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1 CURSO TÉCNICO EM SERVIÇOS JURÍDICOS INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Centro de Educação Tecnológica do Amazonas MANAUS - AMAZONAS 2 2015 SUMARIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 4 1 A INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO ............................................................... 6 1.1 A IMPORTÂNCIA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO .............................. 6 1.2 NATUREZA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO ....................................... 6 1.3 OUTRAS DISCIPLINAS QUE TRAZEM IDEIA GERAL DO DIREITO ......................... 7 1.4 FENÔMENO DA SOCIABILIDADE HUMANA .............................................................. 7 1.5 DIREITO COMO PROCESSO DE ADAPTAÇÃO ........................................................... 8 1.6 AS AÇÕES HUMANAS E O DIREITO ............................................................................ 9 1.7 FORMAS DE INTERAÇÃO SOCIAL E AÇÃO DO DIREITO ......................................... 9 2 A NOÇÃO DO DIREITO ................................................................................................... 11 2.1 O NASCIMENTO DO DIREITO ....................................................................................... 11 2.2 CONCEITO DE DIREITO ................................................................................................. 11 2.2.1 Considerações prévias ..................................................................................................... 11 2.2.2 Definições do direito ....................................................................................................... 12 2.3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO ..................................................................... 14 2.4 DIREITO E MORAL ......................................................................................................... 19 2.4.1 Considerações preliminares ............................................................................................. 19 2.4.2 Teoria do mínimo ético ................................................................................................... 20 2.4.3 Do cumprimento das regras sociais .................................................................................. 21 2.4.4 Direito e coação .............................................................................................................. 24 2.4.5 Teoria tridimensional do direito ....................................................................................... 25 2.4.5.1 A instituição de Dante .................................................................................................. 26 2.4.5.2 Estrutura tridimensional do direito ................................................................................ 27 3 NORMA JURÍDICA ........................................................................................................... 30 3.1 INTRODUÇÃO A NORMA JURÍDICA ............................................................................ 30 3.2 CONCEITO DE NORMA JURÍDICA ............................................................................... 30 3.3 CARACTERÍSTICAS DAS NORMAS JURÍDICAS ......................................................... 31 3.4 CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS .............................................................. 32 4 DIREITO NATURAL E DIREITO POSITIVO ................................................................ 33 4.1 DIREITO NATURAL ........................................................................................................ 33 4.1.1 Caracteres do direito natural ............................................................................................ 34 4.2 DIREITO POSITIVO ......................................................................................................... 34 4.2.1 Caracteres do direito positivo .......................................................................................... 35 3 4.2.2 A divisão do direito positivo: direito público e direito privado ......................................... 35 4.2.3 Os ramos do direito público e direito privado .................................................................. 36 4.3 Parâmetros de distinção entre direito natural e direito positivo............................................ 39 5 DIREITO OBJETIVO E DIREITO SUJETIVO............................................................... 40 5.1 DIREITO OBJETIVO ........................................................................................................ 40 5.1.1 As normas de conduta e direito objetivo .......................................................................... 41 5.1.2 Origem do direito objetivo............................................................................................... 42 5.2 DIREITO SUBJETIVO ...................................................................................................... 43 5.2.1 Classificação dos direitos subjetivos ................................................................................ 43 6 FONTES DO DIREITO ...................................................................................................... 46 6.1 FONTES MATERIAIS ...................................................................................................... 47 6.2 FONTES FORMAIS .......................................................................................................... 47 6.3 CONCEITO E FORMAÇÃO DA LEI................................................................................ 47 6.3.1 Iniciativa da lei ................................................................................................................ 48 6.3.2 Exame pelas comissões técnica, discussão e aprovação ................................................... 48 6.3.3 Revisão do projeto ........................................................................................................... 49 6.3.4 Sanção............................................................................................................................. 49 6.3.5 Promulgação ................................................................................................................... 49 6.3.6 Publicação ....................................................................................................................... 49 6.3.7 A hierarquia das leis ........................................................................................................ 49 6.3.8 Vigência das leis ............................................................................................................. 50 6.3.9 Integração da norma jurídica ........................................................................................... 50 6.4 COSTUMES ...................................................................................................................... 51 6.4.1 Costume – secundum legem, praeter legem e contra legem .............................................. 51 6.5 A LEI E O COSTUME – DISTINÇÕES BÁSICAS ........................................................... 52 6.6 DOUTRINA ...................................................................................................................... 56 6.7 JURISPRUDÊNCIA .......................................................................................................... 56 6.8 ANALOGIA ...................................................................................................................... 56 6.9 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO ................................................................................56 7 RELAÇÃO JURÍDICA ...................................................................................................... 57 7.1 RELAÇÃO JURÍDICA E RELAÇÃO DE FATO .............................................................. 58 7.2 FORMAÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICA ......................................................................... 59 7.3 ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA........................................................................ 60 7.4 ESPÉCIE DE RELAÇÃO JURÍDICA ................................................................................ 60 7.5 SUJEITO DE DIREITO E PERSONALIDADE JURÍDICA .............................................. 62 7.5.1 Personalidade e capacidade ............................................................................................. 62 7.6 DAS PESSOAS JURÍDICAS ............................................................................................. 66 7.6.1 Pessoa jurídica de direito público interno......................................................................... 71 7.6.2 Pessoa jurídica de direito privado .................................................................................... 73 8 TÉCNICA JURÍDICA ........................................................................................................ 74 8.1 ESPÉCIES DE TÉCNICAS JURÍDICAS ........................................................................... 74 8.1.1Técnica de interpretação ................................................................................................... 74 8.1.2 Técnica de aplicação ....................................................................................................... 74 8.2 TÉCNICA LEGISLATIVA ................................................................................................ 75 8.2.1 Apresentação material dos atos legislativos ..................................................................... 75 9 HERMENÊUTICA OU INTEGRAÇÃO DO DIREITO ................................................... 77 9.1 A INTERPRETAÇÃO GRAMATICAL E A SISTEMÁTICA ........................................... 77 9.2 A INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA E A EVOLUTIVA ................................................... 79 9.3 COMPREENSÃO ATUAL DO PROBLEMA HERMENÊUTICO .................................... 80 9.4 INTEGRAÇÃO E APLICAÇÃO DO DIREITO ................................................................ 81 4 9.5 NATUREZA LÓGICA DA APLICAÇÃO DO DIREITO .................................................. 82 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 85 INTRODUÇÃO Os avançados estudos desenvolvidos sobre o Direito, atualmente, diversificam-se em vários planos de pesquisa, que no conjunto tendem a favorecer a ampla compreensão do fenômeno jurídico decorrente da sociabilidade do homem. Por ser objeto de estudo de inúmeras disciplinas afins, o Direito não se perde a sua unidade fundamental e sim a fenômenos jurídicos concretos, apesar do seu enfoque unilateral, as noções trazidas por sua composição concretizam-se pela sua aplicabilidade nas realidades concretas. As disciplinas do Direito se dividem em duas classes: as chamadas disciplinas fundamentais e as auxiliares. Nelas se destacam ao primeiro grupo a ciência do Direito, Filosofia do Direito e Sociologia do Direito, enquanto que no segundo grupo temos a História do Direito e o chamado Direito Comparado. 5 O conhecimento do Direito se faz através de cada uma dessas disciplinas, que abrem, cada qual, um visão própria de estudo, capaz de alcançar o conhecimento sistemático jurídico. Para isso contudo, necessário se faz o estudo evolutivo do Direito, com sua ênfases e compreensão plena dessa ciência que exige aprofundamentos anteriores ao homem e da própria sociedade. O Direito decorre da plenitude social, pois não se pode ter sociedade sem Direito, e tão pouco Direito sem sociedade (ubi societa ib jus). A Introdução ao Estudo do Direito, em muito contribui nesse conhecimento, pois como matéria de iniciação fornece noções fundamentais para compreensão dos conceitos jurídicos que especificamente em matérias peculiares serão aprofundados, mas isso, não significa que não possam desde já ser apresentados ao iniciante ao estudo do Direito, o que passaremos a ver apartir de agora pelo desenvolvimento das temáticas adjacente. 6 1 A INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO A Introdução ao Estudo do Direito é a matéria de iniciação que fornece aos estudantes noções primordiais para compreensão do universo jurídicos. Embora possua conceitos voltados à ciência, a Introdução ao Estudo do Direito em si não é ciência, mas um sistema de ideias gerais estruturadas para atender a finalidade pedagógica Tem como objetivo o fornecimento aos iniciantes estudantes jurídicos uma visão global do Direito, no qual não pode ser obtida através de estudos isolados dos diferentes ramos jurídicos. Nesta disciplina se aprende os conceitos gerais como o de Direito, fato jurídico, relação jurídica, lei, justiça, segurança jurídica, muito usados nos diferentes ramos do Direito com suas peculiaridades. Não se trata em IED conceitos específicos, tais como, desapropriação, aviso prévio, crime, primeiramente porque fogem da finalidade a que se propõe O estudo desta disciplina e segundo porque são particulares a determinados ramos jurídicos: Concluindo-se, portanto, que podemos dizer que em IED possui um tríplice objeto: a) os conceitos gerais do Direito; b) a visão de conjunto do Direito; c) os lineamentos da técnica jurídica. 1.1 A IMPORTÂNCIA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO A importância desta disciplina, não decorre tão somente de propiciar a adaptação às noções essenciais à formação de uma consciência jurídica, mas também a adequação ao estudantes jurídicos aos termos da área bastante usados, tais como, brocados; além de 7 descortinar os horizontes do Direito pelo estudo dos conceitos jurídicos fundamentais, fazendo-os raciocinar enquanto futuros operadores da área. 1.2 NATUREZA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Não é a Introdução ao Estudo do Direito uma ciência no sentido rigoroso da palavra, por faltar-lhe um campo autônomo e próprio de pesquisa, mas é ciência enquanto sistema de conhecimento logicamente ordenados, segundo um objetivo preciso de natureza pedagógica. Não importa, pois que seja um sistema de conhecimentos recebidos de outras ciências e articatisticamente unificados. Trata-se, em suma, de ciência introdutória, como a própria palavra está dizendo, ou seja, uma ciência propedêutica, na qual o elemento de arte é decisivo. Podemos então concluir que a Introdução ao Estudo do Direito é um sistema de conhecimentos, recebidos de múltiplas fontes de informação, destinados a oferecer os elementos essenciais ao estudo do Direito, em termos de linguagem e de métodos, com uma visão preliminar das partes que o compõem e de sua complementaridade, bem como de sua situação na historia da cultura. 1.3 OUTRAS DISCIPLINAS QUE TRAZEM IDEIA GERAL DE DIREITO Filosofia do Direito. A Filosofia do Direito é uma reflexão sobre o Direito e seus postulados, com o objetivo de formular o conceito de Jus (Direito) e de analisar as instituições jurídicas no plano do dever ser. Teoria Geral do Direito. É a disciplina formal que apresenta conceitos úteis à compreensão de todos os ramos do Direito. Seu objeto consiste na analise e conceituação dos elementos estruturais e permanentes do Direito, como suposto e disposição da norma jurídica, coação, relaçãojurídica, fato jurídico, fontes formais. Sociologia do Direito. O estudo das relações entre a sociedade e o Direito, desenvolvido em ampla extensão pela Sociologia do Direito. Esta não pode ter seu conteúdo limitado ao problema da efetividade do Direito, nem empreender aquela pesquisa em profundidade, em nível de especialização. 1.4 FENÔMENO DA SOCIABILIDADE HUMANA 8 A formação humana, desde sua constituição, nos revela que o ser humano foi criado para conviver e se relacionar com outro ser de sua espécime. Como decorrência dessa natural união, a prole, passou a atuar como fator de organização e estabilidade do núcleo familiar. Resultado disso, os pequenos grupos caracterizados pelos sentimentos de afetos tendeu a propagar-se em cadeia até a formação de um grande grupo social. O estudo histórico demonstra que o homem é capaz, durante algum tempo, de viver isolado. Contudo, não durante toda a sua existência, o que leva a caracterização de ser social. Nesta linha do estudo do fenômeno da sociabilidade humana, Aristóteles já dizia que o homem fora da sociedade é “um bruto ou um deus”, considerando-se como algo inferior ou superior à condição humana. Na visão aristotélica este homem viveria alienado sem discernimento próprio ou se consideraria um ser perfeito acima do bem e do mal, na condição a não ser alcançada. São Tomás de Aquino, no mesmo estudo que Aristóteles resolveu realizar indica três hipóteses para a vida humana fora da sociedade: a) mala fortuna b) corruptio naturae c) excellencia naturae 1.5 DIREITO COMO PROCESSO DE ADAPTAÇÃO A relação entre a sociedade e o Direito apresenta um duplo sentido de adaptação: de um lado, o ordenamentos jurídico é elaborado como processo de adaptação social e, para isso se ajusta-se às condições do meio; de outro, o Direito estabelecido cria a necessidade de o povo adaptar o seu comportamento aos novos padrões de convivência. A vida em sociedade pressupõe organização e implica a existência do Direito. A sociedade cria o Direito no propósito de formular as bases da justiça e segurança. Com este processo as ações sociais ganham estabilidade. A vida social torna-se viável. O Direito, porém, não é uma força que gera unilateralmente, o bem-estar social. Por definição, o Direito deve ser uma expressão da vontade social e assim, a legislação deve apenas assimilar os valores positivos que a sociedade estima viver. O Direito, portanto, não pode ser tratado como formula de transformação da natureza humana e sim sua adequação. Para o home e para a sociedade, o Direito não constitui um fim, apena um meio para tornar possível a convivência e progresso social. 9 De forma enfática, Pontes de Miranda se refere ao Direito como um fenômeno de adaptação: “O Direito não é outra coisa que processo de adaptação”, “Direito é processo de adaptação social, que consiste em se estabelecerem regras de conduta, cuja incidência é independente da adesão daqueles a que a incidência da regra jurídica possa interessar.” A vinculação entre Direito e necessidade, essencial À compreensão do fenômeno jurídico como processo adaptativo, é feita também por Renaséns Siches, quando afirma que “o Direito é algo que os homens fabricam em sua vida, sob estimulo de umas determinadas necessidades; algo que vivem em sua existência com o propósito de satisfazer àquelas necessidades...” 1.6 AS AÇÕES HUMANAS E O DIREITO A sociedade cria o Direito e, ao mesmo tempo, se submete aos seus efeitos, suas normativas, suas regras. O novo Direito propõe a imposição de regras por meio da assimilação e posteriormente, adéqua às atitudes. A definição do espírito das leis a sociedade para ser regida por parâmetros, cada uma adequando as ações humanas. Em relação aos seus interesses particulares e na gestão de negócios, os homens pautam o seu comportamento e se guiam em conformidade com os atuais conceitos de licito e de ilícito. 1.7 FORMAS DE INTERAÇÃO SOCIAL E AÇÃO DO DIREITO As pessoas e os grupos sociais se relacionam estreitamente, na busca de seus objetivos. Os processos de mutua influência, de relações interindividuais e intergrupais, que se formam sob a força de variados interesses, denominam-se interação social. A interação social se apresenta sob forma de cooperação, competição e conflito e encontra no Direito a sua garantia, o instrumento de apoio que protege a dinâmica das ações. Na cooperação as pessoas estão movidas por igual objetivo e valor e por isso conjugam o seu esforço. A interação se manifesta direta e positiva. Na competição há disputa, uma concorrência, em que as partes procuram obter o que almejam, uma visando à exclusão da outra. Uma grande característica da sociedade moderna, esta forma revela atividades paralelas em que cada pessoa ou grupo procura reunir os melhores trunfos. 10 O conflito se faz presente a partir do impasse, quando os interesses em jogo não logram uma solução pelo dialogo e as partes recorrem à luta, moral ou física, ou buscam a mediação da justiça. Podemos definir como oposição de interesses. Os conflitos são fenômenos naturais à sociedade, podendo-se até dizer que lhe são imanentes. Quanto mais complexa a sociedade, quanto mais se desenvolve, mais se sujeita a novas formas de conflitos. Nesse sentido, o Direito advém como forma de intervenção, favorecendo para o amplo relacionamento das pessoas e dos grupos sociais, em uma finalidade de paz em convívio. Ao separa o licito do ilícito, segundo os valores de convivência que a própria sociedade elege, o ordenamento jurídico torna possível os nexos de cooperação e disciplina as competições, por meio do estabelecimento de limites necessários ao equilíbrio e à justiça nas relações. Em relação ao conflito, a ação do Direito se opera em duplo sentido. Se de um lado, temos o anseio de evitar desinteligências quanto aos direitos que cada parte julga ser portadora; por outro, diante do conflito concreto, o Direito apresenta solução de acordo com a natureza do caso, quer seja para definir o titular do direito, quer seja para restaurar situações anteriores ou quer seja para aplicar penalidades de diferentes tipos, daí o silogismos da sociabilidade expressa pelos elos que vinculam o homem, a sociedade e o Direito: Ubi homo, ibi societas; ubi societas, ibi jus; ergo, ubi homo, ibi jus (onde o homem, aí a sociedade; onde a sociedade, aí o Direito; logo, onde o homem, aí o Direito). 11 2 A NOÇÃO DO DIREITO 2.1 O NASCIMENTO DO DIREITO Resultante da necessidade de se estabelecer um conjunto de regras que dessem certa ordem à vida em sociedade, o Direito surge apartir dos processos de mútua influência, de relações interindividuais e intergrupais formadas de maneiras variadas de acordo com os interesses naquilo que denominamos interação social. Ubi societa, ib jus – Onde houver sociedade, aí estará o Direito. A interação social se apresenta sob as formas de cooperação, competição e conflito e encontra no Direito a sua garantia o instrumento de apoio de proteção as ações. Na cooperação os seres humanos comulgam o mesmo objeto e valor, onde os esforços passam a ser mútuos em prol de todos, neste caso a interação vem a se manifestar de maneira direta e positiva. Já na competição os objetivos e valores são inversos, os esforços não são cooperados, há uma disputa, uma concorrência, onde cada um procura obter o que almeja sempre visando excluir o outro. Muitas vezes nossa sociedade moderna comuga estes caracteres, em vezes que as pessoasagem de maneira cooperada e outras vezes como concorrentes. No conflito a interação social se faz presente pelos impasses, quando não se consegue solucionar as divergências por meio do diálogo e as partes recorrem à luta, moral ou física. No conflito a interação é direta e negativa. Todas as vezes que as interações sociais resultantes das formas de cooperação ou competição estiverem potencialmente conflituosas o Direito irá disciplinar, já nos conflitos, sempre haverá a possibilidade de mediação do Direito, pois, os conflitos são fenômenos 12 naturais da sociedade, inerentes da complexidade da convivência, é como já se afirmou “o maior desafio não é o de como viver e sim o da convivência”. 2.2 CONCEITO DE DIREITO 2.2.1 Considerações Prévias A ampla divergência entre os juristas, quanto À definição do Direito levou Kant a afirmar, no século XVIII, que os “juristas ainda estão à procura de uma definição para o Direito”. Decorridos dois séculos e meio, sob certo aspectos, mantém-se atual, de vez que os cultores da Jurisprudentia não lograram abranger, através de um definição, todos os sentidos do vocábulo. As dificuldades que o problema oferece estão ligadas a dois motivos básicos, sendo um de natureza metodológica e outro vinculado a tendências filosóficas perante o Direito. O primeiro se refere à prática de se examinar diretamente o tema da definição, sem que antes se proceda ao exame dos diversos sentidos que o termo encerra. De outro lado, definições sofrem a influência do jurista; dependem do tipo de homo juridicus que representa. Os sociólogos do Direito, por sua vez, enfatizam o elemento social, enquanto os historicistas fazem referência ao caráter evolutivo do Direito. Formas especiais de experiência conduzem a definições muitas vezes curiosas, como a formulada por Pitágoras que, sob a ótica da matemática afirmou: “O Direito é o igual múltiplo de si mesmo”. Em lógica, o vocábulo Direito é classificado como termo análogo ou analógico, pelo fato de possuir significados que, apesar de se diferenciarem, guardam entre si alguns nexos. Assim, empregamos esse termo, ora em sentido objetivo como norma de organização social, ora do ponto de vista subjetivo, para indicar o poder de agir que a lei garante; algumas vezes, como referência à Ciência do Direito e outras, como equivalente à justiça. 2.2.2 Definições do Direito A literatura jurídica nos fornece diversas interpretações acerca do tema “Direito”, principalmente quando este se refere propriamente à legalidade, de acordo com Prof. Dr. Luiz Santos (1996). Conforme ele, assim, torna-se necessário estabelecer os diversos conceitos de autores que divergem entre si das definições jurídicas para o entendimento da essência que a lei traz. Além disso, como as Ciências Jurídicas fazem parte do contexto de divergências, são necessárias, até porque ela como ciência tem paradigmas e patamares, evoluções, novos 13 conceituações, modificações, razão maior porque em aspectos científicos das ciências jurídicas, o Direito é o conceito básico. Ademais, acresce ele, em mesma obra, quando adentra nas questões de Meio Ambiente, Ecologia, necessária se torna também que haja uma reflexão sobre esses diversos conceitos. Desta forma, passamos a partir deste momento enumerar, alguns conceitos sobre a Ciência Jurídica, que mais se destacam. Começamos nossos estudos a respeito da definição do que venha a se direito segundo Prof. Dr. Luiz Santos (2001) que afirma: O Direito em sentido subjetivo é a “Ciência normativa”, que estabelece e sistematiza as regras necessárias para assegurar o equilíbrio das funções do organismo social, à obediência de cujos membros são coercitivamente impostas pelo poder público. Em sentido objetivo, é a universalidade dos preceitos ou normas legais que disciplinam e protegem os interesses ou regulam as relações jurídicas. Neste conceito o ilustre autor demonstra as diversas vertentes assumidas pelo Direito. Para ele, o Direito é classificável, “subjetivo e objetivo”, de acordo com a “finalidade que se propõe”, seja, pelo aspecto puramente sociológico, seja pela própria interatividade jurídica. Já na concepção da Teoria Geral do Direito, ou seja, Teoria Geral do Estado - TGP, o Direito enquanto lei escrita é o conjunto de regras coativas a que o Estado submete o indivíduo e a quem assiste. É a norma de agir, que exterioriza o direito pela ação: jus est norma agendi. Neste conceito introdutório, segundo concepção teórica do Estado, importante frisar a finalidade do direito, a que está inserido o individuo como parte integrante de uma sociedade onde cada ser interfere de maneira indireta na vida alheia, e para que essa convivência seja pacífica se tem a atuação jurídica. Reforçando o contexto acima temos outra definição do Prof. Dr. Luiz Santos (2000) que diz que o Direito é: Realização da lei, subjetivamente considerado, é o interesse protegido pela ordem jurídica, que dá a cada um o poder ou faculdade de agir, praticar ou não, livremente, um ato lícito, ou exigir que outrem o pratique ou pode se abster de praticá-lo jus est facultas agendi. No conceito a pouco suscitado, o autor reforça os aspectos subjetivos do direito, só que nesse momento, leva em consideração a “característica coativa”, da qual possibilita aquele que tem “direito” de agir de acordo com a lei ou até “exigir” quando violado o seu direito. 14 Vejamos outro conceito que merece citação advinda dos da Introdução ao Estudo do Direito - IED, onde se verifica a essência do Direito Subjetivo, na qual ele é a ciência que estuda o conjunto de regras jurídicas, pela qual podemos ter a realização da lei subjetivamente considerada no interesse protegido pela ordem jurídica. A terminologia ultrapassa fronteiras jurisdicionais e adentra em outros segmentos, especificamente da fronteira tributária / comercial (Código Tributário Nacional – CTN), em que se pode observar o direito sendo definido como imposto, taxa, ou qualquer outro tributo pago a uma repartição aduaneira, sobre mercadorias importadas ou exportadas. Para Celso citado por Rebello (1980), o direito é a arte do bom e do eqüitativo. É o jus est boni et aequi. Melhor dizendo, é a arte do justo equitativo. Numa concepção mais filosófica, temos destaque à figura de Kant, citado por Rebello (1980), onde o mesmo considera o direito como o conjunto das condições segundo as quais o arbítrio de cada um pode coexistir com o arbítrio dos outros com uma lei de liberdade. Nessa citação, o autor, tem uma visão do universo que envolve o Direito, na qual o seu maior objetivo é o bem comum, ou seja, a melhor convivência entre os seres, isto faz reporte a própria História do Direito, do fenômeno da sociabilidade, estudado em Sociologia Jurídica, onde se entende que para aplicar a norma necessária se faz ter um Fato e uma Norma. Aprofundando mais os estudos sobre a terminologia jurídica, chegamos ao conceito atual idealizado pelo Prof. Miguel Reale (2002, p.02), na qual diz que: “O direito é a vinculação bilateral atributiva da conduta para a realização ordenada dos valores de convivência. Para Reale, o direito é um sistema atributivo de funções, na qual o individuo não só têm direitos como deveres perante a sociedade. É o reflexo de sua Teoria Tridimensional do Direito, onde para atuar a norma necessária se faz saber o fato, valorá-lo e para enfim aplicar a norma.” Segundo autor, esta definição é muito enfatizada pela sociologia jurídica, na qual, a seguridade é que para o ilustre autor, um fato por si só não traz conotação alguma, pois, a norma é a mesma, o que muda, são asações cometidas pelo ser humano, e para isso necessária se faz à valorização do fato, demonstrar a sua caracterização, para enfim poder aplicar eficazmente a norma. Diante deste os conceitos e identificações, segundo Tatilaiane (2005) refletimos a cientificidade do Direito, onde é necessariamente paradigma das Ciências Jurídicas, face às interpretações e definições divergentes citadas no texto, podendo - se afirmar que é realmente o grande patamar diretivo e ordenativo de tudo que existe, tendo como fundamento básico o Ser humano. 15 2.3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO História é a recordação ou registro do fazer do homem em todos os campos, de acordo com Edgar Morin (1999). Em outras palavras, segundo ele, é o registro ou memória da cultura. Porém, do ponto de vista filosófico na sua concepção, a história é mais do que a demonstração e estudos de dados. É a própria constituição da identidade cultural de um povo. Por isso, o estudo da história, na sua visão, em igual obra, é importante, pois, leva-nos a conhecermos a nós mesmos. Há uma história pessoal de cada um e há uma história social, sendo que ambas se condicionam mutuamente. Nesse sentido, a História do Direito pretende segundo Prof. Luiz Santos (1994), a compreender o Direito Atual, a partir das vertentes por ele assumida dentro de sua própria história. Nesse contexto, iniciamos nossa evolução histórica nos reportando ao trabalho exploratório do professor acima citado, passando primeiramente pelo estudo dos povos primitivos, onde se destacava um Direito não escrito, influenciado, em geral, pela religião. Indo além, o professor nos leva ao conhecimento do Direito Egípcio que passou por três fases chamadas de "Antigo Império" (séculos 28 a 33 a.C.), "Médio Império" (1 o quarto do 2 o . Milênio a.C.), e "Novo Império" (séculos 16-11 a.C.), que se caracterizaram por um Direito Público, de Poder Monárquico e por um Direito Privado individualista no início, mas que nos dois primeiros eram estabelecidos num regime senhorial e feudal, enquanto que o Direito Privado é regido por clãs, até a terceira fase. Num estudo oriental, o professor acima citado, verifica que os direitos cuneiformes, dos povos do Oriente Próximo, se utilizaram de uma escrita em forma de cunha e de prego. Não se trata de um direito único, mas de vários sistemas desenvolvidos na Suméria, Acádia, Babilônia, Assíria e pelos Hititas, entre outros. Esses povos, segundo Prof. Dr. Luiz Santos (1994), caracterizavam-se, de modo geral, pela Teocracia, ficando o Direito nas mãos dos sacerdotes e entre os sesus monumentos jurídicos, neles encontramos o famoso Código de Hamurabi, provavelmente de 1694 a.Creconhecido por um sistema jurídico muito desenvolvido, de modo especial na área do direito privado, principalmente no que se refere ao direito das obrigações (contratos), sendo o direito penal muito severo. Numa outra feição, o citado docente, em igual obra acadêmica, se reporta ao Direito Hebraico desenvolvido pelo povo hebreu, de origem semita e nômade, que se estabeleceu na 16 Palestina, acabando por sedentarizar-se até a Diáspora (dispersão), ocorrida após a revolta contra os romanos, que dominava a região, nos séculos I e II, D.C. De acordo com ele, estes povos caracterizavam-se por um Direito Divino, isto é, dado por Deus, revelando-se nos textos sagrados, de maneira que é imutável, podendo apenas ser adaptado à realidade social. Esse Direito, de acordo com eminente doutor citado, de certa forma vai influenciar diretamente o Direito Canônico e o atual Direito Moderno, e mesmo no Direito Muçulmano, pelas inovações por ele trazidas, dentre elas se destacando o dízimo (apropriação, pelo clero, de 1/10 dos rendimentos do povo) e a sagração dos reis, que seriam representantes de Deus. No Direito Grego, o ilustre docente, nos remete aos povos que não se qualificam tanto pela preocupação com a sistematização do Direito, mas, sim, pelo pensamento político e filosófico, que, na verdade, influenciou toda a civilização ocidental. Nele cada cidade tinha o seu próprio sistema jurídico e político, não havia um Direito Grego Geral. Dos clãs, de acordo com o eminente docente, passa-se à formação das cidades, onde vigoram os regimes democráticos, de índole individualista, onde todos os cidadãos, a princípio, são iguais perante a lei, que seria a expressão da vontade popular, através das assembleias. Observe-se, no entanto, que nem todos eram considerados cidadãos e, portanto, nem todos eram "iguais perante a lei". De qualquer forma, afirma Prof. Dr. Luiz Santos (1994), as leis escritas são poucas, derivando o direito mais da consciência coletiva. Embora pensadores fundamentais como Platão e Aristóteles tenham influenciado o mundo ocidental no campo da filosofia e da política, os gregos não instituíram monumentos jurídicos importantes, cabendo aos romanos à sistematização das ideias filosóficas helênicas. Para os romanos, segundo Prof. Dr. Luiz Santos (1994), embora o Direito tenha se desenvolvido tardiamente, em relação ao egípcio e ao grego, o Direito Privado Romano, erigindo-se em um sistema próprio a partir dos séculos I e II A.C, acabou influenciando todo o direito da Europa Medieval e por este veio até nós, nas Américas. No início, conforme os docentes, os romanos, de origem pastoril, vivem em clãs, agrupando-se mais tarde, onde seria erigida a cidade de Roma. Era um direito consuetudinário e, em geral, sem diferenciar as instituições seculares das religiosas. Conhecendo-se pouco a escrita, na visão do ilustre docente, não havia muitas leis escritas, pelo menos até a época da República, que, não obstante, legislou pouco. 17 Um monumento jurídico muito conhecido, na visão dele, é de acordo com ele a chamada Lei das XII Tábuas, que teria sido escrita para que os plebeus queixosos das atitudes dos magistrados conhecessem os costumes da cidade. Embora, haja dúvida sobre sua existência, afirma-se que teria sido escrita em doze tábuas e afixada no átrio do fórum, sendo destruída na ocasião do saque a Roma pelos gauleses em 390, afirma o Prof. Dr. Luiz Santos (1994). Entre os séculos II A.C e III D.C, conforme o ilustre doutor, Roma domina toda a região mediterrânea, deixando-se influenciar pelos direitos egípcio e grego. Constata o Prof. Dr. Luiz Santos (1994), que por um lado, o direito público caracteriza-se pela diminuição da liberdade do cidadão, e que por outro, os direitos privados, individualistas, constrói-se de forma exemplar, reduzindo-se a formas escritas, especialmente o direito das coisas e das obrigações, reduzindo o poder informal dos costumes, mas, convivendo com a produção jurisprudencial e doutrinária, tendendo, no entanto, à codificação, influenciando, pelo direito bizantino, russo, romeno e búlgaro. O Direito Romano Clássico, na concepção do Prof. Luiz Santos (1994), em igual obra, contudo, tem o seu renascimento no Ocidente a partir do século XII D.C, fazendo surgir estudos que levaram à sistematização doutrinária do chamado direito romano moderno, influenciando nossos sistemas até os dias de hoje. Além destes, afirma o autor, em igual obra, que estes influenciaram diretamente o Direito Europeu, temos, ainda, não menos importantes historicamente, o direito hindu, o direito chinês, o direito japonês e o direito muçulmano. O Direito Canônico, para o Prof. Dr. Luiz Santos (1994), é o direito da Igreja Católica Romana, derivando o seu nome do termo canon, que significa "regras", as quais provinham das decisões conciliares, as quais resolviam, sobretudo conflitos de fé. É, sobremaneira, importante, pois foi, durante muito tempo, na Idade Média, oúnico direito escrito, regulando questões de fé ou meramente seculares, proporcionando o domínio, pela Igreja, do cenário jurídico medieval, quando era chamada a legislar e a julgar questões de toda ordem, na falta de um sistema laico eficiente, dada à lacuna deixada pelo direito romano desaparecido com o fim do império romano, conforme o autor. Embora se trate de um direito religioso, baseado nas Sagradas Escrituras, com a aproximação medieval entre a Igreja e os Estados laicos, a ingerência do direito canônico é inevitável, de acordo com o docente. O direito canônico influenciou, segundo ele, todo o direito ocidental europeu e dos países colonizados, oferecendo-lhes os valores éticos e morais de origem cristã, ainda que o 18 próprio direito canônico tenha sido fortemente influenciado pelo direito romano, naquilo que não contrariava o direito divino. Hoje, embora essa relação tenha sido mudada, separando-se Igreja e Estado, na maioria dos países, perdendo o interesse para os leigos a partir do século XVI, a influência do direito canônico, conforme concepção do Prof. Dr. Luiz Santos (1994), é ainda forte, sendo ele próprio um direito vivo, ainda que só no âmbito da Igreja Romana, mas, em pleno vigor, visto que, o atual Código Canônico foi promulgado em 1983, na visão do autor. Os direitos romanistas são denominados os que foram influenciados pelo direito romano, após a sua redescoberta, a partir do século XIII. Interessante, de acordo Prof. Dr. Luiz Santos (1994), em pertinente obra, notar que, desde o século XII, os professores de direito elaboraram um ensino do direito baseado no direito romano, especialmente na clássica codificação de Justiniano, então chamada de Corpus iuris civilis. Esse "direito romano", segundo ele, porém, não era o mesmo direito do Império Romano antigo, pois os professores o interpretavam, evidentemente, a partir da sua ótica contemporânea, influenciada pela cultura jurídica em que viviam. Sua vantagem, entretanto, em relação ao direito feudal, era óbvia: tratava-se de um direito escrito, mais completo e mais evoluído, conforme docente acima citado. E, com isso, deu maior importância à lei, como norma genérica e abstrata, desprendida do caso concreto, acabando por entender o direito mais como dever-ser do que ser, ou seja, mais como ordem ideal do que realidade, no sentido de uma mudança do irracional para o racional, na visão do ilustre doutor citado. Nesse sentido, elabora-se uma "ciência jurídica" e cresce o interesse pelo direito. Substitui-se o "irracional" representado pelos julgamentos divinos através de ordenamentos, aumentando o poder de alguns reis, que, então, podiam legislar, fazendo desaparecer os feudos, estabelecendo-se, por outro lado, um sistema econômico baseado no comércio, na visão do Prof. Dr. Luiz Santos (1994). Enfim, segundo Prof. Dr. Luiz Santos (1994), o direito passa a ser nacional, segundo ele, regendo grandes partes territoriais de maneira uniforme, acabando por preponderar à lei, com necessidade de uma sistematização codificada, enquanto que as expansões da cultura européia, com os descobrimentos e colonização, levam o direito europeu para outras regiões e continentes. Atualmente, compreende o autor, que em alguns países da Europa, o Common Law é o sistema jurídico criado na Inglaterra a partir do século XII, pelas decisões reais, mantendo-se até hoje nos países de cultura inglesa, como Estados Unidos, Canadá e Austrália. 19 Afirma Prof. Dr. Luiz Santos (1994) que esse nome designa o direito comum, ou comune ley, em distinção ao direito diversificado pelos costumes locais. Nada tem a ver com o direito comum continental, e, ao contrário, o juiz é quem faz o direito, na concepção do autor, prevalecendo os precedentes judiciais, enquanto que a lei não exerce qualquer influência na sua evolução. Conforme Prof. Dr. Luiz Santos (1994), o statute law, conforme Prof. Dr. Luiz Santos (1994) ao contrário, é um direito de leis e, na verdade, acabou havendo uma fusão, em 1875, e não uma ruptura, de maneira que até hoje é possível aos juristas ingleses invocarem antigos estatutos legais e decisões judiciais dos séculos XIII e XIV. Interessante notar, de acordo com autor, ainda, que o sistema de Equity nasce de uma necessidade de o rei, através do seu Chanceler, julgar cada vez mais casos, quando, não sendo possível trabalhar tecnicamente como no sistema do Common Law, acaba deixando de lado as leis substantivas e processuais, invocando o sistema romano de eqüidade, com influência do direito canônico. Essa, no entanto, é uma forma deteriorada de eqüidade, que, na verdade, serve ao absolutismo real, afastando a normatividade como limite ao poder de judicar. Mais, tarde, de acordo com ele, com a reforma judiciária de 1873 e 1875, as regras de equity passam a fazer parte do common law, com a função de corrigi-las e completá-las. Ainda que a legislação assuma cada vez mais importância, na Inglaterra, entretanto, não há Constituição escrita ou Códigos como no continente, ainda que seja considerado o berço do Constitucionalismo, com a Magna Carta de 1215, na visão do Prof. Dr. Luiz Santos (1994). 2.4. DIREITO E MORAL 2.4.1 Considerações Preliminares Encontramo-nos, agora, diante de um dos problemas mais difíceis e também dos mais belos da Filosofia Jurídica, o da diferença entre a Moral e o Direito. Não pretendo, num curso de Introdução ao Estudo do Direito, esgotar o assunto mas, apenas, dar alguns elementos necessários para que os senhores não confundam os dois conceitos, sem, todavia, separá-los. Nesta matéria devemos lembrar-nos de que a verdade, muitas vezes, consiste em distinguir as coisas, sem separá-las. Ao homem afoito e de pouca cultura basta perceber uma diferença entre dois seres para, imediatamente, extremá-los um do outro, mas os mais 20 experientes sabem a arte de distinguir sem separar, a não ser que haja razões essenciais que justifiquem a contraposição. Muitas são as teorias sobre as relações entre o Direito e a Moral, mas é possível limitarmo-nos a alguns pontos de referência essenciais, inclusive pelo papel que desempenharam no processo histórico. 2.4.2 Teoria do Mínimo Ético Em primeiro lugar, recordemos a teoria do "mínimo ético", já exposta de certa maneira pelo filósofo inglês Jeremias Bentham e depois desenvolvida por vários autores, entre os quais um grande jurista e politicólogo alemão do fim do século passado e do princípio deste, Georg Jellinek. A teoria do "mínimo ético" consiste em dizer que o Direito representa apenas o mínimo de Moral declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver. Como nem todos podem ou querem realizar de maneira espontânea as obrigações morais, é indispensável armar de força certos preceitos éticos, para que a sociedade não soçobre. A Moral, em regra, dizem os adeptos dessa doutrina, é cumprida de maneira espontânea, mas como as violações são inevitáveis, é indispensável que se impeça, com mais vigor e rigor, a transgressão dos dispositivos que a comunidade considerar indispensável à paz social. Assim sendo, o Direito não é algo de diverso da Moral, mas é uma parte desta, armada de garantias específicas. A teoria do "mínimo ético" pode ser reproduzida através da imagem de dois círculos concêntricos, sendo o círculo maior o da Moral, e o círculo menor o do Direito. Haveria, portanto, um campo de ação comum a ambos, sendo o Direito envolvido pela Moral. Poderíamos dizer, de acordo com essa imagem, que "tudo o que é jurídico é moral, mas nem tudo o que é moral é jurídico". São aceitáveis os princípios dessa doutrina? Será certo dizerque todas as normas jurídicas se contêm no plano moral? Será mesmo que o bem social sempre se realiza com plena satisfação dos valores da subjetividade, do bem pessoal de cada um? Comecemos por observar que fora da Moral existe o "imoral", mas existe também que é apenas "amoral", ou indiferente à Moral. Uma regra de trânsito, como, por exemplo, aquela que exige que os veículos obedeçam à mão direita, é uma norma jurídica. Se amanhã, o legislador, obedecendo a imperativos técnicos, optar pela mão esquerda, poderá essa decisão influir no campo moral? Evidentemente que não. Há um artigo no Código 21 de Processo Civil, segundo o qual o réu, citado para a ação, deve oferecer a sua contrariedade no prazo de 15 dias. E por que não de 10, de 20, ou de 30? Se assim fosse, porém, influiria isso na vida moral? Também não. Outro preceito do Código Civil estabelece que os contratos eivados de erro, dolo ou coação, só podem ser anulados dentro do prazo de 4 anos. Por que não no prazo de 5 anos ou de 3 anos e meio? São razões puramente técnicas, de utilidade social, que resolvem muitos problemas de caráter jurídico. Não é exato, portanto, dizer que tudo o que se passa no mundo jurídico seja ditado por motivos de ordem moral. Além disso, existem atos juridicamente lícitos que não o são do ponto de vista moral. Lembre-se o exemplo de uma sociedade comercial de dois sócios, na qual um deles se dedica, de corpo e alma, aos objetivos da empresa, enquanto que o outro repousa no trabalho alheio, prestando, de longe em longe, uma rala colaboração para fazer jus aos lucros sociais. Se o contrato social estabelecer para cada sócio uma compensação igual, ambos receberão o mesmo quinhão. E eu pergunto: é moral? Há, portanto, um campo da Moral que não se confunde com o campo jurídico. O Direito, infelizmente, tutela muita coisa que não é moral. Embora possa provocar nossa revolta, tal fato não pode ficar no esquecimento. Muitas relações amorais ou imorais realizam-se à sombra da lei, crescendo e se desenvolvendo em meios de obstá-las. Existe, porém, o desejo incoercível de que o Direito tutele só o "lícito moral", mas, por mais que os homens se esforcem nesse sentido, apesar de todas as providências cabíveis, sempre permanece um resíduo de imoral tutelado pelo Direito. Há, pois, que distinguir um campo de Direito que, se não é imoral, é pelo menos amoral, o que induz a representar o Direito e a Moral como dois círculos secantes. Podemos dizer que dessas duas representações - de dois círculos concêntricos e de dois círculos secantes, - a primeira corresponde à concepção ideal, e a segunda, à concepção real, ou pragmática, das relações entre o Direito e a Moral. As representações gráficas têm vantagens e desvantagens. Entre as desvantagens está a de se simplificar excessivamente os problemas. Servem, no entanto, no início dos estudos, como pontos de referência para ulteriores pesquisas. 2.4.3 Do Cumprimento das Regras Sociais Se analisarmos os fatos que se passam em geral na sociedade ou os que nos cercam em nossa vida cotidiana, verificamos que regras sociais há que cumprimos de maneira 22 espontânea. Outras regras existem, todavia, que os homens só cumprem em determinadas ocasiões, porque a tal são coagidos. Há, pois uma distinção a fazer-se quanto ao cumprimento espontâneo e o obrigatório ou forçado das regras sociais. A qual dessas categorias pertencerá a Moral? Podemos dizer que a Moral é o mundo da conduta espontânea, do comportamento que encontra em si próprio a sua razão de existir. O ato moral implica a adesão do espírito ao conteúdo da regra. Só temos, na verdade, Moral autêntica quando o indivíduo, por um movimento espiritual espontâneo realiza o ato enunciado pela norma. Não é possível conceber-se o ato moral forçado, fruto da força ou da coação. Ninguém pode ser bom pela violência. Só é possível praticar o bem, no sentido próprio, quando ele nos atrai por aquilo que vale por si mesmo, e não pela interferência de terceiros, pela força que venha consagrar a utilidade ou a conveniência de uma atitude. Conquanto haja reparos a ser feitos à Ética de Kant, pelo seu excessivo formalismo, pretendendo rigorosamente que se cumpra "o dever pelo dever", não resta dúvida que ele vislumbrou uma verdade essencial quando pôs em evidência a espontaneidade do ato moral. A Moral, para realizar-se autenticamente, deve contar com a adesão dos obrigados. Quem pratica um ato, consciente da sua moralidade, já aderiu ao mandamento a que obedece. Respeita-se meu pai, pratico um ato na plena convicção da sua intrínseca valia, coincidindo o ditame de minha consciência com o conteúdo da regra moral. Acontecerá o mesmo com o Direito? Haverá, sempre, uma adequação entre a minha maneira de pensar e agir e o fim que, em abstrato, a regra jurídica prescreve? No plano da Moral, já o dissemos, essa coincidência é essencial, mas o mesmo não ocorre no mundo jurídico. O exemplo que vou dar esclarece o assunto. É um exemplo trazido de minha experiência profissional, e que pode repetir-se com qualquer dos senhores, nesta vida cheia de imprevistos e de dramas que nos deixam perplexos. Certa vez, fui procurado por um casal de velhos - de quase 80 anos - que me expôs a sua situação de insuficiência econômica, carecedores que estavam dos mais elementares meios de subsistência. Como diziam os romanos, na sua compreensão realística da vida, a velhice é a pior das doenças. Pois bem, o casal de velhos revelou-me que tinha um filho, um industrial de grande capacidade econômica, possuidor de várias fábricas e estabelecimentos comerciais e que, entretanto, não admitia que seus prepostos ou a esposa prestassem qualquer auxilio a seus pais. 23 Ora, o Código Civil brasileiro, como o de todas as nações civilizadas, consagra o princípio da solidariedade econômica entre os cônjuges e os parentes. Nesse sentido, os descendentes não podem faltar à assistência devida aos pais e avós, toda a vez que estes se encontrem em dificuldades econômicas, por motivos que não possam ser superados. É, evidentemente, um preceito de ordem jurídica e, ao mesmo tempo, de ordem moral. É o princípio de solidariedade humana, ou melhor, de solidariedade familiar que dita à regra jurídica consagrada nos códigos. Se a lei civil estabelece a obrigação de prestar alimentos, por sua vez, o Código de Processo assegura aos necessitados remédios indispensáveis à realização desse desideratum, graças à interferência do juiz. Admitamos - como no caso concreto que me foi dado apreciar como advogado - que o filho não ceda a qualquer razão e se recuse, obstinadamente, a prestar assistência a seus genitores. Não restará aos pais senão uma via - a de propor uma ação que se chama "ação de alimentos". Feita a prova, com a demonstração de carência econômica dos interessados e da abastança do filho, para pagar a quantia arbitrada pelos peritos, o juiz proferiu a sentença, condenando o descendente a pagar uma prestação alimentícia mensal. Essa sentença, depois da apelação, passou em julgado, isto é, tornou-se uma sentença da qual não cabia qualquer recurso. Sentença passada em julgado é aquela contra a qual não é possível mais recorrer; é uma sentença que se tornou exequível, por terem os órgãos do Poder Judiciário se pronunciado de maneira definitiva sobre a lide. Tínhamos uma sentença e podíamos, com ela, promover a execução e até a penhora dos bens do filho, a fim de garantir o que tinha sido decidido pelo juiz. O filho passou a efetuar, mensalmente, o pagamento da pensão, mas com revolta: vencido, mas não convencido. Eu lhes pergunto: Até que ponto a regra moral coexistiu,nesse caso, com a regra jurídica? Até que ponto o pagamento se tornou moral? A regra moral de assistência aos ascendentes coexistiu com a regra jurídica até o momento em que se tornou indeclinável o recurso à força, através do Judiciário. No momento em que os pais compareceram ao pretório para propor a ação, visando à prestação compulsória do dever filial, a partir desse instante a regra moral não acompanhou mais a regra jurídica, mas entrou em eclipse por falta de apoio no plano da consciência do obrigado. A Moral é incompatível com a violência, com a força, ou seja, com a coação, mesmo quando a força se manifesta juridicamente organizada. O filho que, mensalmente, paga a prestação alimentícia por força do imperativo da sentença, só praticará um ato moral no dia em que se convencer de que não está cumprindo uma obrigação, mas praticando um ato que o 24 enriquece espiritualmente, com tanto mais valia quanto menos pesar nele o cálculo dos interesses. 2.4.4 Direito e Coação O cumprimento obrigatório da sentença satisfaz ao mundo jurídico, mas continua alheio ao campo propriamente moral. Isto nos demonstra que existe, entre o Direito e a Moral, uma diferença básica, que podemos indicar com esta expressão: a Moral é incoercível e o Direito é coercível. O que distingue o Direito da Moral, portanto, é a coercibilidade. Coercibilidade é uma expressão técnica que serve para mostrar a plena compatibilidade que existe entre o Direito e a força. Há três posições diferentes em face da relação entre o Direito e a força: uma teoria imbuída de eticismo absoluto, que sustenta que o Direito nada tem a ver com a força, não surgindo, nem se realizando graças à intervenção do poder público. Haveria, segundo os adeptos dessa doutrina, no tocante ao Direito, a mesma incompatibilidade que há com a Moral. Essa teoria, como se vê, idealiza o mundo jurídico, perdendo de vista o que efetivamente acontece na sociedade. Em campo diametralmente oposto, temos a teoria que vê no Direito uma efetiva expressão da força. Para Jhering, um dos maio-res jurisconsultos da passada centúria, o Direito se reduz a "norma + coação", no que era seguido, com entusiasmo, por Tobias Barreto, ao defini-lo como "a organização da força". Ficoufamoso o seu temerário confronto do direito à "bucha do canhão", o que se deve atribuir aos ímpetos polêmicos que arrebatavam aquele grande espírito. Segundo essa concepção, poderíamos definir o Direito como sendo a ordenação coercitiva da conduta humana. Esta é definição incisiva do Direito dada pelo grande mestre contemporâneo, Hans Kelsen, que, com mais de noventa anos, sempre se manteve fiel aos seus princípios de normativismo estrito. A título de ilustração, cabe lembrar que Jhering simbolizava a atividade jurídica com uma espada e uma balança: o Direito não seria o equilíbrio da balança se não fosse garantido pela força da espada, consoante é exposto em seu famoso livro. A Luta pelo Direito, que a minha geração lia com entusiasmo e que é pena ande tão esquecido, tantas são as lições magistrais que encerra sobre a dignidade das tarefas do jurista. 25 A teoria da coação se logrou larga adesão na época do predomínio positivista, foi depois alvo de críticas irrespondíveis, a começar pela observação fundamental de que, via de regra, há o cumprimento espontâneo do Direito. Para milhares de contratos que se executam espontaneamente, bem reduzido é o número dos que geram conflitos sujeitos a decisão judicial. Não se pode, pois, definir a realidade jurídica em função do que excepcionalmente acontece. Por outro lado, a coação já é, em si mesma, um conceito jurídico, dando-se a interferência da força em virtude da norma que a prevê, a qual, por sua vez, pressupõe outra manifestação de força e, por conseguinte, outra norma superior, e, assim sucessivamente, até se chegar a uma norma pura ou à pura coação... Foi essa objeção que Hans Kelsen procurou superar com a sua teoria da "norma fundamental", que analisaremos numa de nossas aulas. O que há, porém, de verdade na doutrina da coação é a verificação da compatibilidade do Direito com a força, o que deu lugar ao aparecimento de uma teoria que põe o problema em termos mais rigorosos: é a teoria da coercibilidade, segundo a qual o Direito é a ordenação coercível da conduta humana. A diferença está apenas em um adjetivo, mas é fundamental. Para uns, a força está sempre presente no mundo jurídico, é imanente a ele, e, portanto, inseparável dele. Para outros, a coação no Direito não é efetiva, mas potencial representando como que uma segunda linha de garantia da execução da norma, quando se revelam insuficientes os motivos que, comumente, levam os interessados a cumpri-la. A teoria da coercibilidade, certa enquanto revela a possibilidade de haver execuções jurídicas compulsórias, sem que isso comprometa a sua juridicidade deixa-nos, porém, no vestíbulo do problema, pois surge logo a seguinte pergunta: "Que é que explica essa compatibilidade entre o Direito e a força?". 2.4.5 Teoria Tridimensional do Direito O estudo das diferenças e correlações entre a Moral e o Direito já nos permite dar uma noção do Direito, sem que nos mova a preocupação de definir. Resumindo o já exposto podemos dizer que o Direito é a ordenação bilateral atributiva das relações sociais, na medida do bem comum. Todas as regras sociais ordenam a conduta, tanto as morais como as jurídicas e as convencionais ou de trato social. A maneira, porém, dessa ordenação difere de uma para outra. É próprio do Direito ordenar a conduta de maneira bilateral e atributiva, ou seja, estabelecendo relações de exigibilidade segundo uma proporção objetiva. 26 O Direito, porém, não visa a ordenar as relações dos indivíduos entre si para satisfação apenas dos indivíduos, mas, ao contrário, para realizar uma convivência ordenada, o que se traduz na expressão: "bem comum". O bem comum não é a soma dos bens individuais, nem a média do bem de todos; o bem comum, a rigor, é a ordenação daquilo que cada homem pode realizar sem prejuízo do bem alheio, uma composição harmônica do bem de cada um com o bem de todos. Modernamente, o bem comum tem sido visto, - e este é, no fundo, o ensinamento do jusfilósofo italiano Luigi Bagolini, - como uma estrutura social na qual sejam possíveis formas de participação e de comunicação de todos os indivíduos e grupos. 2.4.5.1 A Intuição de Dante Essa conceituação ética do Direito, que coloca a coação como elemento externo e não como elemento intrínseco da própria vida jurídica, teve uma formulação feliz, por obra não de um jurista, mas de um poeta. Conhecem os senhores evidentemente a personalidade extraordinária do poeta Dante Alighieri. O “divino poeta”, alem de ter-nos legado a Divina Comédia – o poema maravilhoso da Cristandade – deixou obras de Política e Filosofia e, numa delas, esculpidas no espírito dos juristas, pela apreensão genial daquilo que o Direito existe de substancial: “O Direito é uma proporção real e pessoal, de homem para homem, que, conservada, conserva a sociedade; corrompida, corrompe-a”. Dante esclarece que a relação é uma proporção. A proporção é sempre, uma expressão de medida. O Direito não é uma relação qualquer entre os homens, mas sim aquela relação que implica uma proporcionalidade, cuja medida é o homem mesmo. É aqui que se nota a atualidade da conceituação jurídica oferecida por Dante, pois, dentre as múltiplas distinções do Direito, nenhuma é tão fundamental como a que distingue os direito em reais e pessoais. “O Direito é uma proporção real e pessoal, de homem para homem...” parece, àprimeira vista, uma expressão redundante: pessoal, de homem para homem. Se é pessoal, por que dizer de homem para homem? É que, para Dante, o Direito tutela as coisas somente em razão dos homens: a relação jurídica conclui-se entre pessoas, não entre homens e coisas, mas é “real” quando tem uma coisa (res) como seu objeto. A sua definição inspira-se na obra e nos ensinamentos aristotélicos-tomistas e, também, nas grandes lições dos jurisconsultos romanos, especialmente nas lições de Cícero, 27 que dizia que devemos conhecer perfeitamente o homem, a natureza humana para, depois, conhecer o Direito. O Direito, indiscutivelmente, inova, apresenta elementos de renovação permanente, mas conserva, sempre, um fulcro de tradição. 2.4.5.2 Estrutura Tridimensional do Direito O simples fato de existirem várias acepções da palavra Direito já devia ter suscitado uma pergunta, que, todavia, só recentemente veio a ser formulada, isto é: esses significados fundamentais que, através do tempo, têm sido atribuídos a uma mesma palavra, já não revelam que há aspectos ou elementos complementares na experiência jurídica? Uma análise em profundidade dos diversos sentidos da palavra Direito veio demonstrar que eles correspondem a três aspectos básicos, discerníveis em todo e qualquer momento da vida jurídica: um aspecto normativo (o Direito como ordenamento e sua respectiva ciência); um aspecto fático (o Direito como fato, ou em sua efetividade social e histórica) e um aspecto axiológico (o Direito como valor de Justiça). Nas últimas quatro décadas o problema da tridimensionalidade do Direito tem sido objeto de estudos sistemáticos, até culminar numa teoria, à qual penso ter dado uma feição nova, sobretudo pela demonstração de que: a) onde quer que haja um fenômeno jurídico, há, sempre e necessariamente, um fato subjacente (fato econômico, geográfico, demográfico, de ordem técnica etc.); um valor, que confere determinada significação a esse fato, inclinando ou determinando a ação dos homens no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou objetivo; e, finalmente, uma regra ou norma, que representa a relação ou medida que integra um daqueles elementos ao outro, o fato ao valor; b) tais elementos ou fatores (fato, valor e norma) não existem separados um dos outros, mas coexistem numa unidade concreta; c) mais ainda, esses elementos ou fatores não só se exigem reciprocamente, mas atuam como elos de um processo (já vimos que o Direito é uma realidade histórico-cultural) de tal modo que a vida do Direito resulta da interação dinâmica e dialética dos três elementos que a integram1 . Isto posto, analisemos o esquema ou estrutura de uma norma ou regra jurídica de conduta: a) Se F é, deve ser P; b) Se não for P, deverá ser SP2 . Há, por exemplo, norma legal 28 que prevê o pagamento de uma letra de câmbio na data de seu vencimento, sob pena do protesto do título e de sua cobrança, gozando o credor, desde logo, do privilégio de promover a execução do crédito. Logo, diríamos: a) se há um débito cambiário (F), deve ser pago (P); b) se não for quitada a dívida (não P), deverá haver uma sanção penal (SP). Mais tarde, estudaremos melhor essa questão. O que por ora desejamos demonstrar é que, nesse exemplo, a norma de direito cambial representa uma disposição legal que se baseia num fato de ordem econômica (o fato de, na época moderna, as necessidades do comércio terem exigido formas adequadas de relação) e que visa a assegurar um valor, o valor do crédito, a vantagem de um pronto pagamento com base no que é formalmente declarado na letra de câmbio. Como se vê, um fato econômico liga-se a um valor de garantia para se expressar através de uma norma legal que atende às relações que devem existir entre aqueles dois elementos. Pois bem, se estudarmos a história da letra de câmbio, que, numa explicação elementar e sumária, surgiu como um documento mediante o qual Fulano ordenava a Beltrano que pagasse a Sicrano determinada importância, à vista da apresentação do título; se estudarmos a evolução dessa notável criação do Direito mercantil, verificamos que ela veio sofrendo alterações através dos tempos, quer em virtude de mudanças operadas no plano dos fatos (alterações nos meios de comunicação e informação, do sistema de crédito ou organização bancária), quer devido à alteração nos valores ou fins econômico-utilitários do crédito e da circulação garantida da riqueza, até se converter num título de crédito de natureza autônoma, literal, abstrata e exequível. Desse modo, fatos, valores e normas se implicam e se exigem reciprocamente, o que, como veremos, se reflete também no momento em que o jurisperito (advogado, juiz ou administrador) interpreta uma norma ou regra de direito (são expressões sinônimas) para dar- lhe aplicação. Desde a sua origem, isto é, desde o aparecimento da norma jurídica, - que é síntese integrante de fatos ordenados segundo distintos valores, - até ao momento final de sua aplicação, o Direito se caracteriza por sua estrutura tridimensional, na qual fatos e valores se dialetizam, isto é, obedecem a um processo dinâmico que aos poucos iremos desvendando. Nós dizemos que esse processo do Direito obedece a uma forma especial de dialética que denominamos "dialética de implicação-polaridade", que não se confunde com a dialética hegeliana ou marxista dos opostos. Esta é, porém, uma questão que só poderá ser melhor esclarecida no âmbito da Filosofia do Direito. 29 Segundo a dialética de implicação-polaridade, aplicada à experiência jurídica, o fato e o valor nesta se correlacionam de tal modo que cada um deles se mantém irredutível ao outro (polaridade) mas se exigindo mutuamente (implicação) o que dá origem à estrutura normativa como momento de realização do Direito. Por isso é denominada também "dialética de complementaridade". Isto posto, podemos completar a nossa noção inicial de Direito, conjugando a estrutura tridimensional com a nota específica da bilateralidade atributiva, neste enunciado: Direito é a realização ordenada e garantida do bem comum numa estrutura tridimensional bilateral atributiva, ou, de uma forma analítica: Direito é a ordenação heterônoma, coercível e bilateral atributiva das relações de convivência, segundo uma integração normativa de fatos segundo valores. Ultimamente, pondo em realce a ideia de justiça, temos apresentado, em complemento às duas noções supra da natureza lógico-descritiva, esta outra de caráter mais ético: Direito é a concretização da ideia de justiça na pluridiversidade de seu dever ser histórico, tendo a pessoa como fonte de todos os valores. Se analisarmos essas três noções do Direito verão que cada uma delas obedece, respectivamente, a uma perspectiva do fato ("realização ordenada do bem comum"), da norma ("ordenação bilateral-atributiva de fatos segundo valores") ou do valor ("concretização da ideia de justiça"). Donde devemos concluir que a compreensão integral do Direito somente pode ser atingida graças à correlação unitária e dinâmica das três apontadas dimensões da experiência jurídica, que se confunde com a história mesma do homem na sua perene faina de harmonizar o que é com o que deve ser. Se, como bem adverte Jackson de Figueiredo, a vida vale sobretudo como oportunidade de aperfeiçoar-nos, o Direito, em razão de sua própria estrutura e destinação, representa uma das dimensões essenciais da vida humana. 30 3 NORMA JURÍDICA 3.1 INTRODUÇÃO AS NORMAS JURÍDICAS Normas Jurídicas são regras sociais, cuja função é disciplinaro comportamento dos homens. Em um conceito mais definido diríamos que as normas jurídicas são regras sociais garantidas pelo poder de coerção do Estado, tendo como objetivo teórico a promoção da justiça. Estas podem ser: a) Normas morais – aquelas que se baseiam na consciência moral das pessoas (valores e princípios); b) Normas religiosas – aquelas que se baseiam na fé revelada pela religião. 3.2 CONCEITO DE NORMAS JURÍDICAS Na Teoria Geral do Direito o estudo da norma jurídica é de fundamental importância, porque se refere a elemento essencial do Direito objetivo. Ao dispor sobre fatos e consagrar valores, as normas jurídicas são o ponto culminante do processo de elaboração do Direito e a estação de partida operacional da Dogmática Jurídica, cuja função é sistematizar e descrever a ordem jurídica vigente. Conhecer o Direito é conhecer as normas jurídicas em seu encadeamento lógico e sistemático. Para promover a ordem social, o Direito Positivo deve ser prático, ou seja, revelar-se mediante normas orientadores das condutas interindividuais. Não é suficiente, para se alcançar o equilíbrio na sociedade, que os homens estejam dispostos a pratica da justiça; é necessário que se lhes indique a formula de justiça que satisfaça a sociedade em determinado momento histórico. A norma jurídica exerce justamente esse papel de ser o instrumento de definição da conduta exigida pelo Estado. Ela esclarece ao agente como e quando agir. O Direito Positivo, em todos os sistemas, compõem-se de normas jurídicas, que são padrões de 31 conduta ou de organização social impostos pelo Estado, para que seja possível a convivência dos homens em sociedade. Pelas regras jurídicas o Estado dispõe também quanto à sua própria organização. Em síntese, norma jurídica é a conduta exigida ou o modelo imposto de organização social. As expressões normas e regra jurídicas são sinônimas, apesar de alguns autores reservarem a denominação regra para o setor da técnica e, outros, para o mundo natural. Distinção há entre norma jurídica e lei. Esta é apenas uma das formas de expressão das normas, que se manifestam também pelo Direito costumeiro e, em alguns países, pela jurisprudência. 3.3 CARACTERÍSTICAS DAS NORMAS JURÍDICAS Se levarmos em conta, ma pesquisa dos caracteres das normas jurídicas, todas as categorias de regras existentes; forçosamente chegaremos à mesma conclusão que Miguel Reale: “o que efetivamente caracteriza uma norma jurídica, de qualquer espécie; é o fato de ser uma estrutura proposicional enunciativa de uma forma de organização ou de conduta, que deve ser seguida de maneira objetiva e obrigatória”. Isto porque há regras jurídicas de natureza tão peculiar, que escapariam a quase todos os critérios lógicos de enquadramento. O art. 579 do Código Civil de 2002, ao definir o comodato como “empréstimo gratuito de coisa não fungíveis”, expressa, por exemplo, uma norma jurídica que não encerra, em si, nenhuma determinação. Considerando-se, contudo, as categorias mais gerais das normas jurídicas, verifica-se que estas apresentam caracteres que, na opinião predominante dos autores, são seguintes: bilateralidade, generalidade, abstratividade, imperatividade, coercibilidade e promoção da justiça. a) Bilateralidade: O Direito existe sempre vinculando duas ou mais pessoas atribuindo poder a uma parte e impondo dever à outra. Bilateralidade significa, pois, que a norma jurídica possui dois lados: um representado pelo direito subjetivo e outro pelo dever jurídico, de tal sorte que um não pode existir sem o outro. b) Generalidade: O princípio da generalidade revela que a norma jurídica é preceito de ordem geral, obrigatório a todos que se acha em igual situação jurídica. c) Abstratividade: Visando atingir o maior numero possível de situações, a norma jurídica é abstrata, regulando os casos dentro do seu denominador comum, ou seja, com ocorrem via de regra. 32 d) Imperativiade: Na sua missão de disciplinar as maneiras de agir em sociedade, o Direito deve representar o mínimo de exigências, de determinações necessárias. Para garantir efetivamente a ordem social, o Direito se manifesta através de normas que possuem caráter imperativo. e) Coercibilidade: nela a conduta transgressora sofre coerção, ou seja, repressão, uso da força. O Direito existe coerção (força) potencial do Estado, que se concretiza em alguma forma de sanção (punição). A sanção deve ser aplicada à pessoa ou instituição que transgrediu a norma jurídica; tem o poder de imperar, de impor a uma parte o cumprimento de um dever. f) Promoção da Justiça: a norma jurídica deve ter em seu conteúdo a finalidade de estabelecer a justiça entre os homens. 3.4 CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS A classificação apresentada por García Máynez, por sua clareza e objetividade fornece ao jurista um conjunto terminológico e conceitual útil ao discurso jurídico. Os critérios de sua classificação são os seguintes: a) quanto ao sistema a que pertencem; b) quanto à fonte; c) quanto aos diversos ambitos de validez; d) quanto à sanção; e) quanto à qualidade; f) quanto às relações de complementação; g) quanto às relações com a vontade dos particulares 33 4 DIREITO NATURAL E DIREITO POSITIVO A tradição do pensamento jurídico ocidental é marcada pela distinção entre direito positivo e direito natural. Embora, do ponto de vista teórico, essa distinção já possa ser encontrada no pensamento grego, o uso da expressão "direito positivo" é bastante tardia. O direito romano não faz uso do termo "positivo". Entre os estudiosos romanos, ele é citado uma vez por Áulio Gélio: "Quod P. Nigidus arguitissime docuit nomina non positiva esse sed naturalia" ("Conforme ensinou de modo muito arguto P. Nígido, os nomes não são positivos postos pelos homens, mas naturais"), para se referir à linguagem, não ao direito. Referido ao direito, o termo positivo aparece pela primeira vez no Século IV, em Calcídio, um filósofo neoplatônico que, em seu comentário ao Timeu de Platão, diferencia "justiça natural" de "justiça positiva". Segundo esse autor, a justiça natural decorre das leis naturais que regem o universo, a criação e a natureza em geral, enquanto a justiça positiva regula as relações sociais. A distinção de Calcídio ainda está distante da que aparece no direito moderno. Segundo resultados de pesquisas feitas por Kurttner, e aceitas por Norberto Bobbio (cf. Norberto Bobbio. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 1996.), o primeiro autor no qual aparece uma distinção entre jus naturale e jus positivum aceitável entre os modernos é Pedro Abelardo (1079-1142). Em seu Dialogum inter philosophum, judaeum et christianum, Abelardo chama de direito positivo "aquele que é posto pelos homens" (illud est quod ab hominibus positum) e o direito natural é aquele que não é posto por eles, mas por algo ou alguém que está acima deles, a natureza ou Deus (considerado por Abelardo o autor da natureza). 4.1 DIREITO NATURAL O Direito Natural revela ao legislador os princípios fundamentais de proteção ao homem, que forçosamente deverão ser consagrados pela legislação, a fim de que se obtenha 34 um ordenamento jurídico substancialmente justo. O Direito Natural não é escrito, não é criado pela sociedade, nem é formulado pelo Estado. Com o adjetivo natural indica, é um Direito espontâneo, que se origina da própria natureza social do homem e que é revelado pela conjugação da experiência e razão. É constituído
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