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Sociologia Clássica

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A letra grega , adotada universalmente 
para simbolizar o prefixo “micro” (pequeno), 
é usada nesta obra para representar o con-
junto das disciplinas relacionadas à área de 
ciências sociais, em que se estudam aspectos 
sócio-históricos dos grupos humanos.
sociologia clássica
Ficha técnica Editora Ibpex
Diretor-presidente
Wilson Picler
Editor-chefe
Lindsay Azambuja
Editores-assistentes
Adriane Ianzen 
Jerusa Piccolo
Análise de informação 
Silvia Mara Hadas
Revisão de texto 
Alexandre Olsemann
Capa
Bruno Palma e Silva
Projeto gráfico 
Raphael Bernadelli
Diagramação 
Bruno de Oliveira
Iconografia
Danielle Scholtz
Conselho editorial 
Editora Ibpex 
Ivo José Both, Dr. (presidente)
Elena Godoy, Dr.a
José Raimundo Facion, Dr.
Sérgio Roberto Lopes, Dr.
Ulf Gregor Baranow, Dr.
Obra coletiva organi-
zada pela Universidade 
Luterana do Brasil (Ulbra).
Informamos que é de 
inteira respon sabilidade 
dos autores a emissão de 
conceitos. 
Nenhuma parte desta 
publicação poderá ser 
reproduzida por qualquer 
meio ou forma sem a pré-
via autorização da Ulbra.
A violação dos direitos 
autorais é crime estabe-
lecido na Lei nº 9.610/98 
e punido pelo art. 184 do 
Código Penal.
S678 
Sociologia clássica / [Obra] organizada pela 
Universidade Luterana do Brasil (Ulbra). – 
Curitiba : Ibpex, 2008.
200 p.: il. 
ISBN 978-85-7838-048-9
1. Sociologia. 2. Durkheim, Émile, 1858-1917. 3. 
Weber, Max, 1864-1920. 4. Marx, Karl, 1818-1883. I. 
Universidade Luterana do Brasil. II. Título.
CDD 301
20. ed.
apresentação
Este livro de sociologia clássica foi elaborado como mate-
rial didático especialmente para você, aluno(a) de educa-
ção a distância da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra). 
Busca proporcionar uma leitura que subsidie o aprendi-
zado dessa importante disciplina das ciências sociais, apre-
sentando seu processo de formação e as obras de um seleto 
grupo de autores considerados clássicos da sociologia: 
Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx. Você pode estar 
se perguntando: qual a importância de estudarmos autores 
So
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vi
que escreveram suas obras a mais de um século atrás? As 
obras dos autores clássicos, apesar de terem sido produ-
zidas em outros contextos históricos e sociais, preservam 
sua atualidade ao passo que suas interpretações detêm um 
longo alcance e significação teórica, constituindo-se por 
essa razão em pontos de referência para questionamento e 
investigações sobre os processos contemporâneos. Ou seja, 
encontramos nos autores clássicos da sociologia um debate 
indispensável à interpretação dos processos e dos fenôme-
nos sociológicos do presente. A melhor maneira de conhe-
cer um clássico é lê-lo e não recorrer a releituras de outros. 
Então fica um primeiro aviso importante para você: a lei-
tura deste material não o dispensará de ler diretamente os 
textos dos autores que aqui fazemos referência. Isso será 
de fundamental importância para que você obtenha uma 
sólida formação em ciências sociais. Afinal de contas, a pro-
fissão de cientista social tem na teoria um elemento indis-
pensável ao seu desempenho prático, além de ser compo-
nente fundamental do exercício de sua autoridade.
O presente livro está organizado em dez capítulos. No 
primeiro discute-se o processo de gênese da sociologia, 
apontando-lhe sua definição, seus precursores e sua cons-
tituição a partir de Auguste Comte. Os seguintes apresen-
tam as obras de Durkheim, Weber e Marx, desenvolvendo 
uma mesma estruturação lógica para cada um dos auto-
res: um capítulo abordando a vida e obra e uma proposta 
metodológica, outro expondo suas categorias e conceitos 
sociológicos fundamentais e um terceiro no qual discuti-
mos sobre uma obra do autor como forma de incentivar 
você a aventurar-se na leitura do texto original.
Desse modo, nos capítulos 2, 3 e 4 você conhecerá o tra-
balho de Émile Durkheim e sua sociologia funcionalista. 
Nos capítulos 5, 6 e 7 você terá contato com a obra de Max 
A
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ta
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vii
Weber, que inaugura a sociologia compreensiva. Por fim, 
nos capítulos 8, 9 e 10, verá a contribuição de Karl Marx e 
seu materialismo histórico e dialético.
É necessário, ainda, uma nota de esclarecimento 
sobre os motivos que nos levaram a focar os autores nessa 
seqüên cia, com a apresentação da perspectiva marxista no 
final, apesar de Marx ter produzido em período anterior a 
Durkheim e Weber, contemporâneos um do outro. A razão 
para isso é didática e visa facilitar a compreensão de cada 
uma das propostas teórico-metodológicas a partir de sua 
contraposição.
Assim, começaremos o estudo pela perspectiva objeti-
vista da realidade social, que enfatiza as determinações das 
estruturas sociais sobre os fenômenos sociológicos presen-
tes na obra de Durkheim. Em contraste a essa abordagem, 
é apresentada uma proposta acentuadamente subjetivista 
desenvolvida por Weber, cujo foco da análise recai sobre 
o indivíduo e o sentido por este atribuído à ação social 
como definidor do objeto sociológico. Deixamos, assim, 
Marx para o final, porque o seu método dialético incorpora 
simultaneamente os fatores objetivos e subjetivos e analisa 
as dimensões da estrutura e da ação social na determina-
ção das relações sociais.
Parece complicado? Em certa medida é mesmo. A 
sociologia é uma ciência complexa que resiste a simplifica-
ções. Por isso, um segundo aviso. Faça uma leitura atenta 
deste material e, se for necessário, leia-o mais de uma vez. 
Sublinhe o que considerar relevante. O livro é seu! Interaja 
com ele. Anote as idéias principais e tire as dúvidas com 
seu tutor. Aqui você encontrará as três matrizes epistemo-
lógicas e teóricas pelas quais a sociologia vem se desenvol-
vendo até os tempos atuais. Esperamos que você possa se 
apropriar de cada uma delas. Tenha uma boa leitura! 
Prof. Nilson Weisheimer
sumário
( 1 ) A gênese da sociologia, 13
1.1 O que é sociologia?, 16
1.2 Os precursores da sociologia, 19
1.3 Determinantes do surgimento da sociologia, 25
1.4 A sociologia de Auguste Comte, 29
( 2 ) Introdução à obra de Émile Durkheim, 35
2.1 Émile Durkheim: vida e obra, 38
2.2 Objeto da sociologia de Durkheim, 41
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2.3 O método funcionalista, 43
( 3 ) Durkheim: categorias sociológicas fundamentais, 53
3.1 Organização social e formas de solidariedade, 56
3.2 Coesão e anomia através do estudo sociológico do suicídio, 61
3.3 O conceito de representações coletivas, 65
( 4 ) Sobre Educação e sociologia, de Émile Durkheim, 71
4.1 Educação: sua natureza e função, 74
4.2 Natureza da pedagogia e seu método, 82
4.3 Pedagogia e sociologia, 86
( 5 ) Introdução à obra de Max Weber, 89
5.1 Max Weber: vida e obra, 92
5.2 Objeto da sociologia de Weber, 95
5.3 O método compreensivo, 97
( 6 ) Weber: categorias sociológicas fundamentais, 103
6.1 Tipologia weberiana da ação, dominação e legitimidade, 106
6.2 Teoria da estratificação social, 113
( 7 ) Sobre: A ética protestante e o “espírito” do capitalismo, de 
Max Weber, 119
7.1 O problema: confissão religiosa e estratificação social, 122
7.2 O “espírito” do capitalismo, 125
7.3 O conceito de vocação em Lutero: o objeto da pesquisa, 128
7.4 Os fundamentos religiosos da ascese intramundana, 130
7.5 Ascese e capitalismo, 136
( 8 ) Introdução à obra de Karl Marx, 141
8.1 Karl Marx: vida e obra, 144
8.2 O objeto de pesquisa de Marx, 147
8.3 O método materialista histórico e dialético, 150
( 9 ) Marx: categorias sociológicas fundamentais, 157
9.1 Teoria do modo de produção capitalista, 160
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9.2 Formação social,162
9.3 Infra-estrutura e superestrutura, 163
9.4 Forças produtivas e relações sociais de produção, 167
9.5 Processo de trabalho, 168
9.6 Classes sociais, 170
9.7 Luta de classes, 171
( 10 ) Sobre: o Manifesto do Partido Comunista, de Marx e 
Engels, 175
10.1 O contexto, 178
10.2 A obra, 180
10.3 Nosso objeto: “burgueses e proletários”, 181
Glossário, 191
Referências por capítulo, 193
Referências, 197
Gabarito, 199
( 1 )
a gênese da sociologia
Nilson Weisheimer tem graduação em Ciências 
Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do 
Sul (UFRGS) (2001), mestrado (2004) e doutorado 
(2008) em Sociologia também pela UFRGS. Atuou 
como docente no Departamento de Ciências Humanas 
na Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) e no 
Departamento de Sociologia do IFCH/UFRGS. Possui 
livros, capítulos de livros e artigos publicados nas temá-
ticas de sociologia, juventude, gênero e políticas públicas. 
Atualmente, atua como professor-pesquisador no curso 
Graduação Tecnológica em Planejamento e Gestão para 
o Desenvolvimento Rural da UFRGS e é professor coor-
denador dos cursos de Ciências Sociais da Universidade 
Luterana do Brasil (Ulbra). 
( )
“Em toda a ciência o difícil é o começo.”
(MARX, 1983, p. 9)
os seres humanos vivem em sociedade. Passamos a 
maior parte de nossas vidas interagindo com outras pes-
soas e em grupos sociais, como membros de uma família, 
moradores de um bairro, trabalhadores de uma empresa e 
cidadãos de uma nação. Vamos à escola, saímos com ami-
gos, namoramos uma pessoa, casamos e, assim, repro-
duzimos a sociedade, e esta se reproduz em nós. Quase 
Nilson Weisheimer
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tudo em nossas vidas é socialmente construído. Elementos 
como a linguagem, os valores, as modas, os nossos gos-
tos alimentares ou musicais resultam das nossas interações 
com outras pessoas. Compreender e explicar os fenômenos 
sociais é tão importante quanto saber diagnosticar correta-
mente uma doença para buscar a cura para um mal físico. 
O desemprego, a miséria, as desigualdades e as guerras 
são patologias sociais que também podem levar a morte 
não apenas de um indivíduo, mas de toda uma coletivi-
dade. Desse modo, a necessidade de responder às questões 
suscitadas pela vida em sociedade tem sido expressa pela 
humanidade desde os tempos mais remotos. Entretanto, 
apenas a pouco mais de um século vem se produzindo um 
conhecimento científico sobre a sociedade.
Neste capítulo, veremos como ocorreu o desenvol-
vimento histórico do pensamento social que resultou na 
sociologia, apresentaremos uma definição para essa ciên-
cia, conheceremos seus precursores, identificaremos o con-
texto social que determinou seu surgimento e as idéias de 
Auguste Comte, o fundador da disciplina. 
(1.1)
o que é sociologia?
Podemos dizer que a sociologia é a ciência que estuda a 
sociedade. Mesmo essa definição simples não pode ser 
subestimada, pois traz noções complexas como ciência, 
estudo e sociedade. Vale a pena refletirmos sobre elas, por-
que trazem questões importantes à prática sociológica.
A ciência é uma forma especial de conhecimento que 
se difere de outras modalidades do saber, como o senso 
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comum, o religioso, o filosófico e o artístico. Isso não quer 
dizer que seja melhor ou pior que outras formas de conhe-
cimento; cada uma delas tem sua legitimidade. Significa 
apenas que a ciência é diferente porque é um conheci-
mento construído a partir de procedimentos metódicos 
com propósitos empíricos e operacionais que proporciona 
um saber que evolui de modo cumulativo. Os dois pos-
tulados básicos da ciência são: a) trata-se de um conheci-
mento do geral e não do particular; b) é o conhecimento 
do oculto, do que está encoberto pelas aparências do fenô-
meno. Esses aspectos implicam uma postura própria do 
cientista que busca promover a transparência do processo 
de produção do conhecimento e manter um permanente 
estado de alerta, ou seja, uma postura crítica diante da apa-
rência das coisas e, por isso, o cientista busca descobrir a 
essência delas. Seus procedimentos básicos são: 1) embasa-
mento teórico, 2) observação de fenômenos, 3) construção 
de hipóteses, 4) teste das hipóteses e 5) generalização dos 
resultados.
O estudo é uma ação que consiste em orientar os esfor-
ços para aplicar a inteligência para aprender. Isso implica, 
em primeiro lugar, uma atitude curiosa perante os fatos 
exteriores a fim de apreendê-los em nosso ser consciente. 
Isso ocorre porque o processo do conhecimento não se dá 
automaticamente pela assimilação. É preciso ação consci-
ente orientada para determinado fim. Nesse sentido, não 
basta uma postura de curiosidade ingênua, faz-se necessá-
rio um estado de atenção rigorosa da consciência. O edu-
cador brasileiro Paulo Freire considerava o “espantar-se” 
como uma ação fundamental para construção do pensa-
mento1. Assim, estudar implica uma postura curiosa deri-
vada da tentativa de compreensão do mundo e motivada 
pela razão. 
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A sociedade também é uma noção bastante com-
plexa. Essa palavra tende a expressar, de modo amplo, a 
idéia de totalidade de seres humanos na terra em conjunto 
com suas culturas, instituições, normas, idéias e valores. 
É de fato uma associação que assegura a vida humana. 
A sociedade é formada por indivíduos, e estes são cons-
tituintes da sociedade. Ambos se encontram imbricados, 
não sendo possível considerar os termos indivíduo e socie-
dade separadamente. Ou você consegue conceber a idéia 
de um sem o outro? É claro que não! Porque não há socie-
dade sem indivíduos e, analogamente, não há indivíduos 
sem sociedade2. 
Em sociedades, as pessoas estabelecem relações entre 
si, independentemente de sua vontade ou consciência sobre 
isso. Essas relações, que são tanto de cooperação quanto 
de conflito, asseguram a produção dos modos de vida, 
as idéias e a história. Assim, nós, seres humanos, somos, 
simultaneamente, produto e produtores da sociedade, que 
é sempre historicamente situada.
Podemos retomar nossa formulação inicial identifi-
cando a sociologia como a ciência da produção, reprodução 
e transformação das relações sociais. Ou seja, seu objeto 
de estudo são as interações humanas e os produtos destas 
em constante processo de transformação. Não há uma defi-
nição única de sociologia porque esse ramo particular da 
ciência varia conforme a abordagem teórica adotada, con-
tudo tem como objeto de estudo os fenômenos sociais. A 
sociologia é uma ciência humana e histórica e uma disci-
plina das ciências sociais. Ela se difere das demais ciên-
cias naturais e exatas porque o sujeito pesquisador possui 
a mesma natureza que seu objeto de estudo, já que ele pró-
prio é membro da sociedade. Isso implica reconhecer que 
as categorias, objetos e métodos de análise são social e 
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historicamente construídos. 
Conforme o sociólogo brasileiro Alberto Guerreiro 
Ramos, a sociologia em países como o Brasil deveria ser 
conduzida de modo a cumprir dois propósitos: a) elabo-
rar idéias, conceitos e teorias com que a nação possa com-
preender-se a si mesma e b) decifrar objetivamente os seus 
problemas3. Para tanto, esse autor preconizava a análise 
crítica e a seleção de esquemas teórico-metodológicos ela-
borados em outros contextos sociais. Esse é um desafio que 
você também está convidado a enfrentar. Iniciamos essa 
empreitada conhecendo alguns autores que contribuíram 
para o surgimento do pensamento social.
(1.2)
os precursores da sociologia
Antes do surgimento das ciências sociais, diversos pensa-
dores, filósofos, religiosose enciclopedistas produziram 
idéias sobre suas sociedades e tentaram encontrar solu-
ções aos problemas de sua época. Apresentaremos alguns 
 desses autores que contribuíram para o acúmulo do conhe-
cimento, construindo a herança intelectual que resultou na 
nova ciência. São eles os precursores da sociologia.
Os precursores helênicos
Por volta do século V. a.C., surge na Grécia uma forma 
especial de pensar que ficou conhecida como filosofia. Entre 
os filósofos gregos, Platão e Aristóteles destacam-se como 
analistas dos processos políticos e sociais de sua época, 
deixando-nos um legado histórico valioso.
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Platão (429-347 a.C.), discípulo de Sócrates e funda-
dor da Academia, escreveu as obras A república, As leis e 
O governante, que abordam a organização jurídica, política 
e social, redigindo seus textos em forma de diálogos. Em 
A república a partir de um diálogo, elaborou um tratado 
acerca da sociedade ideal, num texto regido pelo princípio 
da justiça4. Em As leis, buscou, entre outras coisas, estabele-
cer as relações entre condições demográficas e geográficas 
com as leis e as características da vida social dos povos.
Aristóteles (384-322 a.C.), discípulo de Platão, escre-
veu a mais conhecida obra da filosofia grega chamada A 
política. Para tanto, ele estudou mais de 150 constituições 
políticas das cidades gregas e outras forjando a noção 
de que “o homem é um animal político” (Anthropom zom 
politikon)5. Ele estabeleceu a política como uma ciência que 
tem por objeto a felicidade, a qual envolveria as dimensões 
da ética (que tem como objetivo a felicidade humana indi-
vidual na pólis) e a política como prática (que visa estabele-
cer a felicidade coletiva da pólis). Nessa obra, ele identificou 
três tipos de sistemas de governo considerados normais: a 
monarquia, a aristocracia e a república; nesse viés, ainda 
contrapôs outros três tipos de desvios governos: a tirania, 
a oligarquia e a demagogia.
Os precursores medievais
A cultura ocidental conheceu na Idade Média o predomí-
nio do cristianismo como doutrina e explicação do mundo, 
segmento no qual Deus era concebido como “consciên-
cia única”. Nesse contexto, os chamados doutores da Igreja 
elaboraram tratados com conteúdos filosóficos e histó-
ricos. Entre os autores desses textos, destacam-se Santo 
Agostinho e São Tomás de Aquino. 
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Santo Agostinho (354-430), teólogo africano, escre-
veu A Cidade de Deus, concebida como uma obra teoló-
gica. Segundo Trujillo Ferrari, Agostinho buscou explicar 
a queda do Império Romano como resultado da luta entre 
a sociedade humana e a sociedade divina (pondo em movi-
mento toda a história da humanidade) e que a luta entre 
ambas culminara inevitavelmente com a vitória da Cidade 
de Deus.6
São Tomás de Aquino (1225-1274) escreveu a Summa 
Teológica, obra na qual analisa a sociedade como meio natu-
ral do homem, que visa atender às suas finalidades vitais. 
Ainda de acordo com Trujillo Ferrari, Aquino defendeu 
da cidade como ambiente ideal para vida humana, que se 
encontra orientada para o “bem comum”, permitindo mais 
facilmente uma aproximação dos homens com Deus.7
Os precursores renascentistas
O Renascimento marca uma nova etapa na história da 
humanidade com o deslocamento do obscurantismo reli-
gioso, fazendo emergir a primazia da razão e constituindo 
uma ruptura com a Idade Média. Esse período é caracte-
rizado por grandes transformações sociais, científicas, 
culturais, religiosas e políticas, que resultam na consti-
tuição de uma nova visão do mundo e do homem. Com 
base na idéia de que a razão deve orientar a ação humana, 
desenvolve-se uma filosofia política, na qual autores como 
Niccolò Machiavelli, Thomas Hobbes e John Locke escre-
veram sobre política, filosofia e economia, áreas analisadas 
com base em elementos empíricos. 
Niccolò Machiavelli (1469-1527), nasceu em 
Florença, foi jurista e diplomata e é reconhecido como fun-
dador da ciência política. Em seus trabalhos, encontram-se 
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os fundamentos do estado moderno e as lutas pelo poder 
político. Suas obras mais conhecidas são O príncipe e 
Discurso sobre a primeira década de Tito Livio. A primeira obra 
consiste em um tratado sobre o poder político, apontando 
como o soberano deveria agir para conquistar e manter o 
poder político8. Na segunda, ele argumenta que entre as 
forças que agem sobre o Estado estão a tradição, a religião, 
as ideologias e as classes sociais, as quais determinam os 
rumos do governo e as decisões do governante.9
Thomas Hobbes (1588-1679), filósofo inglês de inclina-
ção materialista, escreveu A cidade e Leviathan, seu mais 
famoso livro. Neste, argumentava que os homens, para 
sair do estado de natureza, que se caracteriza por uma 
luta de todos contra todos, estabelecem um contrato social 
entre si, abdicando do uso da violência a favor do Estado, 
descrito como o Leviathan, cujo poder soberano é o único 
capaz de manter a ordem social10. Além da observação 
empírica, Hobbes utilizou-se do método comparativo em 
suas análises.
John Locke (1632-1704), um dos mais influentes empi-
ristas britânicos, foi autor de Dois tratados sobre o governo 
e Ensaio sobre o entendimento humano. No primeiro, é exa-
minada a teoria do contrato social, desenvolvendo a idéia 
de que a soberania é revertida ao povo em todos os casos 
em que o rei se transforma em tirano. Sustentando que o 
estado natural do indivíduo é a liberdade, funda as bases 
do individualismo liberal. Na segunda obra, propõe-se 
que a experiência é a fonte do conhecimento e que ela se 
desenvolve por esforço da razão.11 Seu trabalho influenciou 
os iluministas por suas proposições que condizem ao cien-
tificismo e ao liberalismo.
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23
Os precursores cientificistas
O desenvolvimento filosófico e o racionalismo conduziram 
ao Iluminismo e ao Humanismo no século XVII, que seriam 
as principais influências intelectuais da sociologia. Essas 
doutrinas sustentavam-se na idéia de que a razão ilumina-
ria o futuro da humanidade e que esta atingiria a verdade 
sobre as coisas por meio de um método fundado na expe-
riência sensível dos objetos empíricos. Tal procedimento 
viria a ser caracterizado como o cientificismo que apregoa 
o método indutivo para a construção do conhecimento, 
constituindo-se em uma ruptura definitiva com a religião 
e saberes especulativos. Entre seus diversos representan-
tes destacamos os franceses Charles Louis de Montesquieu, 
Jean-Jacques Rousseau e Henri de Saint-Simon.
Charles Louis de Montesquieu (1689-1755), aris-
tocrata francês, produziu textos sobre filosofia e política. 
Entre suas obras, destacam-se Do espírito das leis, As cartas 
persas e Considerações sobre as causas da grandeza dos roma-
nos. Na primeira obra referida, desenvolve-se a noção de 
causalidade social, afirmando que as leis são as “relações 
necessárias que derivam da natureza das coisas”12. A natu-
reza das leis causais das relações humanas seria originada 
por dimensões físicas e morais. Para ele, existem quatro 
leis fundamentais: a) a necessidade da paz, b) a satisfação 
da fome, c) a necessidade de sexo e d) o desejo de viver em 
sociedade13. 
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), um dos mais 
famosos enciclopedistas franceses, foi um dos ideólogos da 
Revolução Francesa e um precursor direto da sociologia. 
É autor de inúmeras obras, das quais se destaca: Discurso 
sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os 
homens, Do contrato social e Émile. Na primeira, há a análise 
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das contradições sociais, demonstrando que as desigual-
dadese a injustiça resultam diretamente das disputas e da 
imposição de hierarquias sociais que não corresponderiam 
aos papéis desempenhados pelos grupos na produção da 
sociedade. Dessa forma, a organização social apenas leva-
ria a corrupção e ao não desenvolvimento das potencialida-
des humanas14. Em seu segundo trabalho, ele desenvolveu 
o conceito de contrato social, admitindo ser impossível o 
retorno ao antigo estado de natureza, diferenciando-se das 
abordagens dos autores ingleses que afirmavam um libera-
lismo individualista. Rousseau estabeleceu o que seria um 
primado da sociologia francesa ao afirmar que a sociedade 
como um todo é necessariamente diferente do que a sim-
ples soma das partes. Difundiu ainda que Estado legítimo 
resultaria da vontade geral, quando a soberania do poder 
se encontrar nas mãos do povo, por meio do corpo polí-
tico dos cidadãos15. Émile é uma obra que esboça os funda-
mentos de uma pedagogia para o exercício da cidadania; 
em formato romanceado, constitui-se um tratado de edu-
cação laica. Ela antecipou temas que seriam retomados por 
Durkheim, como a socialização das novas gerações, ante-
cedendo os debates de uma sociologia da juventude.
Henri de Saint-Simon (1760-1825), conde francês, ade-
riu ainda na juventude ao movimento revolucionário, sendo 
precursor da sociologia e do socialismo, entendidos por ele 
como duas faces de um mesmo empreendimento. Segundo 
sua teoria, a sociedade está em constante movimento, e as 
transformações históricas resultam da luta entre as classes 
sociais. Estas seriam a classe dos produtores (cientistas, 
industriais, banqueiros, operários e camponeses) e a classe 
dos não produtores (nobreza, clero, militares). Em Mémoire 
sur la scienc de L’homme, estabeleceu as bases para a criação 
de uma ciência da sociedade a qual denominou de física 
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social, cujo objeto seria o estudo científico da sociedade 
em ato. Em Catéchisme des industriels, defendeu um novo 
sistema social baseado no governo dos sábios e dos cien-
tistas, o qual chamou de industrialismo, que emergiria da 
solidariedade entre produtores e se constituiria segundo 
o lema “de cada um conforme sua capacidade, a cada um 
conforme sua necessidade”. 
A evolução do pensamento social se caracterizou pelo 
deslocamento das explicações teológicas em direção a 
uma abordagem da sociedade enquanto realidade empi-
ricamente constituída. Com efeito, a herança intelectual 
da sociologia vem da filosofia da história, da filosofia polí-
tica e da filosofia social. Seu desenvolvimento foi marcado 
por um processo de secularização dos modos de conhecer 
e explicar o mundo fundamentado na razão e na observa-
ção crítica da realidade, criando as condições para a eclo-
são da sociologia.
(1.3)
determinantes do surgimento da 
sociologia
A sociologia nasce como resultado das profundas mudan-
ças que marcam a passagem do feudalismo ao capitalismo, 
que ocorreu entre os séculos XVI ao XVIII, distinguindo-se 
do pensamento social anterior. Esse processo é resultado 
de três revoluções que transformaram a cultura, a econo-
mia e a política, modificando definitivamente a história da 
humanidade. São elas: a Pimeira Revolução Científica, a 
Revolução Industrial e a Revolução Francesa.
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Figura 1 – Transformações da passagem do feudalismo ao capitalismo
Transformações
Econômicas Culturais Políticas
Revolução 
Industrial
Revolução 
Científica
Revolução 
Francesa
Capitalismo
Feudalismo
A Primeira Revolução Científica, ocorrida nos séculos 
XVI e XVII, inaugurou a ciência moderna, que teve como 
prenúncio o surgimento de uma nova cosmologia, que 
passa ria à visão heliocêntrica de Copérnico (1473-1543), que 
afirmava que a Terra não era o centro do universo. Isso pos-
sibilitou posteriormente os preceitos de Bacon (1561-1626), 
as concepções de Descartes (1596-1650) e as descobertas de 
Galileu (1564-1642), produzindo um novo elemento no espí-
rito humano: a ciência como reveladora da realidade. Isso 
resultou na emergência de uma visão mecanicista e redu-
cionista de universo, concebendo todas as realidades como 
similares aos mecanismos de um relógio com engrenagens 
em conexão. Desse modo, bastaria conhecer o funciona-
mento de cada uma das partes para controlá-lo e direcio-
ná-lo, e esse conhecimento se faria pela redução. Ou seja, 
conhecendo cada uma das partes, é possível compreender 
o todo. Os achados do mecaniscismo possibilitaram, um 
século depois, o desenvolvimento de novas tecnologias que 
levariam a inventos revolucionários, como o tear mecânico, 
em 1733, e a máquina a vapor, desenvolvida entre 1761 e 
1768, o que abriria caminho à Revolução Industrial.
Esta teve início na Inglaterra do século XVIII e não 
demorou a expandir-se pela Europa. Desestabilizou a 
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antiga ordem feudal baseada nas relações servis, com a 
introdução da máquina no processo de produção, a modi-
ficação das relações de trabalho, a complexidade das hie-
rarquias sociais e as diferenciações entre os membros da 
sociedade. De um lado, a burguesia se consolidou como 
a classe detentora do poder econômico, de outro, desen-
volveu-se o proletariado como a camada mais numerosa 
da população, convertida em trabalhador livre. Tão livre 
que os trabalhadores não tinham mais acesso aos meios 
de produção. A dinâmica capitalista transformou tudo 
em mercadoria, inclusive a força de trabalho humana. 
Esta passou a ser vendida em troca de salário, impondo 
à classe operária jornadas de trabalho que chegavam a 16 
horas diárias, com remuneração que não garantia a sobre-
vivência nas mesmas condições anteriores. Com efeito, 
em paralelo ao crescimento econômico, a industrialização 
produziu mazelas sociais devido à exploração dos traba-
lhadores e a uma urbanização acelerada, sem as condições 
sanitárias e habitacionais necessárias à crescente popu-
lação das cidades. Essas mudanças contribuíram para o 
agravamento dos problemas sociais, aumentando a pros-
tituição, o alcoolismo, o infanticídio, o suicídio, a fome e 
a miséria material e moral das famílias. Os trabalhado-
res aglomeravam-se em casebres, e os esgotos eram valas 
que ficavam a céu aberto. Proliferavam epidemias de tifo e 
cólera. Devido a essas condições, grande parte da popula-
ção urbana era dizimada, aumentando o clima de revolta 
e a violência social.16
Uma vez constituída em classe economicamente domi-
nante, a burguesia buscou ser também a classe politica-
mente dominante. O marco da ascensão burguesa ao poder 
político foi a Revolução Francesa, ocorrida em 1789. Ao 
constituir um Estado independente da Igreja, a burguesia 
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protegeu e incentivou a empresa capitalista. Confiscou 
as propriedades da Igreja, suprimiu os votos monásticos, 
criou instituições civis, transferiu as funções da educação 
para o Estado, aboliu as corporações de ofício, limitou os 
poderes patriarcais na família, defendeu uma divisão igua-
litária da propriedade e mudou as leis, os usos e os cos-
tumes. Ao tomar o poder após a revolução, o movimento 
Iluminista dividiu-se em dois grupos. Os jacobinos, por 
um lado, tidos como revolucionários radicais, pretendiam 
levar a revolução até as últimas conseqüências. Igualdade, 
liberdade e fraternidade para todos os homens era a ban-
deira do movimento, que contrariava os interesses do setor 
da burguesia ligado à família dos Bourbon, tida como con-
servadora. Esses, por outro lado, defendiam a necessidade 
de frear o ímpeto dos trabalhadores para controlar e neu-
tralizar novos surtos revolucionários. Os trabalhadores 
deveriam assumir, na nova sociedade industrial francesa, 
suas funções e postosnas fábricas. Eles se sentiam traí-
dos pela causa da revolução e pelos iluministas, situação 
que gerou revolta e se converteria em movimento operário 
autônomo de matizes anarquistas, socialistas e posterior-
mente comunistas.
Diante desse quadro, os intelectuais representantes da 
burguesia sentiram a necessidade de atualizar suas teorias 
sociais. Visando promover a estabilização social, eles bus-
caram identificar as leis que regem a vida social. Tal rea-
lização somente seria possível através de uma ciência da 
sociedade. Surge então a sociologia como uma explicação 
científica para os processos de transformação social que 
ocorriam na Europa. As questões da transformação e da 
conservação da ordem social eram tidas como questões 
sociológicas centrais. 
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(1.4)
a sociologia de Auguste Comte
Auguste Comte, francês, nascido em Montpellier, em 1798, 
passou a maior parte de sua vida em Paris, onde mor-
reu em 1857. Foi por muitos anos aluno e colaborador de 
Saint-Simon, com quem rompeu por divergências polí-
ticas e metodológicas. Enquanto Saint-Simon percebia 
na ciência uma atividade revolucionária, Comte assumia 
uma posição conservadora e defendia a neutralidade do 
cientista. Ambos compartilham o mérito de fundarem a 
sociologia, mas foi Comte quem a batizou com esse nome. 
e estabeleceu seu objeto. Ele forjou uma palavra híbrida, 
tomando do latim o termo socio, que exprime a idéia de 
“social”, e do grego o termo logos, que significa “estudo”. 
Etimologicamente sociologia quer dizer “estudo do social”. 
A sociologia é definida por ter como objeto de estudo os 
fenômenos sociais, considerados empiricamente do mesmo 
modo como os fenômenos naturais. Segundo a sociologia 
positivista, os fenômenos da sociedade devem ser obser-
vados e a partir daí deve-se estabelecer as relações mútuas 
para se chegar às leis gerais e invariáveis.
Para esse autor, a sociedade é uma totalidade dividida 
em segmentos ou classes que se relacionam de maneira está-
tica, seguindo uma ordem fixa suscetível de ser apreen dida 
pela sociologia. Para ele, “há uma ordem imutável na natu-
reza e o conhecimento o reflete”17. Nesse sentido, a história 
é guiada por dois princípios: o da ordem (transformações 
ordenadas e contínuas) e do progresso (desenvolvimento 
que reflete melhoramentos lineares e contínuos). Para que 
o desenvolvimento histórico possa superar o caos revolu-
cionário, Comte estabelece o princípio do amor como base 
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para a solidariedade social. Em seu Catecismo positivista, ele 
estabelece o princípio moral através do lema “Amor por 
princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim”18. Desse 
modo, o autor propugna que cada fase é superior a ante-
rior, sendo a evolução de uma a outra uma decorrên cia 
necessária que culmina com o espírito positivo. 
Em Curso de filosofia positiva publicado em 1844, ele 
descreve a lei dos três estágios do conhecimento humano. 
“Essa lei consiste em que cada uma de nossas concepções 
principais, cada ramo de nossos conhecimentos, passa 
sucessivamente por três estados históricos diferentes: o 
estado teológico ou fictício, o estado metafísico ou abs-
trato, o estado científico ou positivo”19. No estado teológico, 
as investigações eram sobre a natureza íntima dos seres 
e conduziam a preceitos absolutos. No estado metafísico, 
as especulações abstratas voltam-se aos diversos seres do 
mundo. Já no estado positivo, reconhece-se a impossibili-
dade de se obter respostas absolutas.
Por meio do raciocínio e da observação, ele acredita 
que é possível descobrir as leis que regem os fenômenos 
e estabelecer suas ligações e efeitos gerais.20 Comte desen-
volveu o método positivista que exprime sua concepção de 
ciência, o qual serve para conhecer os fatos tais como eles 
são, como se apresentam. Nesse sentido, o objetivo da pes-
quisa é o conteúdo da natureza, a experiência e a determi-
nação das leis que a regem. Assim, a ciência é a descoberta 
das leis gerais da natureza das coisas. Desse modo, ape-
sar de haver diferentes ciências especializadas em objetos 
próprios, Comte admitia apenas um único método cientí-
fico para os estudos de fenômenos naturais e humanos, o 
método positivista. Com efeito, o conteúdo desse conheci-
mento não é especulativo (no que caberia a filosofia), mas 
científico, isto é: real, objetivo, certo e positivo.
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Comte estabeleceu uma hierarquia entre os conhe-
cimentos positivos, que corresponderia ao modo como o 
conhecimento humano havia se desenvolvido ao longo 
da história, produzindo ciências cada vez mais especiali-
zadas e complexas. A primeira ciência seria a mais geral 
entre todas, a partir da qual as demais evoluiriam especia-
lizando-se em objetos cada vez mais complexos. Assim, na 
ordem de desenvolvimento, ele indicava a matemática, a 
astronomia, a física, a química, a biologia e a sociologia. A 
última a surgir seria a menos geral, uma vez que seu objeto 
apresentava uma natureza bastante particular. A sociolo-
gia, a mais nova ciência, ocuparia o topo da hierarquia dos 
conhecimentos positivos porque seria, ao mesmo tempo, a 
mais específica e a mais complexa de todas. 
Figura 2 – Hierarquia dos conhecimentos positivos segundo Comte
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Sociologia
Biologia
Química
Física
Astronomia
Matemática
Fonte: WEISHEIMER, 2006.
Apesar de Comte fundar as bases da sociologia como 
ciência, ele não se desprendeu totalmente da filosofia. Isso 
leva o sociólogo brasileiro Florestan Fernandes21 a descre-
ver a construção comtiana como uma “sociologia filosó-
fica”. As idéias de Comte tiveram grande repercussão no 
Brasil, exercendo significativa influência, principalmente 
na implementação do regime republicano, o que pode ser 
constatado no lema comtiano presente em nossa Bandeira 
Nacional: “Ordem e Progresso”. 
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(1.5)
ponto final
Neste capítulo, vimos como a sociologia se constitui em 
ciência da sociedade. Essa nova ciência tem como herança 
intelectual a filosofia da história, a filosofia política e a filo-
sofia social. A sociologia surgiu como objetivo de expli-
car as transformações sociais provocadas pela passagem 
do feudalismo ao capitalismo e teve em Auguste Comte 
seu principal nome. Esse autor, além de ter dado o nome a 
essa ciência, buscou estabelecer nos marcos do positivismo 
seu objeto, método e sua posição em relação às demais 
ciências.
Indicações culturais
O NOME da Rosa. Direção: Jean-Jacques Annaud. Produção: 
Bernd Eichinger. Alemanha: Warner Bros. 1986. 130 min.
IGREJA POSITIVISTA DO BRASIL. Disponível em: <http://
www.igrejapositivistabrasil.org.br/>. Acesso em: 5 jun. 
2008.
MARTINS, Carlos Benedito. O que é sociologia. 38. ed. São 
Paulo: Brasiliense, 2004. (Primeiros Passos, 57).
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atividades
Quais transformações sociais influenciaram o surgimento 1. 
da sociologia?
Que tipo de conhecimento tornou possível o desenvolvi-2. 
mento da sociologia?
Por que Auguste Comte é considerado o fundador da 3. 
sociologia?
( 2 )
introdução à obra 
de émile durkheim
“O sociólogo ao penetrar no mundo social precisa ter a 
consciência de que penetra no desconhecido.”
(DURKHEIM, 1973, p. 379)
fundador da escola sociológica francesa, David 
Émile Durkheim foi o responsável pela consolidação da 
sociologia como ciência empírica e como disciplina aca-
dêmica, sendo o primeiro a ter uma Cátedra dessa disci-
plina. Sua contribuição intelectual é uma referência obri-
gatória aos estudantes de Ciências Sociais, porque sua 
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proposta teórica e metodológica, o funcionalismo, vem 
sendo amplamente utilizada por pesquisadores contempo-
râneos, constituindo-se na escola teórica que predominou 
entre os sociólogos no século XX. Por isso, neste capítulo 
apresentamos os principais marcos da vida e obra desse 
autor e verificamos sua definição de sociologia e sua pro-
posta metodológica. 
(2.1)
émile durkheim: vida e obraa
David Émile Durkheim nasceu em Epinal, departamento 
de Voges, região de Lorena na França, em 15 de abril de 
1858. De família judaica e filhos de Rabino, Durkheim se 
tornaria agnóstico no Liceo Luis-le-Grad em pleno Quartier 
Latin, entre a Sorbonne e Collèg de France e Faculté de Droit, 
local considerado o centro do Iluminismo e da cultura 
francesa. Em 1879, entrou na École Normale Supérieur. Em 
1882, concluiu Direito na Universidade de Boudeaux, com 
complementação para docência de Filosofia. No mesmo 
ano, passou a lecionar Filosofia nos liceus de Sens e Saint-
Quentin. Em 1885, solicitou uma licença para retornar a 
Paris para estudar Ciências Sociais e depois transferiu-se 
para Alemanha, onde ficou até 1886 cursando Psicologia 
Social. Neste país, Durkheim teve aulas com o filósofo 
Wihelm Dilthey e o sociólogo Georg Simmel, além de 
tomar contato com a obra do sociólogo Ferdinand Tönnes. 
a. A seção 2.1 tem como base QUINTANERO; BAR-
BOSA; OLIVEIRA, 2001 e CASTRO; DIAS, 2005. 
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Esses intelectuais alemães determinariam o seu interesse 
pela sociologia. Ao regressar a Paris em 1887, foi nome-
ado professor de Pedagogia e Ciência Social na Faculdade 
de Letras da Universidade de Bordeaux, onde realizou o 
primeiro curso de Sociologia nas universidades france-
sas. Sua aula inaugural do curso de Ciências Sociais é um 
marco nesse aspecto, pois se revela um relato da evolu-
ção do pensamento social até a constituição da sociologia 
como ciência, apontando os desafios para sua consolidação. 
Nessa aula, encontra-se a seguinte passagem que indica 
uma das principais características de sua sociologia: “Se 
a Sociologia existe, ela tem seu método e suas própria leis. 
Os fatos sociais não podem ser verdadeiramente explica-
dos a não ser por outros fatos sociais”1. Nesse mesmo ano, 
publicou na Revue Philosophique os artigos: Estudos recentes 
da Ciência Social, A ciência positiva da moral na Alemanha e 
A filosofia nas universidades alemãs. No ambiente tranqüilo 
de Boudeaux, Durkheim pôde dedicar-se a escrita de sua 
tese de doutorado, defendida em 1893, que tem o título: 
“Da divisão do trabalho social”. No mesmo ano, publicou 
Contribuição de Montesquieu na constituição da ciência social. 
Em 1895, editou As regras do método sociológico. Escrita ini-
cialmente para esclarecer os procedimentos adotados em 
sua tese de doutoramento, esta última obra estabeleceu de 
modo definitivo a sociologia como ciência empírica e com 
metodologia própria, superando a perspectiva positivista 
da unidade de métodos entre as ciências sociais e naturais. 
Em 1896, Durkheim fundou L’année Sociologique (A análise 
sociológica). Editada primeiramente em formato de jornal, 
converter-se-ia numa revista orientadora do pensamento e 
da pesquisa sociológica na França, reunindo diversos pes-
quisadores e colaboradores que deram corpo à primeira 
geração da escola sociológica francesa. No ano seguinte, 
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publicou O suicídio, que é considerado uma monografia 
exemplar do método funcionalista. Em 1902, Durkheim foi 
nomeado professor-substituto na cadeira de Pedagogia na 
Universidade de Sorbonne, em Paris. Em 1906, foi nomeado 
professor-titular da cadeira de Pedagogia da Faculdade de 
Letras de Paris, onde ensinava paralelamente Sociologia e 
Pedagogia. Nesse período, publicou A determinação do fato 
moral. Em 1911, editou Julgamento da realidade e julgamento 
de valor e, em 1913, As formas elementares da vida religiosa. 
No mesmo ano de 1913, a cadeira em que era titular pas-
sou a denominar-se cadeira de sociologia da Sorbonne. No ano 
de 1914, eclode a Primeira Guerra Mundial. Esse conflito 
leva ao recrutamento de vários de seus alunos e colabo-
radores. Em 1915, Durkheim perde seu único filho, morto 
no front de Salonique. Esse fato agrava a revolta dele con-
tra a guerra, expressada em dois livros escritos no ano: A 
Alemanha acima de tudo – A mentalidade alemã e a guerra e 
Quem quis a guerra? – As origens da guerra segundo documen-
tos diplomáticos. Com a morte do filho, Durkheim deixou-se 
abater, o que tornou a sua saúde frágil, vindo a falecer em 
15 de novembro de 1917. Após sua morte, foram publica-
das obras importantes. Em 1922, foram editadas: Educação 
e sociologia, Educação moral e Sociologia e filosofia. Em 1928, 
surgiu O socialismo – a definição, seu começo, a doutrina saint-
simoniana. Em 1950, foi a vez de: Lições de sociologia-física dos 
costumes e do direito. Em 1955, foi publicado Pragmatismo e 
sociologia e, em 1970, A ciência social e a ação.
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(2.2)
objeto da sociologia de 
durkheim
Conforme Durkheim escreveu no prefácio da primeira edi-
ção de As regra do método sociológico, “o objetivo de qualquer 
ciência é fazer descobertas, e toda descoberta desconcerta 
mais ou menos as opiniões herdadas”2. Isso implica reco-
nhecer que, em se tratando de sociologia, o pesquisador, 
apesar de estar familiarizado com seu objeto de estudo, 
também faz parte do estudo, pois é membro da sociedade. 
Porém, na verdade, conhece do fenômeno sociológico ape-
nas a sua aparência exterior, ignorando sua verdadeira 
essência. Em termos durkheimeanos, trata-se de reconhe-
cer que se desconhecem as leis gerais que regem seu fun-
cionamento interno. Desse modo, é necessário uma postura 
de distanciamento do sujeito pesquisador do objeto pes-
quisado, para apreendê-lo como uma realidade exterior 
às ações de conhecer e explicar. Mas, a propósito, o que é 
mesmo a sociedade na perspectiva desse autor?
Para Durkheim, a sociedade como um todo não é igual 
à simples soma dos indivíduos que a compõem, mas algo 
distinto, sendo considerada um sistema formado por sua 
associação, constituindo uma realidade específica e com 
características próprias. Ou seja, a sociedade é um fenô-
meno sui generis.3 Dessa forma, ele argumenta a favor da 
superioridade social sobre o individual, visto que o todo 
se impõe como uma realidade exterior à consciência indi-
vidual, ao mesmo tempo em que “a sociedade não pode se 
constituir senão na medida em que penetre as consciên-
cias e que as molde à sua imagem e semelhança”4. Sendo 
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assim, a sociedade, que “ultrapassa o indivíduo no tempo 
e no espaço, está em condições de impor maneiras de agir e 
de pensar que consagrou com sua autoridade”5 e para qual 
contribuíram sucessivas gerações. Para esse autor, a socie-
dade é uma forma maior que o indivíduo e se impõe a ele 
determinando seu comportamento.6
A consciência coletiva impõe-se ao indivíduo por sua 
força exterior e, por conseqüência, à sociedade, sendo 
assim formada pelo conjunto de fatos sociais que exer-
cem uma influência coercitiva sobre as consciências indi-
viduais. Ou seja, o conceito de consciência coletiva se 
articula a outro mais amplo, o de fato social. Ambos apa-
recem como processos instituídos de fora para dentro dos 
indivíduos. Os fatos sociais são, por sua vez, formados pela 
consciência coletiva, que são as idéias, as opiniões, as cren-
ças e os valores compartilhados e que traduzem a maneira 
que a sociedade vê a si mesma e ao mundo que a rodeia7. 
Essa perspectiva de sociedadeconduz Durkheim a colocar 
no centro de sua problemática sociológica a noção de ins-
tituição. “Podes-se, com efeito, sem desvirtuar o sentido 
deste termo, chamar instituição a todos os modos de con-
duta instituídos pela coletividade; a sociologia pode então 
ser definida como a ciência das instituições, da gênese e do 
seu funcionamento”8.
Desse modo, percebemos que o objeto de estudo da 
sociologia são os fatos socais. Podemos, portanto, defi-
nir a sociologia de Durkheim como o estudo dos fatos 
sociais. Antes de procurarmos saber quais os métodos que 
convêm ao estudo dos fatos sociais, é preciso saber o que 
eles são. Com isso, segundo o autor: “É fato social toda a 
maneira de fazer, fixa ou não, suscetível de exercer sobre 
o indivíduo uma coerção exterior, ou ainda, que é geral no 
conjunto de uma sociedade, tendo, ao mesmo tempo, uma 
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existência própria, independente das suas manifestações 
individuais”9.
Maneira de fazer refere-se às maneiras de agir, de pen-
sar e de sentir, nas quais se incluem as representações 
coletivas. Sendo assim, todo fato social possui três caracte-
rísticas definidoras: 1) são exteriores à consciência indivi-
dual, 2) exercem uma coerção sobre o indivíduo e 3) são 
ao mesmo tempo gerais numa dada sociedade e indepen-
dentes das expressões individuais. Essas são as caraterís-
ticas determinantes do objeto sociológico de Durkheim, o 
que implica reconhecer que, para além do indivíduo, exis-
tem coisas que possuem uma natureza sociológica e são, 
portanto, os temas de interesse do sociólogo.
(2.3)
o método funcionalista 
Durkheim, ao buscar conhecer os fatos sociais como exte-
riores ao indivíduo, desenvolveu um método próprio para 
o estudo científico dos fenômenos da vida social. Para 
tanto, ele produziu simultaneamente rupturas com o senso 
comum e com as categorias científicas instituídas pelas 
ciências naturais e pela psicologia para estabelecer a socio-
logia como ciência autônoma. Para tanto, Durkheim pro-
punha que o sociólogo se colocasse num estado de espírito 
semelhante ao dos cientistas, que desenvolvem pesquisas 
em áreas ainda inexploradas em suas ciências, que desbra-
vam novas fronteiras do conhecimento, ou seja, o sociólogo 
deveria estar preparado para penetrar no desconhecido10. 
Agindo assim, ele desenvolveu um método estritamente 
sociológico capaz de demonstrar as relações causais (de 
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causa e efeito) e a função dos fenômenos sociais com vistas 
a descobrir as leis gerais e próprias de seu funcionamento. 
Por explicar as funções desempenhadas pelos fatos sociais, 
seu método é conhecido por funcionalismo. A palavra fun-
ção para referir-se ao método foi usada por Durkheim, com 
o intuito de exprimir a relação entre um fato social e um 
fim social e corresponde à analogia feita pelo autor entre a 
sociedade e um corpo vivo. Esse método foi descrito em As 
regras do método sociológico, texto que se tornou leitura obri-
gatória para os cientistas sociais. Na obra, ele estabeleceu 
cinco regras para os sociólogos estudarem os fatos sociais, 
que serão descritas a seguir.
Regras relativas à observação dos fatos sociais
“A primeira regra e a mais fundamental de todas é consi-
derar os fatos sociais como coisas”11. Isso implica reconhe-
cer os fatos sociais como objetos exteriores aos indivíduos 
e empiricamente situados, o que permite a Durkheim dife-
renciar a natureza da sociologia e a da psicologia. No pre-
fácio da segunda edição de As regras do método sociológico, 
ele mesmo explica o que entende pelo termo:
É coisa todo objeto de conhecimento que não é naturalmente 
compenetrável pela inteligência, tudo aquilo de que não pode-
mos ter uma noção adequada por simples procedimento de 
análise mental, tudo o que o espírito só consegue compreen-
der na condição de se extroverter por meio de observações e 
de exteriorizações, passando progressivamente dos caracteres 
mais acessíveis aos menos visíveis e mais profundos [...].12
Nesse sentido, o termo coisa se opõe à idéia, marcando 
a necessidade do sociólogo romper com suas próprias pré-
noções. Isso nos leva aos complementos dessa primeira 
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regra que Durkheim apresentou através de três corolários.
Primeiro corolário ▪ : “é preciso afastar sistematica-
mente todas as pré-noções”13.
Essa é a base de todo o método científico desde Des-
cartes, que postulou a proposta de dúvida metódica como 
fundamento do conhecimento científico. Trata-se da pos-
tura crítica que o cientista deve ter frente à aparência do 
fenômeno e à sua explicação prévia, como vimos no capí-
tulo anterior. O que torna esse procedimento um tanto 
mais difícil na sociologia é o fato de o sociólogo se depa-
rar com objetos dos quais faz parte, e suas emoções e dis-
posições frente a estes tendem a dificultar o conhecimento 
verdadeiro. Por isso, devemos exercer um estado de per-
manente vigilância frente às noções previas, evitando cair 
nas armadilhas do senso comum e de noções vulgares, 
buscando nos ater aos fatos tal como se apresentam.14
Segundo corolário ▪ : “nunca tomar como objeto de 
pesquisa senão um grupo de fenômenos previamente 
definidos por certos caracteres exteriores que lhe são 
comuns, compreendendo na mesma pesquisa todos 
aqueles que correspondem a mesma definição”15.
Desse modo, a primeira tarefa do sociólogo é definir 
aquilo que irá tratar, para que todos saibam, inclusive ele 
próprio, aquilo que está sendo investigado. Desse modo, 
recomenda-se agrupar os fenômenos primeiramente por 
sua aparência exterior, para depois desvendar suas dife-
renças e suas semelhanças em graus mais profundos. 
Procedendo dessa forma, o sociólogo produzirá um con-
junto de classificações que não dependem dele nem deri-
vam de sua vontade, mas da própria natureza das coisas.16
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Terceiro corolário ▪ : “quando o sociólogo empre-
ender a exploração de uma ordem qualquer de fatos 
sociais, deve-se esforçar por considerá-los naquele 
aspecto em que se apresentam isolados de suas mani-
festações individuais”17.
Dessa maneira, o sociólogo terá tanto mais sucesso em 
conhecer as causas e as funções de um fato social quanto 
mais este estiver objetivamente definido e for representado 
livre dos fatos individuais através dos quais se manifesta. 
Sendo assim, os fenômenos propriamente sociológicos 
podem ser abordados pelos aspectos que mais facilmente 
se manifestam na investigação científica e só depois, reali-
zando-se aproximações sucessivas, é possível de se apode-
rar do que essas manifestações encobrem.
Regras relativas à distinção entre o normal e o 
patológico 
Conforme estabeleceu Durkheim, qualquer fenômeno 
sociológico pode apresentar formas distintas segundo os 
casos empiricamente dados. Esses fenômenos podem ser 
de dois tipos: os normais e os patológicos. Portanto, é 
preciso uma regra metodológica que estabeleça com pre-
cisão a distinção entre um tipo e outro. A esse respeito, 
ele diz que alguns desses fenômenos são gerais a toda 
espécie e, mesmo não se encontrando em todos os indi-
víduos, aperecem na maior parte deles, enquanto outros, 
ao contrário, são excepcionais. Além de surgir em apenas 
uma minoria, têm duração inconstante.18 Em função disso: 
“Chamaremos normais aos fatos que apresentam as for-
mas mais gerais e daremos aos outros à designação de mór-
bidos ou patológicos”19. Desse modo, nosso autor formula as 
três seguintes regras:
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1º – Um fato é normal para um tipo social determinado, con-siderado numa fase determinada de desenvolvimento, quando 
se produz na média das sociedades desta espécie, considera-
das numa fase correspondente de desenvolvimento.
2º – Os resultados do método precedente podem verificar-se 
mostrando que a generalidade do fenômeno esta ligada às 
condições gerais da vida coletiva do tipo social considerado.
3º – Esta verificação é necessária quando este fato diz res-
peito a uma espécie social que ainda não cumpriu sua evolu-
ção integral.20
Com essa distinção, Durkheim afirma ser possível ao 
conhecimento sociológico atuar perante a sociedade tal 
como um médico atua com seus pacientes, buscando pre-
venir o desenvolvimento de patologias sociais ou, uma 
vez identificadas, procurar “curá-las”, estabelecendo suas 
soluções.
Regras relativas à constituição dos tipos sociais
Para Durkheim, a sociologia deveria não apenas conhecer 
de modo objetivo a realidade social, mas orientar o com-
portamento humano em sociedade. Para alcançar esses 
objetivos, o sociólogo precisa saber reconhecer o que é 
típico em uma dada sociedade. A distinção entre o que 
é normal e o que é patológico implica necessariamente a 
constituição de espécies sociais. Desse modo, o trabalho de 
investigação deve começar pela distinção das espécies de 
sociedades entre si segundo sua composição. Esse proce-
dimento permite-nos classificar os diferentes grupos em: 
sociedades simples e sociedades complexas. A primeira 
apresentaria uma maior uniformidade interna, enquanto 
a segunda seria uma sociedade com maior diferenciação 
interna.21 Esse princípio de classificação é enunciado do 
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seguinte modo:
Começar-se-á por classificar as sociedades segundo o grau de 
composição que apresentam, tomando como base a sociedade 
perfeitamente simples ou de segmento único; no interior des-
tas classes proceder-se-á à distinção das diferentes varieda-
des conforme se produz ou não uma coalescência completa de 
segmentos iniciais.22
Assim, Durkheim neutralizou a perspectiva tempo-
ral oferecida pela simples seqüência histórica e passou a 
manipular, interpretativamente, fatos referentes a “tipos 
médios”, os quais são sociologicamente significativos para 
todas as sociedades. Sua base é o entendimento de que as 
sociedades não passam de combinações diferentes de uma 
única e mesma sociedade.23 Nesse sentido, a escala de com-
binações possíveis é finita e em conseqüência a maior parte 
delas deve pelo menos se repetir. Tomando-se o que é pre-
dominante nessa repetição, é obtido um tipo médio den-
tro de cada sociedade. Desse modo, a tipologia social do 
método funcionalista é sempre a de tipo médio, que é a 
média objetivamente verificada na totalidade dos casos de 
um mesmo fenômeno.
Regras relativas à explicação dos fatos sociais
Conforme Durkheim, “quando nos lançamos na explica-
ção de um fenômeno social temos de investigar separa-
damente a causa eficiente que o produz e a função que 
ele desempenha”24. Isso permitirá determinar se existe 
corres pondência entre o fato estudado e as necessidades 
do organismo social, sem nos preocuparmos se estes são 
intencionais ou não. Por isso, é preciso distinguir os pro-
cessos que são causa dos que são função. Causa corres-
ponde ao que determina a existência do fato social. Por 
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função, entendem-se as conseqüências do fato social ou o 
papel que este desempenha numa dada organização social. 
As duas séries de questões devem ser separadas uma da 
outra e, em geral, deve-se começar a pesquisa pela primeira 
delas. Corresponde a um procedimento lógico iniciar a 
análise das causas antes de analisar seus efeitos, pois, uma 
vez resolvida a primeira questão, a segunda será facilitada. 
Com isso, o autor quer enfatizar que “a origem primeira de 
qualquer processo social de uma certa importância deve 
ser procurada na constituição do meio o social”.25 Nesse 
caso, a regra metodológica consiste em observar que
a causa determinante de um fato social deve ser procurada 
nos fatos sociais antecedentes e não nos estados da consciên-
cia individual, [sendo esta complementada pela idéia de que] 
a função de um fato social deve sempre ser procurada na rela-
ção que ele mantém com qualquer fim social interno26;
o qual é constituído por coisas e pessoas.
Regras relativas à administração da prova
Ao tratar da construção dos tipos sociais, o sociólogo deve 
recorrer necessariamente à comparação. O método com-
parativo é o único meio objetivo que permite a prova em 
sociologia, porque seu método de variações concomitan-
tes é capaz de substituir o procedimento de experimen-
tação utilizado pelas ciências naturais para demonstrar a 
validade da prova nas ciências sociais. Por meio da com-
paração, torna-se possível demonstrar que “a um efeito 
corresponde sempre uma mesma causa [...]. [Dessa forma] 
só se pode explicar um fato social de uma certa complexi-
dade se acompanharmos o seu desenvolvimento integral 
através de todas as espécies sociais”27. Logo a comparação 
é o método por excelência da sociologia.
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( . )
ponto final
A concepção sociológica expressa por Durkheim em As 
regras do método sociológico é de que existem nos fenômenos 
sociais uma ordem própria, sujeita a determinações do tipo 
causa-efeito, construindo, portanto, uma ordem causal. 
Com isso, ele procurou demonstrar que o estudo científico 
da sociedade exigiria uma postura investigativa típica dos 
métodos hipotético-indutivos, que partem dos objetos para 
construção do conhecimento. Coerente com esse primado, 
Durkheim propôs tratar os fatos sociais como coisas, ou 
seja, como algo geral, exterior ao indivíduo e independente 
de manifestações individuais, para serem passíveis de 
explicação científica. Seu legado intelectual serve de antí-
doto à tentação recorrente de explicar os fenômenos sociais 
de forma normativa, descrevendo os fatos como gostaría-
mos que fossem e não como eles realmente são.
Indicações culturais
DURKHEIM Émile. As regras do método sociológico. 3. ed. 
São Paulo: Martins Fontes, 2007.
MUCCHIELLI, Laurent. O nascimento da sociologia na 
universidade francesa (1880-1914). Revista Brasileira de 
História, São Paulo, v. 21, n. 41, 2001. Disponível em: <http://
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
01882001000200003>. Acesso em: 29 abr. 2008.
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atividades
Quais são as características do fato social?1. 
Por que é importante para o sociólogo afastar-se sistemati-2. 
camente de suas pré-noções?
Qual é diferença entre um fato social normal e um fato 3. 
social patológico?
( 3 )
durkheim: categorias sociológicas 
fundamentais
“É à saúde geral do corpo social que isto interessa.”
(DURKHEIM, 1973, p. 376)
o insighit original de Durkheim foi perceber que 
os indivíduos atuam em sociedade de modo não totalmente 
livre, mas condicionados por forças provenientes da estru-
tura social. Para esse autor, os seres humanos são, em certo 
sentido, “coagidos” a aceitarem as orientações comumente 
partilhadas por seus grupos de pertencimento e referên-
cia. Dessa forma, seus estudos empíricos buscavam enten-
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der como essas coerções agem sobre os indivíduos, procu-
rando obter respostas às indagações de como as sociedades 
se mantêm estáveis e quais os efeitos provocados por erup-
ções sociais que abalavam a ordem vigente. 
Neste capítulo, apresentaremos as categorias socioló-
gicas fundamentais dessa perspectiva. Veremos as noções 
de solidariedadesocial, formas de consciência, coesão e 
anomia e o conceito de representação coletiva, presentes 
respectivamente nas obras Da divisão do trabalho social, O 
suicídio e As forma elementares da vida religiosa.
(3.1)
organização social e formas de 
solidariedade
A divisão do trabalho social (1893) é a primeira grande obra 
de Durkheim. Nela, o autor buscou tratar os fatos da vida 
moral segundo o método positivo, distanciando-se porém 
dos seus predecessores. O problema central de que parte 
é estabelecer qual é a função da divisão do trabalho na 
sociedade. Ao analisar a sua função, isto é, qual é a sua 
necessi dade social correspondente à divisão do traba-
lho social, ele identificou que é a de integrar a sociedade 
moderna, ou seja, a função da divisão do trabalho é 
produzir solidariedade, que é a base da coesão social 
determinando, depois, quais as causas e as condições cor-
respondentes em situações normais. Como os indicadores 
empíricos dos tipos de solidariedade social, Durkheim uti-
lizou as sanções do direito. Ao final desse trabalho, des-
tacou ainda as formas patológicas da divisão do trabalho, 
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ou seja, quando esse processo não cumpre sua função, isto 
é, não produz coesão social (ver seção “Divisões patológi-
cas do Trabalho” deste capítulo). Ele adotou ainda a tese 
de que a sociedade evolui ao longo da história, produ-
zindo internamente uma diferenciação social das funções 
dos seus integrantes, alterando-se as formas de solidarie-
dade que unem os membros dos grupos. Ele comparou 
as sociedades tradicionais e modernas e evidenciou dois 
tipos de solidariedade: a mecânica e a orgânica. A primeira 
é vislumbrada nas sociedades tradicionais e a segunda nas 
sociedades modernas, resultante da maior divisão do tra-
balho, as quais estão apresentadas na Figura 3 a seguir:
Figura 3 – Organograma das formas de solidariedades
Coesão Social
Divisão do 
Trabalho
Solidariedade 
Mecânica
Consciência 
Coletiva
Solidariedade 
Orgânica
Consciência 
Individual
Direito Penal Direito Restitutivo
Sanções 
Repressivas
Sanções 
Restitutivas
(+)(-)
Fonte: WEISHEIMER, 2006.
A produção das duas formas de solidariedade social 
propostas por Durkheim, a mecânica e a orgânica, encon-
tram-se descritas nas seções a seguir.
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A solidariedade mecânica
Nas sociedades tradicionais, a divisão do trabalho encon-
tra-se ainda em forma rudimentar e predominam ocu-
pações internamente homogêneas e com baixa interação 
com outros grupos profissionais. Nesse tipo de organi-
zação social, as formas de integração social ocorrem por 
similitude, produzindo o que Durkheim classificou como 
solidariedade mecânica, que aparece em analogia com 
a coesão que une entre si os corpos brutos. Os membros 
do grupo atuam de modo unificado e isolado dos demais, 
reproduzindo condições de autonomia, pois são auto-su-
ficientes e não dependem de trocas com outras coletivida-
des sociais.
Essa homogeneidade social diz respeito tanto às ati-
vidades realizadas como aos valores compartilhados, que 
são fundamentais à sobrevivência do grupo, sendo neces-
sária, portanto, uma forte coesão assentada na consciência 
coletiva, severa e repressiva. Desse modo, sua caracterís-
tica fundamental repousa justamente no predomínio dessa 
consciência coletiva.
Conforme o autor, “O conjunto das cresças e dos sen-
timentos comuns à média dos membros de uma mesma 
sociedade forma um sistema determinado que tem sua 
vida própria; podemos chamá-lo de a consciência cole-
tiva ou comum”1. Esta produz uma solidariedade por 
semelhança que liga diretamente o indivíduo à sociedade, 
sem nenhuma mediação. Nesse tipo de sociedade na qual 
predomina a consciência coletiva, as sanções legais que 
constituem a expressão objetiva da solidariedade social 
assumem a forma material no direito penal, cuja finali-
dade é impor sanções repressivas às condutas desvian-
tes e que podem desestabilizar a coesão. Isso significa que 
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a função do direito é impor punições que visam mostrar 
aos membros do grupo que não é permitido desviar-se das 
normas estabelecidas. Nessas sociedades, a solidariedade 
permanece mecânica enquanto a divisão do trabalho não 
se desenvolve.2
A solidariedade orgânica
Com o desenvolvimento da divisão do trabalho, a organi-
zação social se torna mais complexa aumentando sua dife-
renciação interna. Assim, a solidariedade social não se 
fundamenta mais pela similitude dos membros que com-
põem a sociedade, mas agora por sua interdependência. 
Nesse sentido, cada um dos indivíduos mantém relações de 
dependência recíproca uns com os outros. A solidariedade 
orgânica corresponde à sociedade moderna, na qual encon-
tramos um grande número de papéis sociais diferenciados 
e altamente especializados. Esse agrupamento corresponde 
a um sistema que tem seu funcionamento estabelecido por 
meio de uma complexa divisão do trabalho.
Distintamente do tipo anterior, Durkheim estabelece 
uma analogia com um organismo biológico e, em razão 
disso, a denominação solidariedade orgânica, na qual os dife-
rentes órgãos exercem funções especializadas e necessárias 
ao bom funcionamento do corpo em sua totalidade. Nas 
sociedades modernas, aparece um novo tipo de relação 
entre indivíduo e sociedade, que corresponde à emergência 
do predomínio da consciência individual, resultado direto 
da especialização das funções desempenhadas pelos indiví-
duos nesse sistema social com grande diferenciação interna. 
O indicador objetivo dessa forma de solidariedade orgâ-
nica seria a ascensão de um novo tipo de sistema jurídico 
fundado no direito restitutivo. Sua função seria determinar 
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sanções restituitórias a fim de reparar o dano que se cau-
sou, restabelecer a ordem, assegurar o pleno direito às 
liberdades individuais e os interesses legítimos dos cida-
dãos de um Estado. Como própria expressão da divisão do 
trabalho, “o direito restitutivo cria órgãos mais e mais espe-
ciais: tribunais consulares, conselhos pru’hommes, tribu-
nais administrativos de todos os tipos”3. 
Divisões patológicas do trabalho
Na perspectiva de Durkheim, nem todas as formas de divi-
são do trabalho produzem solidariedade. Nesses casos, 
isso é considerado patológico porque põe em risco o bom 
funcionamento do sistema social. Como destacamos nos 
tópicos a seguir, o autor identificou três tipos de divisão 
patológica do trabalho, para as quais existem causas e efei-
tos necessários. 
Divisão anômica do trabalho: ▪ Ocorre quando ine-
xiste ou são frágeis os mecanismos de regulação da 
divisão do trabalho provocado por estados de ano-
mia social. Estes últimos decorrem de situações de 
rápidas transformações sociais que não foram acom-
panhadas por alterações na organização do trabalho e 
do sistema jurídico que o regulamenta. Seus efeitos são 
basicamente dois: as crises industriais e o acirramento 
do conflito entre capital e trabalho. Para superar esse 
estado de coisas que ocorre quando o governo é insu-
ficiente para regular as relações sociais em todos os 
níveis, torna-se necessária a atuação de agrupamentos 
profissionais para a produção de uma mediação entre 
os grupos em conflito.
Divisão forçada do trabalho: ▪ Ocorre devido às 
desigualdades nas condições exteriores de luta entre os 
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atores envolvidos nas relações de trabalho. Nesse caso, 
o efeito necessário dessa distorçãonas condições de 
defesa de interesses é a emergência do que Durkheim 
chamou de guerra de classes. Para esse estado avançado 
de anomia social, a única maneira de restabelecer a 
ordem social será o estabelecimento da justiça social, 
entendida como princípio de eqüidade e reparação das 
desigualdades sociais agudas. 
Insuficiência de atividade: ▪ É a terceira expressão da 
divisão patológica do trabalho. As causas desse fenô-
meno devem-se a funções descontínuas de atividades 
que levam ao desajustamento entre elas. Isso provoca 
como efeito o afrouxamento dos laços de solidariedade 
social anteriormente estabelecidos entre os membros 
de atividades interdependentes. A solução para esse 
problema seria, portanto, intensificar as atividades 
para que não haja espaços vazios no dia de trabalho 
e nem no sistema de troca e distribuição de serviços e 
processos produtivos.
(3.2)
coesão e anomia através do 
estudo sociológico do suicídio
Na obra O suicídio (1897) Durkheim analisa o fenômeno 
do suicídio através de uma perspectiva que ultrapassa 
a questão individual, conferindo-lhe uma abordagem 
sociológica. Demonstra que as causa de morte por suicí-
dio tinham motivações sociais, identificando-o como um 
fenômeno coletivo. A contribuição imediata desta obra foi 
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definir o que ficou conhecido como “lei do suicídio”, na qual 
se estabelece: “o suicídio varia na razão inversa do grau de 
integração dos grupos dos quais o indivíduo faz parte”4. 
Isso implica reconhecer que a ocorrência de suicídio apre-
senta variações conforme os níveis de coesão e situações 
de anomia social. Para chegar a essa lei geral, ele realizou 
um estudo comparativo de taxas de suicídio ao longo de 
trinta anos para seis países europeusa. Desse modo, ele 
pôde mostrar que esses índices apresentavam variações 
em conformidade com as situações vividas em cada um 
dessas nações. Mas, como se define o fenômeno analisado 
por Durkheim? “Chama-se suicídio todo o caso de morte 
que resulta direta ou indiretamente de um ato positivo ou 
negativo executado pela a própria vítima, ato no qual a 
vítima dever produzir esse resultado”5. Sendo assim, o sui-
cídio traduz a forma como a sociedade age sobre os indiví-
duos, constituindo tipos diferentes. 
O suicídio egoísta
Esse tipo de suicídio corresponde a situações em que os 
valores individuais são mais fortes que as normas coleti-
vas. Nessas circunstâncias, os indivíduos não encontram 
respaldo para sua conduta nos valores coletivos, sen-
tindo-se deslocados do meio social ao qual pertencem. 
Inclui-se também nesse processo o fato de que as institui-
ções sociais como a família, a Igreja, o trabalho e associa-
ção pública são frágeis e não regulam suas ações. Nesse 
sentido, quanto mais fracos os grupos a que pertence e 
menos depende deles, tal indivíduo mais depende de si 
a. As estatísticas nacionais de suicídios analisa-
das por Durkheim referem-se a Dinamarca, França, 
Inglaterra, Prússia, Saxônia, Baviera, (os três últimos 
unificarna-se na Alemanha), Itália e Bélgica.
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próprio e não reconhece, assim, outras regras de conduta 
a não ser as estabelecidas por si mesmo. “O que elas tra-
duzem é que o relaxamento dos laços sociais é uma espé-
cie de astenia coletiva, de doença social, tal como a tristeza 
individual traduz o mal estado orgânico do indivíduo”6. 
Essa é a expressão social do suicídio egoísta que aparece 
como uma fuga e ausência de coesão social, uma vez que 
“no próprio momento que ele libertou-se inteiramente do 
meio social, ele sofre ainda sua influência”7. O exemplo 
típico desse suicídio é o do adolescente ou o praticado por 
artistas vanguardistas.
O suicídio altruísta
O suicídio altruísta é basicamente o oposto do anterior. 
Ocorre quando o indivíduo se encontra plenamente coeso 
aos valores de seu grupo social e a condição que lhe con-
feria identidade social altera-se ou lhe impõe um auto-
sacrifício. Esse tipo ocorre com grande freqüência em 
sociedades tradicionais, uma vez que os sujeitos que o pra-
ticam se identificam tanto com sua coletividade que são 
capazes de ceifar a própria vida por ela e por seus valo-
res. Durkheim cita três categorias dessa modalidade: “1º) 
Suicídio de homens que chegaram ao liminar da velhice ou 
foram atingidos por doenças; 2º) Suicídios de mulheres por 
ocasião da morte do marido; 3º) Suicídios de fiéis ou ser-
vidores por ocasião da morte de seus chefes”8. Essas três 
variedades correspondem a três classificações: o suicídio 
altruísta obrigatório, o suicídio altruísta facultativo e o sui-
cídio altruísta agudo, do qual o suicídio místico é o modelo 
perfeito9. Podemos ter como exemplos desse tipo de suicí-
dio a ação dos pilotos camicases japoneses e de homens-
bomba palestinos. 
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O suicídio anômico
O suicídio anômico é aquele que se deve a um estado de 
desregramento social no qual as normas morais estão 
ausentes ou perderam seu poder de regulação sobre as 
pessoas. Esse fenômeno emerge “quando a sociedade se 
vê perturbada, seja por uma crise dolorosa ou por favorá-
veis mais súbitas transformações, [com isso] ele [o suicida] 
se vê provisoriamente incapaz de exercer essa ação, e aí 
está onde resultam essas ascensões bruscas da curva dos 
suicídios”10. O estado de anomia resulta do estado de tran-
sição da ordem socioeconômica que provoca novas dinâmi-
cas na indústria e no comércio. Durkheim demonstrou que 
esse tipo de suicídio ocorre mais entre altos profissionais 
da indústria e do comércio do que entre agricultores, por-
que entre estes últimos predominam os traços das socieda-
des tradicionais. Um exemplo disso é o caso dos suicídios 
cometidos por investidores financeiros que perderam for-
tunas com a quebra da Bolsa de Nova Iorque em 1930. 
Por vezes, o suicídio egoísta e o anômico podem estar 
combinados ou podem não ter uma distinção muito nítida. 
Isso se deve ao fato de que ambos correspondem a socie-
dades complexas. Sendo a sociedade a fonte da regulação 
moral na teoria durkheimeana, poder-se-á supor que os 
indivíduos inadequadamente integrados nas comunidades 
se encontram numa situação de anomia. No entanto, o pró-
prio Durkheim reafirma a distinção entre eles.
O suicídio egoísta resulta de que os homens não vêem mais 
razão de ser na vida; o suicídio altruísta de que esta razão 
lhes parece estar fora da própria vida; o terceiro tipo de sui-
cídio, cuja existência acabamos de constatar, decorre do fato 
de estar desregrada a atividade dos homens, e é disso que eles 
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sofrem. Em virtude de sua origem, chamaremos esta última 
espécie de suicídio anômico[...].11
(3.3)
o conceito de representações 
coletivas
Em Durkheim, a noção de representações coletivas é de 
maior importância para seu esquema teórico e aparece em 
toda sua envergadura na obra As formas elementares da vida 
religiosa (1913). Vimos anteriormente que esse autor perce-
bia os fatos sociais como exteriores aos indivíduos, exer-
cendo sobre eles uma coerção. Igualmente toda crença e 
todos os valores e comportamentos são construídos social-
mente. Seguindo os postulados da tradição francesa12, 
iniciada com Montesquieu e Rousseau, Durkheim susten-
tava que a sociedade é mais do que a soma dos indivíduos 
que a compõe: é uma síntese com qualidades específicas 
distintas dos indivíduos. Ou seja, os fenômenos que carac-
terizam a sociedade encontram suas explicações no todo e 
não nas partes individuais, assim as representações coleti-
vas não implicam necessariamente uma consciência

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