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291 
Capítulo 13: 
Aconselhamento pastoral 
Christoph Schneider-Harpprecht 
13.1 - Introdução 
O termo "aconselhamento pastoral" é uma tradução para o português 
da palavra inglesa pastoral counseling, usada especialmente no contexto 
norte-americano do séc. 20. Muitos consideram este termo uma expressão 
problemática, pois sugere que aconselhamento seria em primeiro lugar uma 
atividade do pastor como ministro ordenado e implicaria uma relação de 
poder que não deixa espaço para a livre articulação do seu parceiro de 
comunicação e para o desenvolvimento independente do mesmo. Outros 
termos técnicos usados nesta área, como a palavra artificial poimênica 
(a ciência do agir do pastor [em grego: poimen]), clínica pastoral (o 
acompanhamento pastoral na área da saúde), psicologia pastoral (a 
interpretação da pastoral sob perspectiva psicológica) ou a definição dos 
parceiros na conversação como paciente, cliente, aconselhando também 
indicam esse problema de poder. A origem dessas metáforas está na 
medicina, na psicanálise e no método psicoterápico de Cari Rogers 
(counseling). A tendência de entender a atividade do aconselhamento pastoral 
a partir da medicina tem as suas raízes já na Igreja antiga e deve-se à 
tradição do platonismo, que transparece no conceito clássico de cura 
d'almas, o qual entende como tarefa principal do pastor a salvação da alma 
imortal através da confissão e absolvição. Para superar o dualismo 
antropológico desta concepção, achamos preferível permanecer na 
terminologia comum e refletir criticamente sobre as suas implicações e limites. 
Falamos neste capítulo da teoria e prática da poimênica e do aconselhamento 
pastoral, destacando que esta atividade não se restringe aos ministros 
ordenados, que ela implica uma relativização do poder, pois trata-se, em 
princípio, de uma relação livre entre dois parceiros iguais. 
Definimos a poimênica como o ministério de ajuda da comunidade 
cristã para os seus membros e para outras pessoas que a procuram na área da 
saúde através da convivência diária no contexto da Igreja, e definimos o 
aconselhamento pastoral como uma dimensão da poimênica que procura 
 292 
ajudar através da conversação e outras formas de comunicação 
metodologicamente refletidas. Ambos baseiam-se na fé cristã e na tradição 
simbólica do cristianismo. O objetivo do aconselhamento pastoral é descobrir 
com as pessoas em diferentes situações da sua vida e especialmente em 
conflitos e crises o significado concreto da liberdade cristã dos pecadores 
cujo direito de viver e cuja auto-aceitação vêm da graça de Deus. O seu 
objetivo é também ajudá-las para que possam viver a relação com Deus, 
consigo mesmas e com o próximo de uma maneira consciente e adulta. Isto 
inclui a capacitação das pessoas para assumirem a sua responsabilidade como 
cidadãos que se engajam em favor de uma melhora das condições de vida do 
seu povo numa sociedade livre, democrática e justa. 
Essa definição interpreta a poimênica e o aconselhamento pastoral em 
primeiro lugar como uma expressão da vida da comunidade e não como 
uma tarefa reservada para os pastores ou outros especialistas da Igreja. 
Aconselhamento acontece sempre e em qualquer cultura quando pessoas 
convivem, participam do discurso público e particular e comunicam-se so-
bre as dificuldades no grupo familiar, no trabalho, na Igreja ou congregação 
religiosa, nas diferentes relações sociais nas quais estão inseridas. A convi-
vência e a comunicação são o fundamento social do aconselhamento em 
geral. O aconselhamento pastoral é uma forma específica do discurso huma-
no. A sua base social é a convivência no contexto da Igreja, a koinonia dos 
membros. Esta koinonia tem para os cristãos um significado espiritual: na 
convivência da comunidade acontece a comunhão com Jesus Cristo, o Filho 
de Deus encarnado que, na sua vida e morte, compartilhou o destino humano 
e, conforme a promessa do evangelho, se torna presente "onde dois ou três 
se reúnem no nome dele" (Mt 18.20). A metáfora bíblica da Igreja como 
corpo de Cristo provavelmente é a expressão mais exata para a 
interdependência das relações humanas e da relação espiritual com Cristo na 
comunhão dos membros da comunidade cristã. 
O aconselhamento pastoral é uma dimensão da koinonia, assim como o 
culto, a catequese, a missão e a diaconia. Isto implica que todas essas dimen-
sões de convivência têm também um significado poimênico e, por outro lado, 
que o aconselhamento pastoral inclui elementos litúrgicos (oração, canto, con-
fissão de pecados e absolvição...), elementos catequéticos (orientação, infor-
mação, processos de aprendizagem...), elementos de missão (anúncio do evan-
gelho, chamado para a mudança de vida, envio para testemunhar a fé através 
da vida...) e elementos diacônicos (visitação, comunhão de mesa, assistência 
social aos pobres e enfermos...). O aconselhamento pastoral e as outras di-
mensões da vida comunitária estão interligados como círculos que se cruzam 
e assim delimitam uma superfície que têm em comum. 
 293 
Naturalmente a diaconia e o aconselhamento pastoral estão mais inter-
ligados. É impossível separar a ajuda psicológica e espiritual da ajuda concreta 
pela ação social. As necessidades físicas e sociais elementares do ser 
humano têm prioridade. O aconselhamento pastoral que oferecesse consola-
ção espiritual aos famintos seria uma contradição cínica do evangelho que 
ninguém pode desejar. No contexto de pobreza que é típico dos países da 
América Latina o aconselhamento pastoral precisa ser integrado no trabalho 
diaconal da comunidade. Este parte diretamente para a ação concreta de 
ajuda, enquanto o aconselhamento pastoral lida com processos de mudança 
da identidade, de posturas, pensamentos, sentimentos, relações interpessoais 
que se refletem no comportamento das pessoas. 
A partir dessa visão é necessário desenvolver na Teologia Prática a 
teoria de uma prática interdisciplinar do aconselhamento pastoral que reflita a 
sua relação com as outras dimensões da vida comunitária, bem como com as 
ciências humanas (psicologia, psicoterapia, teoria da comunicação, sociolo-
gia, antropologia...). Se o aconselhamento pastoral é uma forma específica de 
discurso humano no contexto da Igreja inserida numa determinada sociedade, 
cultura e tradição, ele está sujeito às regras deste discurso. Por isso a teoria e 
prática do aconselhamento pastoral devem levar em consideração os aspectos 
psicológicos, sociais e culturais do seu discurso e entrar num diálogo crítico 
com as disciplinas que desenvolvem estas perspectivas. 
Nesta primeira aproximação à teoria do aconselhamento pastoral 
dentro da Teologia Prática já transparecem os temas fundamentais que 
devem ser aprofundados neste capítulo: a fundamentação teológica, o pro-
blema da inculturação, a relação entre aconselhamento pastoral e as ciências 
humanas e a questão do método. Antes de abordar esses temas, achamos 
necessário esboçar uma visão geral da história do aconselhamento pastoral 
e analisar os principais modelos atuais que determinam o trabalho de 
aconselhamento pastoral nas igrejas do protestantismo histórico na América 
Latina. 
13.2 - Aspectos históricos do aconselhamento 
pastoral 
13.2.1 - As origens platônicas 
A palavra cura d'almas aparece pela primeira vez no diálogo de Platão 
intitulado Laches. Dois pais conversam com Sócrates sobre a educação 
correia para os seus filhos e concordam logo com a opinião do filósofo de que 
 294 
o caminho certo seria a terapia da alma (psyches terapeia)1. Platão exige de 
cada cidadão que ele se preocupe não apenas com o dinheiro, a sua fama e 
honra. Deve também procurar o melhor para a sua alma {epimeleisthai tes 
psyches) através de conhecimento e verdade2. O caminho para tal é o processo 
permanente de autoconhecimento e auto-exame {gnothi seauton). Já nasua 
origem o aconselhamento, entendido como cura d'almas, aparece como uma 
prática social de disciplinar os cidadãos e tem um significado dualista voltado 
contra a realidade física do corpo que durante séculos dominaram o tratamento 
da alma no Ocidente. Isto transparece quando Platão exige, no seu escrito 
Nomoi ("Leis"), que cada cidadão que não acredita nos deuses seja internado 
durante cinco anos numa casa onde, através de contatos com pessoas seletas, 
possa melhorar e salvar a sua alma. A psicologia platônica, que divide a alma 
em três partes, o lado racional (logistikon) relacionado com o verdadeiro ser 
das idéias, o lado do sentimento (timoeides) e o lado da pulsão (epitometikon), 
relacionado mais com a realidade física e sensual, determina o processo de 
autoconhecimento como fuga constante da mente para fora do mundo físico, 
voltando-se para o mundo das idéias e de Deus3. Na Antiguidade a terapia e o 
aconselhamento não eram práticas específicas de terapia no sentido atual. 
Filosofia, teologia, pedagogia e culto eram em grande parte equivalentes4. 
13.2.2 - Poimênica no Antigo Testamento 
No mundo do Antigo e do Novo Testamento encontramos uma concep-
ção diferente de alma e, por conseqüência, também outras concepções de 
aconselhamento. A alma no AT é idêntica à vida. O sopro que Deus soprou 
nas narinas do homem que modelou com a argila do solo é a sua nefesh, ele 
mesmo como ser vivente perante Deus (Gn 2.7). Nefesh é sinônimo da 
identidade do ser humano nas suas relações com Deus, consigo mesmo e com 
o próximo5. A antropologia do AT não separa mente, alma e corpo e entende 
o ser humano de maneira integral e relacional. As perturbações da relação 
com Deus afetam todo o ser humano. Ele as percebe também de maneira 
integral no seu coração (leb) como órgão central das emoções, da autopercepção 
e da consciência. Afastada de Deus a nefesh enfraquece, sofre, fica doente, 
1 Cf. Thomas BONHOEFFER, Ursprung und Wesen der christlichen Seelsorge, p. 11. 
2 Cf. Chrístian MÕLLER, Entstehung und Pragung des Begriffs Seelsorge, p. 9. 
3 ID., ibid., p. 10. 
4 Cf. Thomas BONHOEFFER, op. cit., p. 11. 
5 Cf. Hermann EBERHARDT, Praktische Seel-Sorge-Theologie, p. 19-21. 
 295 
segue o mal nos seus atos e pode morrer. A morte é a falta da relação com 
Deus, e quem se afastou dessa relação já participa da realidade da morte 
enquanto ainda vive fisicamente. 
O aconselhamento no AT está centrado na luta do ser humano para 
resgatar a sua relação com Deus. O aconselhamento aparece como fenômeno 
nas diferentes articulações da vida da comunidade, ligado ao culto, ao sistema 
jurídico e à sabedoria popular. Agentes do aconselhamento no AT são os 
sacerdotes (Lv 12ss.; 1 Sm 1.9ss.), os anciãos e juízes que tomam decisões em 
casos de conflitos (Rt 4), os profetas que desenvolvem na sua prática a admoes-
tação e a consolação individual e coletiva (2 Sm 12; Is 40.1ss.) e, em primeiro 
lugar, os sábios, homens do povo que transmitem como pais de família os 
conselhos da sabedoria popular para os filhos (Pv 4ss.). Nos Salmos podemos 
observar como essa luta pela reintegração na relação com Deus acontecia 
dentro da vida de culto do povo de Israel. No culto se articulavam o grito, a 
lamentação e a prece por ajuda da pessoa que se encontrava fora da relação com 
Deus, que não conseguia mais enxergar o seu rosto. Na dinâmica dos Salmos de 
lamentação e penitência (p. ex.: Salmos 13,22,51...) que perpassa a lamentação, 
a confissão do pecado até poder voltar ao louvor a Deus aparecem elementos 
típicos de um aconselhamento liturgicamente ritualizado e ligado à intervenção 
de sacerdotes, que realizavam cerimônias de sacrifício, de purificação ou de 
cura para reintegrar o indivíduo espiritual e socialmente. 
Os provérbios e os diálogos de Jó com seus amigos nos indicam de que 
maneira a admoestação e consolação eram práticas da sabedoria popular. 
Conforme o costume de acompanhar enlutados, eles visitam o sofredor para 
"compartilhar a dor e o consolar" (Jó 2.11). A solidariedade se exprime em 
gestos tradicionais como rasgar as roupas e jogar pó em cima da cabeça, sentar-
se no chão ao lado de Jó e compartilhar sua dor em silêncio durante sete dias e 
sete noites (2.12s.). Frente ao sofrimento do justo, o aconselhamento dos 
amigos fracassa. Apenas na relação direta com Deus manifesta-se uma solução 
para Jó (caps. 38ss.), que apela a Deus como testemunha contra Deus mesmo 
(16.19s.). Nesta experiência extrema de um apelo ao Deus justo contra o Deus 
ausente que escondeu o seu rosto o AT está sondando profundamente o abismo 
da auto-experiência humana e oferece uma figura de pensamento que tornou-se 
importante para o aconselhamento pastoral de muitas gerações. 
13.2.3 - Poimênica no Novo Testamento 
No NT observamos a continuação de uma prática que integra cura 
espiritual e física, aconselhamento, culto, interpretação das leis divinas e 
 296 
sabedoria popular. O contexto da prática de Jesus e da comunidade primitiva 
era uma sociedade multicultural e multirreligiosa, caracterizada pelo 
desenraizamento social e cultural de grandes populações, por insegurança 
social, injustiça e violência diária. O pensamento apocalíptico que proclama-
va o fim deste mundo e o início do reino de Deus era uma tentativa de manter 
a identidade das pessoas contra o perigo da desintegração total6. A mensagem 
escatológica de Jesus de que o tempo se cumpriu, o reino de Deus está 
próximo e cada um deve converter-se para o novo mundo de Deus que está à 
frente (Mc 1.15) ofereceu uma possibilidade de superar o abismo entre o bem 
e o mal, entre este mundo e a realidade de Deus. Através de uma negação 
radical de si mesmos como seres que fazem parte deste mundo mau, os 
seguidores de Jesus conseguiram uma afirmação dialética da sua identidade: 
sendo pobres e pecadores, eles eram amados e valorizados perante Deus por 
causa do amor que ele lhes transmitia na pessoa de Jesus. Este apresentava-se 
na sua pregação e prática como reconciliador entre Deus e os seres humanos 
que representa o amor e o perdão divinos. Esta afirmação dialética da própria 
identidade perante Deus permaneceu, também após da morte de Jesus na 
cruz, um elemento essencial da autocompreensão cristã e continua sendo um 
ponto central para o aconselhamento cristão. A partir da experiência da 
ressurreição e da fé de que Jesus é idêntico ao futuro juiz do mundo, os 
seguidores dele conseguiram superar a experiência da sua morte e entender a 
si mesmos como pessoas que vivem do perdão e do amor de Deus por causa 
de Jesus Cristo. Ele, o crucificado e ressurreto, tornou-se o centro e a garantia 
da sua identidade7. Paulo a testemunha de maneira exemplar quando diz: "Eu 
vivo, mas já não sou eu que vivo, pois é Cristo que vive em mim" (Gl 2.20). 
Também os escritos joaninos visam uma transformação da pessoa a partir da 
nova vida trazida por Jesus, após a sua morte, pelo Paráclito, o Espírito Santo 
como advogado. Essa nova vida relativiza o antigo ser. 
A palavra paracalein, paraclesis torna-se o conceito-chave para o 
aconselhamento pastoral no NT8. Em Paulo ela significa a oferta da salvação 
através da relação com Cristo que a pregação do evangelho leva até as 
pessoas. A paraclesis as chama para deixarem a sua participação na vida de 
Cristo a partir do Batismo transformar a sua vida quotidiana e afirmá-la 
também em situações de sofrimento (2 Co 1.3ss.). Por isso paraclesis pode 
ler dois significados diferentes: admoestação e consolação. O seu fundamen- 
 
6 Cf. Thomas BONHOEFFER, op. cit, p. 26. 
7 ID., ibid. 
8 Cf. Christoph SCHNEIDER-HARPPRECHT, Trost in der Seelsorge, p. 127ss. 
 
 297 
to é a misericórdia de Deus que justifica o pecador (Rm 12.1). A paraclesis 
desafia os crentes a realizar uma identificação com Jesus Cristo que os 
fortalece, lhes dá paciência e esperança (2 Co 1.6s.).Ela serve para a edificação 
do corpo de Cristo. 
Dois aspectos no NT são importantes para a futura história do 
aconselhamento pastoral. A mensagem da vida no reino de Deus e da ressur-
reição de Cristo transforma a antropologia e abre a porta para a desvaloriza-
ção da corporalidade e a espiritualização da vida que se tornaram dominantes 
na medida em que o cristianismo abriu-se para o pensamento grego. A 
dialética entre esta vida e a nova vida em Cristo que superou a morte levou 
paulatinamente a uma compreensão que identifica a psyche com a verdadeira 
vida espiritual, constituída pelo pneuma, o Espírito Santo que mora nos 
crentes, enquanto que a psyche como vida neste mundo vai ser identificada 
com a existência mortal e pecaminosa na carne. A contradição paulina entre 
sarx e pneuma como duas formas da constituição do ser perante Deus vai ser 
transformada, nos escritos apócrifos, na contradição entre corpo físico e alma 
imortal9. 
Os agentes do aconselhamento no NT são todos os crentes. Porém em 
Tg 5.13ss. transparece que a visitação aos doentes tornou-se mais e mais uma 
atividade específica dos presbíteros da Igreja, que tinham a tarefa de orar com 
o doente, ungi-lo com óleo e perdoar os pecados. O tratamento dos doentes 
continuou sendo uma prática integral de cura espiritual e física. Tiago coloca 
a ênfase ainda na confissão mútua e na oração como meios principais para a 
cura, porém destaca que "a oração do justo, feita com insistência, tem muita 
força" (5.16), quer dizer, a cura depende da qualidade espiritual da pessoa, e 
certos representantes da comunidade parecem ser privilegiados. 
13.2.4 - Poimênica na Igreja antiga e 
na Idade Média 
A integração da tradição bíblica e grega na Igreja antiga transformou a 
mensagem escatológica num dogma sobre a verdade eterna e levou ao uso de 
novos meios de aconselhamento, como cartas de consolação, processos de 
auto-investigação e penitência ritualizada com a finalidade de purificar a alma. 
---------------------- 
9 Cf. Hermann EBERHARDT, op. cit., p. 43ss. 
 298 
Os eremitas no deserto do Egito, fundadores do monaquismo oriental, se 
submetiam, na solidão de sua caverna, a exames espirituais contínuos, 
aprofundaram a cultura da auto-observação e desenvolveram um tipo de acom-
panhamento pastoral por um mestre que assumia o papel de pai espiritual. O 
livro de confissões de Agostinho é o documento mais importante do 
aconselhamento como processo de auto-experiência perante Deus. Agostinho 
reconstrui, reflete e avalia a história da sua vida na forma de uma oração. De 
certa forma psicologiza a sua auto-experiência de pecado, culpa, luto, conver-
são e esperança. Assim a torna a fonte mais importante para o seu 
aconselhamento. Conhecendo a si mesmo, ele pode ser solidário com outros10. 
A centralização do poder no monarquismo episcopal colocou a tarefa do 
aconselhamento pastoral nas mãos dos bispos e presbíteros e lhe deu mais e 
mais um caráter jurídico. O bispo julgava, punia e perdoava os pecados, era o 
guarda da doutrina ortodoxa, decidia sobre a admissão à Santa Ceia e conseguia 
assim controlar o pensamento e o comportamento dos fiéis, a sua consciência e 
o seu corpo. Essa tendência desembocou na elaboração de um sistema de 
penitência que tinha a função de definir o status de uma pessoa em relação com 
a salvação e com a Igreja como representante da verdade eterna. O meio 
terapêutico dessa poimênica era o castigo, a exclusão do grupo social dominan-
te como castigo social e como meio de educação que permitia, através de um 
longo processo de penitência, o reingresso na comunhão dos santos11. 
O exemplo mais famoso desse tipo de aconselhamento é o Livro de 
pastoral do papa Gregório I (590-604), uma coletânea de casos pastorais que 
tornou-se durante um milênio a instrução básica para cada pastor. O meio de 
poimênica era a conversação pastoral. Cabia ao ministro examinar a situação 
moral e religiosa da pessoa, diagnosticando se ela estava de acordo com as 
regras da Igreja para uma vida de fé ou não12. 
10 Cf. Alfred SCHINDLER, Augustin, p. 204s. 
11 Cf. Thomas BONHOEFFER, op. cit., p. 137. O filósofo Michel Foucault identificava nessa prática de 
poimênica "o poder pastoral" como um princípio político que, através de técnicas sistematizadas de 
punição e auto-investigação que estavam à disposição dos pastores, disciplinava o corpo e constituiu a 
alma cristã como reflexo interno do exercício da penitência. Na análise de Foucault, a idéia de alma 
cristã é um produto histórico da internalização da submissão sob "o poder pastoral" através da 
poimênica na era patrística e um elemento básico na formação do sujeito ocidental. Isto quer dizer que 
o sujeito cristão está, desde o início e na sua essência, submisso ao poder espiritual. A análise de 
Foucault exige uma autocrítica da poimênica e o desenvolvimento de uma concepção crítica de 
poimênica como libertação do poder eclesiástico, bem como da submissão por técnicas psicológicas de 
disciplina social (cf. Michel FOUCAULT, História da sexualidade; Hermann STEINKAMP, Die 
"Seele" - "Illusion der Theologen"; Eva ERDMANN, Die Macht unserer Kirchenvãter). 
12 Thomas BONHOEFFER, op. cit., p. 56. 
 299 
A concepção de penitência de Gregório merece atenção específica, pois 
tornou-se a base do sistema de confissão até a época da Reforma. Quem 
cometia um pecado devia confessá-lo ao ministro. A condição para conseguir 
realmente a absolvição por Deus era a contritio corais, a contrição pelo 
próprio pecado. Deus vai ao encontro do pecador pela graça da compunctio, 
provocando o reconhecimento da própria indignidade completa perante Deus, 
quer dizer, uma autocontrição total que torna a pessoa digna para ouvir a 
absolvição. O processo: contritio cordis - confessio oris - absolutio -
satisfactio operis do sistema de confissão em Gregório e na Igreja da Idade 
Média dava às obras o valor de uma busca ativa para mudar não apenas a 
postura interna, mas de recuperar efetivamente o mal causado pelo pecado13. 
13.2.5 - A poimênica da Reforma 
O movimento da Reforma se constituiu a partir do protesto de Lutero 
contra o abuso desse tipo de aconselhamento pastoral. A partir do seu próprio 
processo de luta contra as tentações, a partir de uma profunda experiência 
daquilo que significa ser pecador, ser condenado pela voz de Deus na cons-
ciência, de ser anulado, Lutero descobriu na graça pura como dádiva de Deus 
por causa da vida e morte de Jesus Cristo o fundamento para uma reconstru-
ção e restruturação da identidade do indivíduo. Era um indivíduo com dois 
sujeitos, o verdadeiro sujeito oculto, que é o próprio Cristo ao qual a pessoa 
pertence, e o sujeito perante o mundo, dirigido pela razão e pela livre 
vontade. Esse sujeito perante o mundo está num processo permanente de 
transformação a partir do outro pólo da subjetividade perante Deus. Ou, em 
outras palavras: o ser do pecador está sempre sob o juízo da consciência para 
ser renovado a partir da fé. Ou, como Lutero disse na primeira das 95 teses de 
Wittenberg em 1517: a vida do cristão como um todo é um processo de 
penitência. É necessário voltar-se sempre para a primeira identidade definida 
no Batismo. 
Essa postura tem conseqüências para o aconselhamento pastoral. Sig-
nifica em primeiro lugar que Lutero tirou o peso do ato de penitência 
declarando que este não seria mais obrigatório. Por outro lado, tornou a sua 
própria experiência quase um padrão para todos os seus contemporâneos. 
Sendo cristãos, eles eram confrontados com o questionamento radical em 
 
13 ID., ibid., p. 52. 
 300 
relação a Deus e com a consciência de que toda a sua existência era pecami-
nosa e não apenas determinados atos. Por conseqüência, essa dinâmica da 
consciência e da afirmação da identidade pessoal através da fé como convic-
ção pessoal era o elemento mais forte na práticado aconselhamento pastoral 
em Lutero e no protestantismo14. 
Conforme a famosa definição dos "Artigos de Esmalcalde", 
aconselhamento pastoral é para Lutero o "mutuum colloquium et consolatio 
fratrum"15. Na vida de cada dia na comunidade os irmãos conversam um com 
o outro sobre as suas dificuldades e confessam quando erraram ou transgredi-
ram os mandamentos. O irmão vai ouvi-los e consolá-los pela mensagem da 
absolvição, pela palavra de Deus e pela oração. A consolação como objetivo 
maior da poimênica estabelece de novo a identidade precária lembrando a 
pessoa da sua justificação por Deus. 
O problema da proposta de Lutero consiste no fato de que ele mesmo 
começou, sob a influência das experiências com os entusiastas, a substituir a 
concepção do aconselhamento livre dos irmãos na comunidade por um siste-
ma mais controlador e pastorcêntrico, quando introduziu de novo o exame de 
fé (exame do conhecimento dos mandamentos e do Catecismo Menor) pelo 
pastor como condição para a admissão à Santa Ceia. Na ortodoxia o poder 
poimênico das chaves que cabe ao pastor era acompanhado por meios de 
disciplina eclesiástica executada pela comunidade ou o governo estadual. A 
poimênica luterana aproximou-se assim da prática das igrejas calvinistas, 
que, desde as constituições eclesiásticas de Calvino e Bucer, colocaram o 
enfoque poimênico na "disciplina" da comunidade. Eles exigiram, a partir de 
Mt 18.15-18 e Mt 16.8s., a disciplina como admoestação individual que 
confronta os membros da comunidade com a solicitação concreta de viver 
conforme a graça concedida na palavra e nos sacramentos16. De fato a 
execução da disciplina eclesiástica tornou-se um sistema de controle moral e 
político dos cidadãos. 
 301 
13.2.6 - O desenvolvimento da poimênica no 
contexto da modernidade 
O pietismo desenvolveu, contra a rigidez desse sistema de controle 
eclesiástico, uma nova forma de aconselhamento que promoveu pela primeira 
vez a conversação livre em que uma pessoa podia colocar os seus problemas 
independentemente da situação de penitência17. O enfoque na fé pessoal, nas 
experiências de conversão e na santificação caracterizava o aconselhamento 
pastoral pietista. Instalaram-se pastores como capelães hospitalares cuja tarefa 
era exclusivamente a visitação e o acompanhamento dos doentes, porém o 
único objetivo dessa prática era a conversão dos pacientes independentemente 
da sua situação física, familiar e social18. No racionalismo, o aconselhamento 
rompeu com essa tradição, entendendo a conversação pastoral como diálogo 
entre amigos em que o pastor tinha a tarefa de animar as pessoas, procurar 
melhorá-las moralmente, consolá-las e fornecer ajuda concreta através de 
conhecimentos da medicina e psicologia19. A Igreja Metodista, fundada nesta 
época por John Wesley, desenvolveu uma prática de aconselhamento pastoral 
que integrava os elementos básicos do pietismo com a abertura iluminista 
para a razão e o engajamento social. 
Elementos da posição do pietismo e do racionalismo entraram nas 
concepções poimênicas do protestantismo alemão no séc. 19, as quais, depen-
dendo do enfoque teológico, tomavam um rumo mais pedagógico do 
aconselhamento como conversação que devia reintegrar os membros na 
comunidade e ajudá-los na vivência autônoma do cristianismo (Schleier-
macher), ou um rumo mais ortodoxo procurando consolação no sofrimento e 
soluções concretas para situações conflituosas através da "orthotomia", da 
aplicação de textos bíblicos que indicavam concretamente a palavra de Deus 
para a respectiva situação (Nitzsch). 
O surgimento da psicologia como ciência e da psicanálise no final do 
século passado agravou em nosso século o conflito latente entre concepções 
de caráter liberal e racional que buscam conhecimentos psicológicos, a 
auto-experiência do pastor e a proximidade com a empiria, e concepções 
17 Cf. Michael KLESSMANN, Krankenseelsorge, 672, 30ss., em que o autor destaca que especialmente no 
moravianismo do conde Zinzendorf o aconselhamento era a "expressão do amor libertador e 
participativo". 
18 ID., ibid., 672, 20ss. 
19 Ibid., 672, 37ss. 
 302 
que defendem a primazia da proclamação da Palavra e diminuem ou negam 
o valor da contribuição da psicoterapia. Enquanto, por um lado, Eduard 
Thurneysen, o representante da teologia dialética, insistiu que na conversa-
ção pastoral deve-se proclamar o evangelho do perdão dos pecados e fazer 
oração, limitando o papel da psicologia à função de uma ciência auxiliar, 
surgiu nos Estados Unidos, a partir da cooperação de pastores e médicos 
(A. Boisen e A. Bryan, R. Dicks e R. Cabot), nos anos 20 e 30 o movimento 
da "clínica pastoral", que visa o aconselhamento terapêutico e uma forma-
ção clínica de teólogos. Essa corrente uniu-se nos anos 60 na Europa com o 
movimento da psicologia pastoral que promoveu a recepção de conheci-
mentos psicológicos e psicoterápicos no aconselhamento e tem as suas 
origens especialmente no trabalho pioneiro do pastor e psicanalista Oskar 
Pfister, um amigo suíço de Sigmund Freud. Hoje em dia encontramos nos 
países norte-atlânticos um sistema elaborado de formação clínica e teórica 
para obreiros da Igreja em aconselhamento pastoral que começa a deixar 
marcas também na formação teológica em algumas igrejas evangélicas da 
América Latina. 
13.3 - Tipos de aconselhamento pastoral na 
América Latina 
A forma predominante de aconselhamento pastoral na América Latina 
ainda consiste no sistema de penitência e na poimênica sacramental (Santa 
Ceia, Unção dos Enfermos) da Igreja Católica, porém assumiu, especialmen-
te na convivência das comunidades eclesiais de base, formas e práticas mais 
comunitárias. Por causa da dependência histórica das igrejas evangélicas dos 
imigrantes europeus no Brasil da teologia produzida no exterior, encontramos 
nas comunidades até hoje as diferentes propostas mais ortodoxas ou liberais 
de aconselhamento, conforme a respectiva posição do pastor. Porém sempre 
existiram fortes tendências de religosidade popular e de práticas de 
aconselhamento e terapia integral, como a benzedura e rituais da religiosida-
de afro, que minavam o aconselhamento como instrumento do poder pastoral. 
Parece que a maioria das formas de aconselhamento oficial não atinge a 
dimensão da cultura popular. Surpreendentemente, na América Latina não se 
repetiu ou até se inverteu o conflito entre a psicologia pastoral e o 
aconselhamento centrado na Palavra. As alas mais evangelicais das igrejas 
promovem a psicologia pastoral e tentam conciliá-la com a crença 
fundamentalista, enquanto a teologia da libertação, durante muito tempo, 
manteve uma atitude crítica frente à psicologia, uma postura que, após a 
 303 
queda do socialismo, está mudando com a redescoberta da importância da 
experiência do indivíduo para a teologia da libertação20. 
Uma dificuldade com que nos deparamos na apresentação de tipos de 
aconselhamento pastoral na América Latina consiste no fato de que a maioria 
dos livros sobre o assunto são traduções de textos escritos no contexto norte-
americano que mostram apenas na superfície algumas semelhanças com o 
contexto latino-americano (organização congregacionalista das igrejas, sepa-
ração de Igreja e Estado, fortes movimentos fundamentalistas, problemas 
raciais, sociedade multicultural de imigrantes). Atualmente constatamos a 
importância de quatro modelos teóricos de aconselhamento pastoral na Amé-
rica Latina: a) o modelo fundamentalista, b) o modelo evangelical de psicolo-
gia pastoral, c) o modelo holístico de libertação e crescimento e d) o modelo 
contextual de uma poimênica da libertação. 
13.3.1 - O modelo fundamentalista 
O teólogo norte-americano Jay E. Adams promoveu, em livros internaci-
onalmente divulgados, a visão de um "aconselhamento noutético" que critica 
de maneira radical o uso de qualquer psicologia e chamao aconselhamento 
para voltar exclusivamente à Bíblia como único fundamento para conduzir a 
vida do cristão. O aconselhamento quer levar a pessoa à salvação através da 
morte do "velho homem" e da ressurreição para um novo modo de vida seguin-
do Jesus Cristo e agindo conforme as regras divinas de comportamento humano 
que são descritas na Bíblia. A Bíblia, que é verbalmente inspirada, revela em 
todas as suas partes a verdade de Deus e oferece ao ser humano pecador regras 
para conduzir a vida. Ela lhe mostra como a desobediência em relação a Deus 
cria todo o sofrimento e a doença nos seres humanos. Deus chama as pessoas 
para o arrependimento por causa do pecado e para uma mudança radical de 
comportamento. Para Adams também doenças psíquicas têm a sua raiz no pe-
cado concreto da pessoa. O seu método é a conversação que confronta a pessoa 
com o mal que ela faz (alcoolismo, medo, falta de fé), a responsabiliza pelos 
seus atos e busca uma nova orientação. O aconselhamento pastoral educa a 
pessoa por meios diretivos para que ela se aproxime do exemplo de Cristo. 
Segundo Adams, o sofrimento serve como meio de educação espiritual21. 
20 Cf. Lothar C. HOCH, Seelsorge und Befreiung, p. 135; ID., Aconselhamento pastoral e libertação. 
21 Cf. Jay ADAMS, Conselheiro capaz. 
 304 
Chama a atenção, neste modelo, a falta de qualquer reflexão sobre o 
contexto social, histórico e cultural do aconselhamento. Adams aplica as 
verdades transculturais e eternas da Bíblia que valem para cada pessoa. A 
mudança do comportamento do indivíduo tem prioridade absoluta; causas 
sociais de problemas parecem não ser importantes. Sem dúvida, esse tipo de 
aconselhamento pode ter sucesso especialmente entre toxicômanos (alcoolis-
tas e drogados) que mudam com mais facilidade se existe um sistema efetivo 
de controle social e um forte ideal-do-eu que possa substituir a droga. Porém 
concordamos com os críticos - alguns deles pertencem ao ambiente evangelical 
- que perguntam se a "Bíblia foi realmente escrita como um manual de 
aconselhamento"22 e mostram que a leitura bíblica de Adams está dominada 
por uma visão de obrigação e obediência que não valoriza suficientemente o 
aspecto da liberdade cristã e da graça divina23. 
13.3.2 - O modelo evangelical 
de psicologia pastoral 
Entre os autores evangelicais existe uma forte tendência de usar a 
psicologia para realizar um aconselhamento mais efetivo. O psicólogo Gary 
Collins justifica isto da seguinte forma: 
(...) toda verdade tem origem em Deus, inclusive a verdade sobre as pessoas por 
ele criadas. Deus revelou esta verdade através da Bíblia, a sua palavra escrita à 
humanidade, mas também permitiu-nos descobrir a verdade mediante a expe-
riência e os métodos de investigação científica. A verdade descoberta deve estar 
sempre de acordo e ser confrontada com o padrão da verdade bíblica revelada. 
Limitamos, no entanto, nossa eficácia no aconselhamento quando assumimos 
que as descobertas da psicologia nada têm a contribuir para a compreensão e 
solução dos problemas. Comprometemos nossa integridade quando rejeitamos 
abertamente a psicologia, mas a seguir, introduzimos clandestinamente os seus 
conceitos em nosso aconselhamento - algumas vezes ingenuamente e sem 
sequer perceber o que estamos fazendo.24 
Segundo Collins, o "alvo ulterior e abrangente" do aconselhamento é 
"a evangelização e o discipulado", que os indivíduos tenham "vida em 
22 Cf. Gary R. COLLINS, Aconselhamento cristão, p. 15. 
23 Cf. Donald CAPPS, Reframing: A New Method in Pastoral Care. 
24 Cf. Gary COLLINS, op. cit., p. 16. 
 305 
abundância" na terra e "a vida eterna prometida aos crentes"25. Ele visa 
autocompreensão, comunicação, aprendizado e modificação de comporta-
mento, auto-realização e apoio. Para os não-crentes é um tipo de "pré-
evangelização", para os que sofrem de prejuízos na vida é uma ajuda para 
reconhecer "atitudes prejudiciais inconscientes" e "os recursos íntimos para 
enfrentar uma crise"26. O aconselhamento pastoral está integrado na visão de 
uma "comunidade terapêutica" de obreiros e leigos engajados. Ela pode 
"oferecer apoio aos membros, cura aos indivíduos perturbados e orientação 
quando as pessoas tomam decisões e seguem em direção à maturidade"27. 
A psicologia pastoral de autores como Collins, León, Ellens e outros 
representantes do "Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos" tenta integrar 
a psicologia moderna e o cristianismo bíblico numa visão psicoteológica do 
ser humano que leva, por um lado, a uma prática psicologicamente bem 
refletida, porém, por outro lado, deixa fora a parte da crítica psicológica da 
religião, leva a uma psicologização da fé e a uma teologização da psicologia 
que não deixa de ser problemática. A psicologia pastoral de Jorge A. León, 
um dos modelos mais desenvolvidos deste tipo de reflexão, baseia-se numa 
"perspectiva psicoteológica" do ser humano como um "prisma trilateral", um 
ser "psico-neumo-somático" em que a dimensão espiritual predomina. A 
psicologia pastoral aborda cada dimensão sob as perspectivas psicológicas e 
teológicas com o "objetivo de ajudar o ser humano a ser mais humano e 
melhor cristão"28. A cada dimensão correspondem determinados tipos de 
psicoterapia: ao espiritual a logoterapia de V. Frankl, que parte das idéias da 
busca inconsciente de Deus e da "neurose noógena", ao psíquico a psicanáli-
se de S. Freud e J. Lacan, ao corporal as terapias reichianas, gestáltica e o 
psicodrama. O esforço enorme de León de respeitar os limites entre as 
perspectivas psicqlógicas e teológicas não o preserva de curtos-circuitos 
argumentativos. Tentando, numa postura apologética, identificar as "verda-
des" da psicologia também na teologia e da teologia também na psicologia, 
afirma, p. ex., que "antes de Jaques Lacan se referir às estruturas do psiquismo, 
nosso Senhor Jesus Cristo já nos havia apresentado, na parábola do semeador, 
uma tipologia de, pelo menos, quatro maneiras do ser humano se expres-
sar"29. Subordina a psicologia quando nega que ela possa possibilitar um 
25 ID., ibid., p. 19. 
25 Ibid. 
27 Ibid., p. 14. 
28 Jorge A. LEÓN, Introdução à psicologia pastoral, p. 18. 
29 ID., ibid., p. 14. 
 306 
crescimento integral que leve o indivíduo a ser pessoa no sentido pleno, pois 
o indivíduo colocado "sob Jesus Cristo" se torna pessoa como se a integralidade 
da pessoa esteja reservada exclusivamente aos cristãos30. Apesar da orienta-
ção comunitária e do forte engajamento na questão da família, o modelo não 
fornece instrumentos para um trabalho que inclua o contexto social e político 
de pobreza e marginalização. 
13.3.3 - O modelo holístico de libertação e 
crescimento 
A palavra-chave para a poimênica e o aconselhamento pastoral de 
Howard Clinebell é "integralidade centrada no Espírito"31. O modelo de 
Clinebell parte de uma visão holística do ser humano a qual baseia-se na 
antropologia bíblica que descreve o ser humano como imagem de Deus, 
criado à sua semelhança como pessoa na integralidade de corpo, mente e 
espírito e em relação com os outros, a comunidade. A libertação das pessoas 
para terem vida em abundância (Jo 10.10) era o alvo da vinda de Jesus32. Por 
conseqüência, é "o alvo da vida cristã" desenvolver a personalidade com 
todas as suas possibilidades num processo de crescimento33. 
Clinebell define poimênica como "o ministério amplo e inclusivo de 
cura e crescimento mútuo dentro de uma congregação e de sua comunidade". 
Aconselhamento pastoral, como "uma dimensão da poimênica, é a utilização 
de uma variedade de métodos de cura (terapêuticos) para ajudar as pessoas a 
lidar com seus problemas e crises de uma forma mais conducente ao cresci-
mento"34. Clinebell diferencia seis dimensões da integralidade humana e 
deriva das mesmas seis dimensões da poimênica e do aconselhamento pasto-
ral. Elas servem para avivar a mente, revitalizaro corpo, renovar e enriquecer 
os relacionamentos íntimos de uma pessoa, "aprofundar a sua relação com a 
natureza e a biosfera, crescer em relação às instituições significativas em sua 
vida, aprofundar e vitalizar seu relacionamento com Deus"35 nas mais diversas 
situações durante o ciclo da vida. O aconselhamento faz uso de métodos e 
 
3
0 
Ibid., p. 35. 
 
3
 
Howard CLINEBELL, Aconselhamento pastoral, p. 25. 
 
3
 
ID., ibid., p. 48. 
 
3
 
Ibid. 
 
3
4 
Ibid., p. 25. 
 
3
 
Ibid., p. 29. 
 
 
 307 
técnicas de uma variedade de terapias de crescimento humano36. O ministério 
poimênico cabe à "congregação inteira", que assume a função de uma rede de 
apoio. Os pastores têm a tarefa de "inspirar e supervisionar as pessoas leigas 
no ministério de poimênica"37. 
O modelo de Clinebell abriu-se para impulsos da psicologia humanística, 
porém tenta fundamentá-los biblicamente. Uma visão aberta para o pluralismo 
religioso nas sociedades modernas, a ênfase no aspecto comunitário, a sensi-
bilidade para os problemas causados pelo sexismo e a injustiça social nas 
sociedades do norte e na relação norte-sul do planeta aproximam esta concep-
ção das necessidades da realidade latino-americana38. Por conseqüência, a 
ênfase é colocada na "poimênica de grupos e instituições" e num trabalho de 
conscientização sobre as raízes sociais do sofrimento dos indivíduos39 que 
busca especialmente a valorização das experiências de mulheres e a integração 
espiritual dos dois sexos. Porém o otimismo da perspectiva da integralidade 
holística desperta certo mal-estar. Será que o pecado é apenas uma "resistên-
cia" quantitativa ao processo universal de crescimento, como Clinebell afir-
ma? Apesar do reconhecimento da limitação e finitude do crescimento, 
permanece a tendência de contar com um desenvolvimento constante do 
reino de Deus, entendido como "nova era de integralidade" (Mt 6.IO)40. 
Parece que a confiança no progresso constante, típica do "American way of 
life", assumiu um papel forte na interpretação do cristianismo e da poimênica 
neste modelo. A pergunta central em relação a qualquer concepção holística é 
se ela realmente leva a sério que a vida é sempre um fragmento, que não é a 
plenitude da presença de Deus, mas a experiência da ausência de sentido 
frente à morte, ao sofrimento e à injustiça, a experiência da carência de ser 
que domina o ser humano e faz com que ele, como ser falante, esteja sempre a 
caminho, em busca de sentido e de um futuro diferente41. 
36 Ibid., p. 36. 
37 Ibid., p. 33. 
38 "O ponto fraco de boa parte da poimênica tem sido seu hiperindividualismo. A poimênica e o aconse- 
lhamento pastoral privatizados (juntamente com uma religião privatizada em geral) ignoram as formas 
penetrantes pelas quais racismo, sexismo, preconceito de idade, classismo, preconceito de espécie, 
nacionalismo, militarismo, exploração econômica e opressão política mutilam a integralidade humana 
em escala maciça em todas as sociedades." (Ibid., p. 31.) 
39 Ibid. 
40 Ibid., p. 58. 
41 Cf. Henning LUTHER, Leben ais Fragment. 
 308 
13.3.4 - O modelo contextual de uma poimênica 
da libertação 
Ainda não existem pesquisas sobre o processo de aconselhamento 
mútuo em comunidades eclesiais de base e em movimentos populares. À 
primeira vista destaca-se o caráter ecumênico de um trabalho solidário de 
leigos que são atingidos por determinado problema (barragens, sem terra, 
sem teto, pacientes com AIDS...)- O aconselhamento tem um caráter de apoio 
solidário na luta popular e acontece dentro do contexto específico de grupos e 
encontros. Ele é exercido pelos próprios atingidos ou por representantes 
especializados que trabalham com o objetivo de capacitar as vítimas de 
problemas e injustiças sociais para defender os seus interesses vitais. 
A reflexão ainda rudimentar sobre uma poimênica da libertação, repre-
sentada especialmente pelo teólogo luterano Lothar Carlos Hoch, parte da 
dimensão da encarnação, que leva o/a aconselhador/a a fazer uma opção 
pelos pobres e expor-se ao sofrimento do povo42. Esse deslocamento para o 
lugar do pobre submete o aconselhador à experiência de sua impotência para 
mudar a situação e à crítica de qualquer atitude paternalista de assistência 
pastoral e ensino. A transformação da situação dos pobres exige entrar no 
caminho da convivência solidária no contexto da vida das pessoas conforme 
o exemplo de Jesus. 
Compartilhando o sofrimento, a poimênica deve mudar a sua com-
preensão de pecado e passar de uma compreensão individualista de pecado, 
que leva o povo pobre a desvalorizar-se ainda mais, para uma compreensão e 
denúncia profética do pecado estrutural. A poimênica precisa capacitar as 
pessoas para descobrir o pecado estrutural da sociedade injusta na sua vida 
individual, familiar e social e ajudá-las a questionar a sua situação e tornar-se 
ativas na luta pela libertação43. O critério decisivo para a poimênica é a sua 
contribuição para a conscientização política e o progresso nesta luta44. Inte-
grada na prática libertadora, a poimênica torna-se tarefa de todos e todas e 
serve para que as pessoas e os grupos populares achem a sua identidade e 
cresçam em conjunto. Metodologicamente o aconselhamento em grupos tem 
a mesma importância que o aconselhamento individual, o qual, por sua vez, 
mantém sempre uma perspectiva grupai. O aconselhamento parte do sofri- 
______ 
 
42 Cf. Lothar C. HOCH, Aconselhamento pastoral e libertação; ID., Seelsorge und Befreiung, p. 138. 
43 ID., ibid., p. 139s. 
44 Ibid., p. 140. 
 309 
mento atual das pessoas. Os seus instrumentos, ouvir e falar, servem para dar 
uma voz ao sofrimento, para articular o protesto e partir para a ação45. A 
psicologia, cuja importância para a teologia da libertação Hoch defende46, 
integra-se nesta tarefa. No trabalho da poimênica da libertação ela transfor-
ma-se numa psicologia pastoral contextualizada. 
Para as igrejas históricas surge a dificuldade de integrar o modelo 
contextual com as necessidades dos membros de classe média e a estrutura 
das comunidades tradicionais. Futuramente será importante para o trabalho 
de aconselhamento pastoral superar as barreiras das classes sociais e criar 
mais comunicação e cooperação entre os integrantes dessas classes. A reali-
dade da variedade de estilos de viver a fé dentro da Igreja exige também uma 
maior cooperação entre os diferentes modelos de poimênica e aconselhamento 
pastoral. Parece ser óbvio que a psicologia pastoral evangelical e os modelos 
de poimênica integral e contextual têm muito em comum, especialmente a 
orientação comunitária que valoriza o trabalho dos leigos, aspectos de uma 
antropologia integral, o diálogo com a psicologia e psicoterapia, a visão 
libertadora, colocando a ênfase na cooperação de aconselhamento pastoral e 
diaconia. 
 
 
 
45 Ibid., p. 142. 
46 Cf. Lothar C. HOCH, Psicologia a serviço da libertação.

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