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O Imaginário Ibérico nas Grandes Navegações

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Aula 1: O Imaginário Ibérico à Época das Grandes Navegações 
Objetivos:
Estudar a expansão marítima europeia nos séculos XV e XVI; 
Analisar os interesses comerciais que motivaram as metrópoles a saírem em busca de novas terras; 
Refletir sobre a mentalidade e o imaginário como aspectos relevantes para entender as razões que levaram os europeus a abandonarem seus lares para enfrentar os perigos do Atlântico, conhecido como "Mar Tenebroso"; 
Perceber como entender e discutir a questão do "outro", a alteridade, e como isso é importante para compreendermos tanto a dominação do colonizador quanto a resistência dos colonizados.
Durante muito tempo os historiadores brasileiros utilizaram a palavra descobrimento para explicar a chegada dos europeus às Américas. Entretanto, a partir do ano 2000, durante as comemorações dos 500 anos dessa chegada, o termo entrou em discussão. A grande questão que se apresentava era conceitual, ou seja, descobre-se algo que estava escondido ou algo que ninguém sabia da existência. 
Ora, o continente americano nunca esteve escondido e, sem entrar agora na discussão que desde a antiguidade existiam mapas que descreviam as Américas, pois trataremos desse assunto mais tarde, havia ali habitantes que o conheciam.
Se usarmos a lógica de que os europeus não conheciam as Américas e por isso a descobriram, teremos que levar em consideração que os americanos também não conheciam a Europa e nem por isso ao saberem de sua existência declararam que a descobriram.
O que percebemos é que a adoção dessa palavra no século XVI estava carregada de um sentimento de superioridade. Os europeus consideravam suas maneiras de agir e de pensar superiores às dos povos que habitavam as Américas. Será por que desde o primeiro momento fica claro que, no caso do Brasil, os índios não fundiam metais, não viviam em cidades e andavam nus?
A Carta. Pero Vaz de Caminha
“A feição deles é serem pardos, um tanto avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Nem fazem mais caso de encobrir ou deixa de encobrir suas vergonhas do que de mostrar a cara. Acerca disso são de grande inocência. (...) E o Capitão mandou aquele degredado Afonso Ribeiro e a outros dois degredados que fossem meter-se entre eles; e assim mesmo a Diogo Dias, por ser
homem alegre, com que eles folgavam. E aos degredados ordenou que ficassem lá esta noite. Foram-se lá todos; e andaram entre eles. E segundo depois diziam, foram bem uma légua e meia a uma povoação, em que haveria nove ou dez casas, as quais diziam que eram tão compridas, cada uma, como esta nau capitania. E eram de madeira, e das
ilhargas de tábuas, e cobertas de palha, de razoável altura; e todas de um só espaço, sem repartição alguma, tinham de dentro muitos esteios; e de esteio a esteio uma rede atada com cabos em cada esteio, altas, em que dormiam. E de baixo, para se aquentarem, faziam seus fogos. E tinha cada casa duas portas pequenas, uma numa extremidade, e outra na oposta. E diziam que em cada casa se recolhiam trinta ou quarenta pessoas, e que assim os encontraram; e que lhes deram de comer dos
alimentos que tinham, a saber muito inhame, e outras sementes que na terra dá, que eles comem. (...)Terça-feira, depois de comer, fomos em terra, fazer lenha, e para lavar roupa. Estavam na praia, quando chegamos, uns sessenta ou setenta, sem arcos e sem nada. Tanto que chegamos, vieram logo para nós, sem se esquivarem. E depois acudiram muitos, que seriam bem duzentos, todos sem arcos. E misturaram-se todos tanto conosco que uns nos ajudavam a acarretar lenha e metê-las nos batéis. E lutavam com os nossos, e tomavam com prazer. E enquanto fazíamos a lenha, construíam dois carpinteiros uma grande cruz de um pau que se ontem para isso cortara. Muitos deles vinham ali estar com os carpinteiros. E creio que o faziam mais para verem a ferramenta de ferro com que a faziam do que para verem a cruz, porque eles não tem coisa que de ferro seja, e cortam sua madeira e paus com pedras feitas como cunhas, metidas em um pau entre duas talas, mui bem atadas e por tal maneira que andam fortes, porque lhas viram lá. (...) Até agora não pudemos saber se há ouro ou prata nela, ou outra coisa de metal, ou ferro; nem lha vimos.” (A Carta. Pero Vaz de Caminha).”
Astecas e maias moravam em cidades, fundiam metais e vestiam roupas, mas nem por isso foi estabelecida uma relação de igualdade entre eles e os europeus. O cerne da questão está no que chamamos de eurocentrismo. Os europeus acreditavam que todas os povos que não partilhassem dos seus hábitos, costumes, religião e formas de agir e de pensar eram inferiores. Essa postura justificava a imposição da sua cultura a essas sociedades mesmo que para isso precisassem submetê-los, escravizá-los e até mesmo dizimá-los.
Outra argumentação contrária ao uso da palavra descobrimento é a de que nas terras nas quais Cabral aportou (hoje o Brasil) ainda eram desconhecidas. O País, como nós o conhecemos hoje, é uma construção histórica. Entretanto, se analisarmos mais profundamente esse argumento, perceberemos que todo e qualquer país, inclusive as nações europeias, é uma construção histórica. As sociedades são dinâmicas e estão em constante processo de mudança.
Refletir sobre as transformações culturais, sociais, econômicas e políticas dos países nada mais é do que estudar e compreender suas histórias, portanto, se o Brasil é o resultado: 
“do trabalho, do esforço, da dor, da alegria; das festas, das comidas, das danças; do português falado com diferentes acentos e cantado na bossa nova, no samba, no axé; do feijão-com-arroz, do vatapá, do tucupi, da carne-de-sol, do acarajé, do tacacá e do churrasco; do branco, do negro, do índio; mais ainda, do mestiço, do cafuso, do cariboca, do mameluco, do mulato, do pardo e do retinto; do romance regional, da poesia concreta e do cordel; das cidades futuristas planejadas, do barroco e do utilitário; das praias ensolaradas, das serras com geadas e da garoa enfumaçada...” SILVA, Francisco Carlos Teixeira da, “Conquista e Colonização da América Portuguesa”. In: LINHARES, Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. 9ª Edição. Rio de Janeiro: Campus/Elsevier, 1990. (p. 33)
E poderíamos acrescentar, das alterações sociopolíticas, econômicas e sociais, ou seja, de um conjunto de ações de agentes que produziram fatos históricos únicos, teremos que concluir que também Portugal, França, Inglaterra, China, Rússia, Estados Unidos, Colômbia, etc. são produtos de seus próprios processos históricos.
Foi também durante as celebrações dos 500 anos do Brasil que outra expressão, achamento, utilizada principalmente por historiadores portugueses do século XX, se apresentou como possibilidade de problematizar ainda mais o assunto. Acontece que descobrimento e achamento são sinônimos, logo a explicação dada para desqualificar uma delas serve para cumprir com o mesmo propósito para a outra. 
Francisco Carlos recorre ao historiador espanhol Sanchez de la Cuesta para incrementar um pouco mais nossa discussão, o conceito incluído agora no debate é encontro. Segundo Alvarez teria havido em 1500 um contato entre povos, culturas e civilizações diferentes. (Fonte: Idem, p. 34-35).
Para analisarmos os prós e os contras da substituição de descobrimento/achamento por encontro/contato. Proponho uma comparação desses dois últimos conceitos com outro, o de invasão, defendido por uma linha historiográfica mais próxima à Antropologia. Manuela Carneiro da Cunha reúne dados de vários autores para chegar a uma estimativa das densidades demográficas da Península Ibérica e da América em 1492.
Embora a autora ressalte a discrepância nas informações do número de habitantes nos três continentes – Europa, América e Ásia – o número de habitantes americanos seria superior ao de europeus e conclui que o continente europeu:
“...teria logrado a triste façanha de com um punhado de colonos, despovoar um continente muito mais habitado. (...) Se a população aborígene [indígena] tinha, realmente, a densidadeque hoje se lhe atribui, esvai-se a imagem tradicional (aparentemente consolidada no século XIX), de um continente pouco habitado a ser ocupado pelos europeus. Como foi dito por Jennings (1975), a América não foi descoberta, foi invadida.” CUNHA, Manuela Carneiro da, “Introdução a uma História Indígena”. In: _______, História dos Índios no Brasil. 2ª Edição. 1ª Reimpressão. Rio de Janeiro: Cia das Letras/Secretaria Municipal de Cultura/FAPESP, 1992. (p. 14)
O que se percebe ao cotejar as duas correntes historiográficas é que a primeira trata a colonização como algo natural e mesmo que não pretenda “fazer um elogio aos feitos portugueses”, realmente não o faz, tira toda a importância das resistências, dos conflitos entre europeus e indígenas ao reduzir o choque cultural vivenciado por ambas as sociedades e os embates que daí surgiram a um mero encontro, um contato. Isso permite interpretar que não houve relações de dominação e poder entre colonizadores e colonizados.
Além disso, um encontro/contato é algo não intencional e, como veremos a seguir, existem suspeitas de que a esquadra de Cabral desviou-se propositalmente da costa africana para confirmar a existência de terras a oeste das quais se tinham suspeitas e se havia ali riquezas que pudessem ser exploradas.
Suspeitas de que a esquadra de Cabral desviou-se propositalmente da costa africana. “Os nautas portugueses não ignoravam totalmente a existência de terras nos mares ocidentais. A descoberta dos Açores pelas caravelas henriquinas, e, sobretudo as concessões de numerosas ilhas atlânticas são sinais evidentes de que uma pluralidade de estímulos aconselhava a navegar em mar largo para oeste. (...) Os descobrimentos portugueses de terras ocidentais atribuídas ao segundo quartel do século XV acham-se, todavia, envoltos em mistério. Dir-seia que figuram no romance geográfico. Se, na verdade, foram realizados ficariam circunscritos ao norte do equador, na costa setentrional da América do Sul ou no Mar das Antilhas. (...) Não obstante, os empreendimentos atlânticos realizados no decurso do século XV são demonstrativos dos indícios do conhecimento português pré-colombino. (...) Já Gago Coutinho, em 1943, numa conferência no Liceu Literário Português, no Rio de Janeiro, concluiu que, durante uma prévia exploração do quadrante sudoeste do Atlântico, em data anterior a 1497, fora encontrada a costa brasileira (...) Sabe-se, com efeito, que em 1497 Vasco da Gama, embora navegasse com naus, não escalou na Mina. Preferiu traçar uma reta em arco, passando mais [de] duzentas léguas a oeste e atravessando o Atlântico Sul durante três meses sem ver terra.”1 1 DIAS, Manuel Nunes, “Expansão Européia e Descobrimento do Brasil”. In: MOTA, Carlos Guilherme (org.) Brasil em Perspectiva. 8ª Edição. Rio de Janeiro: Difel, 1977. (p. 20-21,31).
Aliada a essa abordagem da questão é preciso compreender a importância da chegada de Colombo à América, em 1492, e do Tratado de Tordesilhas, em 1493, claros indícios da existência de terras à oeste. Continuemos a reflexão lembrando que durante a Idade Média várias informações e mapas representando outros continentes estiveram guardadas em mosteiros católicos e eram estudados por membros do alto clero da Igreja.
Continuemos a reflexão lembrando que durante a Idade Média várias informações e mapas representando outros continentes estiveram guardadas em mosteiros católicos e eram estudados por membros do alto clero da Igreja. Isso não significa dizer que esse conhecimento estava disponível e ao alcance de todos. É bom ressaltar o caso de Nicolau Copérnico para compreendermos que a Igreja Católica puniu exemplarmente todos aqueles que ousaram desafiá-la, usando a ciência, a filosofia e a razão para contradizê-la.
Também os chineses empreenderam expedições exploratórias no século XIII e contavam com uma cartografia bastante precisa na qual observamos a existência de um mapa no qual estão representados os continentes africano, americano e australiano, assim como a forma circular da Terra está representada.
Terminada a discussão sobre qual termo melhor descreveria a chegada dos europeus à América e, particularmente, dos portugueses ao Brasil, tenho certeza que uma pergunta ficou no ar… Descobrimento, Achamento ou Encontro: qual deles é o correto?
Minha opção é pelo conceito de invasão, mas ao deixar claro que essa foi uma escolha pessoal, já adianto que não há certo ou errado nesse caso, as linhas historiográficas são múltiplas e aconselho a você a filar-se à discussão que lhe parecer mais adequada.
Vamos mudar de assunto. Falemos agora sobre as razões que motivaram os europeus a enfrentarem seus medos e todo um imaginário que descrevia um oceano, o Mar Tenebroso, e as terras para além dele repleto de monstros e figuras assustadoras. Espera aí... se estudamos que havia um conhecimento prévio do Atlântico e dos outros continentes, como justificar a existência de tantos mitos ao mesmo tempo deslumbrantes e apavorantes?
Lembre-se de que as informações estavam fora do alcance da maior parte das pessoas e mesmo muitos daqueles astrônomos, físicos, matemáticos e/ou filósofos que tentaram formular novas teorias a partir do estudo desse material foram duramente punidos.
Podemos citar como exemplos o caso de Giordano Bruno e Galileu Galilei, ambos defensores da tese de Copérnico sobre o heliocentrismo. 
Giordano Bruno era adepto do humanismo e defendeu a teoria de que o Universo era infinito em sua obra De l’Infinito Universo i Mondi. Em 1576, foi levado à Roma para ser julgado sob a acusação de heresia, abandonou a batina e acabou sendo excomungado e queimado vivo pela Santa Inquisição, em 1600.
A punição de Galileu foi mais branda: em 1616, o Tribunal do Santo Ofício (Inquisição) declarou que a afirmação de que a Terra gira em torno do Sol, transformando este no centro do Universo, era uma heresia. As consequências dessa acusação foram a inclusão do livro escrito por Copérnico, De revolutionibus orbium coelestium no Index Librorum Prohibitorum (Índice dos Livros Proibidos) e uma série de interrogatórios e proibições sobre a divulgação das teorias de ambos.
Houve muitos recuos e avanços, as proibições eram impostas e retiradas, Galileu foi inclusive apoiado pelo Papa Urbano VII e, finalmente, em 1633, foi declarado suspeito de heresia por ter publicado um ano antes o livro Diálogo dos Grandes Sistemas, contrariando as advertências que lhe tinham sido dadas.
Surge então uma nova dúvida: se o medo era um sentimento enraizado em todo o medievo e ainda estava presente na passagem para a Idade Moderna, por que se lançar nessa aventura? Explicaremos essa pergunta refletindo sobre a tentação e, por que não dizer curiosidade, que os deixavam aterrorizados mas também ávidos pelo desconhecido, pelo fantástico, pela possibilidade de alcançar riquezas infindas.
Vamos tentar imaginar como seria…
...a vida de alguém que nunca deixou o feudo ou o burgo em que nasceu, no máximo conhecia seus arredores;
...se acrescentássemos o fato de não haver luz elétrica e que durante a noite, até se chegar razoavelmente perto de pessoas e de objetos, só se vislumbrava vultos;
...se adicionássemos noções de pecado e de bruxaria que incluíam desde a obtenção de juros até o a manipulação de certas ervas medicinais;
...se juntássemos uma pitada de culpa, elemento essencial das religiões judaico-cristãs.
Esta é a “receita” para se compreender o imaginário do medievo e de boa parte da modernidade. Percebemos que o medo do desconhecido estava ligado exclusivamente às explorações. Ele era parte daquela sociedade.
Continuando nossa análise da mentalidade do período, foquemos agora em dois personagens, Marco Polo e Preste João, que povoaram esse imaginários com descrições de reinos maravilhosos, embora assustadores.
Marco Polo e Preste João 
Preste João é um rei cristão, um personagem mitológico de 562 que se mantinha jovem banhando-se na fonte da juventude. “A lenda do Preste João foi divulgada na Europa no tempo da 1ª. cruzada, em finais do séc. XI. Anecessidade de aliados favoreceu a crença, entre os cruzados, de que iriam receber o auxílio de um poderosíssimo soberano, vindo da Ásia, e que atacaria o Islão pelas costas. Ora começara então a circular uma mensagem dirigida ao imperador Manuel Coménio, de Bizâncio, que alimentava tal esperança. Era uma carta enviada por alguém cuja grandeza assumia duas dimensões: uma sagrada, relacionada com o divino, a outra secular, em conjugação com o mais alto poder na terra - o Preste João era um rei - sacerdote cristão, um misterioso soberano, suserano de muitas dezenas de vassalos. Tão misterioso, que o seu reino se situara sucessivamente na Mesopotâmia, na China, nas Índias, na Arábia, na África Ocidental e, finalmente, na Etiópia. Nesses tempos, os conhecimentos geográficos eram ainda muito deficientes. (...) De esta célebre Carta foi conhecida uma versão em latim, a que se atribui a data de 1165, aproximadamente; e que foi traduzida para francês, em verso, por um clérigo que assinou Roau d’Arundel. Trata-se de um texto feérico, fantástico e maravilhoso, em que abundam as mais apetecíveis riquezas e os mais variados monstros. Terra de amazonas e centauros, homens anfíbeos, homens com cabeça de cão, liliputianos e gigantes, unicórnios e aves sanguíneas, leões vermelhos e verdes, enfim, tudo o que uma imaginação fértil pode criar. A que se juntam águas de fontes miraculosas; rios que nascem no Paraíso Terreal; pedras preciosas valiosíssimas e em abundância, no fundo dos rios; palácios maravilhosos, milhares de cavaleiros, comida para toda a gente, bem-estar e felicidade. Fantástico e maravilhoso, hipérbólico e exótico, numa deliciosa amálgama. Numa tentativa de regresso a um mundo paradisíaco. (...) Desta Carta, são conhecidas uma centena de versões manuscritas, em diversas línguas, cada uma aí intercalando o que lhe parecia mais conveniente. Por isso, no reino do Preste João, além de ouro e pedras preciosas, há a famigerada pimenta, fonte de um comércio enriquecedor. À procura da pimenta se arriscava a vida por mares tenebrosos. A terra do Preste João não podia ser só luxo, mas também ocasião de bons negócios. Se é certo que os cruzados respondem ao descalabro das suas investidas com um sopro de profetismo, também é certo que os seus senhores não descuram os interesses materiais.” 
Embora não haja dados exatos sobre a data e o local de nascimento de Marco Polo, especula-se que tenha sido em Veneza, na metade do século XIII . O fato de ter sido ele o primeiro ocidental a percorrer a Rota da Seda, do detalhamento encontrado em seus relatos, em uma época na qual o número de fontes desse tipo era bastante reduzido, tornaram os registros de suas viagens, durante muito tempo, referência para quem desejasse conhecer um pouco mais o Oriente, principalmente a China. Em As Viagens de Marco Polo, o leitor é conduzido a um mundo cheio de aventuras, belezas e tesouros. (VILHENA, Maria da Conceição, O Preste João: mito, literatura e história. In: ARQUIPÉLAGO • HISTÓRIA, 2ª série, V (2001). (p. 627-628). Disponível em: http://repositorio.uac.pt/bitstream/10400.3/357/1/Maria_Vilhena_p627-649.pdf)
São essas aventuras cheias de perigo e de maravilhosas recompensas que deslumbraram e empurraram os europeus para as Grandes Navegações.
O Pioneirismo Português
O século XIV foi marcado por uma diminuição do comércio explicada, em parte, pela diminuição demográfica causada pela Peste Negra e por falta de alimentos. No século seguinte houve uma retomada do crescimento que esbarrava em alguns impedimentos: a interrupção do fluxo do comércio realizado através do Mar Mediterrâneo e a necessidade cada vez maior de obter metais, principalmente a prata, para cunhar moedas.
A solução encontrada foi a criação de novas rotas, marítimas e terrestres, que interligassem a Ásia e o norte da África, local onde as caravanas chegavam abarrotadas de mercadorias e ouro em pó, à Europa ocidental. Portugal, embora parte da Europa, tem em sua história especificidades que lhe possibilitaram ser o primeiro a buscar uma rota atlântica.
O Pioneirismo Português
O processo de constituição da unificação nacional portuguesa foi a primeira da Europa e teve início com a expulsão dos mouros de seu território, ainda no século XII, é implantada a primeira dinastia portuguesa, a de Borgonha. Se por um lado esse processo permitiu a centralização do estado português, por outro lado ele esteve sempre ameaçado der se incorporado ao reino de Leão ou ao de Castela pois, dos três reinos, Portugal era o que tinha menor poder bélico, havia também a possibilidade de uma aliança entre ambos contra Portugal. Sempre é bom lembrar que nesse período a riqueza de um reino era medida por sua extensão territorial logo, estando os três reinos localizados em uma península, a possibilidade de expansão geográfica mais provável era a anexação do vizinho. Contra essa possibilidade agiu primeiro Portugal adotando uma política de alianças através de casamentos reais com Castela.
O que seria a solução acabou tornando-se um problema. Em 1383, Dom Fernando I, rei português, morreu sem deixar filho varão, ora a linha de sucessão natural seria sua filha Beatriz, casada com o rei de Castela, Dom João I. A incorporação portuguesa a este reino era o próximo passo se Dom Fernando não tivesse um irmão bastardo, Dom João, mestre da Ordem de Avis. Castela declarou guerra à Portugal e a sociedade portuguesa se dividiu, parte apoiava Dom João I e, consequentemente a anexação e parte, justamente temerosa que ela acontecesse, defendia a coroação do mestre de Avis. Essa guerra, conhecida como Revolução de Avis, durou cerca de dois anos e ao seu término dom João foi coroado rei, iniciando-se assim a dinastia de Avis. Entretanto, a nova dinastia surge atolada em problemas financeiro e precisando garantir terras e títulos para aqueles nobres que uniram em favor de Dom João e se “reconciliar” com a parcela de sua nobreza que lutou a favor de Castela. A busca por novas rotas comerciais e terras era imperiosa para tirar Portugal da crise.
O norte da África, mais especificamente Ceuta, foi a opção portuguesa, como dissemos acima, a região concentrava um comércio que possibilitaria à acesso a ouro, a especiarias, a tecidos, a grãos etc., além de atender os anseios de sua nobreza. Embora a tomada de Ceuta em 1415, não tenha surtido o efeito desejado, os locais abandonaram a região e os mercadores alteraram as rotas das caravanas, Portugal enfrentou permaneceu naquela praça e resolveu ampliar a conquista empreendendo o Périplo Africano (contorno do continente africano) com objetivo de estabelecer um novo caminho para as Índias. O ponto principal que precisamos compreender é que espremido entre os reinos de Castela e Aragão de um lado e pelo oceano Atlântico de outro, não restava a Portugal senão se aventurar no Mar Oceano. E deu certo, a conquistadas ilhas atlânticas – Açores, Madeira, Canárias –, o estabelecimento de feitorias na costa da África e a conclusão da rota para as Índias, possibilitaram um afluxo de mercadorias, ouro, prata, marfim, escravos etc.
Abordemos agora outro aspecto dessa expansão, o Tratado de Tordesilhas. Certamente vocês já ouviram alguém afirmar que Portugal ficou em desvantagem afinal, a Espanha ficou com a maior parte do território. E se disséssemos que os portugueses queriam mesmo era a água? Seu interesse era assegurar a exclusividade de navegação no Atlântico Sul, garantir sua rota significava obter o monopólio de todo o comércio feito nas Índias.
“Consolidava-se, dessa forma, a divisão do mundo prevista no Tratado de Tordesilhas em 1494. Para Portugal, Tordesilhas representou, no esquema geral da construção do império, um grande êxito e possibilitou a implantação da política de mare clausum – o fechamento dos mares aos navios de nações concorrentes. Essa política se justificava pelos altos custos, e riscos, do empreendimento marítimo. A conquista da África e a abertura do caminho para as Índias só seriam possíveis se os esforços fossem altamente remunerados.Para isso era necessário manter o controle sobre o preço, bem como sobre o volume, dos produtos orientais
– as famosas especiarias. Cabia assim, impedir qualquer concorrência
estrangeira, impondo o exclusivo colonial, ou seja, o monopólio sobre o comércio das novas áreas descobertas.”[2: 	SILVA, Francisco Carlos Teixeira da, “Conquista e Colonização da América Portuguesa”. In: LINHARES,Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. 8ª Edição. Rio de Janeiro: Campus/Elsevier, 1990. (p. 27).]
O Pioneirismo Português na Historiografia
Sempre que possível apresentaremos uma (ou mais) visão historiográfica sobre o assunto tratado na aula. Assim, encerramos esta com a análise de Sérgio Buarque de Holanda sobre as razões do sucesso do empreendimento português.
Segundo Buarque de Holanda, os portugueses eram dotados de um “espírito aventureiro” essencial para empreender essa busca pelos caminho das Índias. O autor ressalta a ausência de feudalismo em Portugal como uma das características fundamentais para compreendermos a ousadia portuguesa.
Para ele, a falta de uma hierarquia mais rígida, em uma sociedade na qual a burguesia nascente, ao invés de se insurgir contra a nobreza, adotou seus valores, suas maneiras de agir e de pensar, logo, não houve rupturas traumáticas entre ambas, mas uma cooptação da primeira pela segunda.
Estariam nessa confluência de interesses e seriam responsáveis pelas alianças que culminaram na Revolução de Avis – fator que possibilitou e impulsionou e impulsionou Portugal a obter a primazia na exploração do continente Africano.
Buarque de Holanda também destaca a vontade de enriquecer sem realizar muito esforço, uma ausência de “ética protestante” na Península Ibérica teria resultado em um desapreço pelos trabalhos físico e manual. Enriquecer sem trabalhar, esta seria a máxima que motivava os portugueses a desafiar o Mar Tenebroso. (HOLANDA, Sérgio Buarque de, Raízes do Brasil. 26ª Edição. 10ª Reimpressão. São Paulo: Cia das Letras, 1995)
Você deverá acessar o site abaixo para realizar as atividades:
 <http://fabiopestanaramos.blogspot.com/2010/11/o-imaginario-popular-na-epoca-dos.html>. 
(Continuar o texto de: O imaginário como obstáculo)
Não deixe de ler o artigo O Imaginário Popular na Época dos Descobrimentos Quinhentistas: da Terra Plana ao Mundo Esférico, nele você vai aprofundar o conhecimento sobre a forma que os homens dos séculos XV e XVI imaginavam o que havia no Mar Tenebroso e além dele. Saberá mais também o quanto os antigos romanos, chineses e outros povos conheciam a respeito da África e das Américas. 
Outra forma de aprender um pouco mais é assistindo o vídeo do historiador Bóris Fausto, dessa maneira você estuda e aproveita para travar conhecimento de autores que certamente lerá ao longo do curso. Aproveite e pesquise outras publicações, sites, vídeos e artigos relacionados ao conteúdo da aula a fim de aprender mais sobre os tópicos estudados. 
Qualquer dúvida solicite orientação ao seu professor online utilizando os recursos disponíveis no ambiente de aprendizagem. http: / / fabiopestanaramos.blogspot.com/ 2010/ 11 / o-imaginario-popular-na-epoca-dos. h tml 
Agora que você leu o artigo O Imaginário Popular na Época dos Descobrimentos Quinhentistas: da Terra Plana ao Mundo Esférico, elabore um texto de pelo menos uma lauda refletindo sobre os seguintes aspectos:
Por que os mapas e o conhecimento sobre a existência de outros continentes se perderam? 
Qual a importância da presença moura em Portugal para trazer de volta esse conhecimento? 
Por que o autor afirma que no imaginário do homem na passagem da Idade Média para a Idade Moderna "o possível não se distinguia do impossível"? 
Como filósofos e cientistas eram tratados quando propunham teorias baseadas nesse saber dos antigos? 
Como e por que o medo do Mar Tenebroso foi superado? 
O que era o mito de Prestes João e como ele auxiliou na mudança da mentalidade portuguesa?

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