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Texto 3 - A Globalização da Pobreza - Cáp 1

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TEXTO Nº 3
A Globalização da Pobreza, de Michel Chossudovsky. Editora global. Capítulo l
A GLOBALIZAÇÃO DA POBREZA
Desde o começo dos anos 80, os programas de "estabilização macroeconômica" e de "ajuste estrutural" impostos pelo FMI e pelo Banco Mundial aos países em desenvolvimento (como condição para a renegociação da dívida externa) têm levado centenas de milhões de pessoas ao empobrecimento. Contrariando o espírito do acordo de Bretton Woods, cuja intenção era a "reconstrução econômica" e a estabilidade das principais taxas de câmbio, o programa de ajuste estrutural (PAE) tem contribuído amplamente para desestabilizar moedas nacionais e arruinar as economias dos países em desenvolvimento.
O poder de compra interno entrou em colapso, a fome eclodiu, hospitais e escolas foram fechados, centenas de milhões de crianças viram negado seu direito à educação primária. Em várias regiões do mundo em desenvolvimento, as reformas conduziram ao ressurgimen​to de doenças infecciosas, entre elas a tuberculose, a malária e o cóle​ra. Embora a missão do Banco Mundial consista em "combater a pobreza" e proteger o meio ambiente, seu patrocínio para projetos hidrelétricos e agroindustriais em grande escala também tem acelerado o processo de desmatamento e de destruição do meio ambiente, causando a expulsão e o deslocamento forçado de vários milhões de pessoas.
Geopolítica Global
Após a Guerra Fria, a reestruturação macroeconômica passou a contemplar interesses geopolíticos globais. O ajuste estrutural é usado para minar a economia do antigo bloco soviético e desmantelar seu sistema de empresas estatais. Desde o fim da década de 80, o "remé​dio econômico" do FMI-Banco Mundial vem sendo aplicado no Leste Europeu, na lugoslávia e na ex-União Soviética, com conseqüências econômicas e sociais devastadoras.
Embora com mecanismos de coação diferentes, o PAE também tem sido aplicado nos países desenvolvidos, desde a década de 1990. Não obstante as terapias macroeconômicas (sob a jurisdição dos governos nacionais) tenderem a ser menos cruéis que as impostas no Sul e no Leste, os fundamentos teóricos e ideológicos são muito similares. Os mesmos interesses financeiros globais são atendidos. O monetarismo é aplicado em escala mundial e o processo de reestruturação econômica global também atinge bem no coração os países ricos. As con​sequências são o desemprego, os baixos salários e a marginalização de amplos setores da população. Cortam-se os gastos sociais e muitos dos benefícios conquistados na área do bem-estar social são cancelados. As políticas do Estado têm causado a destruição das pequenas e médias empresas. Nos países ricos, os baixos níveis de consumo de alimentos e a desnutrição estão atingindo também os pobres das cida​des. Segundo um estudo recente, 30 milhões de pessoas nos Estados Unidos são classificadas como "famintas"1.
Desde a metade dos anos 80, o impacto do ajuste estrutural, in​cluindo a derrogação dos direitos sociais das mulheres e as conseqüências ambientais nocivas da reforma econômica, tem sido fartamente documentado. Apesar de as instituições de Bretton Woods terem reconhecido "o impacto social do ajuste", não se visualiza uma mudança de direção da política. Na verdade, desde o fim dos anos 80, coincidindo com o colapso do bloco oriental, as prescrições políticas do FMI-Banco Mundial (agora impostas em nome da "diminuição da pobreza") têm se tornado cada vez mais severas e inexoráveis.
A polarização social e a concentração da riqueza
No Sul, no Leste e no Norte, uma minoria social privilegiada acumulou grande riqueza em prejuízo da grande maioria da população. Essa nova ordem financeira internacional é nutrida pela pobreza humana e pela destruição do meio ambiente. Ela gera a apartheid social, estimula o racismo e os conflitos étnicos, solapa os direitos das mulheres e, freqüentemente, precipita países em confrontos destrutivos entre nacionalidades. Além disso, as reformas — visto que são aplicadas si​multaneamente em mais de cem países — levam a uma globalização da pobreza, processo que aniquila a subsistência humana e destrói a sociedade no Sul, no Leste e no Norte.
O papel das instituições globais
As instituições globais desempenham um papel importante no pro​cesso de reestruturação das economias nacionais. A ratificação do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) e a formação da Organização Mun​dial de Comércio (OMC) em 1995 constituem um marco no desenvolvimento do sistema econômico global. A missão da OMC consiste em regulamentar o comércio mundial em benefício dos bancos internacio​nais e das corporações transnacionais, bem como em "supervisionar" a vigência das políticas de comércio nacional. O GATT viola os direitos fundamentais dos povos, particularmente nas áreas de investimento estrangeiro, biodiversidade e direitos de propriedade intelectual.
Em outras palavras, uma nova "divisão triangular de autoridade" surgiu, baseada na estreita colaboração entre o FMI, o Banco Mundial e a OMC para "vigiar" a política econômica dos países em desenvolvimento. Sob a nova ordem do comércio (que surgiu da conclusão da Rodada Uruguai, em Marrakesh, e da criação da OMC em 1995), a rela​ção entre as instituições sediadas em Washington e os governos nacionais foi redefinida. A imposição das prescrições políticas do FMI-Banco Mundial deixou de depender apenas dos acordos de empréstimo de nível nacional (que não são documentos "geradores de obrigação legal"). Muitas das cláusulas do PAE (por exemplo, a liberalização do co​mércio e o regime de investimento estrangeiro) foram inseridas de for​ma permanente nos artigos do acordo da OMC. Esses artigos têm ser​vido de base para "controlar" países (e impor "condicionalidades") de acordo com a lei internacional.
O cardápio do FMI
O mesmo cardápio de austeridade orçamentária, desvalorização, liberalização do comércio e privatização é aplicado simultaneamente em mais de cem países devedores. Estes perdem a soberania econômica e o controle sobre a política monetária e fiscal; seu Banco Central e Ministério da Fazenda são reorganizados (freqüentemente com a cumplicidade das burocracias locais); suas instituições são anuladas e é ins​talada uma "tutela econômica". Um "governo paralelo" que passa por cima da sociedade civil é estabelecido pelas instituições financeiras in​ternacionais (IFIs). Os países que não aceitam as "metas de desempenho" do FMI são colocados na lista negra.
Embora adotado em nome da "democracia" e do chamado "bom governo", o PAE requer o reforço do aparato de segurança interna: a repressão política — em conluio com as elites do Terceiro Mundo — apóia um processo paralelo de "repressão econômica".
O "bom governo" e a manutenção de eleições multipartidárias são condições adicionais impostas pêlos doadores e credores. Todavia a própria natureza das reformas econômicas impede uma genuína de​mocratização — isto é, sua implementação requer (contrariando o espí​rito do liberalismo anglo-saxão) invariavelmente o apoio do Exército e do Estado autoritário. O ajuste estrutural promove instituições falsas e uma democracia parlamentar fictícia, que, por sua vez, patrocina o pro​cesso da reestruturação econômica.
Em todo o Terceiro Mundo, a situação é de desespero social e falta de perspectivas para uma população empobrecida pelo jogo interativo das forças do mercado. As manifestações e as revoltas populares contra o PAE são brutalmente reprimidas. Caracas, 1989: o presidente Carlos Andrés Pérez, depois de ter denunciado enfaticamente o FMl por praticar "um totalitarismo econômico que mata, não com balas ias pela fome", decretou estado de emergência e enviou unidades regulares de infantaria e fuzileiros navais para invadir as áreas de extrema pobreza (favelas) situadas nos morros que olham de cima a capital. As manifestações de protesto contra o FMI, em Caracas, eclodiram em razão de um aumento de 200% no preço do pão. Homens, mulheres e crianças foram fuzilados indiscriminadamente: "Veiculou-se que o necrotério de Caracas tinhaduzentos corpos nos três primeiros dias [...] e que os caixões funerários estavam se acabando". Extra-oficialmente, morreram mais de mil pessoas. Túnis, janeiro de 1984: manifestações nstigadas em grande parte pêlos jovens desempregados, em protesto Contra o aumento dos preços dos alimentos. Nigéria, 1989: as manifes​tações estudantis contra o PAE resultaram no fechamento de seis uni​versidades do país pelo Conselho das Forças Armadas. Marrocos, 1990: greve geral e revolta popular contra as reformas do governo patrocina​das pelo FMI. México, 1993: insurreição do Exército de Libertação Zapatista, na região de Chiapas, sul do país. Federação Russa, 1993: ma​nifestações de protesto e invasão do Parlamento russo pelo povo, e assim por diante. A lista é longa.
Genocídio económico
O ajuste estrutural é conducente a uma forma de "genocídio econômico" levado a cabo pela deliberada manipulação das forças do mercado. Comparando-o a outros tipos de genocídio, em vários perío​dos da história colonial (por exemplo, trabalhos forçados e escravidão), seus impactos sociais são devastadores. Os PAEs afetam diretamente a subsistência de mais de quatro bilhões de pessoas. Sua aplicação em grande número de países devedores favorece a "inter​nacionalização" da política macroeconômica sob o controle direto do FMI e do Banco Mundial, atuando em nome de poderosos interesses políticos e financeiros (por exemplo, os Clubes de Londres e de Paris, o G-7). Essa nova forma de dominação econômica e política — de "colonialismo de mercado" — subordina o povo e os governos por meio da interação aparentemente "neutra" das forças do mercado. A burocracia internacional sediada em Washington foi investida, pêlos credores internacionais e corporações multinacionais, do poder de execução de um plano econômico global que afeta a subsistência de mais de 80% da população mundial. Em nenhuma época da história o "livre" mercado — operando no mundo por meio dos instrumentos da macroeconomia — desempenhou um papel de tal importância na determinação do destino de nações "soberanas".
Destruindo a economia nacional
A reestruturação da economia mundial sob a orientação das insti​tuições financeiras sediadas em Washington nega cada vez mais aos países em desenvolvimento a possibilidade de construir uma economia nacional: a internacionalização da política macroeconômica transforma países em territórios econômicos abertos e economias nacionais em "reservas" de mão-de-obra barata e de recursos naturais. A aplicação do "remédio econômico" do FMI tende a desvalorizar mais ainda os preços mundiais das commodities, porque isso força diferentes países a dirigirem simultaneamente suas economias nacionais para um mer​cado mundial retraído.
No centro do sistema econômico global repousa uma estrutura desigual de comércio, produção e crédito que define o papel e a posi​ção dos países em desenvolvimento na economia global. Qual é a natu​reza desse emergente sistema econômico mundial? Em que estrutura de pobreza global e desigualdade de renda ele se baseia? Na virada do século, a população do mundo deverá passar de 6 bilhões, dos quais 5 bilhões estarão vivendo em países pobres. Enquanto os países ricos (onde vivem aproximadamente 15% da população mundial) controlam 80% do total da renda mundial, o grupo dos "países de baixa renda" (56% da população mundial, incluindo as da índia e da China), com mais de 3 bilhões de habitantes, recebeu, em 1993, aproximadamente 5% do total da renda mundial, percentual menor que o PIB da França e seus territórios ultramarinos. Com uma população de mais de 600 mi​lhões, a África subsaariana como um todo apresenta aproximadamente a metade do PIB do estado do Texas. O conjunto dos países de média e baixa rendas (entre eles, os antigos países "socialistas" e a ex-União Soviética), representando cerca de 85% da população mundial, recebe aproximadamente 20% do total da renda mundial.
Em muitos países endividados do Terceiro Mundo, o valor real dos salários no setor moderno declinou mais de 60% desde o começo dos anos 80. A situação do setor informal e do desemprego é ainda mais crítica. Na Nigéria, durante o governo militar do general Ibrahim Babangida, por exemplo, o valor do salário mínimo diminuiu cerca de 85% no curso dos anos 80. No Vietnã, os salários estavam abaixo de US$ 10 mensais enquanto o preço interno do arroz havia alcançado o nível mundial, como resultado do programa do FMI posto em prática pelo governo de Hanói: um professor de escola secundária da capital vietnamita, por exemplo, com grau universitário, recebia em 1991 um salário mensal de nos de US$152 (ver Capítulo 9). No Peru, após o Fujichoque, patrocinado pelo FMI-Banco Mundial e implementado pelo presidente Alberto Fujimori, em agosto de 1990, os preços dos combustíveis aumentaram 31 vezes da noite para o dia, enquanto o preço do pão elevou-se 12 vezes. O valor real do salário mínimo, por sua vez, tinha decrescido cerca 190% (em relação a seu nível na metade dos anos 70).
A dolarização dos preços
Enquanto há grande variação no custo de vida entre os países em desenvolvimento e os desenvolvidos, a desvalorização combinada com a liberalização do comércio e a desregulamentacão do mercado local de commodities (dentro do PAE) levam à "dolarizacão" dos preços domés​ticos. Estes, no que diz respeito aos gêneros de primeira necessidade, são crescentemente elevados a seus níveis de mercado mundial. Essa nova ordem económica mundial, embora tendo por base a internacio​nalização dos preços das commodities e um mercado mundial de com​modities totalmente integrado, funciona cada vez mais em termos de uma nítida separação entre dois "mercados de trabalho" distintos. Em outras palavras, esse sistema de mercado global caracteriza-se por uma dualidade na estrutura de salários e do custo da mão-de-obra que pola​riza países ricos e pobres. Ao mesmo tempo em que os preços são unificados e elevados a níveis mundiais, os salários (e o custo da mão-de-obra) no Terceiro Mundo e no Leste Europeu são setenta vezes mais baixos do que nos países da OCDE.
As disparidades de renda entre as nações são sobrepostas às dis​paridades de renda extremamente amplas entre grupos sociais e grupos de renda de cada nação. Em muitos países do Terceiro Mundo, pelo menos 60% da renda nacional está concentrada nos 20% representados pela população de alta renda. Em muitos países em desenvolvimento de média e baixa rendas, 70% das famílias das zonas rurais percebem, per capita, entre 10% e 20% da média nacional. Essas vastas disparidades entre os países e dentro deles são conseqüência da estrutura do comér​cio de commodities e da divisão internacional desigual do trabalho, que atribui ao Terceiro Mundo, e mais recentemente aos países do antigo bloco soviético, uma posição de subordinação no sistema econômico glo​bal. As disparidades ampliaram-se durante os anos 80 e 90 como resultado do "remodelamento" das economias nacionais nos moldes do PAE3.
A “terceiro-mundização do antigo bloco oriental”.
O fim da Guerra Fria teve um profundo impacto na distribuição global da renda. Até pouco tempo, o Leste Europeu e a União Soviética eram considerados partes do "Norte" desenvolvido — isto é, com ní​veis de consumo material, educação, saúde, desenvolvimento científico, etc. amplamente comparáveis aos existentes nos países da OCDE. Embora as rendas médias estivessem no todo mais baixas, os estudio​sos do Ocidente, não obstante, reconheciam os feitos dos países do bloco oriental, particularmente nas áreas de saúde e educação
	Empobrecidos em conseqüência das reformas patrocinadas pelo FMI, estes são agora categorizados pelo Banco Mundial como "econo​mias em desenvolvimento", ao lado dos países de "baixa e média" rendas do Terceiro Mundo. As repúblicas da Ásia central aparecem, junto com a Síria, a Jordânia e a Tunísia, na categoria "renda média inferior", enquanto a Federação Russa aproxima-se do Brasil, com uma renda per capita da ordem de US$3 mil*. Essa mudança nas categorias reflete os resultados daGuerra Fria e o processo subjacente de "terceiro-mundização" do Leste Europeu e da ex-União Soviética.
A ideologia econômica distorce as causas da pobreza global
Desde o início da década de 1980, o discurso econômico dominan​te tem aumentado sua influência nas instituições acadêmicas e de pes​quisa em todo o mundo: a análise crítica é fortemente desestimulada; a realidade social e econômica deve ser vista através de um único conjunto de relações econômicas fictícias, cuja finalidade é dissimular as mani​pulações do sistema econômico global. Estudiosos das principais cor​rentes econômicas produzem teoria sem fatos ("teoria pura") e fatos sem teoria ("economia aplicada"). O dogma econômico dominante não admite nem divergências nem discussão sobre seu paradigma teórico básico: a principal função das universidades é produzir uma geração de economistas leais e confiáveis que sejam incapazes de desvendar os fundamentos sociais da economia de mercado global. Da mesma forma, intelectuais do Terceiro Mundo são cada vez mais recrutados para apoiar o paradigma neoliberal; a internacionalização da "ciência" econômica apóia sem reservas o processo de reestruturação econômica global.
Esse dogma neoliberal "oficial" também cria seu próprio "contra-paradigma", incorporando um discurso altamente moral e ético, que se concentra no "desenvolvimento sustentável" e na "diminuição da po​breza", ao mesmo tempo em que distorce e "disfarça" as questões políticas referentes à pobreza, à proteção do meio ambiente e aos direi​tos sociais das mulheres. Essa "contra-ideologia" raramente desafia as prescrições da política neoliberal. Ela se desenvolve paralelamente e em harmonia com o dogma neoliberal oficial, e não em oposição a ele.
Dentro dessa contra-ideologia (que é generosamente financiada pela instituição de pesquisa), estudiosos do desenvolvimento encon​tram um confortável nicho. Seu papel é gerar (internamente a esse contradiscurso) uma aparência de debate crítico sem tocar nos fundamentos sociais do sistema de mercado global. O Banco Mundial desempenha um papel-chave nesse particular, promovendo pesquisa sobre a pobreza e as chamadas "dimensões sociais do ajuste". Esse enfoque ético e as categorias subjacentes (por exemplo, diminuição já pobreza, questões ligadas a gênero, equidade, etc.) fornecem uma "face humana" às instituições de Bretton Woods e uma aparência de compromisso com a mudança social. Todavia, uma vez que está funcionalmente divorciada de um entendimento das principais reformas macroeconômicas, essa análise raramente constitui uma ameaça para ;a agenda econômica neoliberal.
Manipulando os números da pobreza global
Embora as disparidades sociais e de renda entre as nações e den​tro destas tenham se ampliado, a realidade da pobreza mundial é cada vez mais dissimulada pela manipulação das estatísticas de renda.
O Banco Mundial "estima" que 18% do Terceiro Mundo são "ex​tremamente pobres" e 33% são "pobres". Num seu importante estu​do, que tem servido de referência sobre questões de pobreza global, a "linha de pobreza superior" é arbitrariamente estabelecida a uma renda per capita de US$ 1 por dia, correspondendo a uma renda per capita anual de US$3704. Grupos de população em países com rendas per capita excedendo US$1 por dia são arbitrariamente identificados como "não-pobres". Em outras palavras, por meio da manipulação das esta​tísticas de renda, os números do Banco Mundial servem ao útil propósito de representar o pobre nos países em desenvolvimento como um grupo minoritário.
O uso de dois pesos e duas medidas é abundante nas "medições científicas da pobreza". O Banco Mundial, por exemplo, "estima" que na América Latina e no Caribe só 19% da população são "pobres": uma grosseira distorção, quando sabemos de fato que nos Estados Unidos (com uma renda per capita anual de aproximadamente US$ 20 mil) um em cada cinco norte-americanos é considerado (pelo Escritório do Censo) como estando abaixo da linha de pobreza5
notas
1. Segundo o Centro sobre Fome, Pobreza e Política de Nutrição da Uni​versidade Tufts.
2. Entrevistas feitas pelo autor em Hanói e Ho Chi Minh, em janeiro de 1991
3. Vale observar, a esse respeito, que a participação dos países em de​senvolvimento na renda mundial total declinou substancialmente des​de a violenta investida da crise da dívida. Embora tenha aumentado sua participação na população mundial em mais de 2%, num período de três anos, entre 1988 e 1991, o grupo dos países de baixa renda teve sua participação na renda mundial reduzida de 5,4% para 4,9%. Igualmente, a participação da África subsaariana declinou, no mesmo período, de 0,9% para 0,7%. Em 1993, o Banco Mundial redefiniu a base de medida e comparação da renda per capita. Os números con​tidos na Tabela 1.1 foram corrigidos para diferenças na paridade do poder de compra.
 4. Ver World Bank, World Development Report 1990, Poverty Washina-tonDC, 1990.
 5. O Escritório do Censo dos Estados Unidos estimou (tomando por base o preço de aquisição de uma cesta básica mínima) o nível de pobreza no país em 18,2%, em 1986; ver E. Kaufman, The Economics of Labor and Labor Markets, 2. ed., Orlando, 1989, p. 649. Uma estimativa ofi​cial mais recente confirma um nível de pobreza da ordem de 20%.
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