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Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Direito do Trânsito Cidadania e Democracia Desenvolvimento Sustentado Claudio Henrique de Castro Prefácio do Prof. Vitorio Sorotiuk | Fotografias de Lina Faria Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Cidadania e Democracia, Desenvolvimento Sustentado e Direito do Trânsito. Claudio Henrique de Castro Dedico esta obra para minha querida mãe Leda que me ensinou que as coisas mudam, sempre para melhor. Ficha catalográfica elaborada por Maury Antonio Cequinel Junior Bibliotecário CRB9ª/896 Castro, Claudio Henrique de C355 Reflexões sobre o direito e o cotidiano : cidadania e democracia, desenvolvimento sustentado e direito de trânsito. / Claudio Henrique de Castro. Curitiba : Ctrl S Comunicação, 2012. 209 p. 1. Direito 2.Cidadania 3.Democracia 4. Desenvolvimento Sustentado 5. Direito do Trânsito 6. Oratória I.Título CDU 34 Produção gráfica: www.ctrlscomunicacao.com.br Fotos: Lina Faria Revisão gramatical técnica: Professor Adão Lenartovicz FiCHA TéCniCA: Projeto gráfico e capa: Simon Taylor Diagramação: Fernanda Pivatto Prefácio o observatório crítico. Quando ingressei na Faculdade de Direito na Universidade Federal do Paraná lembro-me de um discurso marcante de um estudante citando José Ingenieros: “Juventude sem rebeldia é servidão precoce.” A frase expressa que cada nova geração traz em si uma nova visão de mundo e se forma observando o mundo constituído forçando uma nova existência também no plano das relações sociais e da cultura. Recentemente um músico, ao lhe perguntarem sobre as críticas ao seu estilo musical, respondeu perguntando: “Alguém já viu erguerem uma estátua a um crítico?”, menosprezando a crítica. Onde a razão? Está com um filósofo chinês que disse que, observando os manuscritos dos grandes homens cultos da história da humanidade, observou que, em muitos textos, encontrou partes rabiscadas e corrigidas. Chegou à conclusão de que mesmo os grandes sábios erravam. E eram sábios justamente porque sabiam se corrigir. Essas reflexões são necessárias para enfrentar os textos de Claudio Henrique de Castro em suas reflexões sobre o Direito e o cotidiano: Cidadania e Democracia, Desenvolvimento Sustentado e Direito do Trânsito. Pois o direito é movimento, expressão do novo e do velho na sociedade, de interesses em conflito, busca incessante em dar a cada um o que é seu. A análise jurídica deve ser feita com a técnica da elaboração do direito, mas com o conteúdo cultural, social em histórico, em uma sociedade de conflitos. Essa é a riqueza do novo livro do autor: a observação crítica sobre os problemas atuais da nossa existência como o exercício da cidadania, o trânsito cujas estatísticas revelam uma guerra civil oculta permanente e a questão urgente, vital e planetária que é a sustentabilidade ambiental. Para os amantes da observação crítica, da democracia, da pluralidade de ideias, as indagações e assertivas do autor significam uma soma ao pensamento crítico da sociedade sobre a sua existência. VITORIO SOROTIUK Advogado e Professor de Direito Ambiental da Faculdade de Ciências Jurídicas Tuiuti. Formado em Direito pela UFPR, Mestre em Direitos Sociais e Econômicos pela PUCPR, Diplomado em Estudos de Desenvolvimento pela Universidade de Genebra – Suíça. reSUMo A presente obra é uma coletânea de artigos do autor, publicados em sites e blogs. Discutem-se temas relacionados com cidadania, democracia, desenvolvimento sustentado e direito do trânsito. O foco da obra explora o cotidiano das cidades e as questões de infraestrutura do estado brasileiro. Os textos buscaram uma linguagem objetiva e acessível às pessoas sem formação jurídica. As fotografias de Lina Faria complementam a reflexão dos assuntos abordados. Palavras chaves: Cidadania, Democracia, Desenvolvimento Sustentado e Direito do Trânsito. ABSTrAcT This book is a collection of articles by author, publi- shed on websites and blogs. Discuss topics related to citi- zenship, democracy, sustainable development and the law of transit. The focus of the work explores the daily life of cities and infrastructure subjects in the Brazilian state. The texts have sought an objective language and accessible to people without legal training. Lina Faria’s photographs complement the discussion of the issues addressed. Keywords: Citizenship, Democracy, Sustainable Development and the Law of Transit. SUMário i. cidadania e Democracia 1.1. O cotidiano no interminável 0800 ..................................17 1.2. Juros sobre juros e o perigo do melado. A capitalização dos juros autorizada pelo STJ ..............22 1.3. As razões que perpetuam a impunidade no Brasil .......26 1.4. As licenças de táxis hereditárias em Curitiba ................30 1.5. A Busca da Dignidade e do Respeito aos Professores ..........................................33 1.6. Os desvios do dinheiro público na publicidade ............42 1.7. O STF, as cotas raciais e as cotas de ensino público ......47 1.8. Afinal, por quais razões pagamos impostos? .................51 1.9. Corrupção custa 100 bilhões por ano aos bolsos dos brasileiros ..................................54 1.10. A República Brasileira e o Custo Brasil ........................56 1.11. O julgamento do médico de Michael Jackson e a Justiça brasileira ........................................................60 1.12. O Ensino Superior na rede privada em Curitiba e região metropolitana: cenário atual e perspectivas para os professores ................................63 1.13. O aumento da remuneração das Polícias no Paraná ....................................................69 1.14. A profissionalização da Polícia (PEC 300/2008) e a gradativa união das Polícias Civil e Militares é uma tendência mundial ..............................................72 1.15. A segurança e o porte de armas no Brasil ....................80 1.16. As desventuras jurídicas do Caso Battisti ....................83 1.17. Considerações preliminares quanto às inovações da Lei Complementar 135/2010 (Lei da Ficha Limpa) ...88 ii. Desenvolvimento Sustentado 2.1. A recente produção legislativa do Congresso Nacional e o Desenvolvimento do Brasil ...........................................94 2.2. As novas leis de mobilidade urbana e de prevenção às infrações contra a ordem econômica à luz do transporte nas cidades .......................................98 2.3. O Novo Fundo de Previdência Complementar do Governo Federal: sua sustentabilidade e os efeitos sobre o desenvolvimento ............................101 2.4. Os aeroportos brasileiros na ficção da infraestrutura .............................................................108 2.5. A invasão de privacidade e a necessária plataforma tecnológica de infraestrutura para resguardar os direitos dos Cidadãos e do Estado .......112 iii. Direito do Trânsito 3.1. A imposição legal de câmeras em bares e casas noturnas em Curitiba e os acidentes de trânsito .........118 3.2. É possível reduzir os acidentes envolvendo motociclistas no trânsito do Brasil? ..............................121 3.3. A grande contribuição do STJ para a cultura da impunidade que reina no Brasil ...............................127 3.4. Locatário também paga por multas de trânsito ..........133 3.5. Estádio, estrada e uma morte que poderia ser evitada ........................................................................137 3.6. A obrigatoriedade de sinalização no uso de equipamentos de monitoramento de velocidade e a Resolução 396 do Contran ..............1413.7. O EstaR é legal? ...............................................................145 3.8. Resolução 363 do Contran é adiada .............................149 3.9. As novas funções da URBS e algumas questões ainda sem respostas ........................................................154 3.10. Advogado da Comissão de Trânsito da OAB questiona URBS ............................................................158 3.11. Os pedestres e o Direito de Trânsito no Brasil ..........160 3.12. Trânsito: as regras mais descumpridas. As bebedeiras, os acidentes de trânsito e o Estado ..164 3.13. Pontos para se discutir a paz no trânsito. Sugestões para diminuir o inferno no trânsito .........168 3.14. Das ilegalidades do reconhecimento de firma do condutor e do proprietário para recorrer em multa de trânsito ....................................................171 3.15. Os motoboys, a indústria da morte e a nova lei nº 12.436/2011 ..............................................................175 3.16. Sem multas, com emprego ...........................................179 3.17. O lado quente da Comissão de Trânsito ....................181 3.18. De volta para o futuro: a suspensão do direito de dirigir e a contagem de pontos retroativa no prazo de cinco anos ................................................188 3.19. As multas da URBS e a decisão do STJ ......................200 3.20. A Inconstitucionalidade das Novas Alterações do Código de Trânsito .................................................203 iV. oratória 4.1. Professor dá dicas para advogados desenvolverem boa oratória ......................................................................206 Sites onde os textos foram publicados amoc1cic.com.br http://blogdojj.com.br/ promotordejustica.blogspot.com.br www.abla.com.br www.acidentesdesastres.com.br www.asarmasmundial.blogspot.com www.blogdajoice.com.br www.blogdozebeto.com.br www.blogsoldacaustico.com.br www.colunamisterx.blogspot.com www.crimesdelitos.com.br www.egov.ufsc.br/portal/ www.espacovital.com.br www.fichacorrida.wordpress.com.br www.guiasaojose.com.br www.intelog.com.br www.invesditura.com.br www.jorgeyared.blogspot.com.br www.jornaldidata.com.br www.jornale.com.br www.jornaloestadodoparana.com www.jusbrasil.com.br www.louzada.adv.com.br www.metavendasbrazil.com.br www.paranaextra.com.br www.promotordejustica.blogspot.com.br www.psc.org.br www.rentacarnews.com.br www.sindilocpr.com.br www.sinpes.org.br Democracia cidadania e 17Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 1.1. o cotidiano no interminável 0800. 9 de agosto de 2012 Um estudante de Direito se encontra com uma estudante de Artes Plásticas e lá pela tantas a artista pergunta: “Afinal, o que vocês estudam?” Com o peito estufado o acadêmico responde: “Ora! As leis, os códigos, e as decisões dos tribunais!” Nesta singela resposta constatamos que o Direito está cada vez mais distante do cotidiano da sociedade, pois são dezenas de pequenos problemas que não são resolvidos pelas Leis e pelos Tribunais e que as pessoas não conseguem sequer se imaginar ajuizando ações para resolvê-los. Do outro lado alguns setores do Direito falam no chamado “demandismo”, uma tendência da população bater às portas do Poder Judiciário para resolver seus problemas cotidianos e com isto os “milhares” de processos são intermináveis. Isto se chama Democracia, mas mesmo assim são poucos os que se aventuram ao risco de ganhar ou perder uma ação para se resolver problemas do cotidiano. Mas, afinal, o que é o cotidiano? Listamos alguns casos do que na soma causam desgastes nas pessoas nas esferas pública e privada: 1) Ligações aos finais de semana, nas manhãs, nos finais de tarde e até à noite de empresas de telemarketing; 2) Questões envolvendo perturbação ao sossego, de vizinhança ou veículos com sons de toda ordem, reformas, carros com som alto etc; 18 Claudio Henrique de Castro 3) Cobranças de correspondências bancárias de cartões (elas continuam), envio de boletos de pagamento; 4) Diferenças pequenas em impostos e taxas para pagar; 5) Problemas de interrupção de sinal de telefone, água, luz, tv a cabo, entregas e produtos com pequenos defeitos; 6) Batidas de veículos irrelevantes advindas de condutas ilegais, mas superáveis diante dos custos envolvidos para a solução; 7) Questões de trânsito, como ausência de sinalização, fiscalização, condutas proibidas e reiteradamente praticadas como estacionamento na guia, irregular, alta velocidade, condutor alcoolizado, que apesar da exposição ao perigo não causam acidentes (sempre é bom lembrar que 57 mil pessoas morreram no Brasil no ano passado no trânsito); 8) Atrasos em documentos oficiais, passaportes, pedidos de alvarás, pedidos de certidões, processos de aposentadorias etc; 9) Atendimentos exclusivamente por telefone de serviços essenciais, com a demora de mais de meia hora ao telefone para explicar e se re-explicar os problemas sem soluções objetivas e adequadas, sempre com um protocolo e com a promessa de se gravar as intermináveis ligações; 10) Falhas reiteradas nos serviços essenciais, como atendimentos em postos de saúde e hospitais, mas que pela dimensão individual são “suportáveis” pelos menos favorecidos; O resultado é que os serviços são prestados com baixa qualidade, mas não compensa questioná-los nas esferas judiciais ou administrativas. 19Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Com efeito, o Direito não resolve os problemas do cotidiano e ingressam neste cenário as denominadas Agências de Regulação, os Procons, os Juizados Especiais e fundamentalmente o Poder Judiciário que não resolvem os problemas do cotidiano da população, pois quem batalha pela sobrevivência não tem tempo, dinheiro e conhecimento para se dirigir a estes órgãos que funcionam por provocação – e não autonomamente. Em conseqüência, parte das grandes corporações reduz a qualidade do atendimento, dos serviços e produtos e inserem no preço esta perversa redução, pois menos qualidade, menos custos e lucro maior. O que podemos fazer? Àqueles poucos que recorrem aos seus direitos entram nas estatísticas dos custos operacionais. Estes recebem indenizações irrisórias, admitidas pelos tribunais superiores que falam em “indústria das indenizações” e “demandismo” – e este resultado invariavelmente acontece depois de muitos anos de espera, até décadas para a solução dos casos judiciais. A função didática e preventiva das indenizações perdeu-se nos congressos e discursos científicos do Direito. A epidemia das mortes do Trânsito sequer é estudada pelo Direito, que está preocupado, na maior parte das vezes, com o exibicionismo intelectual das pós-graduações, com linhas de pesquisas de duvidosa prática e de pouquíssimo alcance social. Neste cenário, o cotidiano escapa ao Direito e as questões mais simples do dia-a-dia das pessoas não se resolvem, sejam no que tange a qualidade dos serviços públicos essenciais, no trânsito e transporte, seja num pequeno ato da vida diária das pessoas. 20 Claudio Henrique de Castro Viver se tornou um interminável 0800 para se tentar resolver problemas cada vez maiores do outrora simples, mas hoje complexo convívio social. Quem sabe a atuação dos políticos possa resolver nosso cotidiano, cujos personagens principais prometem e prometem e o povo, o verdadeiro dono do poder, esquece sempre de cobrar, no repetitivo ciclo eleitoral de dois em dois anos. 22 Claudio Henrique de Castro 1.2. Juros sobre juros e o perigo do melado. A capitalização dos juros autorizada pelo STJ. 5 de julho de 2012 Recentemente o Superior Tribunal de Justiça proferiu decisão favorável à capitalização dos juros, ou seja, que é possívela incidência dos juros sobre os juros, pois se entendeu que ela, a capitalização, vedada pelo Decreto n° 22.626/33 (conhecido como Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano, é permitida pela Medida Provisória n° 2.170-36 para as instituições financeiras, desde que expressamente pactuada, estando ligada à circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal. Nem a legislação de Justiniano, o último imperador romano, que morreu em 565 d.C., permitia esta prática. A sabedoria do Direito Romano Imperial impedia tal procedimento. Passados mais de mil e quatrocentos anos, eis que é permitida a referida prática no Brasil, num momento em que o endividamento da população chegou a índices preocupantes para a banca internacional e para a economia doméstica, obrigando o governo a reduzir os impostos para aquecer o consumo. Trocando em miúdos: pela decisão, a capitalização dos juros deve estar inscrita no contrato e o consumidor deve assinar na linha pontilhada no final. A cena é simples: o gerente do banco mostra o contrato, diz “Leia, por favor!”, você passa os olhos e assina o contrato junto com uma nota promissória e com as bênçãos do Poder Judiciário brasileiro – e está tudo perfeito. 23Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Em 1961 o Supremo Tribunal Federal analisou esta questão e, em brilhante decisão, afirmou que a vedação legal do anatocismo é de ordem pública, prevalecendo sobre a convenção das partes (RE nº 47.497 – SP). Assim, não importava o contrato assinado entre as partes na bacia das almas do contrato financeiro. O assunto é velho, e muito bem descrito na decisão do STF. O jurista Teixeira de Freitas, na sua Consolidação das Leis Civis (de 1856, p. 121), afirmou que é possível a capitalização dos juros, desde que pactuada pelas partes. O jurista Lacerda de Almeida (1897) era contrário a esta posição. Acontece que naquele tempo, quem assinava contrato com os bancos estava em posição de igualdade, falava grosso com os banqueiros, não havia classe média no Brasil, que somente surgiu na década de 40 do século passado. Portanto, falar em acordo entre as partes era possível. Com o surgimento dos contratos de massa, e a ascendente classe C e D ter mais poder de compra, ter acesso a financiamentos e conta corrente em banco não significa que se possa discutir de igual para igual um contrato. O próprio Código de Defesa do Consumidor fulmina esta pretensa situação ideal e confere prevalência aos consumidores. Este assunto pode ser que não suba para apreciação do Supremo Tribunal Federal por conta de mecanismos processuais impeditivos. Resta-nos rezar para que esta decisão seja revertida. Com efeito, é necessário se discutir profundamente o acerto ou desacerto desta decisão do Superior Tribunal de Justiça. 24 Claudio Henrique de Castro A repercussão social disto nos faz lembrar o que aconteceu ao sistema bancário nos Estados Unidos em 2008, onde mais de 400 bancos quebraram devido a cascata financeira impossível de ser cumprida pelos mutuários norte- americanos. Até agora o sistema bancário norte-americano está mancando. A sanha das instituições financeiras deu no que deu: toda sociedade está padecendo os efeitos da quebradeira. A lição que fica é simples e vinha dos nossos avós:“Quem nunca comeu melado quando come se lambuza”. Notas http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp. area=398&tmp.texto=106280 http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC& docID=146791 26 Claudio Henrique de Castro 1.3. As razões que perpetuam a impunidade no Brasil. 22 de junho de 2012 Até ontem comer uma pizza em Curitiba era um ato de preocupação com as calorias e o regime. Depois do arrastão no bairro do Batel, os relógios, os aparelhos celulares, as carteiras, as bolsas chiques e os cartões de crédito e de débito entraram também nesta lista de preocupações. É o modo de ser paulistano chegando à capital dos paranaenses. Em São Paulo a moda agora é freqüentar os restaurantes que foram assaltados, pois dificilmente o crime se repete, ou andar acompanhado de um cão de raça pitbull com coleirinha repleta de cristais swarovski. Enquanto isso, no Senado estuda-se a reforma do Código Penal, com um tímido aumento das penas dos crimes contra a administração pública, em descompasso com o grande volume de delitos descobertos em face de constantes operações da Polícia Federal e a crescente conscientização da sociedade que paga a conta. Muitos delitos no projeto tiveram suas penas reduzidas, a exemplo de todos os crimes contra o sistema financeiro nacional e o peculato (apropriação de bem em função do cargo). Diante disso, pergunta-se: “Será essa a vontade da sociedade que assiste a recorrente impunidade dos crimes de colarinho branco?” 27Reflexões sobre o Direito e o cotidiano O projeto inaugura novas modalidades de crimes, alguns com nomenclatura inglesa: bullying (intimidação vexatória) e stalking (perseguição obsessiva), e outros em bom português: corrupção entre particulares, praticar ato fraudulento, plágio intelectual, uso de celular na prisão, abandono de animais, furto com uso de explosivo, ofensa à empresa e eutanásia. Talvez a proposta mais sensata seja a descriminalização do porte de drogas, tratando- se o dependente como portador de doença, frente a nova epidemia do crack e das anfetaminas nas baladas. Também tramita a proposta de reforma do Código Processual Penal. E como talvez se pense paradoxalmente que o processo penal não combina com o direito penal, em muitos pontos as propostas são antagônicas. O Brasil possui um colossal déficit de vagas nas penitenciárias do sistema federal e nos estados. Isto somado aos processos penais intermináveis resulta um sistema penal direcionado para quem habita o andar de baixo, pois o aprisionado normalmente é aquele que não teve condições de pagar bons advogados. A felicidade dos povos e o advento dos Códigos inauguram um velho debate: até que ponto a legislação penal está distante dos anseios populares, posto que a maior parte das cartas, e-mails e mensagens para a Comissão de sábios foi no sentido do aumento das penas já existentes – e Comissão fazendo-se de surda resolveu caminhar na direção contrária, principalmente no que diz respeito aos crimes contra a administração pública? 28 Claudio Henrique de Castro O Banco Mundial recentemente lançou um mapeamento da corrupção no planeta. Paulo Maluf e Daniel Dantas estão nela, personagens conhecidos da imprensa e dos tribunais brasileiros, sendo que o primeiro, deputado federal, ocupa um importante espaço político da mesma cidade de São Paulo que padece dos arrastões em condomínios e restaurantes. Neste cenário podemos pensar em penitenciárias abertas, lá mesmo, em Brasília no Distrito Federal e nas principais capitais brasileiras. Notas: http://star.worldbank.org/corruption-cases/ http://www.valor.com.br/brasil/2717530/reformas-em-lei- caminham-em-sentidos-opostos-em-sentidos-opostos 30 Claudio Henrique de Castro 1.4. As licenças de táxis hereditárias em curitiba. 1° de junho de 2012 A recente Lei Municipal nº 14.017/2012 que dispõe sobre a hereditariedade das licenças de táxi em Curitiba é manifestamente inconstitucional diante do inciso I do art. 3º da Constituição Federal, que prevê que constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, entre outros, o de construir uma sociedade livre, justa e solidária. Uma sociedade justa afasta institutos jurídicos hereditários, salvo o direito de herança que é eminentemente das coisas privadas e não públicas. O próprio sentido do regime republicano afasta a hereditariedade de direitos públicos, pois herança pública é essencialmentemonárquica. Há mais de cem anos foi superado o regime monárquico no Estado brasileiro, sobrou apenas o Rei Momo e a Rainha nos Carnavais. Estamos num ano eleitoral e o pauta legislativa é farta em medidas para cativar o eleitorado. Vejamos a Constituição do Estado do Paraná que estabelece no seu inciso I do art. 12 que é competência do Estado, em comum com a União e os Municípios, zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público. Ora, basta uma simples leitura para afastarmos a referida lei municipal. 31Reflexões sobre o Direito e o cotidiano A Lei Orgânica de Curitiba prevê no seu inciso III, art. 11, que compete ao Município prover a tudo quanto respeita ao seu interesse e ao bem-estar de sua população, cabendo-lhe, em especial: III. Organizar e prestar diretamente, ou submeter ao regime de concessão ou permissão, mediante licitação, os serviços públicos de interesse local, incluindo o transporte coletivo, que tem caráter essencial. Assim, a licitação é a regra. Temos o maior respeito para com os taxistas e suas famílias, mas pensamos que as Capitanias Hereditárias do século XVI provaram que a hereditariedade não funciona administrativamente, apenas as capitanias de Pernambuco e São Vicente deram certo. A referida lei municipal institui o nepotismo normativo. Imaginem os Ministros do Supremo relatando uma ação deste tipo e todas as piadas que seriam elegantemente proferidas à capital do Estado. A competência, contudo, não chega tão longe, vai apenas ao Tribunal de Justiça, embora possa, com expedientes recursais, daqui a alguns anos, chegar a Brasília. Haverá certamente alguma ação judicial que a declarará inconstitucional. O mais curioso é que a vida republicana é baseada nas efemérides eleitorais. 33Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 1.5. A Busca da Dignidade e do respeito aos Professores. 19 de julho de 2012 1. os perfis econômicos dos Professores Temos de forma breve, dois perfis valorosos de Professores na rede privada de Ensino Superior: 1. o profissional liberal que tem seu consultório, escritório, emprego público ou outra atividade e está na docência para complementar a renda principal não proveniente da docência. Este Professor dificilmente vai se mobilizar, comparecer a reuniões sindicais ou apoiar o movimento de forma ativa. Temos assim esta dificuldade em virtude das condições objetivas de colocação do profissional no mercado de trabalho; 2. e aqueles Professores que têm exclusivamente a docência como principal fonte de renda, e têm medo da despedida arbitrária, que rotineiramente acontece, e com o desemprego estrutural, a cada despedida tem-se dezenas de currículos na gaveta do empregador para a entrevista de emprego, por meio de anúncio em jornal dominical ou até nas rádios AM em alguns casos. Estes dois perfis, somados à completa ausência, na grande maioria das instituições, de Planos de Carreira e da estabilidade profissional, que os docentes da rede pública possuem, geram atual dificuldade na mobilização e a festa dos lucros advindos das imposições salariais aos Professores. 34 Claudio Henrique de Castro Os Professores, sejam os de tempo integral ou parcial, merecem respeito, mas não nos esqueçamos que isto influencia nas negociações sindicais. Precisamos conscientizar toda a categoria dos desafios que se colocam pela grande corrosão salarial que abate a classe. Outra questão relevante é a grande distância dos salários dos Professores antigos (cinco, dez ou mais anos de casa) com os novos contratados. A lógica é a de que ao saírem os professores antigos, jamais os salários chegarão ao patamar daqueles, criando-se um círculo vicioso cujo objetivo é o rebaixamento geral dos salários. Pesquisas e aprimoramento do conhecimento não estão nesta pauta, mas meramente o repasse do conhecimento e, consequentemente, os índices da pesquisa brasileira são os piores dos países em desenvolvimento. Isto não importa verdadeiramente aos lucros desmedidos e ao mercado de escala: quanto menores os investimentos, maiores os lucros (Milton Santos). Os Professores na rede privada se tornaram mais uma peça na engrenagem dos lucros fáceis da rede privada de ensino com as bênçãos do MEC e do Estado brasileiro, que se dizem preocupados com o futuro do país. Há pouco o Ministro da Ciência e Tecnologia numa palestra nos EUA, apresentou-se como ministro do “Ministério da Ficção Científica”, em face da sua carência na língua inglesa ou talvez de um ato falho que espelha a realidade. 35Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 2. As instituições de ensino, o lucro fácil e o crescimento econômico sem valorização salarial Com isto, os Professores tornam-se dóceis e úteis (Foucault), e seus salários são desprestigiados em face das belas reformas de instalações físicas, das suntuosas construções de prédios e estacionamentos, das coloridas propagandas em placas nas esquinas das ruas, dos outdoors bem elaborados, das sonoras propagandas de rádio e fascinantes campanhas de televisão, dos patrocínios de shows dos mais variados, estando na beira da associação de praias tropicais, alegria e festas de finais de semana para cativar os nossos jovens estudantes. É o canto da sereia do negócio do “Ensino Superior Privado”. A publicidade para atrair novos alunos é a principal arma nesta competição desmedida para manter o mercado aquecido. O novo foco é a classe C, com mensalidades baixas, ensino a distância e todas as facilidades possíveis para se conseguir um “diploma do curso superior”. Tudo isto põe o conhecimento à distância da sociedade, em patamares cada vez mais reduzidos em qualidade de ensino. Numa medição bastante simples, comparando o aumento das mensalidades e os “reajustes” dos salários, no período de 2009 a 2012, chegamos a 40%(quarenta por cento) na defasagem dos salários dos Professores. Cabe a lembrança de que o pecado capital da ávareza se concretiza, em muitas personalidades que comandam financeira e administrativamente as Instituições de Ensino Superior, sejam elas laicas ou confessionais. Os alunos e a sociedade sequer imaginam esta grave disparidade. 36 Claudio Henrique de Castro Assim, o desgaste nos salários dos Professores torna-se a principal ferramenta empresarial para se auferirem os lucros em cima dos alunos e de suas famílias. Consagra-se um circuito perverso no qual o que menos importa é a qualidade de ensino, o respeito e a dignidade dos Professores, dos alunos e da sociedade. 3. A globalização do ensino e a perda da soberania nacional Assim, temos um processo de macdonaldização o ensino no qual o conhecimento, apostilado, colhido em portais, sínteses e resumos digeríveis são apresentados aos alunos como “conhecimento”. Enquanto os países desenvolvidos aplicam os recursos públicos no fortalecimento do conhecimento, na rede privada os recursos públicos são investidos pelo Prouni e incentivos fiscais de forma a não cobrar efetivamente pela qualidade do ensino, ficando relegado aos Enades, a pretensa “qualidade” das instituições privadas, sem se avaliar como os Professores são tratados, salários, condições de ensino e progressão na carreira, embora, este item conste retórica e demagogicamente nas avaliações institucionais. Este grave rebaixamento do conhecimento e a pauperização dos Professores brasileiros interessam à globalização, pois a cada dia que passa nos tornamos reféns do conhecimento proveniente dos países desenvolvidos, cujas políticas de ensino são absolutamente diferentes da prática empresarial educacional brasileira. Não por acaso as grandes redes nacionais estão sendo vendidas para grandes grupos estrangeiros; nenhum dos dois verdadeiramente tem compromissos com a pátriabrasileira, mas com a bandeira, sem nacionalidade, dos lucros sobre os salários dos Professores e a lógica do aumento desmedido dos ativos. 37Reflexões sobre o Direito e o cotidiano O principal ativo desses homens de negócios é a quantidade de alunos em milhares e não o ativo humano, dos Professores. Sem docentes, todas as instalações tornam-se prédios fantasmas e abandonados. Vejam, por exemplo, uma negociação de compra e venda de grupo educacional recente cujo preço de compra ultrapassou 1 bilhão de reais. 4. Ausência de piso salarial, paralisação das cláusulas convencionais e reajustes rituais Há muito falamos em piso salarial, mas os patrões insensíveis nos vêm com a desculpa dos módulos de ensino e dos professores horistas, essas grandes modalidades de empobrecimento dos Professores, com todo respeito aos que se submetem a esses regimes. Precisamos de um piso realmente digno. Podemos começar a falar em cinco mil reais, na prática do piso da rede pública federal de ensino superior ou uma progressão na qual admitamos uns três mil reais aumentando com o passar do tempo de trabalho e da progressão na carreira. As instituições que não possuem profissionalismo ou sustentabilidade para a gestão do Ensino devem mudar de negócio. Manter instituições às custas do empobrecimento dos docentes e da enganação de milhares de alunos não pode mais persistir no cenário atual, cujo lucro fácil se dá em virtude da diminuição de salários e dos custos. O que ocorre é que, se empresa vai mal, os empresários sempre vão bem. Aliás, onde estão esses empresários que, com raras exceções, sequer pegaram num giz em algum dia na vida? 38 Claudio Henrique de Castro As negociações das cláusulas convencionais não avançam e os reajustes anuais são um “rito de passagem anual” cujo argumento dos patrões é meramente o da correção pelo INPC e mais nada. Ou às vezes um misericordioso 0,5 (meio por cento) como está correndo na “negociação” de 2011/2012. Assim a intransigência e a mesquinhez consolidam a postura do Sindicato dos patrões, claro; por detrás disto estão os lucros sempre crescentes. Há uma verdadeira caixa preta na contabilidade dessas instituições, cuja escuridão interessa aos vampiros do ensino superior privado. Temos que abrir essas “caixas pretas” para sabermos quais os motivos contábeis que implicam todos os anos o rebaixamento salarial e a pauperização dos Professores. 5. As negociações não se bastam; é necessário avançarmos Na última assembleia conseguimos o apoio das entidades representativas dos Estudantes, que, com irreverência, alegria e liderança propuseram o apoio no sentido de divulgar dados, denunciar instituições arbitrárias, aos alunos e vestibulandos, mas fundamentalmente apoiar a valorização dos Professores e denunciar os abusos nas mensalidades. Na década de 90 uma Faculdade conhecida em Curitiba, ameaçou despedir professores em massa e a reação dos alunos veio a galope, por dois meses os alunos não pagaram as mensalidades e a instituição voltou atrás vestindo as sandálias da humildade. Esta lição, com apoio dos alunos, pode e deve ser repetida em larga escala ainda este ano. 39Reflexões sobre o Direito e o cotidiano É hora de pensarmos neste tipo de paralisação e chamamento, invocarmos a solidariedade dos alunos para paralisarem os pagamentos até que a insensibilidade do Sindicato dos patrões se altere e negociemos de forma a resgatar um mínimo de Dignidade e Respeito à nossa classe: “Sem professores não existem as outras profissões”. Outra medida importante é tornarmos as visitas do MEC quando da avaliação dos cursos, um visita verdadeira, sem mentiras ou armações da pseudoqualidade de Ensino. Para isto é necessário que os Professores avisem o Sindicato de tais visitas para que alertemos as comissões de avaliação das reais condições de ensino das instituições, da precarização e miserabilização dos salários dos Professores, sem planos de carreira e tudo mais que sempre é divulgado no Didata. Por último, dois professores do Sindicato foram recentemente despedidos, em meio às negociações, - eles irão voltar! Este ato demonstra as estratégias dos “escoteiros do mal” em tentar calar aqueles que se voltam para a defesa do Ensino no Brasil e da valorização dos Professores. O Sinpes irá reagir com firmeza e determinação! 6. conclusões e perspectivas de atuação: Diante das reflexões colocadas no presente artigo podemos concluir que: 1. Devemos nos mobilizar, de todas as formas possíveis; 2. Vamos convencer e conscientizar a Sociedade e os Alunos do momento histórico que passamos e das nossas necessidades salariais e de condições de ensino; 40 Claudio Henrique de Castro 3. Precisamos que as Instituições adotem os Planos de Carreira, Piso Salarial condigno e que avancem nas cláusulas convencionais; isto não virá de graça, é necessário nos mobilizarmos; 4. É necessário que nos juntemos aos Alunos para fazermos pressões reais frente a esta exclusão salarial na qual fomos submetidos e ao aumento desmesurado das mensalidades escolares; isto inclui modalidades de mobilização diferenciadas; 5. Nossa recomposição salarial é de 40% (quarenta por cento). Na mesa de negociação pedimos apenas 12% (doze por cento) em virtude da soberana decisão da Assembleia da Categoria, mas isto não exclui outras demandas como qualidade de ensino e a dignificação dos Professores; 6. O Sindicato precisa da mobilização dos Professores, pois o nutriente das nossas reivindicações está na união da categoria; 7. Professores lutando, também estão ensinando! 42 Claudio Henrique de Castro 1.6. os desvios do dinheiro público na publicidade. 19 de maio de 2012 1. o que manda a constituição O Direito é simples. Vejamos. O art. 37 da Constituição Federal que prevê o princípio da impessoalidade e disciplina a publicidade de Estado dispõe: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…) § 1º – A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.” Se um estrangeiro nos visitar e perguntar se os governos federal, dos Estados e dos Municípios gastam dinheiro público em propaganda, a resposta seria dada pelo texto constitucional. Dessa forma, entenderia o estrangeiro que o dinheiro público não pode ser gasto em publicidade posto que ainda somos o país que somos: o 95º em analfabetismo; 73º em expectativa de vida; 98º em mortalidade infantil e que possui uma epidemia de delinquência com uma taxa de 31 homicídios a cada 100 mil habitantes. 43Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Ele nos diria: “Muito bem! Vocês gastam de forma racional os recursos públicos!” Porém, isto é verdade? Sabemos que não. 2. o que acontece na prática No Poder Executivo da esfera federal, aquele que tem a caneta na mão para e liberar os recursos, os Ministérios, faz uso desmedido dos recursos de publicidade; e figura do chefe do Executivo sempre está presente com as frases que caracterizam a gestão – nas liberações de verbas para os bancos oficiais, empresas estatais e demais entes que manipulam e administram as verbas públicas. Não se pode afirmar categoricamente, mas a liberação de recursos que nutrem os grandes jornais, as revistas semanais, os canais e redes de rádio e televisão, tem muito a ver com a modulação das críticas ao poder. Nas esferas estaduais e municipais, os recursosse avolumam nos períodos que antecedem os pleitos eleitorais, numa verdadeira avalanche de dinheiro para as agências de publicidade que fomentam e movimentam milhões em favor dos candidatos. No plano do Legislativo federal, estadual e municipal este processo é mais intenso do que se pode imaginar, muitas vezes com o repasse de verbas para personagens que representam indiretamente o poder de plantão. Essas interpostas pessoas, que administram os meios de comunicação, fazem um sobrepreço da publicidade para aplicar a diferença nas campanhas eleitorais. Os exemplos são recentes na cena histórica e caracterizam as gestões ou as alterações estilísticas dos símbolos oficiais, isto em todas as esferas governamentais. 44 Claudio Henrique de Castro Ainda – e mais, há a grande possibilidade de lavagem de dinheiro das verbas de publicidade em cima do valor real sob o manto da denominada “criatividade” que a princípio não tem preço, pois, afinal, quanto vale uma ideia, um jingle, uma peça publicitária? Não estamos aqui afirmando que todos agem assim, mas que essa possibilidade é bastante possível, não se pode negar. A eleição e a reeleição, inegavelmente, são sempre a prioridades dos poderes instituídos. 3. o que diz o juridiquês Infelizmente os Tribunais não possuem uma linha de interpretação serena e objetiva quanto à análise das propagandas oficiais, e o conceito inscrito na Constituição passa a ser letra morta, salvo casos escancarados desafiados, por vezes e apenas, por oposições partidárias ou ideológicas. A doutrina, isto é, a escrita dos sábios do Direito, é silenciosa e vacilante quanto ao tema publicidade oficial. Assim, os Poderes fazem como bem entendem suas peças publicitárias e a utilizam para a promoção oficial. Vale a sentença popular: “Todos fazem! Por que não podemos fazer também?” 4. o que precisa mudar Não há propriamente propostas sobre o tema e sua disciplina legal, até em razão de o artigo da Constituição ser bastante explicativo e autoaplicável. Entretanto, algumas reflexões podem ser lançadas sobre o tema: 45Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 1. As Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais não podem usar dos recursos públicos para publicidade, nem dos seus personagens, muito menos, de campanhas. Com efeito, a divulgação dos seus atos é feita por meio dos atos oficiais. Leia-se: diários oficiais; 2. As publicidades dos governos federal, estaduais e municipais, das empresas públicas, da administração direta ou indireta, devem ser rigorosamente fiscalizadas pelos órgãos de controle, e os Tribunais devem enfrentar este tema com os conceitos de: desvio de finalidade, desvio de poder e de propaganda antecipada, fulminando com a inelegibilidade os personagens envolvidos e determinando a devolução aos cofres públicos das quantias despendidas. Sobra legislação para fazer isto. Basta vontade política; 3. Toda publicidade oficial deve ser profundamente analisada quanto aos dispêndios, causa e extensão dos efeitos. É hora de as prioridades do governo brasileiro serem efetivamente a solução dos graves problemas sociais; 4. Por fim, a imprensa, para ser crítica, deveria nortear seu trabalho com a premissa de que “é possível sobreviver sem as verbas de propaganda e publicidade oficiais”. 47Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 1.7. o STf, as cotas raciais e as cotas de ensino público. 25 de abril de 2012 O Supremo Tribunal Federal vota hoje as cotas raciais no ensino público. Nosso prognóstico é que o julgamento será apertado, mas será aprovada a legalidade das cotas para a alegria dos setores mais progressistas que vislumbram nelas um mínimo resgate dos mais de 500 anos de opressão aos pobres, negros, efetivados pela sociedade patriarcal e estamental brasileira. Nosso patriciado dirigente não admite alguns avanços que estão ocorrendo (Damatta). Nem só de samba e manifestações culturais vivem os negros e os excluídos. Sem a vinda da África ao Brasil seguramente nosso povo não seria um povo alegre (Darcy Ribeiro). Seríamos tristes e sem musicalidade, seríamos um povo tímido, apático, sem tempero ou poesia. Felizmente a mãe África nos livrou disto tudo. As cotas são transitórias, têm a perspectiva de acabar em 2025/2030, conforme previsões dos setores que militam pelas ações afirmativas. As reparações da escravidão do Brasil ainda estão por vir. Não tivemos ainda uma reforma agrária, não desfavelizamos as periferias das cidades e das grandes capitais, ainda não temos Justiça Social, apesar da pródiga Constituição Federal de 1988. 48 Claudio Henrique de Castro O discurso sobre as cotas começou com um artigo do Ministro Marco Aurélio no Supremo Tribunal Federal, depois na Universidade de Brasília e se espalhou pelo Brasil afora. Ainda há muitas resistências, como naqueles primeiros anos em que os então abolicionistas entoavam seus discursos libertários contra a escravidão no Brasil. Zito Costa, numa profunda e detalhada Tese de Doutorado da USP, comprovou que as telenovelas brasileiras, na sua esmagadora maioria, colocavam os negros e pardos sempre em posições subalternizadas. Onde estão as cotas da mídia (?). Afinal ainda não vivemos numa democracia racial, ao contrário do que pensava Gilberto Freyre. A ideologia do embranquecimento da década de 30/40 do século passado, ainda ecoa nos setores conservadores. O Direito muda, os conceitos de Justiça também. Temos muito que descobrir nos horizontes da cidadania e da inclusão social. O país, é sem dúvida, a nação que concentra os maiores recursos de biomassa do Planeta – e a maior parte da população ainda não recebeu seu quinhão desta imensa riqueza. Ainda temos piadas sobre os negros e pobres, ainda temos a imagem distorcida da globalização e do “darwinismo social” (Milton Santos), na qual os mais capazes sempre vencem socialmente. Entretanto, este cenário estaria correto se todos tivessem oportunidades semelhantes, o que não corresponde à realidade brasileira. Ótima educação e saúde significam dinheiro e posição social. A democracia social está ainda por vir, tem-se quinhentos anos de espera. 49Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Temos ainda um longo caminho a trilhar pela agenda política e a reforma ética das instituições, banindo os personagens que solapam os cofres públicos e que são investidos pelo voto popular. A CNBB sugeriu que deveríamos ter a “cotas dos políticos honestos”; consolidou-se Lei da Ficha Limpa. É um tímido começo para esta nova realidade, mas que possui reflexos positivos na agenda das eleições brasileiras. Parabéns ao Supremo Tribunal Federal por mais este importante passo que será dado em prol da Cidadania, após, é claro, alguns pedidos de vistas, embargos declaratórios e todos aqueles expedientes processuais que conhecemos. 51Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 1.8. Afinal, por quais razões pagamos impostos? 24 de janeiro de 2012 Imagine uma profissão em que todo santo dia sua mulher e sua família façam orações para que você chegue no final do expediente salvo e ileso. Pensem em uma profissão em que sua conduta deva ser tecnicamente impecável frente a situações bastante estressantes e que de sua atuação dependam vidas humanas. Avalie uma profissão em que você tenha o dever da coragem e que enfrente personagens perigosos, armados e audaciosos. Medite a respeito de uma profissão à qual toda sociedade fique atenta e que os mais diversos crimes sejam o seu cotidiano. A exemplo da Polícia Federal, que instituiu um sólido planejamento estratégico, reduziu os graus da hierarquia, reduziu as diferenças salariais da base com o topo da carreira e se profissionalizou, desvinculando-se do Poder Executivo, é chegada a hora das valorosas polícias estaduais, aCivil e a Militar. Não há tempo a perder. O Paraná pode dar um exemplo para o Brasil e definitivamente lançar um plano de valorização salarial condizente com os novos desafios frente ao crime organizado. Temos plena confiança nisto e acreditamos nas nossas autoridades estaduais recém-eleitas. Defendemos altos salários para os professores, pois sem educação os países tornam-se incubadores da criminalidade. Mas a força repressiva e investigativa do Estado deve estar aparelhada, principalmente para os crimes de Estado, os chamados white- collar-crime, ou crimes do colarinho branco, isto é, os crimes da classe alta, os que mais esvaziam os cofres públicos no Brasil. 52 Claudio Henrique de Castro Quando se trata de votar aumento de subsídios para a classe política, rapidamente são elevados os rendimentos da classe dirigente. Quando se fala no salário da base do Estado, professores, profissionais da Saúde e policiais, há muito discurso e pouca ação. As promessas dos atores da política são sempre as mesmas: “Saúde, Educação e Segurança!”. Por detrás desse discurso, na base do Estado, estão profissionais de alto valor moral e ético, que lutam com o suor do trabalho para viver e sobreviver. Não nos esqueçamos ainda dos trabalhadores da limpeza pública, que correm dezenas de quilômetros por dia recolhendo o lixo das cidades. A hora da mudança é agora. Não se pode mais adiar o discurso da cidadania, da democracia, do Estado de Justiça Social. Para isto são necessários novos concursos públicos com salários condizentes com as tarefas que se avizinham necessárias para a construção de uma sociedade realmente democrática. Afinal, por quais razões pagamos os impostos? 54 Claudio Henrique de Castro 1.9. corrupção custa 100 bilhões por ano aos bolsos dos brasileiros*. 23 de novembro de 2011 A corrupção custa para os brasileiros cerca de cem bilhões de reais por ano. Com base nesses dados o advogado e professor universitário Cláudio Henrique de Castro prega uma mudança de mentalidade da população em relação ao corrupto. Segundo ele, o Brasil precisa passar por uma reforma na educação para barrar a ação de corruptos. Para o professor a raiz de boa parte dos problemas vividos pelos brasileiros teve origem na década de 70. Cláudio Henrique de Castro aponta o serviço público como o maior foco de corrupção no país. Entre as soluções apontadas pelo professor estão: tornar a justiça acessível aos pobres, acabar com a prescrição penal e com a prisão especial e rigor na aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal sem as análises elásticas que ocorrem normalmente. Mas ele acredita que o brasileiro já está mais consciente em relação à corrupção. Segundo dados oficiais, o Brasil é a NONA potência mundial, mas é o número 95˚ em analfabetismo, 73˚ em expectativa de vida, 98˚ em mortalidade infantil, e a taxa de homicídios é de 31 para cada grupo de cem mil habitantes. Para Cláudio Henrique de Castro esses números têm tudo a ver com a corrupção. *Notícia Jornalística 56 Claudio Henrique de Castro 1.10. A república Brasileira e o custo Brasil. 22 de novembro de 2011 O conceito de Custo Brasil normalmente passa pela ineficiência e corrupção do Estado brasileiro, uma clara crítica à corrupção endêmica instalada no país. Contudo, devemos olhar para os lados e verificarmos que há um custo em todos os países; o custo da exclusão social que gera 1 bilhão de pessoas que passam fome no mundo e 1,2 bilhão de pessoas não tem acesso à água tratada no mundo. No mundo verifique-se que 10% dos mais ricos detêm 85% do capital global, e metade dos habitantes detém apenas 1% e que os países altamente industrializados do G8 venderam 87% das armas exportadas do mundo inteiro, fomentando e lucrando com a guerras locais e regionais. O Brasil se coloca como a 9ª potência mundial, mas em 95º em analfabetismo; 73º em expectativa de vida; 98º em mortalidade infantil e com uma taxa de 31 homicídios a cada 100 mil habitantes, numa verdadeira epidemia da delinquência. Estas assimetrias devem ser consideradas no conceito de Custo Brasil. Vejamos o problema da corrupção que nos custa R$ 100 bilhões por ano, o que resulta em 3,7 bi de prejuízos por ano, para cada Estado da Federação, combinada com a política de juros altíssimos que beneficia o rentismo em detrimento do estudo e do trabalho se enquadram na “erosão ética”. Inegáveis a ineficiência da infraestrutrura e da logística na “erosão técnica” e ainda os 20 milhões de pobres na “erosão humana”. 57Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Quais soluções poderiam ser apontadas para a redução do Custo Brasil? Vejamos algumas sugestões veiculadas pelos setores mais progressistas: 1. Fidelidade partidária, não a de araque que assola a legislação e a Justiça Eleitoral; 2. Acabar com prisão especial, com a cessação dos privilégios oferecidos às elites; 3. A imposição de ficha limpa para as pessoas indiciadas a critério de juízo de recebimento do inquérito; 4. A indicação obrigatória em cada produto da carga de imposto para conscientizar as pessoas sobre a arrecadação do Estado; 5. Rigor da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e não nas interpretações elásticas e casuísticas que ocorrem rotineiramente; 6. Proibição do voto secreto e salários aos membros do Poder Legislativo; 7. Tornar a justiça acessível aos pobres; 8. Acabar com a prescrição penal que se tornou um grande negócio para a impunidade das elites; 9. Evitar o cinismo pragmático do relaxa, transgride e goza; 10. Enfrentar o falso problema do garantismo penal; 11. Redução drástica dos cargos de provimento indicados no Estado brasileiro e os milhares de cargos em comissão para somente servidores de carreira; 12. Superar o duplo padrão ético no Estado no cumprimento da lei e a cultura da transgressão da lei e do jeitinho (“aos amigos tudo, aos inimigos os rigores da lei”); 13. Implantar uma agenda ética, a exemplo da Noruega; 14. Efetivar uma profunda revisão do conceito de felicidade na qual todos participem da riqueza do Estado; por exemplo, a Costa Rica que possui 18% em comparação com o Brasil que possui 33% de pobres na sua população; 15. Instaurar a definitivamente a República no Estado brasileiro -, passados 122 anos da sua proclamação, o Estado Brasileiro ainda não é feito para, pelo e em função do povo, mas serve na sua maior parte aos detentores do poder e seus apoiadores. 60 Claudio Henrique de Castro 1.11. o julgamento do médico de Michael Jackson e a Justiça brasileira. 9 de novembro de 2011 Terminou anteontem (7) em Los Angeles o julgamento do médico de Michael Jackson, Conrad Murray, condenado por homicídio culposo do cantor, depois de cinco semanas de testemunhos para elucidar como ocorreu a morte do astro, há dois anos. Este julgamento célere e minucioso demonstra como a impunidade é abominada pelos norte-americanos, não obstante todas as críticas que se possam fazer ao sistema processual penal anglo-saxão. Um processo semelhante recentemente terminou no Brasil após quase 30 anos de suspense, recursos e idas e vindas nos tribunais superiores. O resultado é muito claro: a lentidão do processo penal brasileiro aliada aos hábeis recursos processuais e à alta rotatividade de juízes redunda na prescrição dos delitos e a conseqüente impunidade. Estatisticamente os pobres e desassistidos são condenados; as classes média e alta permanecem imunes à legislação penal. Recentes debates legislativos buscam reformas e mais reformas. Mas de uma coisa não há dúvida: o denominado garantismo penal aliado às bizantinas estratégias processuais de defesa, na maior parte dos casos, nutre a impunidade. 61Reflexões sobre o Direito e o cotidiano As lições do julgamentodo médico de Michael Jackson ressoam na América Latina, cuja democracia processual penal ainda não chegou aos tribunais brasileiros. O ditado popular “quem pode mais chora menos” é uma realidade nas delegacias e prisões, nas quais o poder econômico prevalece à frente da justiça penal. A doutrina processual, preocupada com o garantismo do contraditório, da ampla defesa e da sentença final transitada em julgado, afasta-se de uma sociedade justa na qual as diferenças de classes sociais não sejam determinantes no julgamento. Afinal, não somos iguais perante as leis (?). O reflexo disto também se faz sentir de tutela expressiva dos delitos patrimoniais privados, cada vez mais protegidos, e a crescente impunidade dos políticos e administradores públicos quanto aos delitos praticados em detrimento dos cofres públicos, sustentados por toda sociedade. A inelegibilidade e a indisponibilidade de bens são apenas uma pequena retribuição penal, se as compararmos à legislação dos países altamente desenvolvidos que punem de forma exemplar seus corruptos. O Direito penal e processual penal brasileiro têm muito que aprender com o recente julgamento do médico de Michael Jackson, independente da condenação que o júri de sete homens e cinco mulheres lhe imputou de forma rápida e fundamentada. 63Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 1.12. o ensino Superior na rede privada em curitiba e região metropolitana: cenário atual e perspectivas para os professores. 24 de abril de 2011 O governo de Fernando Henrique Cardoso, por meio do seu ministro Paulo Renato, implantou uma estrutura eminentemente privada de ensino superior no Brasil, financiada pelos cofres públicos. Hoje aquele ministro presta consultoria de negócios para os empresários do ensino no Brasil, comprando instituições deficitárias para revendê-las a grandes grupos nacionais e estrangeiros. O governo Lula alterou muito pouco esta realidade, implantando o Prouni e medidas de inclusão de alunos carentes, mas o cerne da questão não foi enfrentado: a qualidade do ensino é cada vez mais baixa. O discurso do governo Dilma parece querer transformar esta realidade, mas se volta tão somente ao ensino fundamental, o que é um começo. Nesta verdadeira indústria do conhecimento, o binômio lucro versus corte de custos é predominante, salvo raras exceções. Com efeito, no meio disso o professor tornou-se mero repassador de conhecimento e mais uma peça que encarece o circuito deste mercado que se convencionou chamar de Educação Superior privada. Em Curitiba e região metropolitana a realidade não é diferente. Este ano os representantes dos empresários, a par dos reajustes muito superiores do INPC para as mensalidades e acréscimos de toda ordem para os estudantes, vêm repassando apenas e tão somente o reajuste do INPC, sem qualquer avanço nas cláusulas sociais da categoria. Na última 64 Claudio Henrique de Castro negociação de férias do meio do ano, por exemplo, ofereceram, com piedade e desprendimento, apenas e tão somente uma semana ou sete dias, sem descurar das semanas acadêmicas de doutrinação pedagógico-salarial, numa afronta à CLT. O desgaste e a grave corrosão nos salários chega a 60% (sessenta por cento) nos últimos anos, o que aproxima o salário dos professores à garantia do salário mínimo, abaixo do piso do Estado do Paraná. O quadro é sombrio, pois um exército de desempregados e profissionais recém-formados se submetem às mais degradantes condições de trabalho e a recebem R$15,00 (quinze reais) por hora-aula. Também a disputa por horas-aula no semestre deixa a categoria desunida pois cada professor pode avançar sobre turmas dos colegas e afetar diretamente o salário do semestre seguinte. Resumindo: quem tinha três turmas pode ficar com apenas uma e ver reduzido seu salário em dois terços. Outra realidade é a profissão como “bico”, para conferir aos detentores do título de professores a captação de clientela e o status da cátedra, deixando de lado a remuneração recebida. Outra característica da situação é que, a par da formação do exército de desempregados, a mão de obra especializada está cada vez mais difícil de ser encontrada, ou seja, não se conseguem profissionais com os requisitos mínimos para o exercício da profissão, sejam quais forem as áreas: Exatas, Humanas ou Biológicas. Ao mesmo tempo, o MEC, que deveria fiscalizar tudo isto, desde os tempos do ministro Paulo Renato vem sendo complacente e beijando as mãos dos empresários do ensino. Grandes grupos internacionais estão comprando gradativamente as redes de ensino, num franco processo de desnacionalização da educação brasileira, com as bênçãos das autoridades. 65Reflexões sobre o Direito e o cotidiano O Ministério, quando se preocupa, olha apenas as estruturas físicas para a solução do Ensino. Fecha os olhos para o apelo à inexistência de carreiras docentes e à absoluta ausência de política de valorização dos professores pelos perversos patrões do ensino, que, na maioria, são empresários sem qualquer formação acadêmica para este mister. A última edição do Didata, jornal da categoria dos Professores, cada vez maior em número de páginas, demonstra este quadro, com relatos de graves arbitrariedades trabalhistas cometidas contra os professores. Alguns se perguntam: cadê o Ministério Público do Trabalho, cadê o MEC, cadê o Poder Judiciário Trabalhista nas ações coletivas? Há denúncias de que algumas instituições praticam o “jogo do empurra das aprovações”, que leva à lógica da aprovação sequencial, caso contrário, demissão sumária, pois alunos a menos, lucros menores. No nível fundamental a coisa é mais degradante ainda! Cerca de 80% (oitenta por cento) dos recém-concursados num Estado do Nordeste, abandonaram nas duas primeiras semanas os postos de trabalho pelo desconhecimento do conteúdo a ser ministrado, o salário e outras oportunidades no mercado. Hoje, com todo respeito a estes outros ofícios, um simples reparo em computador doméstico, encanamento ou pequeno serviço de pintura é muito mais valorizado que a nobre função da docência. O custo da hora-ofício vai de R$50,00 (cinquenta reais) a R$150,00 (cento e cinquenta reais), quando a hora-aula em Curitiba e região metropolitana aos docentes é de R$15,00 (quinze reais). Só que esta aula exige preparação, estudo permanente, compra de livros, pesquisas e, acima de tudo, muito profissionalismo. 66 Claudio Henrique de Castro E os professores sabem da sua importância social; não obstante a remuneração percebida, esforçam-se ao máximo para ministrar aulas de qualidade e conteúdo. A bandeira da valorização dos Professores do Ensino Superior não é encampada por nenhum político, seja do Paraná, seja de outros Estados, ao mesmo tempo que os empresários é que elegem seus representantes para garantir favores tributários e a expansão cada vez maior do famigerado ensino à distância, de custos ínfimos e lucros astronômicos, de duvidosa e baixa eficiência de ensino e baixíssima remuneração em relação aos rendimentos. Os ministérios da República são postos de sindicalistas, numa continuidade da República das centrais sindicais de dirigentes que pouco sentaram nos bancos escolares do Ensino Superior. Há pouco tempo ocorreu um triste episódio em Curitiba, sem divulgação na mídia. Um professor de uma Universidade da rede privada que se autodenomina a melhor do Sul, do Brasil, talvez até da Via Láctea, se suicidou, vítima de depressão. Estudos recentes demonstram que esta enfermidade é a que mais atinge os docentes da rede pública e privada, chegando a índices alarmantes, inclusive no nosso estado vizinho de Santa Catarina. 67Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Quais as luzes para este quadro nefasto? Em recente assembléia dos professores realizadapelo SINPES – Sindicato dos Professores do Ensino Superior de Curitiba e da Região Metropolitana, esses assuntos foram exaustivamente debatidos e chegamos à conclusão de “Estado Permanente de Greve e Mobilização em prol da Valorização dos Professores”, por meio de medidas que sensibilizem a sociedade de Curitiba e do Estado, além, claro, dos empresários do ensino. Os professores e os acadêmicos merecem respeito e consideração, pois acima de tudo irão influir no desenvolvimento social a econômico do nosso país. Foram dez itens debatidos e aprovados para articular esta mobilização durante o ano de 2011/2012. Tudo para mudar esta triste realidade. 69Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 1.13. o aumento da remuneração das Polícias no Paraná. 2 de março de 2012 As recentes tratativas que resultaram no aumento salarial das polícias no Estado do Paraná demonstram duas importantes mudanças no Estado. A primeira: o discurso de campanha não foi uma armadilha eleitoral; o segundo: se avizinham políticas para conter a galopante criminalidade que se instalou no Estado, da capital (do centro às periferias) e até nos mais distantes rincões do interior. A Lei Seca, que trouxe nova dosagem nos limites de direção veicular, é uma lei que em algumas capitais “pegou”, como em São Paulo e Rio de Janeiro, entre outras. Em Curitiba ainda não, pela ausência de blitzes e equipamentos. O número de telefone 190, que demora para atender e, dependendo da ocorrência, a chegada da viatura leva de meia a uma hora, também se juntam à necessidade de mudanças. O treinamento das polícias, com formação em Direitos Humanos, de novas técnicas de prevenção e combate entram na pauta do novo horizonte em que as polícias podem atuar, ajustando-se aos novos desafios do Estado democrático de direito que deixou no passado a ditadura de 1964 e aquela velha polícia formada desde o Estado Novo. 70 Claudio Henrique de Castro Mas o principal está por vir: a inamovibilidade dos delegados, as investigações profissionais e a independência investigatória urgem no horizonte do Estado para se acabar com aquele exemplo que, até há pouco tempo, era citado de forma negativa nos Congressos de Direito, os chamados delegados calças-curtas, sem formação e indicados pelos políticos detentores do currais eleitorais. Não só de pão vive o homem mas, sem dúvida, os reajustes anunciados significam um grande avanço para as valorosas corporações policiais, cujos integrantes arriscam as próprias vidas pela segurança da sociedade. 72 Claudio Henrique de Castro 1.14. A profissionalização da Polícia (Pec 300/2008) e a gradativa união das Polícias civil e Militares é uma tendência mundial. 22 de setembro 2011 Quando vemos que Curitiba é a sexta cidade mais violenta do Brasil e o bairro da CIC (Cidade Industrial de Curitiba) o lugar mais perigoso da capital (1), nos perguntamos se a solução para isto tudo é o aumento do efetivo das Polícias ou a implantação de políticas sociais robustas e investimentos maciços em Educação e Saúde públicas igualitárias. A profissionalização da Polícia (PEC 300/2008) (2) e a gradativa união das Polícias Civis e Militares é uma tendência mundial. O §8º do art. 144 da Constituição Federal (3) dispõe sobre a possibilidade da criação das guardas municipais para os municípios do Brasil. No Paraná teremos 399 guardas municipais, cada município com a sua, com uniformes, leis, regimes de aposentadorias etc. Não esqueçamos que no Brasil são 5.435 municípios, num cipoal legislativo chamado “interesse local”. A competência da Guarda Municipal é a de: “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: (…) § 8º – Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.(grifamos)” 73Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Esta competência é de proteção de bens, serviços e instalações municipais em substituição àquelas terceirizações de vigilância nos bens públicos municipais, apenas e tão somente isto. Temos sérias dúvidas sobre a legalidade do porte de arma deste pessoal, bem como, sobre a extensão dos direitos de aposentadoria especial dos Policiais Militares e diversas outras deferências legislativas que estão ocorrendo no âmbito destas guardas municipais, mas este é outro assunto. Ocorre que esta competência não é de “Polícia de Segurança Pública” nem sob a forma de “convênio”, conforme decidiu o Superior Tribunal de Justiça (A.I.1056.8994-RJ) em 2008, isto é, não pode a Guarda Municipal lavrar multas (decisão abaixo). Nesta semana o Supremo Tribunal Federal declarou que o tema é de Repercussão Geral e, portanto, será decidido o assunto, em breve, se é possível estas guardas lavrarem multas de trânsito ou não. Podemos apenas fazer um exercício de prognóstico quanto ao tema, tanto pode o Supremo admitir como deferir esta possibilidade. São 49 decisões do Supremo Tribunal Federal sobre a competência municipal de legislar sobre “interesse local”, poucas essencialmente sobre trânsito e que não envolvem a figura da guarda municipal, mas afastam a possibilidade de o Município legislar sobre o direito de trânsito, que é competência privativa da União, impossibilidade de vistoria em veículos (ADI.3323/DF), impossibilidade de imposição legal do cinto de segurança (ADI.1032 e outras), nem muito menos, legislar concorrentemente matéria da União (RESP. 596489, 2ª Turma). 74 Claudio Henrique de Castro O Ministro Marco Aurélio, relator do processo de Repercussão Geral (5) em duas laudas reconheceu a relevância do tema, até porque milhares de recursos advindos de processos que se requerem a nulidade das multas da Guarda Municipal carioca e outras poderiam inundar o Supremo Tribunal Federal, num mar de recursos de multas. Em Curitiba, a URBS mediante convênio com o Estado, lavrava multas não somente previstas nos incisos VI a VIII do art. 24 do Código de Trânsito Brasileiro, mas também de outras espécies normativas, alargando de forma ilegal a competência municipal, (se é que é válida), disposta no CTB (6): “Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição: (…) VI – executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito; VII – aplicar as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar; VIII – fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas administrativas cabíveis relativas a infrações por excesso de peso, dimensões e lotação dos veículos, bem como notificar e arrecadar as multas que aplicar;” 75Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Outra afronta era a questão de possuir natureza privada, de sociedade anônima (URBS S.A.) quando o Poder de Polícia é indelegável por ordem da Constituição e somente pode ser exercido pelo Poder Público (art. 144 da Constituição Federal). Reforçamos, neste sentido, o entendimento de que matéria de “interesse local” (art. 30, inciso I, da Constituição Federal) não diz respeito à imposição de multas pelo simples fato de que quem institui legalmente a infração de trânsito é privativamente a União, e a fiscalização e o poder de polícia não podem ser deferidos à Guarda Municipal. Na decisão do Superior Tribunal de Justiça encartada no processo e Repercussão Geral, encontra-se a seguintedecisão (item 7, p. 110): “GUArDA MUNiciPAL. eXercÍcio Do PoDer De PoLÍciA DeLeGAÇÃo DA coMPeTÊNciA iMPoSSiBiLiDADe. Guarda Municipal Representação por Inconstitucionalidade. Indelegabilidade das funções de segurança publica e controle de trânsito, atividades próprias do Poder Público. As atividades próprias do Estado são indelegáveis pois só diretamente ele as pode exercer; dentre elas se inserem o exercício do poder de polícia de segurança pública e o controle do trânsito de veículos, sendo este expressamente objeto de norma constitucional estadual que a atribui aos órgãos da administração direta que compõem o sistema de trânsito, dentre elas as Polícias Rodoviárias (Federal e Estadual) e as Polícias Militares Estaduais. Não tendo os 76 Claudio Henrique de Castro Municípios Poder de Polícia de Segurança Pública, as Guardas Municipais que criaram tem finalidade específica guardar os próprios dos Municípios (prédios de seu domínio. praças etc.) sendo inconstitucionais leis que lhes permitam exercer a atividade de segurança pública, mesmo sob a forma de Convênios.” O atentado de 11 de setembro nos EUA provocou muitas vítimas em razão de uma briga histórica entre a Polícia de Nova Iorque e os Bombeiros, pois suas faixas de rádio não se comunicavam e os bombeiros da segunda torre ainda em pé não sabiam que a primeira havia desabado. Esta ausência de comunicação entre polícias não é privilégio dos norte- americanos. A falta das carreiras específicas e da coordenação de funções das polícias tem contribuído para a baixa eficiência das políticas públicas de segurança, não somente nos países altamente desenvolvimentos, mas também nos emergentes, que é o caso brasileiro, onde até as Forças Armadas, comandadas pelo Exército adentram os morros das habitações populares para coibir o tráfico e as milícias armadas. O Paraná, com efeito, possui um grave déficit nos seus quadros das valorosas Polícias Militar e Civil, há ainda muito a ser feito. Interpretar a Constituição de forma a alargar a competência da não menos valorosa Guarda Municipal é criar novas instâncias de poder, sem qualquer possibilidade de profissionalização e mais uma esfera de baixa ou nenhuma comunicação e planejamento nas políticas de segurança pública, mormente quando o governador e os prefeitos são de partidos diferentes e visões políticas conflitantes. 77Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Temos a convicção de que o STF não admitirá a referida possibilidade de a guarda municipal lavrar multas de trânsito, até porque a Guarda Municipal carioca é comandada por uma sociedade anônima (Empresa Municipal de Vigilância S.A.), nesse sentido, a banalização do poder de polícia, como ocorria em Curitiba, deve ser coibida, pois está intimamente ligada à questão arrecadatória municipal e não propriamente à preocupação com segurança e bem-estar dos citadinos. Por fim, a Polícia Militar não somente está preparada para multar, mas possui formação completa para atuar na seara do trânsito e segurança. É, com efeito, uma corporação, coordenada e subordinada a valores e políticas legais de atuação e que não diz respeito somente a infrações de parada obrigatória ou em local não regulamentado, mas essencialmente da tarefa ostensiva de proteger os cidadãos. Antes de pensarmos nas Polícias que devem lavrar multas, devemos também pensar nos Professores que queremos e devemos valorizar para ensinarem a ótima convivência em Sociedade, com valores éticos e morais de respeito à dignidade humana. O trânsito neste sentido é apenas um reflexo do ethos de uma sociedade em constante transformação histórica que por vezes pode gerar uma inversão de valores, primeiro a arrecadação, depois a proteção às vidas humanas (DAMMATA, Roberto. Fé em Deus e Pé na Tábua). Aguardemos a decisão do Supremo Tribunal Federal, nessa novela que terá muitos capítulos emocionantes. 78 Claudio Henrique de Castro referências: (1) http://g1.globo.com/parana/noticia/2011/07/curitiba-e- sexta-capital-mais-violenta-de-pais.html (2) http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetrami tacao?idProposicao=414367 (3) http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ Constituicao.htm (4) http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp? idConteudo=189421 (5) http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcesso Andamento.asp?numero=637539&classe=RE&orig em=AP&recurso=0&tipoJulgamento=M (6) http://www.denatran.gov.br/ctb.htm (7) http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docT P=TP&docID=1395275&ad=s#2%20-%20VOLUME 80 Claudio Henrique de Castro 1.15. A segurança e o porte de armas no Brasil. 12 de abril de 2011 Há um falso problema no Brasil, que é o da proibição do porte de armas. Já tivemos um referendum que afastou por completo a proibição das armas no país. A grande maioria da população votou pela liberdade do uso. Contudo, a restrição ao porte permanece para os cidadãos de bem. Isto é uma ilegalidade. O tráfico continua e os únicos que possuem porte são: os membros do Poder Judiciário, Ministério Público, senadores, deputados federais, um restrita parte da elites e os novos megaempresários da segurança pública no Brasil: as empresas de segurança privada e, finalmente, os criminosos, aqueles que sobrevivem do crime. Os cidadãos que trabalham são expressamente proibidos de portar armas de fogo e são potenciais vítimas de quaisquer delinquentes que têm a certeza da ausência de riscos no cometimento do crime. O Brasil possui as mais fortes restrições ao porte de armas - e isto tem endereço certo: o crescimento astronômico nos lucros das empresas de vigilância e segurança. Nossas empresas de armas faliram ou se mudaram para os EUA, como é o caso da Forjas Taurus. As anunciadas novas medidas proibitivas do porte são de caráter eminentemente demagógico e eleitoreiro. Na verdade, temos que liberar o porte de armas, obviamente com critérios, não tão rigorosos que somente os amigos do Rei consigam obtê-lo, mas assegurar que os cidadãos tenham a mínima possibilidade de reação frente aos criminosos. Vive-se a Sociedade do medo. 81Reflexões sobre o Direito e o cotidiano Qualquer pessoa pode encomendar armas de grosso calibre, metralhadores, escopetas e fuzis. O mercado paralelo de armas, por conta da proibição, é gigantesco – e diante dessa realidade as autoridades se calam. Curitiba, que é a mais violenta cidade do Sul do Brasil, e Campina Grande do Sul, disputando o posto de mais violenta do Brasil em homicídios, são exemplos marcantes disto. Apesar deste cenário, nenhuma palavra escutamos dos políticos de plantão, que sempre aparecem com os mesmos discursos: vamos lutar por educação, segurança etc… Investimentos sociais são a forma mais sensata para diminuir o problema. Enquanto isso não acontece, padecemos de segurança nas escolas, nas ruas, nas praças, em todos os lugares. A exceção são as ilhas de consumo, os shoppings, que por isso mesmo ficam abarrotados nos feriados e finais de semana. 83Reflexões sobre o Direito e o cotidiano 1.16. As desventuras jurídicas do caso Battisti. 2 de janeiro de 2011 Cesare Battisti, italiano refugiado no Brasil desde 2004, recebeu pedido de Extradição do Governo Italiano (Nota Verbal de 21/02/2007) que foi protocolizado sob nº 1085 de 16/12/2009 junto ao Supremo Tribunal Federal. Com passagens na França até 1982, foi para o México e permaneceu até 1990, voltou para França e veio ao Brasil em 2007. Em verdade, o corpo do acórdão do Supremo Tribunal Federal não deixou claro que a decisão é do Presidente, pois: quatro votos foram pela Extradição, um voto pela observância do Tratado e quatro votos pelo caráter discricionário do Presidente da República (item 8, página 3, do Acórdão da Extradição 1085 de
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