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16-04-2008 Democracia e Cidadania Área de Integração Jorge Barbosa Jorge Barbosa 1 Democracia e Cidadania Área de Integração Os Gregos foram os primeiros a compreender que a realização e o desenvolvimento das características especificamente humanas do indivíduo pressupõem a sua integração numa comunidade. Aristóteles, por exemplo, concebia a política como uma prática que supõe uma reflexão antropológica e ética e que deve proporcionar as condições necessárias para a formação moral e política dos seus membros, especialmente a formação daqueles que iriam governar a Cidade (Polis). Espaço Público, o Domínio da Participação Política Na cidade-estado de Atenas dos séculos V e IV a. C., era a comunidade de homens livres (politai) que governava a Cidade (Polis). A vida política desenvolvia-se na praça pública, a Ágora, onde tinha lugar a discussão política. Havia, por um lado, o espaço privado (o espaço familiar), em que o poder era exercido pelo chefe de família, e, por outro, o espaço público, o lugar onde se reuniam os homens livres. A Ágora era o lugar do confronto de opiniões, da competição entre iguais. A discussão era a base do consenso acerca do tipo de leis e de decisões políticas adequadas para a realização do bem comum, no respeito pelos valores morais e políticos (a honra, a excelência de carácter, o bem e a justiça) partilhados pelos membros da cidade-estado. O cidadão é o habitante da cidade que, por ser membro de uma comunidade, adquire um determinado estatuto, a cidadania, isto é, um conjunto de direitos e de deveres, tendo à sua disposição o espaço público (lugar onde os cidadãos se encontram para conviver e para debater os problemas que dizem respeito a todos) e o espaço privado (espaço familiar que só diz respeito a um grupo restrito). A filosofia política actual realça a importância da participação política activa, como forma de influenciar e controlar a acção dos governos; por isso, um dos maiores desafios do nosso tempo é promover a participação política dos cidadãos, pois é cada vez maior o número dos que resumem a sua participação política ao acto de votar e o número dos eleitores que não votam também tem vindo a aumentar. Uma das vias para inverter esta tendência é a criação de espaços de encontro, de discussão e de debate, agradáveis e de fácil acesso, reconhecendo as organizações internacionais a importância do espaço público para discutir os problemas e os desafios com que somos confrontados. A UNESCO (a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, criada em 1946 com o objectivo de contribuir para a paz e segurança no mundo mediante a educação, a ciência e a cultura), por exemplo, afirma que um dos seus objectivos é “criar um espaço público aberto a todos”, para que “o diálogo possa adquirir uma dimensão internacional autêntica”: ligar “pensadores, responsáveis políticos e sociedade civil” para reforçar a “ligação entre a reflexão, a discussão e acção” (Consultar: http://www.unites.uqam.ca/ ). Jorge Barbosa 2 O progresso tecnológico permitiu alargar o conceito de espaço público, que, actualmente, não refere somente um lugar físico; há um espaço público virtual que permite ligar cidadãos de todo o mundo, trazendo novas oportunidades para o diálogo. Há quem afirme que os blogues e a Internet são a Ágora do nosso tempo, o espaço onde as pessoas divulgam informações, denunciam irregularidades, provocam o debate… Há ainda que ter em conta os meios de comunicação de massas, nomeadamente a TV, que também são espaços de discussão, embora muitas vezes não se apresentem como fóruns democráticos de discussão e de debate. O problema é que, embora o número de utilizadores das tecnologias de informação e comunicação esteja a crescer, sobretudo na Europa e na América do Norte, a maior parte da população do mundo não tem possibilidade de participação, pois nem sequer tem oportunidade de ir à escola. Construção da Cidadania Conceito de Cidadania Como já afirmámos, na democracia grega dos séculos V e IV a.C., cidadão era o membro da cidade- estado que participava activamente na gestão dos assuntos que diziam respeito a todos. Portanto, para os Gregos, cidadania era a expressão do direito e dever de governar, fundados na qualidade de homem livre e na relação de pertença à polis. Porém, na democracia grega, a cidadania: Era uma prerrogativa dos homens livres Excluía as mulheres, os estrangeiros e os escravos; Pressupunha uma participação activa e efectiva (conceito de cidadania activa) Na Roma antiga, o conceito de cidadania traduz o reconhecimento jurídico de inclusão. Assim, cidadão era o indivíduo que estava submetido e protegido pelas leis do Império. As concepções políticas liberais, originadas a partir da Revolução Francesa, dão expressão à cidadania moderna. A cidadania moderna é o reconhecimento universal (isto é, a todos os indivíduos, independentemente de etnia, religião, sexo, etc.) em condições de igualdade política e jurídica, do direito de integração e de participação numa comunidade. No século XX, com os movimentos sociais e a luta em prol do reconhecimento de direitos humanos universais, recupera-se a concepção de cidadania activa, isto é, o reconhecimento universal do direito e do dever de participação política, exigindo que os indivíduos e o Estado assumam os seus deveres e responsabilidades. Jorge Barbosa 3 Globalização e Cidadania (Consultar: http://www.redepaz.org/ ) A emergência da sociedade de informação e comunicação, da Internet e da globalização exige que se pense a política a um nível global. De resto, há já um número significativo de organizações e movimentos de cidadãos que usam os meios de comunicação social e os espaços públicos virtuais para discutir questões gerais (direitos humanos, globalização, problemas ambientais…). Por isso, a cidadania já não pode ser definida em função de uma comunidade restrita (país, cultura ou religião). Nas sociedades abertas, multi-étnicas e multiculturais, a cidadania expressa o direito e o dever de vinculação e de integração dos indivíduos na comunidade de seres racionais. Como propõe Jorge Sampaio: A cidadania é responsabilidade perante nós e perante os outros, consciência de deveres e de direitos; impulso para a solidariedade e para a participação, é sentido de comunidade e de partilha, é insatisfação perante o que é injusto ou o que está mal, é vontade de aperfeiçoar, de servir, é espírito de inovação, de audácia, de risco, é pensamento que age e acção que se pensa. Este conceito de cidadania acentua a responsabilidade individual e a participação política activa e pressupõe o reconhecimento: De igual dignidade de todos os seres humanos; De direitos humanos inalienáveis; Da igualdade política e jurídica; Do direito à diversidade, base do pluralismo democrático; Do direito e do dever de integração e de participação cívico-política. Os Valores da Cidadania A integração participada exige o respeito pelas diferentes convicções e hábitos culturais dos sujeitos sociais que vivem e interagem no mesmo espaço público. Por isso, é necessário que Família e Escola não descurem a educação para a cidadania, preparando as crianças e os jovens para a sua integração na comunidade, no respeito pelos outros mesmo que não sejam da mesma cultura, religião ou partido político, mesmo que não tenham as mesmas convicções, a mesma cor de pele ou orientação sexual. Chamamos educação cívica (ou educação para a cidadania) a esta preparação para viver em comunidade e exercer a cidadaniaactiva e responsavelmente. A educação cívica ensina a: Ser tolerante, respeitando todos os outros e reconhecendo a sua humanidade, para além de todas as diferenças; Preferir o diálogo e a argumentação à violência; Aceitar a diversidade de opiniões e de crenças religiosas e não discriminar os que têm convicções diferentes. Na última década, várias organizações internacionais (a UNESCO e o Conselho da Europa, por exemplo), apresentaram projectos de educação para a cidadania. Jorge Barbosa 4 Resultado do trabalho realizado entre 1993 e 1996 pela Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, o relatório Delors propõe um conjunto de aprendizagens fundamentais: Aprender a conhecer, Aprender a fazer; Aprender a ser (formação pessoal para a autonomia moral e a responsabilidade, o conhecimento e o juízo crítico, a empatia e a comunicação); Aprender a viver juntos (formação social para a escolha e a decisão, a cooperação, a intervenção e o compromisso). No manifesto 2000 por uma Cultura de Paz e Não-Violência, personalidades que se destacaram na luta pelos direitos humanos, laureados do prémio Nobel da Paz, entre outros, afirmam publicamente o seu compromisso de: Respeitar a vida Cuidar: Da natureza à nossa volta Da nossa comunidade, bairro e família; Da sensibilidade do nosso coração; Das palavras que dizemos; Do nosso olhar Rejeitar a violência “O primeiro princípio da acção não-violenta é a não-cooperação com tudo o que é humilhante.” Mahatma Gandhi Ser generoso “A generosidade – o amor – é o fundamento de toda a socialização porque abre um espaço para o outro ser aceite como ele é. E, a partir daí, podermos desfrutar da sua companhia na criação do mundo comum, que é o social.” Umberto Eco Ouvir para compreender “Num diálogo não há a tentativa de fazer prevalecer um ponto de vista particular, mas a de ampliar a compreensão de todos os envolvidos.” David Bohm Redescobrir a solidariedade “Quem faz o próximo sofrer, pratica o mal contra si mesmo. Quem ajuda os outros, ajuda-se a si mesmo.” Leon Tolstoi Consultar: http://unesdoc.unesco.org/
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