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Apostila para OAB - parte geral - 2012.pdf APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 1 APONTAMENTOS MAIS IMPORTANTES – PARTE GERAL DO CP 1 - PRINCÍPIOS - PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA Segundo este princípio, o Direito Penal deve ser a ultima ratio e nunca a prima ratio, só devendo intervir quando os outros ramos do Direito não conseguem solucionar o conflito. Um exemplo recente da utilização deste princípio foi a revogação do crime de adultério (art. 240, CP), pois tal conduta pode ser perfeitamente solucionada na esfera do Direito de Família. Geralmente este princípio é dirigido ao legislador. O Direito Penal deve ser tido como subsidiário, ou seja, a última medida a ser adotada quando os demais ramos do Direito não bastam para solucionar a lesão a um determinado bem jurídico tutelado. - PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE Limita ainda mais o poder do legislador, esclarecendo quais as condutas que podem ser incriminadas pela lei penal. Possui 4 funções principais: A) proibir a incriminação de uma atitude interna (dessa forma, não se pune o que o sujeito pensa, ainda que seu pensamento seja dirigido a algo criminoso, a não ser que exteriorize lesando algum bem jurídico); B) proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio autor (ex.: a auto lesão, a tentativa de suicídio por quem quer se matar, e ainda se discute a validade do art. 28 da Lei no 11343/06); C) proibir a incriminação de simples estados ou condições existenciais (evitando dessa forma o Direito Penal do autor); D) proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem jurídico (condutas que deixem a comunidade insatisfeita, mas que não afetem bens jurídicos tutelados). Podemos ainda mencioná-lo como Princípio da ofensividade. Consoante tal princípio, é indispensável que haja “pelo menos, um perigo concreto, real e efetivo de dano a um bem jurídico penalmente protegido”. - PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL Sua consequência principal deve ser a descriminalização, pelo legislador, daquelas condutas que por uma evolução social ou mudança de costumes a sociedade passa a tolerar, não vendo mais as condutas como agressivas a determinado bem jurídico tutelado. É óbvio que ainda que se possibilite ao aplicador da lei utilizar o Princípio da adequação social, este deve ser utilizado com razoabilidade. Vejamos a decisão abaixo, que bem demonstra que não é em qualquer situação que podemos utilizá-lo: - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA OU BAGATELA APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 2 Por este princípio, o que apresenta insignificante desvalor da conduta ou do resultado não merece a sanção penal. Ocorre resistência quanto à sua aplicação nos crimes com violência ou grave ameaça, ou ainda nos crimes relativos a drogas. É geralmente empregado no furto. Há farta jurisprudência acerca do tema. Inaplicável o Princípio da insignificância ao delito de roubo (art. 157, CP), por se tratar de crime complexo, no qual o tipo penal tem como elemento constitutivo o fato de que a subtração de coisa móvel alheia ocorra “mediante grave ameaça ou violência a pessoa, a demonstrar que visa proteger não só o patrimônio, mas também a integridade pessoal. (STF – AI-AgR 557972 / MG – MINAS GERAIS – 07- 03-2006) Para a incidência do Princípio da insignificância só se consideram aspectos objetivos, referentes à infração praticada, assim a mínima ofensividade da conduta do agente; a ausência de periculosidade social da ação; o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; a inexpressividade da lesão jurídica causada (HC 84.412, 2a T., Celso de Mello, DJ 19.11.04). A caracterização da infração penal como insignificante não abarca considerações de ordem subjetiva: ou o ato apontado como delituoso é insignificante ou não é. E sendo, torna-se atípico, impondo-se o trancamento da ação penal por falta de justa causa. (STF – HC 77.003, 2a T., Marco Aurélio, RTJ 178/310) (AI-QO 559904 / RS – RIO GRANDE DO SUL – 26-08-2005) PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ART. 12, DA LEI No 6.368/76 E ART. 333, DO CP. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA. ATIPICIDADE. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA. I – O trancamento de ação por falta de justa causa, na via estreita do writ, somente é viável desde que se comprove, de plano, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito, hipóteses não ocorrentes na espécie (Precedentes). II – O Princípio da insignificância está estritamente relacionado com o bem jurídico tutelado e com o tipo de injusto. Dessa maneira, não pode ser utilizado para neutralizar, praticamente in genere, uma norma incriminadora. Se esta visa as condutas de adquirir, vender, guardar, expor à venda ou oferecer é porque alcança, inclusive, aqueles que traficam pequena quantidade de drogas. Recurso desprovido. (STJ _ RHC 18198/BA – Quinta Turma – Min Felix Fischer – 20/03/2006) Deve-se ter grande cuidado com a aplicação deste princípio no crime de furto, tendo em vista a existência do furto privilegiado, ou seja, de pequeno valor, art. 155, § 2o do CP. Não se deve confundir insignificância com pequeno valor. O furto de pequeno valor, previsto no art. 155, § 2o do CP, prevê a existência de um furto privilegiado se o criminoso é primário e a coisa furtada é de pequeno valor. A jurisprudência vem entendendo como de pequeno valor a quantia de até um salário mínimo: No crime de furto, há que se distinguir entre infração de ínfimo e de pequeno valor, para efeito de aplicação da insignificância. Não se discute a incidência do princípio no tocante às infrações ínfimas, devendo-se, entretanto, aplicar-se a figura do furto privilegiado em relação às de pequeno valor. (STF – HC 84424 / SP – SÃO PAULO- 07/12/2004) APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 3 I – No caso de furto, para efeito da aplicação do Princípio da insignificância, é imprescindível a distinção entre ínfimo(ninharia) e pequeno valor. Este, ex vi legis, implica eventualmente em furto privilegiado; aquele, na atipia conglobante (dada a mínima gravidade). II – A interpretação deve considerar o bem jurídico tutelado e o tipo de injusto. III – Ainda que se considere o delito como de pouca gravidade, ta l não se identifica com o indiferente penal se, como um todo,observado o binômio tipo de injusto/bem jurídico, deixou de se caracterizar a sua insignificância. No caso concreto, o valor da res furtiva não equivale, em linhas gerais, aproximadamente, a uma esmola, não configurando, portanto, um delito de bagatela. Recurso especial desprovido. (STJ – REsp 909357 / DF – RECURSO ESPECIAL – 2006/0268988-7 – Relator Min. Feliz Fischer – Quinta Turma – 14/06/2007) Como diferenciar no caso concreto a aplicação do Princípio da insignificância, que conduz à atipicidade material do fato, do furto de pequeno valor? Imaginemos que um sujeito subtrai uma caixa de bombons de uma grande loja. Na primeira vez se reconhece o Princípio da insignificância. O sujeito pratica a conduta por várias outras vezes, sendo denunciado como autor do crime de furto em continuidade delitiva. Deveria o magistrado reconhecer como no caso anterior o Princípio da insignificância? A nosso ver não. Alguns sustentam que a aplicação do Princípio da insignificância deve levar em consideração o desvalor insignificante do resultado. Neste exemplo, continuaríamos a ter insignificante desvalor do resultado, mas não podemos ter a conduta do sujeito como insignificante. Isso não impede de nos utilizarmos do furto privilegiado. Condena-se o sujeito, podendo o magistrado, consoante o § 2o do art. 155, substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços ou aplicar somente a pena de multa. Outro exemplo: o sujeito abre a carteira de alguém para subtrair dinheiro. Ao abrir, depara-se com a quantia de R$ 550,00, mas retira apenas R$ 50,00. Neste caso, sua conduta e o resultado dela são tidos como insignificantes. Se o sujeito abrisse a carteira com a finalidade de subtrair todo o dinheiro, se deparasse com a quantia de R$ 50,00, que era tudo que a vítima possuía, e retirasse esses R$ 50,00, a nosso ver já não mereceria aplicação o Princípio da insignificância, mas admitir-se-ia o furto privilegiado. Então, deve a distinção ser analisada de acordo com o caso concreto. - PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE PESSOAL Previsto no Art. 5o, XLV da CF. Também denominado Princípio da intranscendência ou da pessoalidade, ou ainda personalidade da pena. Somente o condenado, e mais ninguém, poderá responder pelo fato praticado. A pena não pode passar da pessoa do condenado. Este princípio justifica a extinção da punibilidade pela morte do agente. Resta óbvia a extinção quando estamos tratando da pena privativa de liberdade, mas o Princípio da responsabilidade pessoal faz com que, mesmo tendo o falecido deixado amplo patrimônio, a pena de multa não possa atingi-lo, pois estaria passando da pessoa do condenado para atingir seus herdeiros. Sendo assim, sempre estará extinta a punibilidade, independente da pena aplicada, quando ocorrer a morte do agente. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 4 - PRINCÍPIO DA LIMITAÇÃO DAS PENAS Previsto no Art. 5o, XLVII da CF. Atende ao Princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1o, III da CF). Não são admitidas as penas de morte (salvo os casos previstos na própria CF), as de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis. A Constituição Federal estabelece em seu art. 5o, XLVII: Não haverá penas: a) De morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) De caráter perpétuo; c) De trabalhos forçados; d) De banimento; e) Cruéis. O art. 84, XIX estabelece que compete privativamente ao presidente da república: declarar guerra, no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo Congresso nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente,a mobilização nacional. - PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE Impede a responsabilidade penal objetiva. Em síntese, ninguém pode ser punido por um crime se não agiu com dolo ou culpa. Encontra amparo legal no art. 18, parágrafo único do CP: Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. - PRINCÍPIO DA LEGALIDADE Na análise de qualquer norma de natureza penal, devemos no primeiro momento verificar se há desrespeito a qualquer dos princípios, sejam eles previstos implícita ou explicitamente na Constituição. O Princípio da legalidade está insculpido no art. 1o do CP e no art. 5o, XXXIX da CF, estabelecendo que nenhuma conduta pode ser considerada criminosa e nenhuma pena pode ser imputada ao agente sem que lei anterior à conduta traga a previsão da conduta criminosa e a pena cominada. O referido princípio é apontado como base estrutural do próprio Estado de Direito, pedra angular do Direito Penal como um todo, abrangendo a pena cominada pelo legislador, a pena aplicada pelo juiz e a pena executada. não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. Este Princípio costuma ser mencionado por meio da expressão nullum crimem, nulla poena sine lege, esta última citada por grande parte da doutrina como construída pelo APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 5 professor alemão Paulo João Anselmo Feuerbach, em 1801, em seu Tratado29. Nilo Batista30 contesta a fórmula acima referida, afirmando que ela não consta da obra de Feuerbach, mas sim articulações dessa fórmula. São as seguintes, consoante o insigne mestre: Nulla poena sine lege Nullum crimem sine poena legali Nulla poena (legalis) sine crimine Francisco de Assis Toledo destaca que embora Feuerbach tenha tido o mérito da construção da fórmula latina, o Princípio da legalidade já se encontrava na Magna Charta Libertatum (séc. XIII),31 no bill of rights das colônias Inglesas da América do Norte e na Déclaration des droits de l´home et du citoyen, da Revolução Francesa, de onde se difundiu para os demais países.32 Abaixo o texto que consagra o princípio na Declaração Universal dos Direitos do Homem e na Convenção Americana sobre Direitos humanos, respectivamente: Art. XI, 2: Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituam delito perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso. Art. 9o: Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no momento em que forem cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito aplicável. Tampouco se pode impor pena mais grave que a aplicável no momento da perpetração do delito. 2 – LEI PENAL NO TEMPO Embora a lei penal exista desde a sua promulgação, só será obrigatória com a publicação oficial. Em vigor, passa a surtir efeitos no presente e para o futuro. Chama-se vacatio legis o período de tempo entre sua publicação oficial e o início de vigência. Antes de falar em lei penal no tempo, temos quer ter a noção de vigência da lei – todas as normas jurídicas. O Artigo 2 º LICC – permanece em vigor Ocorre que pode existir um tempo entre a publicação e a vigência da lei, é o que chamamos de vacatio legis. De acordo com a LICC, se a lei nada falar, ela entrará em vigor em 45 dias. Mas, pode a lei dispor sobre o prazo de sua entrada em vigor. Esse período de tempo da vacatio legis é o período que a lei não tem eficácia, é o período de tempo em que o ordenamento e os operadores estão adequando o sistema vigente para a entrada em vigor daquela lei. Então, quanto mais complexa a lei, mais tempo levará para que ela entre em vigor. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 6 Depois que ela entra em vigor, via de regra, ela deve vigorar por prazo indeterminado, sendo revogada por outra lei a revogue expressamente. Essa vigência da lei até que outra a modifique ou revogue encontra exceção nas leis temporárias ou excepcionais, porque elas mesmas possuem um prazo de vigência, elas são auto-revogáveis, seja pq na lei temporária já tem um prazo determinado, por isso elas são chamadas de temporárias, seja pq nas leis excepcionais elas só vão vigorar enquanto durarem determinadas situações específicas. Então, não vigorará até que outra lei a revogue ou modifique pq ela se auto-revogará. OBS : Ab-rogação – revogação total Derrogação - revogação parcial Essa revogação das leis – artigo 2 º parágrafo 1 º LICC - pode ser expressa ou tácita. Ocorre que foi editada Lei complementar 95 que estabelece que a revogação tem que ser expressa. Então, a partir do advento dessa LC 95, a revogação deverá ser expressa e não mais tácita porque sabemos que o legislador brasileiro não tem hábito de analisar os diplomas existentes. Então a LC 95 veio para conscientizar o legislador que ele precisa revogar expressamente aquilo que contraria o diploma que ele está editando. Irretroatividade e retroatividade da lei penal O conflito temporal de normas pressupõe uma seqüência de leis penais e rege-se pelo princípio constitucional da irretroatividade: Art. 5o. XL da CF “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” O parágrafo único do art. 2o. do CP preconiza a aplicação da lei posterior aos fatos anteriores, desde que essa nova lei de qualquer modo favoreça o agente. Só não terá aplicação a lei nova se o agente já houver cumprido a pena. De acordo com a súmula 611 do STF, o juiz da execução poderá aplicar a lei benéfica quando já tiver ocorrido o trânsito em julgado. Conceito de lei mais benéfica Não é necessariamente somente aquela que diminui a pena. Deve ser aferida no caso concreto, analisando causas de diminuição, causas de justificação, causa de exclusão da APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 7 culpabilidade, lapso prescricional mais curto, melhores condições para concessão do sursis, liberdade condicional,... Dessa forma, resolve-se o caso hipoteticamente, conforme uma e outra lei, para se aferir qual é a mais benéfica ao agente. Tempo do crime O art. 4o. do CP adotou a teoria da ação ou da atividade, sendo o tempo da infração penal tanto o da ação como o da omissão, independente do momento do evento. O momento da conduta, comissiva ou omissiva, será, portanto, o nosso marco inicial para todo tipo de raciocínio que se queira fazer em sede de extra-atividade da lei penal. Espécies de extra-atividade retroatividade e ultra-atividade Exemplo: Alguém, na direção de veículo automotor, praticou homicídio culposo, em maio de 1997, ocasião em que ainda não havia entrado em vigor o Código de trânsito (lei 9503/97 de 23/09.97). Os autos foram conclusos para sentença em outubro de 1997. Qual norma vai se aplicar à espécie? O CP, que nesse caso, possuirá ultra-atividade, uma vez que é lex mitior, pois pune o homicídio culposo com pena de 1 a 3 anos, diferentemente da Lei 9503/97, que traz uma pena de 2 a 4 anos. Crime permanente e crime continuado Em novembro de 2003, o STF editou o verbete 711: “a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência” Lei temporária ou excepcional lei temporária é aquela com tempo de vigência pré determinado. Lei excepcional é aquela que terá vigência durante certa situação tida como excepcional. Encerrado o período de vigência, as leis são tidas como revogadas, ocorre auto revogação. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 8 Tais leis são ultra-ativas, possuem em comum a ultra-atividade gravosa, para que se impeça a impunidade, pois frente a uma curta vigência, seria muito difícil conseguir punir o agente que praticou o fato se fosse considerar que a lei temporária ou excepcional não o poderia alcançar após a sua revogação. 3 – LEI PENAL NO ESPAÇO Lugar do crime Três teorias disputam o tratamento da determinação do lugar do crime: - teoria da atividade - teoria do resultado - teoria mista ou da ubiqüidade Nosso CP, no seu artigo 6o. adotou a teoria da ubiqüidade, ao considerar praticado o crime no lugar em que ocorrei a ação ou a omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria se produzir o resultado. Princípio da territorialidade O princípio da territorialidade está contido no artigo 5o do CP, que determina a aplicação da lei brasileira, sem prejuízo de convenções, Tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. Princípio da Extraterritorialidade Tal extraterritorialidade da lei penal pode ser condicionada (caso de adoção relativa do princípio da extraterritorialidade) ou incondicionada (adoção absoluta do princípio da extraterritorialidade). Será incondicionada quando a aplicação da lei penal for independente do advento de qualquer condição. Ao contrário, nos casos de extraterritorialidade condicionada, a aplicação da lei penal brasileira dependeria do advento de determinada condição. As hipóteses de extraterritorialidade incondicionada estão previstas no art. 7o, I, do CP, que abrange o princípio da defesa, real ou de proteção (alíneas a,b e c) e princípio cosmopolita (art. 7o, I, d). Conceito de território nacional A princípio seria o solo, mas ele não se basta a isto, seria também o subsolo, rios, lagos, lagoas. No sentido Jurídico, além do seu sentido estrito, território também englobaria o mar territorial e o espaço aéreo. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 9 território em sentido estrito – solo, subsolo e águas fluviais e lacustres (rios e lagos), todos lImitados pelas fronteiras políticas. mar territorial –Em âmbito internacional, o mar territorial é a faixa ao longo da costa que compreende 12 milhas. Conceito dado pela Lei nº 8617/93 (combine com o art. 5º do CP) Espaço aéreo –Teoria da soberania sobre a coluna atmosférica – tem uma delimitação correspondente à projeção do país (território em sentido estrito e mar territorial) no espaço. É ilimitada para cima, ou seja, toda a seção atmosférica. Art. 5º, § 1º do CP: Aqui já se tem a aplicação da Lei brasileira fora do conceito lato de território nacional. Trata-se de uma ficção do que seria também território brasileiro, ou seja, uma extensão, por ficção, do território nacional em sentido lato. Seriam os navios e aeronaves públicos ou a serviço do governo brasileiros onde quer que se encontrem e os navios e aeronaves privados ou mercantes brasileiros em alto mar ou aeronaves no espaço aéreo correspondente . Neste último caso (privados e mercantes) Só vão ser extensão do território se estiverem em alto mar, ou seja, no mar de ninguém, fora do mar territorial de outro Estado ou no espaço aéreo correspondente. Vão ter a aplicação da Lei da Bandeira que ostentam. Se estiverem em território de outro país, será aplicada a Lei de onde eles estiverem. Se estiverem em alto-mar e forem estrangeiros, será aplicada a lei de seu território. Logo, considera-se território estrangeiro e o princípio será da extraterritorialidade (art. 7º.) Na hipótese de extraterritorialidade incondicionada (artigo 7º, I do CP), o agente será punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. Se já tiver sido condenado no estrangeiro, aplica-se o artigo 8o, que determina que a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas. Tal regra evita a dupla punição do agente pelo mesmo fato. 5 - TEORIA DO CRIME INFRAÇÃO PENAL DISTINÇÃO ENTRE CRIMES E CONTRAVENÇÕES PENAIS Nosso CP não adota o critério tripartido, adota o critério bipartido, diferenciando crime de contravenção. Delito é sinônimo de crime. As contravenções também são chamadas de delitos-anões Infração penal é conceito amplo, que abrange os crimes e contravenções. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 10 Em síntese: Distinção entre crime e contravenção: Crime - infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa. Contravenção – infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. OBJETO MATERIAL E OBJETO JURÍDICO Objeto material é a pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta. Pode se confundir, muitas vezes, com o próprio sujeito passivo do crime. Já o objeto jurídico é o bem jurídico tutelado pela norma. Ex.: crime de furto – o objeto material é a coisa furtada. O objeto jurídico é o patrimônio. CONCEITO DE CRIME PRETERDOLOSO OU PRETERINTECIONAL É espécie de crime qualificado pelo resultado. Há dolo no antecedente e culpa no conseqüente. Exemplo: lesão corporal seguida de morte – artigo 129, parágrafo 3º do CP. CONCEITO DE CRIME Infração penal Crime (delito) contravenção APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 11 Pelo conceito analítico de crime, podemos defini-lo como fato típico, antijurídico e culpável. FATO TÍPICO CONDUTA – A conduta pode ser comissiva ou omissiva, dolosa ou culposa. Dolo é a vontade livre e consciente dirigida a realizar a conduta prevista no tipo. Vontade não se confunde com desejo. Na vontade, o sujeito quer o resultado delitivo como consequência de sua própria ação e se atribui alguma influencia em sua produção. Artigo 18, CP “salvo os casos previstos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente” Dessa forma, o dolo é a regra; a culpa é a exceção. Crime Fato: Típico Elementos: -Conduta -Nexo causal -Resultado -Tipicidade em sentido estrito (previsão legal) Antijurídico Excludentes da ilicitude ou antijuridicidade: -Legítima defesa -Estado de necessidade -Exercício regular de direito -Estrito cumprimento do dever legal -Consentimento do ofendido Culpável Elementos da culpabilidade: -Imputabilidade -Potencial consciência da ilicitude -Exigibilidade de conduta diversa APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 12 Pela teoria da vontade, dolo é tão somente a vontade livre e consciente de praticar a conduta descrita no tipo. Pela teoria do assentimento, dolo é também a assunção do risco de causar o resultado, ainda que não se trate de vontade direta do agente. Podemos visualizar na primeira teoria, o dolo direto e na segunda, o dolo eventual. Estas são as duas teorias adotadas pelo nosso CP. É o que se depreende do artigo 18, I, do CP. de 1o. grau Dolo direto de 2o. grau O dolo direto de 1o grau é aquele em relação ao fim proposto e aos meios escolhidos, já o dolo direto de 2o grau é conhecido como aquele em relação aos efeitos colaterais, representados como necessários. Ex.: matar o presidente, colocando uma bomba no avião. Fim proposto – matar o presidente Meio – colocar a bomba no avião Efeitos colaterais necessários – matar os demais passageiros Em relação aos demais passageiros, haverá dolo direto de 2o. grau. Dolo eventual – o agente não deseja diretamente o resultado, mas assume o risco de produzi-lo. É necessário distinguir o dolo eventual da culpa consciente. Na culpa consciente, o resultado até é previsível, mas o sujeito não assume o risco de sua produção, porque acredita sinceramente em sua habilidade, tendo como certo que o resultado não vai se produzir. NEXO CAUSAL E RESULTADO: Há a classificação dos crimes em relação ao resultado: - Crime material: o tipo descreve a conduta e o resultado. Para a consumação de um crime material é necessária a realização tanto da conduta quanto do resultado. Exemplo: art. 171 do CP. - Crime formal: o tipo descreve a conduta e o resultado. A diferença é que no crime formal, basta a realização da conduta para haver a consumação do crime, por APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 13 isso, é também chamado de crime de "consumação antecipada", a modificação do mundo exterior não vai acontecer necessariamente, mas pode até ocorrer, sendo, neste caso, apenas um exaurimento do crime. Exemplo: crime de extorsão art. 158 do CP, de acordo com a súmula 96 do STJ. - Crime de mera conduta: o tipo só descreve a conduta. Não há descrição do resultado. Ex. art. 150 CP . A semelhança com o crime formal é que em ambos, basta a prática da conduta para o crime estar consumado. Relação de causalidade Teoria da condição (conditio sine qua non) O nosso Código Penal, no art. 13, trata do nexo de causalidade. Dispõe que o resultado de que depende a existência do crime somente é imputável quem lhe deu causa e dispõe que causa é a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Para saber o que é causa é necessário um processo de eliminação hipotética, método indutivo hipotético de eliminação. Do contrário, tudo será causa, levando a uma responsabilidade penal infinita. Portanto, causa é toda a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido da maneira como ocorreu. Causa de um resultado é toda condição que, suprimida mentalmente, faria desaparecer o resultado. É esta a teoria adotada, mas existem outras teorias que tentam definir o que é causa. Não basta dar causa, é necessário ter agido com dolo ou culpa. Ex: amigo A pendurado num galho prestes a cair num abismo, o amigo B ao tentar ajudar, esticando a mão, faz com que B, que está pendurado solte o galho que acaba caindo. Deu causa? Deu, mas não há responsabilidade penal porque não há dolo, nem culpa. Concurso de causas Quando só há uma causa, resolve-se pelo art. 13, caput, mas se houver um concurso de causas? As causas são definidas pela doutrina em: - preexistentes - concomitantes - supervenientes Exemplo: pessoa que leva um facada, depois um tiro, depois toma veneno? Qual são as causas preexistentes? E as supervenientes? Dependerá do ponto de referência adotado. Ex: Com relação ao veneno, o tiro é preexistente. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 14 No entanto, antes de aplicar a regra, verifica-se se é a exceção – art. 13, parágrafo 1º. – causa superveniente relativamente independente, que causa o resultado por si só, pois neste caso, ela exclui a imputação pelo resultado. Ex.: o agente levou um tiro, depois foi levado ao hospital, onde houve um incêndio e ele morreu. Estabelecido o ponto de referência (o tiro), o incêndio está depois (é uma causa superveniente), o agente só morreu no incêndio, porque estava no hospital, porque levou o tiro (relativamente independente), mas o incêndio mata por si só. Desta forma, estamos diante da exceção, não aplicamos a regra. O agente só responde por tentativa de homicídio, considerando que tinha o dolo de matar. TIPO CULPOSO Consoante o artigo 18, II, CP, diz-se o crime culposo: “Quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligencia ou imperícia. Dispõe o parágrafo único: “salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.” imprudência, imperícia e negligência imprudência – conduta positiva praticada pelo agente que, por não observar o seu dever de cuidado, causasse o resultado lesivo que lhe era previsível. A imprudência e um fazer algo. Negligência – é um deixar de fazer algo que a diligencia normal impunha que fosse feito. Imperícia – quando ocorre inaptidão, momentânea ou não, do agente para o exercício de arte ou profissão. Está ligada à atividade profissional do agente. Imputação objetiva e crime culposo A teoria da imputação objetiva, em síntese, aproxima-se da seguinte assertiva conceitual: “só pode ser objetivamente imputável um resultado causado por uma ação APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 15 humana (no sentido da teoria da condição), quando a mesma cria para o objeto protegido uma situação de perigo juridicamente proibida e o perigo materializa-se no resultado típico”. A imputação objetiva traz para o delito culposo mais um elemento: a evitabilidade. Não basta a conduta, resultado, nexo, previsibilidade e inobservância do dever de cuidado. Se presentes todos esses elementos, mas percebe-se que o resultado ocorreria de qualquer maneira, pela teoria da imputação objetiva, o agente não deve ser responsabilizado. Essa teoria gira em torno da ideia de uma situação de risco para o bem jurídico tutelado. Para que haja a imputação, o agente deve criar ou incrementar um risco proibido ao bem. Além disso, esse risco tem que ser realizado no momento do resultado, para que seja possível a imputação. Se o risco for permitido, ou ainda se o agente não criar um risco ou diminuir o risco, ele não deve responder pelo resultado. A imputação objetiva também faz com que o agente não responda nos casos de aplicação do princípio da confiança. Exemplo: o agente (médico) confia que sua instrumentadora vai agir corretamente e ela não age. Ele não deve, em regra, responder pelo resultado causado por ela durante a cirurgia. ANTIJURIDICIDADE OU ILICITUDE LEGÍTIMA DEFESA Agressão: O primeiro requisito para o reconhecimento da legítima defesa é a existência de uma agressão injusta atual ou eminente. Primeiro é preciso que nós estendamos o alcance da palavra agressão. O que é a agressão que dá ensejo à legítima defesa? Ela tanto pode advir de uma ação como de uma omissão. Um exemplo de uma legítima defesa advinda de uma conduta omissiva é aquele em que um carcereiro deixa de cumprir um alvará de soltura. É uma agressão injusta praticada com omissão. Essa agressão também pode surgir tanto da conduta dolosa como da conduta culposa. Uma agressão culposa é de exemplo mais difícil. Podemos tomar por exemplo o caso do motorista de ônibus que conduza o veículo em alta velocidade colocando em risco iminente a integridade física dos passageiros. É possível que eles reajam a essa agressão injusta e iminente, visando paralisar o veículo retirando as chaves ou a empregar os meios físicos para conter aquele motorista de forma a forçá-lo a conduzir em velocidade aceitável. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 16 Quando falamos em agressão surge a idéia de reação violenta, o que não é necessariamente verdade. Pode surgir a legítima defesa de reações não violentas como por exemplo um furto. Não há violência ou grave ameaça, mas autoriza a legítima defesa. A agressão como requisito para a legítima defesa surge tanto de atividades comissivas, tanto de atividades dolosas como de atividades culposas. Tanto de condutas violentas como de condutas não-violentas. Injusta: O segundo elemento necessário para a configuração da legítima defesa é que essa agressão se mostre injusta. Isso será essencial para o estudo da legítima defesa putativa que veremos logo adiante. A noção de injustiça está ligada à noção de ilicitude. Quando dizemos que a agressão é injusta queremos dizer que ela é uma agressão não amparada na lei. Toda vez que alguém cometer uma agressão não amparada pela lei, estará autorizada a legítima defesa. Se o agente realiza uma agressão autorizada pela lei, aquele que é ofendido não pode reagir em legítima defesa, pois ela exige que a agressão seja injusta, isto é, que não seja amparada na lei. Eu vou saber se uma agressão é justa ou injusta avaliando se ela está amparada ou não no ordenamento. É possível que a lesão corporal eventualmente causada a um cidadão louco seja acobertada pela exclusão da ilicitude pela legítima defesa? Quando nessas etapas de indagação do crime vai se aferir a questão da sanidade mental do agente? Na culpabilidade, a imputabilidade é seu primeiro elemento. Se eu digo que a injustiça da agressão é aferível segundo a licitude ou ilicitude daquela conduta, eu tenho que forçosamente concluir que os inimputáveis praticam agressão injusta, só não serão culpáveis. Assim, é perfeitamente possível a reação contra agressão de inimputáveis (sejam loucos, menores, sejam aqueles que atuam em erro de proibição que também é uma causa de exclusão de culpabilidade, sejam os que atuam em coação moral irresistível). Enfim, nenhuma daquelas situações de exclusão de culpabilidade impede a reação em legítima defesa, porque a despeito de inculpáveis, essas pessoas praticam conduta ilícita. Isso porque a antijuridicidade segundo a ótica formal é aferível em uma relação de contradição entre o que o agente fez e o ordenamento, sem considerações acerca de sua capacidade individual. A capacidade individual do agente só vai ser indagada em sede de discussão sobre imputabilidade. Atual ou Iminente: A agressão além de injusta deve ser atual ou iminente. Atual é aquela agressão que já está acontecendo e iminente é aquela que está para acontecer. A reação em legítima defesa deve sempre ter o caráter de cessar a agressão, seja a que já começou ou aquela que está para começar. Quando tratarmos de uma reação a um fato futuro ou pretérito, não poderemos falar em legítima defesa. Aquela pessoa que reage contra um inimigo que prometeu no futuro matá- la não está agindo em legítima defesa pois não é atual nem iminente a agressão. Da mesma APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 17 maneira não age em legítima defesa quem reage a uma agressão já cessada. Quem apanha em um bar, vai até em casa para pegar uma arma e voltar no local em que estava para atirar em quem o agrediu não está agindo em legítima defesa. Que se volte contra direito do próprio ofendido ou de terceiro: O segundo requisito à legítima defesa é que essa agressão injusta, atual ou iminente, se volte contra direito do próprio ofendido ou de terceiro. Isso dá ensejo à distinção entre legítima defesa própria e legítima defesa de terceiro. O terceiro requisito é o uso moderado dos meios necessáriosNesse requisito entram dois aspectos: necessidade e moderação. O que é um meio necessário que autoriza a legítima defesa? Genericamente é aquele meio disponível para a defesa. Qual o meio disponível para a defesa? Seriam aqueles que eu tivesse a minha disposição naquele momento para exercitar minha defesa. Segundo o professor Rogério Greco, mesmo que a arma seja o único meio disponível portanto necessário, ela não poderá ser usada se esse uso representar uma grave desproporção com a agressão. Digamos que um fazendeiro paraplégico está no meio de suas matas quando um invasor está colhendo os frutos de uma de suas árvores. Nesse caso, Greco afirma que mesmo que a arma fosse o único meio de defesa que ele tem, a arma representa uma grande desproporção. Capez discorda desse entendimento dizendo que se o conceito de meio necessário é o suficiente ou disponível para a defesa, não se pode restringir o uso da arma quando ela seja o único meio disponível. O que vai importar nesse caso é saber se houve moderação ou não. E quando houvesse vários meios disponíveis? Como um dos elementos que caracteriza a legítima defesa é a moderação, se existirem vários meios disponíveis, ele deve empregar o menos lesivo entre aqueles que se mostrem eficazes à defesa. Não se espera que ele utilize um meio inócuo. Além de ser necessário, é preciso que o uso desse meio seja moderado. Como nós medimos a moderação no uso dos meios? Ela é medida com a comprovação de que o agente fez tudo o que podia para se defender e só isso. Enquanto restar evidente que há uma possibilidade de agressão, a vítima deve poder reagir e portanto estará em legítima defesa. Quando as evidências do caso concreto demonstrarem que cessou a agressão e portanto não há mais uma agressão injusta contra ele, qualquer exercício de atividade “defensiva” extrapolará a legítima defesa e permitirá a punição do agente. Uso moderado, portanto, significa usar daqueles meios necessários até a cessação daquela agressão injusta, a partir dali se ele continuar agindo responderá pelo excesso. Finalmente o último requisito necessário para a legítima defesa é o ânimo de defesa. Para que a pessoa seja beneficiada por uma causa de exclusão de ilicitude, é preciso que ela demonstre que além dos requisitos objetivos (que em nosso direito são os do artigo 25), ele estivesse atuando com a intenção de defesa. O ânimo de defesa é o último requisito da legítima defesa. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 18 Existe uma discussão sobre a admissibilidade do concurso de motivos. O que é concurso de motivos? Há hipóteses em que o agente além do ânimo defensivo tem também um motivo concorrente. É o caso do agente que se defendendo de uma agressão injusta, aproveita-se da ocasião para se vingar daquela pessoa que a está agredindo. Nesse caso a concorrência desse outro motivo, que não o de defesa, afasta a legítima defesa? Havendo moderação na reação, ou seja, se o agente observar os requisitos do artigo 25, ele deve ter a legítima defesa reconhecida, ainda que concorra com o ânimo defensivo um motivo torpe. É claro que se ele se exceder, mesmo que não haja motivo concorrente, vai responder pelo excesso. A concorrência de motivo diferente do ânimo defensivo, não impede o reconhecimento da legítima defesa. O excesso afasta a legítima defesa. ESPÉCIES DE LEGÍTIMA DEFESA Legítima Defesa REAL – É aquela em que concorrem todos os requisitos de ordem objetiva e subjetiva. Legítima Defesa PUTATIVA – Assim como o delito putativo é o delito falso, a legítima defesa é aquela que só existe na cabeça da vítima. Ela acha que está se defendendo de uma agressão e não está. O problema aqui é saber qual o tratamento a ser dado à legítima defesa, pois se digo que ela é uma situação em que o agente acha que está se defendendo e não está, estou me referindo a uma situação de erro. Portanto a legítima defesa putatitva é uma situação de erro. Esse erro é de proibição ou de tipo? Importa responder a essa pergunta porque o tratamento que a lei dá para eles é diferente. O erro de tipo está no artigo 20 do CP. No erro de tipo o agente vê mal a realidade. Toda vez que estivermos diante de uma situação em que concluirmos que o agente errou ao ler mal a realidade, estaremos diante de um caso de erro de tipo. Qual o efeito do reconhecimento do erro de tipo? Ele vai sempre excluir o dolo (é uma das poucas regras que não comporta exceção), porque a própria noção de erro é uma noção incompatível com a noção de dolo. O que é o dolo? É a atuação com consciência e vontade. O que é o erro? É a falsa leitura da realidade. Quem atua com dolo não pode estar em erro e quem atua em erro não pode estar atuando com dolo. Assim, toda vez que tivermos uma situação com erro de tipo, esse erro excluirá o dolo. Se esse erro se mostrar vencível, superável (você incidiu em erro, mas se você tivesse prestado um pouco mais de atenção não teria incorrido nesse erro), a punição do agente será na modalidade culposa (se houver, pois sabemos que o delito culposo é excepcional). O outro tipo de erro essencial é o erro de proibição. Nele ao contrário do que ocorre com o erro de tipo, não há uma falsa leitura da realidade, ele sabe o que está acontecendo, ele lê a realidade corretamente. O problema do agente no erro de proibição está no juízo que APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 19 ele faz sobre o que é permitido ou proibido. Então a consequência do erro de proibição não é afetar o dolo. O dolo no erro de proibição fica intacto porque o agente tem consciência e vontade acerca dos fatos O problema no erro de proibição é a consciência sobre a ilicitude. Esse é o motivo pelo qual o erro de proibição é tratado na culpabilidade. O segundo elemento da culpabilidade é a potencial consciência da ilicitude. Se eu digo que no erro de proibição o agente se equivoca com relação ao que é permitido e o que é proibido, o erro dele versa sobre a ilicitude do fato. O erro de proibição que está lá no artigo 21 do CP, vai ter seus efeitos em sede de culpabilidade. Quais serão os efeitos de se reconhecer um erro de proibição? Se esse erro era invencível, isso é, se eu digo que você errou mas qualquer um na sua situação também erraria, esse erro é invencível e em função disso exclui-se a potencial consciência da ilicitude. Como a potencial consciência da ilicitude é um elemento da culpabilidade exclui-se também a culpabilidade. Sem a culpabilidade não há crime. Quando esse erro de proibição se mostrar um erro vencível (você errou em relação ao que era permitido ou proibido, mas você devia ter tomado um pouco mais de cuidado), não se exclui a culpabilidade, apenas atenua-se a pena. ERRO DE TIPO ------------------------------------------EXCLUI O DOLO ERRO DE PROIBIÇÃO (invencível) -------------------- EXCLUI A CULPABILIDADE ERRO DE PROIBIÇÃO (vencível) -----------------------ATENUA A PENA Quem atua em erro de proibição atua dolosamente, ou seja, com consciência e vontade. O problema está na leitura do que é lícito ou ilícito. Exemplo: Uma vizinha chega para mim e diz que está fazendo uma obra em casa e pergunta se eu me importo em guardar uma caixa aonde ela guardava suas joias e eu aceito por confiar nela e por considera-la minha amiga. No dia seguinte sou surpreendido quando policiais tocam a campainha com um mandado de busca e apreensão atrás da caixa. Ao abri-la (ela estava fechada como me havia sido entregue), encontram drogas pesadíssimas guardadas. Eu explico que eu não sabia que o material que eu guardava em casa era material entorpecente. Eu não sabia estar praticando o artigo 12 da Lei 6368. Esse erro é de tipo ou de proibição? Esse erro é de tipo. Eu tinha feito uma leitura incorreta da realidade. Eu imaginava que guardava joias, mas na realidade guardava material entorpecente. Definir se o erro é evitável ou inevitável vai depender da análise do caso concreto. Situação diversa é a do holandês que vem passar férias no Brasil e reserva um quarto em um hotel em Copacabana. Maravilhado com as belezas da cidade, assim que chega veste-se e vai para o calçadão da praia e lá chegando, senta-se confortavelmente em uma APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 20 cadeira e acende um cigarro de maconha. Passa uma patrulha que enxerga e o prende imediatamente. Ao ser preso o holandês explica que não sabia que era proibido fumar maconha no Brasil, pois em seu país era permitido. Esse erro é de tipo ou de proibição? É um erro de proibição porque a leitura que ele fez da realidade não está equivocada. Ele sabia onde estava, ele sabia o que carregava, ele sabia que aquilo era entorpecente e ele fumou porque quis. A leitura equivocada dele deu-se com relação à licitude de seu ato. Se era evitável ou não, vai depender da análise do caso concreto. Nosso CP adotou a teoria limitada da culpabilidade Essa teoria faz uma distinção entre as modalidades de erro. Quando agente erra seja com relação à realidade, acreditando que há uma situação fática que não existe, esse erro dele será um erro de tipo. Ora se o erro de um agente acerca dos elementos de um tipo permissivo é erro de tipo, significa dizer que aquele que atua em descriminante putativa poderá incorrer no chamado erro de tipo. Existe entretanto uma outra hipótese em que o erro será de proibição. Segundo essa teoria quando ele será de proibição? Erro de proibição indireto - Quando o agente atua amparado por uma causa de permissão inexistente. É o caso por exemplo daquele sapateiro que coloca uma placa em sua loja dizendo que a mercadoria que não for resgatada em trinta dias será vendida para cobrir os custos. Aquele sapateiro acha que pode fazer isso, mas não pode. Não existe nenhuma autorização legal para isso. Se ele efetivamente vender o sapato que alguém deixou lá para consertar, ele pode estar praticando um delito. Ele estará em erro de proibição. Ele acredita estar amparado por uma causa de justificação que não existe. Ele pode, por exemplo, achar que está amparado pelo exercício regular do direito. Outra hipótese de erro de proibição indireto é aquela em que o agente excede os limites de uma verdadeira causa de exclusão. Alguém por exemplo está efetivamente em legítima defesa, porém, por analisar mal os requisitos, acredita que pode agir para além do necessário para sua defesa. Ele acha que a partir do momento em que se viu agredido pode reagir e que essa reação não precisará parar no momento em que a agressão que sofria for interrompida. Desvios causais: “A” reage a uma injusta agressão de “B” e acaba atingindo “C”. Estando caracterizada a legítima defesa de A com relação à B, esse desvio no curso causal, indo atingir C, vai implicar na punição de A? Não, porque ao lado dos erros essenciais existem quatro modalidades de erro acidental. São chamados erros acidentais, pois irrelevantes. Não trazem relevância à punição do agente. O primeiro é o erro sobre o objeto: Esse é aquele que incide no objeto material do delito. A coisa ou pessoa sobre a qual recai a ação delituosa. No crime de furto o objeto material é a res furtiva. Querendo furtar APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 21 uma bolsa, me equivoco e furto uma bolsa parecida. Esse erro é irrelevante, pois o art. 155 diz “furtar coisa alheia”, qualquer que seja essa coisa alheia, não importando a que o agente efetivamente desejava furtar. A segunda modalidade é o erro sobre a pessoa: Nessa modalidade o equívoco do agente não está sobre o objeto material, mas na pessoa que o agente deseja atingir. Há um erro sobre a identificação da vítima. O agente acredita estar diante da vítima pretendida, quando na verdade está diante de uma outra pessoa. Esse erro também é irrelevante, já que o CP, por exemplo, no crime de homicídio: “matar alguém”, matar qualquer pessoa, não importa quem, por tal motivo esse erro é também irrelevante. A terceira modalidade é o chamado erro na execução: arts. 73 e 74 do CP. O erro na execução é um erro que também atinge a vítima, mas tem uma diferença. No erro sobre a pessoa, o agente confunde as pessoas, enquanto que no erro de execução há um desvio no curso causal, a vítima pretendida também está na cena delituosa, mas o agente erra na execução. Não há equívoco quanto à identidade da vítima. Os arts. 73 e 74, c/c o art. 20, § 3º, pregam a irrelevância desse erro. Nessas hipóteses considera-se a conduta que o agente desejava praticar e não a que foi praticada. No exemplo que foi dado, mesmo que A atinja C, se estava acobertado por legítima defesa, ainda assim deve ser reconhecida esta, sendo, portanto, excluída a ilicitude de sua conduta. O resultado diverso do pretendido é a quarta modalidade de erro acidental. A diferença do erro na execução para o resultado diverso do pretendido é que no primeiro ocorre um desvio no golpe. Desvio no curso causal. Exatamente o que o ocorre no segundo, mas nesse se acaba por praticar crime diferente do pretendido. No resultado diverso do pretendido há um desvio no golpe, que acaba resultando um desvio no crime. “A” pretendendo atingir uma pessoa acaba por atingir um objeto, ou vice-versa. Nessa hipótese se o agente estiver sobre o amparo da legítima defesa, ao atingir um objeto, da mesma forma deverá ser reconhecida a excludente da ilicitude. ESTADO DE NECESSIDADE O estado de necessidade reside em uma colisão de dois interesses legítimos. Poder-se-ia dizer que no estado de necessidade não há ninguém errado. Todos os personagens agem licitamente. O problema é que uma causa humana ou proveniente da natureza pode desencadear um fator de perigo. Em razão dessa situação de perigo e reconhecendo o Estado que não pode estar presente em todos os momentos e lugares, permite-se que todos os interesses em jogo se confrontem para que saia um deles vencedor. No estado de necessidade, em regra, nenhum dos personagens envolvidos na luta pela defesa do seu interesse provocou o perigo. De qualquer maneira, ainda que algum dos APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 22 personagens seja o causador da situação de perigo, terá o direito de defender o seu interesse. São requisitos para o estado de necessidade: A existência de um perigo atual: É importante se determinar a noção de perigo. Na legítima defesa, o legislador fala em “agressão injusta”, no estado de necessidade o legislador fala em “perigo atual”. O perigo é um estado antecedente ao de dano. Quando o legislador diz que surge o estado de necessidade em qualquer situação de perigo, ele não está exigindo que o agente já se encontre em situação de dano ou lesão a seu interesse. Pode-se dizer que o perigo é a iminência de dano. Presente este dano iminente o agente pode invocar o estado de necessidade. O perigo deverá ser atual. Na legítima defesa o legislador usou as expressões “atual ou iminente”. No estado de necessidade o legislador só usa a expressão “atual”. Na verdade o legislador trocou a expressão, que na legítima defesa é agressão, pela expressão “perigo”. Portanto, perigo é ameaça de dano. 2 - não provocação voluntária do perigo: Quanto a esse requisito existe discussão na doutrina sobre o que significa a expressão “voluntariamente”. Para a maioria da doutrina essa expressão do art. 24 significa dolo. Portanto, substituindo-se a expressão voluntariamente por dolosamente, chegar-se-ia a conclusão de que aquele que provocou dolosamente o perigo, não poderia se valer do estado de necessidade. 3 - inevitabilidade do comportamento lesivo: O estado de necessidade decorre de um confronto de dois ou mais bens jurídicos, estando todos tutelados pelo ordenamento. Um dos requisitos para se caracterizar o instituto é a necessidade de que quem o alega, somente o faça se não tiver outro meio de afastar o perigo. Esse requisito difere da legítima defesa. Na legítima defesa, ao contrário, não se têm dois interesses legítimos, em que um terá que ser destruído para que se preserve o outro, mas um legítimo e o outro não. Em razão dessa distinção, o legislador não exigiu do agente que ele pudesse de outra forma enfrentar o perigo, ou seja, presente a agressão injusta, a vítima poderá sempre reagir, ainda que ela pudesse fugir do local. No estado de necessidade isto não ocorre. Se a fuga é um meio para que se evite a causa do dano, o agente deve se afastar do local. No estado de necessidade há um maior rigor do legislador, pois todos os bens envolvidos são tutelados pelo ordenamento. Se todos são tutelados, só deve se chegar a uma situação de estado de necessidade quando não haja outro meio de se salvar o bem jurídico. Esse requisito faz surgir a hipótese de estado de necessidade recíproco, o que não é possível na legítima defesa. 4 - inexigibilidade de sacrifício do interesse ameaçado: APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 23 Esse requisito pode ser resumido na proporcionalidade na ação. É necessário que ao agir o agente sopese, avalie os interesses em jogo, ou seja, para que se salve um objeto patrimonial, não se pode sacrificar a integridade física ou a vida humana. Aqui, como na legítima defesa, é preciso que se faça uma avaliação dos bens em perigo, para que se saiba que o bem preservado seja, no mínimo, de igual valor ao bem sacrificado. 5- é idêntico ao da legítima defesa, no que diz respeito à titularidade do direito a ser preservado: Também nesse instituto pode-se alegar estado de necessidade na defesa de interesse de direito próprio ou de outrem. Alguns autores entendem prudente que nos casos de bens disponíveis, o agente só atue mediante expressa anuência do titular do direito, que pode eventualmente preferir suportar o dano.Outros autores, por exemplo, como Fernando Capez acham que não há a necessidade de se aguardar o consentimento do titular do bem dos bens disponíveis, pois sempre há uma presunção de interesse do titular na preservação de seus bens, portanto, qualquer um poderia agir na defesa desse interesse alheio e disponível. 6 - finalidade de salvamento: A finalidade de salvamento decorre da estrutura da teoria do delito. Como as causas de justificação estão impregnadas pelo aspecto subjetivo, também nelas é preciso que se comprove a finalidade valorosa. Se o que importa para que se puna alguém, é que a conduta se mostre desvalorada, também para se isentar a conduta deverá ser valorosa. Esse requisito revela a necessidade de se indagar se o agente, além de preencher os requisitos de ordem objetiva, também tinha a finalidade de salvamento, ou seja, pretendia agir em Estado de necessidade. Há um exemplo do cachorro que late a noite toda, e o vizinho atira para matá-lo, descobrindo-se que por coincidência o animal estava para morder uma criança. Nessa situação não se pode afirmar ou reconhecer o estado de necessidade, pois a despeito de cumprir os requisitos de ordem objetiva, a finalidade do agente não era de salvamento, portanto, recusa-se a doutrina a reconhecer o estado de necessidade nessas situações. 7- ausência de um dever de enfrentar o perigo: Só pode alegar o estado de necessidade a pessoa cuja função não tinha, dentre as suas atribuições, a obrigação de enfrentar situações de perigo. O art. 24, §1º dispõe que essas pessoas não podem alegar em seu benefício o estado de necessidade, devendo enfrentar o perigo. Em regra, o bombeiro ou policial não podem, a pretexto do perigo inerente àquela atividade, recusar-se. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 24 ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL O estrito cumprimento do dever legal decorre de uma noção de harmonia no ordenamento. Nenhuma norma deve conflitar com outra. As normas vigentes em um ordenamento devem ser compatíveis. Não se pode admitir que em um mesmo ordenamento haja uma norma que determine a atuação de um agente público para cumprir um dever legal, e outra que considere essa atuação uma prática criminosa. A primeira exigência é que seja um agente público ou particular em exercício de função pública. A segunda exigência é que o dever seja emanado de lei ou norma de amplitude geral. Não pode se escorar nesse instituto, uma pessoa que diz estar agindo por determinação a uma norma de natureza privada. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO O exercício regular de direito parte do mesmo pressuposto de harmonia no ordenamento jurídico. Não se pode admitir que no mesmo ordenamento, de um lado se permita o exercício de um direito e de outro se puna o exercício, pois viola uma norma penal. Aquele que exercita regularmente um direito, não pode ser punido por esse exercício. No exercício regular do direito se tem uma aplicação mais ampla que o estrito cumprimento do dever legal. Nesse, a norma deve ter caráter genérico, só podendo alcançar os agentes públicos ou particulares em função pública. No exercício regular do direito não há essa restrição, portanto, pode alegar exercício regular de direito não só aquele que exercita um dever outorgado por lei, como pode também alegar o exercício regular de direito aquele que o faz em decorrência de uma convenção particular. É o caso das lesões provenientes de competições desportivas ou intervenções médicas e cirúrgicas. Algumas observações devem ser feitas. É preciso que o exercício seja regular. Se o agente extrapola o que a norma autoriza, irá responder pelo excesso. Outra questão diz respeito às condutas culposas, não é somente aquele que extrapola dolosamente a norma que será punido, mas também o que extrapola culposamente... Ofendículas Ofendículas são aparatos predispostos para a defesa em regra do patrimônio (elas podem ser usadas para a defesa de qualquer direito). Quais são os eventos desses chamados ofendículos? São os cacos de vidro, as pontas de lança no alto de muro, as grades, enfim tudo aquilo que de alguma maneira se preste à defesa do patrimônio e que possa como o próprio nome diz ofender aquele que pretenda causar uma lesão a esse direito. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 25 O complicador no que tange as ofendículas é a definição de sua natureza jurídica. Tem duas correntes doutrinárias. Alguns autores entendem que as ofendículas são uma hipótese de exercício regular de direito, ou seja, aquele que predispõe defesa mecânica ou física para a tutela de seus interesses está no exercício regular no direito, por exemplo, de defesa de sua propriedade. Para outros autores, isso é legítima defesa. Essas hipóteses de ofendículas são hipóteses de legítima defesa pois eles só atuam na ocorrência de agressão. O caco de vidro ou a ponta de lança no alto do muro só vai ofender aquele que pretenda lesionar seu direito. Não há entre essas duas correntes uma que se possa dizer que seja majoritária. A doutrina está dividida com relação à natureza jurídica das ofendículas. Só há uma convergência nesse assunto que diz respeito aos chamados aparatos predispostos. Qual a diferença entre os aparatos predispostos e os outras ofendículas? A doutrina cita o exemplo dos aparatos mecânicos ou elétricos que atuam na ocorrência ou na iminência de uma agressão (cerca eletrificada, portas com maçaneta eletrificada, etc.). Nesses casos, em que os aparatos são ocultos e só atuam no caso de uma efetiva agressão, a doutrina é unânime ao afirmar que a hipótese é de legítima defesa pré-ordenada. É claro que nessas hipóteses há que sempre ressalvar a ocorrência de excesso. O agente que predispõe esse tipo de aparato e dá ensejo à ocorrência de um resultado contra alguém que não estava pretendendo lesionar o seu direito, vai responder pelo crime. Irá responder pelo crime aquela pessoa que eletrifique um muro ao redor de sua propriedade, apesar desse muro dar acesso à parte externa (calçada), na ocorrência de um incidente como o de uma velhinha que tropeça e cai em cima do muro vindo a morrer eletrificada. O agente vai responder pelo resultado que ele causar, a título de dolo ou culpa, conforme as circunstâncias. De qualquer forma, tendo esse resultado atingido o inicial agressor, ocorrerá a legítima defesa pré-ordenada. Qualquer tipo de aparato de defesa que atinja terceiro inocente, quem o colocou ali irá responder. Um exemplo dessa hipótese é aquele em que uma pessoa coloca um arame farpado ao redor da piscina de sua casa o que acaba por provocar ferimentos em crianças que tentavam entrar para nadar (não há agressão injusta das crianças). Ele responderá pelo menos a título culposo pela lesão que ele causar às crianças. As ofendículas só vão isentar seja como exercício regular de direito seja como legítima defesa quando se voltem contra o agressor injusto. CULPABILIDADE Primeiramente, cabe diferenciar os momentos em que se afere a culpabilidade no direito penal. Podemos falar do princípio da culpabilidade, pelo qual ninguém responde por um crime sem ter agido com dolo ou culpa, que pela teoria finalista estão presentes na conduta, sem os quais, ocorre a atipicidade. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 26 Pode-se falar ainda da culpabilidade como circunstância judicial a ser avaliada na primeira fase de determinação da pena, permitindo a consideração de diferentes graus de reprovação, que deverão ser utilizados pelo juiz para fixação da pena-base. Por fim, e em seu aspecto mais amplo, considera-se a culpabilidade como fundamento da pena e elemento integrante e essencial do crime. A doutrina majoritária e esmagadora considera a culpabilidade como elemento do conceito analítico de crime, embora ainda haja posições em sentido contrario, principalmente por parte de Damásio de Jesus. Considerando a culpabilidade como elemento do conceito de crime, aquele que adquire produto de crime praticado em concurso com um inimputável, responde por receptação? Esse é um dos principais argumentos da corrente que não adota a culpabilidade como elemento do crime, mencionando que nesse caso o agente não responderia pela receptação. No entanto, adotando-se a teoria da acessoriedade limitada, para que haja a participação, basta que o fato seja caracterizado como um injusto penal, ou seja, um fato típico e ilícito, para que o partícipe seja chamado a responder. 1 – elementos da culpabilidade - imputabilidade - potencial consciência da ilicitude - exigibilidade de conduta conforme o direito DA INIMPUTABILIDADE artigo 228, CF artigo 27 do CP As normas acima dispõem acerca da inimputabilidade do menor de 18 anos, fixada por caráter puramente biológico, estabelecendo que a eles se aplica a legislação especial. Tal lei a ser aplicada é o estatuto da Criança e do Adolescente – lei 8069/90. A prova da menoridade, a princípio, se dá por documento hábil. Na dúvida, pode ser solicitado exame médico ósseo, para comprovação da idade do agente. O ECA, em seu artigo 2o, define que criança é o ser humano com até 12 anos incompletos. Adolescente é aquele a partir dos 12 anos completos até os dezoito anos incompletos. Criança e adolescente não praticam crime, mas ato análogo a crime, denominado de ato infracional. As consequências desse ato são diversas, conforme se trate de criança ou adolescente. À criança que pratica ato infracional, se imporá medida protetiva (artigo 101 APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 27 do ECA). Ao adolescente que pratique ato infracional, se imporá medida sócio educativa (art. 112 do ECA). Ressalte-se que o ECA, em seu artigo 104, parágrafo único, adota a teoria da atividade, igual à adotada pelo art. 4o. do CP. Considera-se praticado o crime no momento da ação ou da omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. Dessa forma, se o agente pratica o fato típico, quando tem 17 anos e 11 meses, mas o resultado só ocorre quando ele já tem 18 anos completos, a ele não se aplicará as disposições do CP, pois na época da prática do ato ele era considerado inimputável. A doença mental, consoante o artigo 26, caput do CP, é causa de exclusão da imputabilidade, assim como o desenvolvimento mental incompleto ou retardado, sempre que em virtude dessas situações, o agente for inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Não se deve confundir o caput do artigo 26 com o seu parágrafo primeiro. O caput trata de inimputabilidade, ao passo que o parágrafo primeiro trata da semi-imputabilidade. No primeiro caso, o agente fica isento de pena. Ele é absolvido e a ele é aplicada uma medida de segurança. No segundo caso, o agente é condenado, mas pela semi-imputabilidade, a pena é reduzida. Diz o artigo 28 que a emoção e paixão não excluem a imputabilidade penal. Quis o CP possibilitar a punição dos chamados crimes passionais. Embora não sejam causas de inimputabilidade, o CP não deixou de os valorar. A violenta emoção é prevista como circunstancia atenuante (art. 65, III, c, CP) quando o agente comete o fato sob a influencia de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima. O artigo 28, II, CP, dispõe que não excluem a imputabilidade a embriaguez voluntária ou culposa, pelo álcool ou substancia de efeitos análogos. Primeiramente, para conseguirmos visualizar se a embriaguez pode ou não excluir a imputabilidade, faz-se necessário analisarmos todas as hipóteses de embriaguez: Embriaguez voluntária – é aquela em que o agente quer beber com a finalidade de se embriagar Embriaguez culposa – o agente bebe voluntariamente, mas ele não tem a intenção de se embriagar, embora inobserve o seu dever de cuidado e acabe se embriagando. Ele bebe voluntariamente e fica bêbado culposamente. Embriaguez preordenada – o agente bebe para ficar embriagado, para cometer o crime. Embriaguez patológica – é causada por doença. O agente está bem, até que ingere certa quantidade (pequena) de álcool ou substancia de efeitos análogos. Não está embriagado, mas age como se estivesse. O exame médico legal dá negativo. Embriaguez proveniente de caso fortuito – caso fortuito é o evento atribuído ao acaso. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 28 Embriaguez proveniente de força maior – força maior é a que provêm do homem. É utilizado certo constrangimento em face do agente para que ele fique embriagado. Agora que já vimos cada caso de embriaguez, analisemos suas conseqüências: Embriaguez voluntária e culposa – artigo 28, II – não isentam o réu de pena Embriaguez preordenada – é circunstancia agravante – art. 65, II, l, CP Embriaguez proveniente de caso fortuito ou forca maior – se for completa e ao tempo da ação, o agente era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, ficará isento de pena – art. 28, parágrafo 1o. Se o agente não possuía a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, a pena será reduzida de um a dois terços. Quanto à coação irresistível, prevista no artigo 22 do CP, ela pode ser física ou moral. A primeira é chamada de vis absoluta, ao passo que a segunda é chamada de vis compulsiva. A coação física irresistível exclui a vontade, tornando o fato atípico. Vimos que o dolo é a vontade livre e consciente. Se há uma coação física irresistível, não se pode falar em vontade livre e consciente. Já a coação moral irresistível exclui a culpabilidade, pela falta de um de seus elementos, qual seja, a exigibilidade de conduta conforme o direito (chamada de exigibilidade de conduta diversa, por alguns). Nesse caso, a vontade do agente é viciada, sendo punível apenas o autor da coação. Trata-se de autoria mediata. Em caso de obediência hierárquica de ordem não manifestamente ilegal, só é punível o autor da ordem. Já se a ordem for manifestamente ilegal, também é punível o inferior hierárquico. O subordinado só será punido se percebe que a ordem constitui um ato ilícito, diante das circunstâncias por ele conhecidas. Se presentes indícios suficientes para que ele perceba a ilicitude e ainda assim, ele não percebe, também será responsabilizado. Cumprindo ordem manifestamente ilegal, o subordinado responde em co-autoria com o superior hierárquico. CONCURSO DE CRIMES (dentro do tema Penas) 1 - Concurso Material – art. 69 Quando o agente mediante mais de uma ação ou omissão (pluralidade de condutas) pratica dois ou mais crimes (pluralidade de crimes). Os crimes podem ser idênticos ou não. Adota o sistema do cúmulo material. O que seria pluralidade de condutas? Como diferenciar pluralidade de condutas da pluralidade de atos? APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 29 Conduta é comportamento humano voluntário voltado a uma finalidade – conceito finalista. Quando um agente dá cinco pauladas em uma pessoas ela pratica uma conduta dividida em cinco atos. 2 - Concurso Formal – art. 70 Distingue-se do material porque aqui há uma única conduta e com ela o agente pratica vários crimes idênticos ou não. Será homogêneo se os crimes forem idênticos ou heterogêneo se diferentes. O formal próprio adota o sistema da exasperação – art. 70, 1 parte. O legislador aqui foi mais brando porque a vontade do agente não foi a de realizar vários resultados. O que justifica o tratamento mais brando do que no concurso material é a unidade de desígnio, ou seja, de querer realizar um só resultado e não vários. O abrandamento não ocorre em razão do agente atuar com apenas uma conduta enquanto que no material ele realiza várias. Regra: os dois crimes tem que ocorrer a título de culpa. ex.: no trânsito atropela e mata duas pessoas. Também quando o primeiro crime decorre de dolo e o segundo de culpa, como ocorre na aberratio ictus ou aberratio criminis com duplo resultado. Se o agente tiver desígnios (vontade/desejo/ fim almejado/ objetivo) autônomos, ou seja, atuar com dolo em cada um dos crimes querendo praticar vários resultados, o concurso será o impróprio/imperfeito e o sistema a ser adotado será o do cúmulo material – art. 70, 2 parte. A regra então é que será impróprio quando os crimes são todos dolosos. Pergunta-se: esse segundo crime também abrange o dolo eventual? Doutrina: para Capez e Patrícia Glioche será impróprio se houver dolo, seja ele direto ou eventual; para Fragoso só será impróprio se houver dolo direto em todos os crimes. Por que que em um assalto dentro do ônibus o agente responde em concurso formal próprio? Para a doutrina, se o agente assalta várias pessoas ele tem dolo em assaltar cada uma delas, e portanto o concurso deveria ser impróprio com cúmulo material, o que é bastante grave. Tecnicamente esse é o entendimento correto. Ocorre que por questões de política criminal a juris utiliza-se de um jogo de palavras para aplicar o sistema da exasperação, afirmando que o dolo do agente é de assaltar o ônibus e não de assaltar várias pessoas, portanto, não haveria desígnio autônomo. Entende-se que há única conduta com vários atos – isso quando o agente anuncia o assalto para todos. Se o agente senta ao lado de um passageiro e rouba-o, depois senta do lado de outro e assim vai indo, pratica crime continuado e não concurso formal. Em um edifício entende-se que ao entrar em cada uma das unidades o agente pratica uma conduta. Portanto ele pratica crime continuado. 3 – Multa Art. 72: as penas de multa nos concursos não sofrem a exasperação, ou seja, são aplicadas distinta e integralmente. Aplicação do sistema do cúmulo material mesmo nos crimes formais próprios. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 30 4 - Crime continuado – art. 71 CP Requisitos: i) Mais de uma ação ou omissão ii) Pratica dois ou mais crimes da mesma espécie: o que são crimes da mesma espécie? Majoritário: são crimes que protegem o mesmo bem jurídico, a vida, o patrimônio etc. No STF são da mesma espécie aqueles previstos no mesmo tipo. iii) Mesmas condições de tempo: a doutrina e juris estabelecem como parâmetro 30 dias. iv) Mesmas condições de lugar: proximidade. Em Estados diferentes não haverá continuidade. Mas se dentro de um mesmo Estado, em Municípios diferentes poderá haver ou não. v) Modus Operandi: se o agente atua com parceiros diferentes nos crimes, o modus operandi já não é o mesmo. Parte da doutrina entende que o elemento subjetivo é desnecessário. Outra parte da doutrina exige o dolo total também chamado de programação inicial. Ainda que não haja a programação inicial, se o crime seguinte decorrer do primeiro haverá continuidade, também quando o agente se aproveita das circunstâncias do primeiro para efetuar o segundo, ex, o agente vai roubar um cofre e lá dentro há um bilhete dizendo que o resto do dinheiro está em outro Município e o agente vai lá furtá-lo. Desconsiderar esse elemento é incentivar o delinqüente habitual. A continuidade foi feita para beneficiar o delinqüente eventual devendo o habitual ser punido mais severamente e não o contrário. Art. 71, par. 1: permite ao juiz que triplique a pena se os crimes forem dolosos, contra vítimas diferentes e praticados com violência ou grave ameaça. Pode ser aplicado no roubo continuado por ex. DAS PENAS DOSIMETRIA DA PENA O art. 68 dispõe acerca do cálculo da pena, estabelecendo o critério trifásico para sua aplicação. A dosimetria da pena, ou seja, sua aplicação, deve ser feita de acordo com o critério traçado pelo art. 68 do CP. Primeiramente são consideradas as circunstâncias do art. 59, as denominadas circunstâncias judiciais. Posteriormente, as circunstâncias agravantes e atenuantes (circunstâncias legais genéricas – art. 61 a 66 do CP), e por último as causas de aumento e de diminuição. APOSTILA – OAB – Professora Cristiane Dupret www.cristianedupret.com.br 31 A pena base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59, em seguida serão consideradas atenuantes e agravantes (pena intermediária) e por último, as causas de aumento e diminuição. Expressamente, o código adotou o critério trifásico. O critério é trifásico. Passemos à análise de cada uma das fases da dosimetria da pena, a serem realizada pelo magistrado ao proferir uma sentença condenatória: 4.1. 1a fase – pena base Art. 59 – O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja