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10. DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I

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GRADUAÇÃO
 2010.1
PARTE I
DIREITO TRIBUTÁRIO E
FINANÇAS PÚBLICAS I
AUTOR: LEONARDO DE ANDRADE COSTA 
COLABORAÇÃO: ANA ALICE DE CARLI
Sumário
Direito Tributário e Finanças Públicas I
AULA 1 – PRÉ-COMPREENSÃO DO TEMA. AS NECESSIDADES PÚBLICAS E A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO. 
BREVE HISTÓRICO DOS TRIBUTOS E DAS FINANÇAS PÚBLICAS EM FACE DA EVOLUÇÃO SOCIAL. .............................................. 3
AULA 2 – O ESTADO FINANCEIRO, A REPÚBLICA E O FEDERALISMO FISCAL. A DISTRIBUIÇÃO DE FUNÇÕES ENTRE OS
 PODERES E A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO NA FEDERAÇÃO. ............................................................................... 24
AULA 3 – O PLANEJAMENTO E AS LEIS ORÇAMENTÁRIAS (PPA, LDO E LOA) ...................................................................... 47
AULA 4 – OS CRÉDITOS ORÇAMENTÁRIOS E ADICIONAIS ............................................................................................. 79
AULA 5 – A DESPESA PÚBLICA, A EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO E A RESPONSABILIDADE FISCAL. ............................................ 94
AULA 6 – O FINANCIAMENTO DOS GASTOS, AS OPERAÇÕES DE CRÉDITO E A DÍVIDA PÚBLICA EM FACE DO EQUILÍBRIO FISCAL. .. 117
AULA 7 – O TRIBUNAL DE CONTAS E O CONTROLE DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA. ........................................................... 129
AULA 8 – AS TRANSFERÊNCIAS CONSTITUCIONAIS E A PARTILHA DE RECEITA TRIBUTÁRIA NO FEDERALISMO FISCAL 
BRASILEIRO ................................................................................................................................................... 143
AULA 9 – A RECEITA PÚBLICA NO ÂMBITO DA TEORIA GERAL DOS INGRESSOS PÚBLICOS. ................................................. 162
AULA 10 – O PODER DE TRIBUTAR, A COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA E A CAPACIDADE TRIBUTÁRIA ATIVA ................................. 181
AULA 11 – A POLÍTICA FISCAL E A EXTRAFISCALIDADE: A NECESSÁRIA COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE EFICIÊNCIA 
ECONÔMICA, JUSTIÇA DISTRIBUTIVA E A CONVENIÊNCIA ADMINISTRATIVA DOS TRIBUTOS. ............................................. 197
AULA 12 – A PARAFISCALIDADE COMO TÉCNICA ADMINISTRATIVA PARA DESENVOLVER ATIVIDADES DE INTERESSE 
PÚBLICO E O TRIBUTO NA CR-88 ......................................................................................................................... 229
AULA 13 – A RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA, OS ELEMENTOS E AS DIVERSAS FASES DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. ................ 245
AULA 14 – AS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS DO PODER DE TRIBUTAR. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS. 
A LEGALIDADE E A NECESSÁRIA PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA JUSTIÇA FISCAL. ............ 274
AVALIAÇÃO: DUAS PROVAS ESCRITAS
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 3
1 Vide artigo 2º da Constituição da Re-
pública Federativa do Brasil de 1988, de 
agora em diante simplesmente CR-88. 
Importante também salientar o Título 
IV da CR-88, intitulado “Da Organização 
dos Poderes”. A parte relevante do tema 
para o presente estudo será apresenta-
da na Aula 2 e detalhado na Aula 3. 
2 No caso brasileiro, a adoção da forma de 
Estado Federado está expressa, em especial, 
nos artigos 1º, 18 e 60, §4º, I, da CR-88. O 
Federalismo Fiscal será introduzido na Aula 
2 em conjunto com o início do estudo do 
Capítulo II, do Título VI, da CR-88 (art. 163 
a 169), intitulado “Das Finanças Públicas”. 
O exame do atual regime de repartição de 
receitas tributárias na Federação brasileira 
será aprofundado na Aula 8 e o estudo do 
sistema de atribuição de competências 
tributárias entre os entes políticos no Brasil 
será realizado na Aula 10, ocasião em que 
será analisado o Capítulo I, do Título VI, da 
CR-88, intitulado “Do Sistema Tributário 
Nacional” — art. 145 a 162 da CR-88). 
3 O estudo da dinâmica e da ratio subjacen-
te ao processo político democrático é de 
fundamental importância para a compre-
ensão de quais deveriam ser as atribuições 
de cada um dos denominados Poderes 
da República na defi nição e execução das 
políticas públicas a serem implementadas 
pelos entes políticos, assim como o papel 
do planejamento e dos orçamentos na 
sociedade brasileira.
4 Vide art. 2º dos Atos das Disposições 
Constitucionais Transitórias (ADCT). Essa 
questão é importante, por exemplo, para 
a compreensão dos possíveis efeitos so-
bre o exercício da competência tributária 
privativa dos entes políticos subnacionais 
(Estados, Distrito Federal e Municípios), 
na hipótese em que os tratados interna-
cionais de natureza tributária fi rmados 
pelo presidente da República Federativa 
do Brasil, o qual é ao mesmo tempo chefe 
do Poder Executivo da União e chefe de Es-
tado — da República Federativa do Brasil, 
estabeleçam isenções e benefícios fi scais 
de tributos estaduais e municipais. Sobre 
o tema importante ressaltar a decisão do 
Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF), 
por unanimidade, no Recurso Extraordi-
nário (RE) 229.096-0, acórdão que será 
examinado na Aula 22.
5 O Estado atua, além do planejamento, 
que será objeto de estudo na Aula 3, na 
fi scalização e no incentivo, e bem assim 
como agente normativo e regulador da 
atividade econômica (art.174 da CR-88), na 
prestação de serviços públicos (art. 175 
da CR-88), na exploração da atividade 
econômica (art. 173 da CR-88), em regime 
de monopólio ou não (art. 177 da CR-88), 
no exercício do poder de polícia (art. 78 da 
Lei 5.172/66, norma denominada de Código 
Tributário Nacional pelo Ato Complementar 
n 36/1967 e recepcionada com status de lei 
complementar pela CR-88, conforme será 
examinado a partir da Aula 9).
AULA 1 – PRÉ-COMPREENSÃO DO TEMA. AS NECESSIDADES 
PÚBLICAS E A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO. BREVE 
HISTÓRICO DOS TRIBUTOS E DAS FINANÇAS PÚBLICAS 
EM FACE DA EVOLUÇÃO SOCIAL.
1.1 PRÉ-COMPREENSÃO DO TEMA
A compreensão de cada parte que compõe o objeto de estudo das Finanças 
Públicas e do Direito Tributário, bem como das respectivas interações de seu 
conjunto e a realidade social, pressupõe o entendimento de alguns elementos 
de natureza estruturante da atividade do Estado, incluindo a tributação, seja 
do ponto de vista jurídico-político, seja da visão exclusivamente econômica 
ou, ainda, da perspectiva em que a Economia, a Política e o Direito se inter-
penetram. Esses elementos, todos essenciais ao entendimento da matéria e 
cuja análise efetivar-se-á ao longo do curso, são:
1. o sistema de distribuição de funções, de independência e de harmo-
nia entre os denominados “Poderes” da República1, assim como a 
forma de Estado2 Democrático3 de Direito, usualmente denomina-
dos de princípio republicano, federativo e democrático, respectiva-
mente, além da forma e do sistema de governo4 implementados,; 
2. a função de planejamento exercida pelo Estado5; 
3. os diferentes substratos econômicos de incidência tributária6, as de-
nominadas “bases de tributação”, bem como as diversas possibilida-
des de repercussão econômica dos tributos sobre os diferentes agen-
tes econômicos, os chamados contribuintes de fato, que arcam com 
o ônus ou encargo fi nanceiro do tributo (eg. consumidores fi nais 
de bens e serviços, proprietários, locadores, locatários, industriais, 
produtores agrícolas, comerciantes, prestadores de serviços em suas 
diversas modalidades, fi nanceiros, manual etc.), independentemen-
te de quem seja designado pela lei como o sujeito passivo da rela-
ção jurídica-tributária (o denominado contribuinte de direito, que 
possui o débito com o Fisco e tem o dever de extinguir o crédito 
tributário);
4. a estrutura normativa de imposição tributária7, isto é, a relação e os 
métodos de interpretação e de aplicação da norma jurídica-tributá-
ria à luz da indissociável correlação entre o Direito e a Economia.
A necessidade do prévio entendimento desses elementos, que englobam 
múltiplas disciplinas,decorre do fato de que as Finanças Públicas e a Tri-
butação são subsistemas tanto do Direito como da Economia, e, ao mesmo 
tempo, expressão e resultante de um longo processo de sedimentação Política 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 4
6 São três os substratos econômicos de inci-
dência tributária: o Patrimônio, a Renda 
e o Consumo. Ressalte-se, entretanto, 
que determinado tributo formulado e 
desenhado para atingir determinada base 
econômica pode incidir, no mundo real, so-
bre outro substrato econômico diverso, por 
força das condições de mercado ou, ainda, 
em função das normas jurídicas aplicáveis 
ou de sua interpretação. A matéria será 
inicialmente examinada na Aula 10 e apro-
fundada nas Aulas 11e 16. 
7 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Teoria da 
Imposição Tributária. In: MARTINS, Ives 
Gandra da Silva. (Coordenador). Curso 
de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 
2008. p. 1. Ensina o eminente autor: “A 
imposição tributária, como decorrência 
das necessidades do Estado em gerar 
recursos para sua manutenção e a dos 
governos que o administram, é fenômeno 
que surge no campo da Economia, sendo 
reavaliado na área das Finanças Públicas 
e normatizado pela Ciência do Direito. 
Impossível se faz o estudo da imposição 
tributária, em sua plenitude, se aquele 
que tiver de estudá-la não dominar os 
princípios fundamentais que regem a 
Economia (fato), as Finanças Públicas 
(valor) e o Direito (norma), uma vez que 
pretender conhecer bem uma das ciên-
cias, desconhecendo as demais, é correr o 
risco de um exame distorcido, insufi ciente 
e de resultado, o mais das vezes incorreto.” 
A matéria será objeto de discussão ao 
longo do curso, sendo a interpretação e a 
aplicação da norma tributária estudadas 
nas Aulas 25 e 26. 
8 LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito 
I. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, 
1983. Tradução de Gustavo Bayer. p. 110 e 
115. Assevera o autor que: “a normatiza-
ção dá continuidade a uma expectativa, 
independentemente do fato de que ela de 
tempos em tempos venha a ser frustrada. 
Através da institucionalização o consenso 
geral é suposto, independentemente do 
fato de não existir uma aprovação indivi-
dual (...) O direito não é primariamente um 
ordenamento coativo, mas sim um alívio 
para as expectativas. O alívio consiste na 
disponibilidade de caminhos congruente-
mente generalizados para as expectativas, 
signifi cando uma efi ciente indiferença 
inofensiva contra outras possibilidades, 
que reduz consideravelmente o risco de 
expectativa contrafática”. A contenção e os 
limites da atuação estatal na seara tributá-
ria serão abordados durante todo o curso, 
em especial após a Aula 11. 
9 ROSA JR., Luiz Emygdio F. da. Manual de 
Direito Financeiro & Direito Tributário. 15 
ed. atual. com alterações no CTN e ampl. 
Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p.151. 
“Parece-nos indiscutível a autonomia do 
Direito Tributário porque possui conceitos, 
princípios e institutos jurídicos que lhe são 
próprios e distintos dos demais ramos do 
direito”. O autor examina detalhadamente 
a questão no Capítulo VI, p. 135-162. 
e Cultural de determinado povo, localizado em território defi nido em dado 
momento histórico, sob as inevitáveis infl uências das múltiplas interações 
dinâmicas de âmbito local, regional e global. 
No entanto, se por um lado há como pressuposto o exame multidisciplinar 
das questões envolvidas, deve-se destacar que as normas econômicas não pos-
suem caráter impositivo formal por força de sua simples existência, razão da 
indispensabilidade da norma jurídica, pois somente esta se reveste da coerciti-
vidade muitas vezes necessária à realização e disciplina da atividade fi nanceira 
estatal e, ao mesmo tempo, pode, também, fi xar os limites e os parâmetros para 
a atuação do Estado de Direito, reduzindo o risco de descumprimento8 das “re-
gras do jogo” pelas partes que interagem nas relações fi nanceiras e tributárias.
Cumpre, ainda, ressaltar que o estudo das Finanças Públicas abrange toda 
a atividade fi nanceira do Estado, isto é, os orçamentos, as despesas, a dívida 
pública bem como as diferentes formas de fi nanciamento dos gastos públi-
cos, destacando-se entre elas os tributos, as receitas decorrentes do patrimô-
nio do próprio Estado e o crédito público. 
Já o Direito Tributário, que no passado se encontrava formalmente inserido 
no escopo de estudo do Direito Financeiro, assim compreendido como o sistema 
normativo formal da atividade fi nanceira estatal, cuida tão somente do tributo, 
o qual representa apenas um subconjunto pertencente ao âmbito da estrutura da 
matéria fi nanceira, já que caracterizado por ser receita coativa de regime jurídico 
público diferenciado. No entanto, o Direito Tributário desenvolveu-se de tal 
forma nos últimos 40 anos que a maior parte da doutrina9 aponta no sentido da 
sua “autonomia”, ainda que relativa10, haja vista que os tributos gozariam de: 
1. autonomia científi ca — existência de um conjunto de regras, prin-
cípios e institutos próprios, inaplicáveis aos outros ramos do direito 
(ex: o lançamento para constituir o crédito tributário, o qual será 
objeto de estudo nos próximos semestres; os princípios da anterio-
ridade clássica e nonagesimal, a serem estudados na Aula 15 etc.); 
2. autonomia normativa — As Constituições de 1946 (art. 5°, XV, 
b) e de 196711 (art. 8°, XVII, c) apenas fi xavam a competência da 
União para legislar sobre normas gerais de direito fi nanceiro, o qual 
se consubstancia como a disciplina jurídica da atividade fi nanceira12, 
sem haver menção expressa ao direito tributário. A Carta Magna 
de 1988, por sua vez, confere status diferenciado ao Direito Tribu-
tário. O artigo 24, I, da CR-88 dispõe que compete à União, aos 
Estados e ao DF legislar concorrentemente sobre direito tributário 
e, também, direito fi nanceiro, de forma apartada e individualizada. 
Ainda, o artigo 163, I, e o artigo 146, ambos da CR-88, conferem 
à lei complementar a atribuição, respectivamente, para dispor sobre 
fi nanças públicas e estabelecer normas gerais em matéria de legisla-
ção tributária; e 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 5
10 Amaro, Luciano. Direito Tributário Bra-
sileiro. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Sa-
raiva, 2005. p.1. Cf. ensina o autor: “Dado o 
extraordinário desenvolvimento do direito 
atinente aos tributos, ganhou foros de ‘au-
tonomia’ o conjunto de princípios e regras 
que disciplinam essa parcela da atividade 
fi nanceira do Estado, de modo que é pos-
sível falar no direito tributário, como ramo 
‘autônomo’da ciência jurídica, segregado 
do direito fi nanceiro. Veremos, mais adian-
te, a relatividade da ‘autonomia’ do direito 
tributário, a exemplo do que se dá com os 
demais ramos do direito.”
11 A redação original do artigo 8°, XVII, c, 
da Constituição de 1967 possuía a seguinte 
redação: “Art. 8° — Compete à União: I — 
(...); XVII — legislar sobre: a) (...); c) normas 
gerais de direito fi nanceiro; de seguro e 
previdência social; de defesa e proteção da 
saúde; de regime penitenciário”. A alínea “c” 
foi alterada pela Emenda Constitucional n° 1, 
de 1969, que passou a expressar: “c) normas 
gerais sobre orçamento, despesa e ges-
tão patrimonial e fi nanceira de natureza 
pública; de direito fi nanceiro; de seguro e 
previdência social; de defesa e proteção da 
saúde; de regime penitenciário”. Já a Emen-
da Constitucional n° 7, de 1977, que conferiu 
nova redação ao dispositivo, dispunha: “c) 
normas gerais sobre orçamento, despe-
sa e gestão patrimonial e fi nanceira de 
natureza pública; taxa judiciária, custas 
e emolumentos remuneratórios dos 
serviços forenses, de registros públicos e 
notariais; de direito fi nanceiro; de seguro 
e previdência social; de defesa e proteção 
da saúde; de regime penitenciário”. O inciso 
II e IV, do citadoartigo 24 da atual Carta de 
1988, estabelecem competência legislativa 
concorrente dos entes políticos para legislar 
sobre “orçamento” e “custas dos serviços 
forenses”. 
12 Nesse sentido, o Direito Financeiro e 
as Finanças Públicas possuem o mesmo 
objeto de estudo, isto é, a atividade fi nan-
ceira do Estado. No entanto, a disciplina 
jurídica é normativa e eminentemente 
prática, ao passo que a ciência das fi nanças 
é especulativa, não possuindo caráter disci-
plinador, pois é pré-normativa e atinente ao 
campo da economia. Não quer dizer, entre-
tanto, que a ciência jurídica possua um fi m 
em si mesma e possa ser estudada e com-
preendida sem a permanente interação dos 
outros campos do conhecimento formal e 
da realidade que se interpenetram.
13 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, 
Novo Aurélio Século XXI: o dicionário 
da língua portuguesa/ Aurélio Buarque 
de Holanda. 3ª ed. totalmente revista e 
ampliada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira 
, 1999. “fi nanças. A situação econômica 
de uma instituição, empresa, governo 
ou indivíduo, com respeito aos recursos 
econômicos disponíveis, esp. dinheiro, ou 
ativo líquido; ou condição fi nanceira”.
14 O artigo 48, II, da Constituição da Re-
pública de 1988 fi xa a competência do 
Congresso Nacional para dispor sobre 
3. autonomia didática — a maioria dos cursos universitários no Brasil 
oferecem o curso de Direito Tributário, não sendo abordada a ma-
téria fi nanceira ou apenas examinada tangencialmente. 
Inquestionável, entretanto, que somente é possível compreender os tribu-
tos e a tributação no contexto das Finanças Públicas em sua interação com 
a Política, o Direito e a Economia, fenômenos indissociáveis e usualmente 
analisados separadamente por comodidade ou questões de ordem didática.
Fixadas essas preliminares, torna-se importante salientar o sentido e o al-
cance da expressão fi nanças para melhor compreensão da matéria. Em sen-
tido comum13, as fi nanças expressam a situação de uma pessoa natural ou 
jurídica, de direito público ou de direito privado, relacionadas aos recursos 
econômicos disponíveis. 
Os bens e direitos, meios necessários para a satisfação dos mais variados 
desejos e objetivos de quem os possui, podem ter diversos graus de liquidez, 
ou seja, a pessoa pode dispor desde moeda corrente nacional14 ou estrangeira 
até imóveis de difícil alienação, seja em função das exigências legais para a 
autorização de sua disposição ou em função de condições de mercado. 
Por outro lado, é importante ressaltar a necessidade de que seja também 
identifi cada, para as mesmas pessoas, titulares dos ativos, a existência e o 
montante de possíveis obrigações vinculadas a essas disponibilidades, isto é, 
se há também obrigações e dívidas assumidas, tendo em vista a relevância de 
que seja determinada a posição patrimonial líquida (capital próprio).15
Assim, a determinação da posição econômica e fi nanceira de uma pessoa, 
de direito público ou privado, requer: (1) a defi nição de mecanismos para a 
quantifi cação monetária16 dos ativos e passivos, à exceção daqueles valores 
mantidos em caixa ou depositados em instituições fi nanceiras, bem como 
dos passivos já expressos em moeda corrente; e (2) de um sistema para a sua 
evidência, controle e gerenciamento ao longo do tempo. 
Idealmente, o sistema adotado para evidenciar as fi nanças, públicas ou 
privadas, deve compreender grupos de contas que expressem a realidade da 
atividade da organização, um regime de registro e contabilização dos atos e 
fatos relevantes, bem como demonstrativos fi nanceiros que possibilitem o 
efi ciente controle e a gestão da atividade da entidade e, ao mesmo tempo, 
aptos a informar adequadamente a situação: 
(a) Patrimonial, em determinado momento do tempo, bem como as 
suas variações entre períodos determinados (mutações ou variações 
patrimoniais); 
(b) Financeira, propriamente dita, adequada ao gerenciamento de li-
quidez de curto prazo e do fl uxo de caixa necessário ao fi nancia-
mento das atividades operacionais correntes e de investimentos, 
bem como da estrutura de capital e de solvência de longo prazo; e 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 6
“emissões de curso forçado” e o artigo 
315 do Código Civil de 2002 (Lei nº 10.406, 
de 10.01.2002) estabelece que “as dívidas 
em dinheiro deverão ser pagas no venci-
mento, em moeda corrente pelo valor 
nominal” salvo os casos previstos em legis-
lação especial, a teor do disposto no artigo 
318 do mesmo CC. Já o artigo 1° da Lei n° 
10.192/2001 determina que o pagamento 
das obrigações pecuniárias exequíveis no 
território nacional deve ser realizado em 
real, ressalvadas as exceções previstas na 
legislação. Nos termos dos artigos 5° e 42 
da Lei n° 8.666/1993, a qual dispõe sobre 
as licitações e os contratos públicos, todos 
os valores, preços e custos utilizados em 
licitações devem ter como expressão mo-
netária a moeda corrente nacional, ressal-
vada a hipótese de concorrência de âmbito 
internacional, cujo edital deve ajustar-se 
às diretrizes da política monetária e do 
comércio exterior e atender às exigências 
dos órgãos competentes. 
15 Sob o ponto de vista jurídico Caio Má-
rio da Silva Pereira pontua que “A idéia 
de patrimônio não está perfeitamente 
aclarada entre os modernos juristas, 
talvez em razão de não ter o direito 
romano fi xado com segurança as suas 
linhas. Segundo a noção corrente, pa-
trimônio seria o complexo das relações 
jurídicas de uma pessoa apreciáveis 
economicamente. (...) Daí dizer-se que 
o patrimônio não é apenas o conjunto 
de bens. (...) Noutros termos, o patri-
mônio se compõe de um lado positivo 
e de outro negativo. A idéia geral é que 
a noção jurídica de patrimônio não 
importa balancear a situação, e apurar 
qual é o preponderante. Por não se te-
rem desprendido desta preocupação de 
verifi car o ativo, alguns se referem ao 
patrimônio líquido, que exprime o sal-
do positivo, uma subtração dos valores 
passivos dos ativos. Ao economista in-
teressa a verifi cação. Também ao jurista 
tem de cogitar dela às vezes, quando 
tem de apurar a solvência do devedor, 
isto é, a aptidão econômica de resgatar 
seus compromissos com os próprios 
haveres. Mas, em qualquer hipótese o 
patrimônio abraça todo um conjunto 
de valores ativos e passivos, sem inda-
gação de uma eventual subtração ou de 
um balanço”. In. PEREIRA,Caio Mário da 
Silva. Instituições de direito civil. 19ª 
ed. Volume I. Rio de Janeiro. Ed. Foren-
se, 2002. p. 245.
16 Princípio Contábil do denominador 
comum monetário. 
(c) Orçamentária, que expresse se foram, e em que grau, atingidas as 
metas estabelecidas, além de permitir o gerenciamento das ações 
planejadas, tendo em vista que o orçamento moderno (orçamento-
programa) é instrumento essencial de ligação entre o planejamento 
das ações e as fi nanças, permitindo a operacionalização efetiva e 
concreta dos planos de trabalho, na medida em que os monetariza, 
isto é, quantifi ca-os em moeda permitindo o estabelecimento de 
cronogramas físico-fi nanceiros. 
Nesse sentido, cabe salientar que o correto entendimento dos mecanismos 
de quantifi cação monetária dos bens, direitos e obrigações, assim como das 
respectivas demonstrações fi nanceiras que os evidenciam, é pressuposto da 
compreensão das Finanças Públicas e, em especial, de aspectos essenciais da 
tributação da renda, que ao lado do consumo e do patrimônio consubstan-
ciam os substratos econômicos de incidência tributária (vide nota 5). 
Também é preliminar ao exame da matéria a distinção entre dois modelos de 
medidas adotados em análise econômica, denominadas, respectivamente, (1) stock 
measure, relacionado ao conceito de estoque, e (2) fl ow measure, vinculado à quan-
tifi cação de fl uxos. O fl uxo é defi nido ao longo de um período específi co de tempo 
(por ano, mês, dia etc.), ao passo queo estoque refere-se a um dado momento 
no tempo, e não durante e ao longo de um dado período de tempo. Essa análise 
permite o acompanhamento da execução do que foi programando, por meio da 
verifi cação da execução dos orçamentos, o que explicita a situação patrimonial e 
fi nanceira em um dado momento do tempo e ao longo do período. Assim, em 
termos gerais e de forma esquemática, visando à compreensão dos elementos cons-
titutivos básicos da análise da situação patrimonial e fi nanceira de uma organiza-
ção, pode-se representar o que se deseja alcançar no momento da seguinte forma:
 Fluxo de Receita (por dia, mês etc.) – situação dinâmica 
 
Tempo 
tempo 1 tempo 2 
 situação estática 1 situação estática 2 
 momento no tempo Fluxo de Despesa (por dia, mês etc) 
situação dinâmica
 
 
100 100 100 100 
100 100 100 100 100 100 100 100 
Ativo 
= 150 
Patrimônio 
Líquido = 
100 
Passivo = 50 
Ativo
= 550 
Patrimônio 
Líquido = 
500 
Passivo = 50 
Total = 800 
Total = 400 
Receitas 800 
Despesas <400>
Resultado +400 
Balan ço Patrimonial 2
Balanço Patrimonial 1
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 7
17 Fábio Nadal e Marcio Cozatti apontam 
no sentido de que “a necessidade públi-
ca não se confunde com necessidade 
individual (cujo grupamento dá lugar 
às necessidades gerais que são, por ex-
celência, homogêneas) e necessidade 
coletiva (não revestida de homogenei-
dade e que surge da contraposição de 
interesses)”. NADAL, Fábio e COZATTI, 
Márcio Faria. Direito Financeiro sim-
plifi cado para concursos públicos. 
São Paulo: Impactus, 2008. p. 19.
18 Importante salientar a existência da 
denominada reserva do possível, adota-
da pela jurisprudência alemã, princípio 
associado à constatação de que todos 
os direitos têm custo e que os recursos 
públicos são limitados, razão pela qual 
haverá sempre e em qualquer circuns-
tância a necessidade de escolha entre 
o que será e o que não será realizado 
pelo Poder Público. SCHWABE, Jürgen 
(Organizador). Cinqüenta Anos de 
Jurisprudência do Tribunal Consti-
tucional Federal Alemão. Tradução 
Leonardo Martins e outros. Montivideo: 
Fundação Konrad Adenauer, 2005. p. 
660-664.BVERFGE 33, 303. De fato, a 
própria Convenção Americana sobre 
Direitos Humanos, denominado Pacto 
de San José da Costa Rica, aprovada no 
Brasil pelo Decreto Legislativo 27, de 
25.09.1992 e promulgada pelo Decreto 
678, de 06.11.1992, estabelece em seu 
art. 26, intitulado “desenvolvimento 
progressivo”, que: “os Estados partes 
comprometem-se a adotar as provi-
dências, tanto no âmbito interno, como 
mediante cooperação internacional, 
especialmente econômica, a fi m de 
conseguir progressivamente a plena 
efetividade dos direitos que decorrem 
das normas econômicas, sociais e sobre 
educação, ciência e cultura, constantes 
da Carta da Organização dos Estados 
Americanos, reformada pelo Protocolo 
de Buenos Aires, na medida dos recur-
sos disponíveis, por via legislativa ou 
por outros meios apropriados.” 
Ao fl uxo de receitas é contraposto o conjunto de despesas do período, o 
que permite determinar a situação líquida do patrimônio, ao fi nal do cada 
exercício, bem como as variações patrimoniais entre dois momentos determi-
nados no tempo. Cabe ressaltar, entretanto, a possibilidade de existir fl uxo fi -
nanceiro sem impacto no Patrimônio Líquido, o que será examinado durante 
o curso. No exemplo, não foi alterada a situação do passivo ao longo do perí-
odo a fi m de facilitar essa análise inicial. Saliente-se, que parte da difi culdade 
da gestão e do controle fi nanceiro e patrimonial, público e privado, decorre 
do fato de que a despesa ou a receita gerada em determinado exercício — sob 
o ponto de vista jurídico ou econômico — nem sempre é realizada fi nancei-
ramente no mesmo período, podendo ocorrer, portanto, desconexões entre: 
(1) o fl uxo monetário; e (2) a contabilização do evento que altera a situação 
patrimonial líquida.
Nesse sentido, importante frisar que o curso deste semestre se inicia com 
esta visão geral da matéria e da Atividade Financeira do Estado ao longo da 
história. Até a Aula 9 serão abordados os diversos temas atinentes ao campo 
tradicionalmente defi nido como pertinente ao Direito Financeiro e às Finan-
ças Públicas, tais como o Financiamento dos Gastos e a Receita Pública no 
âmbito da Teoria Geral dos Ingressos Públicos, a Despesa Pública, a Respon-
sabilidade Fiscal, os Orçamentos (a Lei do Orçamento Anual — LOA, a Lei 
do Plano Plurianual –PPA e a Lei de Diretrizes Orçamentárias — LDO), o 
Controle da Execução Orçamentária, a Dívida Pública e o sistema de Repar-
tição Constitucional de Receitas Tributárias, o qual é determinante para o de-
lineamento do perfi l do Federalismo Fiscal brasileiro, ao lado da denominada 
distribuição de Competências Tributárias, matéria a ser examinada a partir 
da Aula 10, que introduz o estudo específi co da Tributação e do Direito 
Tributário, o qual será desenvolvido até a Aula 26, bem como nos próximos 
semestres — Direito Tributário e Finanças Públicas II e III. 
1.2 AS NECESSIDADES PÚBLICAS E A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO.
Os indivíduos possuem interesses e demandas variadas, as quais, em seu 
conjunto, formam o que se denomina de necessidades gerais ou sociais17. 
Nesse sentido, as demandas coletivas seriam a resultante abstrata do soma-
tório das necessidades individuais. O Estado, entretanto, considerando, por 
um lado, a limitação18 dos recursos disponíveis (naturais, humanos, tecno-
lógicos, fi nanceiros etc.), e, por outro, as demandas individuais e sociais in-
fi nitas, elege, por meio do processo político, que varia de forma e conteúdo 
no tempo e no espaço, aquelas para as quais alocará esforços visando ao seu 
atendimento: são as chamadas necessidades públicas. Assim, uma vez fi xado 
normativamente o dever do Estado em realizar apenas algumas demandas 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 8
19 BALEEIRO, Alimoar. Uma introdução 
à ciência das fi nanças. 16ª. ed. Rio de 
Janeiro: Forense, 2006. p. 3-4.
20 Art. 3º I, II, III e IV da CR-88.
21 VASCONCELLOS, Marco Antonio S. e 
GARCIA, Manuel E. Fundamentos de 
Economia. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 
2006. p. 91.
22 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de 
Direito Financeiro e Tributário. 11ª 
ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 
7. Assevera o autor que: “A expressão 
atividade fi nanceira tem a mesma 
extensão do termo “fi nanças” que, sur-
gindo na Idade Média por derivação da 
palavra fi nare, é sinônimo de fi nanças 
públicas, e não se aplica às fi nanças 
privadas.”
coletivas politicamente determinadas — as políticas públicas-, o que ocorre 
na modernamente por meio dos orçamentos, conforme será estudado nas 
próximas aulas, as mesmas se convolam e transmudam em necessidades pú-
blicas, a serem satisfeitas por meio dos serviços públicos, os quais se quali-
fi cam como o conjunto de bens e pessoas sob a responsabilidade do Estado. 
Os serviços públicos, que são instrumentos do Estado para o alcance dos 
fi ns a que se propõe, se realizam, atualmente, quase que exclusivamente, por 
meio da utilização da atividade fi nanceira do Estado. Nesse sentido ensina 
Aliomar Baleeiro19 que:
“se, em tempos remotos, foi usual, e hoje, excepcionalmente, ainda se verifi ca 
a requisição pura e simples daquelas coisas e serviços dos súditos, ou a colabo-
ração gratuita e honorífi ca destes nas funções governamentais em verdade, na 
fase contemporânea, o Estado costuma pagar com dinheiro os bens e o trabalho 
necessários ao desempenho da sua missão. É o processo da despesa pública, que 
substitui, com vantagem, o da requisição, o da gratuidade de cargos, o do apossa-
mento dos cabedais dosinimigos vencidos, embora de tudo isso ainda perdurem 
resquícios, notadamente em tempo de guerra. A regra, hoje, é o pagamento em 
moeda e, por isso, constitui atividade fi nanceira a que o Estado, as províncias e 
municípios exercem para obter dinheiro e aplicá-lo ao pagamento de indivíduos 
e coisas utilizadas na criação e manutenção de vários serviços públicos”. 
No atual contexto brasileiro, de determinação pelo processo político de-
mocrático das denominadas necessidades públicas, a serem atendidas pelo 
insubstituível instrumento da atividade fi nanceira do Estado moderno, é im-
portante destacar que o poder constituinte originário defi niu ser objetivo 
fundamental da República Federativa do Brasil20: “construir uma sociedade 
livre, justa e solidária”, “garantir o desenvolvimento nacional”, “erradicar a 
pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” e 
“promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade 
e quaisquer outras formas de discriminação”. Para alcançar tais mandamen-
tos constitucionais, o poder público disciplina as relações econômicas e so-
ciais, planeja e executa uma série de ações, entre as quais se destaca a política 
macroeconômica, cujos objetivos, correlatos àqueles fundamentais constitu-
cionalmente qualifi cados, podem ser sumarizados como: (a) a busca de alto 
nível de emprego; (b) a estabilidade de preços; (c) a distribuição equitativa da 
renda; e (d) o crescimento econômico. Os principais instrumentos utilizados 
na condução da política macroeconômica para atingir esses fi ns são “as polí-
ticas fi scal, monetária, cambial e comercial, e de rendas”21, todas integrantes da 
denominada atividade fi nanceira do Estado, caso adotado um conceito am-
plo22 para o termo. De fato, inquestionável a relevância e a interpenetração de 
cada uma dessas políticas econômicas, em especial para atingir consistência e 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 9
23 HARADA, Hiyoshi, Direito Financeiro 
e Tributário. 17ª ed. São Paulo: Atlas, 
2008. p. 4.
24 BALEEIRO. Op. Cit., p. 4.
coordenação entre as políticas públicas que ensejam as despesas do governo e 
as metas macroeconômicas, matéria cujo exame detalhado extrapola o objeto 
deste curso. Nessa toada, serão abordados nesse semestre apenas os aspectos 
mais relevantes dessas questões, na medida em que o estudo dos instrumen-
tos diretamente relacionados: (1) à obtenção das receitas e fi nanciamento 
dos gastos, (2) à realização das despesas, (3) ao planejamento orçamentário 
e à gestão fi scal e patrimonial do Poder Público suscitem uma análise mais 
detalhada dos aspectos macroeconômicos que se imbricam. Assim, pode-se 
representar grafi camente o objeto de estudo das próximas aulas pela fi gura 
que se segue:
O Planejamento do Estado 
e os 
Orçamentos 
O Crédito e a 
Dívida Pública 
Receita Pública Despesa Pública 
Nessa mesma linha de pensamento, Kyoshi Harada23 conceitua a “ativida-
de fi nanceira do Estado como sendo a atuação estatal voltada para obter, gerir 
e aplicar os recursos necessários à consecução das fi nalidades do Estado que, 
em última análise, se resumem na realização do bem comum” (grifo nosso). 
Aliomar Baleeiro24, por sua vez, adotando conceito mais amplo, defi ne 
que a “atividade fi nanceira consiste em obter, criar, gerir e despender o di-
nheiro indispensável às necessidades, cuja satisfação o Estado assumiu ou 
cometeu àqueloutras pessoas de direito público” (grifo nosso). De fato, a 
própria CR-88 estabelece a competência da União para emitir moeda, atri-
buição a ser exercida exclusivamente por meio do Banco Central, no artigo 
164, dispositivo inserido no Capítulo II, do Título VI, da CR-88, intitula-
do “Das Finanças Públicas”. Dessa forma, tanto o eminente autor como a 
Constituição incluem a política monetária diretamente no escopo da análise 
da atividade fi nanceira do Estado, o que será realizado neste curso apenas de 
forma tangencial. 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 10
25 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de 
Direito Constitucional Financeiro e 
Tributário. Volume V. O Orçamento na 
Constituição. 3ª ed. revista e atualiza-
da. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p.1. 
Identifi ca o autor que: a “Constituição 
Orçamentária é um dos subsistemas 
da Constituição Financeira, ao lado da 
Constituição Tributária e da Monetária, 
sendo uma das Subconstituições que 
compõem o quadro maior da Constitui-
ção de Estado de Direito, em equilíbrio 
e harmonia com outros subsistemas, 
especialmente a Constituição Econômi-
ca e a Política”
26 ADAMS, Charles. For good and evil: 
the impact of taxes on the course 
of civilization. 2nd ed. United States: 
Madison Books, 2001. p. 1-2. Revela o 
autor: “Taxes are the fuel that makes 
civilization run. There is no known 
civilizations that did not tax. The fi rst 
civilization we know anything about 
began six thousand years ago in Su-
mer, a fertile plain between the Tigris 
and Euphrates rivers in modern Iraq. 
The dawn of history, and tax history, 
is recorded on clay cones excavated at 
Lagash, in Sumer. The people of Lagash 
instituted heavy taxation during a ter-
rible war, but when the war ended, the 
tax men refused to give up their taxing 
powers. From one end of the land to 
the other, these clay cones say, ‘there 
were the tax collectors.’ Everything 
was taxed. Even the dead could not 
be buried unless a tax was paid. The 
story ends when a good king named 
Urukagina, ‘established the freedom’ of 
the people, and once again, ‘There were 
no tax collectors’. This may not have 
been a wise policy, because shortly 
thereafter the city was destroyed by 
foreign invaders. There is a proverb 
about taxes on other clay tablets from 
this lost civilization which reads: You 
can have a Lord, you can have a King, 
but the man to fear is the tax collectors” 
(grifo nosso). 
Pode-se concluir pelo que foi até aqui exposto, acerca da atividade fi nan-
ceira, que ela é meramente instrumental, na medida em que apenas viabiliza 
a consecução dos objetivos fi xados pelo processo político (ex: educação, saú-
de, segurança pública, transporte etc.), não constituindo uma fi nalidade do 
Estado, isto é, a atividade fi nanceira não constitui um fi m em si mesma. 
Assim sendo, sob o ponto de vista jurídico, o objeto de estudo das próxi-
mas aulas será a Constituição Financeira, a qual, segundo a melhor doutrina, 
é composta pelas Constituições Tributária, Orçamentária e Monetária25 (ar-
tigos 145 a 169 da CR-88), além dos dispositivos pertinentes à fi scalização 
orçamentária dos Municípios (artigo 31 da CR-88); ao controle interno, ex-
terno e social da execução orçamentária e da Administração Pública (artigos 
70 e seguintes da CR-88), ao orçamento do Poder Legislativo (artigos 51, 
IV, e 52, XIII, da CR-88), do Poder Judiciário (artigo 99) e do Ministério 
Público (artigo 127). Antes, porém, serão examinados, de forma sucinta, os 
principais períodos e características mais relevantes da história dos tributos e 
das fi nanças públicas, o que certamente auxiliará a compreensão da realidade 
e o atual estágio de desenvolvimento da matéria.
1.3 BREVE HISTÓRICO DOS TRIBUTOS E DAS FINANÇAS PÚBLICAS.
A leitura de diversos episódios marcantes em todo o curso da história 
da humanidade revela uma verdade inquestionável, independentemente do 
lugar objeto da pesquisa, os tributos sempre tiveram e continuam a ter in-
fl uência determinante no curso das civilizações. 
A primeira civilização de que se tem conhecimento26 concreto, cerca de 
seis mil anos atrás, era denominada Sumer, uma localidade entre os rios Tigre 
e Eufrates, no que hoje é o Iraque. Os acontecimentos históricos lá ocorridos 
revelam a grande infl uência dos tributos já naquela época, e estão gravados 
em hieróglifos encontrados em escavações em Lagash, localizadoem Sumer. 
Após um período de incidência tributária de forma generalizada e bastante 
gravosa, um rei, chamado Urukagina, determinou a “liberdade”, por meio da 
extinção dos coletores do rei. O que parecia ser a solução de todos os proble-
mas ensejou um fi nal amargo para o bondoso monarca e àqueles até então 
submetidos à tirania fi scal: a localidade, após alcançada a almejada “liberda-
de”, foi totalmente destruída por invasores externos. 
Abaixo, reproduz-se a fi gura (extraída do livro de Charles Adams, p. 2, 
vide nota 21) contendo os símbolos que registraram e informam a existência 
da lei libertadora de Urikagina. 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 11
27 ADAMS. Op. Cit. p. 5. Destaca o autor 
que: “Egyptian civilizatian was highli-
ghted by its enduring length. An advan-
ced form of civilized life was in full bloom 
along the Nile before 3000 b.c., and it 
perpetuated itself until the fall of Rome”.
Esse exemplo refl ete um problema crucial, a necessidade de recursos para 
implementação de uma organização mínima e de proteção contra invasores 
— questão que, mesmo após a criação dos denominados Estados-Nações 
Absolutistas continuou a se fazer presente. 
Já na civilização egípcia, caracterizada por sua longevidade27, em contra-
ponto à experiência libertária ocorrida em Lagash, era possível identifi car, 
após o descobrimento de escritos e desenhos dentro de pirâmides e tumbas 
milenares, a existência de períodos de forte “pressão” de fi scais dos faraós 
para garantir-lhes o recebimento da parcela de 20% (vinte por cento) a eles 
pertencentes. Constata-se por meio de fi guras e escritos milenares que nada 
era ocultado, nem mesmos os ovos sob as aves.
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 12
28 CICERO, Marcus Tullius. On Duties II. 
In: Cícero. On the Good life. Tradução 
Michael Grant . New York: Penguin 
Classics, 1971. p. 162. Disponível em: 
http://books.google.com.br. Pesquisa 
realizada em 01.01.2009. 
29 CAMPOS, Diogo Leite de. A Jurisdici-
zação dos Impostos: Garantias de Ter-
ceira Geração. In: MARTINS, Ives Gandra 
da Silva. O Tributo. Refl exão Multidisci-
plinar sobre a sua natureza. São Paulo: 
Editora Forense, 2007, p. 87-88.
Por sua vez, o grande jurista Marcus Tullius Cícero28 (106 — 43 a.C) 
difundiu no Império Romano a ideia grega contra os chamados tributos di-
retos, nos seguintes termos, um ano antes de sua morte (44 a.C):
When constant wars made the Roman treasury run short, our forefathers often used 
to levy a property tax. Every eff ort must be made to prevent a repetition of this; and all 
possible precaution must be taken to ensure that such a step will never be needed … 
But if any government should fi nd itself under necessity of levying a tax on property, the 
utmost care has to be devoted to making it clear to the entire population that this simply 
has to be done because no alternative exists short o complete national collapse.
Cabe salientar, entretanto, que o Império Romano é um exemplo clássico de 
como a exigência de tributos com fundamento apenas na força, sem referência 
ao valor justiça, transforma o direito de propriedade em um sistema de servi-
dões sobre o homem, conforme assevera o professor Diogo Leite Campos29:
Eis, pois, o legado de Roma em matéria fi scal: o imposto como produto e 
instrumento da opressão, crescendo à medida que se desenvolve a máquina po-
lítico-administrativa; assente na força pura, sem referência à justiça. O imposto 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 13
30 GALVÊAS, Ernani. Breve História dos 
Tributos. In: MARTINS, Ives Gandra da 
Silva. O Tributo. Refl exão Multidisci-
plinar sobre a sua natureza. São Paulo: 
Editora Forense, 2007, p. 318. 
31 ADAMS. Op. Cit. p. 164. Um dos ca-
pítulos da Magna Carta trata da livre 
circulação de mercadorias, conforme 
se extrai do texto, in verbis: “Let all 
merchants have safety and security to 
go out of England, to come into England, 
and to remain in and go about through 
England, as well by land as by water, for 
the purpose of buying and selling, wi-
thout payment of any evil or injust tolls, 
on payment of ancient and just customs”. 
Conforme aponta o autor tal normativa 
foi seguida pelos Estados Unidos e Ca-
nadá: “the United States and Canadian 
constitutions adopted this principle of 
internal free trade. Commerce moving 
within the nation cannot be taxed. Fre-
edom to travel in and out the country 
cannot be curtailed. The Russians fi nd 
diffi cult to understand why the West em-
phasizes this basic human right. Magna 
Carta is the source.”
32 Cf. pontua Ana Alice De Carli, in: Bem 
de Família do Fiador e o Direito Hu-
mano Fundamental à Moradia. Rio de 
Janeiro: Editora Lumen Júris, 2009: “Na 
seara da promoção e positivação dos di-
reitos humanos, pode-se apontar como 
marco histórico, a Carta Magna inglesa, 
de 1215, a qual consagrou alguns direi-
tos-garantias como o habeas corpus, o 
devido processo legal, a propriedade 
privada, e o princípio da legalidade. 
Não obstante, a questionável legitimi-
dade da referida Constituição — pois, 
na verdade, consubstanciou apenas a 
concretização dos interesses da bur-
guesia -, ela representa um capítulo da 
história do constitucionalismo inglês.”. 
Cumpre, realçar, que o princípio da le-
galidade tributária antecede a própria 
noção de legalidade em sentido lato.
33 ADAMS. Op. Cit., p. 163. Esclarece o 
autor que: “John’s attempt to stretch 
the revenue devices of the realm had 
failed, but not entirely. Extra taxation 
could be collected with consent. In time 
the consent concept expanded. A rising 
class of wealthy commoners were cal-
led to meet in a House of Commons, to 
approve taxation for commoners in the 
same way the Great Council, approved 
taxation for the nobility. The king now 
became a politician. When extra revenue 
was needed, he did not need to steal it 
or arbitrarily increase taxation, he would 
call together his two councils of taxpayer 
representatives and present a case for 
more taxation.” 
34 GALVÊAS. Op. Cit., 318.
‘nasceu’ em Roma caracterizado pela odiositas, fundado sobre a sua essência de 
mal necessário, de limitação do Direito pela força do ‘princeps’, de instrumento de 
dominação, ‘de império’. Enquanto as relações civis retiravam a sua força da justiça 
que realizavam como instrumento de cooperação entre homens livres e iguais. O 
carácter do imposto como produto e instrumento de um sistema de dominação foi 
evidente desde a grave crise do que o Império Romano atravessou a partir do sécu-
lo III. No decurso do principado de Diocleciano a economia e a sociedade são or-
ganizadas em termos de acampamento militar. O imperador estabelece a coacção 
como único instrumento de estabilização. Impõe-se uma escala de preços máximos 
para uma imensa lista de bens e serviços, estabelecendo como única sanção, para 
infractores, a morte. Simultaneamente, os impostos, destinados a manter uma 
máquina administrativa e militar crescente, aumentaram rapidamente. Criou-se 
um conjunto de impostos para fi nanciar o aparelho administrativo e militar; um 
imposto geral sobre as vendas; um imposto sobre o rendimento; múltiplas presta-
ções de serviços obrigatórias (transporte, fabrico de pão etc.). As atividades profi s-
sionais foram organizadas em corporações, elementos e instrumentos do Estado, 
com carácter coactivo e hereditário. Na última fase da sua história, a romanidade 
transforma-se numa comunidade em que todos trabalham, mas ninguém para si 
próprio. A propriedade mantém-se, é certo, como o ‘fundamento inamovível das 
relações humanas’; mas a sua função deixou de ser ligada ‘naturalmente’ à satisfa-
ção das necessidades de seu titular, para satisfazer os interesses públicos.
Dando um salto na cronologia da história, outro momento merece desta-
quena abordagem que se estabelece neste curso é o século XIII d.C., o qual, 
para alguns autores30, representa o início da sistemática tributária que se con-
sagra na atualidade, uma vez que foi a partir da promulgação da Carta Mag-
na inglesa de 121531 que a legalidade ascendeu como princípio norteador 
das relações tributárias, impondo ao Rei João-sem-Terra o dever de observar 
limites para a criação de tributos. Na realidade, tal documento32 é decor-
rência da indignação dos barões proprietários de terras que forçaram King 
John a assinar a Magna Carta, pois já não concordavam com os constantes 
desrespeitos do monarca aos costumes tributários da realeza impondo-lhes 
excessiva carga tributária. De fato, tributação adicional somente poderia ser 
exigida com consentimento33, cujo conceito foi se alterando e expandindo ao 
longo do tempo, haja vista que a anuência da classe comum então ascendente 
economicamente passou também a ser exigida. 
No mesmo período, isto é, ainda no século XIII, conforme ressalta Gal-
vêas34, o rei Eduardo I foi compelido a ir além e aceitar a norma segundo a qual 
“nenhum tributo poderá ser lançado pelo rei, sem o consentimento dos arcebis-
pos, bispos, condes, barões, cavaleiros, burgueses e todos os homens livres...”.
Alguns séculos depois, já no ano de 1628, a Inglaterra edita o Bill of Ri-
ghts, o qual proclama que “a partir desta data, nenhum cidadão será obrigado 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 14
35 Idem. Ibidem. p. 318-319.
36 TORRES. Op. Cit. p. 3-4. 
37 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elemen-
tos de Teoria Geral do Estado. 16. ed. 
atual. ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 
1991. p. 233.
a conceder qualquer dádiva ou empréstimo ao soberano, ou a pagar qualquer 
tributo, sem a aprovação do Parlamento”; ou seja, concretizou-se o princípio 
da legalidade consubstanciado no imperativo categórico no taxation without 
representation ( aliás, tal expressão foi largamente difundida pelos america-
nos no período da revolução americana ). Conforme preleciona Galvêas35 a 
referida norma-princípio é a base em que se fundam os orçamentos públicos 
dos países modernos. Destaque-se, no entanto, nos termos apontados pelo 
professor Ricardo Lobo Torres36 que:
É inútil procurar antes das revoluções liberais dos séculos XVII e XVIII a fi gu-
ra do orçamento. No mundo patrimonial já surgia a autorização dos estamentos 
e das cortes para a cobrança de impostos. Na Inglaterra a partir de 1215 e em 
Portugal, mas remotamente, tornava-se necessário o consentimento para que o 
Rei pudesse lançar tributos, que tinha o caráter extraordinário e só se justifi cavam 
quando insufi cientes os ingressos dominiais. Mas esses impostos, a rigor, não 
se confundem com os que permanentemente passam a ser cobrados a partir da 
instauração da estrutura liberal de Governo, posto que eram apropriados pri-
vadamente, sem a nota da publicidade que marca os tributos permanentes. Era 
difícil distinguir a Fazenda do Rei e a do Estado, as despesas do Rei e do Reino, as 
rendas da Coroa e do Reino. Assim sendo, não havia necessidade nem de autori-
zação para a cobrança dos ingressos dominiais nem para a realização da despesa, 
pelo que descabe cogitar de orçamento no Estado Patrimonial. (grifo nosso)
Portanto, o período denominado de Patrimonialismo é caracterizado pelo Es-
tado protetor contra as guerras e invasões externas, sendo as fi nanças fundamen-
tadas em rendas patrimoniais e dominiais dos príncipes bem como da exploração 
das colônias. A receita extrapatrimonial de tributos é secundária e excepcional
Já o século XVIII, foi marcado pela independência americana e pela revo-
lução francesa, a qual proclama a proteção de alguns direitos humanos funda-
mentais — em especial a propriedade e a liberdade -, uma vez que o Estado 
era visto como “inimigo da liberdade individual, e qualquer restrição ao indi-
vidual em favor do coletivo era tida como ilegítima”, preleciona Dallari.37 
A Declaração de Independência dos Estados Unidos da America, de 4 de 
julho de 1776, proclama entre as razões da insatisfação com o King of Great 
Britain: “For imposing taxes on us without our consent”. A Constituição dos 
Estados Unidos, por sua vez, ratifi cada em julho de 1787, estabelece em seu 
artigo 1º, seção 8, que: 
Th e Congress shall have the Power 1. to lay and collect taxes, duties, imposts 
and excises, to pay the debts and provide common defense and general welfare 
of the United States; but all duties, imposts and excises shall be uniform throu-
ghout the United States. (grifo nosso)
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 15
38 Ver GALVÊAS. Op. Cit., 318-320.
39 ROSA JR. Luiz Emygdio F. da. Manual 
de Direito Financeiro e Direito Tribu-
tário. 15. ed. Rio de Janeiro: Editora 
Renovar, 2001, p. 4-5.
Na mesma linha, a Constituição francesa de 03.09.1791 foi categórica na 
contenção da prerrogativa impositiva, tendo em vista a necessidade de reno-
vação anual da autorização parlamentar para tributar:
Titre V, art. 1 er: Les contributions publiques seront délibérées et fi xées chaque 
année par le Corps Legislatif, et ne pourront subsister au dela du dernier jour de La 
session suivante, si elles n’ont pás été expressément renouvelée.
Se com o constitucionalismo nasce a idéia de orçamento incorporando 
as garantias normativas da liberdade, por outro lado a marca do período era 
a intervenção mínima do Estado na seara privada, apontando a liberdade 
contratual como um direito natural das pessoas. Com efeito, nesta época, o 
pensador Adam Smith sustentava que as relações econômicas deveriam ser 
regidas pelo princípio da liberdade de negociar, sem a participação do Esta-
do. Era a denominada fase do Estado Liberal — caracterizado como Estado 
Mínimo ou Estado de Polícia -, cuja premissa sob o aspecto econômico era a 
primazia da mão invisível do mercado para reger a economia. 
A Revolução Industrial também merece realce, porquanto trouxe mudanças 
de diversas ordens, inclusive no campo da tributação, possibilitando a imposi-
ção de tributos sobre a produção industrial, sobre o consumo, bem como sobre 
o lucro e a renda auferida dos titulares de propriedade, acentua Galvêas38.
A visão clássica e mais difundida desse contexto, que perdura desde a 
fase fi nal do século XVIII, todo o século XIX até o início do século XX, 
é no sentido de que a atividade fi nanceira do Estado Liberal era neutra, 
geralmente classifi cada como fi nanças neutras ou fi scais, pois tinha apenas 
a função de arrecadar para fazer face às despesas decorrentes das presta-
ções por ele exercidas, de caráter essencial, como as relacionadas à justiça, 
política, diplomacia, defesa contra agressão externa e segurança da ordem 
interna, e os tributos, conforme assevera Luiz Emygdio F. da Rosa Jr39, 
também eram caracterizados pelo fi m exclusivamente fi scal, posto que a 
exigência dos mesmos objetivaria tão-somente a obtenção de recursos para 
fi nanciar a atividade fi nanceira:
Assim sendo, a atividade fi nanceira exercida pelo Estado somente visava à 
obtenção de numerário para fazer face às citadas despesas públicas, isto é, as fi -
nanças públicas tinham fi nalidades exclusivamente fi scais. Gasto Jéze resumiu de 
maneira lapidar o alcance da atividade fi nanceira desenvolvida pelo Estado no 
período clássico, ao enunciar: ‘Il y a dês dépenses publiques; Il faut lês couvrir’. 
Assim, as despesas tinham um tratamento preferencial sobre as receitas, uma vez 
que essas visavam apenas a possibilitar a satisfação dos gastos públicos. Nesse pe-
ríodo, portanto, o tributo tinha fi m exclusivamente fi scal porque visava apenas 
a carrear recursos para os cofres do Estado. 
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FGV DIREITO RIO 16
40 ADAMS. Op. Cit., (1) p. 133-134 e (2) 
p.333. 
Sob o ponto de vista histórico das fi nanças públicas em geral, referidadoutrina traz vantagens para a compreensão da evolução do papel do Estado 
nas ordens econômica e social ao longo dos diferentes períodos, enfatizando 
características que seriam distintas em cada época. No entanto, em que pese 
ser possível vislumbrar os pontos positivos da aludida segmentação sob o 
ponto de vista didático, haja vista marcar de forma clara e precisa, em perío-
dos cronologicamente distintos (1) a fi scalidade — fi nanças neutras e tributos 
somente com fi nalidade arrecadatória — de um lado; e a (2) extrafi scalidade 
e a parafi scalidade — fi nanças ativas e os tributos com fi nalidade não ape-
nas arrecadatória, a partir da segunda década do século XX-, de outro lado, 
conforme será examinado abaixo, o estudo de determinados fatos isolados da 
história nos permite afi rmar que a dissociação temporal entre a fi scalidade 
de um lado e a extrafi scalidade de outro apenas facilita a compreensão da 
ênfase da intenção com que os tributos foram utilizados em cada período da 
história, na medida em que os mesmos também foram exigidos com outros 
objetivos que não meramente arrecadatórios em diversos momentos ante-
cedentes ao denominado Estado de Bem-estar Social intervencionista, ou 
seja, de forma não neutra ou com fi ns outros que não meramente “fi scais”, 
ainda que não qualifi cada a política tributária com a denominação referi-
da (“extrafi scalidade”). Nesse sentido apresenta Adams40 diversos exemplos 
históricos, dentre os quais duas passagens emblemáticas, e que se referem, 
respectivamente: (1) à utilização de tributos para infl uenciar a religião, como 
no caso do islamismo na Idade Média e, também, (2) das tarifas aduaneiras 
e o confl ito Norte e Sul que marca a confederação americana no período que 
antecedeu a guerra civil:
(1) Th e humanity in the tax policy of the Moslems was of utmost impor-
tance. Th e Arabs brought peace and gentleness to an overtaxed world. Th ey 
liberated the old Roman world from decadent, oppressive, and corrupt taxation. 
Nothing illustrates better than the tax refunds they made to Christians and Jews 
in Palestine in A.D. 636. At that time the Moslems had conquered most of the 
lands of Judea, but their forces were overextended, and large body of Roman 
troops was on the march from Antioch. At a war council the Moslems decided 
to evacuate most of the conquered territories. After this decision made the Mos-
lem leader called in the chief tax collector and gave him these instructions: ‘ You 
should therefore refund the entire amount of money realized from them that our 
relations with them remains unchanged but that as we are not in a position to 
hold ourselves responsible for their safety, the pool tax, which is nothing but the 
price of protection, is reimbursed to them’. Accordingly, the entire sum collected 
from the Christian and Jewish communities was refunded to them. Th is aff ected 
the Christians to such a degree that tears trickled down their faces and, one and 
all, they passionately exclaimed: ‘May God bring you back to us.’ Th e eff ect on 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
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41 BALEEIRO. Op. Cit., p. 30-31.
the Jews was still more marked. Th ey cried out with vehemence: ‘By the law ant 
the prophets, the Roman emperor shall not take this city as long as the spark of 
life scintillates in our bodies’. It´s too bad the Jews and Moslems today don´t 
feel that way. Th e Moslems used taxation to bring converts into the faith. Th e 
spread of Islam has been attributed to the sword and many historians harp on 
the Moslem cry of ‘Death to the infi del. Th e Koran (9:29) certainly justifi es that 
course of action. In practice, the Moslems acted to the contrary. Slaughter was 
not the normal modus operandi of even the most fanatical Moslems. Vanqui-
shed people were given three choices: death, taxes, or conversion to the faith. 
With these options it was not necessary for conquered people to lose their heads 
or their religion. (…) 
(2) Th e tariff of 1828 was called ‘the tariff of abomination,’ a biblical term 
meaning the greatest evil. Prior to that time the tariff was needed to repay the 
national debt from the wars of 1812 and the revolution itself. By 1832 the na-
tional debt was paid and there was no justifi cation for the import taxes at high 
rates, except to promote a monopoly in the hands of Northern industrialists to 
raise prices for Southern consumers. Th e South exported about three-quarters 
of its goods and in turn used the money to buy European goods which carried 
the high import tax. Th is means that the South paid about three-quarters of all 
federal taxes, most of which were spent in the North. If they didn’t buy foreign 
goods and pay high taxes the alternative was to buy Northern manufactured 
products at excessively high prices. Either way Southern money ended up in the 
North. Th e injustice of this arrangement dominated Southern hostilities toward 
the North. Said one historian: ‘Indignation against the tariff as an unfair tax 
injurious to their economy was general throughout the South’ A southerner, a 
year after the Civil War ended expressed that indignation in a book appropria-
tely clalled Th e lost Cause: ‘ In every measure that ingenuity of avarice devise the 
North exactes from the South a tribute, which could only pay at the expense and 
the character of an inferiour [sic] in the Union’.
Nessa toada, analisando as fi nanças funcionais e a utilização dos im-
postos alfandegários com fi ns extrafi scais em períodos remotos Aliomar 
Baleeiro41 pontua:
Os progressos das ciências econômicas, sobretudo depois do impulso que 
lhes imprimiu a teoria geral de Keynes, refl etiram-se na Política Fiscal e esta, por 
sua vez, revolucionou a concepção da atividade fi nanceira, segundo os preceitos 
dos fi nancistas clássicos. 
Ao invés das ´fi nanças neutras´ da tradição, com seu código de omissão e 
parcimônia tão ao gosto das opiniões individualistas, entendem hoje alguns que 
maiores benefícios a coletividade colhera de ´fi nanças funcionais´, isto é, a ativi-
dade fi nanceira orientada no sentido de infl uir sobre a conjuntura econômica.
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 18
Destarte, o setor público — “a economia pública” não se encolhe numa vi-
zinhança pacífi ca e tímida junto às lindes da economia privada. A benefício 
desta é que deve invadi-la, para modifi cá-la, como elemento compensador nos 
desequilíbrios cíclicos.
Em verdade, a despeito das novidades terminológicas, a ´Política Fiscal´ é 
apenas nova aplicação dos instrumentos fi nanceiros para fi ns ´extrafi scais´. A 
Política Fiscal, no campo econômico, era bem conhecida dos clássicos para o 
protecionismo por meio de impostos alfandegários. Alguns advogam para fi ns 
“sócio-políticos”, como preferia dizer Seligman referindo-se às tendências de refor-
ma social pelo tributo, defendidas por Wagner. Hoje a política anticíclica de modi-
fi cação da conjuntura e da estrutura atrai as atenções em fi nanças extrafi scais.
Ademais, sob o ponto de vista econômico, conforme será analisado na 
Aula 11 sobre a extrafi scalidade, os tributos, em regra, ainda que seja possível 
instituí-los com a intenção apenas de obtenção de recursos para os cofres pú-
blicos, afetam os preços relativos dos bens e serviços, modifi cam a alocação 
dos recursos pelos agentes econômicos, alteram as decisões quanto à melhor 
estrutura de fi nanciamento corporativo, distorce a taxa de retorno de deter-
minada atividade econômica em detrimento de outra, independentemente 
da intenção do exator. Ou seja, a simples existência dos tributos impacta o 
comportamento das pessoas, das famílias, das empresas e da sociedade como 
um todo, motivo pelo qual é ínsito à tributação redefi nir a alocação dos re-
cursos socialmente disponíveis, o que afeta a demanda e a oferta no mercado 
de fatores de produção e de bens e serviços, razãopela qual, economicamen-
te, a extrafi scalidade é inerente e indissociável da denominada fi scalidade. 
Conforme já se pode extrair pelo que acima foi dito, a etapa subseqüente, 
sob o ponto de vista do desenvolvimento histórico das fi nanças, é classica-
mente denominada de “fase de intervencionismo estatal” ou do “tributo com 
fi m extrafi scal”, e corresponde ao resultado da crise do Estado Fiscal do início 
do século XX, em função do descompasso entre a liberdade econômica e a 
realidade social. As desigualdades eram acentuadas, o que criou um grande 
hiato entre o discurso de desenvolvimento econômico sem a participação do 
Estado e o mundo da vida enfrentado por grande parte da massa humana, que 
se via forçada a trabalhar por baixos salários e com péssimas condições de vida. 
Como conseqüência de tal situação, já no século XIX, seguido pelo século XX, 
movimentos sociais surgiram para combater o sistema liberal clássico vigente; 
marcado pelo individualismo exacerbado, momento em que prevaleciam de 
forma absoluta os valores segurança jurídica e liberdade formal. 
Nesse contexto, exsurgiu o denominado Estado de Bem-estar Social, que 
traz a lume novos valores deixados de lado até então no contexto do Estado 
Liberal Mínimo ( ou de polícia ), caracterizado como mero espectador ou 
ordenador distante dos fatos sociais. O Estado Social passa a ser ator decisivo 
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 19
42 ROSA JR. Op. Cit., p. 5-6.
da conduta privada, com fundamento na visão de que a intervenção estatal 
era conditio sine qua non para o alcance da justiça social e da igualdade ma-
terial. Em conexão com esse movimento, os dispositivos orçamentários das 
Constituições de diversos países foram alterados para abranger a intervenção 
do Estado na ordem econômica e social.
Assevera Luiz Emygdio42 que o Estado passou a intervir na iniciativa pri-
vada especialmente pelas seguintes razões:
a) grandes oscilações porque passavam as economias (...); b) crises provo-
cadas pelo desemprego que ocorria em larga escala nas etapas de depressão, ge-
rando grandes tensões sociais; c) efeitos cada vez mais intensos das descobertas 
científi cas e de suas aplicações; e d) dos efeitos originados da Revolução Indus-
trial com o surgimento de empresas fabris de grande porte, com o consequente 
agravamento das condições materiais dos trabalhadores.
Para intervir na economia o Estado precisou criar novos instrumentos, 
dentre eles surgiu, formalmente, a fi gura do tributo com natureza extrafi scal, 
isto é, o tributo deixava de ser reconhecido por seu caráter eminentemente 
arrecadatório para os cofres do Tesouro, para assumir, concomitantemente, a 
feição de mecanismo coercitivo, utilizado pelo Poder Público com o fi m de 
atingir outros objetivos e metas de natureza econômica e social. Nesse sen-
tido, merece trazer como exemplos de medidas impositivas de exação com 
fulcro extrafi scal, as seguintes situações, que variaram ao longo da história: 
1) aumento da alíquota do imposto sobre importação dos bens estrangeiros 
com vistas a fomentar a indústria nacional e garantir as reservas de moedas 
estrangeiras (instrumento auxiliar da política industrial e cambial); 2) redução 
das tarifas aduaneiras com o objetivo de reduzir os preços dos produtos e as 
pressões infl acionárias em âmbito local (instrumento auxiliar da política mo-
netária); 3) adoção de imposto sobre o patrimônio territorial urbano com vis-
tas à desestimular a especulação imobiliária, a má ou não utilização do imóvel 
urbano — vide IPTU progressivo, nos termos do art. 182, §4º, da CRFB/88 
(instrumento auxiliar da política urbanística e de ocupação do solo), etc.
O Estado Intervencionista ( Social ) ganhou força, especialmente por con-
ta dos prejuízos causados pela II Guerra Mundial, período em que havia 
necessidade premente de se otimizar os recursos para fazer face as demandas 
coletivas. No entanto, as exigências sociais impuseram a necessidade de au-
mentos contínuos da carga tributária e da criação de outras fontes de receitas 
para dar cabo às políticas públicas, cada vez mais intervencionistas, impli-
cando despesas crescentes, em especial pela demanda da Segurança Social/
Seguridade Social, abrangendo a Saúde, a Assistência e a Previdência Social. 
De fato, sob infl uência do keynesianismo, o Estado de Bem-estar Social ele-
vou sobremaneira o papel dos tributos, o que redundou no paulatino es-
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 20
43 TORRES. Op. Cit. p. 3-6. Nesse cenário, 
aponta o autor o Estado Liberal clássi-
co, na sua versão minimalista, como 
marco para o surgimento da cultura 
orçamentária, destacando as mudan-
ças ocorridas ao longo de seu percurso 
histórico. Vale dizer que Estado Fiscal no 
período clássico, também denominado 
de Estado Guarda-Noturno, se restrin-
gia basicamente às atividades de poder 
de polícia, à atividade jurisdicional e à 
realização de alguns serviços públicos, 
não exigindo, portanto, grande estru-
tura tributária.
44 COSTA, Leonardo de Andrade. Se-
minário Brasil Século XXI, em 24 de 
outubro de 2001, Brasília. O Direito na 
Era da Globalização. Realização do Con-
selho Federal da Ordem dos Advogados 
do Brasil, p. 117. “Preliminarmente, é 
importante enfatizar que a matéria tri-
butária sempre foi e sempre será con-
troversa pois traz dentro de si aspectos 
jurídicos, econômicos, administrativos, 
e, principalmente, de relações de poder. 
Portanto, sua análise deve ser, necessa-
riamente, multidisciplinar, e o produto 
fi nal será sempre a expressão do sopeso 
entre as diversas variáveis envolvidas, 
além, é claro, da visão de mundo do 
pesquisador. Seu estudo, em face do 
processo de integração de mercados, 
deve ser desenvolvido em duas dimen-
sões: (1) a primeira no que se refere às 
diferentes formas em que se manifes-
ta a integração internacional. Nesse 
ponto, é importante salientar que o 
processo de integração não tem sido, 
historicamente, uniforme, contínuo 
e linear. Daí decorre o primeiro fator 
de complexidade para compreensão da 
questão. Em suma, as diferentes formas 
em que se manifesta o processo inte-
grativo determinam discussões tribu-
tárias de natureza distintas e, sem dú-
vida, os problemas tributários em face 
da criação de um Estado supranacional 
têm grau de complexidade infi nita-
mente superior ao do estabelecimento 
de uma união aduaneira ou de uma 
zona de livre comércio. (2) uma segun-
da dimensão do problema diz respeito 
às questões tributárias propriamente 
ditas. Inquestionável, que o estudo dos 
aspectos tributários em uma economia 
globalizada deve incluir a análise das 
tarifas aduaneiras, dos impostos sobre 
o consumo e, por fi m, a apreciação dos 
impostos diretos.”
45 BALEEIRO. Op. Cit., p.126.
garçamento do modelo do Welfare State, nos termos então estruturados. As 
constantes crises do petróleo, no fi nal dos anos 70, tornaram inviáveis as 
estruturas do Estado Social, o qual carregava pesado fardo da dívida pública 
e de orçamentos desequilibrados e defi citários. As críticas vinham de todos 
os setores; em especial do pensamento liberal extremado, que denunciava o 
aniquilamento da liberdade por meio da exacerbada intervenção estatal na 
economia e do crescente peso dos tributos. 
Com a crise do Estado do Bem-estar Social, confome ensina o professor 
Ricardo Lobo Torres43:
 (...) modifi ca-se novamente o perfi l da Constituição Orçamentária. As que 
já estavam formalmente redigidas, como a da Alemanha, alteram-se substan-
cialmente em sua interpretação. Nos Estados Unidos inicia-se a discussão sobre 
a Emenda tendente criar regra obrigatória de equilíbrio orçamentário. (...). O 
grande problema atual da Constituição Orçamentária consiste em que deve ela 
ser rica e explícita em princípios jurídicos, de modo a permitir a elaboração da lei 
anual doorçamento segundo a ideologia do equilíbrio orçamentário e as idéias 
de economicidade e transparência das despesas, Insista-se em que o aspecto do 
gasto público é que se torna dramático nas fi nanças públicas contemporâneas.
Apesar das acentuadas mudanças ocorridas no sentido da liberalização, pri-
vatização e foco do Estado na regulação da economia, reduzindo a face estatal 
provedora, o denominado neoliberalismo não superou ( e nem poderia! ) de forma 
absoluta o Estado Social. De fato, o processo histórico, assim como o processo de 
integração de mercados44, nunca é uniforme, contínuo e linear, sendo certo que, a 
cada etapa, novas características são incorporadas e diversas facetas do que existia 
no passado continuam a se fazer presente. Daí a complexidade da realidade atual!
Nessa toada, por fi m, importante realçar que o perfi l e as características 
da receita pública foram delineadas de diversas formas ao longo da história, 
destacando-se entre elas, conforme ensina Aliomar Baleerio45: “as extorsões 
sobre povos vencidos; doações (voluntárias) recebidas; recolhimento das ren-
das produzidas pelos bens e empresas do Estado; exigência coativa de tribu-
tos ou penalidades; tomada de emprésti mos forçados, e; fabricação de di-
nheiro metálico ou de papel”. Para o eminente autor essas diferentes formas 
de fi nanciamento da atividade fi nanceira do Estado, que ocorreram ao longo 
da história, podem ser agrupadas ou reduzidas a cinco padrões, não necessa-
riamente sucessivos, a saber: 
1. parasitária: proveniente da ex torsão, pilhagem e exploração contra 
povos ou inimigos vencidos, característica do mundo antigo; 
2. dominial: decorrente da exploração do próprio patrimônio (bens e 
direitos) do Estado, tais como imóveis, terras etc., prática dissemi-
nada no período medieval,; 
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FGV DIREITO RIO 21
3. regaliana: obtida através da exploração dos denominados direitos 
regalianos, assim defi nidos como os privilégios conferidos e reco-
nhecidos aos reis e príncipes para explorar certos serviços ou con-
ferir esses direitos a terceiros em troca de pagamento ao Estado de 
uma determinada con tribuição (regalia); 
4. tributária: obtida coativamente ou coercitivamente e que passaram 
a ser a principal fonte de receita pública, e; 
5. so cial: caracterizada pela utilização do tributo não somente como 
meio para obtenção de receita, mas, também, com fi ns extrafi scais, 
isto é, objetivando infl uenciar e modifi car a ordem econômica e 
sócio-política.
QUESTIONÁRIO: 
Conceitue a atividade fi nanceira do Estado, determinando e diferen-
ciando, ainda, o escopo e o objeto de estudo do Direito Financeiro e do 
Direito Tributário.
EXERCÍCIO: 
No dia 31.12.2007 “X” possuía situação patrimonial nos seguintes ter-
mos: (1) R$ 100.000,00 (cem mil reais em caixa); (2) R$ 200.000,00 
(duzentos mil reais) em contas a receber de seus clientes — todas com 
vencimento no ano de 2009; (3) R$ 300.000 (trezentos mil reais contabi-
lizados como ativo permanente imobilizado para a realização de sua ativi-
dade); (4) R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) de dívidas com fornecedores. 
Durante o exercício de 2008, até 31.12.2008, “X” auferiu receitas totais 
no montante de R$ 700.000,00 (quinhentos mil reais) em dinheiro e rea-
lizou pagamentos no montante de R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil 
reais) entre custos e despesas para realização da sua atividade bem como 
no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) para quitação de parte de 
sua dívida com fornecedores. Desconsiderando a existência de impostos 
e outros encargos, e tendo em vista a existência no fi nal do período dos 
mesmos R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) em contas a receber de seus 
clientes e o mesmo ativo permanente, apresente a situação patrimonial 
líquida de “X” em 31.12.2007 e em 31.12.2008. Se não tivesse havido o 
pagamento no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) para quitação 
de parte de sua dívida com fornecedores haveria alteração na situação pa-
trimonial líquida em 31.12.2008?
DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANÇAS PÚBLICAS I
FGV DIREITO RIO 22
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FGV DIREITO RIO 24
AULA 2 – O ESTADO FINANCEIRO, A REPÚBLICA E O FEDERALISMO 
FISCAL. A DISTRIBUIÇÃO DE FUNÇÕES ENTRE OS PODERES E A 
ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO NA FEDERAÇÃO.
Examinados os aspectos gerais do curso, especifi cado o conceito de ati-
vidade fi nanceira do Estado, bem como o que se entende por necessidades 
públicas, e tendo sido, ainda, abordada, em linhas gerais, a história dos tribu-
tos e das Finanças Públicas, cumpre agora avançar no estudo dos elementos 
essenciais à compreensão da matéria. Nesse sentido, cumpre ressaltar que a 
realização da despesa e a gestão fi scal e patrimonial do Estado moderno sus-
citam a elaboração, a aprovação, a execução e o controle do orçamento, o que 
pressupõe, necessariamente, a existência de receita pública. 
Antes, porém, do estudo individualizado da despesa, da receita, das opera-
ções de crédito, da dívida pública, da elaboração, a aprovação, a execução e o 
controle do orçamento, o que se efetivará ao longo da primeira parte do cur-
so, impõe-se agora o exame de algumas características

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