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1 CURVA DE PHILLIPS Anexo ao Texto “Macroeconomia”, de Roberto Ellery Jr. Renato Matos Roll Revisão: F. R. Versiani 1. Introdução O modelo keynesiano simples, exposto no texto anterior, mostra que a insuficiência de demanda agregada (gastos de consumo, mais gastos de investimento, mais gastos do governo, numa economia fechada) leva a uma situação em que o produto efetivo é inferior ao produto potencial (ou seja, inferior à capacidade de produção, ilustrada pela curva de possibilidades de produção). Nesse caso, haverá subutilização de fatores de produção e, em particular, desemprego de mão-de-obra. Por outro lado, se há um excesso de demanda, em relação à capacidade de produção, isso produzirá inflação. Pode-se supor, assim, que haja uma relação inversa entre os níveis de desemprego e de inflação. Essa relação, na forma indicada no gráfico abaixo, foi verificada em muitos estudos empíricos, tendo sido pioneiro o publicado, em 1958, pelo economista neozelandês A. W. Phillips. Em decorrência disso, a curva abaixo ficou conhecida como Curva de Phillips. 2. A Curva de Phillips Phillips examinou, de fato, a relação entre taxas de desemprego e taxas de aumento dos salários nominais, usando dados para o Reino Unido, relativos ao período de 1861 a 1957. Mas a maioria dos trabalhos posteriores focalizou a relação entre desemprego e inflação de preços, em lugar de inflação de salários. Assim, quando se fala em Curva de Phillips, tem-se em mente, em geral, uma relação inversa entre o nível de desemprego e o nível de inflação. Estudos para vários países — além do de Phillips — constataram, de fato, movimentos em sentido oposto das taxas de inflação e de desemprego, ao longo do tempo, pelo menos no período até o final da década de 1960. Em termos de política econômica, isso podia ser interpretado como a expressão de uma alternativa implícita, para as autoridades econômicas (um trade-off ), entre a eliminação da inflação e a eliminação do desemprego. O que uma relação como a expressa pela curva abaixo indicaria é a necessidade de chegar a um meio-termo: para obter uma redução do desemprego a um dado nível, seria preciso conviver com a correspondente taxa de inflação. Ou, simetricamente: para se ter uma inflação baixa, seria necessário aceitar um menor nível de 2 emprego. A sociedade deveria decidir qual a combinação aceitável das duas taxas. Gráfico 1 – A Curva de Phillips: taxa de inflação x taxa de desemprego 3. Emprego e inflação de demanda Uma interpretação simples do significado econômico da Curva de Phillips está associada aos efeitos do aumento num dos componentes autônomos da demanda agregada (v. o texto “Macroeconomia”, de Roberto Ellery Jr., para definição de gasto autônomo). Suponha, por exemplo, que ocorra uma expansão dos gastos de investimento; mais concretamente, imagine que, numa determinada cidade, põe-se em operação uma fábrica de sapatos. Para a construção e instalação dessa fábrica, serão contratados trabalhadores locais. Supondo que esses cidadãos estivessem antes desempregados (vivendo com os pais, por exemplo), reduzir-se-á, em consequência, a taxa de desemprego nessa localidade. Ao aumento de emprego corresponde um aumento de renda e, portanto, de consumo. Com mais dinheiro no bolso, os novos trabalhadores modificarão seus hábitos de consumo: poderão ir ao cinema, frequentar o shopping, renovar seu guarda-roupa, comer em restaurantes; onde se bebia água durante as refeições, passa-se a beber refrigerante ou suco; e assim por diante. Haverá um deslocamento para a direita nas curvas de demanda por tais bens ou serviços. Esse deslocamento nas curvas de demanda vai alterar o preço de equilíbrio, nos mercados respectivos. A magnitude do efeito sobre os preços vai depender de vários fatores: a extensão do incremento na demanda, o nível de concorrência no mercado considerado, a elasticidade da oferta, etc. Mas haverá, em geral, uma pressão no sentido do aumento nos preços, como indicado no Gráfico 2. Se isso se der num número significativo de mercados, haverá tendência a uma inflação de demanda. 3 Gráfico 2 – Deslocamento na demanda e preço de equilíbrio (No Gráfico 2, a curva de demanda se desloca para direita e para cima, de D para D’, o que provoca uma elevação na quantidade demandada de Qeq para Qi e no preço de equilíbrio de Peq para Pi). Havendo aumento generalizado de preços, ou seja, inflação, o efeito geral das transformações ocorridas na economia considerada, em consequência do aumento de gastos de investimento, será o indicado na Curva de Phillips do Gráfico 3. O período inicial corresponde ao ponto A, e o período posterior à efetivação do investimento ao ponto B. Passa-se de uma situação de maior desemprego e menor inflação para uma situação de menor desemprego e maior inflação. Gráfico 3 – Deslocamento ao longo da Curva de Phillips É claro que uma redução posterior de renda na cidade em questão, por qualquer motivo, poderia provocar um movimento oposto, de B para A. 4 4. A Ação Governamental Na visão de Keynes, como vimos, as decisões de investimento são muito influenciadas pelas expectativas dos investidores quanto ao futuro, de tal forma que os gastos de investimento são vistos como um componente exógeno da demanda agregada, pouco influenciável por decisões de política econômica. Ações deliberadas no sentido de uma redução do desemprego dependeriam, assim, de intervenções diretas do governo, seja no sentido de um aumento em seus próprios gastos, seja buscando aumentar os gastos de consumo, pela redução de impostos. Nesse sentido, a determinação do ponto da Curva de Phillips em que uma dada economia se situasse resultaria da atuação do governo, a partir de uma escolha social quanto às alternativas de inflação e desemprego. Em situações em que o nível de demanda agregada acarretasse baixa produção e uma taxa de desemprego julgada inaceitável, o policy maker poderia, por meio de medidas que levassem ao aumento de gastos, diminuir o percentual de desempregados, aceitando em contrapartida uma taxa de inflação maior. Ao contrário, numa conjuntura em que a inflação superasse um patamar suportável, promover-se-ia um corte de gastos, o que causaria deslocamentos para a esquerda nas curvas de demanda, e assim queda nos preços, na produção e, consequentemente, no emprego. Essa política representaria uma opção por menor inflação e maior desemprego. 5. Curva de Phillips: outras interpretações Com o aumento dos níveis mundiais de inflação na década de 1970, seguindo-se aos choques do petróleo, as relações antes observadas entre inflação e desemprego, a partir da determinação empírica de Curvas de Phillips, em geral deixaram de ser observadas. Por exemplo: para um dado nível de desemprego, verificavam-se, nessa fase, taxas de inflação mais altas do que as constatadas nos anos anteriores a 1970. Aparentemente a Curva de Phillips deslocava-se para cima. Uma possível explicação para isso partiria da introdução de um elemento antes não considerado nas teorizações sobre a Curva de Phillips: as expectativas quanto à inflação futura (que estariam mais altas, nos anos setenta). Vários economistas, como Milton Friedman1, argumentaram que a relação entre inflação e desemprego, levando em conta os mecanismos de fixação de salários no mercado, dependeria crucialmente das expectativas de inflação. 1 Ganhadordo Prêmio Nobel de 1976 em Economia. 5 Essa reconsideração da análise da Curva de Phillips se fez no bojo do desenvolvimento de novas teorias macroeconômicas, fenômeno observado a partir da década de 1970, após um período em que as ideias de Keynes dominaram amplamente o pensamento econômico. Essas novas formulações representam, em parte, uma volta às concepções dos economistas “clássicos”, tendentes a favorecer, em termos de política econômica, os mecanismos de mercado, em detrimento de intervenções governamentais (que são centrais no sistema keynesiano, como vimos). A análise dos chamados “novos clássicos” dá grande importância, entre outros fatores, a uma ligação entre a macroeconomia e a microeconomia, procurando estabelecer, com cuidado, os fundamentos microeconômicos das análises macro. De outra parte, o período atual presencia também uma renovação e atualização do pensamento keynesiano: os “neokeynesianos” procuram conciliar a visão geral de Keynes com os desenvolvimentos analíticos recentes. Não cabe, num curso introdutório, entrar em detalhes sobre as controvérsias da macroeconomia atual. Em termos muito gerais, pode-se repetir o que já foi dito em texto anterior da disciplina: os princípios da análise keynesiana são úteis para entender fenômenos importantes do curto prazo, como as oscilações da atividade econômica, e fundamentam políticas anticíclicas freqüentemente adotadas. Por outro lado, a análise clássica (e “novo-clássica”) ilumina tendências de longo prazo da economia, indicando inter-relações fundamentais entre variáveis e esclarecendo a operação dos mecanismos de mercado. Bibliografia: CASTRO, Steven. Taxa de juros do BC como Política Anti-inflacionária. Apostila de Introdução a Economia - UnB. PEARCE, David W. The MIT dictionary of modern economics. MIT Press Edition. Cambridge, Massachusets: 1994. ELLERY, Roberto. Macroeconomia. Apostila de Introdução a Economia - UnB. SACHS, Jeffrey D. & LARRAIN, Felipe. Macroeconomics in the global economy. Prentice-Hall Inc., 1993. SERRANO, Franklin. O dilema entre inflação e desemprego. Revista Ciência Hoje. Vol. 39. Dezembro, 2006. Sinergia Gráfica e Editora Ltda. p. 16-17.
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