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Caderno Movimentos Sociais e Saúde

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I Caderno N° 4 • Setembro· 2013
~~IiIWW-
Movimentos sociais e saúde
SEM ~
OPRES5AO
ENSP FIOCRUZ
Fundação Oswaldo Cruz
Presidente
Paulo Ernani Vieira Gadelha
Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca
Diretor
Hermano Albuquerque de Castro
Movimentos sociais e saúde
Coordenadores do Plano de Monitoramento Epidemiológico da Área de
Influência do COMPERJ
Organizadores:
Luciano Medeiros de Toledo
Paulo Chagastelles Sabroza
Autores:
Eduardo Navarro Stotz
Carla Moura Pereira Lima
Gil Sevalho
Márcia Florentino
Marcos Thimoteo Dominguez
Designer e Ilustrações:
Mayrink
Revisão:
Marcelo Zabrieszach Afonso
Produção e divulgação
Maria Lana, Ricardo Carvalhal, Vitor Labre, Melquisedeck Gabriel da Silva,
Willdison Carlos dos Passos Gonzaga,
Arlindo Machado de Azevedo, Elizeu Alves
Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca
Rua Leopoldo Bulhões, 1480 - Sala 609 -Manguinhos - CEP 21041-210
Rio de Janeiro/RJ - Tel. (21) 3838-9189
E-mail: ricardomoura@ensp.fiocruz.br
Tiragem: 10.000 exemplares
Impressão: Gráfica & Editora Minister
Tel. (21) 3878-8700
I
Indice
A resenta ão 3
Movimentos sociais e saúde 13
Os movimentos sociais durante a ditadura militar
====
9
Limites e possibilidades dos movimentos sociais 18
O que são os movimentos soc=ia==is=====~ ==17
Palavras finais 20
Pág. 1
Esta publicação foi desenvolvida
no âmbito do Plano de Monitoramento
Epidemiológico da Área de Influência do COMPERJ
Catalogação na fonte
Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica
Biblioteca de Saúde Pública
T649r Toledo, Luciano Medeiros de (Org.)
Movimentos sociais e saúde. / organizado por Luciano
Medeiros de Toledo e Paulo Chagastelles Sabroza - Rio de
Janeiro, ENSP/FIOCRUZ, 2013.
17 p. : il.
ISBN:
1. Saúde Pública. 2. Participação Comunitária. 3. Direito a
Saúde. 4. Justiça Social. 5. Censos. 6. Movimentos Sociais.
I. Sabroza, Paulo Chagastelles (Org.). 11. Título.
CDD - 22.ed. - 362.1
Pág.2
A resenta o
A população tem sofrido muito com os atuais problemas da assistência à saúde. Mas os
mais antigos sabem que já foi muito pior. Como era pior! Muitas melhorias vieram por meio da
conquista de lutas sociais. Desde a década de 1970, nos mais diversos recantos da nação,
milhares de grupos, movimentos e pessoas têm lutado para melhorar as condições de saúde
da população, enfrentando interesses econômicos e políticos muito poderosos. Trazer para a
reflexão e o debate a importância das lutas dos movimentos sociais na defesa do direito
universal à saúde, resgatando o nosso passado e inspirando novos caminhos futuros é uma
das contribuições desta edição dos Cadernos de Monitoramento Epidemiológico e
Ambienta/.
R econhecer estas conquistas é importante para valorizar a luta social que hoje ainda
ocorre. Sem estas lutas, redes de solidariedade e invenções coletivas, nós não teríamos o
SUS. Se estas lutas não continuassem, o SUS teria muito menos recursos. E as suas práticas
não teriam elementos tão inovadores como o trabalho das agentes comunitárias de saúde, os
conselhos de saúde com grande representação da população, vários serviços abordando
problemas de saúde de forma participativa com os moradores e as organizações
comunitárias, o esboço de uma política procurando a humanização dos atendimentos e uma
assistência menos restrita à apenas o tratamento de sintomas e doenças bem definidas pela
medicina. Na luta pela saúde, muitas contribuições foram feitas para o avanço geral da
democracia e da justiça, o fortalecimento de grupos sociais marginalizados e o
reconhecimento e valorização dos saberes e práticas populares.
Muitas outras conquistas precisam ser feitas. Quem convive com o sofrimento da
população sabe da urgência desta luta. Sem movimentos ativos, esta luta vai se esvaziar e
ficar menos criativa. Será uma luta perdida!
H á muitos grupos políticos e econômicos interessados em desvalorizar os movimentos
sociais. Querem fazer acreditar que a melhoria da saúde virá principalmente pelo trabalho de
lideranças políticas eleitas ou de lideranças técnicas dedicadas. Que a melhoria dependerá
basicamente do aperfeiçoamento tecnológico da assistência ou de um ensino mais
qualificado dos profissionais de saúde. Tudo se resolveria por dentro das instituições de uma
nação já democrática. E que saúde não tem nada a ver com justiça, condições de trabalho e
moradia. Mas, sabemos que não é assim.
H á desafios e dificuldades novas. Os movimentos têm dificuldade de manter sua
autonomia no contexto de um Estado composto também de gestores com muitos saberes
adquiridos pela participação em movimentos sociais do passado. Formas tradicionais de
organização popular estão esvaziadas e é preciso identificar e valorizar novas formas de
organização. O individualismo consumista está se expandindo na cultura, tornando as lutas
coletivas mais difíceis e exigentes. Enfim, são muitos os novos desafios para os atuais
movimentos sociais continuarem fortes na sua luta.
Eymard Mourão Vasconcelos
Médico, professor na Universidade Federal da Paraíba, participante do
movimento da educação popular em saúde desde 1974
Pág.3
Intr -
Antes de iniciar a leitura deste caderno, consideramos importante você
perceber, caro leitor, cara leitora que, apesar de todo mundo falar em
movimentos sociais, quase ninguém consegue definir o que são. Na
verdade, há uma grande polêmica em torno do assunto. Não há um único
significado para esse conceito, isto é, para identificar, descrever e classificar
o que são movimentos sociais.
O conceito de movimentos sociais foi elaborado pelas Ciências Sociais na
Europa em decorrência do surgimento, nos anos da década de 1960, de
lutas sociais em torno de diferentes problemas sociais, a exemplo da
habitação, dos serviços básicos, do acesso à terra ou dos direitos à saúde e
reprodutivos. Nesse sentido, distinguem-se dos movimentos sindicais na
medida em que estes lutam contra a exploração da força de trabalho pelo
capital.
Por isso, dizer "de primeira" o que são movimentos sociais, não é tarefa
simples. Aqui ofereceremos subsídios para você refletir criticamente sobre o
tema e chegar às suas próprias conclusões. Por isso, a nossa análise dos
movimentos sociais adota a perspectiva da Educação Popular em Saúde,
que se organiza para a libertação das pessoas envolvidas no ato de
aprender, em todos os momentos e em todos os sentidos que se possa e ou
precise libertar.
Para efeito de introdução, começamos afirmando que os movimentos
sociais têm diversas formas de organização e de luta.
Pág.4
Por isso, dizer "de
primeira" o que são
movimentos sociais, não é
tarefa simples. Aqui
ofereceremos subsídios
para você refletir
criticamente sobre o tema
e chegar às suas próprias
conclusões. Por isso, a
nossa análise dos
movimentos sociais adota
a perspectiva da
Educação Popular em
Saúde, que se organiza
para a libertação das
pessoas envolvidas no ato
de aprender, em todos os
momentos e em todos os
sentidos que se possa e ou
precise libertar.
Para efeito de introdução,
começamos afirmando
que os movimentos sociais
têm diversas formas de
organização e de luta.
Os movimentos sociais
têm em comum o fato de
apontarem os problemas
fundamentais da
desigualdade e das
injustiças sociais. Movimentos sociais são aqueles que lutam por projetos,
significados e orientações que levem a uma sociedade mais justa.
Voltaremos a essa definição mais adiante, no item quatro desta publicação.
Diferentemente do que ocorreu em outros períodos da história brasileira,
temos um retrocesso na compreensão da importância dos movimentos
sociais. Atualmente, os movimentos sociais são frequentemente
"criminalizados" pelo poder público e pela mídia (imprensa, rádio, televisão e
internet) que influencia grande parte da sociedade e difunde como "absoluta
verdade" as opiniões das grandescorporações das quais dependem por
meio da publicidade e com as quais se identifica em termos de valores.
Essas opiniões objetivam reforçar os interesses de quem tem poder e
colaboram para a manutenção das injustiças sociais, inclusive para que os
investimentos do dinheiro público beneficiem mais quem já tem muito.
Pág.5
Introdução
~ ••i•.•K
Não estamos sós quando nos lançamos à missão de ressaltar a
importância das lutas dos movimentos sociais em prol de outro mundo mais
justo para todos. Muitos são os grandes pensadores que afirmaram a
importância dessas lutas. Para exemplificar, transcrevemos um trecho da
última entrevista de Paulo Freire, em 1997, na qual ele reúne de forma
brilhante elementos fundamentais para reflexões que nos parecem cada
vez mais atuais.
"Eu estou absolutamente feliz por estar vivo ainda e ter acompanhado essa
marcha, que como outras marchas históricas, revelam um ímpeto da
vontade amorosa de mudar o mundo, essa marcha dos chamados 'Sem
Terra'. Eu morreria feliz se visse o Brasil cheio de seu tempo histórico de
marchas. Marcha dos que não têm escola. Marcha dos reprovados, marcha
dos que querem amar e não podem, marcha dos que se recusam a uma
obediência servil. Marcha dos que se rebelam, marcha dos que querem ser e
estão proibidos de ser. Eu acho que afinal de contas as marchas são
andarilhagens históricas pelo mundo. E os 'Sem Terra' constituem para mim
hoje uma das expressões mais fortes da vida política e da vida cívica desse
país. Por isso mesmo é que se fala contra eles. E até de gente que se pensou
progressista que fala contra eles, contra os '8em Terra', como se fossem os
desabusados, como se fossem destruidores da ordem. Não, pelo contrário.
O que eles estão é mais uma vez provando certas afirmações teóricas de
analistas políticos, de que é preciso mesmo brigar para que se tenha um
mínimo de transformação."
Pág. 6
A imagem do que somos como pessoas, habitantes e cidadãos do Brasil é
muito diversa, tanto pelo pertencimento a diferentes classes e grupos
sociais, étnicos e raciais, ao gênero, a culturas e às condições ambientais
diferentes. De acordo com o estudo "Brasil mostra a tua cara", do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), relativo ao período de 1872 a
2000, na composição da imagem da população brasileira traçada neste
último censo demográfico entram aproximadamente 90 variáveis, ou
aspectos da vida da população.
Contudo, alguns traços são marcantes; constata-se que o Brasil passou
por profundas transformações nos últimos 50 anos de nossa história.
Vamos começar pelo fato de que a expectativa de vida dos brasileiros
aumentou em 25,4 anos entre 1960 e 2010, ao passar de uma média de 48
anos para 73,4 anos.
Nesse mesmo período o número médio de filhos por mulher diminuiu de
6,3 para 1,9 e o número de idosos aumentou de 2,7% para 7,4%.
A existência simultânea de três e às vezes quatro gerações numa mesma
família traz uma sensação de "aceleração do tempo" para todos. Também
permite uma troca de experiências sobre as diferentes épocas vivenciadas
pelos membros destas famílias. Uma pessoa que viveu a infância numa
cidade do interior nos anos 1950-1960 pôde conviver com a sua avó,
nascida no final do século XIX, vê-Ia passar a roupa com ferro a carvão e,
mais tarde, com ferro elétrico, ou acender um fogão à lenha e depois um a
gás.
Essa pessoa tem a memória de um Brasil que deixou de ser uma
sociedade preponderantemente rural e agrária para se tornar uma
sociedade urbana, com predomínio da indústria e do setor de serviços.
Pág. 7
Alguns traços do Brasil nos «retratos» dos censos demográficos
A urbanização é outro desses traços marcantes. Os Censos Demográficos
de 1960 e de 1970 registraram a mudança com nitidez, pois, como se pode
constatar na tabela a seguir, enquanto em 1960 a população rural ainda
prevalecia sobre a urbana, em 1970 essa proporção se inverteu:
BRASIL 1960 % 1970 0/0 2010 %
URBANO 32.004.817 45 52.904.744 56 160.925.792 84
RURAL 38.987.526 55 41.603.839 44 29.830.007 16
Fonte: IBGE
O problema mais grave é que as transformações ocorridas entre 1960 e
1980 se deram sob uma ditadura militar. Quer dizer, as experiências
coletivas dessas mudanças não puderam ser discutidas e menos ainda
questionadas. Durante a ditadura militar (1964-1985), a economia
capitalista cresceu a taxas elevadas, mas os trabalhadores foram
submetidos ao arrocho salarial. Enquanto no período entre 1968 e 1973 o
Produto Interno Bruto (PIB - conjunto da riqueza produzida pelo país)
cresceu a uma taxa média de 10% ao ano e a inflação oscilou entre 15% e
20% ao ano, os salários foram corrigidos apenas com uma parte da inflação.
Os reajustes salariais ocorriam a cada dois anos e apenas depois das
greves massivas em 1978-79 passaram a ser semestrais. O valor do salário
mínimo, entre 1965 e 1974, mantinha apenas 69% do poder aquisitivo de
1940. Inevitavelmente a desigualdade entre os muito ricos e os muito pobres
se ampliou e se aprofundou.
Além do arrocho salarial, a falta de uma política habitacional e de
transportes públicos, obrigou os trabalhadores a construírem suas próprias
moradias, geralmente em áreas de risco. A favelização foi o resultado desse
processo de violência social. John Turner, arquiteto e urbanista inglês que
esteve no Brasil em 1968 fez o diagnóstico da questão urbana brasileira:
favela não é problema, é solução de outros problemas.
vocÊ GANHA o SALÁRIO MíNIMO.
COMO é QUE vocE FAZ PARA
COMER, SE VES]IR, MORAR.
ONDE VOCE VIVE?
Pág.8
o golpe militar que depôs João Goulart da Presidência da República em 31
de março de 1964, desfechado em nome dos interesses dos capitalistas e
latifundiários, ameaçados pelas reivindicações dos trabalhadores da cidade
e do campo, somente foi bem-sucedido porque teve apoio na classe média
urbana, que tomou as ruas nas capitais e grandes cidades, no movimento
conhecido como Marcha da Família com Deus pela Liberdade.
Fortalecidos por essa base social, os militares suspenderam a Constituição
Federal do Brasil e fecharam o Congresso Nacional, cassaram o mandato
de deputados e senadores e os partidos foram declarados ilegais; os
sindicatos sofreram intervenção, sindicalistas e dirigentes políticos presos e
banidos.
Mas nem se passaram dois anos e essa mesma classe média, que apoiou
o golpe, voltou-se contra ele por causa do programa econômico que, em
nome do controle da inflação, mediante elevação da taxa de juros e corte do
crédito, provocou uma verdadeira quebradeira das pequenas empresas.
Pág.9
Os movimentos sociais durante a ditadura militar
Os estudantes vocalizaram a revolta da classe média, na luta por mais
vagas nas universidades, e radicalizaram até alcançar o auge na Marcha
dos Cem Mil, na cidade do Rio de Janeiro, em 1968.
Charge publicada em 1968 no jornal Correio da Manhã do Rio de Janeiro, durante a ditadura mili r.
A charge resultou na retirada de circulação do jornal no dia em que foi publica da, por ordem das
autoridades da época.
A sigla EP (que significava Escola Pública), inscrita no bolso da camisa do uniforme de um meni o,
aluno da rede pública do ensino fundamental, ironiza a exagerada forma nas ações de repressão
imposta aos estudantes.
Naquela época, o movimento estudantil organizava com muita coragem passeatas em protesto
contra o regime militar. Por isso, era considerado uma espécie de inimigo público número 1 do
governo.
Pág. 10
A dura repressão e a retomada do crescimento econômico fizeram o
movimento recuar, levando a maioria da classe média a aderir novamente ao
regime ditatorial e a contribuir para sustentá-Io por quase uma década.
Algumas organizaçôes de esquerda resolveram enfrentar a ditadura com
armas na mão, sendo destruídas, com seus militantes presos, mortos ou
desaparecidos.
Entretanto, a Igreja Católica, a maioria da qual até então estava ao lado dos
militares, dividiu-seinternamente e afastou-se do regime. A ala à esquerda,
que se tornaria conhecida pelo nome de Teologia da Libertação, dirigiu-se
para as classes trabalhadoras da cidade e do campo por meio das chamadas
Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Outras igrejas, como a Metodista,
também abraçaram esta perspectiva. Um traço importante da história dos
movimentos sociais nasce nesse momento: toleradas pelos militares, as
igrejas acabaram por abrigar a resistência popular à ditadura.
Assim é que, em 1973, teve início um movimento contra a carestia,
organizado por clubes de donas de casa da periferia de São Paulo (capital)
impulsionado pelas CEBs.
Uma dessas lideranças era Ana Maria do Carmo Dias, então casada com
Santo Dias da Silva, um dos militantes da Oposição Sindical de São Paulo,
assassinado em 1979 pela Polícia Militar durante a repressão a um piquete
na fábrica Silvania, no bairro de Santo Amaro. Ana Maria ajudou a organizar
clubes nos bairros da periferia paulistana. As mulheres dos clubes de Jardim
Souza, Nakamura, Alto Riviera, Vila das Belezas e Parque Arariba se
reuniam para trocar ideias e dali nasceu a ideia de se fazer um questionário
para saber como estava o custo de vida. Constatando a carestia, a primeira
carta reivindicando a
diminuição do custo de
vida, a Carta das Mães da
Periferia de São Paulo, foi
entregue ao deputado
Freitas Nobre, do
Movimento Democrático
Brasileiro (MDB), único
partido oficial de oposição
no Congresso Nacional. A ~~~~?;;;;;;;;;;::::::;r=~=========1
insatisfação popular foi,
assim, canalizada para
esse partido. Nas eleições
proporcionais de 1974, o
MDB obteve 59% dos
votos para o Senado e
48% para a Câmara dos
Deputados.
Pág. 11
Os movimentos sociais durante a ditadura militar
A classe média urbana começou então a levantar a bandeira das liberdades
democráticas, com a fundação, em 1975, do Movimento Feminino pela
Anistia. Em 1977, na medida em que o empresariado brasileiro começava a
se distanciar do regime militar, outras vozes sociais emergiram:
aconteceram greves estudantis e, no ano seguinte, uma onda de greves de
trabalhadores se espalhou por todo o país. Em 1983 esse movimento
organizou-se na Central Única dos Trabalhadores.
No campo, lutas aconteceram nas áreas desapropriadas para a construção
das hidrelétricas, como as do Rio Iguaçu, Tucuruí, Sobradinho e Itaparica.
Eram as Comissões Regionais dos Atingidos por Barragens que
reivindicavam no início a indenização justa para logo em seguida lutar pelo
direito ao trabalho como agricultores, querendo a troca de terra
(desapropriada) por terra (para reassentamento). Esta foi a origem do
Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Em 1984 se constitui um dos
movimentos sociais mais organizados até hoje no Brasil: o Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra (MST). A bandeira principal de luta do MST é a
reforma agrária entendida como uma política nacional que busca um
processo mais profundo de transformação social. O MAB e o MST, junto com
1----=:::==::::-----------, o Movimento das Mulheres
Camponesas e o
Movimento dos Pequenos
Agricultores, constituem a
Via Campesina no Brasil.
Todas essas lutas
contribuíram para o fim do
regime militar, em janeiro
de 1985, apesar das
eleições livres e diretas
para a presidência da
república somente terem
acontecido em 1989.
Pág. 12
Os movimentos sociais voltados para as lutas pela saúde da população se
desenvolveram nas capitais e nas grandes cidades a partir de 1976. O mais
notório foi o chamado Movimento da Zona Leste, em São Paulo (capital).
Esse movimento começou como uma iniciativa do clube de donas de casa
que, no Jardim Nordeste, encaminhou à Secretaria Estadual de Saúde um
abaixo-assinado reivindicando serviço público de saúde nesse bairro
popular. Estudantes de medicina participaram dessa luta pelo posto de
saúde, organizada numa Comissão de saúde naquele ano.
A conquista do posto se deu em 1978, mas, tão logo o serviço começou a
funcionar, a população reclamou da falta de atendimento médico. O
movimento resolveu, então, criar um Conselho de Saúde, eleito pelo voto
direto dos moradores, inclusive dos analfabetos, com a divulgação de fotos e
currículos dos candidatos. No Jardim Nordeste participaram dessa eleição
8.000 dos 15.000 moradores!
Vale notar que essa iniciativa já foi uma antecipação da luta pelo direito de
voto aos analfabetos, finalmente alcançada na Constituição de 1988.
Pág. 13
Movimentos sociais e saúde
A generalização da experiência na região de S. Mateus se deu num contexto
de intensas mobilizações estudantis e operárias entre 1977 e 1979.
Finalmente o Movimento da Zona Leste organizou e realizou em 1983 o
Encontro das Comissões e Conselhos de Saúde da Zona Leste. Nesse
Encontro, os 150 participantes de 37 bairros aprovaram:
• No curto prazo, ampliação e melhoria dos Centros de Saúde,
construção de hospitais públicos e prontos-socorros, ambulatório do
INAMPS e oficialização regimento dos Conselhos;
• No médio prazo, saneamento básico e organização de um Conselho
Regional da Saúde;
• No longo prazo, fim dos convênios com a Medicina de lucro,
atendimento à saúde que seja público, de boa qualidade e igual para
todos e participação da população na fiscalização e controle do
funcionamento de todos os serviços de saúde.
Percebe-se, nas resoluções do Encontro, o entendimento de que se a
saúde era determinada pelo modo como a sociedade estava organizada,
esta por sua vez podia ser alterada politicamente pela organização popular.
O Movimento da Zona Leste levantou propostas que, mais tarde, viriam a ser
debatidas na VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986.
Pág. 14
Movimentos sociais e saúde
Até aquele momento os movimentos eram interclassistas, ou seja,
reuniam em vários lugares do país estudantes, técnicos, professores e
lideranças populares. Mas, com a redemocratização política a partir de
1982, ocorreu uma separação entre os movimentos e as iniciativas de um
grupo que, apoiado no Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (CEBES), nas
instituições de ensino e na Associação Brasileira de Saúde Coletiva
(ABRASCO), se autodenominou Movimento da Reforma Sanitária. Isso
porque a redemocratização, controlada pelos militares, abriu espaço para a
participação desse grupo, de modo a resolver a crise do sistema médico
previdenciário brasileiro, desencadeada em 1981 e que somente seria
superada, a partir da aprovação do direito à saúde na Constituição de 1988,
com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), em 1991.
Também na área da Saúde deve-se destacar a criação do Programa de
Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM), em resposta à reivindicação
do movimento feminista de se instituir um programa público de controle da
fecundidade no Brasil. Esse processo, que surgiu em 1983, abriu caminho
para a luta pela saúde sexual e reprodutiva, embora a desigualdade social
vigente em nosso país tenha limitado o alcance dessa política, pela
dificuldade de renda para ter acesso aos métodos contraceptivos.
A epidemia de HIV-
AIOS, que começou a
tomar vulto no país
naquele momento,
dramatizou a
problemática da saúde
sexual e reprodutiva. A
luta dos soropositivos
por meio de suas
organizações permitiu o
reconhecimento civil e
político dos
homossexuais e o
resgate de sua
dignidade como
pessoas normais, ou
seja, da sua
humanidade, ao
superar a visão, até
então institucionalizada, de um comportamento tido como desviante da
normalidade e incluído na categoria das doenças mentais.
Nesse momento, surgiram também outros movimentos de luta contra as
estigmatizações sociais, a exemplo do Movimento de Reintegração dos
Atingidos por Hanseníase (MORHAN), que afetam as parcelas mais
empobrecidas da população.
Pág. 15
Movimentos sociais e saúde
No começo da década de 1990 aconteceu uma experiência de participação
popular na Saúde muito significativa no pequeno município dePintadas,
localizado na região do semiárido da Bahia. O ponto de partida foi a luta pela
terra, organizada pela Comunidade Eclesial de Base e pelo Sindicato dos
Trabalhadores Rurais daquele município. Então, essas duas organizações
decidiram participar da eleição municipal de 1992. Inicialmente convidaram
o Departamento de Medicina Preventiva Universidade Federal da Bahia
para ajudá-Ios a elaborar um diagnóstico da situação da saúde da
população, tendo em vista a elaboração de um plano municipal e a aquisição
de conhecimentos em prevenção de doenças. O método adotado foi o da
mobilização popular direta. O processo todo envolveu três momentos: (1)
diagnóstico sociossanitário em assembleias populares nos bairros; (2)
cursos para lideranças surgidas nesse processo com metodologia
participativa; reuniões de lideranças com a população; (3) elaboração do
plano municipal de saúde com base na discussão das assembleias.
É interessante registrar que a discussão nas Assembleias Populares de
Pintadas era orientada por um roteiro muito simples, mas que pode servir de
inspiração para nós até hoje. Pedia-se para responder quatro perguntas:
.Ouais os cinco principais pro-
blemas em seu bairro?
.Ouais as causas desses pro-
blemas?
.Ouais as ações que precisam
ser realizadas para enfrentar
essas causas?
• A quem cabe a resposabilida-
de por essas ações?
Essa experiência singular
mostra como se pode pensar a
convocação, a organização e a
realização das conferências de
saúde de maneira
verdadeiramente popular e
democrática. Deve-se ter em
mente que as conferências e os
conselhos de saúde, Instituídos
pela Lei 8.142, de 28 de
dezembro de 1990,
generalizaram-se no Brasil a
partir de 1991, para viabilizar a
municipalização da saúde e,
assim, a criação do Sistema
Único de Saúde.
Pág. 16
A análise histórica dos movimentos sociais acima apresentada permite
entender que movimentos sociais constituem uma designação para formas
de organização e de luta bastante diversas. Tem em comum o fato de
apontar os problemas fundamentais da desigualdade e da injustiça vigentes
na nossa sociedade, de lutar por projetos, significados e orientações.
Os movimentos sociais não se opõem abertamente à ordem social, mas às
formas de seu desenvolvimento no que diz respeito à igualdade, à liberdade,
à democratização das relações sociais. Na medida em que lutam e
alcançam conquistas, afetam a própria constituição da sociedade.
Além de revelar problemas e encaminhar lutas para resolvê-Ios, também
apresentam uma nova forma de compreender a realidade social, pois os
sujeitos deles participantes precisam elaborar um conhecimento na ação
coletiva. O conhecimento não é prévio, é construído na luta.
A politização e a publicitação de questões anteriormente restritas à esfera
privada (gênero, orientação sexual, étnicas) e o compartilhamento de lutas
(pela terra, distribuição de renda, igualdade entre as nações ou
'antiglobalização') permitiu uma maior integração entre os movimentos
sociais, por meio de redes e da participação em conselhos de políticas
públicas.
Assim, podemos afirmar que movimentos sociais são aquelas ações
coletivas nas quais os participantes, tendo em vista um objetivo comum,
tomam decisões por meio de assembleias, reuniões ou outras formas de
democracia direta, sem hierarquia entre os participantes.
Pág. 17
A participação
movimentos sociais em
conselhos (sociedade civil e
governo) para deliberar e/ou
fiscalizar políticas públicas, a
exemplo da saúde, dos idosos
da tutela de crianças e
adolescentes, da política de
educação (controle e
acompanhamento do Fundeb,
das escolas, da Alimentação
Escolar e do Transporte
escolar), tem atualmente uma
abrangência nacional. No caso
do setor da saúde o IBGE
registrou em 2011 a existência
de 5.563 conselhos municipais
em um total de 5.565
municípios, a maioria absoluta
paritários, havendo tanto
aqueles deliberativos como os consultivos.
Essa abrangência no setor da saúde é um indicador do sucesso da
estratégia das transferências intergovernamentais, pois condicionou a
criação dos fundos municipais à implantação de uma estrutura de controle
social baseada em conselhos paritários. Deve-se lembrar, contudo, que a lei
apenas facilita ou dificulta a mobilização social. A efetividade da participação
social nessas instãncias depende, por um lado, do grau de autonomia dos
representantes da sociedade frente aos gestores; e, por outro, da tradição de
luta e de organização de seus movimentos e entidades. Historicamente a
autonomia e a capacidade de mobilização constituem aspectos de um
mesmo processo e são mais acentuadas nas grandes cidades do que nas
pequenas e médias.
Entretanto, a institucionalização dos movimentos, ou seja, seu
enquadramento na lógica da representação em instânc;ias públicas de cunho
paritário, pautada, geralmente, pelos gestores e pela dinâmica política da
gestão pública, acaba por implicar a profissionalização dos movimentos,
uma baixa renovação dos participantes e, assim, o enfraquecimento da
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relação destes com
suas bases sociais.
Nos últimos anos,
porém, a retomada
do crescimento
econômico e sua
expansão por novas
áreas urbanas tem
propiciado o
aparecimento de
novas formas de
organização. Elas
expressam a
consciência da
fragilidade de
organizações da
sociedade civil e a
dificuldade dos
e s p a ç o s
institucionalizados
nos municípios de se
abrirem para o
debate em torno dos
conflitos de interesse.
São as Plenárias de
Movimentos Sociais
e os Fóruns
Populares, experiências experimentadas no Brasil até meados dos anos
1990, agora renascidas para dar conta das limitações apontadas. Formas de
organização mais abertas e plurais, permitindo uma diversidade de
movimentos de distintas características e ideologias, oferecem, na medida
em que estão enraizadas em interesses populares, a possibilidade de
construção de novos movimentos sociais. Os fóruns são espaços que reúne
moradores, movimentos sociais, como pesquisadores e estudantes de
instituições acadêmicas que defendem a cidadania e os direitos sociais,
através da participação direta na concepção, construção, execução,
monitoramento e controle social (gestão social) das políticas públicas. A
unificação dessa diversidade é um desafio por conta da falta de uma cultura
participativa comum, em decorrência de décadas de opressão, tornando
mais difícil o diálogo com as instâncias do poder público. Uma das formas de
enfrentar o desafio é o que faz o Fórum Social de Manguinhos, na cidade do
Rio de Janeiro: as pautas das reuniões partem das demandas trazidas pelos
participantes, são pensadas como temas estruturantes e analisadas e
encaminhadas em função das possibilidades abertas pelo momento político.
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Ao chegarmos ao final dessa leitura, caro leitor, cara leitora, queremos
reafirmar que lutar é um direito, não é nenhum crime.
Ao contrário, somente juntas e organizadas em diversas formas, as
classes trabalhadoras conquistarão os seus direitos. Portanto, a esperança
de dias melhores vem dessas lutas de toda a gente que, apesar de sofrer
várias formas de opressão, acredita noutro mundo mais justo para todas e
todos.
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Para saber mais
FREIRE, Paulo. Cinco minutos (ou pouco mais) com o genial e
saudoso Paulo Freire - Educação e Transformação. Disponível em:
http://imediata.orgl?p=854
GOHN, Maria da Glória Marcondes. Teoria dos Movimentos sociais:
paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo: Edições Loyola,
1997.
STOTZ, Eduardo Navarro. A Educação Popular nos movimentos
sociais da saúde: uma análise das experiências das décadas de 1970
e 1980. Trabalho, Educação e Saúde, volume 3, número 1, páginas 9-
30. Disponível em
http://www.revista.epsjv.fiocruz.br/index.php?Area=NumeroAnterior&Num=24
Realização
~tj
EN S P FIOCRUZ
GOVERNO: FEOEIlÁL
PAis RICO É PAis SEM POBREZA

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