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LIVRO MAL ESTAR NA ESCOLA Outeiral & Cerezer

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1 
Jouteiral@hotmail.com 
 
O MAL-ESTAR NA ESCOLA 
José Outeiral e Cleon Cerezer 
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 
SUMÁRIO 
1. A ADOLESCÊNCIA, A CRIATIVIDADE, OS LIMITES E A ESCOLA 
 José Outeiral 
2. O TRABALHO COM GRUPOS NA ESCOLA 
José Outeiral 
3. VIOLÊNCIA NO CORPO E NA MENTE: CONSEQÜÊNCIAS DA REALIDADE 
BRASILEIRA 
José Outeiral 
4. TENDÊNCIA ANTI-SOCIAL E PATOLOGIA TRANSICIONAL 
José Outeiral 
5. AGRESSIVIDADE, TRANSGRESSÃO E LIMITES NO DESENVOLVIMENTO DA 
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 
José Outeiral 
Cleon Cerezer 
6. A IMPORTÂNCIA DA FUNÇÃO PATERNA NO DESENVOLVIMENTO DA 
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 
José Outeiral 
Cleon Cerezer 
7. A ESCUTA DO MAL-ESTAR NA SALA DE AULA: UM ENSAIO SOBRE 
PSICANÁLISE E EDUCAÇÃO NA ATUALIDADE 
Cleon Cerezer 
8. ADOLESCÊNCIA: MODERNIDADE E PÓS-MODERNIDADE 
José Outeiral 
 
 
 2 
 
CAPÍTULO 1 
 
A ADOLESCÊNCIA, A CRIATIVIDADE, OS LIMITES E A ESCOLA* 
José Outeiral 
 
MESFISTÓFELES 
Pois acertaste vindo até mim. 
 
ESTUDANTE 
Com franqueza, estivesse eu longe já: 
Estas paredes, aulas, salas, 
Não sei como hei de suportá-las. 
É tão restrito e angustiante o espaço, 
De verde não se vê pedaço, 
E ficam-me, nas aulas, bancos, 
Pensar, ouvido e vista estancados. 
 
MEFISTÓFELES 
Antes do mais, dizei-me logo 
A faculdade que elegeste. 
 
ESTUDANTE 
Quero ficar muito erudito, 
Perceber tudo o que há na terra, 
E tudo o que no céu se encerra, 
Natura e ciência, ao infinito 
 
Tudo isto deixa-me tão tolo, 
Como se um moinho me andasse no miolo. 
 
 Goethe, Fausto (1
a
 Parte) (1808) 
 
 
Educar, ao lado de Governar e Psicanalisar, é uma profissão impossível. 
 Freud (1937) 
 
 
 
 
*
 Colaboraram na elaboração deste capítulo a professora Paulina Silbert e a psicóloga Joyce Permigotti. 
 
 3 
 A adolescência é um momento muito criativo em função, entre outras coisas, de ser 
um período de transformações. Nesta etapa da vida se conquista o chamado pensamento 
formal, que oportuniza a pessoa raciocinar sobre hipóteses e elaborar conclusões a partir 
delas. 
 Esta nova possibilidade de pensamento, exercitada pelo adolescente em seu dia-a-
dia, propicia-lhe um novo tipo de relação com o mundo adulto. Entretanto, nem sempre as 
premissas de que se utiliza levam em conta a dimensão possível, do real. Para o adolescente 
é fácil encontrar soluções para os problemas da humanidade, muito embora a maioria delas 
não seja exeqüível na prática. 
 O caráter “mágico” que se estabelece entre o “pensado” e o “exeqüível” cria um 
espaço importante para desenvolver a criatividade que, de início, mostra-se através de uma 
atividade impulsiva, difusa e caótica (desde a ótica dos adultos), mas perfeitamente normal. 
Aos poucos a atividade criativa vai assumindo um perfil mais definido, mais integrado e 
produtivo. O período de transição, entretanto, necessita de um ambiente propício capaz de 
suportar as tensões dos momentos iniciais deste processo criativo peculiar, tanto na família 
como na escola. A criatividade na adolescência articula-se necessariamente com a noção 
de limites. Limite é uma palavra que tem, muitas vezes, uma conotação negativa, ligada 
erroneamente à “repressão”, “proibição”, “interdição”, etc.*, inclusive lembrando 
“repressão política”. No entanto, limite é algo muito além disso: significa a criação de um 
espaço protegido dentro do qual o adolescente poderá exercer sua espontaneidade e 
criatividade sem receios e riscos. Precisamos lembrar que não existe conteúdo organizado 
sem um continente que lhe dê forma. 
 Dois exemplos do antes exposto: 
 O primeiro deles refere-se a um problema encontrado em uma escola onde os 
adolescentes apresentavam uma conduta destrutiva com os móveis e demais objetos da 
classe, e os professores “não sabiam o que fazer”. Questionavam-se muito, faziam reuniões 
e, enquanto isso os alunos “quebravam a escola”. Isto parecia incompreensível, pois os 
professores eram experientes, muitos “pós-graduados” em Educação e a escola tinha um 
 
*
 Embora saibamos que repressão no sentido usado em Psicanálise também significa um elemento 
estruturante da personalidade. 
 
 4 
regulamento interno que, formalmente, normatizava o que deveria ser feito nesses casos: 
“colocar limites”. Esta situação “kafkiana” esclareceu-se com a eclosão, de uma greve dos 
professores em que veio a “tona” a profunda irritação dos adultos com a instituição 
mantenedora. Este fato tornou clara e evidente que a dificuldade dos professores em colocar 
“limites” na agressividade dos adolescentes com a escola era, inconscientemente, porque os 
adolescentes “executavam” o que eles, adultos, gostariam de fazer: esta era a raiz da 
dificuldade em colocar “limites”. 
 Situações idênticas poderão ocorrer nas famílias cujos adolescentes têm problemas 
de conduta e falta de “limites”. Esta falta de “limites” impede o adolescente de exercitar sua 
capacidade de pensar, de ser criativo e espontâneo. 
 Com este exemplo, quero enfatizar que a falta de “limites” na adolescência é 
conseqüência, em maior ou menor grau, de dificuldades dos adultos, pois nenhuma criança 
nasce com a noção de limites. A noção de “limites” se desenvolve num longo processo de 
identificação da criança e do adolescente com seus pais, inicialmente, e, depois, com os 
adultos que a sociedade disponibiliza como professores, artistas, desportistas, políticos, etc. 
 O segundo exemplo nos reporta a uma situação em que um grupo de crianças, de 
dez a doze anos, mostrava-se agitado, com agressões e baixo rendimento escolar. A 
“bagunça” estendia-se a todos os momentos em que estavam na escola. Um professor 
observou que brincavam aos empurrões e lhe pareceu que, assim, buscavam um contato 
físico entre si. Esta observação cuidadosa e oportuna fez com que o Serviço de Orientação 
Educacional (SOE) reunisse o grupo para “conversar” sobre o que estava acontecendo. Os 
assuntos trazidos evidenciaram que a puberdade estava produzindo toda a “turbulência” e 
que mais que “agitados” estavam, realmente, “excitados” davam “puxões” e “empurrões”, 
faziam freqüentes “reuniões dançantes” e chamavam de “galinha” uma menina que, 
precocemente, apresentava os primeiros sinais da puberdade e que com suas “características 
sexuais secundárias” provocava ansiedade na turma, que tentava então “queimá-la” numa 
versão “púbere” da Inquisição. As reuniões do SOE ofereceram um “limite”, um espaço e 
um tempo protegido, que propiciou substituir a agitação pela verbalização dos conflitos. 
Certamente puni-los com “suspensões” e medidas disciplinares não seria um “limite” 
adequado e sim uma “repressão” no mau sentido que, por vezes, tem esta palavra. Um 
 5 
professor sensível e arguto ajudou os púberes em sua difícil “estrada” rumo ao 
desenvolvimento adolescente. 
É necessário enfatizar que as crianças e os adolescentes “pedem limites” e que o “limite” os 
ajuda organizar sua mente. Os adultos, às vezes, não colocam “limites” porque assim será 
mais “cômodo”. Colocar limites significa envolvimento, “conter” o adolescente, suportar 
suas reclamações e protestos, enfim, enfrentar dificuldades. Os adultos poderão também ter 
dificuldades em colocar “limites” em função de problemas com seus pais, tendo, talvez, 
sentido-se “reprimidos” nas suas infâncias e adolescências, têm dificuldades com seus 
filhos. Buscando evitar que eles passem pelo que não gostariam de ter vivido, acabam 
contribuindo para osurgimento de “problemas”. 
Não devemos esquecer os trabalhos do pedagogo britânico S. Neill, que ao relatar sua 
experiência em uma escola, escreveu um livro chamado Liberdade sem medo, onde 
descrevia uma experiência pedagógica extremamente liberal, e alguns anos depois, 
escreveu um outro que, significativamente, intitulou Liberdade sem excesso. 
A escola tem um significado primordial para o adolescente. Conforme o ambiente que ele 
vivencia teremos um aprendizado prazeroso e propício ou distúrbios de conduta e/ou de 
aprendizagem. 
A função da escola é educar, isto é, conforme o significado etimológico da palavra, 
“colocar para fora” o potencial do indivíduo e oferecer um ambiente propício ao 
desenvolvimento destas potencialidades, ao contrário de ensinar, que é in + signo, ou seja, 
colocar “signos para dentro” do indivíduo. Evidentemente, quando a criança chega na 
escola, levando consigo aspectos constitucionais e vivências familiares, porém o ambiente 
escolar será também uma peça fundamental em seu desenvolvimento. Estes três elementos - 
aspectos constitucionais, vínculos familiares e ambiente escolar - constituirão o tripé do 
processo educacional. 
Mas qual a escola? Esta é uma pergunta que os pais se fazem com freqüência e que é 
extremamente necessária, pois uma criança ou um adolescente (e, inclusive seus pais) 
poderá ou não se adaptar em um determinado ambiente escolar. Cada escola tem uma “ 
cultura “ própria, a qual determinado aluno poderá ou não se adaptar. A escola, a sala de 
aula, é um lugar “imaginário”, diferente do espaço real das cadeiras, classes e salas. Ela é o 
que o aluno percebe a partir de sua história, seus desejos e seus medos. Na escola acontece 
 6 
um interjogo de forças inconscientes que se cruzam, se opõem, se conflitam e se reforçam. 
Algumas têm seu processo educacional mais dirigido, com limites mais estreitos, ao 
contrário de outras, mais abertas e mais liberais. Um adolescente, com dificuldade de 
organização, poderá se beneficiar (ou não) de um ambiente escolar mais estruturado e de 
limites mais precisos, sendo necessário avaliar, em cada caso, a situação, buscando 
conhecer como funciona determinada escola e, se necessário, buscando ajuda profissional 
especializada. As simplificações do tipo: “meu filho é tímido, portanto, precisa de uma 
escola mais liberal” ou “como ele não tem limites, uma escola mais rígida irá ajudá-lo” não 
são sempre verdadeiras. O “óbvio ululante” que cada adolescente e cada escola têm 
peculiaridades próprias é verdadeiro. 
As escolas, por seu lado, têm o que chamamos de um “currículo manifesto” e um “currículo 
oculto”, ou seja, aquilo que manifestamente é dito e/ou escrito, e a verdadeira prática no 
dia-a-dia da sala de aula. Não são raras as experiências de ouvirmos falar, por exemplo, de 
uma “educação libertadora”, às vezes isto dito com soberba e empáfia, e constatarmos, 
depois, uma educação retrógrada e carregada de ambigüidades, que são “denunciadas” pela 
percepção acurada dos alunos adolescentes. O processo educação/escola é hoje alvo de 
questionamentos que se situam basicamente em dois pólos: a educação tradicional, na qual 
nós adultos fomos formados, em contraposição à educação progressista, que propõe uma 
relação mais prazerosa (satisfatória) com o conhecimento. 
A primeira nos oferece algumas garantias, já que nos tornamos adultos pelos menos 
supostamente aptos. Mas nem todos viveram esta experiência como proporcionando prazer, 
alegria e satisfação em aprender, como deveria ser o processo educacional. 
A segunda, dita progressista, tem favorecido, em alguns casos, a obtenção de uma relação 
mais tranqüila e flexível com o mundo do conhecimento, desenvolvendo boa capacidade 
para pensar de forma autônoma. Não pode garantir, no entanto, o montante de 
conhecimento e cultura geral antes obtido. No capítulo sobre Adolescência: modernidade e 
pós-modernidade estas questões são abordadas mais detalhadamente. 
As dúvidas quanto à adequação de um ou de outro modelo, ou de uma síntese dos dois, não 
são privilégio dos pais, mas dos educadores também. A Escola, a Educação, vive um 
momento de perplexidade, sem definição de como conciliar as necessidades de uma 
sociedade em mudança permanente (com contestação, transformações e mudanças de 
 7 
paradigmas e valores) e uma proposta educacional que prepare o “homem do futuro”. 
Temos que pensar, então, que nem sempre a escola “tem razão” e que muitas vezes a 
apreciação do adolescente é correta. A escola é feita por pessoas (professores, supervisores, 
orientadores e diretores são “pessoas”) que lidam melhor ou pior com determinadas 
circunstâncias. Os pais têm de estar atentos para situações que se derivam destes fatos. 
Qualquer “Manual de Educação Moderna” aponta como pressuposto a necessidade de 
respeitar as características individuais do aluno; entretanto, o que se verifica na prática é a 
realização de um ensino massificado, em grandes escolas de turmas enormes de alunos, 
mais ao estilo de uma linha de montagem industrial. Como exemplo, verifica-se, também, 
não raramente, a dificuldade que os professores e a própria escola têm para “reprovar” 
(palavra extremamente inadequada) um aluno quando ele não conseguiu dominar o 
conteúdo X de conhecimento em um tempo Y, e acabam colocando na família e/ou no 
próprio aluno a resistência em aceitar a reprovação, como desculpa de sua própria 
insegurança. Os professores, muitas vezes, não toleram as dificuldades de um determinado 
aluno porque sentem estas dificuldades como “ferida narcísica” em sua capacidade de 
ensinar. 
Os pais e professores deverão saber, por outro lado, que estes serão os “recipientes” de 
impulsos, fantasias, emoções e pensamentos mais ou menos conscientes que os 
adolescentes têm em relação aos próprios pais. Amor e agressividade, originalmente 
dirigidos aos pais, serão “transferidos” para os professores. Poderá acontecer que um 
adolescente, irritado com seus pais, tenha com estes uma atitude aparentemente 
“adequada”, extravasando com um professor toda a “bronca” com eles. O professor ficará 
surpreso com a atitude do aluno, mas sua experiência e intuição lhe farão perceber que 
“algo está acontecendo”. Os pais, se chamados à escola pelas atitudes do filho, poderão não 
compreender o que sucede, já que ele está “tão calmo em casa”... . Poderá acontecer, 
também, tomando o exemplo anterior, que o adolescente não demonstre explicitamente a 
irritação dirigida aos pais com o professor e que a conduta negativa apareça sob a forma de 
um baixo rendimento escolar na disciplina. Não serão apenas os sentimentos agressivos que 
serão “transferidos” desse modo, os amorosos também. Os professores, à vezes, são os 
primeiros objetos de “amor edípico”, ocorrendo uma “transferência amorosa”. Por 
exemplo, um menino pode transferir o amor que sente pela mãe para uma determinada 
 8 
professora, por esta lembrar-lhe, consciente ou inconscientemente, a figura materna. Este 
amor tem um aspecto incestuoso, produzindo ansiedade e culpa, o que poderá se manifestar 
de uma forma sublimada, através de um grande interesse em aprender, ou, ao contrário, por 
um desinteresse pela matéria. Algumas dificuldades escolares na adolescência se 
assemelham a situações desse tipo. É interessante lembrar também, que trabalhar com 
adolescentes, como já vimos, desperta o adolescente que existe nos adultos, e isto, nos 
professores, poderá desenvolver distintos sentimentos por um determinado adolescente que 
lhe evoque as situações de vida de sua própria adolescência. 
O que confere à escola importância vital no processo de desenvolvimento do adolescente é 
o fato dela ter a características de ser uma simulação davida, na qual existem regras a 
serem seguidas, mas que se pode transgredi-las sem sofrer as conseqüências, impostas pela 
sociedade, e ser esta uma oportunidade de aprender com a transgressão. 
Deve-se levar em conta, também, que a relação do aluno com a escola é afetada pela 
significação que os pais dão a ela, aos estudos de seu filho e às relações dele com os demais 
alunos. Pais que tenham sido submetidos a uma escolarização muito rígida podem, 
inconscientemente, buscar uma escola permissiva que “compense” a sua vivência escolar 
de sofrimento. Podem, por outro lado, fazer com que seus filhos sofram tanto quanto eles e 
“passem” por tal situação para poderem se tornar “tão educados” quanto eles. 
O desejo de saber e obter prazer pelo saber certamente está mediatizado em primeiro lugar 
pelos pais e, depois, mais tarde, pelos professores e pela escola. Um pode compensar o 
outro, ou até anular seus efeitos. 
A escola não oportuniza somente a relação com o saber e, como uma atividade 
eminentemente grupal, tem também funções de socialização. Em busca de sua identidade, o 
adolescente encontra na micro-sociedade da escola um sistema de forças que atuam sobre 
ele, onde, entre outras coisas, reedita seu ciúme fraterno, compete, divide, rivaliza, oprime e 
é oprimido, ou seja, reproduz o sistema social. É por esta razão que a escola, muitas vezes, 
pode detectar dificuldades no processo de desenvolvimento do aluno, que aparece por 
inteiro na busca de si mesmo, e seu olhar sobre ele é, em geral, menos comprometido 
emocionalmente do que acontece com os pais. 
Podemos dizer, “brincando”, que, se ser adolescente é “difícil”, ser um adulto em contato 
com ele é duplamente “difícil”: primeiro porque temos de lidar com o adolescente “de 
 9 
fora”, externo, real, e depois com o adolescente “de dentro”. Novamente, enfatizamos a 
importância de que o adulto que está em contato com o adolescente (pais, professores, etc.) 
tenha uma “visão binocular”, de dentro e de fora, do adolescente real e das “memórias 
adolescentes”, carregadas ainda de impulsos, fantasias, desejos, emoções, etc., não como 
algo indesejável, mas como demonstração de vida. 
É muito importante também, que exista (se podemos chamar desta forma...) uma “relação 
de confiança” entre a família e a escola escolhida, evidentemente, pelos pais para educar 
seus filhos, isto é, para que os “auxilie” a educar seus filhos. Vemos, com freqüência, os 
pais criticarem a filosofia pedagógica da escola escolhida na presença dos filhos, de uma 
forma que predispõe o adolescente contra a escola. Evidentemente, críticas existirão de 
parte a parte, mas elas deverão ser tratadas nos “canais de comunicação” adequados 
existentes (ou serem criados) ligando o binômio família-escola. 
É extremamente necessário que se evitem dissociações (tão freqüentes...) em que os pais 
criticam a escola (projetando na instituição todos os aspectos negativos do processo ensino-
aprendizagem e, por vezes, da conduta dos filhos) e que a escola, por sua vez, faça o 
mesmo (projetando na família todas as incompetências, falta de colocação de limites, falta 
de participação, etc.) . A criação de uma “comunidade realmente operante” poderá tornar a 
relação família-escola mais integrada e com menos “distorção e ruído” na comunicação. 
Convenhamos que os adolescentes são, em algumas situações, hábeis em promover 
dissociações entre, por exemplo, pai e mãe, entre família e escola, etc. 
A família e a escola deverão compreender que, eventualmente, é melhor uma “troca” de 
escola do que submeter o adolescente a um ambiente que não lhe é adequado e, para isto, é 
necessário, às vezes, experimentar mais de uma instituição. Não basta que a escola tenha 
sido aquela que o pai e a mãe cursaram, ou que os pais “imaginaram” que tenha “a melhor 
proposta pedagógica”. É necessário encontrar uma instituição escolar que se aproxime do 
adolescente (e sua família). Esta escola não precisará, inclusive, reproduzir os “valores 
familiares”, propiciando, desta forma, outros modelos identificatórios para o adolescente, 
que assim, terá mais elementos para construir sua “identidade”. É imprescindível, 
entretanto, que a família e a escola saibam que estão “compartindo” esta experiência. 
Para terminar este capítulo, quero fazer alguns comentários sobre a questão da vocação e da 
escolha profissional. 
 10 
Vocação diz respeito a características e habilidades inatas que apresentamos desde muito 
cedo e tem relação com aspectos (impulsos, fantasias, etc.) de nossa personalidade. 
A escolha profissional, entretanto, diz respeito a uma situação que envolve, além da própria 
pessoa, a circunstância social, como, por exemplo, o mercado de trabalho. Assim, poderá 
ocorrer, muitas vezes, que um adolescente que revelava uma “certa vocação” terá que fazer 
uma escolha profissional, mais ou menos, distante de sua tendência. Este momento, na 
verdade um longo e penoso processo, é muito importante na vida dos indivíduos, e se 
constitui em uma das tarefas principais das etapas finais da adolescência. Em um país como 
o Brasil, onde o mercado de trabalho é restrito e/ou tem uma remuneração inadequada, mais 
uma vez, o jovem tem de lidar com uma realidade, com freqüência, adversa. 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
. 
FREUD, Anna. Introduccion al psicanalisis para educadores. 4 ed., Buenos Aires: 
Paidós. Biblioteca do Educador Contemporâneo. 1961. 
FREUD, A . Introduccion al Psicanalisis para educadores, 5. Ed., Argentina: Editora Paidós, 1966. 
KUPFER, M. C. Freud e a educação, o mestre do impossível. São Paulo: Ed. Scipione, 1989 
 
 
 
 
 
 
 
 11 
CAPITULO 2 
 
O TRABALHO COM GRUPOS NA ESCOLA 
José Outeiral 
 
“Educar, ao lado de governar e psicanalisar, é uma profissão impossível.” 
Sigmund Freud (1937) 
 
 
 Acredito que são duas as contribuições principais que o psicanalista e o terapeuta de 
grupo podem dar à instituição escolar: (1) a primeira é referente ao conhecimento 
psicanalítico como uma teoria do desenvolvimento e do funcionamento da mente humana, 
e a (2) segunda está ligada ao conhecimento da dinâmica grupal que se estabelece entre a 
família, a escola e a sociedade. Na escola, a instrumentação para o trabalho grupal entre as 
variadas combinações possíveis podem ser tais como: grupos de alunos, de professores, de 
pais. 
 O relato que passo a apresentar resulta de minha experiência no trabalho com 
comunidades escolares e como psicanalista e terapeuta de grupo. 
 
UMA VISÃO GERAL 
 
 A escola tem, como sabemos, ao nível consciente, um papel primordial para a 
criança e o adolescente. Conforme o ambiente que lhes é oferecido (e suas potencialidades), 
teremos um aprendizado propício e prazeroso ou, então, distúrbios de conduta e/ou 
aprendizagem. A função da escola é educar, isto é, conforme o significado etimológico da 
palavra, “colocar para fora” o potencial do indivíduo, ao contrário de ensinar, que é 
in+signo, ou seja “colocar signos para dentro” do indivíduo. Como foi exposto no capítulo 
anterior, quando a criança (ou adolescente) chega na escola, ela traz seus aspectos 
constitucionais e suas vivências familiares, mas o ambiente escolar será também uma peça 
fundamental em seu desenvolvimento. Estes três elementos – aspectos constitucionais, 
vínculos familiares e ambiente escolar – constituirão o tripé do processo educacional. 
 12 
 Mas qual a escola? Essa é uma pergunta que os pais se fazem com freqüência e que 
é extremamente necessária, pois uma criança ou um adolescente (e, inclusive seus pais) 
poderá ou não se adaptar em um determinado ambiente escolar. As escolas são instituições 
com “culturas” próprias e singulares(Cultura de Grupo; Bion, 1963) e que terão 
significados diferentes para diferentes alunos. A escola, a sala de aula, é um lugar 
“imaginário”, “mais além” do espaço real de cadeiras, classes e salas. Ela é o que o aluno 
percebe a partir de sua história, seus desejos e seus medos. Na escola acontece um interjogo 
de forças inconscientes que se cruzam, opõem-se, conflitam-se ou se reforçam, através de 
situações manifestas, claras e evidentes, ou de um sutil operar oculto, latente, e, nem por 
isso, menos importante. Cria-se, então, na escola, uma dinâmica grupal que precisa ser 
compreendida, e nesse ambiente, a presença de profissionais com treinamento para o 
trabalho com grupos é muito importante. 
 Algumas escolas têm seu processo educacional mais dirigido, com limites mais 
estreitos, ao contrário de outras, mais abertas e mais liberais. Um adolescente, por exemplo, 
com dificuldades de organização poderá se beneficiar (ou não) de um ambiente escolar 
mais estruturado e de limites mais precisos, sendo necessário avaliar, em cada caso, a 
situação, buscando conhecer como funciona determinada escola. As simplificações do tipo 
“meu filho é tímido, portanto, precisa de uma escola mais liberal” ou “como ele não tem 
limites, uma escola mais rígida irá ajudá-lo” não são sempre verdadeiras. O “óbvio 
ululante” , no sentido que usa Nelson Rodrigues – nosso cronista do dia-a-dia – de que cada 
criança e adolescente e cada escola têm peculiaridades próprias é fundamental. As escolas, 
por seu lado, têm o que chamamos de um “currículo manifesto” e um “currículo oculto”, ou 
seja, aquilo que manifestamente é dito e/ou escrito e a verdadeira prática no cotidiano da 
sala de aula. É importante, também, que pais e professores saibam, dentro de uma visão 
de dinâmica de grupo, que estes últimos serão os “recipientes” de impulsos, ansiedades, 
fantasias, emoções, paixões e pensamentos, mais ou menos conscientes, que crianças e 
adolescentes têm em relação a seus próprios pais. Amor e agressividade originalmente 
dirigidos aos pais serão “transferidos”, (ou projetados) para os professores. Poderá, por 
exemplo, acontecer que um adolescente irritado com seus pais tenha com estes uma atitude 
aparentemente “adequada” extravasando com um professor toda a “ bronca” com pai e a 
mãe. O professor ficará surpreso com a atitude do aluno, mas sua experiência e intuição lhe 
 13 
farão perceber que “algo se passa...” de diferente. Poderá acontecer também,, tomando o 
exemplo anterior, que o adolescente não demonstre explicitamente a irritação dirigida aos 
pais com o professor e que a conduta negativa venha na forma de um baixo rendimento 
escolar. E não serão apenas os sentimentos agressivos que serão “transferidos desse modo”, 
os amorosos também. Os professores são muitas vezes os primeiros objetos – após os pais – 
de “amor edípico”, ocorrendo uma “transferência” amorosa. Por exemplo, um menino pode 
transferir o amor que sente pela mãe para uma determinada professora, por esta lembrar-
lhe, consciente ou inconscientemente a figura materna. Esse amor tem um aspecto 
incestuoso, produzindo ansiedade e culpa, o que poderá se manifestar de uma forma 
sublimada, através de um grande interesse em aprender ou, ao contrário, por um 
desinteresse pela matéria. Algumas dificuldades escolares se organizam em torno de 
problemas desse tipo. É interessante também lembrar que trabalhar com crianças e 
adolescentes desperta aspectos infantis e adolescentes nos adultos, e isto, nos professores, 
poderá desenvolver distintos sentimentos por uma determinada criança ou adolescente que 
lhe evoque sua próprias situações de vida nestas etapas do desenvolvimento. 
 A escola não oportuniza somente a relação com o saber e, como uma atividade 
eminentemente grupal, também tem funções de sociabilização. Em busca de sua identidade 
o jovem encontra na micro-sociedade que é a escola um sistema de forças que atuam sobre 
ele: entre outras coisas, reedita seu ciúme fraterno, compete, divide, ou seja, exercita o 
viver em grupo. 
 
 
 
UMA COMPREENSÃO INTERSISTÊMICA 
 
Como compreensão intersistêmica me refiro a um triângulo que tem, como é evidente , uma 
interação muito dinâmica entre seus vértices: a família, a escola e a sociedade. Uma visão 
que privilegie este enfoque é essencial para que o trabalho com um sistema educacional 
seja efetivo. Uma outra visão, digamos espacial, para transmitir a minha idéia, é considerar 
a escola como no meio do caminho entre a família e a sociedade: quase um “espaço” de 
transicionalidade ( Winnicott, 1975): não é mais o conhecido e protegido “espaço familiar” 
 14 
e tampouco o tão temido e desejado “mundo adulto”. Assim, a escola é o locus onde a 
criança e adolescente exercitam seus passos em direção a independência, à individualização 
e à separação do seu grupo original. Pensando dessa forma, é necessário considerar que a 
escola sofre importantes pressões, mais ou menos manifestas, às vezes diretamente e outras 
vezes de forma indireta, em algumas situações em nível consciente e em muitas outras 
inconscientemente, tanto por parte da família como pelo lado da sociedade. Defrontamo-
nos, então, com uma tarefa – a educação - complexa e difícil, e ao mesmo tempo sedutora e 
gratificante, o que levou S. Freud, a considerá-la como “impossível”. 
 
Parodiando S. Freud, quando ele se referiu à mulher, quero formular duas perguntas – “O 
que quer a família?” e “O que quer a sociedade?”- para que possamos compreender o que a 
família e a sociedade esperam da escola. 
 
O que quer a família? 
 
Inicialmente, é necessário dizer que não existe um “modelo” de família, mas sim uma 
diversidade de modelos familiares, com muitos traços em comum entre si, mas com uma 
infinidade de singularidades. É possível se pensar que cada família tem uma identidade 
própria e, como tal, fantasias, situações traumáticas, perdas, mitos familiares, segredos e 
uma historia. Trata-se, na verdade, de um agrupamento humano em constante evolução, 
constituído com um intuito básico de prover a subsistência de seus integrantes e protegê-
los. É dessa maneira palco dos “dramas” de nossa espécie: amor, ódio, ciúme e inveja, entre 
outros sentimentos mais ou menos confessáveis, que estão presentes no quotidiano deste 
agrupamento especial. O que S. Freud descreve em Totem e tabu, ao falar da horda 
primitiva, pode ser observado, tal como eu penso, com facilidade nas famílias; quero frisar, 
entretanto, que escrevo sobre as “famílias comuns”. Os mecanismos que operam nos grupos 
são, evidentemente, observados na dinâmica grupal da família, com o fato de que ali os 
laços de dependência são fundamentais, e o convívio de seus integrantes é constante e 
permanente, o que propicia que se revelem estados mentais primitivos (como testemunho 
disso, podemos observar como as violências físicas e psíquicas contra crianças ocorrem, 
com freqüência, dentro da própria família). Em relação aos filhos e às expectativas quanto à 
 15 
escola, encontramos várias fantasias familiares, das quais enumerarei apenas duas delas: (a) 
o desejo de que a instituição escolar “eduque” o filho naquilo que a família não se julga 
capaz, como, por exemplo, em relação a limites e sexualidade, e (b) que ele seja preparado 
para o ingresso na universidade e para obter um êxito profissional e financeiro. A escolha 
da escola pela família, assim, é um ponto que requer avaliação para que se possa entender o 
que levou a tal decisão, quais as fantasias e expectativas, se considerarmos que cada 
instituição, bem como as famílias, têm também suas características e peculiaridades, 
algumas têm um sistema mais “rígido” e outras são mais “flexíveis”, determinadasescolas 
são ligadas a grupos étnicos ou religiosos e isso determina uma história, uma maneira de 
“ser”, enfim, uma identidade. Algumas terão uma perspectiva mais “humanista” e outras 
serão mais “técnicas” e há as que ainda estão passando por transformações, pois – assim 
como todas as instituições – elas têm um “ciclo vital”. A família precisa saber por que 
optou por esta ou aquela escola, o que torna necessário conhecer a instituição tanto quanto 
possível. As escolas não são organizadas para receber “qualquer criança”, assim como as 
crianças não necessitam se adaptar a “qualquer escola”. 
 
O que quer a sociedade? 
A sociedade procura ter na escola uma instituição normativa que trate de transmitir a 
cultura, incluindo aí, não apenas conteúdos acadêmicos, mas, e principalmente, seus 
elementos éticos e estruturais. O currículo é construído em função desses fatores, de uma 
forma manifesta (ou explicita, escrita em seus estatutos) ou latente (no dia-a-dia). Se, de 
alguma maneira, a escola “colide” com as pretensões da sociedade, esta trata de submetê-la 
a seus objetivos, das mais diversas maneiras. Podemos pensar, por exemplo, sobre a 
situação do ensino público e refletir sobre este tema. 
 
 A DINÂMICA DE GRUPO NA ESCOLA 
 
Podemos pensar, de uma maneira metodológica, que existirão três maneiras de operar com 
grupos na escola: grupos de alunos, grupos de professores e grupos com pais. É certamente 
possível fazermos diversas outras combinações, mas é sobre as referidas que vou comentar, 
por serem as mais freqüentes. As ansiedades, as fantasias e as defesas serão as que 
 16 
encontramos na dinâmica dos grupos em geral e que, em minha maneira de pensar, são 
melhor trabalhadas dentro dos conceitos de grupo desenvolvido por W. Bion (1970). É 
fundamental que conheçamos os mecanismos dos grupos de trabalho, grupos de 
dependência, grupos de luta-e-fuga e grupos de acasalamento, tais como nos aporta este 
autor. 
 
GRUPOS COM ALUNOS 
 
Atividades de grupo com alunos são fundamentais para uma “vida escolar” eficiente. Esses 
grupos, tais como eu tenho acompanhado, são realizados semanal ou quinzenalmente (com 
um total ótimo de não mais de 15 alunos), com as turmas divididas em dois grupos, por um 
ou dois períodos escolares, coordenados – em geral – por um orientador escolar, seguindo a 
idéia geral de grupos operativos (Zimmermann, 1969). Estes grupos são centrados 
essencialmente em uma ou mais tarefas, tais como, por exemplo, os relacionamentos dentro 
de uma sala de aula ou no manejo de situações ligadas a limites ou sexualidade, que em 
minha maneira de ver são as “demandas” mais freqüentes. Passarei a relatar alguns 
exemplos clínicos de situações. 
 
 
O final do curso 
 
Em uma escola (como acontece em quase todas) as turmas do terceiro ano do Ensino Médio 
apresentavam uma conduta agressiva entre os próprios alunos e com os professores e no 
“último dia de aula” (como já vinha acontecendo nos últimos meses...) criavam situações 
difíceis, depredando a escola e causando tumultos na rua, o que tornava necessário chamar 
não só os pais, mas inclusive a policia e “punir” exemplarmente alguns alunos. Foram então 
realizadas reuniões com professores, ficando evidentes os seguintes aspectos: (a) que essas 
“atuações” diziam respeito à dificuldade dos alunos de se separarem da escola ao final do 
curso, refletindo assim uma dificuldade também com o processo de separação-individuação 
em relação a seus próprios grupos familiares, uma das tarefas centrais da adolescência 
(Outeiral, 1994), e (b) que os professores também tinham dificuldades em se separar dos 
 17 
seus alunos, com os quais estavam em contato, muitas vezes desde a infância e que, de 
forma inconsciente, também “atuavam” não conversando (não preparando) com os alunos 
sobre isso, mas apresentando uma descrição “trágica” do mundo fora da escola ( “vestibular 
muito difícil”, “perspectivas profissionais péssimas”, etc. ...só para citar algumas). Não 
surpreendia assim que os alunos expressassem suas ansiedades e fantasias de uma maneira 
manifesta com agressividade, bem como as de seus professores, que de uma maneira 
inconsciente as projetavam neles e os faziam “atuar”, atacando a instituição e assim 
negando a dor psíquica e a depressão de ter de se afastar de um local onde tinham tantas 
ligações. Trabalhou-se, então, com alunos e professores em torno deste tema: (a) da 
ansiedade de separação como fenômeno presente e fundamental de experiência humana; (b) 
da “atuação agressiva” como negação dos sentimentos relacionados com a ansiedade de 
separação (se denegrimos o objeto ao qual estamos ligados, sofremos menos com a 
separação); e (c) como os fenômenos mentais observados eram comuns a alunos e 
professores. A estratégia utilizada foi trabalhar em grupos com alunos, professores e pais. 
Com os alunos, a partir do segundo semestre do último ano (nas reuniões, o tema 
“separação” era trazido e discutido tanto no que dizia respeito à escola como à família), 
com os professores (examinado como sentiam a saída dos alunos e como os “assuntavam”, 
bem como fantasias e realidades deles próprios – em suas adolescências inclusive – 
relacionadas a essa questão) e com os pais (sobre como enfrentaram os processos de 
separação) em reuniões mais espaçadas. O discutir e compreender os fatos, nos diferentes 
níveis (ansiedades, mecanismos de defesa, momentos evolutivos, funcionamento consciente 
e inconsciente, dinâmica de grupo, etc.), auxiliou todos – alunos, professores e famílias – e 
diminuiu em muito “o terror dos últimos dias de aula”, que foi substituído por excursões, 
torneiros esportivos, apresentações teatrais sobre o tema, convite a profissionais para 
falarem sobre sua profissões e o mercado de trabalho, etc. 
 
 
Uma vinheta de um grupo operativo com adolescentes 
 
 18 
Estão reunidos cerca de 15 adolescentes, rapazes e moças, de uma mesma série com idades 
entre 15 e 16 anos. O grupo é realizado por uma orientadora educacional a cada 15 dias e 
tem a duração de 50 minutos, tempo que representa a duração de uma aula. 
 O clima é de risos, alguma coisa escondida é passada de mão em mão. A 
orientadora intervém, perguntando o que se passa. Os adolescentes seguem rindo, como se 
compartissem um segredo entre eles, com a orientadora “ficando de fora”. 
 
Orientadora: “penso que vocês querem me manter de fora... Talvez esteja ocorrendo algo 
como em casa, ou seja, vocês necessitam manter algo „escondido‟ dos pais...” 
Aluno: “Não é nada... é só uma brincadeira... quem sabe a professora tenta adivinhar o que 
é?” 
Os alunos começam novamente a rir. Dois ou três deles pedem silencio e tentam “cessar a 
bagunça”. A orientadora percebe que uma parte do grupo começa a se ocupar com a 
realização da “tarefa”. 
Orientadora: “Parece que começa a haver, por parte da turma, um interesse pelo que nos 
reúne aqui...” 
Ela não faz sua intervenção se referindo a “alguns” alunos, mas trata de estendê-la a todo o 
grupo, tomando a manifestação de alguns alunos como uma expressão de toda a turma. Os 
alunos diminuem a “bagunça” e se mostram mais atentos: começa a se estabelecer um nível 
mais integrado de funcionamento. 
Um dos alunos: “Ei! Vamos calar a boca! Vamos terminar com essa esculhambação!” 
A orientadora pensa que começa a surgir um movimento em torno de um líder autocrático 
(“superegóico”, associa...), mas é rapidamente interrompida em seus pensamentos. 
O mesmo aluno de antes: “Vamos organizar as coisas! O assunto é se podemos ou não 
fazer provas com consulta... porque algumas disciplinas permitem e outras não...” 
Os alunos agora estão (relativamente...) quietos e pararam de passarentre si uma camisinha 
(preservativo), que havia sido distribuída a um deles como divulgação de uma campanha 
contra a AIDS. A orientadora percebe que o tema da sexualidade, que causava a “bagunça 
anterior”, ficou deixado de lado, embora seja o verdadeiro “emergente grupal”. Ela associa 
que “deixar ou não deixar”, proibir ou não proibir, tem mais a ver com o tema da 
 19 
camisinha/sexualidade do que o de poder-fazer-prova-com-consulta-ou-não. Evita 
interpretar neste momento, resolvendo aguardar a evolução do grupo. 
Vários alunos falando ao mesmo tempo: “É absurdo, ou deixam ou não deixam ! Uau, 
vamos resolver isto agora! Ë impossível fazer provas sem consulta! Esta é uma escola 
moderna ou não!” 
O “líder autocrático” (agora com mais seguidores): “Vamos ficar quietos! Em ordem!”. 
A orientadora até este momento havia “deixado” seguir o grupo, intervindo pouco. Percebe 
que é necessário, agora, contribuir para a “organização”. 
Orientadora: “Vamos objetivar! Ficamos hoje de conversar sobre haver ou não consulta na 
prova, este é o nosso tema! Vamos fazer uma agenda e anotar os nomes de quem quiser 
falar! Por ordem! Quem quer anotar os nomes?” 
O “líder autocrático”: “Eu inscrevo quem quiser falar!” 
Vários alunos levantam o dedo e são agendados. A orientadora percebe que o grupo estava 
mais integrado. O “líder autocrático”, percebido também como um emergente grupal, 
estava agora “mais democrático”. A dinâmica do grupo se encaminhava para a de “um 
grupo de trabalho” (Work Group; Bion, 1961). Ocorre à orientadora que, em sua 
experiência, os grupos de adolescentes, em todas as reuniões, passavam por um período 
inicial de desorganização, que ela associou de várias maneiras: buscam investigar os 
“limites” do grupo; precisam de um período de hesitação inicial (period of hesitation; 
Winnicott, 1975), como descreve Donald Winnicott no Jogo da Espátula; que no inicio 
predomina sempre um grupo de luta-e-fuga (Basic Assumption: Fight-flight; Bion, 1961). A 
orientadora começa a “compreender teoricamente” o funcionamento grupal e a pensar na 
organização deste material para levar para supervisão. Percebe, entretanto, que agora é ela, 
em seu “devaneio teórico” que “ataca a tarefa” e volta para agenda... 
 
Uma menina que era chamada de “galinha” pelos colegas... 
 
Um grupo de adolescentes de 10 a 12 anos, mostrava-se agitado, com agressões e baixo 
rendimento escolar. A “bagunça” estendia-se a todos os momentos em que estavam na 
escola. Um professor observou que brincavam aos empurrões e lhe pareceu que, assim, 
buscavam um contato físico entre si. Essa observação cuidadosa e oportuna fez com que o 
 20 
Serviço de Orientação Educacional reunisse o grupo para “conversar” sobre o que estava 
acontecendo. Os assuntos trazidos evidenciaram que a puberdade e a adolescência inicial 
estavam produzindo toda a “turbulência” e que os mais “agitados” estavam, realmente, 
mais “excitados”: davam “puxões” e “empurrões”, faziam freqüentes reuniões dançantes e 
chamavam de “galinha” uma menina que, precocemente, apresentava os primeiros sinais de 
puberdade e que, com suas características sexuais secundárias, provocava ansiedade na 
turma, que tentava, então, “queimá-la” numa “versão púbere” da Inquisição. As reuniões 
com o Serviço de Orientação Educacional ofereceram um “limite”, um espaço e um tempo 
“protegido”, que propiciou substituir a “agitação” pela verbalização dos conflitos. 
 
 
GRUPOS COM PROFESSORES 
 
As atividades de grupo com professores poderão se desenvolver de várias maneiras: com 
professores de uma mesma disciplina, de uma série, com professores de sala de aula e com 
os que estão em atividades de apoio didático e/ou administrativo – são, enfim, variadas as 
possibilidades. O trabalho de consultoria psiquiátrica (Silva, 1980) se constitui também em 
um importante modelo de dinâmica de grupo que pode ser aplicado em uma escola. As 
atividades grupais poderão ser organizadas de uma maneira sistemática (um semestre ou 
um ano letivo) ou em torno de uma tarefa específica (com um número definido de 
reuniões). O ideal é que sejam coordenadas por uma pessoa não diretamente envolvida nas 
situações que serão examinadas e que por este motivo poderá manter uma visão mais 
“neutra”. As resistências do trabalho grupal deverão ser compreendidas, aceitas e, se 
necessário, assinaladas. Essa ressalva é importante porque, muitas vezes, existe uma 
fantasia entre os professores de que são os “mestres” e que “não vão à escola para 
aprender”, “representam o mundo adulto e, por isso, mais maduro, com razão, etc...”, sendo 
difícil aceitar que também eles poderão aprender muito com a escola e, certamente, com os 
adolescentes. O paradoxo da escola é de que lá, onde alguns ensinam a muitos, todos 
aprendem! Para ilustrar, alguns exemplos: 
 
A colocação de limites 
 21 
 
 Certa ocasião, comecei a trabalhar com um grupo de professores, a pedido deles, 
porque estavam com “dificuldades em colocar limites em um grupo de alunos”; estes 
quebravam objetos escolares, jogavam cadeiras pelas janelas e desafiavam os professores. 
Os professores estavam, como diziam, “imobilizados”, sem saber se deveriam tomar 
atitudes “mais firmes e até mais drásticas” ou “ir relevando e tentando conversar” com os 
alunos. Temiam ser tanto “permissivos” como “castradores”, e a situação ia “se 
arrastando...” Iniciamos a trabalhar com essas questões e eu me surpreendia com a 
dificuldade que tinham de colocar limites “na prática” porque “na teoria” sabiam como 
deveriam fazer frente às situações que estavam acontecendo. Era evidente que algo que 
escapava à compreensão do conteúdo manifesto estava ocorrendo, isto é, havia certamente 
elementos inconscientes impedindo uma visualização e uma tomada de posição. Enquanto 
discutíamos e eu não compreendia o que se passava, os professores e funcionários desta 
instituição entravam em greve, protestando “pela má situação salarial”. Ficou evidente, 
então uma irritação importante dos “adultos” com a instituição, irritação essa que ainda não 
havia surgido nas reuniões. Seguimos trabalhando, mesmo no período de greve, por 
insistência dos professores, que queriam saber o que fazer com os alunos quando 
retornassem. O trabalho em grupo possibilitou, entretanto, compreender o que acontecia. 
Ficou evidente para os professores que suas dificuldades em pôr limites deviam-se ao fato 
de que os alunos tinham atitudes que eles, de maneira inconsciente, estimulavam, 
aprovavam e – de certa maneira – com sua passividade estimulavam; eles, “os adultos”, não 
podiam “atacar” diretamente a instituição, coisa que os alunos faziam por eles... A 
compreensão desses mecanismos permitiu “recuperarem” seu conhecimento pedagógico e 
agir de forma madura e eficaz. 
 
Os “bons” e os “maus” professores 
 
A direção de uma escola havia decidido tomar um atitude com determinados professores 
que estavam tendo “dificuldades” com os alunos, ou seja, não conseguiam colocar limites 
ou, quando o faziam, era de forma “ríspida” e da qual os alunos muito reclamavam. Eram 
tidos pela comunidade escolar como “professores mal-preparados”, na verdade, como 
 22 
“maus professores”. Foram realizadas, então, inicialmente, atividades grupais com a 
direção e com os orientadores educacionais. No trabalho, foi possível constatar que havia 
uma grande dissociação, onde os alunos e parte dos professores (“os bons professores”) 
depositavam em um pequeno grupo (“os maus professores”) todos os aspectos indesejáveis 
e regressivos da comunidade escolar e, assim, estes tornavam-se os “bodes expiatórios”, 
que, como no exemplo bíblico, necessitavam ser “sacrificados” para manter a homeostasedo grupo. Em um segundo momento trabalhamos com o grupo de professores e o grupo de 
alunos. À medida que a dissociação foi sendo elaborada e a questão dos “bodes 
expiatórios” melhor compreendida, estes últimos começaram a se recusar a assumir o papel 
que lhes estava sendo designado, e os aspectos que eram projetados (e assumidos) neles 
começou a ser melhor distribuído entre o grupo; todos tinham problemas em pôr limites. 
Os “bons professores”, na verdade, tratavam de “seduzir” os alunos e assim melhor 
controlá-los, ocultando suas dificuldades. A comunidade escolar funciona também como 
um sistema de vasos comunicantes; a pressão dos alunos, isto é, a necessidade que tinham 
de serem “contidos”, como é natural na adolescência, deslocava-se toda para um grupo de 
professores que tinha, então, de lidar com uma “carga excessiva”. No trabalho com o grupo 
de alunos, estes aspectos também foram examinados e foi interessante observar como eles 
começaram a identificar os elementos “bodes expiatórios”, entre eles. O que inicialmente 
parecia dirigir-se para um ritual de “sacrifício” pôde ser compreendido e possibilitou aos 
diversos grupos uma atitude mais madura e compreensiva. 
 
Alunos desinteressados 
 
 As professoras queixavam-se de que os alunos do turno da noite que trabalhavam 
durante o dia recusavam-se a entrar n sala de aula, e a maioria permanecia nas imediações 
da escola namorando, conversando ou fumando. Na atividade de grupo com os professores 
conversamos sobre o tipo de aluno que freqüentava o turno noturno. Quase todos 
trabalhavam e no serviço eram responsáveis. O que se passava, então, quando estavam na 
escola? Não demorou muito para que se tornasse evidente que o currículo oferecido não 
respondia às necessidades imediatas desses alunos, era pouco motivador e distanciado de 
suas vivências. Mais interessante ainda foi perceber, progressivamente, num trabalho de 
 23 
elaboração grupal, que também os professores estavam identificados “desinteresse” dos 
alunos: sentiam-se desmotivados, pouco valorizados e não remunerados de uma forma 
digna. Ficou claro que se sentiam como adolescentes e, assim, também não procuravam 
respostas mais criativas e currículos mais atualizados. 
 
Os níveis de competência 
 
Em uma determinada situação os professores após conversarem com os pais e instados por 
eles - que reclamavam da “pouca atenção” da escola pela “educação sexual” – começaram 
a se mobilizar, organizar seminários, preparar currículos, convidar profissionais, etc., de 
uma forma, digamos, “excessivamente preocupada e apurada”. Depois de algum tempo, 
começaram a se sentir desestimulados e sem saber como encaminhar, na prática, as 
questões “exigidas” pelos pais. Trabalhando em grupo, fomos percebendo como os pais 
haviam acionado os professores, fazendo-os sentirem-se responsáveis por uma “educação” 
que era, principalmente, encargo da família; os pais evitavam falar com os filhos sobre um 
tema que lhes era difícil e o “passaram” para os professores; estes por sua vez sentiram-se, 
inicialmente, “orgulhosos” da tarefa, mais valorizados como se “soubéssemos mais do que 
os pais”, e excederam a sua competência. A reflexão permitiu compreender que seria mais 
adequado chamar, antes dos adolescentes, os pais, para juntos definirem melhor a tarefa, as 
competências e as formas de encaminhar o trabalho não só da escola , mas também – e 
principalmente – nas casas, entre pais e adolescentes. 
 
Consultoria psiquiátrica 
 
Várias são as possibilidades de trabalho grupal dentro da perspectiva da consultoria 
psiquiátrica (Silva, 1980). Minha experiência com essa atividade compreende um trabalho 
semanal, programado para dois semestres letivos, com grupos de orientadores, em torno de 
7 ou 8 profissionais. Com uma hora de duração em cada encontro. É necessário que seja um 
projeto que tenha uma duração razoável, pois ele tem um objetivo informativo e, em certa 
medida, também formativo, se considerarmos que as próprias vivências do grupo serão 
trabalhadas para desenvolver habilidades nos participantes. A consigna básica é a discussão 
 24 
de situações vividas em sala de aula, trazidas a critério dos orientadores. As principais 
questões diziam respeito às dificuldades de um determinado aluno e de manejo de situações 
de grupo em sala de aula. Quando, por exemplo, era trazido “um aluno” para discussão, 
buscava-se ter uma visão global da dificuldade, momento evolutivo, situação familiar, 
atitude dos colegas e professores, etc., estabelecendo-se uma reflexão entre todo o grupo; 
algumas vezes se compreendia a “sintomatologia” como uma expressão do momento 
evolutivo da criança; em outras ocasiões, como um “emergente grupal” (como um “bode 
expiatório”) ou, ainda, como alguém que necessitava de ajuda especializada, discutindo-se, 
então, o encaminhamento, entre muitas outras experiências. O grupo de orientadores 
desenvolveu uma habilidade crescente em relação a estes elementos e ao seu próprio 
funcionamento como grupo e, a partir disso, a aplicação deste conhecimento na dinâmica 
grupal da sala de aula. Nas discussões, para exemplificar, alguns se mostravam mais rígidos 
e “punitivos”; outros, condescendentes e “maleáveis”, o que oportunizava discutir os 
mecanismos de cisão, identificação projetiva e introjetiva, etc. Considero este tipo de 
atividade uma das mais importantes no trabalho com grupos de professores. 
 
GRUPOS COM PAIS 
 
Os grupos com pais poderão, também, ser de diversos tipos: 
 Grandes grupos, com um tema geral para ser discutido, escolhido pelos pais e 
com a ajuda de profissionais. Inicialmente, todos assistirão a uma exposição, 
depois serão feitos pequenos grupos para reflexão e discussão sobre o tema (com 
um secretário anotando as principais questões) e, ao final, haverá um retorno ao 
trabalho em grande grupo, com uma breve exposição do secretário de cada 
pequeno grupo e o coordenador fazendo uma síntese. 
 Pequenos grupos para discussão de determinados temas ou situações específicas 
sugeridos pelos próprios pais e/ou pela escola, com uma freqüência combinada, 
como, por exemplo, uma reunião semanal ou quinzenal, de uma ou uma hora e 
meia de duração, por período de alguns meses. 
 Grupos de pais e professores (e, eventualmente, alunos) reunidos em conjunto, 
para discutir questões comuns na comunidade escolar. 
 25 
 
Exemplos 
 
Drogas e sexualidade 
 
 Um assunto que surge, amiúde, como demanda de informação por parte dos pais é 
“drogas”. Evidentemente, esse é um assunto muito importante, porém é significativa a 
freqüência com que surge como tentativa de encobrir outras questões mais comuns, como a 
“sexualidade”, pelas quais todos passam, o que não acontece com drogas, e sobre a qual é 
muito mais difícil falar. Ter um “posicionamento” sobre “drogas” é fácil, mas sobre 
“sexualidade” é bem mais difícil. Certa ocasião, uma escola religiosa, que até há poucos 
anos havia sido exclusivamente feminina, organizou um programa chamado de 
“Adolescência hoje”, incluindo toda a comunidade escolar. Ocorreram situações grupais 
muito interessantes, algumas até mesmo cômicas. Em uma reunião de pais, com o auditório 
lotado, antes de iniciar uma conferência sobre o tema “sexualidade na adolescência”, o 
expositor foi até o banheiro. Inadvertidamente, uma religiosa da escola o fechou a chave no 
banheiro, atrasando a reunião por mais de meia hora, com todos procurando o expositor... 
Nesta mesma ocasião, após uma “conferência” com os alunos, alunas em sua maioria, o 
expositor começou a receber perguntas escritas, e a primeira, significativamente, dizia “O 
problema desta escola não é drogas é sexo...”, que ao serlida causou muito riso em todos. 
Estes episódios, de conteúdo maníaco pelas reações que produziram, permitiram trabalhar e 
entender que a demanda verdadeiramente necessária da escola era o tema da sexualidade, 
tanto por parte dos adultos como de adolescentes. O programa que havia sido planejado 
passou a incluir então este tema tão emergente e difícil de ser abordado. O episódio do 
banheiro foi tomado não como uma simples anedótica casualidade, mas como uma 
expressão de emergente grupal, assim como a pergunta-afirmação de uma aluna também foi 
compreendida desta forma. Tais fatos foram percebidos como “comunicações” de toda a 
comunidade e utilizados para o entendimento da situação. 
 
Trabalhando com o tema da identidade em uma “escola de comunidade” 
 26 
 
Em uma “escola de comunidade”, isto é, ligada a uma comunidade religiosa e cultural foi 
feito um trabalho, com pais e professores cujo tema era “Identidade e Juventude”. 
Inicialmente, foi feito com um grupo de representantes dos pais, professores e um líder 
religioso um levantamento de temas que lhes pareciam importantes para essa questão: o 
ritual de iniciação dos jovens e um tema religioso sobre a morte. Surgiram, em torno desses 
dois temas, variados elementos, como peças de teatro, filmes, poesias, contos, desenhos e 
pinturas, etc. Os adultos mostraram-se muito interessados e estimulados na busca desses 
elementos culturais e religiosos, como se a proposta, inicialmente, tendo os jovens como 
pretexto, fosse uma demanda, um desejo deles próprios. Assim, em um primeiro momento, 
trabalhou-se este tema com os adultos da comunidade, pais e professores. A dinâmica de 
grupo utilizada transcorreu da seguinte forma: inicialmente se assistia (ou eram feitas 
leitura coletivas) de contos, poesias, teatro ou cinema sobre os temas; posteriormente, 
organizava-se uma mesa com profissionais de diversas áreas (literatura, psicanálise, 
religião, etc.) para apresentação dos temas conforme a “ótica” de cada um e, após, o 
“grande grupo” era dividido, as apresentações comentadas e finalmente o “grande grupo” 
se reunia novamente para discussão. O importante, nesse trabalho, além da dinâmica 
utilizada, foi compreender que a sugestão feita pelos alunos era importante para eles, 
desejosos de trabalharem “suas raízes” e sua identidade religiosa e cultural. Tal experiência 
produziu alguns textos que, desdobrados, hoje servem aos mesmos objetivos em outras 
localidades e novos elementos culturais foram incorporados e, mesmo encontrados após 
pesquisas. 
 
A utilização do teatro como “mote” para o trabalho grupal com pais 
 
 Uma experiência interessante é a utilização de pequenos “esquetes”, escritos pelos 
próprios alunos e/ou professores (Berlim, 1996), sobre temas de interesse levantados pelos 
pais. Esses esquetes são apresentados pelos alunos e, depois, são discutidos entre os pais 
com a coordenação de um orientador (ou profissional da área convidado). O teatro produz 
um “impacto mobilizador” entre os participantes que é muito produtivo. 
 
 27 
ELEMENTOS BÁSICOS DA DINÂMICA DE GRUPO NA ESCOLA 
 
 Esclarecendo meus marcos referenciais teóricos e clínicos básicos, quero fazer 
referência a alguns textos que considero fundamentais: inicialmente a dois livros de 
Sigmund Freud, Totem e tabu (1913) e Psicologia de grupo e análise do ego (1921); ao 
clássico texto de Bion, Experiências com grupos; ao livro de David Zimerman, Estudo 
sobre psicoterapia analítica de grupo (1969) ; ao livro de Luiz Carlos Osório e 
colaboradores, Grupoterapia hoje (1986); ao de David Zimerman, Fundamentos básicos 
das grupoterapias ( Zimerman, 1993) e, last but not least, os trabalhos Os sistemas sociais 
como defesa contra as ansiedades persecutória e depressiva, de Elliott Jaques, e O 
funcionamento dos sistemas sociais como defesa contra ansiedade, de Isabel Menzies 
(1969). Acredito que esses livros e trabalhos serão de ajuda aos profissionais que 
desenvolverem sua prática clínica nas escolas, e como eles quero compartir essas 
referências que me foram úteis. Caso seja possível fazer uma síntese sobre a dinâmica de 
grupo na escola (ou qualquer outra estrutura social), sugiro que imaginemos o seguinte 
“esboço”: 
 O grupo, evidentemente composto por indivíduos, funciona como se fosse uma 
unidade, e seus componentes representam aspectos desta “unidade-formada-por-
partes”; a manifestação de um dos membros é tomada (embora nem sempre) 
como um emergente de todo o grupo; 
 A integração grupal permite aflorar (e, inclusive, produz) diversas ansiedades e 
fantasias que determinam mecanismos de defesa do grupo e, por fim, a forma de 
funcionamento mais ou menos integrada deste grupo; 
 As necessidades predominantes serão do tipo confusional, paranóica e 
depressiva, e os mecanismos de defesa mais observáveis (relacionados às 
fantasias e ansiedades anteriormente descritas) são, principalmente, a cisão, a 
identificação, a identificação projetiva e introjetiva e os mecanismos maníacos e 
de reparação (Segal, 1964; Winnicott, 1935); 
 Estes processos de funcionamento grupal determinam o surgimento de papéis no 
grupo (“bode expiatório”, “bom aluno” ou “bom professor”, “mau aluno” ou 
“mau professor”, “profeta”, etc.) que, quanto mais “fixos”, mais representam 
 28 
uma atitude regressiva do grupo comum como um “todo” (e, consequentemente, 
quanto mais “saudável” o grupo, mais estes papéis “circulam” entre seus 
membros); 
 O grupo tenderá a funcionar de uma maneira alternada entre o grupo de trabalho 
e os supostos básicos de funcionamento grupal, tal como descritos por Bion 
(1961), como “grupo de dependência”, “grupo de acasalamento” e “grupo de 
luta-e-fuga”. 
 
 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
BERLIM, C. Esquetes. Comunicação pessoal, 1996. 
BION, W. Experiências com grupos: os fundamentos da psicoterapia de grupo. Rio de 
Janeiro: Imago, 1970. 
FREUD, S. Totem e tabu, E.S., vol. XII, 1913. 
FREUD, S. Psicologia de grupo e análise do ego E.S., vol. XVII, 1921 
MENZIES, I.; JAQUES, E. Los sistemas sociales como defensa contra la ansiedad. Buenos 
Aires: Horme, 1969. 
OSORIO, L.C. Grupoterapia hoje. Porto Alegre: Artes Médicas,1986 
OUTEIRAL, J. Bion e os grupos. Trabalho apresentado em reunião clínica, na Sociedade 
Psicanalítica de Pelotas, dez. 1990 12 pp. 
OUTEIRAL, J. Adolescer: Estudos sobre adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986. 
SEGAL, H. Introduction to the Work of Melanie Klein. William Heinemann-Medical Books ltd., 1964. 
SILVA, A .C. Uma experiência de consultoria psiquiátrica em escola com população de 
alunos adolescentes. In: ZIMMERMANN, D. Temas de Psiquiatria. Porto Alegre: Artes 
Médicas, 1980. 
WINNICOTT, D. The maniac defense. In: WINNICOTT, D. Through paeditrics to Psychoanalysis. London: 
The Hogarth Press and the Institute of Psycho-Analysis, 1975 
WINNICOTT, D. The observation of instants in a set situation. In: WINNICOTT, D. Through paediatrics to 
psyco-analysis. London: The Hogarth Press and The Institute of Psyco-Analysis, 1975. 
WINNICOTT, D. Transitional objets and transitional phenomena. In: WINNICOTT, D. 
Through paediatrics to psyco-analisys. London: The Hogart Press and The Institute of 
Psyco-Analysis, 1975. 
ZIMERMAN, D. E. Fundamentos básicos das grupoterapias. Porto Alegre: Artes Médicas, 
1993 
ZIMMERMANN, D. Estudos sobre psicoterapia analítica de grupo. São Paulo: Mestre Jou, 1971. 
 
 
 29 
 CAPITULO 3 
 
VIOLÊNCIA NO CORPO E NA MENTE: CONSEQÜÊNCIAS DA 
REALIDADE BRASILEIRA 
José Outeiral 
 
 “O que viola o outro o corrompe” 
 (Maomé, citadopor Masud Khan) 
 
 
 Como médico, psiquiatra de crianças e adolescentes e psicanalista, meu vértice de 
observação é dado pela teoria e pela clinica psicanalítica. Minha prática é determinada, 
entretanto, pelo trabalho clínico com uma fatia da população adolescente: aqueles que 
possuem um suporte familiar “suficientemente bom”, têm acesso à escola, aos bens e 
valores da sociedade de consumo; enfim adolescentes de nosso estrato social, nossos 
adolescentes – filhos, alunos, pacientes, vizinhos, etc. - os adolescentes que fomos, há não 
muitos anos, e os adolescentes com os quais convivemos hoje. 
 Sobre esses adolescentes – de nossa categoria social, econômica e cultural – muito 
se tem escrito. Tenho, inclusive, alguns textos publicados sobre este tema. Quero avisar ao 
leitor, entretanto, que neste capítulo estou escrevendo sobre adolescentes em relação aos 
quais conheço pouco (e certamente incorrendo nos erros de falar sobre o que não sabemos – 
ou sabemos?), os adolescentes “excluídos” . 
 Na verdade, trabalhei durante algum tempo num programa de Psiquiatria 
Comunitária em uma vila periférica e, depois, com menores no Juizado da Infância e da 
Juventude. Em diferentes ocasiões prestei assessoria à FEBEM e ao município de Porto 
Alegre, no manejo com menores infratores e com crianças e adolescentes em situação de 
rua ou albergados. 
 Na vila pude observar, por exemplo, que as adolescentes iniciavam sua vida genital 
aos 14, 15 anos, com um número significativo delas engravidando e levando a termo ou não 
a gestação, e praticamente todos os adolescentes, rapazes e moças, eram capazes de prover 
parte ou a totalidade do seu sustento. Em uma escola de classe média que estudamos na 
ocasião, a poucos quilômetros da vila, a situação era totalmente diferente: as moças 
 30 
iniciavam sua vida genital aos 16, 17 anos, poucas engravidavam e nenhum dos 
adolescentes trabalhava. 
 Não sei se esta denominação “adolescentes excluídos” é a mais correta ou oportuna, 
mas é certo que ao menos eles são excluídos de nossas discussões e escritos. Quando 
concordamos que adolescência é um fenômeno psicossocial (Outeiral, 1994), 
reconhecemos que existirão aspectos comuns e também específicos, que caracterizarão o 
processo adolescente nos diferentes estratos socioeconômicos e culturais de nossa 
sociedade. 
 Quem são eles – os adolescentes excluídos – e quantos são? As estatísticas são muito 
variáveis: alguns dizem que são cerca de vinte milhões de menores desfavorecidos, sete 
vezes toda a população do Uruguai ou metade de toda a população da Argentina. Outros 
contestarão estas cifras. Mas aí estarão eles: nas ruas, nas estradas, nos campos, nas cidades 
e – de novo – nas ruas, entre os carros, provocando em nós os mais variados sentimentos, 
confessáveis ou não: vergonha, repulsa, culpa, irritação, medo, etc... Melhor seria não vê-
los, não escutá-los, não senti-los: negá-los, denegá-los ou ainda (de maneira pedante) 
podemos dizer Verneinung. 
Laplanche e Pontalis, em seu Dicionário de Psicanálise , definem assim este termo: 
Processo pelo qual o sujeito, embora formulando um dos seus desejos, pensamentos ou 
sentimentos até então recalcados, continua a defender-se deles negando que lhes 
pertençam. 
Muitos poderão ser os aspectos sobre os quais poderemos nos inclinar para observá-los: 
vou comentar apenas alguns deles, convidando o leitor a trazer outros. Vou me restringir ao 
tema: a violência no corpo e na mente do adolescente – conseqüências da realidade 
brasileira. 
 
 
A DURAÇÃO E AS ETAPAS DA ADOLESCÊNCIA 
 
Um dos primeiros elementos a serem considerados envolve o fato de que, empiricamente, 
considero que nos estratos menos favorecidos de nossa sociedade o processo adolescente, 
como tal, é desencadeado mais cedo e é em muitos sentidos, abreviado, sendo a passagem 
 31 
da infância ao mundo adulto bastante rápida. Talvez esteja dizendo algo que pareça óbvio e 
nada original, mas julgo necessário fazer este registro. 
 Podemos observar, com alguma facilidade, uma pseudo-maturidade que se 
estabelece, incluindo neste aspecto padrões verbais aparentemente mais desenvolvidos e 
uma conduta também em aparência mais adulta. Na verdade nos encontramos diante de 
mecanismos defensivos, muitas vezes de sobrevivência do corpo e da mente, em que 
estruturas clínicas como as compreendidas no amplo espectro da Tendência Anti-Social ou 
do tipo Falso Self representam os níveis mais integrados. O conceito de trauma 
acumulativo de Masud Khan também é de utilizade para a compreensão destas situações. 
 
ESTADOS DA MENTE NA ADOLESCÊNCIA 
 
OS EFEITOS TRAUMÁTICOS DA VIOLÊNCIA DA SOCIEDADE 
Donald Winnicott nos auxilia neste campo ao descrever sua experiência clínica, 
particularmente com crianças separadas das mães durante a evacuação de Londres, na 
Segunda Guerra Mundial, com o conceito de Tendência Anti-Social, particularmente ao 
referir-se à importância “dos efeitos da separação e da perda, da destruição e da morte”. 
 
TENDÊNCIA ANTI-SOCIAL 
Em um Simpósio, realizado em 1994, pude comentar aspectos da Tendência Anti-Social, 
tal como a concebeu Donald Winnicott. As apresentações deste encontro estão publicadas 
em um livro editado por David Levisky (Levisky, 1997). O capítulo seguinte deste livro 
abordará esta questão com maior profundidade. 
Donald Winnicott distingue dois aspectos da privação: (1) deprivation a perda do bom 
objeto e a perda do marco confiável dentro do qual a vida instintiva e espontânea da 
criança se sente segura (estado no qual se teve algo bom que foi perdido) e (2) privation um 
estado no qual jamais se teve algo e que resulta em doença mental ou no domínio de uma 
psicose. Assim ele mostrou que a tendência anti-social se articula em um ponto com as 
psicoses e em outro com as neuroses. Estabeleceu, desta maneira, que a experiência de 
privação dificulta à criança alcançar o estágio de reconhecimento e preocupação com o 
outro e um sentido de responsabilidade social dentro do indivíduo. 
 32 
Para este autor, pediatra e psicanalista, os atos anti-sociais dos delinqüentes e dos 
psicopatas mostram sinais de esperança. “A esperança orienta-se a recuperar o que se 
perdeu, ou que isto seja devolvido e que os processos de maturação, que ficaram 
congelados quando da perda, sejam liberados novamente”. Desta forma, Winnicott, 
escreve Clare Winnicott (1989), “explicou ao menos parte da vida afetiva do homem sem 
ter que recorrer a um instinto de morte herdado”. Para ele, o furto, por exemplo, está no 
centro da tendência anti-social, associado à mentira. Na verdade, a criança que furta um 
objeto não está desejando o objeto roubado, mas a mãe, sobre quem ela se julga “com 
direitos”. 
Três são, então, os aspectos básicos da “tendência anti-social” para Donald Winnicott: 
 ele relaciona a tendência anti-social “a uma falha ambiental precoce, 
principalmente a uma falha na função materna”; 
 Distingue dois tipos de reação da criança a estas falhas: (a) quando a privação 
ocorre depois de ter havido uma função materna “suficientemente boa” e por um 
período de tempo suportável, a criança poderá desenvolver a tendência anti-
social” - deprivation; (b) se a privação (privation), ou a falha na função materna, 
ocorrer desde o inicio da vida, poderá se desenvolver uma doença mental grave 
ou uma psicose; 
 Donald Winnicott considera que a “tendência anti-social” comporta um 
sentimento de esperança, o que dá uma configuração clínica muito especial ao 
problema. 
 
 
FALSO-SELF 
A outra questão diz respeito às organizações defensivas do tipo “falso-self”. Esta 
situação resulta de cisões muito primitivas ocorridas no ego, como intuito de proteger o 
“verdadeiro self” das falhas e/ou intrusões ambientais, principalmente na relação com a 
mãe. Este será um tipo de organização que conduzirá, eventualmente, o adolescente a 
um grau razoável de “adaptação social”, embora saibamos que com o tributo da perda 
da espontaneidade e da criatividade. Poderá ocorrer também o desenvolvimento de um 
“falso self” em que o elemento adaptativo se relacionará a estruturas ligadas à 
 33 
transgressão e a espaços sociais marginais: o adolescente se adaptará, dessa maneira, a 
uma “gangue” ou a uma “turma” na qual buscará ser aceito e tratará de se moldar aos 
padrões éticos vigentes nestes grupos. 
 
PATOLOGIA DA TRANSICIONALIDADE 
No simpósio referido antes, estabeleci, seguindo Donald Winnicott e outros autores, a 
relação entre a tendência anti-social e a patologia da transicionalidade. Evidentemente 
as patologias vinculadas a um inexistente (ou insuficientemente desenvolvido) ou com 
um desenvolvimento atípico (“estruturas lacunares” de K. Friedlander) do superego, 
fracasso de uma elaboração edípica e regressão e/ou fixação a elementos pré-gentais 
estarão presentes nestes adolescentes. Esta patologia estrutural, reconhecível em termos 
metapsicológicos, tem também sua representação psíquica nas alterações do self 
decorrentes de falhas nas transicionalidade. Vários autores discorrem sobre estes 
aspectos, bastante conhecidos na bibliografia especializada (Outeiral, 1995). 
 
TRAUMA ACUMULATIVO 
Masud Khan utiliza o conceito de “trauma acumulativo” para descrever situações que, 
penso, se aplicam a esses adolescentes com freqüência. Ele parte da concepção de 
Freud sobre a função da mãe como escudo protetor, desenvolvida em “Além do 
principio do prazer” (1920). Masud Khan escreve ( Khan, 1963): 
Meu argumento é que o trauma acumulativo resulta de fendas observadas 
no papel da mãe como escudo protetor durante todo o curso de 
desenvolvimento, desde a infância até a adolescência – isto é, em todas as 
áreas da experiência onde a criança precisa da mãe como um ego auxiliar 
para sustentar suas funções do ego, ainda imaturas e instáveis... O trauma 
acumulativo procede, portanto, das tensões que uma criança experimenta no 
contexto da sua dependência de ego em relação à mãe como seu escudo 
protetor e ego auxiliar... Nesse contexto, seria mais exato dizer que estas 
fendas, repetidas no correr do tempo e entremeadas no processo de 
desenvolvimento se acumulam de forma silenciosa s invisível. Daí a 
dificuldade e identificá-los clinicamente na infância. Pouco a pouco vão se 
fixando até formarem os traços específicos de determinadas estruturas de 
caráter (Greenacre, 1958). Gostaria de limitar-me apenas a declarar que o 
emprego da palavra trauma no conceito de trauma acumulativo não nos 
deve levar erroneamente a considerar tais fendas observadas na papel da 
mãe com escudo protetor como traumáticas na época ou no período em que 
ocorreram. Só adquirem valor acumulativamente e retrospectivamente... 
 34 
Deve ajudar a substituir reconstruções incriminadoras, como mães más, 
rejeitadoras ou sedutoras, bem como construções antropomórficas - os 
objetos parciais – tais como seio “bom” ou “mau”. Em segundo lugar, 
poderia ser feito um exame mais convincente do interjogo patogênico de 
variáveis específicas inerentes ao relacionamento total do equipamento 
físico e psíquico da criança e de como o ambiente enfrenta este interjogo...” 
 
Masud Khan utiliza também alguns dos conceitos básicos de Donald Winnicott para 
desenvolver suas idéias. Para ele o que leva a mãe a desenvolver o papel de escudo 
protetor é o que Winnicott chama de preocupação materna primária, em que a mãe 
suficientemente boa, através de suas funções de holding, handling e apresentação de 
objeto interagem com seu bebê. O conceito de intrusão (impingment) também é 
fundamental, Masud Khan comenta ( Khan, 1963): 
E a intromissão das necessidades e conflitos pessoais da mãe que 
caracterizo como fracasso no papel que desempenha como escudo protetor: 
O papel da mãe como escudo protetor não é passivo; é uma atitude alerte, 
de adaptação e organização. O papel de escudo protetor é resultado das 
funções de ego maternas autônomas e isentas de conflito. Se os conflitos 
pessoais interferirem aqui, o resultado será um desvio do papel de escudo 
protetor para a simbiose ou fuga para uma rejeição. Como a criança 
reagirá a esses fracassos da natureza, intensidade, duração e freqüência do 
trauma. 
 
 
A ATUAÇÃO 
A atuação, ou o agir, constitui um meio comum de comunicação e de tentativa de 
evitação – como defesa maníaca – das ansiedades confusionais, paranóides e 
depressivas na adolescência. Nos adolescentes a que estou me referindo, pelos seus 
precários meios de estruturação psíquica, este modelo de funcionamento mental – o 
atuar como comunicação e como defesa maníaca – será mais intenso. 
 
 
OS MODELOS OPERACIONAIS DE PENSAMENTO 
A adolescência se constitui de movimentos (flutuações) progressivos e regressivos. Nas 
flutuações progressivas predomina o processo secundário, o pensamento abstrato e os 
modelos verbais de comunicação. Nas flutuações regressivas, tão comuns nos 
 35 
adolescentes a que estou me referindo, predomina o processo primário, o pensamento 
concreto e o “agir” como modelo comunicacional operante. 
 
 
O PROCESSO DE SEPARAÇÃO – INDIVIDUAÇÃO 
A adolescência é um processo em que se reatualiza o processo de separação-
individuação, tal como descrito por Margareth Mahler e outros autores. Os adolescentes 
sem uma estrutura familiar adequada e com uma relação materna falha nas primeiras 
etapas do desenvolvimento experimentarão dificuldades nesta tarefa. A Sindrome 
Bordeline (difusão de identidade, utilização de mecanismos primitivos de defesa - 
particularmente a cisão - e precário juízo de realidade), relacionada aos processos 
referidos antes, poderá estar presente como uma expressão patológica (Outeiral, 1995). 
 
OS PROCESSOS IDENTIFICATÓRIOS, A PERSONALIDADE E A FORMAÇÃO 
DA IDENTIDADE 
Os processos de identificação são fundamentais na adolescência, particularmente na 
constituição da identidade. Os padrões de identificação destes adolescentes serão 
basicamente aqueles encontrados, em especial, nos indivíduos que representam a 
possibilidade de sobrevivência. Evidentemente serão modelos e padrões de 
identificação bastante distintos dos modelos das classes sociais mais favorecidas. A 
ética (ou as estruturas superegóicas) que se constituirá a partir de então será peculiar. A 
falta de um continente familiar adequado, de um espaço e de um limite, que criem as 
condições propícias para o desenvolvimento e para a estruturação da personalidade, 
poderá determinar uma atividade impulsiva, pouca tolerância à frustração e uma 
tendência ao acting-out. Além das dificuldades na estrutura egóica, o ideal de ego e o 
superego tenderão a apresentar deficiências com identificações patológicas. 
 
A RELAÇÃO COM O CORPO 
Em um trabalho anterior, publicado com Luiz Carlos Osório, tive a oportunidade de 
escrever sobre ao corpo na adolescência, descrevendo os diversos aspectos desta 
“personalização” ou, como diz Donald Winnicott, da integração da psique-soma. 
 36 
É importante que o grau de normalidade de um adolescente pode ser detectado através 
de sua atitude em relação ao corpo. Pode senti-lo como totalmente próprio ou, em casos 
de má elaboração da “personalização”, como pertencente a outro, especialmente à mãe, 
como figura materna presente ou ausente. Como resultado, todas as mudanças corporais 
são vividas como persecutórias (com o corpo e/ou seus órgãos, transformando-se em 
um depositário

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