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PARADIGMAS RIVAIS O texto “paradigmas rivais”, de Ciro Flamarion Cardoso, é hoje, quinze anos depois de sua primeira publicação, praticamente um clássico da historiografia brasileira no que se refere à questão das crises da história nas últimas décadas do último século. Isto não porque tenha elaborado uma análise das crises historiográficas e dos rumos da historiografia, no contexto deste novo milênio, com a qual a maior parte dos historiadores poderia concordar. Exatamente por ter mostrado um ponto de vista muito particular, esse texto não nos revela uma tentativa de discutir a questão dos rumos historiográficos no mundo contemporâneo a partir de um confortável ponto de vista externo. Ao contrário, Ciro Flamarion situa-se dentro da própria crise que pretende analisar. Ele mesmo é um historiador que sempre se inseriu ou no interior do grande feixe de correntes do materialismo histórico, ou pelo menos em diálogo bastante íntimo com este modelo, se considerarmos que neste mesmo texto Cardoso parece preferir se autodefinir, de maneira mais abrangente, como pertencente ao paradigma moderno ou iluminista, ao invés de demarcar mais uma vez a sua identidade como pertencente ao campo mais específico do materialismo histórico (CARDOSO, 1998: 14). Ciro Flamarion Cardoso também foi sempre um adversário contumaz das perspectivas historiográficas propaladas por alguns dos autores (na verdade, bem distintos entre si) que ele mesmo situa entre os pós- modernistas historiográficos. Segundo a proposta de Ciro Flamarion Cardoso, seriam pós-modernos não apenas os historiadores que se declaram pós-modernos (ou que aceitam este rótulo), mas também certos setores da Micro-História (um campo histórico que examinaremos na sexta aula deste curso), o filósofo Michel Foucault e os demais historiadores de inspiração foucaultiana, os historiadores franceses ligados à Nouvelle Histoire, em especial os cultores da História Cultural, os historiadores de origens diversas que aproximam história e literatura e que colocam em xeque a possibilidade de se alcançar algum tipo de verdade histórica, ainda que parcial, e, por fim, até mesmo a Escola de Frankfurt – uma escola de historiadores que, eles mesmos, consideram-se ligados ao materialismo histórico. A dicotomia proposta por Ciro Flamarion Cardoso admite apenas duas posições em relação à questão da racionalidade e da cientificidade. Haveria a defesa da racionalidade e, no pólo oposto, um apregoar da irracionalidade. Isso, naturalmente, deixa de fora a possibilidade de que se considere que existem vários tipos de racionalidade, e não apenas uma. Por outro lado, sua análise unifica, de um lado e de outro dos termos da dicotomia apresentada, propostas que apresentam muitas diferenças entre si. O texto revela, de alguma maneira, as dificuldades de tentar classificar de maneira muita simplificada as componentes de uma realidade historiográfica que é bastante complexa.
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