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DIREITO AMBIENTAL – Apostila Esquematizada Prof. Raimundo Sérvulo Lourido Barreto1 SUMÁRIO 1. Introdução ao direito ambiental 2. Conceito de direito ambiental. 3. Princípios relativos ao direito ambiental Princípio do meio ambiente equilibrado como um direito humano fundamental, Princípio da prevenção e da Precaução, Princípio democrático, Princípio do desenvolvimento sustentável, Princípio da responsabilidade, Princípio do equilíbrio, Princípio da cooperação, Princípio do limite, Princípio do poluidor-pagador. 4. Tutela Constitucional do Meio Ambiente 4.1 – O Art. 225 da Constituição Federal 4.2 - Da significação geral dos enunciados 5. Da Repartição de competências 6. Política Nacional do Meio Ambiente 6.1 – Da Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA – Lei Federal nº 6.938/1981 6.2 – Princípios e objetivos da PNMA 6.3 – Do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA 6.4 – Dos Instrumentos da PNMA 7. Responsabilidade e dano ambiental: 7.1 - Conceito e previsão legal 7.2 – Responsabilidade civil ambiental 7.3 – Possibilidade ou não de excludentes 7.4 – Possibilidade de condenação por dano moral 1 Defensor Público. Mestre em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas – UEA. 1. Introdução ao Direito Ambiental. - É uma certeza afirmar que o meio ambiente (os recursos naturais) vem sofrendo a ação depredadora do homem há milênios, mas nunca esteve tão ameaçada como nas últimas décadas, paradoxalmente quando a agressão ao meio ambiente já não se vem dando em razão de desconhecimento dos seus malefícios, mas, na maioria das vezes, de forma preordenada e consciente2. - Vivemos em uma sociedade de risco? O surgimento da sociedade de risco designa um estágio da modernidade no qual começam a tomar corpo as ameaças produzidas até então pelo modelo econômico da sociedade industrial. A Teoria da Sociedade de Risco – característica da fase seguinte ao período industrial clássico, representa a tomada de consciência do esgotamento do modelo de produção, sendo esta marcada pelo risco permanente de desastres e catástrofes.3 - Acrescente-se o uso do bem ambiental de forma ilimitada, pela apropriação, a expansão demográfica, a mercantilização, o capitalismo predatório – esses são alguns dos elementos que conduzem a sociedade atual a situações de periculosidade.4 - Sociedade de risco e ambiente: Giddens, diz que o risco é a expressão característica de sociedades que se organizam sob a ênfase da inovação, da mudança e da ousadia. Questiona-se a própria prudência e cautela da ciência em lidar com as inovações tecnológicas e ambientais, que, mesmo trazendo benefícios, estão causando riscos sociais não mensuráveis. - Direito e sociedade de risco: O certo é que as situações de risco e perigo conduz a pensar o meio ambiente de forma diferente, superando o modelo jurídico tradicional. Assim, o RISCO, HOJE, é um dos maiores problemas enfrentados quando se objetiva uma efetiva proteção jurídica do meio ambiente. - Os institutos que caracterizam o Direito Ambiental no Brasil, sem dúvida alguma, têm uma influência forte e direta das respostas que a Sociedade Internacional deu aos problemas ambientais percebidos, sobretudo, pelos países desenvolvidos, como por ex., a poluição e degradações do meio ambiente que se expressaram pela constatação do buraco da camada de ozônio, chuvas ácidas, efeito estufa, dentre outros, os quais se agravaram, sobretudo após a década de 1960. - Por fim, a contribuição doutrinária que embasou o reconhecimento de um novo sub-ramo do Direito Internacional Público denominado Direito Internacional do Ambiente, para mencionar os principais aspectos. Por isso, para uma visão que privilegie as origens dos institutos do Direito Ambiental, é imprescindível conhecer, como dito, o que a Sociedade Internacional formulou direta ou indiretamente ao dar 2 Desde os primórdios da civilização, o meio ambiente, por meio de seus recursos naturais, sempre se constituiu e ainda se constitui como a principal fonte de matéria prima para o desenvolvimento da humanidade. Ou seja, o homem sempre buscou na natureza os meios de prover a sua subsistência, em todos os aspectos. 3 Estudos afirmam que a relação entre o crescimento populacional e o uso de recursos do planeta já ultrapassou em 20% a capacidade de reposição da biosfera e esse déficit aumenta cerca de 2,5% ao ano. Isso quer dizer que a diversidade biológica está sendo destruída muito mais rápido do que está sendo reposta e esse desequilíbrio está crescendo. As florestas tropicais, responsáveis pela maior parte dessa biodiversidade, são destruídas ao ritmo de 130 mil km2 por ano. Essa perda afeta gravemente os serviços naturais (ciclos e processos responsáveis pelo equilíbrio da natureza), como o regime hidrológico, a fertilidade natural do solo, a temperatura da terra. 4 A urbanização do planeta também tem gerado debates e preocupações. Nos últimos 50 anos, a velocidade e a escala com que a população urbana cresceu, principalmente em regiões menos desenvolvidas, geraram grandes desafios à sustentabilidade das cidades. Em parte, essa mudança é atribuída ao fenômeno da migração, que provocou grande crescimento nas zonas urbanas de países subdesenvolvidos. A rapidez do crescimento dessas áreas nas últimas décadas gerou problemas como a falta de saneamento apropriado e a ocupação urbana irregular. atenção na agenda internacional às questões ambientais globais e às formulações que a doutrina internacional ambiental construiu. - No direito interno, o arcabouço legal foi construído ao longo das duas últimas décadas, mais precisamente, a partir da Lei nº 6.938/81 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente), em seguida veio a Lei nº 7.347/85 (Ação Civil Pública), e finalmente, com o advento da CF/88, um Capítulo dedicado ao Meio Ambiente marcou definitivamente a inserção da tutela ambiental no ordenamento jurídico pátrio, pois que impôs como obrigação da sociedade e do próprio Estado, a preservação e defesa do Meio Ambiente. Recepcionando algumas normas ambientais já existentes e, por outro lado, prevendo a elaboração de outras normas infraconstitucionais, a CF de 1988, estabeleceu um novo ramo no direito, qual seja o Direito Ambiental - que visa tutelar o ambiente em todas as suas formas com vistas a proporcionar vida digna (proteção da vida sadia, a qual depende de um ambiente ecologicamente equilibrado) às presentes e futuras gerações.5 - O presente material de apoio abordar de forma objetiva e esquematizada os fundamentos do direito ambiental, através de uma breve evolução histórica do surgimento do tema no mundo, da análise dos princípios relativos ao direito ambiental, a análise dos dispositivos da Constituição Federal relacionados à tutela ambiental e a repartição de competências em matéria ambiental, além da análise genérica sobre a lei da política nacional do meio ambiente, a discussão sobre responsabilidade e dano ambiental, além da análise de dispositivos das legislações ambientais mais relevantes. 1.1. As tragédias internacionais como alerta - Sem dúvida, as tragédias serviram de substrato inicial para o desenvolvimento da preocupação com o meio ambiente. A soma de tais acontecimentos trágicos (hoje chamados de desastres ecológicos, acidentes ambientais, catástrofes ecológicas), confluiu num certo momento histórico para uma chamada de atenção especial para se cuidar da vida humana e do meio que a abrigava. - A publicação do livro "Primavera Silenciosa", de Rachel Carson (1962), foi a primeira obra a detalhar os efeitos adversos da utilização dos pesticidas e inseticidas químicos sintéticos, iniciando o debateacerca das implicações da atividade humana sobre o ambiente e o custo ambiental dessa contaminação para a sociedade humana. A autora advertia para o fato de que a utilização de produtos químicos para controlar pragas e doenças estava interferindo com as defesas naturais do próprio ambiente natural e acrescentava: "nos permitimos que esses produtos químicos fossem utilizados com pouca ou nenhuma pesquisa prévia sobre seu efeito no solo, na água, animais selvagens e sobre o próprio homem. Tal obra tornou-se um best seller em 1970, como um dos livros que sintetizavam com rara agudez, os problemas ambientais decorrentes do uso dos agrotóxicos. - Relatório do Clube de Roma: "OS LIMITES DO CRESCIMENTO" - "Nele se mostra que o crescimento exponencial da economia moderna acarreta como conseqüência necessária, num espaço de tempo historicamente curto, uma catástrofe dos fundamentos naturais da vida. O consumo voraz de recursos e a emissão 5 ANTUNES, Paulo de Bessa (1996), assevera que quanto ao meio ambiente, a legislação veio a se desenvolver depois da Conferência das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Estocolmo-1972), quando a participação brasileira foi intensamente criticada, desencadeando a criação da Secretaria Especial do Meio Ambiente e posteriormente a concretização de algumas normas. Declarações Internacionais – constituem importantes métodos de aperfeiçoar novos conceitos e princípios gerais e, quando adotados, passam a influenciar e servir de orientação geral aos Estados e nas suas políticas ambientais, bem como a dar formulação ao direito. desenfreada de poluentes colocam em xeque a sobrevivência da humanidade. Fazia previsões catastróficas, se mantida a forma de lidar com os recursos naturais. Tal publicação, uma síntese da situação econômico-ambiental, ensejou a formação de duas correntes, as quais vão ser conciliadas apenas mais tarde. Uma delas, os que eram partidários do crescimento zero, tinha um matiz grande de defensores. Os mais radicais pregavam a intocabilidade dos recursos naturais.6 No pólo oposto, estão os que desprezaram a idéia do crescimento zero, por inaplicável, apregoando que o desenvolvimento é a solução (grupo dos desenvolvimentista) e o homem sempre achará uma alternativa no caso de falta destes recursos. * Problemas mais dos ricos que dos pobres? - Os problemas comuns da Sociedade Internacional, na verdade, até hoje, refletem problemas causados pelos países desenvolvidos, os quais, fincados na revolução industrial, sempre mantiveram a liderança da expansão do Capitalismo, sem grandes preocupações, até então, com as conseqüências ambientais desta corrida econômica. Nos países de economia planificada (socialista), a situação não era diferente, embora, por muitos anos, mantida a divulgação sob censura. Como conseqüência desse desenvolvimento a qualquer custo, podemos citar os seguintes fenômenos negativos: a) chuva ácida - Contaminação da atmosfera devido à presença no ar de compostos de enxofre provenientes das indústrias e dos centros urbanos, especialmente dos veículos. O fenômeno não é novo, foi detectado em Manchester, na Inglaterra, no século passado e o termo foi criado pelo químico Roberto Angus Smith. O que é novo foi sua constatação como um problema internacional. E um tipo de poluição atmosférica de longa distância. A chuva, neve ou neblina com alta concentração de ácidos em sua composição, conhecida como chuva ácida, é um dos grandes problemas ambientais do mundo contemporâneo. O óxido de nitrogênio (NO) e os dióxidos de enxofre (SO2), principais componentes da chuva ácida, são liberados com a queima de carvão e óleo, fontes de energia que movem diversas economias no planeta.7 b) efeito estufa - Aquecimento da Terra causado pela concentração de gás carbônico na atmosfera, provocado pela queima de combustíveis fósseis. Provoca secas, enchentes, desertificação e subida do nível dos mares. Dentre os gases, os principais são o CO2, produzido pela queimada de florestas e pela combustão de produtos como carvão, petróleo e gás natural; o óxido nitroso, gerado pela atividade das bactérias do solo; e o metano, produzido pela decomposição de matérias orgânicas. A forma como o efeito estufa se manifestará no futuro ainda é imprevisível. A longo prazo, o superaquecimento do planeta pode causar problemas ambientais como tufões, furacões e enchentes, em conseqüência do derretimento das geleiras e do aumento da evaporação da água. Deve atingir também a fauna, pois algumas espécies de animais não se adaptam a temperaturas elevadas, além de comprometer ecossistemas, especialmente mangues, mais sensíveis a alterações do nível do mar. c) buraco na camada de ozônio - Situada na estratosfera, entre 20-35 km de altitude, a camada de ozônio tem certa de 15 km de espessura, sendo crucial para o 6 Parte destas idéias subsistem com as Ongs, geralmente internacionais, que apregoam, por exemplo, a intocabilidade da floresta amazônica e, para tanto, repetem o bordão de que este ecossistema representa o pulmão do mundo; é o patrimônio comum da humanidade, detém a maior biodiversidade do mundo, induzindo a idéia de intocabilidade deste recurso natural. Neste bloco situam-se os conservacionistas ou preservacionistas. 7 Os efeitos observados vão desde a destruição da vegetação, até danos causados nos edifícios e monumentos (dissolução do calcário), mas inclui a acidificação de rios e, sobretudo lagos, causando a morte de peixes. Em termos econômicos, os efeitos da chuva ácida em florestas, culturas e edifícios do Reino Unido foram estimados em 4.500 milhões de euros/ano e na Alemanha esse valor supera 7.250 milhões de euros. Percebeu-se claramente o fenômeno da poluição transfronteiriça, donde a frase de que "a poluição não tem fronteiras". desenvolvimento da vida na terra. Composta de um gás rarefeito, formado por moléculas de três átomo de oxigênio - o ozônio -, impede a passagem de parte da radiação ultra violeta emitida pelo Sol. A agressão à camada de ozônio interfere no equilíbrio ambiental e na saúde humana e animal. Sem sua proteção, diminui a capacidade de fotossíntese nas plantas e aumenta o risco do desenvolvimento de doenças como o câncer de pele. Pode ter efeito mutagênico (alteração do código genético) e teratogênico (aparecimento de deformações), podendo levar até mesmo à morte. Efeitos em desordens oculares.8 d) as mudanças climáticas globais - A principal causa ainda é a queima de combustíveis fósseis oriundos das atividades antropogênicas. Os estudo mais importantes sobre o clima envolvem a questão do aquecimento da Terra. O desmatamento e a emissão de gases têm provocado alterações no clima mundial, e é possível que a temperatura do planeta aumente 3,5º no século XXI de acordo com especialistas da ONU. O aquecimento deve causar mudanças no regime normal da seca e chuva em algumas regiões e afetar sobretudo as áreas dos pólos. Na Antártica, o maior reservatório de água doce da Terra, já se observam indícios de crescimento do degelo. O derretimento do gelo poderá elevar o nível dos oceanos. 1.2. As respostas da Sociedade Internacional: a) Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente humano (CNUMAH) – Estocolmo (Suécia/1972) – Evento de grande importância para a humanidade, já que formalmente, esta Conferência apontou a reação da Comunidade internacional aos problemas ambientais. De formulações, estudos, buscas, discursos, passou-se à prática. Os países tinham que agir e rapidamente. Uma das alternativas da ONU foi exatamente convocar os países a perceberem a situação do meio ambiente no mundo e quais ações seriam necessárias, a partir daí, visando a recuperação do dano quando fosse possível,a prevenção e em que áreas necessitaria revisão das posturas mundiais. A Conferência de Estocolmo foi o grande divisor de águas. Contendo 26 princípios, ela veio acompanhada de um plano de ação composto de 109 resoluções. As nações passaram a compreender que nenhum esforço, isoladamente, seria capaz de solucionar os problemas ambientais do Planeta. As principais conseqüências deste evento foram: a.1) Escolha do dia mundial do meio ambiente(05 de junho) - Desde então, tal dia comemora-se, no mundo, um dia dedicado para ações, projetos e denúncias quanto a situação do meio ambiente. No Brasil, englobando este dia, foi instituída a Semana Nacional do Meio Ambiente, comemorada pelos Governos Federal, Estadual e Municipal e a sociedade civil. a.2) Programa das Nações Unidas para o meio ambiente (PNUMA) – Trata-se de apêndice da ONU, especializado a cuidar das questões ambientais a nível internacional e em parceria com os países. O PNUMA emite um relatório sobre o estado do meio ambiente no mundo, uma publicação que conta a situação dos diversos países no lidar com os vários recursos naturais. Também controla o transporte naval de substâncias químicas perigosas, além de ter vários projetos de rascunho de Convenções Multilaterais, Regionais e outras, para a defesa do meio ambiente. Promove o Direito Ambiental, no âmbito internacional e interno. Sua sede fica em Nairóbi (Quênia). 8 O impacto do CFC na camada de ozônio começou a ser observado em 1974 pelos químicos Frank Rowland e Manoel Molina, ganhadores do Prêmio Nobel de Química de 1995. Eles confirmaram que o CFC reage com o ozônio, reduzindo a incidência desse gás e, conseqüentemente, a espessura da camada. Na época, o CFC usado em propelentes de sprays, embalagens de plástico, chips de computador, solventes para a indústria eletrônica e, sobretudo, nos aparelhos de refrigeração, como geladeiras e sistemas de ar condicionado. a.3) Movimento ambientalista ( Ong’s e partidos verdes) – a partir de então o Movimento Ambientalista ganhou força no mundo inteiro, através da mobilização da Sociedade Civil, denunciando o risco do uso da energia nuclear e do dano generalizado ao meio ambiente. O braço político do movimento ambientalista, na década de 70, desembocou nos chamados Partidos Verdes, pois levantavam a defesa do verde e a busca da paz, em rejeição à guerra e à destruição ambiental. De outro lado, as Organizações não governamentais iniciaram uma luta, cuja preocupação era a da sociedade civil de muitos países europeus, temerosos da guerra fria e do mau uso dos recursos naturais. Com isso, ONG’s de âmbito mundial apareceram, das quais dois bons exemplos são: o Greenpeace e o WWF, que atuam no âmbito global, regional e local com muito ativismo. a.4) Declaração de Estocolmo - Documento final da CNUMAH, continha declarações convergentes, contudo, sem o caráter de obrigatoriedade jurídica, pois não se tratava de uma Convenção Internacional. Quando muito, pode-se colocar tal documento como um "Protocolo de Intenções" ou de boa vontade, dos países signatários que participaram do evento. Entretanto, a partir desta Declaração, surgiu na doutrina a expressão soft- law ( direito suave, direito verde, direito leve, quase-direito ), para designar tanto as Resoluções como os Princípios extraídos desta Declaração. De fato, não tem caráter obrigatório juridicamente, mas ensejou que os países buscassem viabilizar o que ali continha e, sobretudo, as ONGs tiraram dali sua principal bandeira para, voltando aos países de origem, os militantes exigirem a construção de uma legislação e de mecanismos de proteção administrativos e utilização racional do meio ambiente. a.5) Princípios relativos ao meio ambiente e surgimento do direito internacional do meio ambiente ( 26 Princípios e 109 Resoluções) - Da Declaração de Estocolmo, a doutrina extrai princípios básicos que informam tanto do direito interno de muitos países, como também o novel ramo do Direito Internacional Público, o Direito Internacional do Meio Ambiente. Assim, suscintamente, pode-se mencionar o Princípio do Direito ao Meio Ambiente equilibrado como um Direito Humano Fundamental, junto com os demais direitos fundamentais. Extrai-se o Princípio da Prevenção, o Princípio da Responsabilidade Inter-Gerações, dentre outros. * Destaque dentre os princípios oriundos da Conferência de Estocolmo a QUALIDADE DO MEIO AMBIENTE COMO UM DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL. Ou seja, a percepção imediata de que o direito à vida e à saúde, suporte da vida, se concretizam num substrato, numa base, qual seja, o meio ambiente. Assim, a viabilização da vida e sua continuidade se dará num meio ambiente saudável, equilibrado, bem cuidado. Alguns doutrinadores colocam tal princípio, tomando como base Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, como um direito de terceira geração (Direito de Fraternidade) e outras vezes, como um direito de solidariedade. Outros doutrinadores separam o direito da fraternidade do direito da solidariedade, colocando neste último o direito ao meio ambiente equilibrado como um direito de quarta geração. O relevante é que a doutrina já inclui tal direito no mesmo patamar que os outros direitos fundamentais da pessoa humana. b) Relatório BRUNDTLAND: "O NOSSO FUTURO COMUM" - As relações injustas da humanidade entre ricos de um lado e pobres de outro, geravam a poluição. Para alguns, a pior poluição era a pobreza. A questão demográfica também foi levantada. Aqui, aparece a utilização oficial da expressão "desenvolvimento sustentável". A cooperação internacional na área ambiental é enfatizada, sobretudo, esperando-se dos países desenvolvidos um papel de financiamento e apoio para o conhecimento e uso de tecnologias limpas para os países em desenvolvimento. Há uma reafirmação da quebra de um paradigma: os recursos naturais não são inesgotáveis, ou seja, os recursos naturais são finitos. Alguns fazem referência ao slogan "Pensar globalmente e agir localmente". c) Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) – Rio de Janeiro/1992 (Eco-92) - Foi registrada a presença de delegações nacionais de 175 países, sem contar os eventos paralelos promovidos pelas Organizações Não Governamentais. Do evento resultaram: c.1) Consolidação da idéia de Desenvolvimento Sustentável - A utilização oficial em documento oficial deu-se no Relatório Brundtland, publicado com o título "O Nosso Futuro Comum". Na realidade, tal expressão promoveu a reconciliação de duas correntes: os desenvolvimentistas, defensores da continuidade da exploração econômica tal qual vinha sendo feita desde a Revolução Industrial, como se os recursos naturais fossem inesgotáveis e de outro lado, dos Preservacionistas ou Conservacionistas, defensores de uma espécie de moratória do uso dos recursos naturais (economicamente concretizado na idéia do Crescimento Zero). Na Rio/92, então, consagra-se o Princípio do Desenvolvimento Sustentável, a partir daí, o Princípio e a idéia que move a visão internacional e interna da maioria dos países quanto ao lidar com a questão ambiental. A partir de então, é de se observar que os eventos mundiais tomam como base, exatamente, o Desenvolvimento Sustentável aclamado na ECO/92 e todo encontro mundial sobre o tema, a partir de então, denomina-se Rio + 5 (avaliação cinco anos depois ); Rio + 10, de novo, no mesmo sentido, 10 anos após a ECO/92 fez-se a Cúpula do Desenvolvimento Sustentável em Joahnesburgo, para avaliar sua aplicação pelos países. c.2) Criação da Comissão de Desenvolvimento Sustentável - Houve a necessidade de se acompanhar, junto à sede da ONU, os Tratados Internacionais e as ações que promovessem o Desenvolvimento Sustentável. Para tanto, sem esvaziar o papel do PNUMA, cuja sede é no Quênia, constituiu-seuma Comissão sobre o Desenvolvimento Sustentável que, dentre suas atividades, está a de acompanhar o cumprimento deste Princípio dentro dos Tratados Internacionais firmados entre os países. c.3) Elaboração da Agenda 21 Mundial - Tal documento, especificamente AGENDA 21, foi produzido na CNUMAD, visando o planejamento de um conjunto de ações mundiais que garantissem metas para o Desenvolvimento Sustentável até o século XXI e envolvesse tanto os governos, organizações internacionais, organizações não governamentais e a sociedade civil dos países. Para tanto, partindo-se da Agenda 21 Mundial, cada país deveria elaborar a sua própria agenda, adaptando-a, a partir de sua construção, à realidade local. Na realidade, a Agenda é o instrumento de planejamento, cujo compromisso básico foi elaborá-la para possibilitar o envolvimento dos vários níveis governamentais com a sociedade civil. c.4) Declaração do Rio (27 princípios) - Assim como em Estocolmo, no Rio produziu-se a Declaração do Rio, a qual, mesmo não sendo de caráter obrigatório, proclamou Resoluções e Princípios, ora repetindo, ratificando, ora ampliando o alcance de muitas visões apontadas na CNUMAH/72. c.5) Convenções/Tratados internacionais multilaterais: Convenção sobre a Biodiversidade e Convenções sobre as mudanças climáticas globais - Um dos anseios da Comunidade internacional, era ter instrumentos com obrigatoriedade jurídica, além das Convenções Regionais, que envolvessem ações globais de proteção do meio ambiente. Na Rio/92 duas Convenções Multilaterais Mundiais foram assinadas: A Convenção-Quadro sobre as Mudanças Climáticas Globais (da qual decorreu, mais tarde,o Protocolo de Montreal (camada de Ozônio) e o Protocolo de Kyoto ( sobre gases de efeito estufa ) e a Convenção sobre a diversidade Biológica, mais conhecida como Convenção sobre a Biodiversidade. Houve uma expressiva gama de assinaturas. Entretanto, do ponto de vista do Direito Internacional, a obrigatoriedade de uma Convenção ou Tratado internacional, decorre da ratificação e sua respectiva incorporação no direito interno. Neste aspecto, sua entrada em vigor internacional exige um número mínimo de ratificações, o que ensejou uma demora grande na entrada em vigor de ambas as Convenções. O Brasil assinou e ratificou ambas as Convenções, as quais já estão em vigor e, internamente, já são instrumentos legais obrigatórios no Ordenamento Jurídico brasileiro. d) Um novo ramo do direito: O DIREITO INTERNACIONAL DO AMBIENTE - O reconhecimento de um conjunto de institutos que regulam as relações internacionais no âmbito jurídico quanto ao tema meio ambiente, fizeram perceber que havia um material substancial para se formular uma teoria que abarcasse o tema, sem, contudo, significar um "novo direito". Antes de formuladas um corpo teórico que explicasse o fenômeno, principalmente pela forma como surgiu (o inestimável papel das ONG’s e a existência do que se convencionou chamar ("soft law"), pareceu, à leitura apressada, que, de fato, havia um novo ramo do direito. Isto porque era, em grande parte, divulgado e conhecido por organizações privadas extremamente atuantes, sem vínculos governamentais (cuja posição como sujeito de direito internacional não se lhes reconhece ) e embasado em disposições de caráter mais moral, programático, ideal do que normativo internacional. * Assentada a poeira dessa situação, viu-se que as obrigações entre países só seriam plenamente exigíveis dentro do quadro do direito internacional clássico (pelos tratados multilaterais, pelo costume e pela participação do sujeito Estado e do sujeito Organizações Internacionais), além da participação imprescindível institucional das Organizações Internacionais. Dado o caráter clássico citado, é de se reconhecer que existe um Direito Internacional do Ambiente (ou, alternativamente, Direito Internacional do Meio Ambiente ou Direito Internacional Ambiental). * DEFINIÇÃO: "conjunto de regras e princípios que criam obrigações e direito de natureza ambiental para os Estados, as organizações intergovernamentais e os indivíduos". * Quanto aos SUJEITOS, a definição já os elenca, ou seja, os Estados (países), as Organizações Internacionais e o indivíduo. Quanto aos Estados, aplica-se a teoria geral do Direito Internacional Público (DIP). As Organizações Internacionais, dentro do DIP, são aquelas formadas por sujeitos do direito internacional: ora o Estado, ora as Organizações Internacionais, ora ambos. As Organizações Intergovernamentais são as que abrigam somente Estados em sua composição. Haverá casos, no entanto, que estarão num mesmo Tratado Constituinte, Estados e Organizações Internacionais. Mesmo quando se pensa em blocos (MERCOSUL, NAFTA, UNIÃO EUROPÉIA, etc.), são estes tipicamente organizações internacionais, vinculadas ao Tratado que as constituiu. O papel do Indivíduo como sujeito, ainda espera uma melhor densidade. No entanto, partindo-se da idéia de que dentro dos DIREITOS HUMANOS o indivíduo tem tal subjetividade e, reconhecendo-se o DIREITO AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO um DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL, este sujeito tem um papel importante a desempenhar. Outras ainda especulam na possibilidade da própria HUMANIDADE ser sujeito do direito internacional, dado os interesses relevantes para sua preservação e sobrevivência, que estaria acima do direito individual ou do direito de um Estado ou poucos Estados. 2. Conceito de direito ambiental. - Conceituar direito ambiental não é tarefa fácil, de qualquer forma, elencamos aqui as definições de doutrinadores importantes do direito pátrio, no sentido de demonstrar a interdisciplinaridade do tema. - “O conjunto de técnicas, regras e instrumentos jurídicos organicamente estruturados para assegurar um comportamento que não atente contra a sanidade mínima do meio ambiente.” (Sérgio Ferraz). - “Conjunto de técnicas, regras e instrumentos jurídicos sistematizados e informados por princípios apropriados que tenham por fim a disciplina do comportamento relacionado ao meio ambiente” (Diogo Figueiredo Moreira Neto). - “Conjunto de normas e princípios editados objetivando a manutenção do perfeito equilíbrio nas relações do homem com o meio ambiente” (Tycho Brahe Fernando Neto). - “O complexo de princípios e normas reguladores das atividades humanas que, direta ou indiretamente, possam afetar a sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando a sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações” (Edis Milaré). - Para o Professor Paulo Affonso Leme Machado, direito ambiental é um direito de proteção à natureza e à vida, dotado de instrumento peculiares que se projetam em diversas áreas do direito, sobretudo, no direito administrativo. - Para Paulo de Bessa de Antunes, o direito ambiental pode ser definido como um direito que tem por finalidade regular a apropriação econômica dos bens ambientais, de forma que ela se faça levando em consideração a sustentabilidade dos recursos, o desenvolvimento econômico e social, assegurando aos interessados a participação nas diretrizes a serem adotadas, bem como padrões adequados de saúde e renda. - Para o referido autor, esse direito se desdobra em três vertentes: direito ao meio ambiente, direito sobre o meio ambiente e direito do meio ambiente. Tais vertentes existem, na medida em que o direito ao meio ambiente é um direito humano fundamental que cumpre a função de integrar os direitos à saudável qualidade de vida, ao desenvolvimento econômico e à proteção dos recursos naturais.9 9 Mais do que um ramo autônomo do direito, o direito ambiental é uma concepção de aplicação da ordem jurídica que penetra, transversalmente, em todos os ramos do direito. O direito ambiental tem uma dimensão humana, uma dimensão ecológica e uma dimensãoeconômica que devem ser compreendidas harmonicamente. Evidentemente que, a cada nova intervenção humana sobre o ambiente, o aplicador do direito ambiental deve ter a capacidade de captar os diferentes pontos de tensão entre as três dimensões e verificar, no caso concreto, qual delas é a que está mais precisando de tutela em um dado momento. (In Direito ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 8.). 3. Princípios relativos ao direito ambiental. - Nosso estudo deve começar pela observação fundamental de que toda forma de conhecimento filosófico ou científico implica a existência de princípios, isto é, de certos enunciados lógicos admitidos como condição ou base de validade das demais asserções que compõem dado campo do saber. (REALE, Miguel). - Princípios são os mandamentos básicos e fundamentais nos quais se alicerça uma ciência. São as diretrizes que orientam uma ciência e dão subsídios à aplicação das suas normas. Em uma interpretação entre a validade de duas normas, prevalece aquela que está de acordo com os princípios da ciência.10 - A relação do Direito Ambiental com os demais ramos do Direito é uma relação transversal, isto é, as normas ambientais tendem a se incrustar em cada um dos demais ramos do Direito. O Direito Ambiental penetra em todos os demais ramos da Ciência Jurídica. - Para se formular uma política ambiental com justiça ambiental, é necessário que o Estado se guie por princípios que vão se formando a partir da sedimentação das complexas questões suscitadas pela crise ambiental. “Os princípios têm avultado como verdadeiras normas de conduta, e não meramente como diretrizes hermenêuticas, realçando-se, hodiernamente, a distinção entre regras jurídicas e princípios jurídicos, sendo ambos normas jurídicas (processo de juridicização). Despertou-se, por assim dizer, para o fato de que os princípios jurídicos – escritos ou implícitos – representam as bases sobre as quais o direito se constrói e das quais ele deriva (as regras jurídicas, inclusive, seriam concreção dos princípios), ou dito de outro modo, os elementos fundamentais que inspiram o sistema jurídico e que, portanto, devem funcionar como orientadores preferenciais de interpretação, da aplicação e da integração normativa, com o consequente afastamento de uma postura mais legalista” (TRF 5ª Região, Agravo Regimental em Suspensão de Liminar n. 3557/02 – PE, Pleno, j. 21.09.2005, Relator Desembargador Federal Francisco Cavalcante). “O sistema jurídico de proteção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, §3º) e infraconstitucionais (Lei 6.938/81, arts. 2º e 4º), está fundado, entre outros, nos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral. Deles decorrem, para os destinatários (Estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, comportando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), bem como de pagar quantia (indenização dos danos insuscetíveis de recomposição in natura), prestações essas que não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso” (STJ. REsp 605323, j. 18.08.05, Rel. Min. José Delgado). 10 Os princípios, cuja função sistematizadora do ordenamento jurídico é evidente, exercem primazia formal e material sobre as regras jurídicas, impondo padrões e limites à ordem jurídica vigente. In THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. Salvador: Jus Podivm, 2011, p.58. 3.1. Princípio do meio ambiente equilibrado como um direito humano fundamental. - O homem tem o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado, pois havendo o desequilíbrio ecológico, está em risco a própria vida humana. Todos os demais princípios decorrem deste. Colocado por alguns como direitos de terceira geração ou dimensão, dentro dos chamados Direitos de Solidariedade/Fraternidade.11 - Do ponto de vista do direito interno, o mais relevante reconhecimento deste princípio está no caput do artigo 225 da CF/88. Tal direito vai além do cidadão brasileiro, para alcançar o estrangeiro (residente ou em trânsito). Fundamentalmente, seu significado coloca tal direito como qualquer outro direito humano fundamental, possibilitando inseri-lo numa sistemática interna e internacional de proteção, numa aplicação livre e ampla. Este é um dos princípios que a doutrina tem dado ênfase, mormente porque ele possibilita a ligação entre o Direito Ambiental e os Direitos Humanos. Denominado Princípio do Direito Humano, dentre outros. Seu alcance é global. - Já se julgou, inclusive, que: “Um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado representa um bem e interesse transindividual, garantido constitucionalmente a todos, estando acima de interesses privados.” (TRF 4ª Região, Apelação Cível n. 199804010096842/SC, j. 18.12.02, Rel. Desdor. Federal Joel Ilan Paciornik). - O STF também já se posicionou no sentido de que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito da coletividade, portanto, de terceira geração. “O direito à integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação de direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não a indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social.” (MS – 22.164-0/SP, Rel. Min. Celso de Mello). - O direito a um meio ambiente equilibrado está intimamente ligado ao direito fundamental à vida e à proteção da dignidade da vida humana, garantindo, sobretudo, condições adequadas de qualidade de vida, protegendo a todos contra os abusos ambientais de qualquer natureza. Como salienta Édis Milaré, o reconhecimento do direito a um meio ambiente sadio configura-se como extensão do direito à vida, quer sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres humanos, quer quanto ao aspecto da dignidade desta existência – a qualidade de vida -, que faz com que valha a pena viver.12 3.2. Princípio da Prevenção e da Precaução. - Evitar a incidência de danos ambientais é melhor que remediá-los, uma vez que as seqüelas de um dano ao meio ambiente muitas vezes são graves e irreversíveis, sendo justamente isso que os princípios da prevenção e precaução buscam evitar. 11 Os direitos de 1ª geração são aqueles de cunho negativo, ou seja, uma conduta não positiva do Estado, visando resguardar os direitos fundamentais ligados à liberdade, à vida e à propriedade. Já os direitos de 2ª geração possuem status positivo, ou seja, demandam comportamento ativo do Estado, visando à realização da justiça social, quais sejam, os direitos sociais, culturais e econômicos. Na terceira geração estariam presentes os direitos de fraternidade e solidariedade, de caráter altmente humano e universal. Tais direitos fundamentais não têm por objetivo a proteção de interesses individuais, mas sim do próprio gênero humano. A titularidade dos direitos de terceira geração é coletiva, por vezes indefinida e indeterminada. 12 In THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. Salvador: Jus Podivm, 2001, p.58. - Prevenção – quando se constata, previamente, a dificuldade ou a impossibilidade da reparação ambiental, ou seja, consumado o dano ambiental, sua reparação é sempre incerta ou onerosa. A possibilidade do resultado é o que caracteriza o princípio da prevenção. Assim, procura-se evitar o risco de uma atividade sabidamente danosa e evitar efeitos nocivos ao meio ambiente.13 - Precaução – aplica-se àqueles casos em que o perigo é abstrato, de um estado de perigo em potencial, onde existam evidências que levem a considerar uma determinada atividade perigosa.14 O princípioda precaução consiste em evitar que medidas de proteção sejam adiadas em razão da incerteza que circundam os eventuais danos ambientais.15 - O princípio da precaução é considerado uma garantia contra os riscos potencias que, de acordo com o estado atual do conhecimento, não podem ser ainda identificados. Assim, no caso de ausência da certeza científica formal, a existência do risco de um dano sério ou irreversível requer a implementação de medidas que possam prever, minimizar e/ou evitar este dano. - Portanto, a prevenção atua no sentido de inibir o risco de dano em potencial (atividades sabidamente perigosas), enquanto a precaução atua para inibir o risco de perigo potencial (ou seja, o dano em abstrato).16 - Assim já se manifestou a jurisprudência acerca da diferença entre os dois princípios: “A tutela constitucional, que impõe ao Poder Público e a toda coletividade o dever de defender e preservar, para as presentes e futuras gerações, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, como direito difuso e fundamental, feito bem de uso comum do povo (art. 225, caput, CF), já instrumentaliza, em seus comandos normativos, o princípio da prevenção (pois uma vez que se possa prever que uma certa atividade possa ser danosa, ela deve ser evitada) e a consequente precaução (quando houver dúvida sobre o potencial deletério de uma determinada ação sobre o ambiente, toma-se a decisão mais conservadora, evitando-se a ação), exigindo-se, assim, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade (art. 225, §1º, IV, CF).” (TRF 1ª Região, Agravo de Instrumento n. 200301000096950/DF, j. 06.12.04, Rel. Antônio de Souza Prudente). 3.3. Princípio do equilíbrio ou da variável ambiental. - Há que se levar em conta a variável ambiental em qualquer ação ou decisão - pública ou privada - que possa causar algum impacto negativo sobre o meio. Trata-se da necessidade de se analisar quais os prejuízos e impactos, e ao contrário, 13 Aqui se fala na certeza de ocorrência de um dano no futuro, se não forem obstaculizadas as causas, ou ainda, as consequências futuras de danos. 14 LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patrick de Araújo. Direito Ambiental na sociedade de risco. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 22. 15 A sua verificação fundamenta-se na dúvida, isto é, na incerteza técnica e científica. Contudo, em decorrência da gravidade e letalidade de alguns riscos, deve-se agir prontamente para proteger a coletividade. Este princípio foi proposto formalmente na Conferência da ONU, Rio-92 – Princípio 15 da Declaração do Rio 92 – “Com o fim de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério da precaução de acordo com suas capacidades. Quando haja perigo de dano grave e irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para postergar a adoção de medidas eficazes para impedir a degradação do meio ambiente”. 16 HAMMERSHMIDT, Denise. O risco na sociedade contemporânea e o princípio da precaução no direito ambiental. Revista de Direito Ambiental, ano 8, n. 31, 2003, São Paulo: RT, p. 147. quais os benefícios e ganhos que um empreendimento poderá acarretar ao meio ambiente. - Este princípio representa a ponderação, a mensuração razoável dos efeitos da prática de qualquer ato que intervenha no meio ambiente, respeitando a manutenção das diversas ordens que compõem um ecossistema17 “O direito a integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, a própria coletividade social.” (MS 22164/SP, Rel. Min. Celso de Mello, j. 30.10.95, Tribunal Pleno). 3.4. Princípio democrático. - Visa assegurar a participação do cidadão na proteção do meio ambiente. Tal princípio tem raízes nos movimentos reivindicatórios da sociedade civil e se concretiza através do direito à informação e do direito à participação. A participação democrática também tem sede constitucional (art. 225, §1º, VI). “Para assegurar a efetividade desse direito (ao meio ambiente ecologicamente equilibrado), incumbe ao Poder Público: VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente”. - Paulo de Bessa Antunes, assim divide a participação democrática18: Iniciativas legislativas Medidas administrativas Medidas processuais Plebiscito (art. 14, I, CF) Direito de informação (art. 5º, XXXIII, CF) Ação popular (art. 5º, LXXIII, CF) Referendo (art. 14, II, CF) Direito de petição (art. 5º, XXXIV, CF) Ação Civil Pública (art. 129, III, CF) Iniciativa popular (art. 14, III, CF) EPIA (art. 225, IV, CF) “A participação popular no procedimento administrativo de criação das unidades de conservação (Lei 9.985/2000, arts. 5º e 22) e Decreto 4.340/02, art. 5º), além de concretizar o princípio democrático, permite levar a efeito, da melhor forma possível, a atuação administrativa, atendendo, tanto quanto possível, aos vários interesses em conflito.” (TRF 4ª Região, Agravo de Instrumento n. 200504010294191/PR, j. 06.03.06, Rel. José Paulo Baltazar Junior). 3.5. Princípio do desenvolvimento sustentável. - Contempla as dimensões humana, física, econômica, política, cultural e social em harmonia com a proteção ambiental. Se há o direito dos povos à busca do desenvolvimento, este não se deve efetivar a custa da degradação do meio ambiente. A busca do desenvolvimento sustentável implica no uso de ações racionais que 17 TRENNEPOHL, Terence Dornelles. Fundamentos de Direito Ambiental. Salvador: JusPodivm, 2007, p. 43. 18 In Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. preservem os processos e sistemas essenciais à vida e à manutenção do equilíbrio ecológico.19 - O desenvolvimento sustentável20 é aquele que busca atender aos anseios do presente, tentando não comprometer a capacidade e o meio ambiente das gerações futuras. As diretrizes de um desenvolvimento sustentável refletem a necessidade de conservação do meio ambiente, observados os princípios científicos e as leis naturais que regem a manutenção do equilíbrio dos ecossistemas, a necessidade de compatibilização das estratégias de desenvolvimento com a proteção do meio ambiente, a adoção de medidas de prevenção de danos e de situações de riscos ambientais e a cooperação internacional. “A Constituição de 1988, ao consagrar como princípio da ordem econômica a defesa do meio ambiente e ao estabelecer que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida e vital para as presentes e futuras gerações, agasalha a teoria do desenvolvimento econômico sustentável”. (TRF 5ª Região, Apelação Cível n. 209609/SE, j. 20.11.01, Relator Paulo Gadelha). - Boa parte da doutrina entende que o desenvolvimento sustentável tem como pilar a harmonização das seguintes vertentes: crescimento econômico, preservação ambiental e equidade social, sendo que em qualquer processo de desenvolvimento econômico essas três vertentes teriam que estar presente de forma simultânea. Assim, ausente qualquer um desses elementos não se terá desenvolvimento sustentável. 3.6. Princípio da responsabilidade. - A solidariedade e perpetuidade da vida humana enquanto espécie, faz com queo homem pense não só na existência presente, mas nas gerações que virão sucessivamente. Tal compromisso define o sentido da responsabilidade intergeração. - Prevê o art. 225, §3º, que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. Com esta previsão, toda e qualquer hipótese em que ocorrer dano ou agressão ao meio ambiente, e em que seja possível indicar o responsável, direto ou indireto, do dano, este deve ser incumbido de reparar o prejuízo por ele provocado, sendo responsabilizado civilmente pelo ressarcimento do prejuízo causado. - Todo cidadão, bem como o poder público, pode ser responsabilizado pelo dano ambiental e, mesmo sendo lícita a atividade desenvolvida, não se exclui a responsabilidade civil pelo dano ambiental. “As condutas dos apelantes causaram dano ambiental que reclama reparação pecuniária, por todos devida solidariamente, em homenagem ao princípio da responsabilidade objetiva do Estado.” (TRF 5ª Região, Apelação Cível n. 209609/SE, j. 20.11.01, Relator Paulo Gadelha) 19 Neste âmbito, pode-se inserir, inclusive, a questão da função socioambiental da propriedade, um derivativo da função social da propriedade inserida no Direito brasileiro pela legislação e consagrada no Direito Agrário. Sua aplicabilidade é coerente, pois que a exploração racional e a preservação dos recursos naturais da propriedade rural, compõem exatamente a idéia do desenvolvimento sustentável, ou seja, busca do desenvolvimento sem violar a sustentabilidade do meio ambiente. 20 A primeira utilização oficial do termo foi feito no Relatório Brundtland, contudo, a criação do termo Desenvolvimento Sustentável se deve à União para Conservação da Natureza (IUCN) e ao WWF. Sua consolidação, enquanto Princípio, ocorreu na Conferência do Rio-92. Desde então, tal expressão sintetiza o desejo atual dos Estados em relação à utilização dos recursos naturais. Tem alcance mundial. 3.7. Princípio da cooperação. - Os países têm que se pautar pela busca da cooperação internacional. Também aqui se inclui a responsabilidade por ações e omissões cometidas num dado território que podem afetar seus vizinhos. Os países têm responsabilidades ambientais comuns, mas diferenciadas, segundo seu desenvolvimento e sua capacidade. - Reconhece-se como Princípio do Direito Internacional Público, o dever de cooperação. Decorrente disto, o Princípio em apreço refere-se às ações cooperativas em favor do meio ambiente. Não só no domínio específico do Direito Internacional, mas nas relações entre as nações. Neste princípio está incluída a cooperação no sentido de repassar os conhecimentos de tecnologia limpa e conhecimentos de proteção do ambiente obtidos pelos países mais avançados e que têm possibilidade econômica de investir e obter resultados nas pesquisas ambientais. - A cooperação internacional expressa-se na solidariedade entre os povos. Até porque, aduz-se, é máxima que as responsabilidades são comuns, mas diferenciadas, esclarecendo que os Países desenvolvidos o fizeram à custa de intensa exploração e contaminação do meio ambiente e, agora, espera-se que tais Países cooperem com os não desenvolvidos ou em desenvolvimento, para que possam minimizar os danos na sua busca legítima pelo desenvolvimento. Seu alcance é mundial e sua positivação no direito brasileiro consta na própria Constituição Federal, quando se refere à cooperação entre os povos como um princípio a ser utilizado nas relações internacionais pelo Brasil (art. 4º, IX). 3.8. Princípio do limite. - Compete ao Estado, como mantenedor da res publica, definir os padrões de qualidade ambiental que têm de ser obedecidos pelos cidadãos. A máquina administrativa estatal dispõe de mecanismos de frenagem contra os abusos individuais.21 - O princípio do limite constitui-se como balizador das emissões de poluentes, qualquer que seja a espécie e os limites do poder de polícia administrativa são demarcados pelo interesse social em conciliação com os direitos fundamentais do cidadão.22 3.9. Princípio do poluidor-pagador. - O poluidor tem que arcar com o ônus dos danos de sua atividade. O que se quer é a prevenção, a precaução, o cuidado prévio (aqui, cabe ao potencial poluidor custeá-los). Entretanto, ocorrida a degradação e a poluição, cabe ao poluidor pagar tal reparação. - Busca-se compensar a degradação (externalidades negativas), haja vista o dano ser coletivo e o lucro recebido pelo particular privado. É uma forma de 21 Art. 78, CTN: Considera-se poder de polícia a atividade da Administração Pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, a disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais e coletivos. 22 O poder de polícia ambiental, que reflete o princípio do limite, possui atributos específicos e peculiares ao seu exercício, quais sejam: a) discricionariedade – entendida como a livre escolha de exercer seu poder; b) auto-executoriedade – execução direta das decisões, sem a necessidade da intervenção do poder judiciário; c) coercibilidade – imposição coativa das medidas adotadas pela administração. compensar essa capitalização do lucro e a socialização do dano. O poluídor deve arcar com todos os ônus de seus atos, com o custo da produção.23 - Em razão da limitação dos recursos naturais, entende-se que o mercado deve suportar o encargo, principalmente às custas de quem aufere mais lucros com a exploração da natureza. Portanto, a finalidade deste princípio é a de impedir riscos e responsabilizar o custo ambiental coletivo, em nome da privatização dos lucros advindos da exploração de alguma atividade que importe degradação. - Está positivado na legislação brasileira, no art. 14 da Lei 6.938/81, a qual introduziu no direito brasileiro a responsabilidade objetiva do poluidor e, por extensão, aos causadores do danos ambiental, já que pela legislação, a poluição é uma espécie de degradação. 23 TRENNEPOHL, Terence Dornelles. Fundamentos de Direito Ambiental. Salvador: JusPodivm, 2007, p. 46 4. Tutela Constitucional do Meio Ambiente. 4.1. O art. 225 da Constituição Federal - Do Bem Jurídico Tutelado. - Ao considerar o meio ambiente como um direito de todos e ao impor à coletividade e ao poder público o dever de preservação, o constituinte de 1988 estabeleceu a natureza difusa do bem ambiental, ao defini-lo como de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.24 - A análise do art. 225 deve estar em consonância com o art. 1º, III, que considera como um dos fundamentos da RF do Brasil a “dignidade da pessoa humana” e o caput do art. 5º, o qual elenca o “direito à vida” como direito fundamental do cidadão. Assim, a essência do bem ambiental é a proteção da vida, no caso, esta proteção diz respeito a um conceito de vida sadia, como um direito indisponível e indivisível.25 - Em suma, não existe valor mais importante do que a proteção da vida. Contudo, considerando-se a relevância desse valor para o desenvolvimento do ser humano, podemos concluir, de acordo com a lição de José Afonso da Silva: “que não é tanto o meio ambiente considerado nos seus elementos constitutivos. O que o Direito visa proteger é a qualidade do meio ambiente em funçãoda qualidade de vida, ou seja, a qualidade do meio ambiente converte-se, assim, num bem, que o direito reconhece e protege como patrimônio ambiental”. - Tal conclusão é alcançada pela observação do art. 225 da CF, que utiliza a expressão sadia qualidade de vida. De fato, enfatiza José Afonso da Silva, “o legislador constituinte optou por estabelecer dois objetos de tutela ambiental: um imediato, que é a qualidade do meio ambiente, e outro mediato, que é a saúde, o bem-estar e a segurança da população, que se vêm sintetizando na expressão da qualidade de vida”.26 - Isto posto, a qualidade ambiental, enquanto condições do ambiente, utiliza-se de parâmetros que levam em conta as atividades humanas, as quais podem melhorar ou não esta qualidade. Assim, a qualidade ambiental que é objeto de proteção constitucional, é aquela que permite a existência humana digna. - Por fim, o bem ambiental objeto da tutela jurídica não é, somente, a sua qualidade, mas todos os seus componentes naturais e artificiais, em conjunto ou isoladamente considerados. Neste sentido, destaca Celso Fiorillo: “a divisão do meio ambiente em aspectos que o compõem busca facilitar a identificação da atividade degradante e do bem imediatamente agredido. Não se pode perder de vista que o direito ambiental tem como objeto maior tutelar a vida saudável, de modo que a classificação apenas identifica o aspecto do meio ambiente em que valores maiores foral aviltados”.27 24 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo–se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 25 Da análise do art. 225 da Carta Magna, percebe-se, a partir de seu conteúdo perfeitamente sistematizado, que as diretrizes para proteção do patrimônio ambiental brasileiro já nasceram em perfeita sintonia com os princípios fundamentais estabelecidos na própria Constituição (art. 1º, I a IV e caput do art. 5º). Neste caso, a essência do patrimônio ambiental é a proteção da vida, não obstante, esta proteção diz respeito a um conceito de vida sadia, a qual depende de um ambiente ecologicamente equilibrado para que se possa cumprir o princípio síntese que é a “dignidade da pessoa humana”. 26 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro, 2a. ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 18- 19. 27 Op. cit. p. 19. Álvaro Luiz Valery Mirra, verifica que a tendência é considerar o ambiente como macrobem através de uma visão globalizada e integrada (ver art. 3º, I, Lei 6.938/81 – que aponta o meio ambiente como um bem incorpóreo e - Assim, podemos ter a seguinte classificação doutrinária de Meio Ambiente: ⊗ Meio ambiente natural: aquele constituído por si só, independentemente da influência do homem. Compreende o solo, água, ar atmosférico, flora, fauna, a biosfera de uma forma geral (art. 225, § 1º, I a VII). Caracteriza-se pelo equilíbrio dinâmico, o qual deve estar presente em qualquer tipo de ecossistema; ⊗ Meio ambiente artificial: aquele decorrente da ação humana. É formado pelo espaço urbano construído, englobando o conjunto de edificações e os equipamentos públicos, como ruas, praças, áreas verdes, e demais logradouros públicos (arts. 225; 182; 21, XX; entre outros, todos da CF); ⊗⊗⊗⊗ Meio ambiente cultural: formado pelo patrimônio artístico, histórico, turístico, paisagístico, arqueológico, espeleológico, etc (arts. 225; 216, da CF). Na realidade, também decorre da ação humana, que atribui valores especiais a determinados bens do patrimônio cultural do país; ⊗ Meio ambiente do trabalho: significa qualquer local onde se desenvolva atividade humana com vistas à produção de bens e serviços para a geração de lucro (arts. 225; 200, VIII, da CF). ☻ Pressupostos para o Entendimento do Tema: ⊗⊗⊗⊗ Devemos entender a Constituição como um Sistema, onde todos os subsistemas estão em harmonia (interação dinâmica) e, por conseguinte, devem observar o comando constitucional (sistema), a fim de cumprir as funções por ele estabelecidas, dentre elas o cumprimento do princípio síntese/meta, qual seja a Dignidade da Pessoa Humana. ⊗⊗⊗⊗ Os direitos constitucionais, notadamente os fundamentais têm uma função orientadora de todo o ordenamento jurídico, logo, toda a interpretação deve ser conforme a constituição, já que esta se encontra no ápice de nosso sistema jurídico (princípio da supremacia da norma constitucional). ⊗⊗⊗⊗ Do extraído da norma do art. 225 da CF, o legislador constituinte ao proteger o meio ambiente, quer que possa haver vida digna (sadia qualidade de vida com base no piso vital mínimo – art. 6º) à atual e futuras gerações (caráter antropocêntrico do direito ambiental). ⊗⊗⊗⊗ Ante a tais orientações e visto que um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da CF), resta-nos o entendimento de ser o homem o destinatário de toda e qualquer norma jurídica e detentor da titularidade dos direitos expressos constitucionalmente (o direito ambiental brasileiro é eminentemente antropocêntrico)28. imaterial. Já os elementos corpóreos integrantes do meio ambiente tem conceituação e regime próprios e estão submetidos a uma legislação própria e específica à legislação setorial (código floresta, lei de proteção à fauna, código de águas, etc.). Assim, quando se fala na proteção dos elementos citados, por exemplo, não se busca propriamente a proteção desses elementos em si, mas deles como elementos indispensáveis à proteção do meio ambiente como bem imaterial, objeto último e principal visado pelo legislador (In Fundamentos do direito ambiental no Brasil. Revista Trimestral de Direito Público, São Paulo, v. 7, p. 179, 1994. Na concepção de microbem ambiental, isto é, dos elementos que o compõem (floresta, rios, propriedade de valor paisagístico, etc.), o meio ambiente pode ter o regime de sua propriedade variado, ou seja, público e privado, no que concerne à titulariedade dominial. Na outra categoria, ao contrário, é um bem qualificado como de interesse público; seu desfrute é necessariamente comunitário e destina-se ao bem-estar individual. Observa-se que o regime de propriedade variada está sujeito à função social e ambiental de seu aproveitamento, respeitando a qualidade de vida e a sustentabilidade conforme disposição constitucional. 28 A despeito desse caráter, a CF/88 não contemplou o ambiente como mero instrumento para o proveito econômico e a geração de riquezas. Os fortes delineamentos econômicos de ordem constitucional são conformados com a 4.2. Da significação geral dos enunciados do art. 225. - Costuma-se dividir o art. 225 em três partes distintas: a regra-matriz, os instrumentos de garantia e as determinações particulares.29 Trata-se do reconhecimento do meio ambiente como direito fundamental, impondo-se a obrigatoriedade de sua proteção, por tratar de bem de uso comum do povo, sendo essencial à sadia qualidade de vida.30 ► Regra-matriz – o caput do artigo. a) meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito de todos – pertence a todos, incluindo aí as gerações presentes e as futuras, sejam brasileiros ou estrangeiros – combinar essa assertiva com o princípio do direito humano fundamental. b) meio ambiente é bem de uso comum do povo – é um bem que não está na disponibilidade particular de ninguém, nem de pessoa privada, nem de pessoa pública – combinar essa assertiva com o princípio do poluídor-pagador. c) meio ambiente é essencial à sadia qualidade devida – não existe sadia qualidade de vida em um ambiente poluído ou degradado – combinar essa assertiva com o princípio do direito humano fundamental. - A análise do caput do art. 225, demonstra a concepção jurídica conferida ao bem ambiental pelo Estado brasileiro, no sentido de não apenas conferir o meio ambiente saudável como direito subjetivo. Ou seja, a CF/88 contemplou o meio ambiente como bem que perpassa a concepção individualista dos direitos subjetivos, pois reputou como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. - Tal concepção serve como limite ao exercício de direitos subjetivos, no sentido de que a garantia de preservação do meio ambiente está dissociada da idéia de posição jurídica individual no que se refere a um pretenso direito subjetivo ao bem ambiental. ► Os instrumentos de garantia - §1º, incumbe ao poder público: I – preservar os processos ecológicos essenciais (aqueles que asseguram as condições necessárias para uma adequada interação biológica). Com o provimento do manejo ecológico das espécies (significa lidar com as espécies de modo a conservá–las, recuperá–las, quando for o caso). Com o provimento do manejo dos ecossistemas (significa cuidar do equilíbrio das relações entre a comunidade biótica e o seu habitat). II - preservar a diversidade31 e a integridade do patrimônio genético – preservar todas as espécies, através do fator caracterizante e diferenciador da imensa quantidade de espécies vivas do País. III - definir espaços territoriais e seus componentes – significa estabelecer a delimitação da área ecologicamente relevante, onde o uso do patrimônio, ali inserido, ficará condicionado às disposições constantes de Lei.32 proteção ambiental. Assim, o art. 170, VI, ao assegurar a livre a iniciativa, coloca a defesa do meio ambiente como princípio geral da atividade econômica. A mesma diretriz segue o art. 186, ao dispor sobre a função sócio-ambiental da propriedade. Tal dispositivo, ao valorizar o aproveitamento econômico do ambiente (aspecto econômico), estatui que deve ser realizado de acordo com o aproveitamento racional e adequado dos recursos naturais e com a preservação do meio ambiente (In LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e Estado – Direito Ambiental Constitucional Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 140). 29 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional, São Paulo: Malheiros, 2006; SIRVINSKAS, Luis Paulo. Manual de Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2002; MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. São Paulo: RT, 2004. 30 Combinar sempre a redação do caput do artigo com os princípios que regulam o direito ambiental. Por exemplo, não ocorreria conflito se o princípio do desenvolvimento sustentável fosse sempre aplicado às atividades econômicas. Ainda, o planejamento do desenvolvimento deve acompanhar os princípios do equilíbrio, do limite, do poluído-pagador, e de todos os outros que buscam o crescimento econômico aliado à preservação. 31 Art. 2º, III, Lei 9.985/2000. a) Unidades de proteção integral (UPI): Estação Ecológica (EE), Reserva Biológica (RB), Parque Nacional (PN), Monumento Natural (MN), Refúgio de Vida Silvestre (RVS). b) Unidades de uso sustentável (UUS): Área de Proteção Ambiental (APA), Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), Floresta Nacional (FLONA), Reserva Extrativista (RESEX), Reserva de Fauna (RF), Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS), Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). IV - Estudo Prévio de Impacto Ambiental – constitui um instrumento de prevenção de degradações irremediáveis. Exige-se estudo de impacto ambiental para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente. Esse estudo deve ser realizado previamente à autorização de obra e/ou de qualquer atividade, não podendo o EIA ser concomitante ou posterior à obra ou atividade, sob pena de malferir o próprio resultado do estudo e tornar sem efeito sua finalidade preventiva.33 V – controle relativo a tudo que diz respeito a substâncias que importem risco para o meio ambiente – ver princípio do limite (cabe ao poder público a regulação das atividades do particular quando contrapostos aos interesses da coletividade). VI - promover a Educação Ambiental – significa, no futuro, o exercício - de práticas conscientes.34 VII – proteção da fauna e flora, como formas de composição do ecossistema.35 ► As determinações particulares - §2º-6º: §2º - Prevê a responsabilização daquele que explorar recursos minerais, com a conseqüente recuperação do meio ambiente – está ligado ao princípio da responsabilidade.36 §3º - Prevê a responsabilização por infrações – também ligado ao princípio da responsabilidade e com a lei dos crimes ambientais. “É poluidor a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental; o poluídor, por seu turno, com base na mesma legislação, art. 14 – ‘sem obstar a aplicação das penalidades administrativas’ é obrigado, ‘independentemente da existência de culpa’, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, ‘afetados por sua atividade’. Depreende-se do texto legal a sua responsabilidade pelo risco integral, por isso que em demanda infensa a administração, poderá, inter partes, discutir a culpa e o regresso pelo evento”. (REsp 442586/SP, Rel. Min. Luiz Fux, j. 26.11.02, DJ 24.02.03). §4º - A CF/88 define como patrimônio nacional a floresta amazônica brasileira, a mata atlântica, a serra do mar, o pantanal mato-grossense e a zona costeira.37 32 Art. 2º, I, Lei 9.985/2000. 33 Quanto à significativa degradação, leva-se em conta toda e qualquer agressão ambiental que venha a causar dano sensível, ainda que não seja excessivo. Sobre o EIA, ver as Resoluções CONAMA 001/86 e 237/98. 34 Ver Lei 9.795/99 – dispõe sobre a Política Nacional de Educação Ambiental. 35 Ver Lei 9.605/98; Lei 4.771/65. 36 Ver Decreto 227/67 (Código de Mineração). 37 A intenção do legislador foi tratar com mais atenção essas áreas, dedicando-lhes especial enquadramento constitucional. §5º - Trata da indisponibilidade das terras devolutas38 ou arrecadadas pelos Estados quando necessárias á proteção dos ecossistemas naturais. §6º - Trata da necessidade de lei federal para a instalação de usinas nucleares, cuja competência pertence a União. - No caso da CF/88, verifica-se que o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado se insere ao lado do direito à vida, à igualdade, à liberdade, caracterizando-se pelo cunho social amplo e não meramente individual. Da leitura global dos diversos preceitos constitucionais ligados à proteção ambiental, chega-se à conclusão de que existe verdadeira consagração de uma política ambiental, como também de um dever jurídico constitucional atribuído ao Estado e à coletividade. - Em síntese, o Estado deve fornecer os meios instrumentais necessários á implementação do direito ao meio ambiente ecologicamente. Já a coletividade deve abster-se de práticas nocivas ao meio ambiente e, por outro lado, deve se empenhar para implementar o gozo daquele direito, participando ativamente das ações voltadas á proteção do meio ambiente. - O que é realmente inovador no art. 225 é o reconhecimento da indissolubilidade do vínculo Estado-sociedade civil (interesses públicos e privados),o qual redunda em verdadeira noção de solidariedade em torno de um bem comum. 38 São aquelas pertencentes ao poder público, mas que ainda não foram tituladas (Decreto-lei 9.760/46). 5. Da Repartição de Competências. - Competência é a capacidade jurídica de uma corporação pública para agir, emitir decisões. É o poder de que servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções. Também pode ser compreendida como a congregação das atividades juridicamente conferidas a determinado nível de governo visando a emissão das suas decisões no cumprimento do dever de defender e preservar o meio ambiente.39 - Segundo Edis Milaré, essas competências desdobram–se em dois segmentos: a) Competências administrativas (ou de execução de tarefas) – as que conferem ao Poder Público o desempenho de atividades concretas, através do exercício do seu poder de polícia. - A proteção do meio ambiente como um todo, bem como o combate a poluição em qualquer de suas formas, a preservação das florestas, da flora e da fauna, e a exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios, estão incluídas entre as matérias de Competência Comum (art. 23, III, VI e VII). - Esta competência comum de que trata o art. 23, na realidade se refere a uma cooperação administrativa, a qual para José Cretella “Competência Comum é cooperação administrativa, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento do bem estar, em âmbito nacional, entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios...”. - Lei Complementar irá estabelecer a forma como as instâncias de poder cuidarão das matérias elencadas no art. 2340. Enquanto esta Lei não sair, a responsabilidade pela proteção do meio ambiente é comum e solidária, ou seja, todos são co-responsáveis. - A problemática está em saber, em cada caso concreto de competência comum, a que ente público está afeto o poder de polícia ambiental. A doutrina corrente interpreta a regra do art. 23 da CF da seguinte forma: a) matérias de interesse local - isto é, aquelas que não extrapolam os limites físicos do Município, devem ser administradas pelo Executivo Municipal. b) quando a matéria extrapola os limites físicos de um Município ou envolva mais de um Município, desloca–se a competência do executivo Municipal para o executivo Estadual; ou ainda tratando–se de bens públicos estaduais e de questões ambientais supramunicipais, a competência também será do Executivo Estadual. c) nas hipóteses em que as matérias envolvam problemas internacionais de poluição transfronteiriça ou em duas ou mais unidades federadas, a competência será do Executivo Federal. 39 A Constituição busca realizar o equilíbrio federativo através de um sistema de repartição de competências que se fundamenta na técnica de enumeração dos poderes da União, com poderes remanescentes para os Estados, e poderes definidos indicativamente para os Municípios. Combinadas a essa reserva de campos específicos, o texto prevê ainda atuações comuns entre os entes, prerrogativas concorrentes entre a União, os Estados e o DF e atribuições suplementares dos Municípios. Competências ambientais pode ser compreendida como a congregação das atribuições juridicamente conferidas a determinado nível de governo visando a emissão das suas decisões no cumprimento do dever de defender e preservar o meio ambiente. 40 Parág. único, art. 23, CF. b) Competências legislativas – que tratam do poder outorgado a cada ente federado para elaboração das leis e atos normativos. Na repartição de competências legislativas aplica–se o Princípio da Predominância do Interesse, cabendo à União legislar sobre as matérias de interesse nacional, aos Estados as de interesse regional, enquanto aos Municípios as de interesse meramente local. - O art. 24 e incisos I, VI e VII da CF/88, determina competir à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: florestas, caça, pesca, fauna, conservação, defesa do meio ambiente e dos recursos naturais, proteção ao meio ambiente e controle da poluição, proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico. - Pode-se observar que este artigo não explicita a competência legislativa do Município, o que pode levar à conclusão precipitada de que o Município não tem competência legislativa em matéria ambiental. Porém, ao observarmos os artigos 23, 30 e 225 da CF/88, observa-se que o Município pode legislar em matéria ambiental. ► No âmbito da competência concorrente: - A competência concorrente implica que a União deve estabelecer parâmetros gerais a serem observados pelos Estados e Municípios. - A União legislará e atuará em face de questões de interesse nacional, e as suas normas devem servir de referencial para os Estados e Municípios. - Os Estados legislarão diante de problemas regionais, devendo observar os princípios e fundamentos genéricos previstos pela legislação federal. - Os Municípios legislarão apenas quando o interesse for estritamente local, devendo observar os princípios e fundamentos genéricos previstos pela legislação federal. - Caso a União não legisle sobre normas gerais, os Estados podem ocupar os espaços em branco, exercendo a Competência Legislativa Plena para atender às suas peculiaridades. Contudo, a superveniência de Lei Federal sobre normas gerais suspende a Lei Estadual no que lhe for contrário. - Sinteticamente temos: ☻ Repartição de Competência Material (Administrativa - CF/88): Poderes enumerados União (art. 21, XIX, XX e XXIII) Municípios (art. 30, VIII e IX) Competência Administrativa Exclusiva Poderes reservados Estados (art.25, §1º a §3º) Comum Cumulativa/paralela União (Estados), DF e Municípios (art. 23, III, IV, VI, VII e XI) ☻ Repartição de Competência Legislativa (CF/88): 1. Privativa – União (art. 22, IV, XII e XXVI - Possibilidade de delegação para os Estados (art. 22, § único) 2. Concorrente – União, Estados e Distrito Federal (art. 24, VI, VII e VIII). Obs.: Municípios não. ► União estabelece normas gerais (art. 24, § 1º). ► Estados e Distrito Federal têm, competência suplementar complementar, quando se limitam a detalhar a norma federal (art. 24, §2º). ► Estados e Distrito Federal têm, competência suplementar supletiva, quando suprem lacunas existentes na lei federal (art. 24, §3º). 3. Remanescente – Estado (art. 25, §1º e 3º). Toda matéria que não for atribuída à União e aos Municípios caberá, de forma remanescente, aos Estados. 4. Municípios ► Exclusiva – art. 30, I. ► Suplementar – art. 30, II – Não para editar legislação concorrente, mas sim para editar legislação decorrente (a norma federal ou estadual deverá preexistir à norma municipal). 5. Distrito Federal – reservada (art. 32, §1º). - Com base no que se demonstrou nos quadros acima, transcrevemos abaixo os dispositivos constitucionais de maior interesse: Art. 21 - Compete à União: XIX - instituir Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso. XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos. XXXIII – explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer o monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições Art. 22 - Compete privativamente à União legislar sobre: IV águas, energia... XII jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia. XXVI – atividades nucleares de qualquer natureza.
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