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Psicopatas

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Prévia do material em texto

o americano Dorita Page 
(foto) assassinou uma < 
mulher em 1999. Era ; 
dãda comd corta sua .: 
condenação à morte até 
Raine estudá-lo. Page 
pegou prisão perpétua. 
Desde criança, eie ' 
apanhava de sua mãe com 
uma barra de ferro. Lesões 
em sua cabeça podem ter 
afetado seu cérebro 
• Thçamainyet v/áfence (2013) 
* 
LIÇÕES DE BIOLOGIA 
Responsável por operações mentais 
como descoberta, reconhecimento e 
retenção de informação 
ÈrwoSve sentimentos e emoções. 
Trata principalmente cie reações <te 
ordem afetiva o empatia 
E a expressão da integração cie 
todos os domínios. Coordena 
habiiicfãdesJisicase motoras 
CÉREBRO CRIMINOSO 
mi 
m 
8 2 i ÉPOCA s 8 d ® a g o s t o d e 2013 
Félix é apenas um personagem de fic-
ção. Como todo personagem bem cons-
truído, porém, ele parece real. Mistura 
ingredientes conhecidos de gente má, sem 
remorso e cruel. Seu comportamento 
lembra criminosos com problemas neu-
rológicos (leia o quadro ao lado). Félix 
mostrou frieza emocional ao sequestrar 
a sobrinha Paulinha (Klara Castanho) 
logo após o nascimento e abandoná-la 
numa caçamba de lixo. Quando reencon-
trou a menina (já crescida e durante a 
recuperação de um transplante), tentou 
matá-la novamente. Invadiu a UTI e tro-
cou um remédio por água. Sua tendência 
para a hostilidade, a dificuldade para ini-
bir reações antisociais e a incapacidade 
de suprimir a raiva aparecem em quase 
todo capítulo. Félix tem explosões cons-
tantes e vive chamando a secretária, a 
discreta e eficiente Simone (Vera Zimmer-
mann), de cadela. Nesta semana, quando 
descobriu que sua mulher, Edith, o traía, 
bateu nela e no filho, Jonathan. Somente 
alguém com noção reduzida de perigo é 
capaz de praticar tantas maldades com a 
certeza de sair impune. 
Como Walcvr Carrasco, autor At Amor 
à vida, relata em sua coluna nesta edição 
(leia na página 70), Felix é assim por ser 
"uma pessoa tortuosa, reprimida desde a 
infância" e "fruto de um pai repressor e de 
uma família que finge não saber quem eíe 
é". Sua concepção se enquadra na narra-
tiva tradicional sobre o comportamento 
criminoso, costumeiramente assodàdo às | 
más influências do ambiente ou das rela-
ções sociais e familiares. Nos últimos 70 
anos, esse tem sido o modelo dominante 
entre os estudiosos do crime e da malda-
de. Relegadas desde que serviram de base 
científica para as ideologias racistas, como 
o nazismo, que vicejaram no mundo oci-
dental na primeira metade do século XX, 
as teorias que associam o crime a caracte-
rísticas biológicas ou genéticas voltaram 
gradualmente a ganhar prestígio em uni-
versidades e centros de pesquisa cle reno-
me. No ano passado, a maior conferência 
de criminologia do mundo - organizada 
pela Sociedade Americana de Criminolo-
gia - reuniu dez apresentações em que o 
crime era relacionado à biologia ou aos 
genes. Estudos defendendo que crimino-
sos violentos podem ter predisposição 
biológica a cometer tais atos ganharam 
mais força agora, com os avanços recentes 
da netirociéncia na compreensão do fun-
cionamento do céreb ro e de sua influência 
no comportamento humano. 
A fronteira em que a neurociência e a 
criminologia se encontram é explorada 
no livro The anatomy of noknce (A ana-
tomia da violência, em tradução livre;, 
lançado em maio, pelo neurocientista e 
criminólogo britânico Adrian Rane. O 
livro teve grande repercussão Estados 
Unidos e no Reino Unido. Professor da 
Universidade da Pensifv jnfe nus Estados 
Unidos, Raine almeja fundar 3 disciplina 
da "neurocriminologia", £íe pcsiufo que 
muitos coroportarr-c-: - .v.ntas, ain-
da que possam ser cr*. — „ . ; * pelo 
ambiente, tem rei. „ com • 
Foto. John Preito/Th» Denver Post v á o t u y (msj 
Ovilão Félix, o maior sucesso de Amor à vida, a novela das 9 da noite da TV Globo, é a encarnação da crueldade. Interpretado pelo ator Mateus Solano» ele jogou um bebê recém-nascido numa caçamba de lixo, deixou a irmã adotiva sangrando no chão de um banheiro de 
bar após o parto, desviou dinheiro do hospital da própria família e 
encomendou o assassinato do sócio do pai para cumprir seu maior 
objetivo: receber uma herança milionária. Gay enrustido cuja 
homossexualidade só foi revelada na semana passada, Félix usava a 
imagem de pai. de família para esconder suas ardilosidades. Agora, 
após a revelação, terá de recorrer a outras artimanhas. 
— — 
rizem o comportamento humano e as áreas afetadas ppr;seu mau funcionamento 
i-'tt'<' 1 ' 'í '* .. VrL.v . Y", *• ..".. • •' 
Planejamento e organização 
Tomada de decisões 
PRÉ-FRONTAl 
MEDIAL 
^ M M S B I w h k ' 1 
DiSGUUDO 
POSTERIOR 
Autorreflexão 
Aprendizagem e memória 
Dificuldade de alterar estratégia 
. Tendência para hosffiitede 
Incapacidade de suprimir a raiva 
Falta de autoconheçimento 
S d t íigosvo d e 2 0 i ß i ÉPOCA 1 6 3 
• 
_ 
LIÇÕES DE BIOLOGIA 
características neurológicas do criminoso. 
"Muitos criminosos violentos tém o cé-
rebro fisicamente diferente e estrutural-
mente deficiente", disse Raine a ÉPOCA. 
Félix, portanto, pode ter sido reprimido 
e querer se vingar, como sugere seu cria-
dor. Gente como ele, porém, também 
pode sofrer de disfunções cerebrais. 
A pesquisa de Raine, uma das estrelas 
do Congresso do Cérebro, Comporta-
mento e Emoções, em São Paulo, em ju-
nho, não se limita a ser uma atualização 
da frenologia, disciplina desenvolvida a 
partir de 1876 pelo italiano Cesare Lom-
broso, um dos inspiradores das ideias 
eugenistas abraçadas pelos nazistas. Lom -
broso argumentava que a forma do crânio 
e do maxilar poderia determinar quem 
era criminoso ou não. Usando técnicas 
modernas de ressonância magnética, Rai-
ne se dedica a estudar a atividade cerebral 
de criminosos violentos, assassinos e psi-
copatas. Num estudo em 2009, ele anali-
sou o cérebro de 27 psicopatas - categoria 
em que pode ser enquadrada muita gen-
te parecida com o vilão Félix. Descobriu 
que a região do cérebro responsável por 
gerar medo, ansiedade, culpa e coordenar 
as decisões de caráter moral - conhecida 
como amígdala - desses psicopatas tinha 
um volume 18% menor que em outras 
pessoas e apresentava atividade propor-
cionalmente inferior. 
Outra região associada ao comporta-
mento criminoso é a parte do cérebro 
situada atrás da testa, que controla impul-
sos e a capacidade de planejamento, cha-
mada córtex pré-frontal. "Ele é um anjo 
da guarda do'comportamento", diz Raine. 
Uma deficiência no córtex pré-frontal 
pode resultar em menor controle das 
emoções e comportamentos sociais. Pode 
causar também falta de autocontrole, per-
da da noção de risco ou propensão exa-
gerada para o medo e a raiva. Em 1994, 
por meio de imagens obtidas por tomo-
grafia, Raine analisou a atividade cerebral 
de 41 assassinos condenados. Descobriu 
que seus cérebros tinham atividade redu-
zida no córtex pré-frontal. Ela podia estar 
relacionada às dificuldades de eles se con-
terem em situações estressantes. 
A comprovação dessas deficiências já 
alterou o destino de julgamentos nos 
EUA. O primeiro caso foi de Herbert 
Weinstein, um publicitário de 65 anos. 
Em 199.1, ele enforcou sua mulher, Bar-
TAL PA!,.. 
Darre! Hili (numa 
foto de 1996) 
foi condenado 
à morte, em 1980, 
por matar um 
homem durante um 
assalto. Seu pai 
também era 
assass ino 
A COMPROVAÇÃO 
DE DEFICIÊNCIAS NO 
FUNCIONAMENTO 
DO CÉREBRO DE 
CRIMINOSOS MUDOU 
JULGAMENTOS NOS 
ESTADOS UNIDOS 
bara, após uma discussão. Ao tentar aco-
bertar o crime, Weinstein arremessou o 
corpo dela da janela deseu apartamento, 
no 20° andar de um edifício em Manhattan, 
Nova York. Foi preso no mesmo dia. 
Como Weinstein não tinha antecedente 
criminal ou registros de comportamen-
to violento anterior, sua êqu ipe de defesa 
contratou um neurologista para analisar 
seu cérebro.Uma tomografia revelou que 
Weinstein tinha um cisto que alterava a 
posição do tecido no córtex frontal. Ale-
gando insanidade mental e falta de capa-
cidade para raciocinar e controlar suas 
emoções, a defesa reduziu a pena de 
Weinstein de 25 para sete anos de prisão. 
O caso abriu precedentes. Em 1999, o 
próprio Raine foi convocado por um 
advogado de defesa para avaliar um 
assassino brutal: o americano DontaPage, 
de 23 anos, que roubara e estuprara uma 
mulher. Em seguida, Page matou a vítima. 
Cortou sua garganta com uma faca de 
cozinha e enfiou-a em seu peito. Quando 
criança, Page fora abandonado pelo pai 
- que tinha problemas mentais e usava 
droga. Também sofrera abusos físicos da 
mãe - que batia nele com cordas e barras 
de ferro, especialmente em sua cabeça. 
Aos 2 anos, ele já passara cinco vezes na 
emergência de um hospital, uma delas 
6 4 : ÉPOCA s sio as®8to d e 2013 
— 
porque "caíra" da janela de um carro. Aos 
10 anos, sofrera abuso sexual de um vizi-
nho. Aos 18, já cometera vários crimes e 
fora encaminhado 19 vezes para trata-
mento psicológico, embora não tivesse 
participado de nenhuma sessão. Page, 
provavelmente, pegaria a pena de morte 
em Denver, no Estado do Colorado.'Rai-
ne analisou seu cérebro e detectou pouca 
atividade no córtex pré-ffontal (confira a 
imagem no quadro na página 62). No tri-
bunal, ele testemunhou que havia uma 
explicação social e biológica para o com-
portamento de Page. Q>m esse argumen-
to, Raine e a defesa mitigaram sua respon-
sabilidade. Page escapou da pena de 
morte e pegou prisão perpétua. 
Nenhum caso citado no livro de Raine 
se compara à história de Jeffrey La.nd.ri-
gan. Abandonado aos 8 meses, foi adota-
do por uma família rica. Recebeu atenção 
dos pais adotivos e estudou em escolas 
particulares. Aos 2 anos, Landrigan já 
apresentava comportamento agressivo. 
Não demorou a agir como uni criminoso. 
Aos 10 anos, virou alcoólatra. Aos 11, co-
meçou a roubar casas. Em seguida, virou 
usuário de drogas e começou a furtar 
carros. Landrigan passou boa parte da 
adolescência em centros de detenção, até 
cometer seu primeiro assassinato,nteSês 
„TAL FILHO 
Jeffrey Landrigan 
(numa foto de 
2010) era filho 
biológico de Darrel 
Hill, mas nunca o 
conheceu. Adotado 
por uma família 
rica, entrou para a 
vida criminosa e 
também foi 
condenado à morte 
• M H 
HÁ 30 ANOS, UM 
ESTUDO PIONEIRO 
NA DINAMARCA 
RELACIONOU 
GENÉTICA À 
CRIMINALIDADE 
Fotos: AP a nspreduçlo 6. a g o í t ü de20iC3 • ÉPOCA :: 6 5 
depois de completar 20 anos. Tomava 
cerveja com um amigo de infância, que o 
convidara para ser padrinho de seu filho. 
Landrigan ficou irritado com o pedido e 
matou o amigo a facadas. 
Preso em 1982, pegou uma sentença 
de 20 anos. Fugiu da cadeia em f989, 
quando se mudou para Phoenix, no Ari-
zona. Lá, matou outra pessoa. Depois de 
discutir com Chester Dean Dyer, homem 
com quem tinha um caso amoroso, Lan-
drigan o enforcou e mutilou seu corpo. A 
parte mais estranha de sua história ainda 
estava por vir. Um funcionário da cadeia 
onde ele aguardava a execução no corre-
dor da morte achou Landrigan muito 
parecido com Darrel Hill, um condenado 
famoso numa cadeia no Estado do 
Arkansas, que conhecia pessoalmente. 
Após testes genéticos, foi. descoberto que 
Landrigan era filho biológico de Hill. 
"Nunca conheci meu pai, mas ele defini-
tivamente exerceu uma grande influência 
em minha vida", disse Landrigan, em 
1999, ao jornal britânico The Sun. Tam-
bém entrevistado, Hi.ll afirmou que seu 
pai, morto num tiroteio a seu lado, tam-
bém era um assassino. "Landrigan era 
uma maçã podre", diz Raine. 
Como Raine, outros cientistas têm se 
dedicado a estudar a relação ck caracte-
rísticas biológicas com a criminalidade. 
Em abril, o neurocientista Kent Kiehl, da 
Universidade do Novo México, nos EUA, 
publicou um estudo com. a análise das 
imagens do cérebro de 96 criminosos da 
prisão estadual. Kiehl descobriu que, 
quatro anos depois de soltos, aqueles 
com atividade baixa em out ra área, tam-
bém responsável por regular o compor-
tamento, apresentavam o dobro da pro-
babilidade de reincidir e cometer outro 
crime do que os presos com a região 
normalmente ativa. 
A base genética do comportamento 
criminoso é estudada há quase 30 anos. O 
primeiro estudo no campo foi publicado 
em 1984, pelo psicólogo dinamarquês 
Sarnoff Mednick. Com informações de 
todas as .14.427 adoções de crianças feitas 
na Dinamarca entre 1,924 e 1947,Mednick 
afirmou que a quantidade de crimes co-
metidos pelos pais biológicos aumentava 
o risco de seus filhos homens cometerem 
crimes. Sustentava sua tese com a seguin-
te descoberta: enquanto 13% dos filhos 
de pais biológicos sem ficha criminal • 
O universitário 
Victor Hugo 
Deppman, de 
19 anos, foi morto 
na frente do 
condomínio 
onde morava, depois 
de ser rendido 
por um assaltante 
que roubou seu 
celular. Quando 
retirou a mochila 
para entregá-lo, foi 
baleado à queima-
roupa na cabeça. 
Morreu horas depois 
Três homens invadiram o consultório 
da dentista Cinthya Magaly 
Moutinho de Souza.de 47 anos, e 
a queimaram viva, porque ela tinha 
apenas R$ 30 em sua conta 
A estudante Lindayane 
de Sousa Leite, de 16 
anos, desapareceu no 
começo de junho. Uma 
semana depois do sumiço, 
seu corpo foi achado 
com sinais de estupro 
c pauladas na cabeça 
Segundo a 
polícia, Roberto 
Freire, de 23 
anos, torturou e 
ateou fogo a seu 
ex-sogro Antônio 
Bonfim, No dia 
seguinte, sua 
ex-namorada 
Thayná Bonfim, 
de 17 anos, foi 
encontrada morta 
com três facadas. 
Freire foi preso 
ainda em junho 
UtfOFEMj 
4 1 3 6 9 8 
• l i ..Mfltí • i s 
LIÇÕES DE BIOLOGIA 
haviam sido condenados, o número subia 
para 25%, em média, nos casos de filhos 
de pais com três ou mais crimes. 
O crime também é estudado sob a óti-
ca de um novo campo da biologia, que 
estuda como o ambiente ou os hábitos de 
vida (como fumar ou usar drogas) inte-
ragem com os genes. Trata-se da epigené-
tica. Uma das primeiras pesquisas rela-
cionando epigenética ao crime foi 
publicada em 2002. Nela, os neurocien-
tistas Avshalom Caspi e Terrie Moffttt, da 
Universidade Duke, nos EUA, analisaram 
as informações hereditárias de 1.000 in-
divíduos numa comunidade na Nova 
Zelândia. Compararam-nas ao compor-
tamento antissocial na vida adulta. A du-
pla descobriu que aqueles com níveis 
baixos de uma certa substância química, 
caso tivessem sofrido abuso na infância, 
eram mais predispostos a manifestar 
comportamento antissocial. 
"O comportamento humano é resulta-
do da interação da biologia e fatores am-
bientais" diz o psicólogo Kevin Dutton, da 
Universidade de Cambr idge, autor do livro 
The wisdorn of psychopaths: what saints, 
spies and serial killers can teach us about 
success (A sabedoria dos psicopatas: o que 
santos, espiões e assassinos em série podem 
nos ensinar sobre o sucesso, em tradução 
livre), de 2012. Dutton usa uma metáfora 
para explicar como o comportamento 
pode ser influenciado por essas duas forças 
-biologia e ambiente."Jogue um pote de 
aço num chão de concreto e nada aconte-
cerá. Faça o mesmo com um pote de por-
celana chinesa', e ele se estilhaçará." 
Por isso, mesmo quem postula a cria-
ção da"neurocriminologia" como Raine, 
é cauteloso ao fazer associações de caráter 
determinista entre biologia e crime. Nem 
todo criminoso tem disfunções cerebrais. 
E nem todo indivíduo com um perfil ce-
rebral específico é necessariamente um 
assassino ou psicopata. Além disso, o cé-
rebro costuma mudar fisicamente no 
decorrer da vida. "Diria que 50% da cau-
sa de crimes violentos é biológica. Mas 
biologia não é destino, e podemos buscar 
tratamento", diz Raine. Ele já estudou o 
próprio cérebro e descobriu muitas se-
melhanças como cérebro de um homem 
que matou 64 pessoas num período de 
20 anos. "Provavelmente, não aconteceu 
nada porque tive uma boa qualidade dê 
vida e pais que me amaram muito", diz. • 
A marcada crueldade 
Os crimes hediondos que assustaram o Brasil neste ano 
O universitário 
Victor Hugo 
Deppman, de 
19 anos, foi morto 
na frente do 
condomínio 
onde morava, depois 
de ser rendido 
por um assaltante 
queroubou seu 
celular. Quando 
retirou a mochila 
para entregá-lo, foi 
baleado à queima-
roupa na cabeça. 
Morreu horas depois 
Três homens invadiram o consultório 
da dentista Cinthya WJagaly 
Moutinho de Souza, de 47 anós, e 
a queimaram viva, porque ela tinha 
apenas R$ 30 em sua conta 
A estudante Lindayane 
de Sousa Leite, de 16 
anos, desapareceu no 
começo de junho. Uma 
semana depois do sumiço, 
seu corpo foi achado 
com sinais de estupro 
e pauladas na cabeça 
Segundo a 
polícia, Roberto 
Freire, de 23 
anos, torturou e 
ateou fogo a seu 
ex-sogro Antônio 
Bonfim. No dia 
seguinte, sua 
ex-namorada 
Thayná Bonfim, 
de 17 anos, foi 
encontrada morta 
com três facadas. 
Freire foi preso 
ainda em junho 
BiancaMantellePazinattó,de18anos, 
foi assassinada a facadas. Seu corpo foi 
encontrado em sacos plásticos, embaixo da 
cama de uma amigade17 anos, suspeita do 
prime com outra adolescente de 16 anos. A 
polícia apreendeu anotações com uma espécie 
de roteiro do crime, feitas pélajovem de 17 anos, 
em que afirma ter sido namorada de Bianca 
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41 369 8; 
LIÇÕES DE BIOLOGIA 
; ÉPOCA : õ cie ÃgoftÇQ de '.'OU; 
haviam sido condenados, o número subia 
para 25%, em média, nos casos de filhos 
de país com três ou mais crimes. 
0 crime também é estudado sob a óti-
ca de um novo campo da biologia, que 
estuda como o ambiente ou os hábitos de 
vida (como fumar ou usar drogas) inte-
ragem com os genes. Trata-se da epigené-
tica. Uma das primeiras pesquisas rela-
cionando epigenética ao crime foi 
publicada em. 2002. Nela, os netirocien-
tistas Avshalom Caspi e Terrie Moffitt, da 
Universidade Duke, nos EUA, analisaram 
as informações hereditárias de 1.000 in-
divíduos numa comunidade na Nova 
Zelândia. Compararam-nas ao compor-
tamento antissocial na vida adulta. A du-
pla descobriu que aqueles com níveis 
baixos de uma certa substância química, 
caso tivessem, sofrido abuso na infância, 
eram mais predispostos a manifestar 
comportamento antissocial. 
"O comportamento humano é resulta-
do da interação d.a biologia e fatores am-
bientais", diz 0 psicólogo Kevin Dutton, da 
Universidade de Cambridge, autor do livro 
The wisdom of psychopaths: what saints, 
spies and serial külers can teach us about 
success (A sabedoria dos psicopatas: o que 
santos, espiões e assassinos em série podem 
nos ensinar sobre o sucesso, em tradução 
livrej, de 2012. Dutton usa. uma metáfora 
para explicar como o comportamento 
pode ser influenciado por essas duas forças 
- biologia e ambiente. "Jogue um pote de 
aço num chão de concreto e nada aconte-
cerá. Faça o mesmo com um pote de por-
celana chinesà, e ele se estilhaçará." 
Por isso, mesmo quem postula a cria-
ção da"neurocriminologia",como Raine, 
é cauteloso ao fazer associações de caráter 
determinista entre biologia e crime. Nem 
todo criminoso tem disfunções cerebrais. 
E nem todo indivíduo com um perfil, ce-
rebral específico é necessariamente um 
assassino ou. psicopata. Além disso, o cé-
rebro costuma mudar fisicamente no 
decorrer da vida. "Diria que 50% da cau-
sa de crimes violentos é biológica. Mas 
biologia não é destino, e podemos buscar 
tratamento", diz Raine. Ele já. estudou o 
próprio cérebro e descobriu muitas se-
melhanças com o cérebro de um homem 
que matou 64 pessoas num período de 
20 anos. "Provavelmente, não aconteceu 
nada porque tive uma boa qualidade de 
vida e pais que me amaram muito" diz. • 
A marca da crueldade 
Os orirnes hediondos que assustaram o Brasil neste ano 
Ficou conhecido como "anjo da 
morte" pelas cruéis experiências 
que conduziu em campos de 
extermínio na Segunda Guerra 
Mundial. Era entusiasta das 
ideias de Galton e sonhava em 
"aprimorar" a raça humana 
Em 1964, o psicólogo britânico 
publicou o livro Crime e 
personalidade. Escreveu que o 
crime era resultado de uma 
interação entre condições do 
ambiente e características do 
sistema nervoso 
FRANGIS GALTON 
Antropólogo britânico que 
estudava a biologia humana. 
Cunhou o conceito filosófico de 
"eugenia" em 1883. Afirmava 
que a raça humana podia ser 
"melhorada" com a exclusão de 
pessoas "inferiores" 
: DEFENSOR DA' 
FBENOLOâíA ; 5 ; :: : tí •» ïr.lïi î j: íí « ÏW Î » £ Ï 
Em 1895, publicou o livro 
Antropologia criminal, em qüe 
associava características 
craniofaciais ao tipo de 
criminoso. Seu trabalho caiu 
em desgraça e foi descartado 
pelos cientistas 
ADRIAN RAINE TERRIE MOFFITT 
O neurocientista e criminólogo 
britânico foi üm dos pioneiros 
no estudo do cérebro de 
criminosos violentos e planeja 
fundar a disciplina da 
"neurocrimínologia" para dar 
mais relevância ao tema 
A pesquisadora alemã publicou 
em 2002o primeiro estudo que 
relaciona fatores genéticos ao 
comportamento criminoso. 
Neurocientista, Terrie continua 
a publicar pesquisas 
relacionadas ao tema 
"Há um risco enorme em estigmatizar 
crianças", diz Arthur Caplan, professor 
de bioética na Universidade da Pensilvâ-
nia. "O cérebro é plástico e adaptável, 
então o diagnóstico será sempre sobre 
riscos, não certezas." Para a historiadora 
Nicole Rafter, autora do livro The crimi-
nal brain: understanding biologkal theories 
of crime (O cérebro criminoso: compreen-
dendo as teorias biológicas do crime), de 
2008, não há soluções fáceis. "Todo mun-
do quer soluções preventivas para elimi-
nar o crime", afirma. "O esforço em iden-
tificar criminosos em potencial pode 
discrimina r muita gente. Escrevi a histó-
ria da eugenia nazista e sei disso." 
O mais importante resultado cias pes-
quisas da neurociência sobre criminalida-
de talvez seja reconhecer,-como diz John 
lauta criminólogo e professor da Univer-
sidade de Maryland, CoMege Park, nos 
EUA, que "não há um fator único para o 
crime e a violência". Para ele, a aceitação 
da abordagem biológica pode aprimorar 
o estudo do crime. "A neurociência pode 
ajudar especialmente a identificar diferen-
ças individuais entre cada criminoso", diz 
Laub. Num ano em que a sociedade bra-
sileira foi abalada por uma série de assas-
sinatos cruéis (leia o quadro na página 66), 
em que os bandidos queimam ou matam 
suas vítimas e seguem comportamentos 
desprovidos de qualquer racionalidade 
aparente, o fenômeno da criminalidade 
não poderá ser entendido se for observa-
do apenas por um únicoángulo - as rela-
ções sociais. É preciso levar em conside-
ração que há gente com predisposição 
para o crime tanto na ficção - como o 
vilão Félix - como ná vida.rèal. • 
•Com Mariana Tessiture 
A história da biologia na criminologia 
Depois de cair em descrédito, as teorias sobre crime e biologia voltam a ganhar prestígio 
Fotos Ointe! Sobrai/FtKura ^»ss/folhApres*, reprodução C8, 
Jíidson M«r<íue3,^'oíhapr<m s Getty Images (8) 
Embora relacionem a criminalidade 
ao nível de atividade de certas regiões do 
cérebro, os neurocientistas ainda não 
avançaram a ponto de descobrir como a 
intenção de fazer uma crueldade pode 
estar codificada na biologia humana e 
como essa informação pode gerar um 
comportamento criminoso. "Precisamos 
ter cuidado e respeitar os limites de nosso 
conhecimento científico, porque as con-
sequências de aplicá-lo a pessoas podem 
ser graves", afirma o psicólogo Eyal Aha-
roni, da Universidade da Califórnia e co-
lega de Kiehl, da Universidade do Novo 
México, na pesquisa divulgada em abril. 
Raine afirma que seu campo de estudo 
poderáa judar a diagnosticar pessoas com 
problemas potenciais no cérebro e pro-
porcionar a criação de tratamentos so-
ciais, psicológicos e até nutricionais -
ideia que não é bem-aceita pelos críticos.

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