UFMG/1983 (segunda etapa) não traba­
lhava na época do exame e freqüentou algum cur­
so pré-vestibular.
As circunstâncias específicas do vestibular co­
locavam cm situação equivalente os produtores 
dos textos analisados (bem como todo o conjunto 
de candidatos que chegaram a fazer a redação). 
Todos eles já haviam concluído o 2? grau e, no ves­
tibular, já haviam sido aprovados nas provas da 
etapa eliminatória, ou seja, já haviam passado por 
uma dupla seleção.
A particularidade de os integrantes da amos­
tra serem concorrentes ao curso de Letras susci­
ta a hipótese de que eles tenham em comum o pen­
dor e o gosto pelo tra to com a linguagem, carac­
48
te rís tica que os distinguiria dos demais candida­
tos. Tal hipótese não encontrou respaldo num in­
d icador quantitativo levantado: as notas das re­
dações.
A questão de redação valeu 12 (doze) pontos, 
sendo a nota média, portanto, 6 (seis). Nos dois 
grupos, a média aritmética das notas ficou em tor­
no de 6 (seis) e a moda, também para os dois g ru ­
pos, foi 6 (seis).
Os pontos aqui levantados para a caracteri­
zação da am ostra serão retomados na conclusão, 
porque eles é que dão a medida da sua represen- 
tatividade c, por conseguinte, do alcance das pos­
síveis generalizações a serem postuladas.
4. Implicações do contexto pragmático
Como já disse, as circunstâncias históricas do 
momento de produção das redações têm particu­
lar im portância no caso em exame, em razão do 
assunto proposto como tema, d iretam ente vincu­
lado à realidade circundante. Tal fato determinou 
que, afinal, o material cognitivo com que os ves- 
tibulandos trabalharam em seus textos fosse fun­
dam entalm ente o mesmo, o que não ocorreria se 
a proposta dc redação ensejasse a criação de um 
texto com base cm vivências pessoais.
Outros elementos condicionantcs decorrem 
do fato de os textos integrarem uma prova de ves­
tibular. A situação comunicativa é absolutam en­
te artificial. O produtor do texto não é dono do 
seu assunto, nem da forma do seu discurso. Vê- 
se na contingência de discorrer sobre o tema que 
lhe for imposto, nos moldes preestabelecidos pelo
49
program a do concurso. O recebedor é ignorado, 
porem compulsório. Não se trata de um a pessoa 
a quem o produtor queira dizer alguma coisa, mas, 
pelo contrário, trata-se de um desconhecido que, 
caneta vermelha em punho, poderá barrar-lhe a 
entrada na universidade. A relação que se estabe­
lece en tre os interlocutores, em razão dos luga­
res que ocupam, é uma relação de poder, em que
o produtor se submete ao que ele imagina sei a 
vontade do recebedor. Esse jogo de representações 
mentais, no entanto, sc processa de form a distor­
cida, porque os protagonistas de lato não se co­
nhecem e se baseiam cm suposições estereotipa­
das sobre a figura do outro. Mais um artificialis- 
mo resulta do próprio objetivo do pretenso ato de 
comunicação. A intenção nào é dizer alguma coi­
sa, mas demonstrar que se tem o domínio de uma 
modalidade do código c. com isso, angaria r apro­
vação no concurso. Nesse caso, às vezes, pode ser 
mais conveniente se esconder do que se mostrar, 
dizer não o que realmente se teria a dizer, mas ape­
nas o dizível, o considerado adequado para a cir­
cunstância. Assim, os objetivos do produtor, as­
sociados àquilo que ele imagina ser a expectativa 
do recebedor, vão exigir um severo direcionamen­
to da situação no sentido da conquista da meta 
planejada. Noutros termos, intencional idade, acei­
tabilidade e situacionalidade vão se conjugar pa­
ra exigir a auto-superação do candidato com vis­
tas à produção de um texto o mais próximo pos­
sível do padrão considerado desejável.
As contingências apontadas autorizam algu­
mas expectativas. O curso a que sc destinam os 
candidatos, sua prévia seleção e suposta cuidado­
sa preparação, a importância social c a competi-
50
lividade do curso conduzem à hipótese dc que ti­
re em mãos um elenco de produções lingüísticas 
com alto padrão de textualidade. Por outro lado, 
fatores correlatos levam a esperar baixo grau dc 
informatividade nas redações: todas elas inte­
gram a m esm a prova, tra tam do mesmo tema, 
proposto no mesmo momento. Foram elaboradas 
por pessoas sujeitas às mesmas condições histó­
ricas e culturais, pertencentes, em sua maioria, 
a m esm a classe social e à mesma faixa etária, su­
postamente com a mesma habilitação e aptidão, 
que provavelmente se subm eteram a uma prepa­
ração de tendência despersonali/an te e que pre­
sumivelmente procuraram cum prir as exigências 
do programa.
Os fatores que sugerem a segunda hipótese 
pesaram mais que aqueles que dão origem à pri­
meira. De início, um indicador disso foi a d istri­
buição de freqüência das notas de redação, que 
revelou um a concentração em torno de 6 (seis), 
tanto para a amostra analisada quanto para o uni­
verso dos vestibulandos UFMG/1983 (segunda eta­
pa). A análise qualitativa das redações vai confir­
m ar essa suposição.
SI
C A P I T U L O 4
A C O E R Ê N C I A . A C O E S Ã O 
E A I N F O R M A T I V I D A D E : B R E V E E S T U D O 
Q U A N T I T A T I V O
A análise quantitativa não constitui o foco dc 
interesse deste trabalho. Os núm eros que ap re ­
sento rap idam ente aqui têm apenas a função de 
possibilitar uma visão panorâmica do que foi apu­
rado no exame do corpus e, assim, m arca r um 
ponto de pa r t id a para a análise qualitativa.
Computando quantas redações apresentaram 
uma ou mais infrações a cada condição conside­
rada, obtive os resultados constantes da Tabela
1 a seguir.
53
TABELA 1
INFRAÇÕES AS CONDIÇÕES DC TEXTUALIDADE CONSIDERADAS
Fatores Condições
% de Redaçócs 
com Infração
C ontinuidade 32
Progressão 30
Coerência
Não-con trad ição 
in te rn a 33
externa 64
A rticulação
presença 56
pertinência 56
C ontinuidade 60
Coesão
P rogressão 12
\à o -c o n trad ição 51
A rticulação 36
Suficiência de dados 65
Inform atividade Im previsib ilidade 87
A Tabela 1 m o s tra que a in fo rm ativ idade foi 
o fa to r cm re lação ao qual houve m a io r núm ero 
dc redações com problem as: 87% de las fe riram 
a condição de imprevisibilidade e 65%, a de su fi­
ciência de dados.
Em segundo lugar vem a coerência. Assina­
lo que os aspec tos que têm a ver com a o rgan iza­
ção conceituai in terna do texto, à exceçào da con­
dição de articu lação interna ("presença"), se apre­
sentam falhos num percen tual re la t ivam ente bai­
xo de redações (cm to rno dc 30%). J á as condi­
ções de não-contradição externa c dc pertinência 
da articulação estabelecida se m o s t ra ra m proble­
m áticas c m m ais da m etade dos textos.
A coesão foi o fa to r que sc ap re se n to u defi­
ciente num percentual m en o r dc redações. O em ­
prego dc recursos lingüísticos que deno tam a pro-
54
gr es são (a estruturação de frases e parágrafos em 
função das relações entre dado e novo e entre tó- 
d í c o e comentário, o uso de mecanismos de cria­
ção de foco) sc mostrou inadequado num percen- 
:ual pouco signif icativo de redações (12%). Os me­
canismos de junção e os articuladores do discur­
so, que servem à inter-relação das idéias do tex­
to, foram mal empregados em 36% das redações.
O alto índice de redações com problemas 
quanto à condição de não-contradição (51%) se 
explica em função do grande núm ero de falhas 
na área léxico-semântica: em 43% das redações 
foram constatadas impropriedades vocabulares 
que configuravam contradição entre o significan- 
te empregado e o significado cabível. Em 8% fo­
ram encontrados problemas concernentes ao uso 
de tempos e modos verbais, que redundam em 
contradições no regime enunciativo do texto.
Os recursos lingüísticos que expressam a 
continuidade tiveram utilização inadequada em 
60% das redações. Esse percentual, em desacor­
do com os 32% de redações afetadas por proble­
mas de continuidade no plano da coerência, exi­
ge um esclarecimento. Esse desacordo significa 
que, em m uitos casos, a re tom ada de elementos 
era feita sem problemas no plano conceituai, mas 
se apresentava mal expressada na superfície 
do texto. Era possível perceber com nitidez que 
elemento estava sendo retomado, a retomada 
e ra pertinente, mas não havia, por exemplo, con­
cordância en tre o pronome e seu antecedente, 
ou entre o verbo e o sujeito elíptico. Os pronomes 
anafóricos e a elipse, aliás, foram os mecanis­
mos de expressão da continuidade que apare­
55
ceram mal em pregados com m aior freqüência no 
cor pus.
A T abe la 2 a segu ir re su m e e to rna de fácil 
v isualização o que foi dito nos ú lt im os p a rág ra ­
fos a p ro p ó s i to do em prego dos recursos de coe­
são:
TABELA 2
1 \ FRAÇÕES RELATIVAS AO EMPREGO ÜH RECURSOS COESIVOS
Condiçóes M ecanismos de coesão
% de Redações 
com Problemas
Continuidade
Pronom es anafóricos 
Elipse
substitu ição por zero 
concordância com sujeito elíptico 
D eterm inação por artigo deíinido 
Recorrência lexical 
Substitu ição lexical
32
02
10
06
04
06
TOTAL 60
Progressão
Relações en ire dado e novo 
Relações en tre tópico e com entário 
Mecanismos de criação dc foco
02
09
01
TOTAL 12
N'áo-contradiçáo
Tempos e modos verbais 
Compat ibilidade léxico-semântica
08
43
TOTAL 51
Articulação Mecanismos der junção e articuladores 36
TOTAL 36
É de in te resse re ssa l ta r que, indiv idualm en­
te, os itens que se a p re se n ta ram problem áticos 
em m aior núm ero de redações foram: o em prego
56
do vocabulário (43% dos textos com casos de con­
tradição léxico-semântica); o uso de mecanismos 
de junção e articu ladores do discurso (36% dos 
textos com problemas); o uso de pronomes ana- 
(o ricos (32% das redações com problemas de falta 
de concordância, ambigüidade, etc.). Os outros 
itens constantes da Tabela mostram índices pou­
co ou nada significativos, o mais alto deles a tin­
gindo apenas 10%. Esse levantamento é impor­
tante como diagnóstico e sugere um a nova área 
de trabalho no cuidado com o aspecto formal da 
redação.
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CAPÍTULO 5
A C O E R Ê N C I A . A C O E S Ã O 
E \ I \ TF O R M A T I V I D A D E : A N Á L I S E Q U A L I T A T I V A
Neste estudo qualitativo pretendo demons­
t r a r quais foram os problemas constatados nos 
textos e que interpretação eles receberam. Para 
tanto, vou transcrever14 e analisar algumas re­
dações em que essas dificuldade aparecem bem 
caracterizadas e são representativas do que ocor­
reu com freqüência no corpus.
A intenção é apresentar exemplos caracterís­
ticos de infração a cada condição de textualida- 
dc fixada. Como não foi possível encontrar tex­
tos cu jo único problema fosse uma falha bem de­
lineada com relação a uni determinado requisi­
to, decidi apresentar a análise integral da reda­
ção escolhida para ilustrar o não-cumprimento 
de cada condição, destacando as dificuldades eon-
59
cernentes à realização cio requisito em 1'oco, mas 
não ignorando as eventuais falhas relativas a ou­
tras condições. Posto que o corpus me oferecia 
mais de um texto com ocorrência típica e inte­
ressante de infração relativa a cada condição, ou 
me oferecia textos com manifestações diferentes 
do mesmo problema, julguei pertinen te traze r à 
m ostra mais de um a redação, em alguns casos.
1. Em foco: p roblem as relativos à coerência 
e à coesão
1.1. Falha na realização do requis ito 
de continuidade
REDAÇÃO N? 41
O homem como fruto do meio
O homem é produto do meio social 
cm que vive. Somos todos iguais e não 
nascemos com o destino traçado para fa­
zer o bem ou o mau.
O desemprego, pode ser considera­
do a principal causa de tanta violência. 
A falta de condições do indivíduo em ali­
mentar a si próprio e sua família.
Portanto é coerente dizer, mais em­
prego, menos criminalidade. Um empre­
go com salário, que no mínimo supris­
se o que é considerado de primeira ne­
cessidade, porque os sub-empregos, es­
ses, não resolvem o problema.
Trabalho não seria a solução, mas 
teria que ser a primeira providência a 
ser tomada.
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Existem vários outros fatores que 
influenciam no problema como por 
exemplo, a educação, a falta de carinho, 
essas crianças simplesmente nascem, 
como que por acaso, e são jogadas no 
mundo, tomando-se assim pessoas re­
voltadas c agressivas.
A solução é alongo prazo, é cuidan­
do das crianças, mostrando a elas a es­
cala de valores que deve ser seguida.
E isso vai depender de uma cons­
cientização de todos nós.
A descontinuidade é f lagrante nesse texto, 
mas aparece aí associada à desarticulação. E não 
são esses os únicos problemas. Vejamos a análise.
A e s t ru tu ra formal da redação corresponde 
á organização do texto dissertativo e atende, pois, 
às exigências do programa: um parágrafo in tro­
dutório, qua tro dc desenvolvimento e dois reser­
vados à conclusão. De início, um núm ero tão 
grande de parágrafos num texto relativamente pe­
queno faz suspe ita r de um a certa fragmentação.
O título e a prim eira frase lançam uma idéia 
que não se rá mais re tom ada explicitam ente na 
redação e que só à custa de algum esforço do rc- 
cebedor pode ser relacionada com os fatos e con­
ceitos expostos. Não é imediata

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