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Pato Donaid, Mickey, S'Jper-Homem, t',sterix, Nf.í é' importa qual o idioma, I não irll)orta s(~ " ias são subHteratura,' ou não, A verdade é que, desde que surgiram '1a imprensa americana do começo do século, as histórias em quadrinhos são universais_ Fizeram â cabeça de diversas qer;:,qões e, nos j 1dS dS '10jé, -).(Ui98rTl UITI pÚbiico d(~ cfmtenas de milhões do pessoas em tvlo o rnu r; JO , Um público que sabe que a M2~Ja' ida é a plern :ô1 namorada cio Pato Don.:lld e quP. a Miriam Lane, um dia, ainc;-- 'f81 descobrir a verdade'ra Identidade do " lj I I II ,...,1 INHOS cOlecão •• primeiros 144 • _. _passos • • Cai o Império - República Vou Ver - Lmn M. Schwarcz/ Angeli • Da Colônia ao Império - Um Brasil para Inolôa Vw 11 Latifundiário Nenhum Botar Defeito - UI/o M. Sc;hwarcz / Miguel Paiva Coleção Primeiros Passos • O que é Herói - Martin Cezar Feijó • O que é Indústria Cultural - Teixeira Coolho Coleção Tudo é História • Tio Sam Chega ao Brasil - A Penetração Cu ltUiol Al tlurlntl rl l1 - Gerson Moura OQUEÉ HISTÓRIA EM QUADRINHOS 1 ~ edição 1985 . 2 ~ edição editora brasiliense DIVIDINDO OPINIOES MULTIPLICANDO CUlTIJRA 1 9 B 7 ? • Copyrighl © Sonia M. Bibe·Luyten Capa: ' Carlos Matuck Revisão: José W. S. Moraes Conceição A. Gab riel U F R J -AZe~-;;t~~nsfe~i ~5:_§CO·· 1 1 Im (1~ FiJos'ofh c C'ências IIUm3llJS , . B3>.:tül>.:t51 36 30.351 Uu/', .' editora brasiliense s.a. rua general jardim, 160 01223 . são paulo . sp lono 1011) 231·1422 brftllllOll1l8 lolox: 11 33271 OBlM BR R EÇO 1'''0 (fi ./ o .- ÍNDICE - Int rodução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 - As HQ no mundo . , . , . . . . . . . . . . . . . . . . 16 - A longa luta dgs quadrinhos brasi leiros . . . 60 - Indicações para leitura . . . ... . .. . . . .... 87 •• •••• I , INTRODUÇÃO Quantas vezes todos nós já levamos bronca dos pais, sendo pegos "em flagra" com uma revista de quadrinhos na mão e eles diziam: "Larga esse gibi! Não tem coisa melhor para ler?" . Preconceitos como esse ainda existem, mas estão ficando menos freqüentes. Hoje, a grande~ maioria das pessoas já está conscientizada da >J:' enorme importância que têm as histórias em Y quadrinhos. \ Tanto na área da educação como nas A de lazer e, ati!" nos camoos da orooaganda comer· -t cial e pol ítica.} _ Em todas as áreas temos, portanto, a possibili· dade de encontrar os quadrinhos. O que importa , porém, é d~ onde vêm essas históri as e quem as ' escreve, pois elas são excelente veículo de mensa·i,l1r~" ..L... gens ideológ[cas-e- d8-CLítica"social expl ícita ou implicitamente. , - 8 - Sonia M. Bibe-Luyten O que é História em Quadrinhos 10 por isso; por exemplo, que elas foram proibidas durante a Segunda Guerra Mundial pelo Ei xo, e os países do bloco comunista se recusam a aceitar as historietas do Ocidente_ Por outro lado, a Ch ina Popular, na época de Mao Tsé-Tung chegou a criar seus próprios quadrinhos a fim de divulgar melhor a ideologia da "Revolução Cultural"_ l.t-pesar dessa sua força e ímpeto de comunicação, o quadrinho tem sofrido muito em matéria de desprestrgio por parte de intelectuais e educadores do próprio mundo ocidental _ Essa condição de subproduto de cultura que acompanha as HQ está em função da estrutura industria l de grande escala , envolvendo interessés econômicos que podem acabar, realmente, de compr0rTleter o relaciona- mento mais dinâmico c·om a cultura -Mas não podemos nos esquecer dos inúmeros desenhistas que levaram à frente um pensamento mais amplo, c riando quadrinhos os quais souberam retratar, com esp írito- de crítica e humor, cada época, cada "instante do ser humano da maneira mais direta possível , captando tendências artísticas e cinematográficas para compor sua estética visual. Para não sairmos de perto, basta lembrar os persÕ= nagens de Henfil e Ziraldo, além da inesquecível Mafalda, de Quino, o mais famoso desenhista da.Argentina. Os quadrinhos marcam, sem dúvida, os aCQJlte.ci- -mentoL.d_o_sé..~esta civl'lização da qual você é protago~i sta. Para cnegar à forma atual, as -" HQ acompanharam toda espécie de evolução e um incrível entrelaçado de influências da foto- grafia e do cinema . Usaram também as inovações tecno lógicas para a reprodução das imagens. Além disso tudo, a influência que os quadrinhos exerceram nas pessoas , tanto no Ocidente como no Oriente, é considerável e, mesmo assilll! , não foi ainda avaliada em toda a sua extensão. Quantos escritores, pintores ou diretores de cinema já não confessaram terem se i nspirado na HQ, como uma leitura que dei xou , marcas bem profundas em sua formação intelectual? ---Portanto, através de seu desenvolvimento, da formação de sua linguagem, da luta dos desenhistas brasileiros para conquistar seu espaço, vamos juntos acompanhar como se deu essa evolução, procurando dissipar mal-entendidos e compreender por que as Histórias em Quadrinhos deixaram, ou melhor, ultrapassaram a condição de instrumento de consumo para 1Qrnarem-se símbolo da civili· zação contemporâne~l Os ingredientes das HQ Antes de qualql!er definição, quero dizer que o quadrinho é um \ produto com ra ízes populares. E mais popular aincra foi a sua difusão. Como um meio de comun icação, ele nasceu nas empresas 9 " ... 10 Sonia M. Bibe-Luyten O que é História em Quadrinhos 11 jornalfsticas norte-americanas, no fim do sécu lo p ~sado ~ De~ o in fcio, sua característica foi a de comu-nicação de massa, uma vez que atingia um pú5fic o ./ enorljlJI Outro detalhe foi a exigência dos melhmes e mais modernos processos de impressão gráfica para a sua produção. Assim, o primeiro guadrinho norte-americano, o Ye//owKid (Moleque Amarelôl. ae cor amare la, OI justamente para testar essa cor que estava sendo usada pela primeira vez na im- pressão de jornais. No Brasi l, a Editora Abril, o maior parque gráfico da América Latina, começou e se con~olidou com a impressão das revistas Pato Dona/d. A difusão dos quadrinhos fo i universal, mas em cada canto do mundo recebeu nomes diferentes ., Nos Estados Unidos, o nome comic strios (tiras cômicas) está mUito Vinculado com o con- teú do, isto é, no infcio de sua popularização,....àS histórias tinham um caráte.r predominantememe humorCstico caticatur:esc "pesar · das novas modalidades surgidas postenormente, este nome continua até hoje: comic strips, comics, comix ou funnies (engraçados) - como designativo geral em pafses de I fngua inglesa. Para as revistas, adota- .§e..o termo CJlmic books...... ' ~ França chama-se bandes dessinéf1$, ou seja, bandas (tiras) desenhadas. Mas, na Itália, o nome derivou-se daquilo que é mais característico nos quadrinhos: ~umetti - fumacinhas, os ba lõezinhos que ~aem da boca dos personagens, indicando sua fala Na Espanha e no Brasil, ocorreu algo em comum quanto ao nome popu lar de rev istas em .quadrinhos . Uma revista infantil espanhola (que Iniciou-se em 1917), chamada T B. O., ficou_ tão conhecida e famosa que seu nome ampliou-se até abranger todas as publicações de caracterfsticas semelhantes. Hoje em dia, na ESJ:lanha a pal~ " taheó" é eq uiva le lll!Lil_p_ala.ll(a..b(asileif.a~gip!,;J.- Poucas pessoas se lembram de que a palavra "gibi"t significa "moleque". ~ que houve uma rev ista com este nome, nas décadas de 30 a 40, que, de tão difund ida, emprestou seu nome a todas -as revi stas de quadrinhos do p2fsJ Na América Espan.b.ola, .usa-se a Ila lavra "histo- rieta'':'" nQ JaJ:lão, mangá, e em Por.111gal, "histórias aos quadradinhos". - Como se estruturam as HQ E la~ são formadas por dois códigos de signosoráficos: a ilUagem e a li0B-ua9em escrita. ÕTãto tio os .quadrinhos terem nascido do conjunto de ( 1 ~l as artes diferentes - literatura e desenho - --- . I1 O os desme rece. Ao contrariO, essa funçao, esse I!lI ráter misto que deu in fcio a uma nova forma c/li manifestação cultural., é o retrato fiel de nossa 12 Sonia M Bibe-Luyten O que é História em Quadrinhos época, onde as fronteiras entre os meios artfsticos se Inter Iam. IÕ infundada a crítica que se faz aos quadrinhos, pri ncipalmente aquela que os considerª s_ubli!era- ~ura ou "sub arte". Isso porque,-uma vez que os quadrinhos tenham se nutrido em fontes literárias ou pictóricas, não quer dizer que esses materiais conservem a sua natureza depois de adquirirem sua forma final. IÕ o que acontece com o cinema: depois de o roteiro passar para a linguagem cinema- tográfica não é mais literatura e, Sim, uma nova e vigorosa modalidade artfstica. Entre os elementos que entram na composição dos quadrinhos, o que mais caracteriza e dá dina- micidade à leitura são os balões . O balão é a marca registrada dos quadrinhos . Na sua forma 6em-- comportada, indica a fala coloquial de seuiJlerso- n"agens. l'iIo entanto, quan o estes mudam de nu mor, expressando emoções diversas (surpresa, ódio, alegria, medo), os balões acompanham tipologicamente, participando também da imagem. As formas são muitas e bastante variadas. Parti~do-s~ do balão-f~>Jodemos.-encontrar- o oalão-pensamel'lto, balão-berro, balão-cochilo, balão -trêmulo (mado), bal1!o-transmissão (para t ransmitir Sõm de aparelhos elétricos ou elet rônicOs) balão- Besprezo.balão-uníssono (mostrando a fal~ ú-nica d~ diversos personagens) , balão mudo e dezenas de formaç_éiê . diversas. Esses tipos e formas vão depender sempre da situação que se quer criar, ocasionando, aSSim, ótimos efeitos visuais e comu nicativos. Vocês podem imaginar, agora , quantas palavras e expressões explicativas são economizadas, hoje em dia , pela simples colocação deste ou daquele tipo de balão. - - - Da mesma forma que os balões, as onomato- péias, palavras que rocuram re roduzi r ru ' dos e sons, ' completam a lin uagem dos guadrinhos e lhes dão efeito de grande beleza sonora. Numa comparação com o cinema, os quadrinhos tiveram a primazia de ser falantes desde o in ício (n ão se esqueçam de que o cinema foi mudo até a década de 20). Posteriormente, as HQ foram buscar a inspiração sonora . nas artes cinematográ- fic as para exprimir os ru ídos não contidos nos balões. NOs quadrinhos japoneses, por exemplo, as onomatopéias têm uma função muito mais plástica do que visual ou sonora. Isto porque a escrita japonesa é formada por caracteres e as onomato- pé ias inseridas nos quadrinhos dão um incrível movimento, equilíbrio e força ao som que estão ex primindo. Pode-se observar que a expressão dos ru ídos onomatopaicos tem muito a ver também com a I íngua inglesa . to que esta I íngua, por ser híbrida (houve ma is de dez idiomas na formação do Inglês atual , sobretudo o antigo holandês e o f'ra ncês normando), favoreceu melhor a escolha 13 14 Sonia M Bibe-Luyten O que e História em Quadrinhos definitiva de palavras para determinar as coisas_ Além disso, a fase de consolidação dos quadrinhos teve como local os Estados Unidos e daí partiu sua influência pelo mundo. A I íngua inglesa já é sintética e, por isso mesmo, reproduz o som com maior proximidade e freqüên- cia / Assim, certas onomatopéias têm seu sentido na tradução lingü ística semelhante ao ru ído expresso. Vejamos alguns exemplos: r--- ONOMA- SIGNIFICADO TOPÉIA NO OUAORINHO TRADUÇÃO SLAM! porta batendo bater com força uma porta CRACKl objeto partindo-se quebrar; arrebentar ; rachar SNIFF fungar; cão farejando aspirar audivelmente pelo nariz SPLASHI pessoa ou objeto espirrar; esguichar caindo na água GULPI engasgo tragar; f ocar engulir; devorar; su- Estas e mu itas outras onomatopéias, que já são dotadas de significado em inglês, quando são trans- portadas para outras I ínguas, ficam apenas com uma função de signos visuais, isto é, passam a ser convenção na linguagem das HQ. Fui tradutora, durante a lguns anos, da página de quadrinhos do Jornal da Tarde, e sempre procurei respeitar a forma original das onomatopéias, justamente por esse motivo. Mais recentemente, porém, diversos desenhistas brasileiros, na criação de suas histórias, começaram a buscar e adotar uma grafia onomatopaica mais pertinente à nossa I rngua, trazendo, conseqüentemente, uma ass imi- lação eficaz e um contato mais direto com o leitor. • •• • •• IS o AS HQ NO MUNDO Os pioneiros Por incr(vel que pareça, a~ns das HO estão "'\ justamente no in (cio da civilização, onde as inscri- ,,\\ ções rupestres nas cavernas pré-históricas já reve- lavam a preocu[1a ãõOe na rar os acontecimentos através de desenhos sucessivos_ - Durante o processo civilizatório, várias mani- !festações aproximaram-se desse gênero narrativo: mosaicos, afrescos tapeçarias e ais EL-um'l dezena de técnicas foram utilizados para registrar a história por meio de uma seqüência de imagens, . No fim do século passado, com o aprimoramento das técnicas de impressão, as estórias em ir'Qagens foram largamente utilizadas nos livros e jornais, -Os pesquisadores, porém, convencionaram tomar como arco inicial para uma história das HO o o que é História em Quadrinhos Little Nemo, de Winsor McCay_ Sonia M Bibe-Luytel que é História em Quaarmnu~ aparecimento, emI1894, do Yellow_Kid, criação do norte-americano Richard -"F. Outcault para - o. ew York World, jornal sensaCIOnalista de pro- priedade de Joseph Pu li t~ " ste ma rco é importante, pois os quadrinhos, _eLaIIL..e I a s somente em álbun QU livros assam a ser d ivu l ados or um veículo dL ,comunicação_ d mas~jl.,~ndo_acessLveis_a um.. número bem maior de pessoas. _ O personagem Yellow Kid aparecia no suple- mento dominica l em cores que, na época, era a principa l atração do jornal. "O Moleque Amare lo" tomou-se rapidamente uma grande atração. Depois disso, os quadrinhos passaraQ1 a ser fator determinante na vendagem dos jorna is, e seus autores, disputados pelos áv idos empr.;strios da notrcia. Tanto é que William Randolph Hearst, outro magnata das rotativas e arqui inimigo de Pulitzer,jiacou rapida mente de seu ta lão de cheques e levo R icha.Ld OlJtcal,llt- pa ra o seu New Y ork Journa, onde este criou o seu se undo personagem de sucesso: o garoto Buster Brown. A superva onzação das HO, devido à exigência dos leitores, mostrou aos empresários que os quadrinhos t inham o seu lugar assegurado, e eles "compreenderam" rap idamente o fenômeno sa indo à procura de autores cada vez me lhores, criando uma efervecência no setor. Logo, desenhistas de primeira linha traba lhavam freneticamente na construção de uma linguagem que já estava exp lo- dindo em todas as direções. Outcault, no entanto, não inventou a história em quadrinhos. Na verdade, ela já ex istia em estad latente e convergia para o ponto de partida pelo trabalho e van os autores que es avam mais ou menos no mesmo momento criativo. O mérito de Outcau lt está no fato de ter sido ele uem Ilr'- meiro rea lizou essa s{ntese e introduziu o balão, que é, sem dúvida, o elemento ue define a história em guadnnhos como tal. Com o aparecimento do balão, os personagens passam ~ f~r e a narrativa gan a um aVO<ltn'a",-c---1 mismo, libertando-se, ao mesmo tempo, da figura do narrador e do texto de rodapé que acompanhava cada imagem. Com essa autonomia, cada qua- drinho ganhou uma incr{vel agilidade, porque passou a contar em seu interior, integradas à Imagem, com todas as informações necessárias para o seu entendimento.Os personagens passam expressar-se com suas próprias palavras, e surgem os onomatopé ias acrescentando sonoridade às I age ns. Dois anos depo is do Yellow Kid, Rodolph @ Dlrks, um desenhis.ta_ pdocip.iante, .já ch~ava ã .H ..... larma definitiva da HO. ~us personagens, Thê Kotzenjammer Kids (Os Sobrinhos do Galtao , I O um exemplo completo de HO. Até o apare- I!lmento dos Sobrinhos do Capitão, as estórias I r Im meio toscas, titubeantes. Ouase sempre um "li outro elemento básico das HO estava mal 20 Sonia M Bibe-Luyte lo que é História em Quadrinhos 21 resolvido. comprometendo a narrativa. deixando-a precária . Os gersonaoens de Dirks (vocês conhecem bem os dois garotos terdveis lu tando sempre contra as formas de autoritarismo simbolizadas pelo Capitão - e eles são publicados até hoje ~.no Brasil ) são tiDOS pitorescos. com vida própria. encaixados direitinho no cenário. Com-ªsta obra. a "!) narrativa quadrinizada consegue. após várias expe- V riências. realizar um trabalho vigor0iz e conso- I I idar-s.eJ:le.tin.ithlamen.te-cu= linguaglt.m. Houve outras bis1ód.~ue ficaram f amosas pe las suas inovações. Um bom exemplo é Ji1t1e- ,Nemo in Slumberland (O pequeno Nemo no país dos sonhos). desenhado por Winsor McCay em 1905. Apresentado no melhor estilo art-nouveau- (modalidade artrstica em voga na época. com vegetais e flores estilizadas). McCay abriu para os quadrinhos um panorama vastrssimo. Ele atinge a condição de arte. e seus desenhos desempenham outro papel ao invés de ~e sucederem monoto- namente emoldurando a acão. '-O que foi visto até agora. aconteciaJlos suple- mentos domlDicais. que eram. na época. a parte mais procurada do jornal. com os leitores aguar- dando ansiosamente o momento de reencontrar seus heróis. A partir de 1907 ocorria uma profunda modi- 1/ fi cação nesse esquema com o aparecimento da r primeira tira diária - ~ dailv stci!J.. Com isso. os ~ / quadrinhos deixaram de ser um bloco isolado dp . conteúdo do jornal para ingressar nas páginas!:S internas e aparecer nos outros dias da semana A-- tornando-se uma prêSeiiÇa cotidiana na vida dos leitores. Essa- alteração implicou também uma mudança forma l. já que na página dominical as estórias ocupavam a sua tota lidade e. agora. viam·se com- primidas numa tira. obrigando os autores a dar o se..!! /::. recado em três ou. no máximo. c inco quadrinhos. c1' r {'Estamos falando de Mutt e Jerr. criação de Bud ~ Fisher. consider<Ldu primeira tira diária. que vei~ ~v abrir novo espaço e tomolJ. incllJsive • ....Q lugar do,- suplemento dom inical.' Completa-se. assim. o período de construção da linguagem. com flexibilidade suficiente para realizar uma grande alteração formal sem perder o que já havia conquistado. Um exemplo disso é o próprio "Mutt e Jeff". que surgiu já na sua forma defin itiva e ·continua sendo publicado incansa- velmente. Apareceu . inclusive. até pouco tempo trás. no jornal O Estado de S. Paulo. A difusão do-;;;omiCS - os Sy:::Jes ----- ----- .---- Como já vimos. o surgimento das tiras diárias na primeira década do século coincide com a exp losão 11 I imprensa norte-americana. Em conseqüência do aci rramento da disputa pelo públ ico leitor. os I I 22 Sonia M Bibe-Luy te, que é História em Quadrinhos 23 editores saíram à PLOcura de novas fórmulas para aumentar as tiragens. E, nesse momento, os qua- drinhos já haviam comprovado sua eficiência. Além das tiras cômicas, onde predominavam crianças endiabradas, inocentes trapalhões e an ima is humanizados, surgiu mais tarde um outro tipo de quadrinho: as tiras seriadas . Nessa nova modalidade, cada tira f uncionava como um cap í- turo c:iTário de _ uma hisJória centra l. O último quadrinho continha a carga maior de informação 'I ~ e--!uspense, remetendo o interesse [:lara o próximo " caprtu lÓ", à ve nda no dia seguinte em todas as bancas ... Essas séries duravam aprox imadamente seis semanas. '---"" AI Capp, o criador de Li', Abner (Ferdinando, no Brasil), satir izou essa situação criada pe las histórias de seqüência e o impacto que elas causa- ram, mobilizando e cativando os lei tores ameri- canos. Ele colocou seus personagens nas situações mais absurdas para conseguir a continuação da historinha. [Entretanto, a grande difusão das HQ foi real- 1...r7 mente consegu ida graças ao esquema dos syndicat~s -"r r ou-a§"ênclas distribuidora'S] (e não "sindicatos", como são erroneamente traduz idos). Essas agências distribu íam e continuam distr ibuindo centenas de hif !órias para ve ículos em todo o mundo. ~ primeiro syndicate, criado por Hearst em 1912, foi o International News Service, que mais tarde se tornaria o King Features Syndicate. Um dos primeiros personagens internacionalizados foi o Pafúncio (Bringing-,,-úather), criação de George MacMaõjJ... desenhado em rico est il o a~ tpéco (a moderna junção de retas e curvas). .;tO} syndicates funcionam com desenhistas<,~ co.ntratad~ Rara produw séries de bistórias?"" previamente apm1'a_dai que devem ser enviadas com grande antecedência para correções e padro- ni zaç§ ReprotJuzidas em papel de boa qualidade, são enviadas para jornais e editoras que têm contrato assinado com O syndicate, geralmente, por doze meses. Cuidam também dos direitos autorais e do "merchand ising", isto é, a comercial ização dos personagens em camisetas, brinquedos e todas os as coisas. , O sistema de distribuição R,oss ibilita a grandes -:: <- pequenos jornais e revistas do mundo inteiro Lf 1I publicação dos autores e personagens mais romosos por um preco ab.Sllmo_de-.ba<.a.to.::UJucro do syndicate está na grande quantidade de tiras que são vend idas de uma só vez sem que se tenha quo redesen há-Ias. O esquema funciona até hoje, e II ca fácil imaginar como se sentem os desenhistas loca is (o caso do Brasil, por exemplo), ao tentar Ii OI1COrrer e encaixar seu material nos jorn,~) sJ I\lém disso, esses syndicates têm uma especie de "l1sura interna que obriga seus autores a nivelar 11 conteúdo das histórias a fim de co locá-Ias em '1l1l1lquer sociedade, mesmo as mais moralistas. 24 Sonia M Bibe·Luy t que é História em Quadrinhos Um brasileiro num syndicate - O nosso conhe· cido Henfil é o exemplo mais próximo que atesta a pobreza do esquema. Depois de um "vestibular" onde concorreu com uns dois mil desenhistas, conseguiu fec har contrato com os americanos para produzir os Fradim. Travestidos em The Mad Monks (Os monges doidos), começaram a ser publ icados em dez jornais americanos, alguns importantes como o Chicago Tribune . Não durou dois meses. Os leitores enviavam cartas reclamando contra o humor feroz e sádico de Henfil e os jornais cancelaram os contratos. A consolidação . Acredito que para se compreender bem o ritmo de produção dos quadrinhos é preciso se lembrar dos acontecimentos pol íticos e soc iais do in ício do século XX. Sobretudo, a(]écada de 30 é um prato cheio para estas observações, uma vez.,que há uma co ntra ão muito grande, tanto em aco cimentos como na produção de HQ. A mudança de uma deca a para outra foi muito rápida na América. O ano de 1929 marca o in ício de uma série de fatos ocasionados pela "quebra" da Bolsa de Nova Iorque, gerando uma crise sem precedentes no mundo inteiro. O crack liquidou, Tarzan, de Burne Hogarth. 2S I('~~r - • " 26 Sonia M Bibe-Luyte que é His tória em Quadrinhos 27 , . I, de um só golpe, o otimismo dos anos loucos da A história já t inha aparecido em forma de romance: I' era do jazz. Tarzan af the Apes, de Edgar Rice Burroughs, em i:'~llr , A nação americana havia crescido na segurança 1912_ Foster fez a adaptação do romance para as de um eterno mil agre econôm ico, e o decênio de HO, introduzindo realismonos quadrinhos. Foi 20 caracterizou-se por um esbanjamento alegre e o desenhista- Hogarth, porém, que deu a Tarzan '" . insensato da burguesia rica das cidades. a majestade do senhor da selva. Conseguiu dar Logo, porém, veio o d il úvio'! A classe operária ao cenário uma exuberância fantástica e ao herói pagou os excessos da classe dirigente com milhões uma be leza de formas inspirada no próprio Mi- de desempregados. Como conseqüência , o próprio chelangelo . I lazer das massas ficou aretaBO;-CheganBoa-ré- a Sal tando dos galhos da selva para o futuro, o / a l ter~h~b i tos e m,9dlfíCar o gosto das pessoa s flê nero ficção científica é o tema de três grandes :11 por dete.r:-m inadas cois'lli. "j" JJ. 2- - histórias: Brick Bradfard (de W_ Ritt e C. Grayl. E ta lvez por isso que se expl ica como o gênero Buck Ragers (de Nowlan e Dick Calkins) e Elash~ "Aventura" chegou ao auge e um turbilhão de Gardan J de Alex Raymondl. que obteve grande iP histórias surgllUJ.e.S!iLépo.ca, explorando ao máx i::- ucesso. As hero rnas de Alex Raymond foram mo esta nova mina de ouro. A aventura indica um I\1U ito avançadas para a época em que viveram e 11 desejo de evasão e a criação de mitos, de heróis Ind os os seus personagens parecem sa ídos das te las , positivos. Reve la a necessiaaaeae novos modelos ti o cinema - são altos, loiros, com queixos e / nos quais se inspirar para a conduta humana. IIllrl zes para ninguém botar defeito. Flash Gordon - E a era de Tarzã (aventura na selva), Flash 11 I1 Ca rna o protótipo do mito ariano. Dotado deV Gordan (aventura de ficção científica) e do Prín- 11 m corpo perfeito musculatura inveiável, [1ossu í cipe Valente (aventurnno passado med'ieval). lodos os atributos de uma sUl)er-raça. No enredo, 1/'; como se os heróis - envolvidos nas histórias " passado, presente e futuro se entrelaçam, mas /' compe~assem as perturbações e inseguranças da 11 r 11 todas as épocas o bem sempre acaba ven- triste realidade e todos resolvessem fugir para I lindo o ma l. , lugares desconhecidos. E " foi então ,que se deu a O passado reviveu toda sua alória com o PríncjQe consoJidaçJo dos quadrinhos: o volume de criacão V,I lonte, uma história na -qual cava leiros, dragões, e a boa qua lidade de materi~ . 1I t1l1 cesas, castelos e cenários majestosos sa iam ,Tarzan surge no cenário desenhado por dois tl II pena de H. Foster, familiarizando o leitor com grandes mestres, Ha l Foster e Burhe Hogarth. I oorte do Rei Artur, os Cavaleiros da Távola - - , 28 Sonia M Bibe-Luyt que é História em Quadrinhos Redonda e os vikings. Foster mostra uma visão norte-européia da Idade Média : uma era sem trevas mas de muitas lutas. E como ele era origina- riamen te um pintor, as HQ ganharam ' muito na in trodu ção de paisagens nos desenhos. Foster, tendo vivido no Canadá, soube retratar e enri- queceras quadrinhos com lagos, florestas e pan- ta~is. ~~a Europa, a aventura segue por outros caminhos, com a cnaçao de Tíntín (do belga Hergél que, ao invés dos jornais, publica suas histórias em álbuns < gue logo T oram traduzidos para outros idiomas, 9tingindo,~slm , milhões _de leitores em todo o mundo. -- -[é om Tintin inicia-se a Escola de Bruxelas, um ntro criador de quadrinhos na Europa, de onde, ma'is tarde, surgiram out(êS histórias excepcionais como Asterix e Lucky LU.6!J No in ício dos anos 3D, na América, aparece um desenho animado que passou depois para as revistas de quadrinhos, e ficaram famosíssimos tanto o criador como a criação. Estou falando do Míckey Mouse, o ratinho Que deu origem ao imp-ér io i--. Disney e a In úmeros outros personagens corTiõ o ! V Pato Donald, Tio Patinhas,_Margarida , Zé~Carioca, Minie, João Bafodeonça e assim por diante . ~Os qüa(frl n ~os d e Walt Disney,- no-s velhos tempos, exploraram ao máximo o tema aventura, tendo Tio Patinhas como herói principal que não poupava nada e a ninguém para descobrir uma nova mina de ouro em algum lugar do planeta . Disney , na produção de desenho animado, levou às telas alguns contos de fadas que as crianças s6 conheciam pelos livros. Hoje em dia, ao se fa lar, por exemplo, de Branca de Neve ou Cinderela, a meninada, com certeza, verá diante de SI a Ima,gem disneyana dos personagens. Esse lindo e poderoso império de revi stas em quadrinhos, desenho animado e parques de diversão 'tremeu nas bases quando dois sociólogos no Chile, Dorfman e Mattelart, atacaram o mito mais badalado dos últimos tempos. A acusação principal \ toma as inocentes historinhas como dlfusoras do opitalismo amencano, que funCionam, há anos, oomo lava~em c~reb~~ de populações infanto- , Juvenis do mundo Intel~ As posições são bas: te radicais mas, pessoal- l11ente, acho que no fundo os dois sociólogos não tloixam de ter razão, principalmente porque o I"odelo Disney é exportado para inúmeros pa íses. I as crianças do Brasil ou do Paquistão, sem II rom outros neróis naCionaiS nas tancas, vão lIIulm il andQ, em qllilddnho.s,._Ji.Ç..~. II lt ler lucro fácil sem oroduzir,-ªp.LQlLe.ltar,se das. illltlS fracos e a desprezar as sQ,c.i.e.dades pri mi.ti.vas_ M,IS' o grande mérito de Disney (e isso ninguém pl1do contestar) é ter dado às HQ um estilo elásti co , "'illlli b rado, que influenCI Ou desenb istas..do mundo.. 1I IIIIIro, principalmente os franceses Mosmo nos Estados Unidos, porém, não faltaram 29 ,. I. 30 Sonia M Bibe-Luyt (Iu e é História em Quadrinhos 31 autores que fizera m do quadrinho um meio de om seu dinossauro combatendo inimigos pré- criticar a sociedade moderna de consumo. históricos. - tJm rre"te-sfõlAI Caep, - através de Li '1 "há 400 anos", surgia, na se lva africana, 0-que, ' E , IAn~r (FerdioaodoL satirizou com mu ito humor, pri meiro grande her~ i das HO: o Fantasma. Tanto --- - o meio em que vIvia. le como seus descendentes iam se casando, tendo Ele escolheu seus personagens inspirados nos novos Fantasmas para, aSSim, gerar a lenda da habitantes de pequenas loca lidades caipiras norte- Imorta lidade do "Eseírito-Oue-Anda". Criado por t-'" americanas. Assim, a partir de gente como Ferd i- Lee Falk, esta história teve uma trajetória diferente nando, Vio leta e Xu lipa Buscapé, com suas vidas, das outras HO. O Fantasma, que namorou Diana brigas e amb ições limitadas, é que AI Capp ridicu- Pa lmer mais de tr inta anos, fina lmente se...c_asa e_ lariza o modo de viver da civ il ização ocidenta l, do 10m filhos (gêmeos, por sina l) _p~ra continuar a/ IP a!!1erican wav af Ufe. (g le foi também uma das dinastia. primeiras pessoas a chamar a atenção das massas Isso não é muito comum_llils fjO. Norma lmente, Pttê problemas de defesa do meio ambienti:) os heróis parecem não ver o tempo passar. Passados A história que gerou ma is polêmica foi a dos quase cem anos, os Sobrinhos do Cap itão conti- "Shmoos", seres que se transformavam em bife, lIuam moleques e endiabrados e a Margarida até ovos, le ite, enfim tudo aquilo que alguém quisesse hoje não se decidiu entre o Gastão e o Pato Dona ld. possuir. Imaginem só o desespero dos grandes Lee Falk CriOU também ou t ro personagem, capitalistas, que viam nos "Shmoos" uma ameaça Mondrake, um mágico com cartola e capa v~l ha para o sistema financeiro do mundo. O eróprio " preta, com seu criado, o gigante negro Lothar AI Capp foi muito _perseguido, sobretudo, na Esta história também se atualizou, mas no k aécada de 40, 12e lo senador McCarthy, da extrema- "" nt ido social. De uma espécie de escravo, Lotbar_ direita america~ . - "" tra nsforma em príncipe africano e também '1lI lI nja uma noiva, uma linda more~ Isso, com Outras histórias famosas "' Itoza, para :agrada r os milhões de leitores negros III São desta época também Papeye, o. marinheiro 1111 m'undo inteiro. Em todo caso, essas mudanças 11 11 adaptações permitiram aos personagensde que ficava forte qLiãndo com ia espi nafre para I 'tJ Fa lk uma ace itação revigorada, ao passo que sa lvar a Olívia Pal ito das garras do Brutus . E o IIlIlItos outros heróis de HO simplesmente desapa-Brucutu, o homem das cavernas, sempre montado IIIlmam por se terem fossilizado. . - J '--- , I 11111 I 32 , Sonia M Bibe-Luy --::: _ Em todo caso, podemos dizer que a produção norte-amencana da época pré-guerra é"Tão forte que lOunda os jornais de tOda- a- Europa e do mündo inteiro. O sucesso foi devido tanto à qualidade dos desenhôs como ao eficiente sistema de , distribuição dos syndicates. Além disso fica -- . , L conso lidada também a própria composição dos qu~drinhos. Isto é, anteriormente, os personagens e figuras eram colocaâos ãe- forma ind iscriminada. Foi principalmente com Hoga rth, em Tarzã, que certas regras começaram a funcionar para dar movimentos equi'li5racros:-Maravilhosos jogos de ~ com o aproveitamento máx imo do branco e preto foram conseguidos por Mil ton Caniff, em Terry e os Piratas. O uso de nanquim com pincel, obtendo uma persoectiva' elaboraaa, faz lembr ar , muito os efeitos cinematográficos. Os anos 30 ~foram para os qu.adr nhos o mesmo que Ho ll ywood para o cinema: foi a época da aventura e da invencão o misto de realidade e fantasia. Como resultado, temos que as HQ ficaram consagradas e todos liam quadrinhos. A crise - a utilização política das HQ Vamos chegando ao fim da década de 30 e podemos imaginar o astral das pessoas, principa l- mente na Europa, onde a guerra começava a dar - Ifle é História em Quadrinhos 33 flI1YlIDfDAVB 1kD- A. -- 111 .. ~ ,,'.'-. h~:- ..... n_ se us primeiros Sina iS. A tensão e o desespero 'faz iam parte do dia-a-dia, num cI ima mais ou menos como os d ias de hoje. Em 1939 estoura a Segunda Guerra e o mundo 80 divide. O futuro se torna uma grande nebu losa,.., No fim do decênio 30-40, quando Hit ler parecia Invenc íve l na Europa e a América se preparavã ',-. \ para combater, os heróis de aventura não eram mais Ruficientes. Contra o monstro nazista que se. Igígantava, a segurança coletiva e o inconsciente do um povo reclamavam alguma coisa a mais do que um hort]MO. E, de repente, neste cenário de conflito, apare- 110m dois jovens, Joe Shuster e Jerry Spiegel, com lima história e um herói diferentes de tudo aguilo / 'Ille se havia feito em guadrinhos: uma figura de loupa colante no corpo, botas, capa voadora e gu~~LY" 110 momento de neriaO~~Jl.eLPoderes P-ªU IIlvar a lguém. O Super-Homem estava em ação.L e incrfvel como se conseguiu juntar o clima de IlIns§o de uma guerra com um herói que levava a~\ 111 soas para uma outra dimensão sunerirreal. I 11110 deu outra . Foi um sucesso! Quando os EUA entraram na guerra com solda- / d., e armas, os ,quadrinhos já estavam lutando ,~ 1II IIIndo pelos ba lõezinhos divulnando suas mens<t- IIIIIU de proe.aganda ide.o lógica. Nos aiÍos quarenta, a democracia americana '1' IIl1va-se ameaçada e, para levantar este moral, só 111" mo superpoderes imediatos tiveram um efeito '!f .. '. II 34 ... ..... . • • ft • Sonia M Bibe-Luy " ue e História em Quadrinhos 3S de impactiJ E os super-heróis eram exatamente isso: agiam para o bem das leis vigentes, em bora seus métodos não fossem nada legais. Tinham que matar pessoas a fim de preservar a paz. s quadrinhos até antes da entrada dos Estados Uni.aos na guerra, já estavam engajados numa posição pol ftic.a. O Principe Valente lutava contra o~ hunos, que, na gíria inglesa, queria dizer germa- n ICOS. Dick Tracy e X-9 se voltam contra sabotadores até mesmo- o- Tarzan, na selva africana , luta cp tra orsoldaaos co loniaíSiiazistas. L ~as foio ~up?r-Homem mesmo a grande atração da epoca. Primeiro, porque deu origem às dezenas de super-heróis que conhecemos, como Batman, _ Capitão Marvel, Homem de Ferro, Hulk, Thor, - MJ1lher Maravilha e outr9§! lE, depois, com a publicação do Super-Homem é que os quadrinhos americanos passam a ser ed ita- dos em revistas. E a era dos comicjJgpks. A revista Action Comics, que lançou esse super-herói, slmples'!1ente dobrou--sua circulação a partir dof~ ,. E o herol Q!.l.e..Le~ell.tQU.p-oLexç.clêllcj a oJ.dea I a.merl ~ano de "Ame rica for Americans" foi o ~ue~relro Capitão América - o primeiro super- nerOI a se declaraL P_ublicamente inimigo _dos \...~az l stas . Estava na cara! Ou melhor, na roupa dele: seu uniforme. listrado e estre lado representava a própria bandeira americana. Seu pior inimigo (a I éinCle!=tltl-er, é claro) étTIdo o que significa ameaça para a "democracia americana". O Capi tão América, depois de tanto lutar na -. guerra, foi, anos depois, um dos pioneiros a se questionar sobre a sua funçao na sociedade. Sua • cé leb re frase : "Talvez eu devesse lutar menos ... perguntar mals~des!lncadeou toda a oroblemá- tlca existencial. d.?~ super-heróis. . ~ 'lk:como oposlçao a este furor guerreiro, os qua- ' fiHnhos, n essa época. ãtinge m um ponto alto soR- Ilspecto gráfico, com a criação de The ~Rilit.. (O Espírito), de Will Eisner. O que havia de dife- I nte nesta história era a -técnica de iluminação. , to é, o aproveitamento ao máximo do branco e preto em contraste de luz e sombra e novos ângJJlos ti desenho, muito semelhante à técnica cinemato- ' -\- uráfica.:.. O desenhista também inovou na abertura tllI história. Cada vez começava "The Spirit" com IIITI desenho diferente e sugestivo. Will Eisner marca o alto grau de sofisticação II cni ca conseguido pelos desenhistas norte-ameri- I finos sem envo lver-se com problemas de cunho Itll 016gico, e esta tendência marca o.fim do apogeu tloH super-heróis. o que o período da Segunda Guerra nos deixou 1111 uma boa lição de como os quadrinhos são um iIl'I'l lente veícul o ,para mensagens de cunho ideo- '''lIlco. As HQ desempenharam seu e,apel na PLopa --t'b.t- U,""lo ideológica antinaz ista . E bem fácil explicar- 36 1 • iJI Sonia M Bibe·Lux I/fie é História em Quadrinhos 37 por quê. Imagine um herói de quem você gosta muito mesmo. Com o passar do tempo, você estará imitando muitas de suas ações, e tudo o que ele disser será verdade para você. Assim é que as HO foram usadas, através dos heróis, para ·transmitir o pensamento de quem comandava a guerra. No f inal do conflito ficou-se conhecendo as armas ideológicas dos que ganharam. Mas há pouca notrcia. de quadrinhos usados nas fileiras totali - taristas. Mas eles existiram e foram utilizados para combater ou desmoralizar os aliados também. I Na Itália, Mickey Mouse, que lá se chama Topolino, foi substitu ído por um outro nome, "Tuffolino". Na França, na zona ocupada pelos alemães, teve-se notícia de uma revista que incluía quadrinhos com fortes mensagens contra os russos e os personagens tinham cara de fuinha e nomes alusivos como Orloff e Venine. o fim da guerra, a situação era bem ruim para os quadrinhos. Havia falta de papel, as histórias foram bastante reduzidas e, graficamente, fica ram bastante pobres. O conteúdo também sofreu mu ito. Era difícil mostrar otimismo depois que milhõ_es de pessoas de todos os países foram or.tas} . Começou-se uma campanha contra as HO. Muitos artigos e livros apregoavam que os qua- drinhos eram maléficos para as crianças e que eram os culpados pela deli nqüência juvenil. O mais fa moso foi o livro A Sedução dos Inocentes, de Frederic Wertham. At ravés de uma se leção parcia l, procurava ele demonstrar que os responsáve is por todos os males do mundo eram os quadrinhos. Chegava a absurdos como o ·exemplo da moça que virou prostituta porque lia HO., Os ecos dessa campanha con t ra os quadrinhos ohegaram ao Brasil no começo dos anos 50 e, como ).r IlIntas outrascoisas, importaram-se os falsos t10nceitos moralistas. Muitos professores e pais, IlIfluenciados por essas idéias, começaram a proibir que as crianças lessem quadrinhos. Até hoje, IIluita gente ainda insiste em considerar as HO I mo nocivas e subproduto de cultura. Mas áinda bem que na Europa, lá pelos inícios dos a~os 60, alguns intelectuais franceses . e ~talia - 110 devolveram o bom conceito que os quadrinhos .lImpre tiveram. Foi o in icio dos estudos de Comu- IIIt1oç§o de MasSã.. nos_quais ~passava a anall s'!:g--V 11 f nômeno quadri nhos como um dos melhores 1IIIIIos de informação e de formação de conceitos. I 1111 visão mais científica e imparcial foi logo 1III Iorporada pe los americanos, e, desta maneira, rlll possível fazer-se uma reaval iação crítica e • 1111 trutiva de tudo o que se tinha produzido .111 hlrlórmente Multas calieças rolaram. Isto é, muitos heróis .hllll [l receram das tiras e das \listas. Outros li. IIlIm e muitos novos surgiram...Q que mudou, ,,"I.lm, foi a conscientização dos autores, que não · 38 " I Sonia M. lJlt'e-L,uYI<II1C é História em Quadrinhos mais procuravam divertir por divertir mas, Sim, usar os quadrinhos para que servissem d,,-e..':!!.~@.:.., 1 deiro mecanismo de veicu lação de idéias, Isso, geralmente, era feito de forma indireta ou imp l ícita, os resu Itados estão a í ate oJe e- m comprovados por vocês mesn~~tvejamos adi ==--.I A reconstrução "Levanta, sacode a poeira e dá volta por cima" . , , Isso é letra de samba mas, acredito, se alguns desenhistasam'ericanos morassem no Brasil , teriam usado essa frase para reconstruir a imagem negativa dos quad rinhos a partir do fim dos anos 40, Também não era para menos, Fim de guerra, o mundo destru ído,. sem muita - esperança! No entanto, no meio daquele cenário sombrio surgi u uma hi stória em quadrinhos Iflue veio modificar conteúdo das HQ americanas , Pago , de Walt Kelly, " nt go desenhista dos estúdiõs Disney, começa a abOrdar temas soc iais e 01 íticos de süa""'poca, Através de personagens an imais com cara de gente, as histórias seguiram por um rumo diferente da aventura e passaram a enfocar um ma is pensa~ No Brasl , Pago não teve mu ita repercussão . Não porque ficasse devendo aos grandes m"stl'es '. dos quadrinhos. Ao contrário ' W, Kelly era um ;$~ ~I ~ t ..Q' ~ l~~ !l1 1:.2 ~~ is a&~ ~~.~ .. ãb ~,I:ô 39 .::- - " '< - -~ {j 5'0 o "" \.~ ~ , ., ':I! t· , I , I' 40 Sonia M Bibe·Lu lI/c é História em Quadrinhos grande conhecedor de sua I íngua e brincava com o idioma inglês, inventando novas palavras a partir da junção de duas outras para . dar nomes aos personagens. E coitados dos tradutores para encontrar sinônimos à altura. Mas Walt Kelly encontra uma alma gêmea: Charles Schulz, que conseguiu revolucionar os quadrinhos dos anos 50 com uma história aparen- ..-')7te"mente inocente: Peanuts IMinduim ou Turma de Cfiar ie Brown em ortuguês). Seus personagens são muito conhecidos no Brasil: o próprio Charlie Brown, seu cãozinho Snoopy, LucYL a menina manaona do grupo e toda a turminha de crianças que falam e ques- tionam- o mundo melhor do ue mu ito adurto. , Aliás, é isso que mais choca nos Peanuts. São as crian as que pensam e refletem sobre .o mundo, analisando psico oglcamen e a umanidade. O próprio autor, que é pastor protestante, fez muita gente passar a reacreditar na humanidade através dos balõezinhos de seus personagens mirins. O momento era propício para que este tipo de estória tomasse conta dos quadrinhos iniciados por Pago e Peanuts . A década de 50 ficou conhecida pela fase do quadrinho pensante e intelectual. As histórias não somente se modificaram no conteúdo mas vestiram roupa nova também. Se lembrarmos dós desenhos de aventura que fizeram época nos anos 30, do tipo Tarzan e Flash Gordon, dá pãra perceber os cenários glo- rlosos e exuberantes . Cada quadrinho era uma vordadeira obra de arte onde a forma e o conteudo o completavam. Com os quadrinhos pensantes, o peso maior foi dodo ao conteúdo dos balõezinhos, isto é, a mensa- 11 m se destacava dos cenários simpl~iJ E: como SE lIlores representassem num teatro apenas com ur" IlI nd o branco no palco . Nesta linha, como sucessores doPeanuts, surgiram hl tóri as incríveis como Eeiffer, de Jules Feiffer, linde entra em cena o primeiro anti-herói dos quadrinhos. O autor consegue dar um clima mu ito IlI nso onde seus personagens transmitem fossa, 111 ogurança e uma comunicação impossível de Id6las. Porém, através de cenários teatrais, os 'illlldrinhos sã um bom exem lo de unidade "NlóticJL eles transmitem o estado . de espírito do , seu criador e revelam muito bem o clima dll anos 50. Dentro deste espírito, mas criado alguns anos 111 111 tarde, Mata/da, de Quino, na Argentina, é li lll grito vindo da América Latina contra o mundo IlI lInbardeado de tanta maldade. Quino utl Iza hllll bém crianças para explicar o universo. Mas '" 111 a habilidade de transmitir tudo isso sob os " lh os da América subdesenvolvida. Seus persona- Il'li l rep resentam a composição do povo argentino : Mll lnlda, a menina politi zada que dá lições de 'li lologia e política para seus pais . Manolito, filho In 11 m merceeiro de origem espanhola, asp ira, 41 ri 42 Sonia M Bibe·Luy ,, ~tI História em Quadrinhos como imigrante, a ser muito rico e proprietário de uma caOeiããe Supérl"ITeTCaaos. Suzanita simboliza- a mu lher que apenas quer casar·se mUito bem e ter fir ~ . - Para certas pessoas, quando se fala em Mafa/da, vem automaticamente uma comparação com Charlie Brown. Porém, uma grande diferença ex iste entre ambos e suas visões de mundo. Charlie rsrown pertence a uma sociedade rica, a norte. ãmericana, e Malfada, ao mundo subdesenvolvido e, portanto, com pro lemas que nos tocam mais I ~p'erto. --18inda reagindo contra o realismo dos anos 40 seguindo o novo estilo caricatura I - onde se torna importante o traço deCisivõ -, ohnny Hart cria S.C. (Before Christ), em português A.C. (Antes de Cristo). Situados num mundo pré.fíistór ico, onde os animais também falam, seus personagens não refletem o contexto em que vivem mas reagem e d iscutem problemas do nosso temp~ Uma história em quadrinhos do in rcio da década que não segue as novas diretrizes propostas é Pimentinha . Volta a linha de histórias de crianças e;;aiã5rada~, predominantes na década_ d_e...2.Q, e q!!: vem reforçar a imagem irresponsável e fe liz da classe média norte-americana. tQ conjunto de histórias dos anos 50 faz renascer as HQ americanas, que esta v m tão desacreditadas no final da Segunda Guerra. Mas, no resto do mundo, houve também uma reação positiva culmi. II Indo com uma consideráve l produção de cunho 111 1 rnacional. Na França, a dup la R. Gosciny e A. Uderzo I II m Asterix , um gaulês ba ix inhoL inteligente e ,11i gre que vive numat:Jnica aldeia resistente-;à I Il l1 quista romana. Apesar de Astenx ser o herol I li Il1cipal , ele .Jlli!!icamen.tELOão_sobr-evive- sem-seu III lle companhei o .... .O.be lix . E o ressurgimento da 1I ola de Bruxelas, iniciada com Tin tin , de Hergé. 1\ maio r inovação de Asterix está nos diálogos, ' 11 111 jogos de alavras e caracteres gráficos que " primem determinada língua estran eira falada I ,,,I!ls personagens-,- . Nas histórias de Astenx, os gauleses sempre I 111 vitoriosos, e o folclore é mostrado cor!) u.<:!2 111'11 de humor mul to particular: através do qual li loltor médio francês se Identifica com os feitos "" h ró i. Aliás, o segredo do sucesso de Asterix é Illiples: as histórias base iam·se nos estereótipos ' 1111 todos os povos fazem de si mesmos e dos 111 11 " 'S. Lá' vãoalguns exemplos: a fleuma dos 111 11 nlcos, o temperamento fogoso dos espanhóis, I ",~I~tência , a teimosia e o apego às tradições dos 111I 1C:OS9S. Gosciny morreu em 1977 e a ú ltima IV' IIllIra do gaulês foi "Asterix entre os belgas". IltI", tO tenta continuar com a série, mas com 1111 II l1r sucesso. 1'lIbll cados em álbuns e traduzidos para muitos " '11011 15 a aldeia gau lesa e a turma de Asterix , - - 'h " li" tao populares na França que sao pratica· 43 , I 44 Sonia M Bibe.Lu II~ Ó lfistória em Quadrinhos 45 mente o simbolo dos quadrinhos .franceses . E os romanos que se cuidem com a poção mágica (simbo lo da superioridade ga ttl.\tsa)! .Sem ,deixar a peteca cair, lo faroeste americano fOI satirizado pela produçãõ franco·belga com Lucky Luke, De autoria de Morris e Gosc in'Y! r~aptou uma parcela do público jovem europeu: L!,.ucky Luke é um anti·co.L1{boy acompanhado de seu fieI cã? Ran Tan Pia0.! (qualquer semelhança com Rm Tm Tm é mera co incidê~ia) e os eternos antiinimigos, ?s Irmãos Dalton, LE um herói soli. tárlo, uma parodia dos personagens lio llywood ianos, que sabe dosar com espirito humoristico o mito e( .J:ea lida?e do oeste americao Nessa epoca, houve também uma série de histórias que retratam o enfado e a monoton~ Neste aspecto, os mgleses tomam a dianteli'ã: Personagens como Bristow e, sobretudo, Andy Capp, se tornaram a dei icia do lazer dos burocratas, Falando giria londrina, Andy Capp ou o Zé do Boné, de _ Reg Smyth, mostra com perfeição àS crises de desemprego ~ quebra de valores. Andy Capp .é preguiçoso, dn lco e briguento, mas apanha d: Fio, sll.a_mulher que o sustenta. Dá tudo para nao trabalhar e, quando não joga futebol ou bilhar, cUida de seus pombos e bebe com os amigos (ou amigas) no bar. Quando eu traduzia as ti ras do Zé do Boné para o Jornal da Tarde, em São Paulo, recebia muitas cartas de fãs do irrequieto personagem. Muitos se Idontificavam com a sua maneira de ser. Pensavam I/lÓ que era brasileiro! A única diferença é que ' I do Boné, mesmo não trabalhando, sempre " ,cobia uma ajuda·desemprego do governo inglês, Ilulaa que até hoje não se cogitou para os desem· 111 gados brasileiros, Para os que trabalham em repartições públicas 111 1 em escritórios empoeirados, há uma estória qll se tornou clássica no gênero: Bristow, de Il onk Dikens, que sintetiza todos os lances de uma IlItlna de tr~~alho através da figura patética de seu I" rsonagem.\..E Bristow, com um incurável otim is- 1110, procura fazer o melhor possivel de uma vida IIIon6tona, numa caricatura da sociedade mOder~J Entretanto, a grande reviravolta dos quadri ril'ios 111 u·se em 1952, com o surgimento de um movi- 1111 nto que modificou commm.mente o estilo de Il llmor nos Estados Unidos. Estou falando da 11 vista Mad, que, liderada por Harvey Kurtzman Ilomeçou a satirizar tudo que encontrava pela ' 111 nte: filmes famosos, _program~ de TV e até 1I10smo as próprias istóriaLe1D-quadrinhos. Através de jogos de palavras e a reconstituição ;In tipos, não escapou ninguém. Só para terem uma 11I,lla: Walt Disney foi travestido em Walt Dizzy ( Ionto) , Princi e Va lente em Principe Violento e 11 pr6prio Flash Gordon virQu Flesh Garden lí!L.. 111m da Carne). Uma personagem bastante reacio- lI ~rla dos anos 30, Littl e Orphan Annie, se traos- IlIrma numa espetacular loura sexy, Little Annie 46 Sonia M Bibe·Lu) 'I''" é História em Quadrinhos Fanny, que só tem corpo, mas a cabeça é vaz ia de idéias. A Mad de ixou como legado uma série de outras do mesmo gênero, satirizando tudo e todos . Em outros países, como a França, a revista Hara.Kiri representou a mais importaClte tendência intelectual em moldes homorísticos. Bem posteriormente, no Brasi l, as revistas Crazy, Pancada, P/op, K/ik e Gripho, em que se destacam as colaborações de José Alberto Lovetro (JAL), traduziram o humor nilciona l daJru:truLbaslantej rneUgente, também I I Normalmente, quando se pensa nos anos 50, imediatamente vem a lembrança dos quadrinhos pensantes, dentro da linha psicológica e metafísica. Tudo berTI.'" l'IJo entanto, eu acredito que através"da sátira e do humor, tão bem representados pela revista Mad e outras semel hantes, é que se deu a I grande vá lvula de escape para o ranço provocado L. p~ guerra fria. .~riso, o escárnio, a gozação e a ironia bem dosados cumpriram também sua função de recons- trução e do renascer de um mundo ainda embara- çado nos resultados da Segunda . Guerra Como sempre, o espetácu lo tem que continuar~ A vanguarda 1\ vanguarda feminina Dizem que as mulheres dos quadrinhos nos IIIIOS 60 puseram "as manguinhas pra fora". Eu dir ia que, na verdade, puseram muito ma is do que lu o. Cansadas de tanto aparecerem em seg~ndo plIlM, as mulher~pro,ta.gonistas do novo quadrlnh? " I) O s ímbolo da vitOria e~iill.ça do sexo feml- 111 11 0 sobre os homens. Desde a condenação dos quadrinhos, proc lama- dll no início dos anos .50 como responsáveis pela di uradação fisio lóg ica do ser humano, l1}~ i ta água Inlo u. A distância de alguns anos,. onde~l,berdade dll ex pressão foi um fato adquirido, fez com que 1/ 1 rot ismo reencontrasse seu devido lugar. 8arbarella foi o carro-chefe das hera nas eróticas . Orlada em 1962 pelo francês Jean-C laude Forest, 1111) misto de Mul her Maravilha e Little Annle I lInny, foi publicada na revista V-Magazine: Com IllIrba rella os franceses conheceram sua primeira II Q para adu ltos. Em 68 foi levada às telas com direção de Roger Vodin e J ane Fonda no papel pr incipal. Bem li lr rente das hera ínas submissas dos anos 30, I'omo Da le Arden (f lash Gordon), Jane (Tarzã) e Nnrda (Mandrake) .lBarbare lla queria mais é t irar IIl ovolto dos homens para as fi na l idades que 47 o,' ; , 48 Sania M. Bibe-Luyten ela comandav; 1 A sua posIÇão é um reflexo da própria evolução da -mulher na sociedade moderna . Dentro do estilo ficção científica, Barbarella transita pelo espaço, ama a aventura, devora tudo que encontra pela frente, buscando sempre novas emoções. O sinal ficou verde e {0, trânsito livre para tantas outras almas gêmeas. Apareceu Valen tina , de Guido Crepax, heroína freudiana que se li berta dos problemas cotidianos através do mundo de son hos. Va lentina é enigmática, bela, sensua l mas de dif(cil leitura, pois leva ao extremo a linguagem cinematográfica nos quadrinhos. Ainda na Europa, Guy Peellae rt criou duas beroínas inspiradas nas musas da música francesa: ~del/e, a partir de Sylvie Vartan,. e Pravda, de Françoise Hardy. As duas hero ínas Introduziram a pop art nos quadriohos, misturando cenas míticas . com liberação sexuaU E surge Paulette no pedaço, uma heroína desbravada, com se ios enormes, uma criação genial da dupla Wolinsky e Plchard . \.!.. os franceses não pararam mais de produz ir belas mulheres : de Gigi e Moliterni surge Scarlet Dream, e da pena de Nicolas Devil, Saga de Xam, que, apesar da aparência violenta, é uma grande mensagem de amor e p.iZ1 E a Itália não fica nada devendo à França em produção. À partir da revista Diabolik em 63, surge o moment~have de difusão de hero ínas. Juntam- se a linha francesa e a italiana e o resu ltado foi o que é História em Quadrinhos I uma legião de mulheres belas, eróticas, como: Satanik, Isabel/a, Messalina, Jungla, Justine, , Walal/a, Odina, Lucifera e daí por diante. Essas heroínas representaram um momento da liberação sexual italiana, tornando-se assim, juntamente com os franceses, o símbolo dos quadrinhos adultos dos anos 6Ql Esta Influência conseguiu, também, furar o bloqueio dos pa íses comunistas, e uma mulher 'enorme, grotesca, com uma estrela vermelha na testa e os seios à mostra, rasga a cortina de ferro parase tornar heroína única dos quadrinhos soviéticos (clandestinamente, é claro). O fato é singular mas Oktvabrina ou Octobriana ' representa o verdadeiro espírito da Revolução de Outubro de 1917. Quem a criou foi um grupo de estudantes 'da_ Unille,rs idade de Shenshensko, em Kiev. Ela transita livremente no tempo e no espaço, mas está pronta a combater a opressão dos velhos regimes coloniais e a burocracia soviética con- temporânea. Na distan te Ãfrica, em Moçambique, a mulher também conquista seu espaço, ap6s 1975, o ano da libertação, depois de cinco séculos de colonia- lismo português. Seu nome é Xiconhoca. Ela é. revolucionária e líder dos idea is da FRELlMO (Fre nte de libertação de Moçambique).- Apesar de Xiconhoca ter sido criada nos anos 70 e não pertencer à linha erótica, seu autor coloca a mulher em primeiro plano na conquista de seus direitos. 49 r 50 Sonia M. Bibe-Luyten 'i:.,. [Na verdade, as heroínas dos anos 60 , usa ndo o erotismo como escudo e os movimentos femin istas como arma, retratam bem os anseios de uma emancipação socia l, econômica e sexua l1 Abaixo a ordem. Viva o underground! A grande difusão das HO americanas teve como base a organização eficiente dos svndicates. Mas, para que isso fosse possível, as histôrias preci- savam ter certas regras para Q..ue pudessem e possam ser li das no mu ndo inteirol M ui to ligada à histó ria dessa difusão, está uma c~'nsura caminhando ao lado e tornando, assim, as HO de consumo muito "pasteurizadas". Isso significou uma espéc ie de censura a temas, imagens e texto. E: muito comum L-- ver nas HO certos sinais gráficos como cobras, lagartixas e caveiras, significando um palavrão não dito ou censurado. Nesta trajetória, a um certo momento, .lIDl grupo de estudantes da Ca lifórnia, liderado p_OJ:. obert Crumb, resolve quebrar certos tabus nos_quadrinhos. "\JLclima era propício . O mov imento underground dos anos 60 alastrava-se para todas as moda lidades art(sticas. Na verdade, é difícil definir o que foi / o underground, po is pretendeu revol uc ionar todo o sistema vigente, o establishment, isto é, a ordem estabe lecida. O líder deste movimento foi Nervil le, que propunha uma so lução tendo como origem as o que é História em Quadrinhos 51 . , , './1 1 6 ,. , . , I ~ , 52 Sonia M Bibe·Luyten comunas rurais e a mudança da concepção de família, peça·base da organização de uma socie· . dade. Isto provocou umª espécie de contracultura, uma cultura marginalizacJ!J Robert Crumb, vivendo e participando da juventude underground contestadora, cria um personagem que fez mudar os rumos da HQ: 'Fritz the Cato Criado em 1967, é um gato estu· dante, contestador, poeta, revolucionário, român- tico, terroriswe drogado. 10 caçador também. Mas não de ratos e, sim, de gatinhas, participando . de orgias e fUQindo semore da ,,-ºI ícia, - l\IIãis tarde, o mesmo Robert Crumb cria outros personagens. Mr. Natural, um baixinho careca de longas barbas brancas, ex-motorista de táx i do Afegan istão que resolve viver nos EUA. Ele prega a desobediência socia l, mas depois foge para as florestas e va i viver como erm itão. Apesar de velho, gosta de moças bonitas e apetitosas. Mas, no fundo, transmite uma !lfande fossa, pois, sempre que pode, deixa transpare1er que há poucas esperanças no mundo. Esses dois personagens foram editados na revista n' fundada pelo próprio Crumb. Com tudo isso as HQ sofreram grandes mu· anças. Os quadrinhos, no meio de toda essa contestação, ficaram livres dos modelos impostos pelos syndicates. O pa lavrão é dito mesmo, não há censura para as orgias e o desenho é mais livre. Além disso, não há regras para publicação. o que é História em Quadrinhos A reprodução passou a ser permitida sem problemas de direitos autorais. O sistema de vendas e distr i- buição era feito "de mão em mão" nas portas dos teatros, nos jardins, nos bares, enfim, tudo ao contrário do sistema "certinho". O sucesso foi grande l Mas, de marginal que era, l foi engolido pelo sistem"ãj Surgiram revi~tas e " personagens semelhantes aos de Crumb. rF:oram industrializ~os, formando·se até uma ~itora undergroundl Seu criador, vendo tudo isso aconte· ~ cer, abandona o mundo civilizado e vai criar cabras . O movimento underground nos uadrinhos, porém, rodou o mundo. No Brasil, Fritz the Cat e -Mr. Natural fiçaram conhecidos atrãVes da. revista Grilo, nos anos 70. E influenciou bastante o · uadrinhos marginais brasileiros. Foi uma etapa importante como forma de prCrtestar num período de bastante agi tação socialt Em 65, o Vietn1í. era cenário de guerra e as ãu~ potências do mundo, Estados Unidos e União Soviética, gastaram milhões em armamentos e a juventude teve que ir à luta. E os que ficaram ou vol tavam mutilados, berra· vam ao mundo "Paz e Amor". Os univerSitários pariSienses, na primavera de 68, se revoltam contra os sistemas arcaicos. Muito tumulto, agressão. Nos Estados Unidos, em Berckeley, Califórnia, apare· ciam os sneaks - jovens que t1ªEam a roupa em público em sinal de protesto. E os quadrinhos dessa época refletiram bem o clima de insegurança 53 ( 54 I I' I ' Sonia M Bibe-Luy tell e ~ forma de protesto foi pôr abaixo tudo aquilo que incomodava o2.jovens. JI:1em da Zap de Crumb, surgem Snappy Sammy 2 moot, do guerrilheiro revolucionário SkiQ Willi amson (1968) e Trashman, de Spain. RodrLgu@ Os temas abordados pelas revistas underground tinham em comum as comunidades marai!lais, a sexualidade, os hippies, a violência, a droga e a ecologia, dentro de um estilo realista e caricatural.. Os quadrinhos underground inspiraram-se em algumas histórias sadomasoquistas dos anos 40 e 50 e também parodiavam os personagens da idade de ouro (anos 30), co locando os heróis como Tarzã e Flash Gordon numa intensa atividade sexual. Mao Tsé-tung ataca de quadrinhos Nessa mesma época, porém, do outro lado do mundo, os quadrinhos estavam servindo para propósitos bem diferentes. Se a gente se transportar para a China, nos anos 60, a cabeça vai ter que se reciclar para compreender o que estava aconte- cendo lá e o que as histórias em quadrinhos desem- penharam nesse pa(s. Nunca é demais recordar que os comunistas, ao conquistar o Qoder na China em 1949, já de cara desenvolve.!:am _uma grodução de quadrinhos como instrumento de educação e formação ideológica. Ficaram célebres os "Quadrinhos de Mao", onde gradualmente foi inserido o pensamento de Mao o que é His tória em Quadrinhos 55 Tsé-tung. Jmpressos e distribuídos somente na /AL-b~ Ch in a, o Ocidente praticamente nãQJ.oro.ou..coQbeLX .Qmen!o_dessa...pGaer-eSil-ar-ff\a-i€leelég i€a~omente após 71, quando alguns intelectuais franceses e italianos como Chesceaux, Nebiolo e Umberto Eco p ublicaram um livro - I fumetti di Mao-, é que o bloqueio foi fu rado . c Nos anos 60, os mao(stas, .para reforçar a imagerTL do seu I (der (que estava perdendo terreno), fazem a "Revolução Cu lt ural" numa tentativa de trans- formar o curso da po l ítica chinesa. Aí é que entram os quadrinhos - um ve ículo de - fácil le itura e ca~ã - para cumprir uma função peaagógl~ Na verdade, é o texto que teiTl umar?" importância Ql:imordiãl. A figura adquire uma função de suporte para atrair a atenção do lêTtor. :...... Portanto, os quadrinhos de Mao refletem, na (iécada de 60, as contradições pol (ticas da China,~ no momento de rompimento com a União Soviét ica e em que se desemboca na Revolução Cultural.- Seu grafismo revela dois estilos bastante diferentes: a natureza é pintada de forma tradicional, mas as figuras humanas são bem real istas. Com um acrés- cimo: os maus e os tra idores dª-pátria são awes.e.o- tados de forma caricatu[al~_____ ~os ·Estados- Unidos, além do movimento un"derground há grande efervecência na produção dos novos super·heróiS":' ~ Stan L",e é a gran e estrela entre os desenhistas americanos. São de sua criação numerosos ~uper- I rrr 56 ., I L' Sonia M Bibe·Luyten heróis, mas não do tipo tradicional. Apesar de a vestime ta ter muito em comum com os da década de 40, uas personal idades parecem ser mais normais, isto é, amam, odeiam, têm seus defei· ~ tiflOos, etc Com Steve Ditko, Stan Lee criou O Homem· Aranha e Doctor Strange. E com Jack Kirby, os famosos Fantastic Four, grupo composto por quatro super·heróis: O Homem Elástico, A Mulher Invis/vel, a Tocha Humana e O Coi~ Hulk, o incr(vel Hulk, saiu da incrível pena de Stan Lee, e os anos 60 deram às HO o primeiro super·herói negro: 81ack Panther, que mudou O nome para 81ack Leopard para não se ligar ao movimento extremista com a mesma den om inação. Já na Europa, a França ataca os quadrinhos com ' a famosa revista Hara·Kiri, onde permitiu que mu itos desenhistas novos mostr~ssem seu talento e, em seguida, surge 8.-. famosa\ Pilote, estinada ao público adulto das H..9J E a Itália publica a revista Linus, introduzi 'ldo as novas tendências estéticas da década de 60, camo por exemplo Valentina, de _ o CrepaXl. - . O que mudou nos anos 70 e 80 Temas misturados com ficção científica, canções de cavaleiros mais a feitiçar ia medieval consti· o que e His/ória em Quadrinhos tu íram·se num gênero denominado fantasia heróica. Nos Estados Unidos, os quadrinhos mais.conhecidos com este assunto foram 8lackmark, um cavaleiro do mundo do pós·guerra atômica, onde a sociedade vo lta a ser primitiva. Além de Annikki, de Mike Rogers, uma hero (na bárbara, diferente ffifs eróticas do período anterior. A série Cinco Qor Infioirus.r de Esteban Maroto, também dentro do gênero fantasia heróica, ficou conhecida pelo público brasileiro através da Edição Monumenta l da EBAL, onde o desenho é primo· roso e muito bem elaborado. 57 Com um nome estranho e belo ao mesm"O" tempo, a França dá um grande passo na va nguarda dos quadrinhos em termos ed itoriais. Precisamente no dia 19 de dezembro de 1974, nascia a Editora '/ V Os Humanóides Associados, cuja grande atração e- foi a revista Métal Hurlant. Seus fundadores, Druillet, Grot, Dionnet e Farka's, deram um passo gigantesco no mercado de quadrinhos, abrindo espaço para um novo pÚblicÕl Muitos desenh istas famusos entraram para as páginas de Métal Hurlant. Druillet, já conheci· díssimo através das aventuras de Lone Sloane, cria um novo t ipo de anti·herói: Vuzz, um personaqem mi'steríoso VInSlO de algum planeta perdido da .~ galáxia. ' Sob o pseudônimo de Moebius, o francês Jean Giraud não fica atrás e seiiTlpõe como um dos ~ maiores expoentes da criação de histórias fasci· 'tif S8 . Sonia M. Bibe·Luyten nantes. E o Brasil perdeu Sérgio Macedo, que ficou muito mãis ...konhecido no mundo pelas páginas do Métal Hurlant do .que em nosso pa ís. , , O editor da revista americana National Lampoon gostou tanto do estilo desses quadrinhos que quis publicar algumas histórias da Métal Hurlant. E em abril de 77, edita Heavy Metal nos Estados Unidos . No entanto, ao invés de comprar todo o material francês, inseriu histórias locais mais compatfveis If com o gosto americano. Com um acréscimo de material da Espanha e da Itália, também . Inclusive, l~' o desenho animado Universo em Fantasia, uma seleção de quadrinhos da Heavy Metal, foi todo :1 feito com material americano. A produção dos anos 80 na América do Norte if es.tá voltadi;l Rara as minisséries,Jepresentando uma / G:ra fase das HQ. O formato é de gibi, Rorém, a~ istórias são mais bem elaboradas. A capa e o I j papel interno são de melhor qualidade e existe III toda uma reformulação da narrativa com a intra· 1 ~?ãO de novos personagens. . \ As minisséries lembram ~ouco as aotiga.§. j novelas e~rtuJ.os~~cada_uma de las contém de 6 a 12 números com hlstb rias completas . . I Na apresentação gráfica há influência do estilo do desenhista Will Eisner .tO ESDrrito, da década 111 de 49, lem6ram·senllOjogo de luz, e a linguagem . cinematográfica aRarece a tooo vapor. E um . detalhe: o Ocidente vai buscar inspiração nas HQ Japonesas tanto em conteúdo como no e,st ilo, ~l I-- . - o que é História em Quadrinhos 1 . , E neste intercâmbio quem está ganhando e o leitor da nossa década. i: muito difícil falar do momento histórico que se vive. Quem são os novos heróis, qual em a os preferência do público, que rumo vão tomar quadrinhos daqui para a frente? Vamos viver nosso tempo e saborear as pági dos gibis de maneira intensa, poi s elas passa nas rão para a história dentro de alguns anos. E, enquanto os heróis e heroínas cavalgam p elo na da, espaço em busca de novas aventuras, a vida Terra continua, mas eles serv irão, sem dúvi para novos temas de quadrinhos . e o mundo acabasse, tudo fosse destru íd somente sobrassem as revistas de histórias quadrinhos, algum ser extraterreno (se consegui o e em sse er, em decifrar a escrita de nosso planeta ) pode ria t com certeza, uma idéia adequada do mundo que, outrora , vive mos. . •• •• •• S9 'r • ALONGA LUTA DOS QUADRINHOS BRASILEIROS Você, leitor, naturalmente não nasceu em 1929 nem pôde acompanhar a criação de um personagem americano nessa época. Por outro lado, deve conhecer, com certeza, quem é o herói Mickey Mouse, de Walt Disney. Até hoje, ao longo desses anos todos, o pequeno camundongo ainda está perambulando pelo mundo, as páginas das revistas de HO ou em comercia is de algum produto. Por uma série de razões, o rat inho Mickey ficou famoso em seu país de origem e, depois, no mundo todo. E, assim, tantos outros heróis ou heroínas americanos, franceses ou italianos, formando um conjunto de produção de quadrinhos em seus respectivos países. E do Brasil, você, de imediato, seria capaz de nomear cinco ou dez heróis de HO, desde o in (cio o que é Históna em Quadrinhos deste século, com ampla repercussão ri,acional ou internacional? Talvez sim. Talvez não. E ' muito mais para não do que para sim , não é verdade? E por que será que certos pa íses conseguiram não só criar heróis nacionais que continuam vivos (publicados) até hoje, como também fazê-los cr iar fama no mundo inteiro? 61 Como já vimos, há os esquemas de divulgação e de sustento de um personagem. Mas é preciso que ele seja criado e que viva o suficiente para consta- tar-se se agrada ou não. Um bom exemplo para isso é Maurício de Souza . Após anos de lu tª.....ele conseguiu- impor os seus gersona ens e, hoje....em dia, suas revístas vendem mais do que as do mUl:II:!a-, Disney no Brasil. No entanto, o personagem que vem tomando vu lto nos últimos tempos LQ Cbico. - Bento, justamente o que mel hor representa o brasileiro de nossos dias com seu sonhos nostálgico volta ao interioL Um caso bem diferente do Brasil, por exemplo, é a Argentina que, no resto, é igual a nós no que se refere à infl'uência estrangeira em todos os ângulos. No entanto, seus desenhistas e respectivos personagens são mundialmente famosos e expor- tados para uma série de países, como a Maf,alda, o Patoruzú e o Isidoro, a lém de muitos outr~ Como é que pôde acontecer isso bem ao nosso lado? Bem, vo ltando alguns anos, na época de Perón e Evita,- houve pura e simplesmente uma proibição de se editar Quadrinhos estrangeiros na r~J 62 Sonia M. Bibe-Luyten Argentina . Esta situação durou alguns anos. Tempo sufic iente para que os desenhistas argentinos se---- " organ izassem em uma poderosa escola cU Jos " resu ltados são sentidos ainda hoje. I , Atualmente, no Brasil, é difícil proibir-se qua l- I quer COisa, ma is ainda cortar uma influência ali enigena tão arraigada no pa is. Por outro lado, porém, poderiam pelo menos dar um m ínimo de Q ondições de sobrevivência a nossos desen h istas. Uma dessas possibilidades é uma regulamentação da produção nacional por lei, de que falare i adia r1tê.l . ~ Até o momento, todas as nossas produções Cle' HQ, com exceção de Maur ício de Souza, não I : perduraram no tempo. Mu itos art istas de primeira I grandeza não puderam ser apreciados devi damen te pelo púb lico a quem desejavam oferecer o seu trabalho. Já houve diversos artistas que, não I obtendo o devido reconhecimento aqUi, foram I!' para outros paises, onde foram recebidos de braços I' abertos. Um desses exemplos é Sérgio Macedo, que, , no inic io dos anos 70, fQi..,:;Jara a França e lá passou a publi car seus traba lhos numa das revistas I mais importantes do momento, a Métal H tgkint. Iô importante sabermos como se deua evolução da HO nac l~ se~esen nistas e Rersonagens principa is nor dois ~ntivos : um deles, Rara ava liar a prQdução at ua l e suas tendências . A outra ,_ta.l1l8z. a ma)s importante : para tomarmos co~iência da própria cu ltura brasil eira gue nela se ref lete ._ I I Um povo que tive r' consc iência de suJLb istória, J • \ O que é História em Quadrinhos 63 suas ra izes, se ja em que campo for: literatu ra,_ to. ci nema e, mesmo, quadrinhos, saberá, com mui maior precisão, tra c;:ar o futuro . Os quadrinhos brasileiros tiveram gran des expoentes e bons momentos. Muitos de les, poré m, foram a bafa dos oeJaLCi.cc u ns.tânc las.::e,-p~1f.1Gll'l a ·l· cla_ me nte, pela fa lta de consciência. Uma i::Qosi:: iêo cr7tica de quem Qublica, .ctLguem comllliLl' to , .tíém de quem faz. Quando se ana lisa o ,passado, a tendência é de er res se ressaltar o que de melhor ficou . Mas, em qual qu pais, em gua lguer él2oca, l2ara que os melho preva lecessem hOl.L\le mui.tB-.ptodução iosig o.ifi:... cante, também. Assim, a produção dos quadrinhos nasclon ais em rá, Je· _se ue deverá ser vista em função do que aconteceu cada época para poder ser ava liada . E este se portanto, um bom começo para se fa lar em tra tória das HO brasileiras . Uma trajetória que iniciou em mo ldes mu.itO-LllalS-lml.ta-t-J-ves el o q criativos. E por que isso? Um início modesto . i: bom lembrar do que ocorreu nos Estad Unidos no f im do século passado com os quadrinh os os: ais ta o sucesso alcançado pelos suplementos dominic dos . . partir do " Yellow Kid". Des Jorna iS, a 64 Sonia M. Bibe-Luyten forma, os primeiros personagens norte-americanos logo alcançaram uma ampla repercussão, que chegou, inclusive, ao Brasil. Nossa primeira revista de HO chamava-se O Tico Tico e surgiu· áernT90o.Seu personagem priilcipal <õhamava-se Chiquinho, um menininho loiro de cabelos compridos. Na reáfidade era uma cópia de Buster Brown, criado por R. Outcault, o primeiro desenhista de quadrinhos americano, o mesmo aútor de "YeITOvVKid". - - O Tico Tico era uma revista destinada às crianças, mas não como os gibis que conhecemos hoje em dia. Havia poucas páginas com quadrinhos. O resto ; ' era texto. Geralmente, curi"bsida-de·s;-iábulas e -fatos sobre a história do Brasil. Ao longo dos anos, porém,-Ol lcO Tico foi se enriquecendo com grandes co laborações de desenhistas famosos. Um bom exemplo disso é a história de "Reco Reco, Bolão e Azeitona", de Luís Sá, que soube pôr no papel tipos bem brasileiros. O Azeitona é um negrinho sapeca que faz mUita agunça Coiii o c0l!12anhei o.-ll..olão., Úm meoino_ gor..ducho, e o R-eco Reco,Jjue tinha o cabelo todo arrepiado. Luís Sá continuou deseDbaodp~depois, inúmeras histórias,. e_ se estilo fo U llconfundível: quente, formas arredo dâd.as, um ve rdadeiro barroco brasileiro. Maccou época na HO nacional. Lembro-me bem, quando ele morreu há alguns anos, os jornais demonstraram pouca importância a este grande artista. No entanto, ele merece nossa o que é História em Quadrinhos , VOI) VlPE~I " fN· O L E O "I 'A' ""<\.0. RO~A~ TALVrl Ot .,., CE RTO • PARA AMAelAR SEUS CABELOS TOOO MVNOO I os ME"U$ CABElOS, TE NHO DAR U,01 JEITO NflfS. " :, 65 7""1 . 66 Sônia M Bibe-Luy ten admiração por ter dado ao quadrinho um sabor inconfundivelmente brasileiro. : til Outro grande valor dessa época foi J. Carlos. O volume maior de sua criação a rtfstica, porém, foram a charge e a nustração. Ele colaborou em quase todas as revistas importantes de seu tempo. ' Nos quadrinhos, sua criação no O Tico Tico foi Jujuba, Carrapicho e Lamparina, que, além de I • primar_(:Ie lo lindo desenho, mostrava um conteúdo bem brasileiro. Soube captar a paisagem tropical,~ i i! burburinho subürbano, a conversa de muro e --também o sofisticado ambiente urbano. . Em 1960, O Tico rico' term ina sua jornada, com II 55 anos de publicação ininterrupta . Foi o fim de Ilit! I uma revista por onde passaram grandes desenhistas e funcionou como uma espéc ie de tubo de ensaio onde se ex perimentaram novas técnicas e novas histórias. Foi lido por mu itas gerações e' ensinou 11' mu ita coisa para as crianças de diversas épocas. Os suplementos no Brasi I: Uma faca de dois gumes O Brasil viveu grandes momentos e mu itas transformações no campo artrstico e pol ítico nos anos 20 e 30. Na li teratura, Graciliano Ramos, José Lins do Rego e José Américo tornaram-se expoentes porque souberam utilizar temas ...brasi- leiros. O mesmo aconteceu com a pintura, onde Portinari e o Grupo Santa Helena, na mesma l~~ (l que é História em Quadrinhos linha, se destacaram e todos se internacional izar am o 0-O segredo estava começando a ser desvendad partir do nacional para o universa l. Na pol (tica, Getúlio Vargas dominou o cen ário de um tas. e se nho ade glO: em seu ção tos foi nte deu CIO- ma nacional, tornando-se muito popu lar através ações como dom (nio da imprensa e outros. Foi dos governantes mais ca ricaturizados pelos artis Dizem que ele até gostava d isso. Getúlio, qu tornaria famoso por uma série de- reis de cu nacionalista, no entan to, perdeu uma oportunid muito boa de aumentar a inda mais o seu prestí não fez nada para abrasileirar as histórias quadrTilhõs:-Na Argentina, como já mencionei, colega de ditadura procurou concentrar a aten dos leitores argentinos em torno de assun nacionais de lá. E um dos passos decisivos nacionalizar os quadrinhos. Ali ás, ele simplesme proibiu as histórias estrangeiras e, com isso, campo aberto pa ra os argentinos fazerem as na nais. O resultado disso todos con hecem : u 67 vtr0rosa produção argentina. No Brasil, por essa época, estavam-se .con tU IITdo grandes monopólios jorna l rsticos em for de empresas bem est ruturadas, com eficie sti- l ma ntes sistemas de produção e de distribuição. Um de I les, ha, I i1FiõS A Gazeta, lança a Gazeta Infantil ou Gazetin que se caracte riza pela publicação de quadrin tanto estrangeiros como nacionãiS':"Dos Importa vale c itar o Gato Félix, Fantasm.l!JLl.iJ:tl.eJ'Jem Slumberland. Mas em suas páginas aparece tamb d~S' j O...lD ém . I lli 11' 68 Sonia M. Bibe·Luy ten HQ brasileira. Um desenhista que caracterizou a epoca fo i Be1monte. Ele foi outro exemplo de desenhista que soUbe capta r o gosto popular e transformá·lo em produção art(stica . O forte de sua "'-produção foi a charge, e o personagem QlJe o celebrizou foi Juca Pato (que também aparece em quadrinhos), o tipo comum das J1essoas qLJe sempre "pagam o pato" por
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