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Trabalho Karl Marx - Quando toda a vida pode virar mercadoria X Barbie, “brinquedo” tirano

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Interpretação dos textos abaixo considerando em sua argumentação aplicar os 
seguintes conceitos: forças produtivas, mais-valia, fetichismo da mercadoria, 
alienação. 
Quando toda a vida pode virar mercadoria 
POR DANIEL BIN 
– ON 19/06/2014CATEGORIAS: BRASIL, ECONOMIA, PÓS-CAPITALISMO, POSTS 
 Em A era dos extremos, o historiador Eric Hobsbawm observou que uma das reações 
dos comentadores ocidentais ao colapso do regime soviético fora ratificar o triunfo 
permanente do capitalismo. Um pouco disso e, ainda mais, o desejo de durabilidade 
de tal triunfo animaram outros a proclamar que as teses expostas pela economia 
política marxista estariam ultrapassadas. Contudo, essa mesma permanência do 
capitalismo nos autoriza a pensar justamente o oposto. Simplificações como as que 
recorrem à “queda do muro” para defender o abandono das teses de Marx não se 
sustentam diante do argumento sintetizado pelo sociólogo Michael Burawoy quando 
diz que “a longevidade do capitalismo garante a longevidade do marxismo.” 
Se dermos um passo adiante em relação a essa noção de permanência, podemos 
lançar a hipótese de aprofundamento das relações capitalistas. O exemplo mais 
completo é a ampliação da exploração do trabalho, seja direta, no local de produção, 
ou indireta, por exemplo, via redução do financiamento de políticas de bem-estar, que 
funcionam como salário social e cujas reduções engendram ampliação da exploração 
em termos agregados. Evidência desse conjunto de transformações é o aumento da 
desigualdade no nível da economia mundial ao longo dos últimos quarenta anos. 
Mas é sobre outra figura que gostaria de chamar atenção nesse processo de 
aprofundamento capitalista. Trata-se da mercadoria, objeto que Marx tomou como 
ponto de partida de sua análise em O Capital. Na primeira frase daquele livro lê-se 
que “a riqueza das sociedades em que domina o modo de produção capitalista 
apresenta-se como uma ‘imensa acumulação de mercadorias.’”Cabe observar que a 
mercadoria é ponto de partida não apenas do estudo exposto em O Capital, mas do 
próprio modo de produção que lhe serviu de objeto. Ao concluir o volume I do livro 
com a seção intituladaA chamada acumulação primitiva, Marx tinha em mente 
justamente o processo por meio do qual a capacidade de trabalho fora convertida em 
mercadoria. 
Esforço-me agora para colocar em contexto similar alguns primeiros exemplos que, se 
não são da maior relevância para as estatísticas econômicas, o são para ilustrar 
fenômenos outrora não tão facilmente imagináveis com tais. Contudo, eles se tornam 
menos surpreendentes se lembrarmos que este é um momento marcado por aquilo 
que a historiadora Ellen Wood chama de “commodification of life”, cujo significado 
contextual é algo próximo de “conversão das condições de vida em mercadoria.” 
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Em abril passado, vimos a imagem do jogador de futebol Daniel Alves recolhendo e 
comendo uma banana que fora arremessada em sua direção em mais uma das 
manifestações racistas já comuns em estádios europeus. Logo em seguida, o jogador 
Neymar lançou em rede social a campanha marcada pelo insultante 
“somostodosmacacos.” Pouco depois, a empresa do ramo de vestuário Huck começou 
a ofertar comercialmente uma camisa com aquele mesmo dizer. Aqui importa menos a 
alegação de que o faturamento com a venda das camisas seria revertido para o 
terceiro setor e que a empresa nada lucraria com a comercialização. Fato é que, 
independente das somas movimentadas e da destinação que se lhes tenha dado, 
estava ali a figura da mercadoria. 
Outro exemplo que segue lógica similar tem a ver com algo que parece te virado 
moda, literalmente, para um certo estrato social que, de repente, resolveu protestar 
contra “tudo que está aí.” Há algumas semanas, por meio de uma estampa em 
camiseta, responsáveis pela marca de roupas Ellus resolveram bradar “abaixo este 
Brasil atrasado.” É possível que seu objetivo fosse também — ou principalmente — 
político, mas seria temerário descartar a hipótese da motivação mercantil. Por que não 
aproveitar a onda de indignação de um estrato social que é capaz de pagar pelo 
protesto? Não seriam os primeiros, como pode ser visto, por exemplo, 
nas camisetas“para protestar”. 
Talvez os casos acima sugiram algum exagero de minha parte; por isso, é preciso 
colocá-los no devido lugar em termos de importância para a discussão do tema 
mercadoria. Conforme já sugeri, são casos pouco significativos em termos do quanto 
mobilizaram de trabalho e capital e do quanto adicionaram de valor à economia. 
Contudo, o mesmo não pode ser dito acerca dos aspectos qualitativos da mercadoria. 
Talvez uma implicação importante de movimentos como estes seja ideológica, no 
sentido de empurrar os limites daquilo que pode ser considerado socialmente aceitável 
como mercadoria. Não obstante, adicionemos à discussão casos estatisticamente 
mais significativos. 
Eventos recentes de mercantilização dos mais relevantes são as privatizações em 
áreas como educação, saúde ou previdência. Estas assumem diversas formas, mas, 
de um modo geral, surgem ocupando espaços abertos pela redução calculada do 
financiamento estatal. Com isso, atividades outrora concebidas como públicas passam 
a ser apresentadas como potenciais áreas de exploração capitalista em larga escala. 
E no momento em que parte considerável dos ativos estatais já foi alienada, surge, 
como uma espécie de privatização disfarçada, a chamada parceria público-privada. 
Panaceia para alegadamente imprimir eficiência aos serviços prestados pelo Estado, 
ela acaba formalizando no varejo uma associação entre o Estado moderno e o capital 
que existe desde o surgimento de ambos. 
Nem mesmo o monopólio do uso da força reivindicado pela conceituação liberal de 
Estado escapa – o que se observa há algum tempo no crescimento da oferta de 
serviços privados de “segurança.” Estes, a despeito da dependência do sentimento 
disseminado de insegurança, se apresentam como preventivos e auxiliares de tarefas 
das quais o Estado alegadamente não dá conta. Num passo adiante na lógica 
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mercantil, também para o ato de punir, outrora visto como atribuição exclusiva do 
Estado, inaugura-se aquilo que poderia ser chamado de indústria do encarceramento. 
Seu exemplo mais significativo é o que ocorre nos Estados Unidos. Na “terra dos 
livres”, onde vivem 5% da população mundial, estão 25% da população carcerária do 
planeta, o que apenas no ano de 2010 custou ao país cerca de 80 bilhões de dólares. 
Importante notar que a população carcerária dos EUA atualmente supera 2,4 milhões 
de pessoas. Mais que quadruplicou desde 1980, momento que coincide com a 
ascensão do pensamento conservador e da propaganda sobre os benefícios 
universais do livre mercado. Qual exemplo poderia melhor sintetizar a combinação de 
um conservadorismo que clama por punições cada vez mais severas e abrangentes 
com um fundamentalismo que enxerga qualquer coisa como mercadoria? 
Possivelmente há outros, mas fato é que, entre meados dos anos 1990 e meados dos 
anos 2000, a quantidade de prisões operadas por empresas privadas nos EUA passou 
de cinco a cem. 
E esse mesmo tipo de mercantilização já começa a chegar ao Brasil. Em janeiro de 
2013 foi inaugurada a primeira penitenciária do país construída sob o regime de 
parceria público-privada, localizada em Ribeirão das Neves, região metropolitana de 
Belo Horizonte. Nas palavras do governador do Estado, o novo complexo prisional 
visa “otimizar os recursos públicos para que a eficiência, a efetividade e a eficácia 
sejam vocacionados para o sistema prisional”. Sobre este caso e suas potenciais 
mo t i vações e imp l i cações soc ioeconômicas va le a l e i t u ra a ten ta 
da reportagem “Quanto mais presos, maior o lucro”, da Agência Pública. Dali destaco 
o apontamento acerca das garantias de retorno sobre o investimento privadocom o 
qual o governo se compromete via manutenção de uma ocupação mínima de vagas 
prisionais. 
Num país onde a população prisional é a quarta — terceira se computadas as pessoas 
em prisão domiciliar — maior do mundo, e onde começa a se disseminar o modelo 
inaugurado por Minas Gerais, que nos últimos dez anos duplicou a quantidade de 
presos, a simultaneidade de certos fenômenos não pode ser desprezada. Somam-se a 
isso as crescentes pressões conservadoras pela redução da maioridade penal e de 
criminalização dos movimentos sociais, o que aponta para uma outra simultaneidade, 
de desocupação das ruas e de ocupação de prisões. Prisões existentes ou prisões a 
construir dentro de um novo esforço de investimentos em prédios, dispositivos de 
vigilância, armamentos, alimentação, uniformes etc., estruturando-se assim toda uma 
cadeia de mercadorias. 
Esta análise pode parecer um tanto sombria ao apontar tendência de aprofundamento 
das relações capitalistas e das desigualdades que elas engendram. Mas um 
pensamento dialético nos convida a olhar para possibilidades distintas. Com isso, 
retomo Marx, que pode parecer ter ficado distante, restrito a uma citação quanto ao 
lugar da mercadoria em seus métodos de explicação e de exposição do modo de 
produção capitalista. Além do convite que a dialética nos faz para olhar para reversão 
das possibilidades aqui apontadas, a própria existência destas e de similares mostra, 
também, limites do contexto em que se desenvolvem. Na medida que um determinado 
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regime de acumulação começa a apresentar dificuldades crescentes de reprodução, a 
busca de alternativas por parte do capital é ela mesma sinal dos seus próprios limites. 
Muito do que vemos hoje é reação justamente à exaustão do regime de acumulação 
que vigorou ao longo de meados dos anos 1940 a meados dos 1970. 
Concordando com o que diz David Harvey sobre a necessidade de um projeto, para 
além das constatações e dos protestos, entendo que a resistência à lógica de 
mercantilização é questão a ser tratada com atenção especial nas pautas dos 
movimentos progressistas. Essa luta desempenha duplo papel, sendo o mais imediato 
a busca pela redução — ou pela contenção do aumento — das desigualdades 
sinalizadas pela privatização e pela conversão de tudo quanto for possível em 
mercadoria. O outro papel tem a ver com prazo mais longo. Lutar contra a privatização 
da saúde ou da educação; lutar a favor do passe livre no transporte público; enfim, 
lutar a favor do que é público — o que não se resume ao estatal — e contra a 
mercantilização aponta para a construção de um outro futuro. 
Se o crescente processo de conversão em mercadoria tem sido mecanismo por meio 
do qual o capital enfrenta suas crises, combater essa possibilidade é combater a 
própria capacidade de reprodução do capital. Se no passado os movimentos 
progressistas tinham nas relações de produção o terreno primeiro de suas lutas, a 
ampliação desse espaço segue necessária. O aprofundamento das relações 
capitalistas e das suas crises coloca para esses mesmos movimentos um desafio que 
é também oportunidade, cujo aproveitamento depende da capacidade de bloquear os 
meios pelos quais o capital posterga a sua derrocada. 
Daniel Bin é professor da Universidade de Brasília e pesquisador visitante da 
Universidade Yale, EUA 
http://outraspalavras.net/brasil/quando-toda-a-vida-pode-virar-mercadoria/ 
Barbie, “brinquedo” tirano 
! 

Há décadas, boneca uniformiza desejos, padrões estéticos e visões de mundo das 
meninas. Agora, versão “interativa” registra dados privados e “dialoga”. Talvez, com 
apelos de marketing… 
Por Lais Fontenelle 
Barbie: uma imagem que aprisiona. Esse é o título do meu trabalho de conclusão de 
curso de Psicologia, há quase duas décadas. Essa boneca sempre chamou minha 
atenção. Não pelos modelitos que exibia ou por seus 10 cm de quadril e 12,5 de 
busto, mas pelo que ela representa para várias gerações de meninas ao redor do 
mundo. 
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Nascida nos Estados Unidos, Barbie foi durante décadas a boneca mais vendida no 
planeta. Dona de um fã clube de mais de 18 milhões de colecionadores pelo mundo 
todo, exemplo de beleza para mulheres que tentaram reproduzir seu rosto com 
cirurgias plásticas, ela completou meio século de existência com direito a desfile de 
moda em Nova York, exposição em museu suíço e sem nenhuma marca do tempo – 
com os mesmos cabelos longos, lisos e loiros e olhos de estrela. 
A boneca, que não envelhece nas prateleiras, atravessou cinco décadas imbatível, 
com um sorriso no rosto e influenciando meninas do mundo inteiro com valores 
materialistas e ideais de beleza inatingíveis. E agora, mais uma vez, se reinventou 
com o lançamento da versão Hello Barbie, a primeira da linha que fala e responde às 
perguntas das crianças. 
Vale voltar um pouco no tempo para contextualizar alguns fatos. No final dos anos 50, 
o casal Ruth e Elliot Handler, fundadores da fábrica de brinquedos Mattel, encontraram 
um nicho de mercado ao observarem as brincadeiras de sua filha, de 7 anos, com 
bonecas de papel. Na época não existia uma boneca tridimensional de corpo adulto 
com a qual a criança pudesse fantasiar e realizar seus sonhos. Foi nesse momento 
que Ruth criou Barbie e seu mundo cor-de-rosa, revolucionando para sempre as 
brincadeiras de meninas que, até então, brincavam, exclusivamente, com bonecas 
bebês como um exercício de maternagem. 
Com a chegada da Barbie as meninas passaram a experimentar, em suas 
brincadeiras, a falsa ideia de que as mulheres adultas podiam ser o que desejassem: 
médicas, astronautas, bailarinas – desde que fossem magras e belas. A boneca 
parece ter virado o jogo, passando a ditar não só as regras das brincadeiras como 
também os desejos das meninas, esgotando em seu corpo magro, oco e de plástico 
as possibilidades de ser e de brincar. A Barbie diz para as meninas que para ser é 
preciso ter… carro conversível, coleção de sapatos, namorado sarado e muitos 
acessórios. 
Isso dito, fica claro que essa boneca e seu mundo exercem uma forte influência nos 
ideais femininos contemporâneos. Se, de alguma maneira, nós mulheres nos 
libertamos dos espartilhos de nossas bisavós, parecemos estar hoje aprisionadas no 
culto ao corpo e busca incansável da magreza. Nossos corpos desejantes, 
supostamente libertos, estão agora entrelaçados a objetivos mercadológicos. A 
estética “Barbie” disseminada pelo mundo todo é imposta pela cultura da moda, 
principalmente pelas imagens publicitárias. Vendido como passaporte para a 
felicidade, influencia também no desenvolvimento de transtornos alimentares. 
Esse fato é tão verdadeiro que em 2012 duas adolescentes inglesas de 16 anos, da 
cidade de Crewkerne, chegaram ao baile de formatura do colégio empacotadas dentro 
de caixas da Barbie em tamanho natural, como verdadeiras bonecas de plástico 
encenando uma entrada triunfal. 
As caixas de papelão de 1,80 m X 0,60, com flores pintadas à mão, foram feitas por 
uma mãe que gastou 250 libras para realizar essa fantasia. Se a intenção era roubar a 
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cena, elas conseguiram. A cidade toda parou para vê-las passar, aprisionadas em seu 
sonho de infância. 
Já com a Hello Barbie, o último lançamento da Mattel em parceria com a Toytalk 
brinquedos, outros sonhos de infância serão aprisionados, melhor, armazenados numa 
nuvem. Nesse Natal a Mattel, na tentativa de retomar seus lucros com a venda da 
boneca, inovou colocando à venda no mercado a Barbie que usa um aplicativo Toytalk, 
transmite as conversas das crianças com a boneca via wifi e as armazena num 
servidor da empresa. A Hello Barbie usa inteligência artificial e reconhecimento de voz, 
sendo capaz de armazenar mais de 8 mil diálogos das crianças. 
Não só as falas da criança – e também as de outras pessoas da casa ou amigos da 
criança – são captadas pela boneca eenviadas ao servidor da empresa. A partir da 
análise desse material, novos dados são enviados à boneca, que poderá responder 
perguntas e travar diálogos com a criança. Vale destacar que a boneca também 
armazena outras informações e incorpora às conversas detalhes como gostos, lugares 
e até nomes citados pela criança – o que pode ser extremamente perigoso. 
Soube do lançamento da boneca desde o início de 2015, quando a CCFC (Campaign 
for a Comercial-Free Childhood – ONG norte-americana que luta contra a 
mercantilização da infância) lançou uma campanha para que a boneca não chegasse 
às prateleiras. Foram mais de 45 mil assinaturas apoiando a CCFC, que elegeu a 
boneca o pior brinquedo de 2015, com 57 % dos votos. 
Mas, foi somente depois que minha filha de 4 anos ganhou seu primeiro brinquedo 
falante, neste Natal, que resolvi me debruçar sobre o assunto. Notícias recentes me 
levaram a refletir sobre brinquedos que falam ou são ligados à web, pelo impacto que 
podem ter no desenvolvimento saudável das crianças. 
Bonecos que emitem som, cantam ou reproduzem de três a cinco frases não são 
novidade no mercado, mas ver de perto o que um simples Furby pode causar na 
brincadeira inocente de uma criança – é assustador. Minha filha, ao desembrulhar o 
boneco, presenteado esse Natal pelo querido avô, e entender que ele parecia de fato 
ter vida independente de sua imaginação, pirou. De início, encantou-se ao perceber 
que ele precisava de seus cuidados para se alimentar, brincar e dormir. Porém, 
quando se deu conta de que ele não parava de falar quando ela quisesse e que não 
tinha um botão para desligá-lo, parece não ter gostado tanto assim. Não foi à toa que 
Frankenstein assustou seu criador. 
Depois disso me deparo com o resultado de uma pesquisa sobre o quanto os 
brinquedos que falam são piores para o desenvolvimento da linguagem das crianças. 
Segundo o artigo, se o brinquedo fala, filhos e pais se calam. E quando pais e mães 
usam menos palavras, geram menos conversas e obtêm menos respostas das 
crianças – o que tem um enorme impacto no desenvolvimento de sua linguagem. 
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Some-se a isso a notícia de que a Vtech, empresa de Hong Kong fabricante de 
tablets, “learning toys” e apps desenhados para crianças, acabou de experimentar 
uma das maiores invasões hackers focadas em crianças na história. 
Aproximadamente 5 milhões de contas de pais e mais de 6,4 milhões de perfis infantis 
contendo dados privados foram comprometidos, gerando danos às famílias. E quando 
a Toytalk, assim como a Mattel, afirmam que não farão uso das gravações feitas pela 
Hello Barbie para contactar as crianças ou assediá-las com apelos de marketing, só 
nos cabe desconfiar e ficar atentos. 
Então me pergunto: por que estamos permitindo que uma boneca espie as 
brincadeiras de nossas crianças? O brincar é a linguagem universal das crianças. 
Através de suas brincadeiras elas elaboram conflitos, exercitam comportamentos 
adultos, se socializam e usam sua imaginação e criatividade. É uma atividade sagrada 
que merece nosso respeito e proteção. 
As crianças ficam concentradas em suas brincadeiras e, na maioria das vezes, não 
gostam de ser invadidas ou interrompidas. Imagine se perguntássemos o que pensam 
sobre suas brincadeiras serem gravadas – achariam graça? Através do brincar, as 
crianças travam diálogos imaginários e perguntam e respondem de acordo com sua 
subjetividade, maturidade, medos e angústias. Como será para elas receber respostas 
prontas de uma boneca? Não seria muito mais interessante e benéfico darmos espaço 
à imaginação? 
Nos Estados Unidos não só ONGs, mas também especialistas e famílias já estão 
cobrando dos órgãos responsáveis uma política que regule as novas tecnologias 
presentes nesse tipo de brinquedo, e que as produções e vendas sejam interrompidas 
até a existência das normas. Deixo aqui essa reflexão na esperança de que esse tipo 
de brinquedo não aterrisse por aqui e comece a hackear dados de crianças expostas e 
vulneráveis em suas brincadeiras. Façamos valer o artigo 12 da Declaração Universal 
dos Direitos Humanos, que diz: “Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida 
privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à 
sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito 
a proteção da lei.” 
Lais Fontenelle Pereira 
Lais Fontenelle Pereira, mestre em Psicologia Clínica pela PUC-Rio e autora de livros 
infantis, é especialista no tema Criança, Consumo e Mídia. Ativista pelos direitos da 
criança frente às relações de consumo, é consultora do Instituto Alana, onde 
coordenou durante 6 anos as áreas de Educação e Pesquisa do Projeto Criança e 
Consumo. 
http://outraspalavras.net/posts/barbie-brinquedo-tirano/ janeiro, 2016

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