Prévia do material em texto
QUADRO VI FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL BETIM, 2011 DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 SUMÁRIO Decreto que regulamenta o registro do patrimônio imaterial em Betim ................... 004 1. Introdução ................................................................ ............................. 005 2. Contextualização histórica, sociológica e antropológica ................................... 007 3. Histórico de Betim ................................................................ ................... 016 4. A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso – uma história .................................... 040 5. A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso e sua relação com o Município de Betim .. 043 6. Descrição dos lugares e suportes físicos e agenciamento do espaço para a atividade ................................................................ ................................ 044 7. A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso – formato, conteúdos, narrativas, significados ..................................................... 046 8. Os protagonistas da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso: trajetórias, papéis, funções, organização .......................................................... 059 9. Os recursos para a realização da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso ................ 062 10. Produtos da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso ........................................ 063 11. A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso e suas relações com o público .............. 064 DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 12. Inventário ................................................................ ........................... 065 13. Identificação de atividades correlatas ....................................................... 093 14. Delimitação e descrição da área de ocorrência ............................................ 094 15. Salvaguarda e Valorização ................................................................ ...... 097 16. Documentação Fotográfica ................................................................ ..... 101 17. Registro audiovisual ................................................................ .............. 115 18. Referências ................................................................ ......................... 116 19. Ficha Técnica ................................................................ ...................... 119 20. Trâmite do Registro ................................................................ .............. 121 21. Documentos diversos ................................................................ ............ 135 DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 LEI DE REGISTRO DO PATRIMÔNIO IMATERIAL A Lei Municipal Nº 2.944, de 24 de setembro de 1996, que institui a proteção do patrimônio cultural de Betim, já prevê o registro do patrimônio imaterial. Esta Lei já foi enviada ao IEPHA em 1998. O Município regulamentou a matéria através do Decreto Nº 16.389, de 26 de outubro de 2000. O conjunto de peças legais foi avaliado pelo Sr. Carlos Rangel, do IEPHA, em 23 de novembro de 2009, e reconhecido como válido. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 1. INTRODUÇÃO: Balt-hazar acendeu sua lâmpada de azeite e iluminou, com sua luz bruxuleante, o mapa que abrira sobre o chão. “Aqui está ela”, disse marcando com o seu dedo um lugar no mapa. “Beth- léhem. Fica precisamente na divisa entre dois grandes reinos. À esquerda está o Reino da Fantasia. À direita está o Reino da Realidade. São reinos perigosos. Quem mora só no Reino da Fantasia fica louco. Quem mora só no Reino da Realidade fica louco. Para se fugir da loucura há de se ficar transitando de um para outro, o tempo todo. Somente os moradores de Beth-léhem estão livres da necessidade de estar, o tempo todo, indo de um reino para outro. Porque Beth-léhem fica bem na divisa (...). (Rubem Alves. Os três reis) As folias são manifestações escassas na Betim do século XXI, cidade de quase quinhentos mil cidadãos, da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Mas sua memória é muito recente e podem ser, facilmente, encontradas dezenas de foliões em diversas regiões da cidade. Durante os dois últimos empreendimentos de inventário do patrimônio cultural realizados na cidade, pela Fundação Artístico Cultural de Betim, os inventários das regionais Vianópolis e Citrolândia, respectivamente nos anos de 2009 e 2010, um retrato parcial dessa realidade pode ser delineado: as comunidades dessas duas regionais relataram a existência de doze folias, em atividade ou recentemente DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 inativas. Durante o aprofundamento das pesquisas, o Departamento de Memória e Patrimônio Cultural da Fundação pôde identificar apenas uma folia ativa e presenciou o processo de desativação de uma outra; e ainda está registrando, nos últimos meses, as tentativas de revitalização de uma folia inativa há alguns anos. Dentre os integrantes das folias inativas, muitos vivem em Betim há décadas e foram atingidos pelo acelerado processo de urbanização pelo qual passou a cidade. Os antigos territórios das folias receberam novos moradores, herdeiros de tradições culturais diversas, e não houve mais a necessária renovação desses grupos, pelo ingresso de novos foliões e moradores dispostos a receber as folias. O regime de trabalho nas cidades, com seus horários mais rígidos e inflexíveis às práticas rituais, assim como o crescimento de grupos religiosos não-católicos são relatados como fatores de desvitalização das folias. Por outro lado, a própria urbanização trouxe muitos foliões, transplantados de regiões rurais e pequenas cidades do interior de Minas Gerais. Estes relatam experiências de formação de grupos em Betim, experiências essas que duraram alguns anos ou décadas, até o envelhecimento dos foliões, ou sua conversão a outros credos. Uma experiência da Fundação com a música de viola, o Projeto “Quintais”, que reúne periodicamente até duas centenas de “violeiros”, não por acaso também foliões ou ex-foliões, revela uma “saudade” das folias e o desejo de políticas públicas que as fomentem e revitalizem. O presente registro, de uma folia que venceu os fenômenos sociais relatados e reencontrou os caminhos de sua vitalidade – a Folia de Reis do Bairro Santo Afonso, pode fundamentar as políticas públicas posteriormente adotadas para a garantia do direito à memória e à cultura. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 2. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA, SOCIOLÓGICA E ANTROPOLÓGICA A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso faz parte de uma tradição de festas da natividade das divindades, que remonta à Antiguidade Clássica. Essas festas, designadas “pagãs” pelo cristianismo, foram por este apropriadas e ressignificadas, mesclando seus conteúdos com elementos cristãos. Os romanos, por exemplo, cultuavam o Deus-Sol Invencível em festejos depois adotadospelos egípcios. As festas romana e egípcia aconteciam em datas diferentes, mas com intervalo de poucos dias entre elas, e, no ano 138, o Papa São Telésforo as regulamentou, isto é, tornou-as parte das festividades cristãs. Mais tarde, em 378, o Papa Júlio I considerou que, como não havia data fixa para a comemoração do nascimento de Jesus, o dia 25 de dezembro seria dedicado a esta recordação, ficando o 06 de janeiro como Dia de Reis. A partir daí, as festas da natividade no âmbito do cristianismo foram, pouco-a-pouco, sendo acrescidas de elementos diversos, como as figuras de Gaspar, Melchior e Baltazar, os três reis magos que, segundo a tradição, foram do Oriente à Judéia para saudar Jesus Cristo. Conta ainda a tradição que eles levavam consigo, para presentear o Menino, ouro, incenso e mirra, que representariam as três dimensões do Messias: sua realeza (ouro), sua divindade (incenso) e humanidade, dado que o óleo de mirra era, então, utilizado para embalsamar os mortos. Uma vertente da tradição cultiva a idéia de que os reis magos se DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 converteram e foram batizados por São Tomé, depois pregando o Evangelho em seus países de origem. Os reis magos foram canonizados no século VIII, sendo, por isso, referidos como Santos Reis. O fundamento bíblico das folias está nos evangelhos de Lucas (capítulo 2, dos versículos de 1 a 20) e Mateus (capítulo 2, versículos de 1 a 12). Há, porém, uma diferença importante entre as duas narrativas. Lucas se preocupa em descrever a viagem de José e Maria a Belém e em justificar por que fizeram aquela viagem – houve um decreto do imperador romano, ordenando um recenseamento e todos deviam se alistar na sua própria cidade. Chegando a Belém, deu-se a hora do Nascimento; a cidade estava cheia e tiveram que se abrigar nos arredores. Não se fala de Reis Magos. Toda a cena é composta pelo anjo que avisa os pastores, José, Maria e o Recém-Nascido. Não acontece a visita de reis vindos de longe, mas, em contrapartida, quando os pastores chegaram à manjedoura, uma multidão, um exército de anjos desce do céu, dando Glória a Deus. Mateus já vai direto ao assunto: “Tendo Jesus nascido em Belém...”. E é aí que se encontra a origem mais remota da folia de reis. Já no primeiro versículo da narrativa, o evangelista diz: “eis que vieram magos do Oriente”. Mas o texto bíblico não diz quantos eram, nem seus nomes. No desenvolvimento da devoção ao longo dos séculos, teólogos, pintores, hagiógrafos e os chamados padres da Igreja foram definindo o que não foi dito no texto sagrado. Houve muitas indagações sobre quantos eram. Poderiam ser os quatro sugeridos contemporaneamente pela literatura e pelo cinema. Várias versões orientais diziam, entretanto, que eram doze. Mas, devido aos presentes assinalados no versículo 11 – ouro, incenso e mirra –, todas as tradições ocidentais se fixaram em três reis, com os nomes de Gaspar, Baltazar e Belchior. (PESSOA, 2007, p. 75). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 A devoção aos Reis Magos desenvolveu-se por toda a Europa durante a Idade Média. Segundo Jadir Pessoa (2007), isso se deve à chegada dos restos mortais destes três entes míticos à catedral de Colônia (Alemanha), em 1164. Eles para lá teriam sido trasladados de Milão (Itália) como despojos de guerra, numa conquista de Frederico Barbarrocha. E para Milão teriam sido levados no século IV ou V como presente especial da Imperatriz Helena, de Constantinopla (PESSOA, 2007, p. 63). Enquanto fizeram todo esse percurso, foram surgindo em diversos países pinturas em catacumbas, quadros, retábulos, esculturas, altos-relevos em sarcófagos, apresentando a visita dos Reis Magos ao Menino Jesus. E, a partir de Colônia, espalharam-se por toda a Europa como parte das grandes peregrinações, a exemplo do que já acontecia em Santiago de Compostela, Terra Santa e Roma. Como heranças diretas dessas peregrinações, surgiram então os cânticos populares, muito importantes em toda a Europa medieval, chamados Noëls na França, Villancicos na Espanha e Folias em Portugal. Provavelmente, esses cantos, acrescidos do teatro de Gil Vicente, depois de José de Anchieta e Manoel da Nóbrega, constituem as matrizes mais diretas das diversas devoções existentes no Brasil, como reisados, bois-de-janeiro, bois-de-reis, pastorinhas e, especialmente, no chamado “corredor das bandeiras” (SP, MG, GO, MS), as folias de reis. Pela dinâmica natural ou pelo menos inevitável de uma espécie de dispersão cultural, elas podem ser encontradas também hoje, ainda que com distribuição menos regular, nos estados da Bahia, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Maranhão e Paraná, e sabe-se de registros de folia de reis até mesmo no Rio Grande do Sul (PESSOA, 2007, p. 63-64). O que individualiza as folias de reis diante das celebrações DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 afins é, segundo Eloísa Branches (2007, p. 25), a presença do palhaço, cuja performance inclui um texto falado. No essencial, a folia é um ritual itinerante do catolicismo popular, que atualiza a memória da narrativa bíblica da visita dos Reis Magos ao Menino Jesus, oferecendo cânticos e preces e pedindo ofertas para os festejos finais do ciclo de cada ano. Sua origem remota, portanto, é a Ibéria, mas no Brasil as folias desenvolveram um caráter mais sacro, enquanto que em Portugal, o elemento profano, próximo da pândega, seria mais acentuado. A tradicional localização rural da folia de reis, presente em algumas definições clássicas dos pesquisadores, deve ser agora relativizada, pelo evidente fato de que o intenso êxodo rural ocorrido nas décadas de 1960 a 1980, no Brasil, provocou um significativo deslocamento dessa prática, que hoje já se pode dizer majoritariamente urbana (PESSOA, 2007, p. 70). Até o final dos anos de 1960, a folia de reis sobreviveu praticamente como uma manifestação cultural e religiosa da zona rural. De acordo com Carlos Steil, ser católico é menos uma opção religiosa do que uma condição de vida no meio rural. Neste catolicismo informado pela experiência corporal dos devotos “cabe ao praticante beber de todas as fontes, de modo que o sincretismo é a própria condição de acesso à plenitude e multiplicidade do sagrado. O espaço privilegiado da experiência religiosa não são os sistemas religiosos em si, mas as fronteiras entre eles” (STEIL, 2001, p. 23). Se no catolicismo institucionalizado, a liderança religiosa conduzida por especialistas é consumida por leigos, nesta religiosidade popular predomina a produção de auto-consumo, conforme definida por Bourdieu (1994) (BRANCHES, 2007, p. 24). Os anos 60 foram o fim de um relativo isolamento vivido pelo campo. Na passagem para os anos de 1970, DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 começou a haver uma redução da população rural e ao mesmo tempo surgiu a televisão. Logo depois, veio a melhoria das estradas e dos transportes de maneira geral, que, juntos, reduziram significativamente a distância entre o rural e o urbano. Aquele antigo encantamento, a partir daí, teve que ser dividido com outros atrativos poderosos do mundo urbano. Veio então um período de quase três décadas desfavoráveis à reprodução das folias, cada terno ou grupo sendo afetado de maneira diferenciada: envelhecimento ou redução do quadro, redução do número de moradores a serem visitados e, em muitos casos, até a extinção de grupos.Contraditoriamente, o mesmo processo de modernização da sociedade brasileira, que antes dificultava a reprodução das manifestações populares tradicionais, ao final dos anos de 1990 já lhes estava sendo benéfico. É corrente entre folcloristas a idéia de que a associação com o turismo, mesmo sendo um risco à conservação da originalidade, é inevitável para a sobrevivência das manifestações ditas folclóricas. Nos casos de algumas tradições já extintas, a criação de grupos parafolclóricos, para apresentação em escolas e outros espaços, é a sua única possibilidade de sobrevivência (PESSOA, 2007, p. 72-3). Os grupos de folia estão tendo maiores oportunidades de se reproduzir, tanto no campo como nas cidades e, inclusive, de se apresentarem em público, fora do ciclo, especialmente nos Encontros de Folias, como acontece em Ribeirão Preto (SP), em Brasília, em Aparecida do Norte (SP), em Muqui (ES) e em Goiânia. E esses encontros começam a conquistar a atenção de observadores vindos do teatro, da dança, da fotografia. 2.1. Conteúdos e significados das folias DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 De um ponto-de-vista antropológico, as folias foram vistas até os anos 1960 como parte do “folclore” brasileiro. De lá para cá, mudanças de perspectiva teóricas as localizam no campo do catolicismo popular e defendem que essas manifestações não devem ser consideradas como sobrevivências culturais de um passado findo, mas formas como grupos muito atuais lidam com seus contextos sócio- culturais. Um exemplo é o significado da peregrinação: segundo Carlos Brandão, citado por Eloísa Branches (2007), a peregrinação, como forma de relacionamento diferente da ordem hierárquica social cotidiana, proporciona uma experiência de comunitas na qual o indivíduo se distancia do seu papel social. Também o ritual da visita é fulcral na manifestação. Nele, dissolvem-se as fronteiras entre o público e o privado (a rua e a casa), tão marcados nas sociedades contemporâneas. As casas adquirem, momentaneamente, um estatuto público e sagrado. Esse ritual é baseado ainda numa relação de troca material e espiritual entre os devotos, o dono-da-casa e o Santo Reis1. Os devotos abençoam a casa com cantos sagrados e recebem dinheiro dos donos-das-casas para a realização da festa em homenagem ao Santo, que acontece no final do período de peregrinação. A ordem capitalista, como a nomeou Carlos Brandão, fica assim questionada, pois é uma outra economia de trocas que predomina nessas manifestações. O olhar contemporâneo, urbano e politicamente correto deve observar alguns requisitos ao presenciar a folia. Esta deve ser entendida em sua globalidade, que não inclui apenas a saída às ruas, a peregrinação e as visitas. Um 1 O Santo Reis empregado no singular é significativo da interpretação de um episódio bíblico pelo catolicismo popular: os três Reis Magos são condensados na figura de um Santo. No texto, a opção em manter o termo Santo Reis segue a maneira como as pessoas das folias falam desta devoção. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 exemplo de como a perspectiva do todo no ritual é imprescindível para a compreensão de qualquer aspecto que o integre são as relações de gênero. Se uma pessoa chega a uma casa, vê uma folia de reis cantando e toma esta cena isoladamente, provavelmente vai dizer que se trata de um ritual machista, que não permite a participação das mulheres. Hoje já se torna muito mais comum a participação de mulheres na cantoria de folia – como mostra Eloísa Brantes (2007) a respeito do Reisado do Mulungu, cantado exclusivamente por mulheres solteiras, separadas e viúvas. Mas, tradicionalmente, toda a instrumentação e vozes são desenvolvidas por homens. Isso não é suficiente para se dizer que não há lugar para a mulher. No seu todo, há muitas funções desenvolvidas por mulheres, como confecção dos enfeites, preparação da comida, direção das rezas de terço e outras orações, etc. (PESSOA, 2007, p. 71). As folias, não raro, são grupos familiares, cuja atuação está profundamente marcada por uma narrativa que lhes dá seus contornos. A norma é um dos universais da cultura. Nenhum grupo humano sobrevive sem alguma forma de coerção social. A folia de reis não conseguiria ser diferente. Mas essas normas têm um sentido especial. Elas atestam a leitura que a folia faz da narrativa evangélica, base religiosa da tradição. Normalmente, o embaixador ou mestre ou, ainda, o capitão de uma folia é o portador do conteúdo axial do ritual. Ele o guarda, zela por sua observância e freqüentemente toma a iniciativa de repassá-lo a um filho ou parente próximo. E aquilo de que o embaixador mais deve saber reporta-se, fundamentalmente, às duas passagens bíblicas chamadas evangelhos da infância de Jesus, registrados apenas por Mateus e Lucas (PESSOA, 2007, p. 73) Mas o palhaço (também conhecido como “boneco” ou “bastião”) não pode prescindir desses componentes básicos DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 na ponta da língua. É que, por tradição, o palhaço é o guardião do Menino Jesus. Ele é o único que pode passar à frente da Bandeira – o objeto simbólico mais importante desta religiosidade –, sempre que necessário, para exercer essa função de guardião. Por isso, ele se torna o ponto de contato entre os foliões e o morador. Para os que seguem com rigor a tradição, o dono da casa em geral se dirige primeiro ao palhaço. E pode acontecer que ele trave com o palhaço um diálogo, perguntando, por exemplo: “Boneco, de onde vocês estão vindo?” Nessa hora, o palhaço tem que responder: do Oriente. Uma segunda pergunta é imediatamente posta: “E para onde vocês estão indo?”. E a resposta aceitável é: Pra Belém. Na seqüência, uma terceira pergunta é acrescida: “E o que é que vocês vão fazer lá, Boneco?”. O palhaço deve concluir: Vamos visitar o Menino Jesus. Se não forem essas as respostas, será a completa desonra para toda a folia e, segundo os costumes mais antigos, é um caso em que o morador pode prender a bandeira, exigindo do embaixador um rosário de versos, redimindo todo o grupo. Normalmente, quando uma pessoa vai “pegar a máscara” – assumir a função de palhaço – pela primeira vez, há toda uma sabatina de algum folião mais velho, para saber se ele tem essas respostas bem preparadas. Há também um processo de aprendizagem que poderia ser classificado como instrumental, no sentido pragmático, feito para o desempenho de uma função. É o caso de um adolescente que começa a aprender a tocar violão na folia de reis ou para tocar na folia de reis. Depois, muitos que assim agem acabam ultrapassando essa perspectiva instrumental. Mesmo no interior do ritual, é comum essa expansão do aprendizado. Um folião pode aprender a cantar a quarta voz e permanecer anos a fio nesta mesma função. Outro pode DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 começar por ela e em pouco tempo pode saber cantar todas as outras ou pelo menos as que mais se adaptam ao seu timbre de voz. O mesmo acontece com os instrumentos. Mesmo se um folião não tem ampla bagagem de atuação musical fora da música da folia – o reis –, durante o giro de casa em casa ele pode ser capaz de tocar todos ou a maioria dos instrumentos. Os muitos casos em que isso acontece são uma prova de uma espécie de auto-suficiência da folia: ela precisa de tocadores paraos instrumentos e ela os motiva a aprender pelo menos aqueles básicos para a sua reprodução. Todos os membros da folia devem também aprender e respeitar assiduamente as evitações codificadas para o ciclo: não se pode passar os instrumentos por debaixo dos arames ao atravessar uma cerca e, ainda, a folia não pode cruzar um caminho onde ela já passou. Essa última interdição é uma forma segura de que a folia se mantém fiel ao fato bíblico que lhe dá origem. Como o Rei Herodes tentou enganar os magos, dizendo-lhes que também queria adorar o Menino Jesus, pedindo-lhes que lhe avisassem onde o teriam encontrado, o Evangelho de Mateus, no versículo 12 da narrativa já citada, diz: “Avisados em sonho que não voltassem a Herodes, regressaram por outro caminho para a sua região”. No desenvolvimento do ciclo, todos são de acordo que o personagem mais importante é o dono da casa. Cada casa onde a folia está cantando transforma-se, naquele momento, em uma Belém provisória. É como se, ao longo do ciclo da folia, a visita dos Três Reis ao Menino Jesus tivesse que ser atualizada em cada casa. Nas casas onde há um presépio instalado, isso fica mais explícito, com o aumento dos versos a serem cantados. Em todos os casos, então, um bom folião aprendeu e jamais se esquecerá que deve fazer todas as vontades do dono da casa – chamado por todos de patrão (PESSOA, 2007, p. 74-7). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 6 Um exemplo advindo da folia estudada por Pessoa (2007) é que, na chegada em uma casa, canta-se saudando o morador, dizendo que é uma semelhança da viagem dos Três Reis, etc. Acontece então o verso final da chegada, que é a entrega da bandeira para o dono da casa. A entrega da bandeira é um sinal da vinda do sagrado ao espaço mais reservado da fé, que é a casa do morador. Nesse momento, estaria encerrada a primeira parte da cantoria e se faria uma pausa. Mas, acontece que, se o morador não ficou satisfeito e quer escutar mais, ele se ajoelha. Aumenta-se então o trabalho dos foliões, que, conduzidos pelo embaixador, emendam mais alguns versos (PESSOA, 2007, p. 78) Segundo a tradição sociológica francesa, de Durkheim e Maurice Halbwachs, introduzida no Brasil especialmente por Ecléa Bosi, a memória não pode ser estudada como fato em si. Recordar não é apenas lembrar ou reviver, mas refazer, reconstruir com as idéias de hoje as experiências do passado. E a memória não é individual, é sempre coletiva. Não é apenas o fato de o indivíduo espontaneamente trazer para o presente alguma coisa supostamente perdida em algum lugar do passado. É refazer o passado, com os ingredientes dados pelo grupo social em que se vive. Nesta perspectiva, memória é trabalho, é todo o esforço de um grupo no sentido de convencionalizar o seu presente, e esse trabalho geralmente acontece a partir da necessidade do grupo de garantir a coesão necessária à sua reprodução. Isso é muito verificável na folia de reis. É muito comum nos momentos de pausa da cantoria, ou, quando os foliões estão andando pelas estradas, algum folião mais velho contar uma história contendo algum fato importante, às vezes fantástico, da constituição do ritual. Há senhas muito claras para essas situações. Em geral, as histórias começam com: “uma vez nós saímos com uma folia”, “uma ocasião nós chegamos com uma folia na casa de fulano de DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 7 tal”, etc. O conteúdo desses casos é quase sempre reforçando a coesão havida, o respeito cultivado em relação à devoção, o zelo em relação à correta aplicação de instrumentistas, cantores e outras funções, etc. O recurso pode ser o inverso também, com a narração de fatos em que nada disso foi observado e a folia se viu embaraçada, impedida de continuar o giro. A função de todo esse trabalho da memória não é apenas enobrecer um passado feliz da crença, povoado de pessoas importantes para o seu surgimento; menos ainda punir as pessoas mal-aplicadas em relação às suas regras. Trata-se de um trabalho coletivo, que acontece toda vez que a coesão do grupo se vê ameaçada, que a tradição se vê descaracterizada ou que as obrigações da devoção correm algum risco de descrédito (PESSOA, 2007, p. 79). Se tiverem razão alguns analistas contemporâneos, que dizem que o mundo agrário está subsumido pelo grande capital flutuante pelo mundo afora e que, por conseqüência, a mudança mais importante do final de século XX foi a “morte do campesinato”, podemos dizer que não há nada mais anacrônico que a sobrevivência das manifestações populares de origem marcadamente rural, especialmente a folia de reis. Ela aposta numa lógica econômica que não existe mais, aposta na existência de uma população e num comunitarismo rurais já sensivelmente reduzidos, e aposta numa autonomia organizativa também difícil de ser reproduzida. Especialmente no caso do ressurgimento de grupos de folias em contextos urbanos, a lógica do trabalho urbano com que são forçados a se confrontarem é acintosamente negadora dessa possibilidade de autonomia. O antigo agregado ou sitiante das fazendas não encontrava o menor problema em se retirar da lida do curral ou da sua roça durante os dias de giro da folia – um filho, parente ou vizinho assumia o curral e a roça podia até agüentar uns DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 8 dias a mais no mato. Do hoje componente de uma folia urbana não se pode dizer o mesmo (PESSOA, 2007, p. 80). A que se deve essa teimosia? Muitas hipóteses poderiam ser pesquisadas e discutidas em vista de uma resposta a essa pergunta. Poder-se-ia dizer, por exemplo, que esse processo de transformações ainda está em curso e que, quando estiver devidamente concluído, haverá uma acomodação urbana mais segura para as pessoas, que não terão mais tanta necessidade de cultivar essa saudade do mundo rural perdido. Uma outra hipótese menos fatalista poderia ser o reconhecimento de um recurso relativamente contestador nessas ressurgências, em face de uma situação de desenraizamento, na qual se encontram no contexto urbano (PESSOA, 2001). Continuar a fazer folia de reis pode ser uma perseverante forma de denunciar os descaminhos – individualismo, desumanização, destruição do sujeito – da sociedade atual e de expressar, segundo a leitura dos seus praticantes, as bases ou os princípios humanos fundamentais do seu reordenamento. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 9 3. HISTÓRICO DE BETIM 3.1. A ocupação As mais remotas notícias sobre a ocupação da região de Betim, afora a ocupação provável por indígenas semi- nômades, remonta ao início do século XVIII. Toda a região hoje denominada Minas Gerais estava agitada à época; a descoberta de riquezas minerais atraía aventureiros em busca de glória e outros tantos, em seu rastro, ocupados em sobreviver. O ambiente era de mobilidade espacial constante. A região onde hoje fica Betim fazia parte de uma importante rota que vinha de São Paulo a Pitangui – e era a rota dos bandeirantes atraídos pelas descobertas minerais na citada povoação – e também da rota de abastecimento que vinha da Bahia às Minas. A importância desta última rota só ganha dimensão a partir do olhar mais atento dos historiadores sobre a diversificação econômica das Minas no auge da mineração. As Minas vinham sendo vistas como lugar de escassez, de total dependência do abastecimento proveniente de outras capitanias e concentraçãoda atividade econômica na mineração. Novos estudos têm demonstrado a importância da produção própria e da circulação de mercadorias no interior da capitania. Betim, antes de assim se chamar, fazia parte deste entrecruzar de caminhos. Por aqui, chegavam os escravos transferidos do nordeste para as Minas, que eram registrados na localidade das Abóboras, depois denominada, por isso, Contagem das Abóboras. Em Contagem, também se DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 0 registrava o gado entrado nas Minas e destinado a abastecê- las. A contagem, evidentemente, tinha objetivos fiscais. Também por essa razão o primitivo nome de Belo Horizonte era Curral D’El Rey, ou seja, o local onde o gado era armazenado, depois distribuído, tendo sido devidamente taxado. A descoberta de ouro em Minas Gerais, em 1690, quando já estava decadente a indústria do açúcar no litoral nordestino, proporcionou novas atividades econômicas ao sistema colonial português. A coroa proibiu qualquer plantação de alimentos ou criação de gado na zona aurífera, para não desviar mão-de-obra da mineração. Assim os garimpos tornaram-se centros de compra de alimentação e de animais de transporte. É claro que houve resistência a tal proibição, como mostra a instalação de criadores de gado em Betim bem no início do século XVIII, conforme se comenta adiante. Era proibido aos tropeiros ou viajantes pousarem nas estradas ou caminhos do município impedindo o trânsito. Tinham que afastar os animais do centro da estrada. Era de interesse da coroa portuguesa que os caminhos às vilas fossem de fácil acesso, pois dessa maneira, além de abastecê-las dos mais diversos gêneros, facilitava-se também a saída do metal precioso para o erário real. Com esses intuitos, foram emitidos bandos e outras ordens reais que se destinavam à construção de pousadas para viajantes e a manutenção dos caminhos de acesso às vilas do ouro. Em um dos primeiros núcleos de povoação da atual Betim, logo no início do século XVIII, foi construído um casarão destinado ao uso como pousada e venda de secos e molhados, especialmente para as tropas que por aqui passavam. Este casarão abriga atualmente a Casa da Cultura Josephina Bento. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 1 O fato de Joseph Rodrigues Betim ter solicitado uma sesmaria nesta região em 1711 não foi um acaso depois tornado conhecido por ter originado uma povoação. Provavelmente, esta solicitação fez parte de uma estratégia dos grupos paulistas, então em franco confronto com os portugueses preocupados em garantir a si próprios a reserva da área em que se encontravam os minerais preciosos. Como se sabe, os paulistas foram os pioneiros das descobertas, mas foram imediatamente confrontados pelos “reinóis” que, como colonizadores, se sentiam no direito de se apossar das riquezas. Ora, em 1708 ocorrera um sangrento conflito entre bandeirantes paulistas e portugueses, conhecido como Guerra dos Emboabas. Emboabas foi o nome dado pelos paulistas aos “reinóis”, e significava “estrangeiros”, “invasores”. Apesar da maneira razoável como o conflito se resolveu em prol dos paulistas, estes se sentiam ameaçados: percebiam que cabia a eles a tarefa de localizar veios auríferos, mas que a posse dos mesmos não se encontrava assegurada, na medida em que os “reinóis” a cobiçavam. Daí intensificar-se a solidariedade entre estes aventureiros que, na historiografia oficial, figuram como heróis. A solicitação de sesmaria por Joseph Rodrigues Betim, ligado por parentesco e amizade ao famoso bandeirante Borba Gato, deve ter visado assegurar a posse de um importante caminho e parada, vital para o empreendimento bandeirante. Ao contrário do que diz em sua petição, Joseph Betim não desejava estabelecer-se nestas terras e lavrá-las, como não o fez, mudando-se logo para Pitangui, antes mesmo de obter a confirmação real da doação da sesmaria, o que se dava cerca de três anos após a doação propriamente dita; nesta ocasião, avaliava-se o desenvolvimento da sesmaria, isto é, se houvera estabelecimento do sesmeiro e escravaria, exploração do solo ou subsolo, povoação... Joseph Betim não DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 2 a obteve e nem mesmo a solicitou, segundo o minucioso trabalho do historiador Geraldo Fonseca (1975). Este estudioso inclusive contesta poder Joseph Betim figurar como fundador da povoação ou como responsável pela ereção de duas capelas em sua sesmaria; obter autorização para erigir capelas era, à época, processo complexo e lento, sendo improvável que o bandeirante o tenha alcançado em dois anos durante dos quais deve ter permanecido nestas paragens. Não se encontraram documentos que comprovem a solicitação da ereção das capelas por Joseph Betim na sesmaria onde hoje se localiza o município de Betim, e sim em Pitangui, onde o pioneiro logo depois se estabeleceu. Primitivos estudiosos destes documentos podem ter se enganado quanto às capelas. Assim, do primeiro proprietário das terras onde hoje fica Betim, ficou seu nome, primeiro aplicado ao Ribeirão da Cachoeira, tornado Betim, depois adotado pelo povoado surgido em torno da primeira capela. É muito provável que a memória social local tenha “exagerado” a participação de Joseph Rodrigues Betim na primitiva formação do povoado, porque o referido bandeirante era um verdadeiro potentado, aparentado e ligado por relações de solidariedade com alguns dos mais destacados bandeirantes brasileiros, o que conferiria uma origem “nobre” a Betim, preferível a admitir que a povoação fora fundada por anônimos. Nas primeiras décadas após a doação da sesmaria a Betim, a região consolidou-se como local de passagem e parada dos tropeiros. Outros sesmeiros atuavam na região porque, quando a Coroa Portuguesa doava sesmarias, fazia-o “por atacado”, a fim de que os sesmeiros pudessem contar com uma vizinhança importante para a segurança e o estabelecimento de vínculos sociais. Os sesmeiros aqui estabelecidos juntamente com Joseph Rodrigues Betim em 1711 DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 3 foram João de Souza Sotto Mayor (criador de gado) e João Leite da Silva Ortiz. Entre 1711 e 1750, a sesmaria de Betim recebeu diversos núcleos de povoação, coincidentes com os pontos de parada dos tropeiros. O primeiro deles a ganhar importância foi o da Bandeirinha do Paraopeba. Seu nome deve ter se originado no fato de o local em que se estabeleceu ter sido objeto de uma “bandeirinha”, isto é, uma pequena expedição em busca de minerais ou um “ramo” de uma bandeira. De fato, os bandeirantes paulistas, reunidos na Câmara de São Paulo em 1730, deliberaram que, uma vez aberto o caminho das bandeiras até Sabarabussu, que fossem enviados pequenos grupos que plantassem roças em pontos estratégicos, para o suprimento das futuras expedições bandeirantes. Assim nasceram as bandeirinhas. O arraial da Bandeirinha é o primeiro de Betim a aparecer na documentação oficial, quando pede autorização para construir uma capela, em 1753, e a recebe em 1754. Para o período, a construção de uma capela era um primeiro sinal de estabelecimento de um povoado. Isso independia da religiosidade propriamente dita da comunidade, visto que a Igreja era responsável pelos registros de nascimento, casamento e morte e por todos os ritos que conferiam identidade aos potentados e à gente média do local. As pessoas andavam enormesdistâncias até a capela mais próxima, e era por isso que os “homens bons” de cada local se empenhavam na construção de capelas em suas terras, a fim de evitar o desconforto de suas famílias e agregados. Quando solicitaram a construção de sua capela, quiseram que isso se desse num monte, razão pela qual a capela ficou distante do pioneiro núcleo de povoação. Assim, por volta de 1770, foi levantado um cruzeiro na Bandeirinha, o qual foi benzido solenemente no dia de Santa Cruz. A partir daí, iniciou-se a Festa Anual de Santa Cruz DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 4 (fim de abril ou início de maio), que continua sendo realizada no atual bairro Bandeirinha. No século XVIII, essa festa era tão concorrida quanto a da padroeira. A capela do arraial da Bandeirinha foi construída imediatamente, o que dá uma medida da prosperidade da região. A construção e a equipagem da capela precisavam obedecer a certas regras da Igreja e demandavam recursos, geralmente obtidos por subscrições da comunidade. A capela foi erigida onde hoje se encontra a Praça Milton Campos, de frente para o arraial da Bandeirinha – portanto com os fundos para o futuro centro histórico de Betim – e recebeu o nome de Capela de Nossa Senhora do Monte do Carmo. Como já havia outras capelas na região, em Mateus Leme e Santa Quitéria – hoje Esmeraldas – o novo templo tornou-se conhecido como Capela Nova do Betim, nome que depois se estendeu ao arraial. Entre 1760 e 1800, o arraial cresceu em importância, como indica a instalação de forças policiais reais e a elevação da localidade a distrito em 1797, fato confirmado pela Câmara de Sabará em 1801. 3.2. Trajetória sócio-econômica e administrativa Ao longo desse período, despontou o primeiro verdadeiro potentado da extensa região de Capela Nova do Betim, João Nogueira Duarte, proprietário da Fazenda Serra Negra, cuja produção, extensão (730 alqueires) e escravaria (centenas) eram notórias na capitania. Já na década de 1770, Nogueira Duarte detinha cargos de nomeação direta da rainha D. Maria I, o que dá uma medida de seu reconhecimento oficial. O pioneiro era português, tendo primeiro se estabelecido em Congonhas do Campo. A importância de sua família e daqueles aos quais se ligou por casamento e negócios está atestada em documentos DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 5 oficiais. Seus descendentes constituíram importante tronco genealógico em Betim, tendo muitos ocupado cargos militares e eclesiásticos de destaque. A partir de meados do Século XIX, Betim participou da retração econômica e decadência que atingiu toda a antiga zona de produção aurífera. Desenvolve-se, então, uma atividade econômica de subsistência, quase sempre fundamentada na fazenda autárquica. Às margens do Rio Betim, se instalaram olarias e moinhos de fubá, estes últimos beneficiários das quedas d’água, chegando somar 35. Restam na cidade vestígios das edificações desses estabelecimentos, além de instrumentos empregados na produção. O viajante James Wells (1995) esteve em Capela Nova e em suas adjacências durante o oitocentos, assim se manifestando sobre a localidade: Capela Nova do Betim é avistada muito antes que eu a alcance. Sua longa rua de casas brancas e telhas vermelhas fica situada proeminentemente sobre um morro alto, cercado de vales fundos e de morros mais altos e cadeias de montanhas. A estrada desce da região alta que eu tinha atravessado, cruza um vale e sobe por uma ladeira larga e íngreme, com casas separadas, casebres e ranchos de cada lado. Chegando ao topo, ela se une a outra rua em ângulo reto, ou melhor, a uma longa praça aberta, com filas de casas de porta e janela amontoadas e uma igreja simples, caiada, em uma extremidade. Há diversas vendas e armazéns de secos e molhados e ranchos abertos para tropas de mula. (...) Uns poucos matutos, em seus matungos esquálidos, montados com seus dedões do pé enfiados em pequenos estribos e usando o inevitável poncho de baeta ou tecido azul listrado de vermelho; umas poucas mulheres negras ou mulatas, vestidas com saias de algodão e xales espalhafatosos e batas brancas, apregoando frutas ou doces em tabuleiros de porta em porta; uns poucos vadios nas vendas e armazéns; algumas cabeças nas janelas assistindo apáticas à cena para a qual passam diariamente olhando e os numerosos porcos, bodes, cachorros, galinhas, perus e galinhas d’angola da rua constituem a restrita vida presente nesta vila sonolenta (p. 121-2). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 6 O século XX alvoreceu em Betim sob o signo da implantação da infra-estrutura que posteriormente faria da região um pólo industrial. Em 1909, a Schnoor Engenharia obteve empreitada junto ao Governo Estadual para construir 155 km da seção BH – Henrique Galvão (atual Divinópolis) da Estrada de Ferro Oeste de Minas. O engenheiro Antônio Gonçalves Gravatá, então funcionário da Schnoor, sugeriu a construção de uma usina hidrelétrica na principal queda d’água do Rio Betim, que tinha 84 metros. A hidrelétrica foi construída por Gravatá, em suas terras (Fazenda Cachoeira), com recursos próprios e de seu empregador Emílio Schnoor. Inaugurada em 1914, com capacidade de produção de 250 kw, a hidrelétrica chegou a fornecer energia para Henrique Galvão. Em 1945, até Contagem recebia energia gerada pela usina. Nem a ferrovia nem a hidrelétrica alteraram significativamente a atividade econômica em Betim, que permaneceu especializada na produção de gêneros alimentícios, principalmente arroz, milho, mandioca, feijão, cana-de-açúcar e algum gado. O território onde está Betim havia sido pertencente à Vila de Sabará, cuja jurisdição era imensa, desde o início da ocupação. Em 1901, pouco depois da instalação do regime republicano no Brasil, houve uma reforma político- administrativa do Estado brasileiro, que se desdobrou na divisão do território em estados e municípios. Foi então que surgiu o estado de Minas Gerais, com 11 grandes municípios, sendo um deles o de Santa Quitéria ao qual Capela Nova ficou subordinada, até perdendo algo da autonomia adquirida em 1897. Não houve resistência do arraial à subordinação a Santa Quitéria porque os potentados locais, João Nogueira Duarte à frente, mantinham boas relações com os líderes santaquiterienses. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 7 Por volta de 1910, a cidade desenvolveu um novo desenho urbano em função da passagem da linha férrea, que se instalou a aproximadamente uns setecentos metros da parte posterior da Praça Milton Campos – até então tida como região central. É comum no meio popular a afirmativa de que “a cidade cresceu para trás, nas costas da Igreja [antiga Matriz onde hoje está a Praça Milton Campos]”. Percebe-se, dessa forma, uma formação urbana que desloca o eixo central da cidade para a confluência das avenidas Governador Valadares e Amazonas, em detrimento ao “antigo” centro, na Praça. Este momento histórico trouxe uma inédita dinâmica sócio-urbana para o município, mas a população do campo se manteve superior à urbana, que, inclusive, manteve um crescimento vegetativo. Betim tornou-se município por decisão estadual e federal em 1938. Isso não foi fruto de mobilização local, mas de uma nova divisão administrativa do Brasil, promovida neste ano. Essa nova divisão administrativa foi estudada por uma comissão criada por Olegário Maciel desde 1932, obedecendo a determinação federal2.Minas Gerais, nesta ocasião, passou a ter 71 municípios. Fonseca (1975, p. 105), embora registre uma manifestação organizada pelo padre Osório Braga, numa ocasião em que o governador Benedito Valladares passava por Betim, prefere creditar a emancipação de Betim a uma querela do próprio Valladares com Santa Quitéria. O referido município teria feito oposição ao líder político e este, para puni-lo, lhe teria tirado parte significativa do território, ao criar o município de Betim. O recém-criado município de Betim – que também era comarca, isto é, sede do poder judiciário – compreendia os atuais territórios de Contagem, Campanha, Ibirité e 2 Betim: 50 anos de emancipação (1938/1988). Revista editada pela PMB (Adm. Tarcísio Braga), p. 11. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 8 Ribeirão das Neves. Novas reformas em 1960 e 1962 reduziram o território de Betim para a configuração atual – 376 km². Nas décadas de 1940 e 1950, Betim volta a ter importante função de local de passagem das rotas de abastecimento, desta vez destinadas à capital, Belo Horizonte. O planejamento estadual destinou a Betim duas outras funções econômicas: a industrialização de base ou de bens de capital, representada pelas siderúrgicas aí instaladas, e a produção de alimentos para o abastecimento da capital. Juntamente com Pedro Leopoldo, Santa Luzia, Nova Lima, Sabará, Vespasiano e Lagoa Santa, Betim constituiria o chamado “Cinturão Verde” de Belo Horizonte. Entretanto, nenhuma destas duas intenções político- econômicas alterou substancialmente a economia betinense, que permaneceu intensamente voltada para a subsistência. Pelo Censo Demográfico de 1940-1950, feito pelo IBGE, 51% da população urbana de Betim estava ocupada com “Atividades Domésticas e Escolares”, enquanto que 31,78% classificavam- se sob a rubrica “Condições Inativas e outras”. Ainda na década de 40, instalam-se as primeiras indústrias de Betim, ligadas à constituição do Parque Siderúrgico Nacional3, nos anos 1940: Cerâmica Saffran (1942), Ikera (1945), Cerâmica Minas Gerais (1947). Essa primeira industrialização pode ser atribuída a uma elite industrialista local, mais integrada com a localidade, mais comprometida com a absorção da mão-de-obra da região e, por seu caráter mais tradicional, pouco agressiva sobre o tecido urbano. Fez parte da constituição do Parque Siderúrgico Nacional a criação da Cidade Industrial de Contagem, cuja extensão abrangeu Betim. 3 Estas indústrias pioneiras compuseram, juntamente com a Magnesita (Contagem), a Cerâmica Togni (Poços de Caldas), a Cerâmica João Pinheiro (Caeté), a Acesita (Coronel Fabriciano) e a Belgo-Mineira (Sabará), o setor de produção de refratários para a siderurgia mineira e para os parques siderúrgicos de São Paulo e Rio de Janeiro. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 2 9 Nos anos 50, muda o eixo da industrialização brasileira – decresce o investimento nas indústrias de bens de capital, como as siderúrgicas primeiramente instaladas em Betim e volta-se o foco para a produção de bens de consumo duráveis, para a substituição das importações. A partir daí, Betim, por sua oferta privilegiada de infra- estrutura, destina-se a se tornar pólo de atração das indústrias. Entretanto, isso se dá vagarosamente. Em 1954, a instalação de uma central geradora de energia da CEMIG, e em 1959, a construção do trecho Belo Horizonte - Extrema (sul de minas) da Rodovia Fernão Dias, que liga Belo Horizonte à capital paulista, começam a delinear as mudanças intensificadas nas décadas seguintes. A Rodovia Fernão Dias, construída no governo do então presidente Juscelino Kubistchek, assume relevância no processo histórico em questão, por ter provocado um considerável número de loteamentos na porção central da cidade, durante a década de 1960. Algumas famílias, que já possuíam grandes áreas na região em volta da Praça Milton Campos (antigo Largo da Matriz) e na extensão da Av. Governador Valadares, promoveram a repartição dessas áreas com a finalidade de trazerem os familiares do campo para a cidade, ou para vender os lotes a terceiros. Já outras, que habitavam no meio rural, compravam terrenos próximos ao centro, ou na extensão da Rodovia, para praticarem o loteamento e se mudarem para o meio urbano. Um dos maiores exemplos desta ação foi o loteamento do bairro PTB – sigla que significa “Posto Telegráfico de Betim”, por existir na linha férrea, que passa em frente ao bairro, tal posto. Praticamente durante toda a década de 1960 houve um certo arranjo territorial, embasado nas ações de configuração dos lotes e bairros novos, sendo a maioria implantados às margens da Rodovia. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 0 Ainda na década de 60, chegam a Betim algumas indústrias de médio porte, quase todas de capital privado, à exceção da REGAP, e se instalam no Bairro Cachoeira, local tradicional da primeira industrialização de Betim, vinculado à presença da Av. Amazonas, do Rio Betim e da Ferrovia Oeste de Minas. São elas: Cortume Morumbi (1960), Fabril de Minas (sabões, 1962), Riomar (artigos de pesca, 1962), Fábrica São Geraldo (móveis, 1962), Fábrica São João (biscoitos, 1962), Frigorífico Silveli Torres (1964), Confecções Dora (1964), Siderúrgica Amaral (1965), Refinaria Gabriel Passos (1968), Asfalto Chevron (emulsão asfáltica, 1969), Sidero Manganês de Pellets (1969, a partir de 1974, chamou-se Siderúrgica Wilson Raid). A Refinaria Gabriel Passos foi instalada em Betim porque o local constitui uma confluência de condições favoráveis à redistribuição de combustíveis. Entretanto, a economia local não foi dinamizada pela presença da refinaria. Nos anos 70, apenas uma indústria, a Asfaltos Chevron, havia sido atraída para o município em função da REGAP. No início desta mesma década, a Prefeitura Municipal de Betim contraiu empréstimo junto à Caixa Econômica Federal para adquirir os terrenos que seriam doados tanto à Fiat Automóveis quanto à Krupp. Houve disputa entre os estados brasileiros e entre os municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte para sediar a Fiat. O que favoreceu Betim foi, além de suas condições infra- estruturais e da atuação política em seu favor, o esgotamento do espaço de Contagem. Ainda, um dos fatores de atração da Fiat para o Brasil/Minas/Betim foi a intensa propaganda desenvolvida pelo INDI (Instituto Nacional do Desenvolvimento Industrial) no exterior. O folheto de propaganda de título “Introduction to Minas Gerais” diz: DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 1 Muitos mineiros são altos, delgados, esbeltos e de pele clara, mas não existem barreiras de cor em Minas, nem em mito nem em fato. Homens e mulheres de todas as nações e de todas as raças são recebidos abertamente em Minas. Encontra-se também uma ausência de consciência de classe e esta atitude está combinada com o senso democrático de que todos os homens são iguais (MACHADO, 1979). O então presidente da Fiat, Giovanni Agnelli absorveu a propaganda, conforme transparece de sua fala: Um dos elementos principais para a instalação de um complexo industrial é a disponibilidade de mão-de- obra. Na zona de Minas Gerais, a disponibilidade é enorme e nos permitirá atingir uma média de 8 a 9.000 operários. Além do mais, o município de Betim comprometeu-se a criar escolas para a preparaçãodo pessoal especializado, sob a orientação de instrutores italianos4. As negociações para a implantação da Fiat em Betim foram bastante rápidas: em fins de 1972, após ser eleito, o governador mineiro Rondon Pacheco, iniciou os contatos com a empresa e declarou que um final feliz se anunciava; em 1973, é criado o Fundo de Investimentos e Participações, que tem por finalidade destinar verbas do Estado a diversos empreendimentos industriais; no orçamento de 1973 do Estado, estão previstos gastos com a implantação da Fiat, antes mesmo de se concluírem as negociações com a empresa, o que se deu no decorrer de 1973; os trabalhos de terraplenagem e infra-estrutura começam neste mesmo ano, logo após a conclusão das negociações; em 1976, já havia carros Fiat nas ruas. Nos anos 70, a política econômica estadual conhecida como “Nova Industrialização Mineira” colocou Betim em posição de destaque. Essa política, concebida por planejadores estatais, visava tirar Minas Gerais da posição de centro industrial periférico, fornecedor de insumos para o eixo Rio/São Paulo, tornando-o um centro autônomo. Para 4 Revista Tendência. “Por que a Fiat se instalou em Minas Gerais”. Agosto de 1973, nº 0, p. 50. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 2 isso, foi criada a Companhia de Distritos Industriais de Minas Gerais (CDI), que planejou cinco distritos industriais na Região Metropolitana de Belo Horizonte: Betim, Vespasiano, Contagem, Santa Luzia e Belo Horizonte. Betim, cujo distrito foi denominado Paulo Camilo, recebeu mais investimentos, tendo sido programada para ser o 2º pólo automobilístico do país. Segundo dados da CDI até 1979, Betim havia recebido 72,60% dos investimentos nos distritos industriais da RMBH e gerara 64,11% dos empregos diretos criados nestes mesmos distritos. É importante ressaltar que Betim sofreu uma alta especialização produtiva, isto é, grande parte de sua industrialização nesta época deu-se em função da indústria automotiva. O processo de industrialização continua acelerado nos anos 80. Ao final desta década, a recessão da economia nacional faz diminuírem os investimentos, mas não os estanca. A especialização automobilística da indústria continua alta, mas as administrações municipais dos anos 90 e 2000, conscientes de que isso constitui uma fragilidade para a economia local, buscam incentivar a diversificação industrial. A recente criação do Distrito Industrial de Bandeirinhas faz parte deste contexto. A economia rural betinense foi desagregada a partir dos anos 70. O número de pessoas ocupado nesta atividade é irrisório em relação aos setores secundário (indústria) e terciário (comércio e serviços), bem como sua participação na riqueza produzida. Destaca-se a produção de leite e de horti-fruti-granjeiros, distribuídos principalmente através do CEASA. Conforme dados do Censo Demográfico 2000 do IBGE, o crescimento populacional de Betim, a cada ano, está na ordem de 5,03%. O mesmo Censo, em seus dados trabalhados, atesta que 26% dos chefes de família betinenses têm escolaridade máxima de 4 anos, isto é, um total despreparo DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 3 para a inserção qualificada no mercado de trabalho industrial. 3.3. Geografia urbana e aspectos ambientais Distante aproximadamente 30 quilômetros da capital, o município de Betim é hoje um importante pólo de concentração industrial do Estado de Minas Gerais e a segunda maior arrecadação de ICMS do estado, só perdendo para a capital, o município está entre as maiores economias do Brasil. Quanto aos aspectos físicos, o município de Betim está localizado na Bacia do Rio Paraopeba, que o corta nas regiões oeste e sudoeste. O rio Paraopeba é um marco na definição da paisagem e define também a divisa entre Betim e os municípios de Igarapé, São Joaquim de Bicas e Juatuba. Entre as diversas divisas municipais, podemos destacar a de Betim com o município de Contagem, do ponto de vista hidrográfico. Esta divisa é feita pela barragem da Várzea das Flores, a área de preservação de mananciais mais importante de Betim, responsável por 15% do abastecimento de água da região metropolitana de Belo Horizonte e onde se produz a água de menor custo para o sistema. De preservação fundamental, tem uso rural (sítios para fins-de-semana), lazer e urbano (Bairro Icaivera). O município possui diversas micro-bacias hidrográficas, dentre as quais podemos destacar as sub- bacias do Rio Betim e do Riacho das Areias, que compreendem boa parte da região mais urbanizada da cidade, inclusive as regionais Centro e Alterosas. Do ponto de vista climático, a temperatura média anual, fica em torno de 20 graus centígrados e o índice pluviométrico médio é de 1.450mm. Em relação às áreas verdes e à fitogeografia, destacam-se no município dois tipos de biomas: o do Cerrado DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 4 e o da Mata Atlântica. Na divisa com o município de Contagem, no bairro Icaivera, destaca-se na paisagem uma típica floresta de encosta, com topografia bastante íngreme. Próximo à ponte do rio Paraopeba, podemos constatar uma singular floresta de galeria, com a presença de muitas lianas e sub-bosque pouco denso. Na divisa entre Betim e Ibirité, encontra-se um cerrado bastante degradado pela formação de pastagens. Na estrada de Betim para Esmeraldas, podemos encontrar uma formação de cerrado bem desenvolvida, apresentando na sua paisagem os estratos arbóreo, arbustivo e herbáceo. Próximo ao centro da cidade, encontra o Parque Ecológico Engenheiro Felisberto Neves, que apresenta vegetação expressiva com porte arbóreo em torno de 25m. Apesar dos grandes problemas ambientais existentes no município, a cidade vem promovendo diversas ações de recuperação ambiental e reintegração social. A gestão dos recursos ambientais está a cargo Conselho Municipal de Desenvolvimento Ambiental (CODEMA). Várias iniciativas estão sendo realizadas como: saneamento básico, coleta seletiva de lixo e aterro sanitário, o que possibilita ao município receber o incentivo do ICMS Ecológico e buscar a melhoria da qualidade de vida para sua população. Como exemplo, destaca-se a construção de interceptores de esgoto ao longo do rio Betim, do riacho das Areias e de Estações de Tratamento de Esgoto (ETE) em várias partes do município. Outra obra no setor ambiental é a Central de Tratamento de Resíduos Sólidos: o lixo que chega ao aterro sanitário, depois de triado, é prensado para ser vendido. O restante é enterrado. Em relação à questão ambiental, podemos destacar a construção de várias avenidas sanitárias, dentre elas, a avenida Antônio Carlos, no bairro Teresópolis, avenida Porto Alegre, ligação entre as avenidas Edméia Lazarotti e DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 5 Belo Horizonte e a avenida do Imbiruçu que liga a avenida Marco Túlio Isaac à via Expressa, facilitando o acesso da população da região do centro de Betim e aos municípios de Contagem e Belo Horizonte. A população do município, que hoje totaliza quase 450 mil habitantes, tem crescido com taxas superiores à população da Região Metropolitana de Belo Horizonte e do Estado de Minas Gerais. Em 1970, quando o grau de urbanização da Região Metropolitana de Belo Horizonte era de 92%, Betim apresentava-se ainda como um município de população predominantementerural, com um grau de urbanização de 46%, aproximadamente. Em curto período, o município passa por um profundo processo de transformação socioeconômica: em 1980 o município, já apresenta um grau de urbanização de cerca de 91%, ligeiramente inferior ao da Região Metropolitana de Belo Horizonte, que resultava em torno de 96%. Fato notável é que Betim continua com alta taxa de crescimento urbano, mesmo passado o momento dos maiores impactos decorrentes da implantação da Fiat Automóveis em seu território, nos anos 1970. Com isso, observa-se que o município, por um lado, abriga um forte e moderno setor industrial e, por outro, configura-se como receptor de consideráveis fluxos migratórios que se dirigem para a Região Metropolitana de Belo Horizonte, compostos, em grande parte, por segmentos pobres e não qualificados da população. Apesar de Betim, nas últimas décadas, estar ocupando a 2ª e a 3ª posição entre os municípios mineiros que mais arrecadam impostos, o que indica a vitalidade de seu setor privado, a renda per capita do cidadão betinense é de R$ 203, 22 e o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) é de 0,775, um pouco superior às médias estadual (0,719) e nacional (0,699), nas quais está contida uma DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 6 reconhecida desigualdade de grandes dimensões. Do ponto-de- vista do desenvolvimento humano, o município ocupa, por exemplo o 135º lugar entre os 853 municípios mineiros (PNUD, 2000). Isso mostra que o modelo de desenvolvimento econômico adotado nem sempre está associado à elevação geral dos padrões de vida. 3.4. Saúde pública Há poucos dados sistematizados sobre os primórdios da prestação de serviços de saúde em Betim, especialmente se considerada tal prestação como uma função estatal pública, como geralmente a entendemos hoje. Ao que parece, isso só acontece de forma regular a partir do final dos anos 40, mantendo a rede pública uma oferta bastante precária que só se universaliza relativamente nos anos 90. O primeiro registro notável da prestação de serviços de saúde em Betim refere-se aos idos de 1916, quando a Fundação Rockfeller, norte-americana, enviou uma Comissão Internacional de Saúde ao Brasil para o estudo de doenças tropicais, principalmente a ancilostomíase. As relações pessoais do engenheiro Antônio Gonçalves Gravatá é que propiciaram a Betim ser a base da missão. Também concorreram para isso o acesso ferroviário e a existência de uma pequena unidade móvel de monitoramento do tripanosoma cruzi em Betim. O relatório da missão deu conta de que 20% da população urbana betinense e 60% da rural (que alcançava mais de 70% do total na época) tinham ancilóstomos. Além disso, 80% dos atendidos (o total de atendidos chegou a 1.435) tinham Doença de Chagas. Consta que as pessoas se deslocavam até 40 km para receber atendimento, o que dá uma medida da carência da população quanto aos serviços de saúde. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 7 Grandes nomes da medicina brasileira estiveram em Betim para acompanhar os trabalhos, a exemplo de Carlos Chagas e Adolfo Lutz. Após o fim da missão, uma de suas casas portáteis permaneceu em Betim, de forma que a antiga unidade móvel ficou melhor aparelhada e houve atendimento dos casos mais graves fora de Betim – em Belo Horizonte. O médico responsável registrou sua decepção com as autoridades brasileiras por não se terem decidido a tornar regular o atendimento aos doentes, através de um dispensário definitivo. Ao longo da primeira metade do século XX, registra-se a presença da epidemia de gripe espanhola em Betim, o que causou a morte de 38 pessoas em 1918. Sabe-se que não havia socorro público às vítimas e que este socorro partiu dos potentados locais. Os farmacêuticos José Borges e Pedro Xavier de Assis – este último o Mestre Pedro, muito querido da comunidade e que, além de boticário, era professor e erudito – cuidaram do atendimento aos doentes. Nisso, tiveram o auxílio econômico do Dr. Gravatá e dos fazendeiros José Nogueira Duarte e José Belém. Apenas em 1949, há registro da inauguração de um posto de saúde em Betim pelo governador Milton Campos. Este posto, que ficou conhecido como Unidade Central Dr. Hacketi (porque está localizado na rua homônima), localizado onde hoje está o Centro de Referência em Saúde Mental de Betim (CERSAM), marcou o início da prestação de serviços em saúde de maneira mais regular em Betim. O posto era mantido pelo Estado, que, até a década de 70, inaugurou outros postos, no Angola, no PTB e em Vianópolis. Além destes, Betim contava com o complexo de saúde da Colônia Santa Isabel, cuja principal unidade era o Hospital Orestes Diniz5, para 5 Inaugurado em 1932, o Hospital Dr. Orestes Diniz contava com uma estrutura admirável, devido à atenção dedicada à hanseníase pelas autoridades sanitárias nos anos 30, e ainda em 1988 contava com 56 leitos. Após a desativação da Colônia, o hospital poderia ter sido DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 8 atendimento principalmente dos internos e de seus parentes que foram se instalando nas redondezas. Nos anos 70, a Prefeitura Municipal de Betim inicia ações próprias no campo da saúde, inaugurando seu primeiro posto de saúde, localizado na Rua Rio de Janeiro, com um médico e um dentista, que atende prioritariamente aos funcionários da própria Prefeitura. A população propriamente dita ficava aos cuidados dos postos mantidos pelo Estado e pelo INAMPS. Em 1978, foi inaugurada a FAMUB (Fundação Municipal de Urgência de Betim), primeira unidade de saúde municipal a adotar o conceito de atendimento do urgência. Nessa mesma época, foi criado o primeiro Código Sanitário de Betim, que disciplina questões relativas à poluição, ao saneamento básico e ao funcionamento adequado, do ponto-de-vista sanitário, das empresas de Betim. Esse código vigora até hoje em Betim. Em 1983, um evento externo provocou intensa reordenação da prestação de serviços em Betim: a criação das Ações Integradas de Saúde (AIs). As AIs representaram a parceria entre as esferas municipal, estadual e federal para a atenção à saúde. Em conseqüência disso, o setor da saúde em Betim foi progressivamente adotando uma linguagem mais consistente e neste início de década criou-se um departamento de defesa do meio ambiente na Secretaria de Saúde (CODEMA), inaugurou-se o posto do PTB e a primeira policlínica de Betim, Alcides Braz, que trazia uma nova concepção em saúde pública – o atendimento em especialidades médicas. Também desta época datam os gabinetes odontológicos escolares, abertos com recursos de um convênio com a Fundação de Assistência ao Estudante (FAE). acionado pela população de Betim, mas o estigma da hanseníase fez com que isso nem fosse considerado pelos cidadãos. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 3 9 Entre 1985 a 1988, foi elaborado o primeiro plano de saúde do município, com um diagnóstico bastante acurado do setor. O plano, denominado Modelo Assistencial para o Município de Betim, detectava a ausência prática de um sistema de saúde capaz de absorver a demanda local. Betim contava então com cinco unidades de saúde mantidas pelo Estado e nove mantidas pelo município, e oplano previa ampliar o sistema para vinte e duas unidades, inclusive com a construção do hospital municipal e a municipalização das unidades do Estado. A organização sistêmica, que só se efetivaria nos anos 90, já estava delineada neste plano, que previa a especialização de cada unidade em um tipo de atenção à saúde e o funcionamento dos encaminhamentos por referência e contra-referência6. Nem tudo o que se vislumbrou no plano foi implementado, mas houve significativo avanço da atenção básica à saúde no município, com a criação de programas de saúde para a mulher, a criança, hipertensos e diabéticos. Houve a implantação de mais três policlínicas e seis postos de saúde. Ao final dos anos 80, Betim enfrentou uma situação conflituosa no campo da prestação de serviços em saúde: o Hospital N. Sra. do Carmo, fundado por sociedade particular, enfrentava dificuldades financeiras, razão pela qual foi desativado. Houve grande comoção da comunidade, devido à cidade não ter unidade hospitalar. Em novembro de 1989, o hospital foi reativado, com subvenções municipais. Foi nesse momento que a Prefeitura Municipal começou a negociar o convênio que viabilizaria a construção do primeiro hospital público de Betim. Essa construção começou já no início da década de 90, quando também se construiu a 6 Quando o usuário entrasse em qualquer unidade, esta teria a responsabilidade de encaminhá-lo ao atendimento adequado, quando a necessidade do usuário não fosse da competência da unidade. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 0 maternidade pública municipal e se negociou com as instâncias estadual e federal para que Betim pudesse assumir a gestão semi-plena de seu sistema de saúde, o que aconteceu em 1993. Os anos 90 foram o período de implantação e consolidação de um sistema de saúde em Betim. Em 1994, levantamentos diagnósticos apontavam que o princípio da descentralização ainda não havia sido efetivado e que nem os servidores da saúde nem os usuários consideravam o atendimento em saúde satisfatório. A Prefeitura elaborou o Plano Municipal de Saúde para 1995-6, que adota os seguintes princípios orientadores para a saúde municipal: acesso, acolhimento, vínculo7, autonomia e resolutividade8. O principal problema a ser enfrentado era o do relacionamento do profissional de saúde com o usuário em estado de sofrimento. Houve diagnóstico do perfil da saúde da população betinense. As doenças respiratórias respondiam pela maior parte dos atendimentos na rede pública, decorrência do clima e da poluição atmosférica. Das conclusões gerais desse diagnóstico, decorreu que o governo deveria investir prioritariamente sobre as doenças parasitárias, sobre a hanseníase, a saúde mental e as doenças cardiovasculares – hipertensão à frente. A saúde bucal do betinense também deixava a desejar: de cada usuário atendido pelo sistema, era encontrada uma média de cinco dentes afetados, um índice semelhante ao da população nordestina na mesma época. 7 Sentir-se ligado ao sistema durante todo o tempo do tratamento, sem precisar demandar acesso em cada instância. 8 Alta capacidade de resolução do problema de saúde que gerou a demanda. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 1 O diagnóstico revela que o município já havia atingido uma boa cobertura vacinal; a situação do saneamento básico ainda era crítica: 80% desta contavam com abastecimento de água, mas apenas 29% tinham acesso à rede de esgoto; a coleta de lixo, tanto a domiciliar quanto a de resíduos hospitalares, acontecia três vezes por semana, sendo que 22 bairros não tinham coleta. A rede física de saúde de Betim foi praticamente toda reformada e construída segundo o padrão das políticas de saúde pública. O atendimento em três níveis (básico, secundário e terciário), sonhado desde meados da década de 80, realizou-se nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), nas UAI (Unidades de Atendimento Imediato) e no Hospital Regional e Maternidade Pública Municipal. O atendimento nas especialidades médicas passou a ser feito na Unidade Divino Braga, foram criados os Centros de Referência em Saúde Mental do Centro e do Teresópolis (o primeiro já existia embrionariamente) e o Centro de Referência em Saúde Mental Infantil, além do Centro de Convivência Cazuza, para as DST/Aids. Foram municipalizadas as unidades de saúde mantidas em Betim pelo Estado, por força do processo de municipalização nacional mesmo, e, em 1998, a Secretaria de Saúde assumiu a gestão plena do sistema de saúde local. Ainda no começo da década, ocorreu o primeiro concurso público na área da saúde em Betim. Nos anos 2000, o sistema de saúde de Betim tem sido reconhecido com repetidos prêmios extra-municipais. Isso significa que está à frente do que se pratica em muitos municípios do país, mas não que tenha atingido um nível satisfatório de atendimento. Os principais problemas estão em que a procura por serviços públicos de saúde supera em muito a capacidade de absorção do sistema e em que a DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 2 política de saúde não é assumida política e profissionalmente pela totalidade dos servidores. Apesar dos problemas, os indicadores da saúde em Betim estão hoje em alto patamar. As condições de saneamento básico, que se refletem diretamente na saúde da população, alcançaram os seguintes índices em 2000: 96,18% da população eram atendidos pela rede de abastecimento hídrico, 69,21% contavam com rede de esgoto e 95,22 eram atendidos pelo serviço de coleta de lixo. Caiu significativamente a incidência de doenças reversíveis pelo investimento no setor de saúde. A mortalidade geral está em 4,8 pessoas por cada mil nascidas vivas e a mortalidade infantil baixou de 54,3 para 16,6 por mil nascidas vivas em 15 anos. Em 2002, Betim alcançou o índice de 3,01 consultas médicas por habitante/ano, acima do recomendado pelo Ministério da Saúde (2 a 3 consultas por habitante/ano). A expansão da rede de saúde teve continuidade, paralelamente ao investimento em humanização. Novas unidades de saúde foram implantadas: Centro de Referência em Habilitação “Anderson Gomes de Freitas”; Centro de Convivência “Estação dos Sonhos”, para pacientes da saúde mental; Casa Lar, no Angola, que é um lar abrigado para pacientes aposentados da saúde mental; finalmente, foi inaugurada a nova UBS Teresópolis. 3.5. Educação Setores da localidade de Capela Nova do Betim começam a se organizar para reivindicar instrução escolar formal em 1832. Em 1838, começa a funcionar a primeira escola de instrução primária (uma “aula”) ministrada pelo professor Francisco de Paula Rodrigues. Esta primeira instituição escolar chamou-se Escola da Capela Nova de Betim, criada por portaria de 18 de fevereiro de 1838. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 3 Os primeiros professores, depois do pioneiro, foram: José Gonçalves do Amaral, Francisco de Paula Rodrigues Júnior, que teve uma carreira de 15 anos no magistério de Betim, até se aposentar, João Gonçalves Martins, que sofreu boicote da população capelanovense, inconformada com a saída de Francisco Júnior, Joaquim Primo da Rocha, Augusto César Neves Murta, Joaquim Antônio da Fonseca, Symphronio de Souza e Silva e Pedro d'Assis Xavier e Paula Júnior, o Mestre Pedro, considerado o mais erudito professor capelanovensedesta primeira “safra”. As primeiras professoras foram Maria Augusta das Dores Maia, Amélia Zeferino de Freitas Moreira, Rita Carolina de Jesus, professora leiga, que assumiu a cadeira feminina em 1882, ministrando um ensino mais intuitivo e sendo, por isso, questionada pela inspetoria, que já exigia formação técnica para professores. Ao longo do século XX, Betim conheceu outras educadoras tradicionais para a memória local, já num contexto de feminização do magistério. A mais conhecida delas, Josephina Bento nasceu em Ouro Preto, 1903, onde estudou. Em Betim, lecionou primeiro em Santo Afonso (1926-1929), e depois no Afonso Pena (1929-57), onde se aposentou. Em 1850, é criada uma cadeira de ensino masculino de primeiro grau em Betim o que aumenta a escolaridade de alguns betinenses para o equivalente aos oito anos de escolaridade obrigatória atuais. A cadeira só foi ocupada em 1853, por Francisco de Paula Rodrigues Júnior, filho do primeiro professor. A demora no preenchimento do posto se deveu ao fato de que havia poucos professores qualificados e o concurso necessário para preencher as vagas era muito rigoroso. Em 1854, dos 130 alunos matriculados na aula de Francisco de Paula Rodrigues, apenas dois eram mulheres. A legislação brasileira determinava a existência de instrução formal feminina a partir de 1867 e, DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 4 anteriormente, já permitia o ensino misto, que era rejeitado pelos pais. Por isso, Antônio D'Assis Martins, quando deputado, solicitou escola feminina para Betim (1872). A partir de 1886, ocorrem ações de descentralização do acesso ao ensino: é criada uma cadeira de ensino elementar em Pimentas; em 1890, cria-se a cadeira de ensino do Engenho Seco; em 1901, o mesmo ocorre na localidade de Jacaré. Em 1921, surge a primeira escola mista de Betim, em Bandeirinhas, seguida, em 1933, pela escola mista de Vianópolis. Estas escolas foram os primeiros núcleos das atuais E. M. Barão do Rio Branco e E. M. José Salustiano Lara. Nos anos 40, proliferam escolas rurais e nos bairros mais populosos, e surge a primeira escola noturna, no bairro PTB, núcleo da atual E. M. Raul Soares. O surgimento desta última escola não é fortuito: o bairro PTB nasceu como bairro operário, e sua população, conseqüentemente, demandava uma escolarização fora dos horários de trabalho. Em 17 de julho de 1910, foi inaugurado o primeiro grupo escolar de Betim, criado por Decreto de 02/01/1910, que recebeu a denominação de Grupo Escolar de Capela Nova, depois Conselheiro Afonso Pena, e instalou-se no prédio onde hoje está o Museu Paulo Gontijo. A construção do primeiro prédio deu-se pelo consórcio de recursos públicos e privados. Em 1957, instala-se em Betim a Fundação Nossa Senhora do Carmo, responsável pelo primeiro ginásio betinense, o Ginásio Nossa Senhora do Carmo de Betim, núcleo da atual E. E. Nossa Senhora do Carmo, então instituição de caráter privado, isto é, mantida pelas mensalidades dos alunos. O segundo Ginásio, primeiramente denominado Lia Salgado, foi inaugurado em 1958 pela Professora Haydée Matos Martins, funcionando provisoriamente e sendo mantido DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 5 pela Fundação Padre Rocha. Em 1964, D. Lia Salgado, esposa do então governador de Minas Gerais, utilizando uma verba da qual as primeiras-damas dispunham para fomentar a cultura, construiu um novo prédio para o Ginásio, que recebeu o nome de Clóvis Salgado, permanecendo sob a responsabilidade do Estado até os anos 2000, quando foi municipalizada. O antigo prédio dessa escola continuou abrigando instituições educativas e culturais, até a atualidade, quando ali funciona a Biblioteca Pública Municipal. O Colégio Estadual de Betim iniciou suas atividades em 1965, com 430 alunos, tendo como principal expoente da equipe de fundadores o professor Raphael Martins. Denominado posteriormente Colégio Normal Oficial de Betim, devido a ter instalado o Curso Normal para formação de professores, em 1975, o Colégio tinha 1.300 alunos e 45 professores. O primeiro ginásio municipal, denominado Ginásio Municipal de Betim, hoje Escola Municipal Raul Saraiva Ribeiro, foi criado em 1969 e mantido por recursos públicos e privados visto que, naquele período, era incomum que municípios mantivessem ginásios. Funcionou em seus dois primeiros anos no antigo prédio do Grupo Escolar, tendo sua sede própria, onde se encontra até a atualidade, inaugurada em 1972. Em 1975, lei municipal mudou o nome da instituição para Autarquia Escola Municipal Raul Saraiva Ribeiro, o que lhe permitia oferecer séries além do primeiro grau. A primeira grande iniciativa de ensino profissionalizante em Betim foi o Centro Educacional de Betim, construído pela Legião dos Oblatos de Cristo Sacerdote e Nossa Senhora das Vitórias, instituição sediada em Lagoa Santa. A instalação da escola em Betim deu-se graças à doação de terreno pela Prefeitura em 1957 e à liberação de uma grande soma pelo Ministério da Educação e DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 6 Cultura. É interessante observar que essa iniciativa foi contemporânea da industrialização em Betim e certamente tinha em vista a qualificação profissional para a indústria. Porém não teve sucesso e o prédio foi assumido pelo município. Outra importante iniciativa de ensino profissionalizante foi o Colégio Comercial Betinense. Criado em 1963 e inaugurado em 1964, com 25 alunos, ocupou o antigo prédio do Grupo Escolar. A primeira escola de educação infantil de Betim foi instalada em 1959, em terreno doado pela Prefeitura, e recebeu o nome de Jardim de Infância Menino Jesus de Betim, instituição privada. Em 1964, foi fundada a Escola Nossa Senhora da Assunção, instituição privada, por Ester Assunção, discípula de Helena Antipoff, para atender pessoas com deficiências. As décadas de 70, 80 e 90 constituíram, principalmente, um período de expansão e busca da universalização do acesso à escola básica em Betim. O processo de municipalização fez com que a Rede Municipal ultrapassasse, em extensão, a Rede Estadual. Praticamente universalizados o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, Betim agora trabalha os seguintes desafios: universalização da Educação Infantil; correção do fluxo dos estudantes no sistema, combatendo a reprovação e a evasão; elevação da qualidade do ensino, buscando, nesse momento, a alfabetização de todos os estudantes. 3.6. Cultura Os registros sobre a vida cultural em Betim são escassos para períodos anteriores ao século XX, exceto quanto à vida religiosa. Esta, predominantemente articulada ao catolicismo, foi intensa e bastante bem registrada. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 7 Graças a isso, preservaram-se os primeiros registros relativos à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e a suas atividades desde 1814. Embora não haja registros sistemáticos ainda, sabemos que as folias de reis também eram importantes manifestações, queridas e lembradas pela população. A Folia de Reis de Santo Afonso, uma das primeiras a ser estudada na cidade, remonta a 1920. Nas primeiras décadas do século XX, a cidade já contava com uma vida cultural mais secular, a exemplo de salas de cinema, sendo a primeira delas mantida por Thiers do Bom Conselho, na atual Rua Dr. Gravatá, e a mais importante delas, localizada na atual Praça Tiradentes, foi mantida pela família Marcelinoaté as últimas décadas do século XX. O cinema constituía uma efervescência em seu entorno, enquanto se esperavam as sessões, promovendo o encontro entre os jovens. Em meados do século XX, na atual região central da cidade, a vida cultural estava muito articulada a dois tradicionais clubes desportivos e sociais: o Industrial e o Vera Cruz. Estes mantinham sedes no centro e promoviam concorridos bailes, além de movimentarem a população, dividindo-a em torcidas para os times de futebol, ativos e importantes até a atualidade. Também o carnaval foi uma importante manifestação cultural em Betim, entre as décadas de 70 e 90, especialmente na configuração dos blocos carnavalescos e das escolas de samba. O primeiro concurso de escolas de samba em Betim aconteceu em 1977, tendo como participantes os times Industrial, Democrata, Sete e São Cristóvão, e a Escola Raul Saraiva. O Sete sagrou-se campeão. Nos próximos concursos, foram campeões: Capela Nova (1978), Sete (1980), Cartolas (1981), Arco-Íris (1982), Capela Nova (1987) e Sete (1990). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 8 Os núcleos carnavalescos pioneiros, também os primeiros a se organizarem em escolas de samba, foram Os Cartolas, os Unidos do Samba Sete, os Unidos de Citrolândia e a Arco-Íris. Já no final dos anos 70, estes grupos movimentavam, por iniciativa própria, o carnaval da cidade. O bloco carnavalesco mais tradicional da cidade é o Virgens do Rodô, fundado por sócios do Clube Atlético Rodoviário, também um dos pioneiros do município. Criado em 1984 e ativo desde então, o bloco explora o humor através do desfile de homens vestidos de mulheres. Um importante lugar de cultura em Betim, em meados do século XX, foi a então Colônia Santa Izabel. Fundada nos anos 1930 para segregar pessoas atingidas pela hanseníase, estas ali articularam importantes manifestações culturais, também estimuladas pela concepção urbanística da colônia e pelos equipamentos públicos disponíveis. A vivência da música, do teatro e do cinema no Cine Teatro Glória é muito lembrada. Clubes de futebol também ali se desenvolveram, assim como despontaram na colônia importantes artistas plásticos e compositores. O Coral Tangarás de Santa Izabel é o mais antigo grupo cultural da colônia ainda ativo. Fundado em 1936 e ligado à Paróquia de Santa Izabel, começou como uma iniciativa do Frei Chico (Francisco Van Der Poel), possuindo hoje fortes raízes comunitárias. O coral mantém uma média de 40 cantores entre 16 e 70 anos e possui um acervo de cerca de 200 partituras, entre elas várias compostas por compositores da própria colônia, além dos instrumentos que o acompanham. Um dos mais importantes e antigos grupos culturais da cidade tem sido a Corporação Musical Nossa Senhora do Carmo, tradicional banda de música, fundada em 1903. Passando por importantes mudanças conceituais ao longo do último século, a banda continua abrilhantando os principais DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4 9 eventos públicos no município e é fartamente premiada nos encontros de grupos afins em diversas regiões de Minas Gerais e do país. Há cerca de 50 anos, surgem os dois principais centros de cultura privados radicados no município: o Salão do Encontro e a Missão Ramacrisna. Implantados nas comunidades da Regional Norte e da Regional Vianópolis, respectivamente, têm ali desenvolvido importantes atividades de articulação e formação das comunidades. Ambos alcançaram projeção internacional. A partir dos anos 80, a Prefeitura Municipal começa a desenvolver políticas públicas na área da cultura. É criada a Fundação Artístico Cultural de Betim e seu primeiro centro cultural, a Casa da Cultura Josephina Bento. Ao longo dos anos 90 e 2000, a Funarbe expande suas ações no território municipal, mantendo atualmente onze centros culturais, entre bibliotecas e centros de formação e de memória. É também nesse momento que a cidade cresce demograficamente e diferentes grupos e manifestações culturais ganham visibilidade. Surgem, por exemplo, o Coral da Casa da Cultura (1988) e depois o Coral Canto Livre, a Associação Betinense de Letras (1986) e a Companhia de Dança Para-folclórica Capela Nova (1991). A importante atividade de produção artesanal da cidade é organizada em feiras, uma política ainda descontínua, mas bastante visível na cidade nas últimas décadas. Emergem as grandes festas populares organizadas pela Prefeitura Municipal, a exemplo do Betim Rural e da Feira da Paz. Multiplicam-se casas noturnas, bares e centros culturais privados, onde a cidade vive a sua sociabilidade. 3.7. Santo Afonso e a Região Vianópolis: epicentro geográfico da Folia DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 0 As mais remotas notícias da ocupação da região em que nasceu a Folia de Reis do Bairro Santo Afonso remetem ao século XIX. É possível que, já no século XVIII, grandes fazendas da região, como a antiga Fazenda Ponte Nova e a Fazenda Santo Antônio, participassem do abastecimento das Minas coloniais. No interior da primeira, inclusive, desenvolveram-se equipamentos públicos, como capela, cemitério, escola, estação de trem e centro comercial. É possível que o primeiro núcleo urbano da hoje Região Vianópolis tenha sido mesmo o atual Bairro Santo Afonso, à época chamado Povoado do Buraco. Formado a partir de antigos moradores da Fazenda Santo Antônio, este povoado era a principal referência urbana da região, além da Fazenda Ponte Nova, até por volta da década de 20, quando a inauguração da Estação Ferroviária Melo Viana, localizada no atual centro urbano do Bairro Vianópolis, e a abertura da rodovia MG 050 tornou este último bairro o mais relevante como núcleo de povoação. No povoado do Buraco, erigiu-se um cruzeiro em torno do qual se davam as atividades sócio religiosas da comunidade. Por volta da década de 30, erigiu-se uma Capela nas imediações do cruzeiro, sendo esta dedicada a Santo Afonso, cuja devoção não era tradicional na comunidade, mas era uma escolha de um dos membros de sua elite, que doou a imagem. Aos poucos, o povoado passou a ser chamado Buraco de Santo Afonso, e depois apenas Santo Afonso. A relevância desse povoado nas primeiras décadas do século XX é evidenciada pelo fato de esta ser uma comunidade-pólo das celebrações católicas, juntamente com a Capela de São José/São Sebastião da Fazenda Ponte Nova. O vigário da Paróquia de Nossa Senhora do Carmo, Padre Osório Braga, ia a cavalo celebrar no povoado, com grande cortejo, atraindo toda a vizinhança. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 1 Depois que se formou um núcleo urbano na localidade de Moreiras, hoje bairro Vianópolis, após a inauguração da Estação Ferroviária Melo Viana e da rodovia estadual MG 050, Santo Afonso perdeu sua relevância regional. Ainda há vestígios de seu período áureo na arquitetura local, a exemplo de sedes de fazendas, antigos estabelecimentos comerciais e organizações religiosas. Hoje, porém, o lugar é como um retiro no interior da cidade. 4. A FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO – UMA HISTÓRIA Ainda não há pesquisas aprofundadas sobre a história das folias em Betim. A memória dos mais ativos líderes das últimas folias da cidade, a exemplo do Sr. Odorino Avelino Siqueira, remetem a Joaquim Maximiliano o pioneirismo desta manifestação em Betim. Em meados do século XX, Joaquim Maximiliano faleceu, aos 96 anos, ainda como “embaixador”de sua folia. Isso remete as origens de seu grupo aos meados do século XIX. Desde então, entre as décadas de 1930 e 1970 do século passado, emergiram outros grandes foliões, como João Belarmino, Joaquim Nicolau, Antônio Pinto de Carvalho, José Arésio, José Ventura e o próprio Odorino, que eram também profundamente ligados às tradições do Rosário. Um exemplo da atividade das folias nessa época é que a Igreja de São José Operário, no Bairro Cachoeira, foi construída com recursos arrecadados pela folia, assim como aconteceu, nos anos 80, com a Folia de São Sebastião de Pimentas, que contribuiu ativamente para a construção da capela local. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 2 Entre os anos 70 e 90, Betim chegou a sediar encontros de folias, alguns deles com fomento público, já na perspectiva de revitalizar uma manifestação em desaparecimento. Porém, os líderes foliões foram progressivamente perdendo seus grupos, pelo envelhecimento e morte, pela conversão a outros credos, entre outros fatores. Muitos deles participam de encontros de folias nos municípios vizinhos, como São Joaquim de Bicas e Santa Terezinha de Minas, distrito de Itatiaiuçu, e também integram grupos de música caipira, como forma de manter os antigos laços de sociabilidade. A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso está em atividade pelo menos desde a década de 1920. Segundo informações do atual mestre-da-folia, Sr. Osmar Gonçalves Diniz, a memória do grupo chega até seu bisavô, o Sr. Chico Campestre, que foi seguido na liderança da folia pelos ancestrais Joaquim Nicolau (anos 1940, aproximadamente), Antônio Izidoro, Milton Pedro Cândido (lembrado carinhosamente como Tio Hamilton ou Tio Milton) e, agora, o Sr. Osmar. Conta o Sr. Osmar que, em sua infância, no final dos anos 40 e início dos 50, os foliões saíam de casa no dia 25 de dezembro e só retornavam no dia 06 de janeiro, dormindo em sedes de fazenda e até em meio a milharais, exaustos de tanto dançar. O sacrifício e o sofrimento faziam, então, parte do conceito da folia, como nos mostra Eloísa Brantes (2007), que estudou uma folia na qual cada saída ainda pode durar 27 horas ininterruptas. Nas décadas de 50 a 70, a Folia viveu curtos episódios de desativação, geralmente pela morte de um líder e a conseqüente transição da liderança, sendo o período mais longo de inatividade o compreendido entre a saída de Antônio Izidoro e a ascensão de “Tio Hamilton”. Em 1978, estando a Folia desativada, e tendo começado no Brasil as discussões sobre o Ano Internacional da DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 3 Criança (1979), a família Gonçalves Diniz, com destaque para Eduardo Gonçalves Diniz e outros líderes da comunidade de Santo Afonso, resolveu fazer uma festa de Natal para as crianças. Foram levantados donativos na comunidade, sendo a principal contribuinte uma fábrica de brinquedos de Matozinhos. Muitos brinquedos foram angariados e sorteados entre as crianças, sendo a festa um sucesso. Nessa ocasião é que surgiu a idéia de reativar a Folia de Reis, para encampar a festa de Natal das crianças, nos anos seguintes. “Tio Hamilton”, então, assumiu a liderança da Folia, que até hoje reverte parte das oferendas arrecadadas para presentear as crianças. Durante a década de 80, os foliões mais ativos e líderes de todo o grupo, juntamente com “Tio Hamilton”, foram: Antônio Lúcio (cavaquinho e voz), Geraldo Lírio (violão e voz); José Lúcio (caixa e cantos dos palhaços); Ermínio (sacoleiro da Folia, o que recebia as oferendas) e Tarcísio (caixa e voz). “Tio Hamilton” é o ancestral de mais cara memória para os foliões atuais. Detinha uma propalada habilidade de versejar e conhecia profundamente os fundamentos da folia. Preparou seus continuadores, o sobrinho Osmar, atual mestre-da-folia, e também o principal cantador, Enderson “Liquita”. Após o seu falecimento, em novembro de 2004, embora tenha recomendado a continuidade da Folia, esta deixou de “sair” naquele ano, devido ao luto, voltando à atividade no final de 2005. No ano de sua morte, “Tio Hamilton” indicou os que deveriam continuar a sua obra. Os foliões também guardam histórias sobre a confecção artesanal de seus instrumentos. A caixa mais antiga de que os foliões se lembram era feita com couro de boi e sua afinação foi feita com cipó. O mais antigo reco-reco de que se lembram foi feito com bambu. Os foliões, durante o processo de registro da Folia, fizeram uma réplica daquele DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 4 antigo reco-reco de bambu para que a equipe de pesquisa o registrasse em fotografia. A folia, assim, rememorou. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 5 5. A FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO E SUA RELAÇÃO COM O MUNICÍPIO DE BETIM A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso, até por sua localização geográfica, numa das extremidades do território municipal, e também por sua característica de manifestação tradicional residual, tem escassas relações com o Município de Betim em sua globalidade. Essa relação tem acontecido especialmente através das mídias locais que, no ciclo da folia, 25 de dezembro a 06 de janeiro, principalmente, procura remanescentes dessas manifestações para a elaboração de matérias ilustrativas das datas e fenômenos comemorativos. E, sendo a Folia de Santo Afonso a mais ativa de que se tem notícia no território municipal, ela se torna uma das mais procuradas. A Folia é, ainda, independente do poder público municipal no que diz respeito ao financiamento. Tem autonomia organizativa, não sofrendo intervenções na montagem da manifestação, como acontece com outras manifestações tradicionais, a exemplo do Reinado de Nossa Senhora do Rosário (congado). Eventualmente, a Folia de Santo Afonso participa de eventos relacionados à cultura do Município, como encontros de folias, realizados esporadicamente nos anos 90 e 2000. A atuação desta Folia tem cunho regional – na Regional Administrativa Vianópolis – onde é conhecida e requisitada DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 6 por muitos, e sua relevância para o registro como patrimônio cultural do Município se dá, não necessariamente por ser reconhecida em todo o território municipal, mas por ser um remanescente forte da cultura foliã. O reconhecimento e fomento desta folia pode lhe garantir abrangência municipal, para que sirva de referência e incentivo a outras manifestações foliãs. 6. DESCRIÇÃO DOS LUGARES E SUPORTES FÍSICOS E AGENCIAMENTO DO ESPAÇO PARA A ATIVIDADE A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso tem como sedes a casa do mestre-da-folia, Osmar Gonçalves Diniz, situada à Rua Governador Valadares, n. 415, no Bairro Santo Afonso, em Betim. Ali ficam guardados os objetos da folia, especialmente a indumentária dos palhaços, as bandeiras e os instrumentos. Ali se reúnem os foliões, por volta das 19h de cada dia, entre 26 de dezembro e o primeiro sábado após o dia de reis, 06 de janeiro, para as visitas diárias. A casa do Sr. Osmar é uma edificação térrea, ampla, com sala, cozinha e varandas amplamente freqüentadas pelos foliões. Está implantada num conjunto de dois lotes, num dos quais se encontram as ruínas da antiga casa das professoras da comunidade, construída pelo governo do Estado para abrigar as mestras designadas pelo serviços público estadual que prestavam serviçosem Santo Afonso, num período em que as professoras formadas em escolas DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 7 normais ainda eram raras e disputadas. No mesmo terreno, vive sua filha Patrícia e seu genro Giovanni, ambos profundamente envolvidos com a Folia e seus anfitriões. O amplo terreno onde está implantada a casa do Sr. Osmar permite que várias dezenas de foliões se concentrem a cada dia do ciclo da folia, para ensaios e estreitamento das relações. A concentração começa ao anoitecer e a Folia costuma sair entre 20h e 20h30. Esta folia não mais faz giros ininterruptos e não mais bate à porta dos moradores para realizar visitas. As visitas são agendadas diretamente com o mestre-da-folia, e os foliões seguem em seus carros quando o destino é os bairros vizinhos, Marimbá, Pimentas, Açude, etc. Apenas quando as visitas acontecem no próprio bairro Santo Afonso, na Rua Governador Valadares, os foliões vão a pé. Os bairros da Regional Vianópolis podem ser caracterizados como um mix de rural e urbano. Ela constitui parte do cinturão verde de Betim e seus núcleos urbanos, as sedes dos bairros, são dispersos. Há muitas áreas de fazendas e sítios. O próprio Bairro Santo Afonso é muito extenso, por isso suas diversas regiões são denominadas especificamente pela população; é o caso de Barro Branco e Cana Velha. A maioria das casas visitadas pela Folia de Reis do Bairro Santo Afonso, conforme se observou nos anos 2009/2010 e 2010/2011, está localizada nos núcleos urbanos, especialmente no Bairro Santo Afonso e no vizinho contíguo, Marimbá. Neste último ciclo, a Folia visitou quarenta e duas casas da região, restando ainda muitos convites não atendidos. Tanto na casa do mestre-da-folia, quanto na casa visitante, o presépio é o pólo de atenção da Folia. Esta folia dá preferência a casas que ainda montam presépios, DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 8 por esta razão. Estas casas, segundo os foliões, estão cada vez mais raras, e foram menos de uma dezena em 2010/2011. Em geral, a folia começa sua atividade diária no exterior da residência ou instituição a ser visitada, especialmente varandas ou halls, se houver. Ali se realizam os cantos de entrada. Se houver presépio, o momento seguinte da manifestação se dará junto a ele – os cantos de presépio. Novamente no espaço mais público, acontecerão as negociações entre os palhaços e os anfitriões, para a obtenção de oferendas, e também os cantos de despedida e agradecimento. A Capela de Santo Afonso é um outro lugar-referência desta Folia. Nela acontece o “arremate” da Folia, desde sua reativação, nos anos 70. A Capela foi construída das primeiras décadas do século XX, sendo provável que a Folia tenha contribuído para a sua construção. São muito recorrentes os relatos de que as folias da região revertem sua arrecadação para a construção de capelas comunitárias. No “arremate” da Folia, acontece missa festiva, na qual os foliões têm participação especial, e depois, no galpão de apoio da igreja, uma construção aberta, com colunas e telhado, o grupo folião faz seu encerramento, com muitos cantos e performances corporais. Cerca de duas centenas de pessoas se reúnem para a culminância. 7. A FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO – FORMATO, CONTEÚDOS, NARRATIVAS, SIGNIFICADOS DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 5 9 A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso tem sua abertura, todos os anos, no dia 26 de dezembro, na casa de seu mestre, o Sr. Osmar Gonçalves Diniz. Seu evento de abertura é uma oração diante do presépio. Diferentemente do costume geral das folias, que têm sua abertura em 24 de dezembro, a Folia de Santo Afonso prefere dar início às suas atividades depois do Natal, para não atrapalhar as ceias das famílias. Este é um dos muitos sinais da sensibilidade da Folia aos regimes de vida contemporâneos. O grupo é composto por um número variável de foliões, entre 30 e 60. Entretanto, há um grupo mais fixo, que exerce as diversas funções presentes na manifestação (músicos, cantores e palhaços), e que soma trinta pessoas; a função de palhaço tem grande rotatividade a cada noite, havendo na comunidade cerca de vinte jovens aptos a exercê- la. Segue-se uma síntese dos conteúdos e significados das diversas funções exercidas na Folia. Os palhaços Três personagens desta Folia vestem, a cada noite, “fardas” e máscaras, para viver os “palhaços”: o Velho, o Bastião e o Benedito. As fardas são coloridas sendo as mais utilizadas, atualmente: a do Bastião vermelha, a do Velho “ramalhada” (chita com ramagens graúdas) e a do Benedito “chitada” (chita com motivos miúdos)9. O grupo guarda 9 Os termos entre aspas foram utilizados por D. Maria de Lourdes Benevides Diniz (entrevista em março de 2009), e ela se referia a alguns dos conjuntos de indumentárias que a Folia usa hoje. Foram observados alguns conjuntos que não observam esse padrão, adotando tecidos sintéticos que, segundo relatos ainda de D. Maria (janeiro de 2010), têm sido rejeitados pelos jovens que exercem a função de palhaços. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 0 várias fardas, todas confeccionadas com recursos da comunidade. É interessante registrar que D. Maria de Lourdes Diniz, esposa do Sr. Osmar, é referenciada com respeito pelos foliões, por ser a guardiã das roupas da Folia. Bastião é a personagem que abre o caminho da Folia; ele leva um chicote para afugentar animais que habitem as casas visitadas pelos foliões e que os ameacem. Seu nome e sua atuação na Folia fazem alusão a São Sebastião, considerado, na religiosidade popular, o santo protetor contra pragas, pestes e animais peçonhentos. O chicote é usado também em uma das principais danças do grupo, a “dança do chicote”, e também como forma de assustar espectadores que estejam desprevenidos durante as evoluções. Esse palhaço usa atualmente uma farda inteiramente vermelha, em alusão a um santo mártir, e faz voz grossa em suas intervenções. O Velho é quem carrega a bandeira da folia, uma peça com a representação pintada dos três reis magos junto à estrebaria em que está o Menino Jesus, e adereçada de fitas e flores; ele apresenta a Folia, conversa com o dono da casa para que a receba, ou seja, é o líder da encenação. Representa o mais idoso e sábio Rei Mago. Ele é quem primeiro dança, e logo faz uma parada abrupta, interrompendo também a execução musical, para pedir ao dono da casa a primeira esmola da noite. Atualmente, usa farda de chita, máscara negra com uma cruz sobre a cabeça e uma barba longa, que o identifica como uma autoridade anciã. Benedito leva um bastão adereçado com flores, usa máscara negra, e, como o Velho, farda de chita. Este palhaço é uma alusão a São Benedito e sua presença na Folia pode significar o desejo de prosperidade para as famílias visitadas, pois o santo referido é padroeiro das mesas fartas. O bastão é relatado em outras folias como uma DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 1 alusão às espadas dos soldados de Herodes, com as quais estes defenderam o Menino Jesus das perseguições. E também como uma referência ao cajado dos pastores presentes no relato tradicional do nascimento de Jesus. Na tradição das folias, essas três personagens representam os três Reis Magos, o que se revelaespecialmente em suas máscaras: a do Velho é marcada pela barba e por uma estrela na testa, representando o mais idoso entre os três reis magos; a do Benedito é negra, para representar um rei africano, e o próprio São Benedito, que é africano; e a do Bastião é amarelada, representando um rei do extremo Oriente. Na Folia de Reis de Santo Afonso, todos usam máscaras negras, exceto o Pastorinho, que usa a máscara amarelada. Em algumas folias, a representação dos Reis Magos está separada da representação dos palhaços propriamente ditos, chamados “Herodes”, conforme nos informou o Sr. Antônio Pinto de Carvalho, folião de outra tradição em Betim. Os “Herodes” representam os soldados enviados à Judéia pelo governante romano homônimo, que queria o assassínio do Menino Jesus. Esses soldados, porém, encantados pela criança, optam por não matá-la e se disfarçam de palhaços para escapar ao ódio de Herodes. Na Folia de Santo Afonso, os Reis Magos e os palhaços estão representados nas mesmas pessoas. Uma quarta figura aparece entre os palhaços na Folia de Santo Afonso: um palhaço-criança, chamado “Pastorinho”. Isso se deve, segundo o Sr. Osmar Gonçalves Diniz, ao fato de que as crianças têm grande participação nesta Folia e sempre manifestam o desejo de se vestir como palhaços. Assim, essa possibilidade foi aberta pelos foliões mais velhos, de forma que, desde cedo, as crianças aprendem as tradições e as performances da Folia. Quem introduziu essa inovação na Folia foi o próprio Sr. Osmar, nos anos 90, e DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 2 depois da primeira performance do Pastorinho, o ancestral “Tio Hamilton” deu sua permissão para que se continuasse a experiência. O primeiro Pastorinho foi Itamar, hoje adulto e ainda folião. Mateus Diniz, 14 anos, é um dos que exercem a função de Pastorinho; ele tem uma pequena sanfona que imita a sanfoninha de oito baixos de seu avô, o Sr. Osmar, a quem vê tocar na Folia desde os quatro anos de idade. O pequeno Luís Otávio já é figura obrigatória entre os palhaços, com destacada performance nas danças e brincadeiras; é o mascote da Folia de Santo Afonso. Keuller Fernando da Silva Souza também está entre os “pastorinhos” da Folia atualmente; hoje aos 14 anos, iniciou-se na Folia aos 10, não sendo filho de folião. Porém, por ser primo de Liquita, acompanha a Folia desde cedo e encantou-se com suas performances e brincadeiras. Por serem pequenos e leves, os pastorinhos são elevados e jogados pelos demais, proporcionando momento de alegria e encantamento nesta Folia. Cantadores e músicos Além dos palhaços, a Folia de Santo Afonso tem a presença dos cantadores, com destaque para Enderson “Liquita” e também para a participação das mulheres. “Liquita” é o puxador das vozes, sendo “respondido” por dois grupos de rapazes e, finalmente, dois grupo de moças. Enderson Junior Benevides (Liquita) começou na Folia desde o falecimento do “Tio Hamilton”. Sobrinho do Sr. Osmar, acompanha a Folia desde criança, passando pelas funções de dançante (palhaço), cantador das respostas e, finalmente, o principal cantador. Além dessa função, Liquita ordena o grupo, corrigindo os palhaços e representando a tradição: “Pra mim, é uma religião. Tem DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 3 gente que vem pela festa, pela batucada, mas aquilo tem que representar alguma coisa para você” (entrevista em janeiro de 2010). Liquita interpreta os cantos de chegada, presépio e despedida e, aparentemente, é o indicado do Sr. Osmar para ser seu continuador na liderança da Folia. Logo após Liquita interpretar cada quadra dos cantos, um grupo de jovens faz a primeira resposta, que repete toda a quadra; a seguir, um outro grupo de vozes masculinas, a segunda voz, repete apenas o último verso da quadra, o que também é feito imediatamente pelas vozes femininas e pelas vozes masculinas mais agudas, sendo estas vozes conhecidas como “quinta” e “requinta”. Os instrumentos em uso na Folia de Santo Afonso são: a sanfona de oito baixos tocada pelo Sr. Osmar; o violão e o cavaquinho, o reco-reco, dois a quatro chocalhos tipo xique-xique, dois a quatro pandeiros, e duas caixas, sendo uma delas a caixa-bumbo. Em geral, a Folia sai com quatorze músicos. Alguns instrumentos são considerados pelos foliões como inadequados a essa manifestação, embora apareçam ocasionalmente: o acordeom, o tarol e o triângulo, por exemplo. O formato A cada uma das noites de seu ciclo, a Folia se concentra por volta das 19h na casa do Sr. Osmar, após a jornada diária de trabalho. A saída se dá por volta de 20 h, horário em que os foliões chegam do trabalho e reúnem familiares para a peregrinação do grupo. O Sr. Osmar tem a agenda da noite, a partir dos convites que recebe e das casas que tradicionalmente visita. Segundo ele, não é mais possível que a folia percorra as ruas pedindo para ser recebida porque “as DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 4 religiões estão muito misturadas hoje” e há pessoas que não reconhecem a folia ou a identificam como bagunça (entrevista em março de 2009). Apesar disso, sempre restam famílias que desejam receber a folia e não há espaço em sua agenda, dado que, geralmente, acontecem três visitas por noite. A Folia se dirige, na maioria das vezes, em automóveis próprios até os locais das visitas. Ao chegar, em silêncio, ela se organiza em frente à porta. Os palhaços, com a bandeira, o cajado e o chicote, postam-se diante da porta. O puxador Enderson Liquita e os músicos com sanfona, caixa e violões ficam junto aos palhaços, sendo que os músicos se postam de frente para Liquita, que conduzirá a execução musical. Atrás de Liquita se organizam os grupos de cantadores: o primeiro e o segundo vozes masculinas (“aduetos”, como diz S. Joaquim, primeira e segunda vozes, como diz S. Osmar); e o primeiro e o segundo grupo de vozes agudas, a “quinta” e a “requinta”. Então, Liquita puxa o canto: “E agora, vamos chegando/ pra dentro do seu terreiro/ para cantar e dançar/ Mas sentar perto primeiro”. O canto de entrada, composto por diversas quadras, é executado até a senha “Abre, abre a sua porta/ Abre a sua portaria”, quando o dono-da-casa acende a luz e abre a porta. Os palhaços então o abordam, perguntando se está disposto a dar “esmola” ao Santo Reis, mediante as brincadeiras dos palhaços. Isto combinado, se a casa tem presépio, é executado o canto do presépio, mais algumas quadras executadas no padrão da Folia. Então têm início as danças e brincadeiras dos palhaços. As danças são executadas a partir de um segundo padrão musical da Folia. O puxador dos cantos é o Sr. Joaquim Alves Diniz, que executa quadras irreverentes conforme o palhaço a dançar. Enquanto ele canta, o palhaço como que “aquece” o corpo. Depois, os músicos da Folia adotam um DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 5 ritmo forte, de batucada, e então o palhaço executa sua dança, procurando ser original e engraçado. Tendo o dono da casa apreciado a dança, ele dá uma esmola, geralmente em moedinhas, que é depositada pelo palhaço na sacolinha da Folia, hoje guardada a cada noite por uma menina. Assim, as meninas também têm precocemente a sua iniciação na Folia. Os palhaços se apresentam até que se esgotem as esmolas do dono da casa. Então, é feito o canto de agradecimento, por Liquita, sendo a performance da Folia a mesma que se dá no canto de entrada.Em muitas casas, a Folia recebe um lanche após a manifestação. De qualquer forma, a última casa a ser visitada a cada noite sempre está programada para oferecer o lanche. O “arremate” ou encerramento da Folia de Reis de Santo Afonso acontece no primeiro sábado após 06 de janeiro. Esse arremate tem acontecido na Capela local, com barraquinhas e leilões, nos quais se vendem algumas das oferendas recebidas pela Folia, como garrafões de vinho, cachaça, porcos e novilhas. No interior das casas visitadas, é desejável que esteja montado um presépio, onde a Folia se “ajoelha”. Ou, como sintetizou S. Joaquim Diniz, “o destino da folia é visitar o presépio” (entrevista em março de 2009). Diante dele, acontece o auge da folia, “as vozes se encaixam” e alguns espectadores até se assustam com a intensidade da manifestação. Assim, a folia está intrinsecamente ligada à montagem de presépios nas casas visitadas, uma prática ainda presente na região de Vianópolis, mas que vem rareando. Ainda em relação à importância dos presépios para as folias, manda a tradição que os palhaços não se deixem identificar durante as visitas. Porém, diante do presépio, eles são obrigados a levantar a máscara, em respeito ao Menino Jesus. Os palhaços experientes fazem manobras, como DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 6 se esconder atrás de objetos, para não serem reconhecidos nem nesse momento. A atividade da folia também depende da sensibilidade e conhecimento sobre as tradições foliãs por parte das lideranças católicas que atuam na região. O Sr. Osmar relata que, no início de 2009, o presépio da Capela de Santo Afonso foi desmontado antes do dia do arremate da Folia10 e que, por isso, às vezes considera a possibilidade de realizar o arremate em sua própria casa. Um folião de Santa Terezinha de Minas informou ao Sr. Osmar que o encerramento na casa do mestre-da-folia é tradição em diversas regiões, o que lhe deu tranqüilidade para considerar a possibilidade da mudança. Este episódio ilustra bem como se dão as trocas de saberes e experiências entre os mestres de folia, contribuindo para a contínua renovação da manifestação. No início de 2010, o encerramento das atividades aconteceu mesmo na Capela e, neste início de 2011, o templo se encontra em reforma, tendo a Folia realizado seu arremate na residência do Sr. Osmar, e depois apresentações públicas e o lanche de encerramento na Escola Municipal Alcides Braz. É no arremate que as crianças são presenteadas. O dia de dar presentes, segundo os foliões, é o dia 06 de janeiro, dia em que os Reis Magos presentearam o Menino Jesus com ouro, incenso e mirra, e não no dia 25 de dezembro, como se convencionou no Natal ocidental. As doações à Folia de Reis do Bairro Santo Afonso são feitas em dinheiro, havendo um ou outro donativo tradicional, a exemplo dos que foram citados como leiloáveis. O saldo das oferendas é utilizado para comprar 10 O presépio da Capela foi desmontado no dia 06, como manda a tradição religiosa, mas o arremate da Folia só aconteceu no dia 08, um sábado, dia convencionado pelos foliões de Santo Afonso. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 7 os presentes das crianças e o restante é confiado à Conferência de São Francisco de Assis, também ativa na comunidade. Os cantos Quem detém os saberes sobre os versos cantados na Folia de Santo Afonso é principalmente Enderson Liquita. O Sr. Joaquim é normalmente responsável pelo “sapecado”, conjunto de versos cantados para a dança dos palhaços, o que é uma característica específica deste grupo, não necessariamente presente em outras folias; cada palhaço tem seu canto específico que, depois de executado, é seguido por uma forte batucada, ocasião em que o palhaço desenvolve sua performance, sendo o próprio palhaço quem determina o fim dos sons. Durante a apresentação dos palhaços, há improvisos e a apresentação de versos compostos sobre temas variados, que visam o divertimento dos foliões. Alguns dos cantos da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso são: Cantos de chegada ou de entrada E agora vamos chegando Pra dentro do seu terreiro Para tocar e dançar E sentar perto primeiro11 Oh, meu nobre cidadão 11 A estrutura da execução do canto é a seguinte: Liquita (puxador) canta os quatro versos; o primeiro grupo de vozes masculinas, chamado de “resposta” ou “adueto”, repete os quatro versos; o segundo grupo de vozes masculinas, chamado de “segunda voz” ou “segundo adueto” repete apenas o último verso, em timbre grave; as moças que fazem a “quinta” e a “requinta” repetem apenas o último verso, agudamente. Duas vozes masculinas agudas participam da quinta e da requinta. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 8 Que mora aqui neste fundo Receba os Santos Reis Para ser feliz no mundo Oh, meu nobre cidadão Que dentro da casa está Receba os Santos Reis Eles vêm te visitar Bandeira de Santo Reis Ela vem te visitar Ela vem tirar esmola Para um dia festejar Santo Reis saiu no mundo Visitando rico e pobre Retirando a sua esmola Cada um dá o que pode Oh, Senhor dono da casa Generoso e singular Dá esmola pra bandeira Que temos que viajar Oh, senhor dono da casa Generoso e singular Dá esmola pra bandeira Para nós agradecer Abre, abre a sua porta Abre a sua portaria (3x) Receber os Santos Reis Filhos da Virgem Maria DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 6 9 Cantos de presépio Ora, vamos, meus pastores! Visitar o Menino Jesus que nasceu em Belém. (Texto falado por Liquita antes do canto) Caminhamos, caminhamos Para a gruta de Belém Visitar o Menino Deus Que nasceu para o nosso bem 25 de dezembro Esse foi o grande dia Nascia o Menino Deus Filho de José e Maria 25 de dezembro Quando o galo deu sinal Nascia o Menino Deus Numa noite de Natal De Jessé nasceu a vara Da vara nasceu a flor E da flor nasceu Maria De Maria o Salvador “Sapecados” – cantos para as brincadeiras dos palhaços Aprendi tocar sanfona Na sanfona de taquara Esse povo está dizendo Tocador de meia-cara12 12 A execução do canto, feita por Joaquim Alves Diniz, obedece à seguinte estrutura: Joaquim canta a quadra duas vezes, conforme o palhaço escolhido, pelo dono da casa, para dançar. Depois, a folia DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 0 Oh, Pastorinho Que veio fazer aqui? Veio cantar e dançar Fazer o povo rir Oh Pastorinho Que veio fazer aqui? Veio comer minha paçoca Beber meu (...) O velho mais a velha Fizeram uma combinação O velho dorme na cama A velha dorme no chão Menina, quem te contou Que essa noite serenou? Eu deitado no seu colo Sereno me molhou Joguei meu chapéu pra cima Chapéu parou no ar Peguei com Nossa Senhora Chapéu tornou voltar Oh, Bastião Que veio fazer aqui? Essa dança diferente É a dança do siriexecuta os instrumentos num forte ritmo de batucada, para a dança efetiva do palhaço em questão. A voz de Joaquim é de difícil audição pelo conjunto da Folia. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 1 Sabiá comeu mamão Jogou a casca no chão Eu também quero jogar Na cara do Bastião Cantos de saída, agradecimento ou despedida13 Deus lhe pague a vossa esmola Que nos deu tão de repente Deus o tenha lá na glória Com o Divino Onipotente Deus lhe pague a vossa esmola Que nos deu com alegria Deus o tenha lá na glória Aos pés da Virgem Maria Deus lhe tenha lá no céu Aos pés da Virgem Maria Deus lhe tenha lá na glória Com o Divino Onipotente Retiramos oh meu rei Com a bandeira da guia Deus lhe pague a bela esmola Pagarei neste louvor Retiramos oh meu rei Com a bandeira da guia Bandeira de Santos Reis Tem a nossa companhia 13 São executados com a mesma estrutura dos cantos de entrada. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 2 Aqui nesta casa fica São José, Jesus, Maria Deus lhe pague, Deus lhe ajude E até o ano que vem Viva o Santo Reis! (Texto falado por Liquita e repetido por todos) Performances corporais As danças dos palhaços constituem momentos de rara beleza na Folia de Santo Afonso. Além da dança do chicote, já citada, e das danças urbanas contemporâneas, trazidas pelos jovens, a exemplo da “dança da garrafa”, foi citada a “tremedeira”, cujo maior virtuose foi o Sr. Joaquim Diniz, e que não é mais executada hoje porque nenhum folião a domina. A dança do chicote constitui uma espécie de ápice da apresentação da Folia, e consiste em o palhaço dançar sem tocar o chicote, que está estendido no chão, sendo tanto mais apreciado quanto mais originais e velozes são os movimentos. Outra dança bastante presente na Folia de Santo Afonso é um palhaço simular espasmos e desmaio no chão; os outros palhaços o tocam no pulso e no peito para curar o súbito mal-estar. Faz parte da encenação fazer parecer verdadeiro o desmaio. Observa-se também a “paradinha”, que consiste em surpreender o auditório com paradas abruptas, sinalizadas pelo palhaço que dança. Uma outra dança tradicional dos palhaços é a “perninha”, que consiste em dois palhaços se darem as mãos e dançarem, um conferindo equilíbrio ao outro. Em 2011, foi observada a dança-do-siri, anunciada pelos palhaços como uma novidade. Os palhaços a executam de lado, em postura corporal que lembra de fato o siri. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 3 O papel do dono-da-casa na Folia Em 01 de janeiro de 2010, o casal Antônio e Dolores, moradores do Bairro Santo Afonso, receberam a Folia. Eles permaneceram com a porta fechada, até que o canto de entrada entoou: “abre a sua portaria!”. Então, o Sr. Antônio ajoelhou-se, beijou a bandeira e recebeu o cajado, levado nesta ocasião pelo palhaço “Pastorinho”. A seguir, começa a encenação dos palhaços com os donos da casa, para pedir esmolas. Na residência observada, os homens da família saem para a varanda, para negociar com os palhaços; eles parecem ter reservado uma certa quantidade de dinheiro para a Folia, mas esta só faria jus a estes recursos se sua atuação fosse original e agradasse aos moradores. As negociações em torno das esmolas duraram quarenta minutos nesta ocasião. Os palhaços atuam na “luta” pela esmola - o Bastião disse: “Vão [Vamos], patrão, pagar, uai, tá difícil demais, uai!”. Encena-se também uma certa competição entre os palhaços, para ver quem vai conquistar mais donativos. Agradar ao dono da casa e obter muitas ofertas é condição para o palhaço continuar atuando como tal. As esmolas são pedidas várias vezes e os donos da casa anunciam quais são os palhaços com melhor performance. Também podem dizer que um certo palhaço está muito preguiçoso, e por isso a esmola é regateada. As brincadeiras dos palhaços denotam a apropriação de elementos das culturas contemporâneas na Folia. Na apresentação de 01 de janeiro de 2010, foram utilizadas expressões como: “Mata o Velho!”, “Peraí que eu vou ali recarregar a bateria”, ou “Vou dar corda aqui” (fazendo o gesto de dar corda nas costas de um parceiro que demonstrava cansaço). Mais uma evidência da constante DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 4 recontextualização dos conteúdos culturais no interior da manifestação, indício da sua vitalidade. 8. OS PROTAGONISTAS DA FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO: TRAJETÓRIAS, PAPÉIS, FUNÇÕES, ORGANIZAÇÃO As principais lideranças da Folia de Santo Afonso são: 1. Osmar Gonçalves Diniz – Mestre-da-folia, vive na comunidade de Santo Afonso desde seu nascimento, onde seu grupo familiar está radicado desde pelo menos o final do século XIX. Sua casa é a sede da folia, onde ficam guardados seus apetrechos. De liderança afetiva e carismática, Osmar apresenta uma firmeza em relação aos conteúdos básicos da folia e orienta o comportamento do grupo. Toca uma sanfona de oito baixos, com grande sensibilidade performática. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 5 2. Joaquim Alves Diniz – Irmão de Osmar, toca caixa e puxa os cantos dos palhaços. É também um guardião e transmissor dos saberes tradicionais do grupo. Vive no Bairro Cachoeira, contíguo à Regional Vianópolis, também um tradicional reduto de antigos foliões. 3. Enderson Júnior Benevides – Sobrinho de Osmar, é o atual puxador dos cantos da Folia, caixeiro e o virtual continuador do atual mestre. Aprendeu grande parte dos seus saberes com o ancestral “Tio Hamilton”. Osmar divide com Enderson “Liquita” as tarefas de decisão sobre a Folia. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 6 São os componentes mais freqüentes da Folia: 1. Osmar Diniz – Sanfona 2. Enderson “Liquita” – Caixa e voz 3. José Silva (da Mercearia Silva e Lane) – Violão 4. Barbosa – Reco-reco 5. Nely – Violão 6. Joaquim Diniz – Pandeiro, caixa e voz 7. Artur – Palhaço, pandeiro e voz 8. Nilton – Pandeiro 9. Rosilene (Pretinha) – Xique-xique (compositora e possível puxadora de alguns cantos da Folia nos próximos anos) 10. Raquel – Xique-xique e voz 11. Renata – Xique-xique e voz 12. Fernanda – Xique-xique 13. André – Xique-xique 14. Giovanni – Xique-xique 15. Adilson – Palhaço e voz 16. Guilherme – Palhaço e voz 17. Júnior – Voz 18. Paulo Henrique – Voz 19. Rafael – Voz e palhaço 20. Jayverson – Voz 21. Warley - Voz DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 7 22. Sildésia – Voz 23. Letícia – Voz 24. Patrícia – Voz 25. Ana Luísa – Voz 26. Zé Coringa – Voz 27. Paulo Bicó – Voz 28. Mateus Diniz – Palhaço e voz 29. Luiz Otávio – Pastorinho 30. Keuller – Pastorinho 31. Luciano – Palhaço 32. Geraldo – Palhaço e voz 33. Tafarel – Palhaço e voz 34. Pedro – Palhaço e voz 35. Marcos Vinícius – Palhaço 36. Arlindo – Palhaço e voz DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 8 9. OS RECURSOS PARA A REALIZAÇÃO DA FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSOA Folia de Reis de Santo Afonso é financiada comunitariamente. Seus instrumentos e indumentárias formam um acervo antigo, raramente renovado, e confeccionado pelos próprios foliões. As mulheres dos mestres-da-folia, como D. Ilza Ferreira Cândido e D. Maria de Lourdes Benevides Diniz, preparam e mantém a indumentária. D. Ilza, viúva de “Tio Hamilton” é reconhecidamente quem melhor confecciona as máscaras dos palhaços e costurava pessoalmente suas indumentárias. Os fartos lanches que finalizam cada noite de peregrinações da Folia de Santo Afonso são preparados pelas famílias anfitriãs. O Sr. Osmar Gonçalves Diniz declarou em entrevista, em março de 2009, que prefere não obter financiamento público para a Folia, para evitar que ela se torne dependente desses recursos. Ele prefere ajuda na pesquisa sobre a tradição folia do que propriamente no financiamento. Um importante montante de recursos arrecadado pela Folia vem das oferendas dos moradores visitados durante o ciclo anual. Esses recursos, que podem alcançar em torno de R$ 200,00 em cada noite, servem para a compra de comida, guloseimas e brinquedos para o público participante da culminância. O restante é revertido para a Conferência de São Francisco de Assis, atuante na comunidade. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 7 9 10. PRODUTOS DA FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO São produtos da Folia de Santo Afonso: 1. A indumentária dos palhaços, produzida pelas mulheres da comunidade, e que consiste em calças e camisas de manga comprida, largas, para servirem em todos os palhaços atuantes, e também em máscaras negras, conforme inventário anexo a esta documentação. 2. As performances corporais específicas da Folia, constituídas pelas seguintes, identificadas: “perninha”, dança do chicote, tremedeira, paradinha, dança da garrafa, dança do siri. 3. Os cantos da Folia, geralmente herdados da tradição foliã, porém adaptados e combinados entre si, com ênfase para os “sapecados”, improvisados pelo Sr. Joaquim Diniz para a dança dos palhaços. 4. A documentação fotográfica produzida pelos foliões para registrar sua trajetória. 5. A bandeira e o cajado, objetos devocionais de suma importância na Folia. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 0 11. A FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO E SUAS RELAÇÕES COM O PÚBLICO A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso cumpre uma evidente função social de renovar e manter fortes os vínculos de solidariedade na comunidade de Santo Afonso. Ao funcionar em torno do clã dos Gonçalves Diniz, agrega também aqueles que se ligam à família pelo matrimônio, bem como os vizinhos, amigos e conhecidos. Atua no auxílio mútuo às famílias carentes da região e canaliza a criatividade, a integração entre as gerações, entre os velhos e os novos costumes. Reconcilia a religiosidade e o profano, pela via da irreverência dos palhaços. A Folia é convidada para apresentações em outras regiões de Betim, além de Vianópolis, e também nos municípios vizinhos, e já foi documentada em vídeo pela Missão Ramacrisna e pela TV Betim. Os próprios familiares guardam numerosos registros das últimas festas. Além dos participantes diretos da Folia, há aqueles que a acompanham e, todos juntos, totalizam até cerca de duas centenas de pessoas a cada noite. Alguns são migrantes de Santo Afonso para outras regiões da Região Metropolitana de Belo Horizonte, para outros bairros de Betim e até para São Paulo, que retornam à comunidade de origem para as festas de fim-de-ano e recessos de verão, e aproveitam para participar da Folia. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 1 Os foliões são receptivos com os visitantes, e assim atraem novos componentes. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 2 12. INVENTÁRIO 12.1. INVENTÁRIO DA FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO Município: Betim Distrito: Sede (Regional Vianópolis) Designação: FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO Categoria: Celebração Endereço: Rua Governador Valadares, 415, Bairro Santo Afonso Agentes da Manifestação: Família Gonçalves Diniz do Bairro Santo Afonso Líderes da Manifestação: Osmar Gonçalves Diniz, Joaquim Alves Diniz e Enderson Júnio Benevides Periodicidade: Anual Contextualização da Manifestação: A manifestação pertence ao acervo cultural do catolicismo popular brasileiro. É uma celebração contextualizada no ciclo de festas natalinas, que foram instituídas nos primeiros séculos da era cristã, considerando celebrações inclusive anteriores ao advento desta era, as festas da natividade das divindades. No caso específico das folias de reis, trata-se de atualizações da narrativa sobre o nascimento de Jesus, especialmente da DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 3 visita dadivosa dos chamados reis magos a este menino. Celebrações com este caráter específico surgem na Europa medieval, a partir do traslado dos restos mortais dos supostos reis para vários pontos do continente, como relíquias sagradas. A presença dessas relíquias motivou a criação cultural em diversas linguagens, inclusive folguedos populares que receberam diversas configurações em cada país onde se desenvolveram. Em Portugal, esses folguedos foram chamados folias e tinham um caráter de festejo profano. Trazidas para o Brasil a partir do século XVI, as folias deram origem a diversas manifestações em regiões diferentes, dentre elas o reisado, as pastorinhas, os bois e as próprias folias de reis. Com essa última configuração, ocorrem principalmente no sudeste brasileiro, mas há relatos de expansão dos grupos até para o extremo sul. O formato básico das folias de reis é a visitação às residências de devotos dos Santos Reis e a louvação à bandeira desses santos, que são entendidos como uma unidade, e também ao presépio, que representa o Jesus menino e seus pais. Os grupos de folias são formados em geral por três palhaços, que representam os reis magos e também os soldados romanos enviados para perseguir o recém- nascido, porém convertidos à sua causa; músicos e cantores. Além dos momentos de devoção, as folias expressam também a irreverência e o profano, nas brincadeiras dos palhaços destinadas a obter esmolas dos visitados, esmolas essas geralmente revertidas para a manutenção do culto católico nas comunidade e para o auxílio mútuo. Histórico: A memória da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso remonta aos anos 20 do século XX. Não há mais conhecimentos sobre a fundação da Folia e suas primeiras ações, porém os mais velhos narraram aos atuais líderes DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 4 quais foram os primeiros mestres desta Folia, a saber João Belarmino e Joaquim Nicolau, tradicionais foliões e congadeiros das primeiras décadas do século XX em Betim, e depois Chico Campestre e Milton Pedro, em meados do mesmo século. Este último reativou a Folia em 1978, depois que ela estivera alguns anos parada devido à morte do antigo líder. Desde então, a Folia só foi interrompida no ciclo natalino de 2004/2005, após a morte do próprio Milton Pedro, ocasião em que a Folia guardou luto. A reativação da Folia esteve associada ao Ano Internacional da Criança (1979) e, desde então, tem revertido sua arrecadaçãopara presentear as crianças no dia de Reis. Descrição: A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso é um empreendimento cultural do clã Gonçalves Diniz, desde seus primórdios. Os atuais patriarcas e também os jovens foliões pertencem a esta família, à qual se agregam aqueles recebidos em matrimônio e também vizinhos, amigos e conhecidos. A Folia sai com entre 30 e 60 componentes, capazes de revezamento nas diversas atividades. Cerca de 20 jovens e crianças estão aptos a atuar como palhaços e, a cada noite, quatro se apresentam. Há cerca de 15 músicos fixos, que tocam sanfona de oito baixos, violão, viola, reco-reco e caixas, e mais duas dezenas são capazes de se revezar com chocalhos e pandeiros. Há dois puxadores dos cantos, Enderson Júnio Benevides (Liquita) e Joaquim Alves Diniz, e mais oito cantores que fazem as respostas, além de dez mulheres que se revezam na voz chamada de “requinta”, a última resposta dos cantos da Folia. A atuação da Folia pode ser descrita nos seguintes termos: 1. O Sr. Osmar Gonçalves Diniz, mestre-da-folia, agenda visitas da folia com devotos da comunidade, isto é, o Bairro Santo Afonso e bairros vizinhos, especialmente DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 5 Marimbá, geralmente três visitas a cada noite, entre 26 de dezembro e 06/08 de janeiro. 2. A Folia vai a pé até a casa a ser visitada, se esta for próxima da casa do Sr. Osmar. Se for distante, a Folia segue em carros próprios para o destino. Ao chegar, vai até a porta da casa em silêncio e se organiza diante dela. Todos prontos, Enderson “Liquita” puxa o canto de chegada ou entrada: “E agora vamos chegando / para dentro do seu terreiro...”. Quando o canto, composto de cerca de vinte versos, respondidos a cada dois deles, chega à senha “abre a sua portaria”, o dono da casa visitada acende a luz e abre a porta. Os palhaços entram na casa irreverentemente e negociam com o dono para apresentarem suas danças em troca de esmolas. 3. Aceita a proposta pelo dono da casa, o Sr. Joaquim Gonçalvez Diniz assume a função de puxador dos cantos. Ele canta quadras humorísticas, dedicadas a cada palhaço, para que este dance. Em geral, é o dono da casa que escolhe o palhaço a dançar de cada vez, e avalia seu desempenho dando esmolas. Na performance dos palhaços, as pernas e pés são os recursos corporais mais utilizados. As danças incluem as tradicionais “perninha” e dança do chicote, e também as contemporâneas dança da garrafa e dança do siri. Enquanto o dono da casa tiver esmolas para dar, os palhaços dançam e se expressam com tiradas de humor. 4. Se a casa tem presépio, a Folia adentra a sala de visitas e faz o canto do presépio, puxado por Enderson Liquita. Se não, como tem acontecido geralmente na comunidade ultimamente, Liquita conduz os cantos de agradecimento e despedida, configurados semelhantemente aos cantos de entrada: “Deus lhe pague DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 6 a vossa esmola / Que nos deu com alegria / Deus o tenha lá na glória / Aos pés da Virgem Maria”. 5. Frequentemente, os donos da casa oferecem um lanche à Folia ao final do evento. Documentação fotográfica: Importância da Manifestação: A Folia é uma importante expressão dos valores e padrões de devoção e sociabilidade na comunidade em que ocorre. Os conteúdos que ela veicula são adotados como parâmetros de DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 7 vida pelos seus agentes e, nesta comunidade, a manifestação permanece como uma forma de manter laços de sociabilidade horizontais entre vizinhos, de redistribuir recursos, de ordenar a conduta, de formar a juventude e mantê-la longe de certos riscos, como a violência urbana e as drogas lícitas ou ilícitas. Vitalidade da Manifestação: A Folia de Santo Afonso apresenta grande vitalidade. Análise da Vitalidade: É uma folia grande, na qual a maioria das funções pode ser desempenhada por diversos foliões, em revezamento. Atualmente, as únicas funções de difícil transmissão são a confecção das máscaras e a execução da sanfona. Há muitos jovens na Folia, inclusive o virtual continuador do atual mestre, que deverá ser Enderson Júnio Benevides. Há uma grande presença de crianças e mulheres na Folia. Fatores de Degradação: Os líderes da Folia de Santo Afonso identificam o alcoolismo como um dos principais fatores de degradação das folias de reis. Assim, apesar de a oferenda de bebidas alcoólicas fazer parte do ritual da folia nas residências visitadas, este grupo tem como estratégia não consumir bebidas durante as visitas, mas apenas na festa de “arremate”. Os participantes da assistência, porém, podem portar um vinho para consumo durante as atividades. É evidente que o enfraquecimento do catolicismo, a laicização da sociedade e a experiência típica da vida urbana e do trabalho, não mais associada aos ritmos da semeadura e da colheita, e sim aos ditames da produtividade cotidiana, promovem mudanças na forma como as práticas da folia se concebem e são conduzidas. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 8 Um olhar ortodoxo sobre esta manifestação poderia interpretar algumas mudanças, como as danças urbanas veiculadas pela mídia, o fato de a folia não poder mais fazer percursos a pé ou não mais pedir de fato a entrada nas casas, como sinais de degradação. A literatura, entretanto, indica que, em todas as regiões de ocorrência dessas manifestações, as folias vêm introduzindo mudanças que viabilizam sua sobrevivência, sem colocar em risco seu conteúdo básico, que é a reatualização da história do nascimento do Menino Jesus. Ao mesmo tempo em que muda dinamicamente, para dialogar com os ritmos próprios da vida contemporânea em Santo Afonso, a Folia também tem contato com lideranças das folias na micro-região em que está Betim, a fim de dialogar com a tradição e não esquecer seus conteúdos. Medidas de Conservação: São recomendáveis, para o fomento da vitalidade da Folia, as seguintes medidas: ações de educação patrimonial na comunidade, para o conhecimento dos conteúdos da Folia; desenvolvimento de eventos de musicalização (canto e instrumentos), que oportunizem a transmissão desta função no interior da Folia; realização de oficinas de confecção de indumentárias, instrumentos e máscaras de folia Proteção Legal Existente: Inventário (2009) Proteção Legal Proposta: Registro como patrimônio imaterial do Município Informações Complementares: Entrevistas com Antônio Pinto de Carvalho (março/2009), Joaquim Alves Diniz (março/2009), Osmar Gonçalves Diniz (março/2009, janeiro/2010, janeiro/2011) e Enderson Júnio Benevides (janeiro/2010). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 8 9 Referências: FONSECA, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas: Betim, sua História. 1711-1975. Betim: Prefeitura Municipal de Betim, 1975. GOLOVATY, Ricardo Vidal. A folclorização da cultura popular: a folia de Santos Reis no Jornal Correio de Uberlândia, 1984-2002. História e perspectivas, Uberlândia (32/33): 221-244, Jan. Jul./Ago.Dez, 2005. GOMES, Ana Claudia. Histórico da Vida Religiosa em Betim. Pesquisa encomendada pela Articulação Comunicação & Marketing. Betim - MG, 2005 (texto não-publicado). PAULINO, Rogério Lopes da S. Máscaras vivas ou em extinção? Tradição e renovação nasfolias de reis. In: IV REUNIAO CIENTIFICA DE PESQUISA E POS GRADUAÇÃO EM ARTES CENICAS, Belo Horizonte, 2007. Ficha Técnica: Levantamento: Adriana de Araújo Lisboa, Otília Sales Neta, Ana Claudia Gomes (março de 2009 a janeiro de 2011) Elaboração: Ana Claudia Gomes (janeiro de 2011). Revisão: Ana Claudia Gomes (janeiro de 2009). Fotografia: Adeildo Silva (janeiro de 2010). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 0 12.2.INVENTÁRIO DE BENS IMÓVEIS Município Betim Designação Capela de Santo Afonso Distrito Sede - Regional Vianópolis Endereço Rua Governador Valadares, s/n, Santo Afonso - Betim MG Propriedade Eclesiástica Responsável Paróquia Nossa Senhora do Rosário e São Sebastião Situação de ocupação Própria Análise de Entorno A Capela Santo Afonso se encontra na Rua Governador Valadares. Esta via é pavimentada com asfalto, tem aproximadamente 7 metros de largura e não tem passeio. Como referência, notam-se o sítio Recanto das Estrelas e a Granja Santo Afonso, assim como o ponto final do ônibus linha 830. Nota-se um tipo de adensamento de tipologia rural, com terrenos de área maior que o lote padrão urbano. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 1 Documentação Fotográfica Interior da Capela de Santo Afonso em mar/2009 Capela de Santo Afonso em agosto/2009 Capela de Santo Afonso em agosto/2009 – Observar o galpão anexo, onde acontecem atividades da Folia DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 2 Capela de Santo Afonso em reforma/ janeiro 2011 Capela de Santo Afonso em reforma/janeiro 2011 Galpão da Capela de Santo Afonso, onde acontecem as brincadeiras dos palhaços Reforma (Janeiro de 2011) Histórico A Capela do Bairro Santo Afonso foi construída em 1922 pela senhora Maria Beatriz no seu próprio terreno. Dona Maria Beatriz era muito religiosa e antes de construir a referida Capela, edificou em seu terreno um Cruzeiro onde a comunidade por muitos anos tinha o costume de fazer orações DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 3 de terços, novenas e às vezes até missas e festividades religiosas. O Padre da Paróquia Nossa Senhora do Carmo de Capela Nova de Betim viajava quilômetros em comitiva de carros de boi e cavalos, com muitos fiéis da Paróquia, para a celebração da Missa no Cruzeiro do povoado de Santo Afonso que nesta época se chamava povoado do Buraco. Dona Maria Beatriz, extremamente Mariana, construiu próxima ao Cruzeiro esta Capelinha, que foi referência para a comunidade local e de regiões vizinhas, pois até então a Capela mais próxima do povoado do Buraco; era a Capela de São Sebastião da Fazenda Ponte Nova, a quilômetros dali e que foi demolida na segunda metade do século passado. A Capela, construída então na década de vinte, recebeu uma imagem de Maria e a comunidade local atribuiu a iconografia da mesma à da Imaculada Conceição, pois a santa tinha seus pés esmagando a cabeça de uma serpente. Portanto, a Capela passou a ter o nome de Capela da Imaculada Conceição. Algum tempo depois, os fiéis descobriram que a imagem não era da Imaculada Conceição, mas de Nossa Senhora das Graças, pois a Imaculada possui as mãos postas no peito e outras características iconográficas diferentes da imagem existente na Capela, que possuía as mãos abertas e estendidas. Mas a comunidade continuou atribuindo a Capela à Imaculada Conceição e todos os anos, no mês de maio, as crianças do sexo feminino se vestiam de virgens para coroar a Imaculada Conceição. O Sr. José Pinto, nascido na região e conhecido como Juca Pinto, era uma liderança do povoado do “Buraco”, e devoto de Santo Afonso Maria de Ligório, que foi Bispo e Doutor da Igreja, conhecido por sua devoção pela Imaculada Conceição e por Jesus Crucificado. Em 1943 o Sr. Juca Pinto foi padrinho de uma Imagem de Santo Afonso Maria de Ligório. Antigamente, os devotos não utilizavam a palavra comprar quando adquiriam imagens sacras, pois acreditavam que o termo era uma ofensa ao sagrado. A DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 4 expressão utilizada nesta circunstância era “trocar o Santo”, e quem patrocinava a troca eram os padrinhos dos santos - pessoas da comunidade devotas daquele santo. Há indícios de que o nome da região mudou de “Buraco” para Santo Afonso devido a esta devoção de algumas lideranças da comunidade a Santo Afonso Maria de Ligório. Não se sabe ainda se antes da imagem que o Sr. Juca Pinto “trocou”; para a Capela em 1943 existia outra mais antiga do mesmo santo. O que se sabe, através de depoimentos de moradores antigos, é que todos os anos havia a trezena de Santo Afonso que ocorria de primeiro a treze de julho na Capela de Dona Maria Beatriz ou Capela da Imaculada Conceição. Nesta trezena, havia barraquinhas, leilões e outras atividades que aglomeravam pessoas de varias regiões vizinhas e do centro de Betim. Devido à organização dessas festas e devoção ao Santo, aos poucos o imaginário popular deixou de atribuir a Capela a Nossa Senhora da Imaculada Conceição e passou a chamá-la popularmente de Igrejinha de Santo Afonso. Não existem registros históricos precisos sobre a época em que se substituiu a toponímia da Região. O que se sabe, como já mencionado, é que com o tempo a população foi deixando de lado o signo toponímico que fazia alusão a um acidente físico na geografia do lugarejo “Buraco”, e gradualmente foi se identificando e adotando uma toponímia que fazia referência ao santo devotado na Capela do povoado Santo Afonso. Nos primórdios da Capela a comunidade local já era bastante ativa e havia uma Folia de Reis formada pelos clãs da região, orações de terços e muitas quermesses. Nas ultimas décadas do século passado a Capela intensificou sua atividade, com missas semanalmente; além das tradições já mencionadas, havia também uma conferência de São Vicente de Paula no mesmo terreno da Capela e outras diversas atividades como grupos de teatro formados por pessoas da Tapera, Pimentas, Cana-Velha, DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 5 Marimbá e Santo Afonso. Esse grupo se apresentava em datas comemorativas da tradição Católica e principalmente na Semana Santa. A Capela de Santo Afonso sofreu diversas intervenções ao longo dos seus 87 anos. Nos registros da Cúria Metropolitana consta que a mesma é a Capela mais antiga da Paróquia da Regional Vianópolis, por isso constitui um bem cultural de relevância histórica para a região. A Capela de São Sebastião da Fazenda Ponte Nova, que seria mais antiga do que a de Santo Afonso, além de ter sido demolida há muitos anos, nunca foi registrada oficialmente como patrimônio da Mitra Metropolitana e nem como imóvel da diocese de Divinópolis. Uso Atual Institucional Descrição Edificação em partido retangular, com empena em frontão. Estrutura em alvenaria autoportante, piso externo em concreto desempenado e piso interno em cerâmica de tom avermelhado 10x5cm. Vãos e aberturas retangulares, uniformemente distribuídos, com fechamento em esquadrias de chapa dobrada e vidro texturizado. Cobertura em telhado de estrutura de madeira e telhas cerâmicas do tipo capa-e-bica sendo o beiral com cachorro. Ofechamento do terreno é feito com pilaretes de concreto e arame farpado. Proteção Legal Existente Nenhuma Proteção Legal Proposta Inventário Estado de Conservação DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 6 A Capela se encontra em reforma Análise do Estado de Conservação A Capela de Santo Afonso está passando por uma renovação total de seus acabamentos. O estado atual demonstra que serão reaproveitadas apenas as estruturas em alvenaria. Relatos orais dão conta de que a intervenção atual na Capela não se deve propriamente a danos estruturais, mas a um desejo de renovação das lideranças da comunidade e sacerdotes. Fatores de Degradação Dado o estado de reforma em que se encontra a Capela, não se aplica a inserção de informações nesse campo Medidas de Conservação Não se aplica. Intervenções De acordo com relatos e imagens antigas da capela, o que se nota é a modificação do telhado, que antes era de telha cerâmica do tipo capa-e-bica sem molde e ultimamente foi de telha cerâmica do tipo colonial capa-e-bica muito comum no mercado. A Capela passa atualmente por uma intervenção renovadora. Referências Bibliográficas Cadernos de Memória - Patrimônio Cultural de Vianópolis. Prefeitura de Betim/MG. Informações Complementares Entrevistas: Antônio Pinto da Silva (Agosto de 2009), Arayldo José dos Santos Filho (Março de 2009), Dolores Cândida da Silva (Agosto de 2009), Maria das Neves Amaral DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 7 (Agosto de 2009), Osmar Gonçalves Diniz (junho de 2009, janeiro de 2010, janeiro de 2011), Zeferina Cândida da Silva (Agosto de 2009). Ficha Técnica Levantamento e elaboração: Adriana das Graças de Araújo Lisboa, Otília da Conceição Sales Neta, Pedro Antonio Brito (novembro/2010 e janeiro/2011) Revisão: Ana Claudia Gomes (janeiro/2011). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 8 12.3.INVENTÁRIO DE BENS IMÓVEIS Município Betim Designação Residência de Osmar Gonçalves Diniz Distrito Sede - Regional Vianópolis Endereço Rua Governador Valadares, 415, Santo Afonso - Betim MG Propriedade Privada Responsável Osmar Gonçalves Diniz e Maria de Lourdes Benevides Diniz Situação de ocupação Própria Análise de Entorno A Residência do casal Osmar Gonçalves Diniz e Maria de Lourdes Benevides Diniz se encontra na Rua Governador Valadares. Esta via é pavimentada com asfalto, tem aproximadamente 7 metros de largura e não tem passeio. Como referência, notam-se o sítio Recanto das Estrelas e a Granja Santo Afonso, assim como o ponto final do ônibus linha 830. Nota-se um tipo de adensamento de tipologia rural, com terrenos de área maior que o lote padrão urbano. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 9 9 Documentação Fotográfica Residência do S. Osmar. Na garagem acontecem ensaios da Folia (Jan/2011) Residência do S. Osmar. Na garagem acontecem ensaios da Folia (Jan/2011) DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 0 Vista posterior da residência (Jan/2011) Uso Atual Residencial Histórico O Sr. Osmar e D. Maria de Lourdes vivem na edificação desde seu casamento, em 1960, ocasião em que foi construída a edificação. Descrição A residência do Sr. Osmar, edificação própria, está implantada num conjunto de lotes onde também se encontra uma antiga edificação que serviu como residência das professoras da antiga escola estadual mista da comunidade de Santo Afonso; encontra-se também no terreno a residência da filha do Sr. Osmar, Patrícia. A edificação inventariada tem partido retangular, é construída em alvenaria e coberta com telhas de fibrocimento e é cercada de varandas, exceto no fundo. Tem três quartos amplos, sala, hall de transição entre a sala, um dos quartos e a cozinha, banheiro, cozinha e sala de jantar. Aos fundos, amplo galpão com telhado, porém sem vedações, é utilizado para acondicionar materiais referentes à continuidade da atividade econômica do proprietário, que mantém este e um outro terreno no entorno. Proteção Legal Existente Nenhuma Proteção Legal Proposta Inventário Estado de Conservação Bom. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 1 Análise do Estado de Conservação A residência vem passando por manutenção e renovação constantes, não apresentando restrições ao uso. Fatores de Degradação Não foram detectados. Medidas de Conservação Manter as iniciativas de manutenção em curso pelo casal proprietário. Intervenções A residência passou por diversas intervenções, inclusive sua ampliação, nos anos 70, quando foram acrescentados um quarto, o banheiro e o atual conjunto de sala de jantar e cozinha. Referências Bibliográficas Não há Informações Complementares Entrevista: Osmar Gonçalves Diniz (janeiro de 2011) Ficha Técnica Levantamento e elaboração: Ana Claudia Gomes (janeiro/2011). Fotografia: André Dias (Projeto Antenados / Missão Ramacrisna (janeiro/2011). Revisão: Ana Claudia Gomes (janeiro/2011). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 2 12.3. INVENTÁRIO DE BENS MÓVEIS 1. Município: Betim 2. Distrito: Sede 3. Acervo: Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4. Endereço: Rua Governador Valadares, 415, Bairro Santo Afonso 5. Proprietário: Osmar Gonçalves Diniz e Maria de Lourdes Benevides Diniz 6. Responsável: Os mesmos 7. Designação: Bandeira de Santos Reis 8. Localização Específica: Aposentos íntimos da casa do casal 9. Espécie: Flâmula 10. Época: 1978 11. Autoria: O casal Milton Pedro Cândido e Ilza encomendaram uma pintura dos Santos Reis a autor desconhecido. D. Ilza confeccionou o conjunto da bandeira. 12. Origem: Comunidade de Santo Afonso, Betim 13. Procedência: Comunidade de Santo Afonso, Betim 14. Material/Técnica: Veludo, cetim, pintura à mão, costura à máquina. 15. Marcas/Inscrições/Legendas: Não há 16. Histórico: A bandeira foi confeccionada em 1979, ano em que se decidiu recomeçar a Folia de Santo Afonso, pelas mãos de Milton Pedro Cândido. Este encomendou a pintura de Santos Reis à mão, e sua esposa Ilza a inseriu a pintura em uma moldura de tecido e a enfeitou pela primeira vez. 17. Descrição: A bandeira é constituída por um quadro central pintado à mão, em que se vêem representados os três reis magos, Baltazar, Belchior e Gaspar. Dois deles têm a pele em tom claro, usam barba. Um deles usa túnica verde e capa em tom amarronzado, e o outro túnica preta, com faixa DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 3 azul na cintura e capa azul. O terceiro rei, negro, usa turbante à moda muçulmana, túnica amarronzada e capa vermelha. A estrela de Belém é representada luminosa acima deles, sobre um céu azul claro. Aos pés dos reis, está o Menino Jesus em simples manjedoura de palha, com cabelos pretos, pele clara e roupa amarronzada. Este quadro está costurado em um quadro maior, de veludinho branco ou palha, servindo-lhe de moldura umafita em cetim dourado. A bandeira é sustentada por um bastão torneado, coberto por fita de cetim dourada. As extremidades da bandeira, na altura do bastão, trazem laços em fitas vermelhas de cada lado e pequenos arranjos de flores e frutos. 18. Documentação Fotográfica: Estampa pintada à mão da bandeira Detalhe da estampa da bandeira DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 4 Detalhe da estampa da bandeira Detalhe, adereço da bandeira 19. Condições de Segurança – Boas. O objeto fica acondicionado nos aposentos íntimos de Osmar e Maria de Lourdes Diniz. 20. Proteção Legal Existente – Nenhuma 21. Dimensões – 70x40 cm 22. Estado de Conservação – Bom. A bandeira apresenta pequenos desgastes (puídos) na parte inferior da pintura à mão. 23. Características Iconográficas – A bandeira traz a clássica representação dos Santos Reis Magos, Baltazar, Belchior e Gaspar, junto à manjedoura do Menino Jesus em Belém, onde chegaram guiados por uma estrela especial, também representada no objeto inventariado. Os Reis Magos trazem recipientes com os presentes com que agraciaram Jesus, ouro, incenso e mirra. 24. Intervenções/Responsável/Data – Todos os anos, a bandeira de Santos Reis da Folia de Santo Afonso é revista DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 5 antes do ciclo natalino. Seus adereços são frequentemente renovados. O tecido e a fita que servem de moldura à representação pictórica dos Santos Reis são trocados de tempos em tempos, quando há desgaste. Apenas a pintura à mão permanece a mesma desde 1979, mas já teve retoques. A responsável pelas intervenções atualmente é D. Maria de Lourdes Benevides Diniz. 25. Referência Bibliográfica: AZZI, Riolando. "A Espiritualidade popular no Brasil: um enfoque histórico". In; Revista Grande Sinal, Petrópolis, Vozes, Ano XLVIII, pp. 293-304, 1994. DAVID, Solange Ramos de Andrade. "Manifestações populares do Catolicismo na Revista Eclesiástica Brasileira -m1963- 1980". In; REB, vol.63, fasc. 251, julho de 2003, pp.601- 614. 26. Informações complementares: Entrevista com Osmar Gonçalves Diniz e Maria de Lourdes Benevides Diniz em janeiro de 2011. 27. Ficha Técnica: Levantamento/elaboração: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011 Fotografia: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011. Revisão: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 6 12.3. INVENTÁRIO DE BENS MÓVEIS 1. Município: Betim 2. Distrito: Sede 3. Acervo: Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4. Endereço: Rua Governador Valadares, 415, Bairro Santo Afonso 5. Proprietário: Osmar Gonçalves Diniz e Maria de Lourdes Benevides Diniz 6. Responsável: Os mesmos 7. Designação: Bastão 8. Localização Específica: Aposentos íntimos da casa do casal 9. Espécie: Bastão 10. Época: 1978 11. Autoria: Milton Pedro Cândido e Ilza Ferreira Cândido 12. Origem: Objeto confeccionado pelas lideranças da Folia de Santo Afonso, em sua reativação, nos anos 70. 13. Procedência: Bairro Santo Afonso 14. Material/Técnica: Madeira, fitas, flores artificiais. 15. Marcas/Inscrições/Legendas: Não há. 16. Histórico: Quando da reativação da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso, em 1978, Milton Pedro Cândido e Ilza Ferreira Cândido confeccionaram o bastão, objeto tradicionalmente presente nesta manifestação. 17. Descrição: Bastão em madeira, adaptado a partir de um cabo-de-vassoura, coberto com fita em tom dourado escuro. Em sua extremidade superior, foram anexadas por amarração flores artificiais. O conjunto tem acabamento em fitas douradas e vermelhas. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 7 18. Documentação Fotográfica: Bastão da Folia de Reis de Santo Afonso Bastão da Folia de Reis de Santo Afonso DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 8 Bastão da Folia de Reis de Santo Afonso 19. Condições de Segurança – Boas. O objeto fica guardado nos aposentos íntimos dos líderes da Folia. 20. Proteção Legal Existente – Nenhuma 21. Dimensões – 1,20m 22. Estado de Conservação – Bom 23. Características Iconográficas – O bastão da Folia é uma alusão ao cajado dos pastores e considerado um apoio utilizado pelo Rei Mago mais velho em suas andanças. Não foi identificado o significado das flores apostas ao bastão da Folia. 24. Intervenções/Responsável/Data: O bastão é renovado quase que anualmente, função que cabe a D. Maria de Lourdes Diniz e à sua filha Rosilene. 25. Referência Bibliográfica: AZZI, Riolando. "A Espiritualidade popular no Brasil: um enfoque histórico". In; Revista Grande Sinal, Petrópolis, Vozes, Ano XLVIII, pp. 293-304, 1994. DAVID, Solange Ramos de Andrade. "Manifestações populares do Catolicismo na Revista Eclesiástica Brasileira -m1963- 1980". In; REB, vol.63, fasc. 251, julho de 2003, pp.601- 614. 26. Informações complementares: Entrevista com Osmar Gonçalves Diniz e Maria de Lourdes Benevides Diniz em janeiro de 2011. 27. Ficha Técnica: Levantamento/elaboração: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011 Fotografia: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011. Revisão: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 0 9 12.3. INVENTÁRIO DE BENS MÓVEIS 1. Município: Betim 2. Distrito: Sede 3. Acervo: Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 4. Endereço: Rua Governador Valadares, 415, Bairro Santo Afonso 5. Proprietário: Osmar Gonçalves Diniz e Maria de Lourdes Benevides Diniz 6. Responsável: Os mesmos 7. Designação: Sanfona de oito baixos 8. Localização Específica: Aposentos íntimos da casa do casal 9. Espécie: Instrumento musical 10. Época: Presumivelmente, década de 1920 11. Autoria: Desconhecida 12. Origem: Desconhecida 13. Procedência: A sanfona foi dada a S. Osmar pelo Sr. Geraldo Rabelo. 14. Material/Técnica: Couro, metal, plástico, madrepérola. Manufatura. 15. Marcas/Inscrições/Legendas: Não há. 16. Histórico: A sanfona foi adquirida pelo Sr. Geraldo Rabelo, para seu filho, cerca do final dos anos 90. Não sendo usada pelo rapaz, o Sr. Geraldo presenteou com ela o Sr. Osmar, sabendo que este gostava de tocar a sanfona na Folia. A sanfona foi reformada por um profissional de Juatuba, que a identificou como sendo, aproximadamente, de 1922, 17. Descrição: Sanfona de pequenas dimensões, com oito baixos, sendo seu fole confeccionado em couro e plástico e sua estrutura externa em madrepérola verde. 18. Documentação Fotográfica: DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 0 Sr. Osmar toca a sanfona Detalhe da sanfona de oito baixos Fole em couro da sanfona 19. Condições de Segurança – Boas 20. Proteção Legal Existente – Nenhuma 21. Dimensões – 40x60 cm (fechada) 22. Estado de Conservação – Bom 23. Características Iconográficas – Não se aplica. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 1 24. Intervenções/Responsável/Data: O Sr. Osmar levou a sanfona para reforma com um profissional de Juatuba, que identificou como antiga e preciosa a sanfona de oito baixos. Esta intervenção aconteceuem meados dos anos 2000. 25. Referência Bibliográfica: AZZI, Riolando. "A Espiritualidade popular no Brasil: um enfoque histórico". In; Revista Grande Sinal, Petrópolis, Vozes, Ano XLVIII, pp. 293-304, 1994. DAVID, Solange Ramos de Andrade. "Manifestações populares do Catolicismo na Revista Eclesiástica Brasileira -m1963- 1980". In; REB, vol.63, fasc. 251, julho de 2003, pp.601- 614. 26. Informações complementares: Entrevista com Osmar Gonçalves Diniz e Maria de Lourdes Benevides Diniz em janeiro de 2011. 27. Ficha Técnica: Levantamento/elaboração: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011 Fotografia: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011. Revisão: Ana Claudia Gomes. Janeiro/2011. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 2 13. IDENTIFICAÇÃO DE ATIVIDADES CORRELATAS Conforme discutido em outros pontos deste trabalho, as Folias são manifestações afins de diversas outras celebrações componentes do catolicismo popular no Brasil, a exemplo dos reisados, das pastorinhas e dos bois. No caso específico das folias, estas ocorrem principalmente nos estados de Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo, estados conhecidos como “corredor das bandeiras”. E apresentam variações: além das folias de reis, temos também as Folias de são Sebastião e de Santa Cruz. Estas últimas têm características musicais e performáticas semelhantes às de reis, porém guardam particularidades devocionais. Na micro-região mineira designada Médio Paraopeba, a ocorrência de folias ainda é bastante freqüente, tanto que se realizam em municípios como São Joaquim de Bicas e Itatiaiuçu tradicionais encontros de folias. Elas, entretanto, são residuais, no sentido de que são compreendidas por segmentos restritos do público urbano, majoritário nessa região. Em geral, os encontros atraem os próprios foliões que, nessas ocasiões, trocam saberes e experiências. Em Betim, a maioria das folias identificadas está inativa. Os patriarcas têm dificuldades na montagem dos grupos, especialmente quando migrantes, não havendo mais grupos familiares extensos nas regiões em que se radicaram, e por grande parte dos vizinhos não mais compreender os DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 3 conteúdos das folias ou terem abandonado as práticas religiosas ou adotado credos não-católicos. Há freqüentes manifestações do desejo de reativar as folias, havendo o fenômeno da reativação de algumas delas neste ciclo natalino de 2010/2011: a Folia de Reis do Bairro Angola, cuja liderança é o Sr. Raimundo Moreira Barbosa; a Folia de Reis e de São Sebastião do Bairro Cruzeiro, na Regional Citrolândia, cujo líder é o Sr. Reservindo. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 4 14. DELIMITAÇÃO E DESCRIÇÃO DA ÁREA DE OCORRÊNCIA A Folia de Reis do Bairro Santo Afonso atua principalmente nos bairros Santo Afonso e Marimbá, da Regional Administrativa Vianópolis. O Bairro Santo Afonso é o mais antigo núcleo urbano da Regional, e tem a Rua Governador Valadares, onde está a sede da Folia, como eixo articulador, no qual estão dispostos os principais equipamentos públicos locais: ponto final da linha 830 de transporte coletivo; a tradicional casa noturna do Itamar, de público popular, conhecida e freqüentada por moradores de toda Betim; a Associação Batista de Assistência Social, grande complexo arquitetônico onde se desenvolvem atividades principalmente educacionais e retiros espirituais; a Capela de Santo Afonso e outros. Trata-se de um núcleo urbano pequeno, ainda entremeado por muitas propriedades de caráter semi-rural, como sítios e chácaras. Entretanto o bairro tem outros núcleos, conhecidos como Cana Velha e Barro Branco. O bairro Marimbá constitui a principal área de metropolização da Regional Administrativa Vianópolis atualmente. Ainda um importante reduto de sítios e fazendas, abriga diversos loteamentos de características populares, onde tanto vivem antigas famílias radicadas na região, como migrantes oriundos das áreas periféricas da região metropolitana de Belo Horizonte e também do interior de Minas. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 5 Ainda há muitos moradores, em ambos os bairros, interessados em receber a Folia, sendo visitados anualmente por ela cerca de 40 residências; porém observa que a vizinhança desses moradores, especialmente no bairro Marimbá, sequer percebe a presença da manifestação, por ser esta ilegível aos não-iniciados. Segundo informações das lideranças da Folia, as casas constantemente visitadas nos últimos anos são: Nome do anfitrião Bairro João Açude Nativa Barro Branco Clemência Barro Branco Marinho Antônio Barro Branco Baiano Barro Branco Maria do Sinval Barro Branco Sinval Barro Branco Salvador Antônio Cândido Barro Branco Vicentina Pinto Califórnia Nilton Diniz Cana Velha Rosalino Benevides Cana Velha Rosilene (Preta) Cana Velha Barbosa Cana Velha Warley (Arlim) Cana Velha Breno Cana Velha Antônio Cesário Cana Velha Neuza Cana Velha Gervásio Cana Velha Eliseu Cana Velha Waldemar Gentileza DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 6 Osmar Jr. (Mazinho) Gentileza Helena Gentileza José Silva (Mercearia Silva e Nane) Marimbá Rita Marimbá Dona Preta Marimbá Carlinhos da Lia Marimbá Zé Brejeiro Marimbá Forró do Itamar Santo Afonso Antônio Pinto Santo Afonso Paulo Bicó Santo Afonso Carlos Gomes Santo Afonso Erci Filomeno Diniz Santo Afonso Carlos e Dinéia Santo Afonso José Maria Cândido Santo Afonso Missão Ramacrisna Santo Afonso Júlio Santo Afonso Adilson Santo Afonso Kathia Diniz Santo Afonso João Santo Afonso Efigênia Santo Afonso Patrícia Santo Afonso Osmar Gonçalves Diniz Santo Afonso DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 7 15. SALVAGUARDA E VALORIZAÇÃO: Recomenda-se, para a adequada salvaguarda e conservação da Folia de Reis e São Sebastião de Santo Afonso: 1. Manter a autonomia do clã Gonçalves Diniz na concepção, execução e liderança da Folia. Algumas das lideranças do grupo, ocasionalmente, reivindicam a intervenção do poder público no sentido de conceder recursos para a Folia, como novos instrumentos. As pesquisas sobre a folia em outras regiões de Betim mostram que, quando o poder público interfere com essa perspectiva (dotar o movimento de recursos materiais), a vitalidade da manifestação cultural fica estritamente dependente da continuidade dessa intervenção. O Sr. Antônio Coló, por exemplo, atribui a desagregação da Folia de Reis do Bairro Cachoeira a essa dependência. É recomendável que a participação do poder público neste movimento se dê no sentido de empoderar a Folia de Reis de Santo Afonso, a fim de que suas lideranças fortaleçam a sua organização e aprendam novos caminhos para combater a escassez e as limitações. Essa perspectiva é forte, por exemplo, no líder Osmar Gonçalves Diniz, quando este reitera que não falta dinheiro para a folia, porque este é dado pela comunidade. 2. Promover o intercâmbio entre as folias de reis de Betim e dos municípios circunvizinhos é uma interessante estratégia de conservação. Como a configuração das foliasé passada de geração a geração, por vias orais, é importante que os detentores dos saberes sobre a folia possam se DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 8 encontrar e conversar, e que as folias possam ver as performances umas das outras. Entretanto, Osmar Gonçalves Diniz não aprecia muito encontros de folias, acha-os artificiais e acredita que muitas das folias que participam desses encontros não existem mais como manifestações devocionais do ciclo natalino; apenas “batem folia” nos encontros. Ele também informa ter dificuldades para reunir seu grupo quando é convidado para tais encontros, devido aos horários de trabalho e limitações na locomoção. 3. Em 2009, a Folia de Reis de Santo Afonso estava sem violeiros fixos. Em 2010, conseguiu recrutar Nely e José Silva, mãe e filho, violeiros, na própria comunidade. Ao longo das pesquisas, o Sr. Osmar relatou que uma de suas principais dificuldades tem sido transmitir os saberes sobre a execução da sanfona de oito baixos. Isso porque ele aprendeu “ouvindo e vendo” seu pai tocar, mas não sabe como ensinar (entrevista em dezembro de 2010). Um de seus netos, Gabriel, está apresentando bons resultados com uma sanfona de brinquedo, vendo seu avô tocar; há esperanças de que ele adquira esse saber. Daí decorre que a formação musical para o canto e a execução de instrumentos pode ser uma importante ação de fomento a esta Folia. A Fundação Artístico Cultural de Betim possui um centro de formação, o Centro Popular de Cultura Joaquim Nicolau, na região, que pode ser o irradiador dessas ações de formação. 4. Atualmente, há apenas uma pessoa na comunidade de Santo Afonso apta a confeccionar máscaras para os palhaços da Folia conforme o rigor das tradições: D. Ilza Cândido. Idosa, ela já nem sempre pode atender às encomendas com muita agilidade. Uma interessante ação DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 1 9 de fomento seria a promoção de oficinas em que esta senhora pudesse transmitir seus saberes, valorizando saberes que ela acumulou ao longo da vida. 5. Na comunidade que envolve a Folia, ainda há muitas famílias capazes de ler os conteúdos desta manifestação. Porém, é evidente que elas vêm diminuindo ao longo dos anos, o que é visível, por exemplo, no desaparecimento dos presépios. Ações de educação patrimonial na comunidade podem contribuir para a retomada do contexto para esta e outras Folias. 6. A Folia de Santo Afonso pode ser um epicentro da retomada de manifestações foliãs em Betim. A ação pública de realização de encontros de folias pode ser uma estratégia para a agregação dos foliões e a ampliação da leitura sobre essa manifestação na cidade. A autonomia do clã Diniz para participar ou não dos encontros deve ser preservada. Cronograma de ações de fomento à Folia de Reis do Bairro Santo Afonso Ações/2011 1º Trim. 2º Trim. 3º Trim. 4º Trim. 1. Apoiar a renovação dos instrumentos e materiais da folia, através do fornecimento de dois couros para as caixas e um xique-xique, apontados pelo x DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 0 Sr. Osmar Gonçalves Diniz como necessidades atuais. 2. Apoiar a renovação da indumentária da Folia, através do fornecimento de tecidos para a confecção de um conjunto de fardas pela comunidade. x 3. Desenvolver projeto de aperfeiçoamento musical da Folia de Santo Afonso, através da técnica vocal, que ajudará a proteger as vozes, especialmente de Liquita e Joaquim Diniz, e da execução de instrumentos musicais. x x 4. Promover oficina de máscaras com a x DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 1 presença de D. Ilza Ferreira Cândido, detentora dos saberes sobre as mesmas. 5. Promover atividades de educação patrimonial na comunidade nas proximidades do ciclo natalino. x 6. Realização de encontro de folias de reis em dezembro, com a montagem de presépio. A Folia de Reis de Santo Afonso será convidada para funcionar como estímulo a outras folias em processo de reativação ou em atividade. x DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 2 16. DOCUMENTAÇÃO FOTOGRÁFICA Folia em 2001 – Última participação de Milton Pedro Cândido (Acervo da foliã Renilda) Interior da Capela de Santo Afonso em 2001, no arremate da Folia (Acervo da foliã Renilda) DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 3 Arremate da Folia em 2001 (Acervo da foliã Renilda) Apresentação da Folia em 2008 DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 4 Palhaço com a máscara levantada diante do presépio / 2008 Folia entra solenemente na Capela de Santo Afonso / 2008 DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 5 As cantoras da Folia / 2008. Festa do arremate da Folia: a comunidade participa de um lanche / 2008. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 6 Folia de Santo Afonso aguarda a abertura da porta na Missão Ramacrisna. 05/10/2010. Solange Botaro abre a porta da Missão (05/01/2010). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 7 Enderson Liquita puxa o canto de entrada (05/01/2010) Negociações entre os palhaços e o dono da casa (05/01/2010). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 8 Performance do Pastorinho e do Benedito (05/01/2010). Performance do Pastorinho e do Benedito (05/01/2010). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 2 9 Performance do Bastião (05/01/2010) Sr. Joaquim e Sr. Osmar Diniz, Barbosa no reco-reco (05/01/2010) DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 0 A “perninha” executada pelo Pastorinho e pelo Benedito (05/01/2010) As anfitriãs da Missão Ramacrisna, Efigênia e Solange Botaro, conduzem a bandeira de Santos Reis (05/01/2010). DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 1 Efigênia e Gilberto, anfitriões da Missão Ramacrisna em janeiro/2011, portam o bastão e a bandeira da Folia, enquanto os palhaços ajoelhados diante do presépio aguardam a execução do canto de presépio, pela Folia A dançado chicote na Missão Ramacrisna em janeiro de 2011. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 2 Músicos e cantadores da Folia. Observar a significativa presença das mulheres. Janeiro 2011 Comunidade de Santo Afonso, presente ao Arremate da Folia em 08/01/2011 DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 3 O presépio da casa do Sr. Osmar, onde se deu o Arremate em 2011. Os músicos da Folia durante o canto de chegada – Arremate da Folia (08/11/2011) DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 4 Os palhaços entram na casa do Sr. Osmar em 08/01/2011. D. Maria de Lourdes os recebe portando a bandeira. Atentar para as máscaras produzidas para este ciclo da Folia. Negociações do Velho com a dona da casa. 08/01/2011 DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 5 Os palhaços se ajoelham diante do presépio (08/01/2011) Folia executa o canto de presépio (08/01/2011) DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 6 Participação do palhaço Pastorinho no Arremate da Folia (08/01/2011) D. Maria de Lourdes negocia com o Bastião (08/01/2011) DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 7 17. REGISTRO AUDIOVISUAL: DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 8 18. REFERÊNCIAS Fontes Orais Antônio Pinto de Carvalho, Antônio “Coló” (Av. Amazonas, 3.998, Bairro Cachoeira) Enderson Júnior Benevides Giovanni Lopes Giovanni Lopes Joaquim Alves Diniz Keuller Fernando Letícia Luciano Maria de Lourdes Benevides Diniz Mateus Diniz Odorino Osmar Gonçalves Diniz Patrícia Rafael Bibliografia ALVES, R. Os três reis. Tempo & Presença, n. 321, p. 33-34, jan./fev. 2002. Disponível em: <http://www2.uol.com.br/aprendiz/n_colunas/r_alves/id151201 .htm>. Acesso em: 30/12/2010. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 3 9 BOLLEME. Geneviéve. O povo por escrito. (Tradução de Antonio de Pádua Danesi). São Paulo: Martins Fontes, 1988. BRANCHES, Eloísa. A espetacularidade da performance ritual no reisado do Mulungu – Chapada Diamantina – Bahia. Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, 27(1): 24-47, 2007. FONSECA, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas: Betim, sua História. 1711-1975. Betim: Prefeitura Municipal de Betim, 1975. FREITAS, Flávia. Salve! Salve a Nossa Cidade... Memória de Betim. Betim: MM Impressão, s/d, 101p. GOLOVATY, Ricardo Vidal. A folclorização da cultura popular: a folia de Santos Reis no Jornal Correio de Uberlândia, 1984-2002. História e perspectivas, Uberlândia (32/33): 221-244, Jan. Jul./Ago.Dez, 2005. GOMES, Ana Claudia. Histórico da Vida Religiosa em Betim. Pesquisa encomendada pela Articulação Comunicação & Marketing. Betim - MG, 2005 (texto não-publicado). MAIA, Tom. O folclore das tropas, tropeiros e cargueiros no vale do Parnaíba. Rio de Janeiro: Funarte: Instituto Nacional de Folclore, 1981. MARTINS, Saul. Folclore em Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG, 1991. MARTINS, Sebastião. Caminhos de minas. São Paulo: Publicações e Comunicações, 1992. MODESTO, Ana Lúcia & PITANGUI, Cleonice. Levantamento Cultural de Betim. Betim: FUNARBE, 1996. (mimeo). PAULINO, Rogério Lopes da S. Máscaras vivas ou em extinção? Tradição e renovação nas folias de reis. In: IV Reunião Científica de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas, Belo Horizonte, 2007. PESSOA, Jadir de Morais. Mestres de caixa e viola. Cad. Cedes, Campinas, vol. 27, n. 71, p. 63-83, jan./abr. 2007. PREFEITURA MUNICIPAL DE BETIM (Secretaria de Planejamento / Divisão de Planejamento). Informativo Municipal - Betim ano base 1999. Betim/MG: Prefeitura Municipal de Betim, 1999. 102 p. RIBEIRO, Cláudia Júlio. Estudo e avaliação do sistema de reciclagem e tratamento de lixo domiciliar de Betim. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 0 Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Engenharia da UFMG. 1997. (Dissertação de Mestrado). RODRIGUES, Maria Lúcia Estrada. A expansão industrial e o processo de produção do espaço em Betim. Universidade de São Paulo. 1980. (Dissertação de Mestrado). RUGANI, Jurema Marteleto. Betim, no caminho que vai das Minas à industrialização. Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Arquitetura da UFMG. 2001. (Dissertação de Mestrado). SILVEIRA, Marco Antônio. Os arraiais e as vilas nas minas gerais. 4 ed. São Paulo: Atual, 1996. SINOPSE ESTATÍSTICA do Município de Betim – Estado de MG – Subsídios para Estudo da Evolução Política – Alguns Resultados Estatísticos – 1945. Principais Resultados Censitários – 1 – IX – 1940 – Rio de Janeiro – Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – 1948. SOUZA, Martha Veloso Cólen Mourthé de et al. Resgatando a História. Betim. Betim: Gráfica da Prefeitura, s/d. STEIL, Carlos Alberto. Catolicismo e cultura. In: Victor Vincent Valla (org.). Religião e cultura popular. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. VASCONCELLOS, Diogo L. Pereira de. História antiga das Minas Gerais. Belo Horizonte, 1974. WELLS, James W. Explorando e viajando três milhas através do Brasil. Do Rio de Janeiro ao Maranhão. Tradução de Myriam Ávila e Introdução de Christopher Hill. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1995. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 1 19. FICHA TÉCNICA Pesquisa e sistematização dos aspectos históricos e geográficos do município Ana Claudia Gomes (Mestre em História pela UFMG (2002) Rodrigo Cunha Chagas (Bacharel Licenciado em História PUC/MG) Henrique Moreira de Castro (Geógrafo Especialista em Percepção Ambiental e Espaço Urbano pela UFMG). Pesquisa e sistematização dos dados históricos e antropológicos sobre a Folia de Reis do Bairro Santo Afonso Adriana das Graças Araújo Lisboa Ana Claudia Gomes Otília Sales Neta Transcrição das entrevistas Ana Claudia Gomes Colaboração nos levantamentos de campo de 2009 Lázaro Mariano Alves Pesquisa bibliográfica, elaboração e revisão Ana Claudia Gomes Documentação fotográfica e audiovisual Adeildo Silva Ana Claudia Gomes Andrey dos Santos (Projeto Antenados – Missão Ramacrisna) Giovanni Lopes (Acervo da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso) Renilda (Acervo da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso) Leandro Dias (Projeto Antenados – Missão Ramacrisna) DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 2 Cristiano Menezes Aguiar Rafael Kenedy Willian Pereira Faustino Thales Gomes da Silva Santos Edição da documentação audiovisual Carolina Miranda Realização Departamentode Memória e Patrimônio Cultural Fundação Artístico Cultural de Betim – FUNARBE Aderbal Hipólito Lara Gomes – Presidente Rodrigo Cunha Chagas – Superintendente Prefeitura Municipal de Betim Maria do Carmo Lara Perpétuo – Prefeita Alex Tadeu do Amaral Ribeiro – Vice-prefeito DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 3 20. TRÂMITE DO REGISTRO DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 4 PROPOSTA DE REGISTRO DE BEM CULTURAL COMO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL DO MUNICÍPIO Nós, Adriana de Araújo Lisboa, Ana Claudia Gomes e Otília Sales Neta, componentes do Departamento de Memória e Patrimônio Cultural da FUNARBE, vimos respeitosamente à presença deste egrégio Conselho para solicitar o registro da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso como patrimônio cultural de Betim. Como historiadoras e cidadãs, vimos acompanhando as atividades da Folia desde 2009, ocasião em que conduzimos o Inventário Participativo do Patrimônio Cultural da Regional Vianópolis; na ocasião, a comunidade indicou a atividade de diversas folias na região, com ênfase para a Folia de Santo Afonso, a mais antiga, autônoma e ativa de que se tem notícia. O bem foi inventariado juntamente com outras duas folias, sua atividade vem sendo divulgada através dos serviços de comunicação da Prefeitura de Betim e suas influências já são sentidas na reativação de outras folias. As possibilidades de que a valorização da Folia de Santo Afonso contribua na reativação e no fortalecimento das manifestações foliãs em Betim são bastante significativas, sendo uma de nossas motivações na solicitação presente. Atenciosamente, Betim, 04 de janeiro de 2011. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 5 Adriana de Araújo Lisboa / Ana Claudia Gomes / Otília Sales Neta Departamento de Memória e Patrimônio Cultural - FUNARBE DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 6 ATA DE APROVAÇÃO PROVISÓRIA DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 7 PARECER TÉCNICO SOBRE O REGISTRO DO BEM CULTURAL Após ter conduzido os trabalhos de pesquisa e sistematização das informações sobre a Folia de Reis do Bairro Santo Afonso, de Betim – MG, manifesto-me favoravelmente ao seu registro como patrimônio cultural deste Município, pelas seguintes razões: 1. Trata-se do único grupo remanescente desta manifestação em atividade ininterrupta há várias décadas em Betim; 2. É um grupo que resguarda diversas das características ancestrais associadas às celebrações da natividade da divindade cristã e que as atualiza frequentemente, permitindo a recontextualização da manifestação na contemporaneidade; 3. Trata-se de um grupo dotado de intensa vitalidade e capacidade de auto-organização e auto-reprodução, o que abre perspectivas de que seu registro e fomento estimulem grupos similares a retomar seus trabalhos de memória e expressão cultural através desta manifestação; 4. As atividades do grupo permitem a experiência de uma manifestação cultural complexa e elaborada, o que reitera o reconhecimento da produção cultural do povo brasileiro e betinense. Betim, 15 de janeiro de 2011. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 8 Ana Claudia Gomes Mestre em História pela UFMG Departamento de Memória e Patrimônio Cultural - FUNARBE PARECER DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DE BETIM SOBRE O REGISTRO DO BEM CULTURAL DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 4 9 NOTIFICAÇÕES/ COMUNICAÇÃO E RECIBOS DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 0 NOTIFICAÇÃO Notificamos ao Sr. Osmar Gonçalves Diniz, mestre da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso, que o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim aprovou o registro desta Folia de Reis como patrimônio cultural de Betim. Informamos que o registro é regido pela Lei Municipal 2.944/1996, que foi regulamentada pelo Decreto 16.389/2000, legislação que determina responsabilidades ao poder público na promoção e fomento dos bens culturais municipais. O registro constitui um estímulo a que a Folia de Reis de Santo Afonso permaneça ativa e conserve seus saberes, visto que esta manifestação enriquece o acervo cultural do povo betinense. Solicitamos que, estando a Folia de Reis de Santo Afonso em concordância com o presente registro, seu líder assine o recibo anexo, manifestando estar ciente desta ação. Betim, 10 de janeiro de 2011. Rodrigo Cunha Presidente Interino do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 1 RECIBO Recebi notificação sobre o processo de registro da Folia de Reis de Santo Afonso como patrimônio cultural do Município de Betim, ação com a qual eu e o grupo de foliões que oriento estamos em acordo. Betim, 07 de janeiro de 2011. Osmar Gonçalves Diniz Mestre da Folia de Reis do Bairro Santo Afonso DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 2 PRONUNCIAMENTO DA INTENÇÃO DE REGISTRO DA FOLIA DE REIS E SÃO SEBASTIÃO DE SANTO AFONSO COMO PATRIMÔNIO CULTURAL DO MUNICÍPIO DE BETIM A Fundação Artístico Cultural de Betim (FUNARBE) e o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim fazem saber que estão sendo desenvolvidos os procedimentos previstos na Lei nº 2.944 de 24 de setembro de 1996, que institui a política municipal de proteção ao patrimônio cultural, e regulamentados pelo Decreto nº 16.389, de 26 de outubro de 2000, que institui o registro de bens culturais de natureza imaterial que constituem o patrimônio cultural de Betim, para o registro da FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO. A proposta de registro partiu da própria Fundação, tendo em vista a exemplaridade e relevância do bem cultural indicado para registro para a memória e a identidade das comunidades culturais que o desenvolvem e o reconhecem, tendo sido aprovada pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim, em caráter provisório, no dia 06 de janeiro de 2011, e em caráter definitivo, no dia 14 de janeiro de 2011. Ao deliberar sobre o registro definitivo, o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim teve em consideração os estudos técnicos, históricos e antropológicos, desenvolvidos pela equipe técnica da Fundação Artístico Cultural de Betim. Em caso de eventuais manifestações da comunidade a respeito da intenção ora pronunciada, estas deverão ser protocoladas junto à Fundação Artístico Cultural de Betim, à Avenida Governador Valadares, 888, Centro, Betim, endereçadas ao Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim, num prazo de 30 (trinta) dias contados a partir da publicação da intenção de registro. Betim, 14 de janeiro de 2011. Aderbal Hipólito Lara Gomes Presidente da Fundação Artístico Cultural de Betim Presidente do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de BetimDOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 3 Publicação DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 4 ATA DE APROVAÇÃO DEFINITIVA DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 5 RENÚNCIA DA FOLIA DE REIS DO BAIRRO SANTO AFONSO AO PRAZO DE IMPUGNAÇÃO DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 6 CÓPIA DO DECRETO OU HOMOLOGAÇÃO DO REGISTRO. DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 7 INSCRIÇÃO NO LIVRO DE REGISTRO DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL Folia de Reis do Bairro Santo Afonso 1 5 8 21. DOCUMENTOS DIVERSOS Matérias da imprensa betinense sobre a Folia