Buscar

Adolescentes que cometeram homicídio. Quais os fatores de risco?

Prévia do material em texto

7
ARTIGO ORIGINAL
Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016Adolescência & Saúde
RESUMO
Objetivo: Investigar os fatores de risco relacionados à conduta de adolescentes que cometeram homicídio. Métodos: 
Foram analisados os prontuários de jovens detentos em um Centro de Atendimento Sócio Educativo, no período de 2014 a 
2015. As variáveis consideradas foram idade, gênero, estado conjugal, escolaridade, uso de drogas e álcool, circunstâncias 
do crime, contexto social e familiar. Resultados: Os resultados evidenciaram um total de 28 protocolos de adolescentes 
masculinos, com média de idade de 17 anos, com baixos níveis de escolaridade (82%) e socioeconômico (89%), com 
história de abandono escolar (97%), de vulnerabilidade social (78%), de uso de álcool e drogas (75%), e de transgressão 
familiar (71%). O homicídio foi conduzido pelo uso de arma de fogo (53%) e esteve relacionado a dívidas de drogas (78%). 
Conclusão: Os fatores de risco evidenciados devem ser considerados na ressocialização dos jovens e no desenvolvimento de 
medidas de prevenção contra as reincidências.
PALAVRAS-CHAVE
Violência, crime, adolescente, fatores de risco.
ABSTRACT
Objective: This study investigated behavioral risk factors among adolescents committing homicide. Methods: The 
2014 – 2015 records of reform school detainees were analyzed by the following variables: age, gender, marital status, 
education, drug and alcohol use, circumstances of the crime, social aspects and family context. Results: The results 
consisted of the records of 28 male adolescents with a mean age of age of 17; poor education (82%); low economic and 
social (89%) status; school dropouts (97%); socially vulnerable (78%); alcohol and drug use (75%); and other crimes in 
the family (71%). Just over half (53%) of these homicides involved fi rearms, with 78% related to drug debts. Conclusion: 
These risk factors must be taken into consideration during the rehabilitation of these youngsters, together with steps 
designed to prevent repeat offences.
KEY WORDS
Violence, crime, adolescent, risk factors.
Adolescentes que cometeram 
homicídio: Quais os fatores de risco?
Teens who have committed murder: What are the risk factors?
Pricila Welter1
Silvana Alba 
Scortegagna2
Pricila Welter (pri_welter@hotmail.com) - Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Envelhecimento Humano. Universidade de 
Passo Fundo, BR 285, Km 171, São José. Cx. Postal 611. Passo Fundo, RS, Brasil. CEP: 99052-900.
Recebido em 05/06/2015 – Aprovado em 06/07/2015
1Graduanda do Curso de Psicologia da Universidade de Passo Fundo (UPF). Passo Fundo, RS, Brasil. Bolsista de Iniciação Científi ca PROBIC-
FAPERGS, em projetos relacionados à questão de aspectos psicológicos e sociodemográfi cos no contexto da criminalidade e da violência.
2Graduada em Psicologia, com mestrado em Educação pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Passo Fundo, RS, Brasil. Doutorado em 
Psicologia pela Universidade São Francisco (USF). São Paulo, SP, Brasil. Professora Titular III do Curso de Psicologia e dos Programas de 
Pós-Graduação Stricto Sensu em Envelhecimento Humano e em Administração, da UPF. Passo Fundo, RS, Brasil.
>
>
>
>
8 Welter e ScortegagnaADOLESCENTES QUE COMETERAM 
HOMICÍDIO: QUAIS OS FATORES DE RISCO?
Adolescência & SaúdeAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016
negativas, como o homicídio5. Entre os fatores de 
risco relacionados à constituição psíquica encon-
tra-se a falha na instauração de limites e da fun-
ção paterna. Limite é algo estruturador da criati-
vidade, sua ausência impede que o adolescente 
pense, seja criativo e se organize psiquicamente6. 
Já a função paterna é fundamental para a instau-
ração de regras e interditos7. Assim, na situação 
dos adolescentes em confl ito com a lei, a instau-
ração destas funções acaba sendo fragilizada, 
acarretando prejuízos a um desenvolvimento sau-
dável, fazendo com que o adolescente busque no 
externo a lei não encontrada no convívio familiar.
Além disso, as características individuais e 
de personalidade de adolescentes que comete-
ram homicídio também podem ser considera-
das elementos de risco; entre elas observam-se 
a baixa autoestima, autoimagem negativa, im-
pulsividade, inabilidades sociais, inefi ciência de 
recursos para enfrentar situações complexas, 
distorções na autopercepção e na percepção do 
outro8,9,10. Na relação entre o comportamento 
de adolescentes perpetradores de homicídio e 
o contexto social e familiar, observam-se história 
de transgressão por parte de outros membros 
da família, ausência de vínculos positivos, rede 
de apoio fragilizada e falhas na competência pa-
rental11,12. Para melhor compreensão dos fatores 
imbricados nas questões que envolvem adoles-
centes em confl ito com a lei, algumas pesquisas 
encontram-se relacionadas na Tabela 1.
Conforme a tabela 1, os fatores de risco 
para o desenvolvimento saudável dos adoles-
centes e a inserção na criminalidade, dizem res-
peito a: falhas importantes no desenvolvimento 
da competência parental4,11,12, rede familiar dis-
funcional4,12, uso de drogas e álcool4,11,13,14, nível 
de escolaridade baixo13,14,15,16, vulnerabilidade e 
desigualdade social, testemunhar violência no 
cotidiano familiar e social4,13,15,16. Esses dados 
podem ser úteis para embasar as discussões so-
bre a maioridade penal e para a compreensão 
do aumento da violência entre os jovens. Nessa 
direção, o presente estudo buscou investigar os 
fatores de risco relacionados à conduta de ado-
lescentes que cometeram homicídio. 
INTRODUÇÃO
A violência envolvendo jovens, seja na po-
sição de vítimas ou de autores de crimes, cresce 
de forma acelerada tornando-se foco de muitas 
discussões. Neste contexto, diferentes posicio-
namentos emergem sobre a redução da maio-
ridade penal, que tem por objetivo diminuir a 
idade de 18 para 16 anos para a penalização de 
adolescentes autores de atos infracionais.
A Constituição da República¹ defi ne, em seu 
artigo 228, que o jovem com até 18 anos de idade 
incompletos, é penalmente inimputável, porém 
responsável por seus atos. O Conselho Federal de 
Psicologia² expõe que a opção pela redução da 
maioridade penal serviria muito mais para enco-
brir os graves problemas sociais e a falta de políti-
cas públicas destinadas à proteção e cuidado das 
crianças e adolescentes brasileiros, do que para 
reduzir os índices de violência entre os jovens.
Deste modo, compreende-se que o jovem 
já é responsabilizado por seus atos, e que a me-
dida adotada para o delito cometido deve levar 
em conta a fase de desenvolvimento em que este 
se encontra (adolescência), seu universo familiar, 
social e econômico. Fortalecer o vínculo com a 
família, oferecer assistência aos seus membros, 
prover condições para a reinserção escolar e o 
desenvolvimento da educação formal que pos-
sibilite o alcance de melhores condições socioe-
conômicas e, consequentemente, de reinserção 
social, parecem ser políticas para proscrever o ci-
clo da violência, a serem alcançadas pelo Estado.
Como um fenômeno complexo, compreen-
de-se que a violência, em especial o homicídio, 
resulta da interação entre fatores estruturais, so-
ciais, psicológicos e individuais3,4. Há três níveis 
de conceitualização: (I) O nível estrutural, que 
enfatiza a infl uência da organização social na 
constituição do sujeito; (II) O nível sociopsicológi-
co, que refere-se às instituições de controle social, 
como a família e a escola; (III) O nível individual, 
que inclui aspectos biológicos e psicológicos3.
Adolescentes expostos a múltiplos fatores de 
risco acabam sendo prejudicados em seu desen-
volvimento, o que contribui para o ato de práticas 
>
9Welter e Scortegagna ADOLESCENTES QUE COMETERAM 
HOMICÍDIO: QUAIS OS FATORES DE RISCO?
Adolesc. Saude, Rio de Janeiro,v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016Adolescência & Saúde
Tabela 1. Descrição dos estudos brasileiros com adolescentes em conflito com a lei no período de 2007 a 2013.
Autores e ano 
do artigo
Objetivo/
Instrumentos
Participantes Resultados/Conclusão
Roseana Mara 
Aredes Priuli, 
Maria Silvia de 
Moraes (2007)13
Levantar o perfil 
sóciodemográfico e 
infracional de adolescentes 
infratores. Prontuários da 
Instituição.
48 adolescentes, entre 
14 e 18 anos de idade 
completos, que cumpriam 
medida socioeducativa de 
Internação.
Faixa etária de 17 anos. 
Escolaridade baixa, evasão 
escolar, e uso de drogas. 
Residiam em bairros de 
vulnerabilidade social.
Sandra Eni 
Fernandes Nunes 
Pereira, Maria 
Fátima Olivier 
Sudbrack (2008)11
Descrever a relação entre 
os níveis de dependência 
das drogas e a prática de 
atos infracionais. Entrevistas 
semiestruturadas.
29 adolescentes, autores 
de infração, no contexto 
da Vara da Infância e 
Juventude de Brasília.
Uso de álcool ou drogas 
no momento da infração. 
Ausência de afetividade e 
autoridade na família.
Mayra Costa 
Martins, Sandra 
Cristina Pillon 
(2008)14
Analisar a relação entre 
o uso de drogas e o ato 
infracional. Questionário 
estruturado.
150 adolescentes, 
cumprindo medida 
socioeducativa de 
internação pela primeira 
vez.
Média de 16 anos. Baixa 
escolaridade. Uso de álcool e 
drogas.
Herminia Castro 
Silva, Hilda 
Daniela Oliveira 
(2011)12
Discutir o papel 
desempenhado pelo 
jovem no processo de 
estabelecimento das 
interações no cotidiano de 
sua vida na criminalidade. 
Entrevistas individuais e 
em grupos e pesquisa nos 
prontuários.
14 adolescentes entre 16 e 
18 anos de idade, privados 
de liberdade em uma 
Instituição Socioeducativa.
Envolvimento de familiares 
com o crime. Situação de 
trabalho instável. A maior 
parte dos jovens não acredita 
que possa sair da situação 
porque passou a ser sua rotina, 
porque o contexto continua o 
mesmo.
Jana Gonçalves 
Zappe e Ana 
Cristina Garcia 
Dias (2012)4
Compreender como a 
dinâmica familiar pode 
estar associada à prática de 
atos infracionais. Estudo de 
casos múltiplos.
5 jovens privados de 
liberdade. Duas entrevistas 
individuais guiadas com 
cada adolescente.
Fragilidades e violência nas 
relações familiares, falta do 
quadro de referência para o 
desenvolvimento psicológico 
saudável.
Bianca Izoton 
Coelho e Edinete 
Maria Rosa 
(2013)15
Analisar as representações 
do ato infracional e medida 
socioeducativa. Entrevista 
Semiestruturada e técnica 
das evocações livre.
46 adolescentes, com 
idade entre 15 e 18 anos, 
que cumpriam, há mais de 
três meses, a medida de 
Liberdade Assistida.
A caracterização demonstrou 
renda familiar e nível de 
escolaridade baixos, local de 
residência precário.
Marina Rezende 
Bazon, Jorge Luiz 
da Silva, Renata 
Martins Ferrari 
(2013)16
Descrever as trajetórias 
escolares de adolescentes 
em conflito com 
a lei. Entrevistas 
semiestruturadas.
6 adolescentes em 
cumprimento de Medida 
Socioeducativa e seus 
respectivos responsáveis.
Os adolescentes foram 
apreendidos durante o período 
de evasão escolar. Dificuldades 
de aprendizagem, reprovações. 
Necessidade do apoio escolar 
para superarem as práticas 
infracionais.
10 Welter e ScortegagnaADOLESCENTES QUE COMETERAM 
HOMICÍDIO: QUAIS OS FATORES DE RISCO?
Adolescência & SaúdeAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016
MÉTODOS
Trata-se de um estudo retrospectivo docu-
mental, tendo como fonte todos os prontuários 
de adolescentes que cometeram homicídio, que 
constavam em um Centro de Atendimento So-
cioeducativo (CASE), no período de janeiro de 
2014 a janeiro de 2015, em uma cidade do norte 
do estado do Rio Grande do Sul. Como proce-
dimentos, inicialmente contatou-se o CASE, por 
meio do diretor responsável pela instituição, o 
qual assinou a Carta de Autorização para a rea-
lização deste estudo. Na sequência, a pesquisa 
obteve a aprovação do Comitê de Ética em Pes-
quisa (CEP) da Universidade sob protocolo de 
número 110/2009. De posse destes documentos, 
realizou-se a análise documental dos protocolos.
Os dados foram categorizados de acordo 
com as seguintes variáveis: (a) informações so-
bre características sociodemográfi cas como gê-
nero, idade, estado civil, escolaridade; (b) his-
tórico de uso de drogas e álcool, constituição 
familiar, e circunstâncias do crime cometido. A 
análise dos resultados contou com a estatística 
descritiva e a literatura pertinente.
RESULTADOS
De um total de 75 prontuários (100%) de 
adolescentes que cometeram diferentes atos in-
fracionais como roubo, tráfi co de drogas, porte 
ilegal de arma, internos no CASE, foram identifi -
cados 28 prontuários (37%) com história de ho-
micídio. Os dados sociodemográfi cos e as carac-
terísticas psicossociais dos adolescentes podem 
ser visualizados na tabela 2.
Conforme apresentado na tabela 2, todos 
os adolescentes (100%, n=28) que praticaram 
homicídio eram do gênero masculino, com ida-
des entre 14 e 19 anos, média de 17 anos, sendo 
a maior parte solteiros (92,9%, n=26), seguido 
de união estável (7,1%, n=2). No CASE em que 
a pesquisa foi realizada não havia adolescentes 
femininas cumprindo medida.
Sobre a escolaridade, 82% (n=23) frequen-
tavam o ensino fundamental, tão somente 18% 
(n=5) estavam no Ensino Médio. A maior parte 
dos adolescentes cursava a 7º série (25%, n=7), 
seguido da 6º série (21,4% n=6). O abando-
no escolar antes do crime ocorreu em 96,4% 
(n=27) dos casos, exclusivamente um adoles-
cente (3,7%, n=1) não havia deixado de fre-
quentar a escola antes de ter cometido o crime.
O ato homicida foi classifi cado como qua-
lifi cado, com a intenção de matar, em 90%, 
(n=25) dos casos, 78% (n=22) motivados por 
desentendimentos anteriores como brigas de jo-
gos ou por ciúmes de ex-namoradas envolvidas 
em outros relacionamentos, ou por dívidas de 
drogas. Entre os registros dos adolescentes 64% 
(n=18) expuseram que o crime ocorreu sem 
planejamento prévio, com a utilização de armas 
de fogo (53,5% n=15), seguido do uso de arma 
branca (42,8% n=12) e, minoritariamente, a ví-
tima foi morta no porta malas do carro (3,7% 
n=1). O homicídio foi o único ato infracional co-
metido (86% n=24), embora, em menor parte 
dos casos, tenha ocorrido relação com outras in-
frações como roubo e extorsão (14% n=4).
O consumo recorrente de drogas e álcool 
esteve presente na história de 75% (n=21) dos 
adolescentes, a maior parte deles fazia uso de 
maconha. Outros dados revelam que 78% 
(n=22) dos jovens provinham de um ambiente 
violento e de vulnerabilidade social, residiam em 
bairros da periferia com forte tradição no tráfi co 
de drogas, com precária qualidade da moradia, 
e subcondições de saneamento. O nível socioe-
conômico foi baixo em 89,3% (n=25), apenas 
10,7% (n=3) possuíam renda familiar média; os 
familiares responsáveis exerciam trabalho infor-
mal e não tinham uma profi ssão defi nida.
Sobre o contexto familiar, 71% (n=20) dos 
adolescentes, tinham familiares que haviam co-
metido algum delito, a transgressão era existente. 
Na maior parte dos casos, o delito foi cometido 
pelo pai (50% n=10), e pelo tio (35%, n=7). Em 
apenas 28,6% (n=8) dos casos, os membros da 
família dos adolescentes não haviam sido presos.
>
>
11Welter e Scortegagna ADOLESCENTES QUE COMETERAM 
HOMICÍDIO: QUAIS OS FATORES DE RISCO?
Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016Adolescência & Saúde
>
Tabela 2. Descrição dos dados sociodemográficose das características psicossociais dos adolescentes 
perpetradores de homicídio
Variável Descrição £ %
Idade
14
15
16
17
18
19
2
1
9
10
4
2
7,1
3,7
32,1
35,7
14,3
7,1
Gênero Masculino 28 100
Estado Civil
Solteiro
União Estável
26
2
92,9
7,1
Escolaridade
4ª série
5ª série
6ª série
7ª série
8ª série
Ensino Médio
2
5
6
7
3
5
7,1
17,9
21,4
25,0
10,7
17,9
Arma Utilizada
Arma de Fogo
Arma Branca
Outro
15
12
1
53,5
42,8
3,7
Outros atos infracionais
Sim
Não
4
24
14,3
85,7
Contexto de Vulnerabilidade Social
Sim
Não
22
6
78,6
21,4
Uso de drogas e álcool
Sim
Não
21
7
75
25
Transgressão Familiar 
Sim
Não
20
8
71,4
28,6
£= Frequência, quantidade; % = Percentual
DISCUSSÃO 
Entre os fatores sociodemográfi cos, a mé-
dia de idade dos adolescentes foi de 17 anos, 
próximos a encerrar a idade de inimputabilidade 
penal, que é 18 anos incompletos, resultado este 
que corrobora outros estudos13,14. Além disso, a 
baixa escolaridade e a evasão escolar foram sig-
nifi cativas entre os adolescentes, e necessitam 
ser discutidas.
A escola é uma das instituições que deve-
ria dar continuidade ao processo de instauração 
de limites e de construção da identidade, mas, 
neste estudo, 97% (n=27) dos adolescentes 
evadiram-se deste ambiente. Alguns estudos 
demonstram a baixa escolaridade dos jovens e 
a evasão escolar como fatores de risco relacio-
nados a conduta homicida5,13,16. Este afastamen-
to, seja por expulsão ou por processos sutis de 
exclusão, como baixo desempenho, confi gura-
12 Welter e ScortegagnaADOLESCENTES QUE COMETERAM 
HOMICÍDIO: QUAIS OS FATORES DE RISCO?
Adolescência & SaúdeAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016
-se em um marco importante para a entrada ou 
para o agravamento da conduta delituosa, pois 
parece tornar os adolescentes mais vulneráveis, 
sem vínculos com as fi guras de autoridade17.
Em relação ao crime cometido, 78% 
(n=22) referem o motivo principal relacionado 
a dívidas de drogas ou discussões sobre jogos e 
ciúmes. O uso de drogas, e o envolvimento nes-
te meio, faz com que o adolescente seja mais 
suscetível aos comportamentos de risco, como 
a prática de infrações, sendo este um dos im-
portantes fatores de risco na conduta de ado-
lescentes homicidas13,14.
Entre os adolescentes, 64% (n=18) de-
monstraram que cometeram o homicídio sem 
planejamento, o que pode estar relacionado às 
características de personalidade como a impulsi-
vidade, outro fator de risco que pode infl uenciar 
atitudes violentas. Além da impulsividade, a hi-
peratividade, a ansiedade e a raiva são também 
características referidas8,9,10. Frente à tensão in-
terna, jovens com um aparelho psíquico fragi-
lizado podem utilizar defesas arcaicas, como a 
passagem ao ato. Esta diz respeito à impulsivi-
dade e imaturidade do aparelho psíquico, sendo 
o ato uma tentativa de fazer ligação da pulsão18. 
Observa-se que a escassa mediação psíquica, 
e a passagem ao ato denunciam a fragilidade 
de recursos internos; revelam uma estruturação 
psíquica com lacunas, repleta de faltas; demons-
tram os parcos investimentos recebidos por es-
tes jovens ao longo de sua constituição.
Fatores familiares, situacionais e sociais se 
constituem, igualmente, como importantes as-
pectos a serem examinados. O contexto de vul-
nerabilidade psicossocial, educacional, de con-
dições precárias de moradias, com altas taxas 
de tráfi co de drogas e poucas oportunidades de 
emprego, são marcas características da maior 
parte da amostra deste estudo (78%, n=22). 
Estes dados corroboram pesquisas precedentes 
que reforçam tais fatores como preditores da 
violência10,12,13. Em relação à baixa renda envol-
vendo as famílias dos jovens que cometeram o 
delito, a questão econômica, por vezes, pode 
contribuir para que os jovens tornem-se infra-
tores, como forma de sobreviver e aumentar a 
renda familiar19.
Em relação aos aspectos favoráveis ao de-
senvolvimento de comportamento infrator, 
observa-se também o uso de drogas e álcool. 
Entre os adolescentes deste estudo, 75% (n=21) 
faziam uso de maconha semanalmente, antes 
da internação. Esta realidade, exposta em ou-
tras pesquisas, demonstra que os fatores que 
infl uenciam o uso de drogas são: ser jovem, ter 
baixa escolaridade, disponibilidade, e presença 
de drogas na comunidade de convivência5,13,14. 
A associação entre o uso de substâncias psicoa-
tivas e o cometimento de delitos, sugere que o 
uso de drogas deixa o adolescente mais exposto 
aos comportamentos de risco, como a prática 
infracional14.
Para complementar a ideia da infl uência 
do nível sociopsicológico na situação dos ado-
lescentes em confl ito com a lei, torna-se neces-
sário refl etir sobre o contexto familiar. A família 
é o primeiro grupo social em que o indivíduo 
é inserido, em que se estabelecem as primeiras 
relações humanas que servem de base a todas 
as posteriores. A família do adolescente em con-
fl ito com a lei tem uma forte infl uência tanto 
na aquisição quanto na manutenção dos com-
portamentos infratores, porém sua infl uência é 
também importante na extinção desses com-
portamentos20.
Ao analisar a família como fator de rele-
vância na constituição de uma pessoa, pode-se 
pensar que, sendo a grande maioria dos adoles-
centes (71%, n=20) procedentes de um meio 
familiar transgressor, o contexto em que os pi-
lares de sustentação deveriam ser constituídos 
e a lei instaurada, é permeado de falhas. Sendo 
assim, os delitos perpassam as gerações e a cena 
familiar se torna um fator de risco.
Das pessoas que haviam cometido delitos 
na família dos adolescentes deste estudo, em 
50% (n=10) dos casos era o pai o infrator, se-
guido do tio (35%, n=7). Verifi ca-se, portanto, 
que as fi guras de representação da lei e de iden-
tifi cação, como a fi gura paterna, são frágeis e 
falhas. A instauração da função paterna é uma 
13Welter e Scortegagna ADOLESCENTES QUE COMETERAM 
HOMICÍDIO: QUAIS OS FATORES DE RISCO?
Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016Adolescência & Saúde
>
intervenção necessária e estruturante no proces-
so de formação do Superego por possibilitar a 
interiorização de regras essenciais para a vida e 
permitir que o ser humano não destrua a si mes-
mo e nem ao outro7.
Nas situações de delinquência, a função pa-
terna fi ca comprometida; então, muitos jovens 
procuram no externo o interdito que não encon-
tram no ambiente familiar, o que pode ter ocorri-
do neste estudo. Consequentemente, o ato infra-
cional pode surgir de uma busca do pai ausente, 
da autoridade, de uma lei que seja capaz de co-
locar limites. Nestas circunstâncias, não se pode 
deixar de questionar: como entender como auxí-
lio os posicionamentos legais que são favoráveis 
à maioridade penal de adolescentes que comete-
ram homicídio? Como a diminuição da idade de 
18 para 16 anos poderá contribuir para auxiliar 
estes adolescentes a instaurarem a lei?
Nota-se que as fi guras de autoridade, 
como pai e mãe dos adolescentes, não conse-
guiram instaurar efi cazmente a lei, o limite, o 
interdito. Outros estudos com adolescentes em 
confl ito com a lei demonstram a difi culdade de 
controle dos pais frente aos seus fi lhos, em que 
estes jovens passam a ganhar extensa liberdade 
e a supervisão parental torna-se inapropriada, 
podendo constituir-se jovens que não respei-
tem autoridade parental e não possuam um 
ambiente adequado ao desenvolvimento sau-
dável4,10,11,12,19.
Na falta de um quadro de referência, a par-
tir do qual poderia construir sua identidade, o 
jovem poderá buscar na sociedade a referência 
de que necessita para transpor os primeirosestá-
gios de seu desenvolvimento emocional, já que 
não o encontrou no meio familiar6. Daí a necessi-
dade de não abster-se do papel social (legal) que 
podem desempenhar as instituições brasileiras, e 
não se promover a maioridade penal. 
Diante do exposto, compreende-se que a 
vulnerabilidade que permeia a vida destes ado-
lescentes não se restringe apenas a um contexto 
pessoal ou individual, não é um processo linear, 
pois a fragilidade provém também da família, 
do meio social e da escola em que estão inseri-
dos. Nesse sentido, indaga-se novamente: onde 
se encontra espaço para expressão, proteção e 
contenção destes adolescentes? Recorre-se ao 
social para buscar as falhas do cuidado e suprir 
esta lacuna, como se no externo buscassem o 
controle frente aos seus atos6.
É assim que, paradoxalmente, a delinquên-
cia pode ser compreendida como um pedido 
de auxílio, ou seja, cometer um delito poder ser 
entendido como ter ainda alguma esperança de 
buscar preencher um vazio interno, buscando 
no externo algo que falta internamente: a lei. 
Alguns autores entendem o ato delinquencial 
como um apelo18, uma busca pelo olhar do Ou-
tro, de reconhecimento7.
De um modo geral, os dados encontrados 
na presente pesquisa são congruentes com ou-
tros estudos4,8,11,12,13,14,15,18. Demonstram que a 
combinação de fatores de risco, notadamente os 
familiares, sociais, educacionais e individuais, in-
fl uenciam o comportamento infracional, e a con-
duta de adolescentes que cometeram homicídio.
CONCLUSÃO 
Esse estudo alcançou o objetivo proposto, 
na medida em que trouxe compreensão sobre 
os fatores de risco relacionados a condutas de 
adolescentes que cometeram homicídio. Tais fa-
tores referem-se a processos de constituição indi-
vidual, ao entorno familiar, social e educacional. 
Entre os principais achados do estudo destaca-se 
o baixo nível de escolaridade, a vulnerabilidade 
social, o uso de drogas e álcool, a transgressão 
familiar e as falhas na competência parental.
As limitações do estudo envolvem os da-
dos dos documentos analisados, podendo haver 
informações limitadoras em cada prontuário. 
Além disso, a natureza documental deste estudo 
impossibilita uma compreensão mais profunda 
da estrutura e da dinâmica familiar, e da perso-
nalidade dos agressores.
Entretanto, as contribuições desta pesquisa 
são pertinentes e atentam para o desenvolvi-
mento de políticas públicas e ações interdiscipli-
14 Welter e ScortegagnaADOLESCENTES QUE COMETERAM 
HOMICÍDIO: QUAIS OS FATORES DE RISCO?
Adolescência & SaúdeAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016
REFERÊNCIAS 
1. Senado Federal (Brasil). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988.
2. Conselho Federal de Psicologia. Redução da idade penal: socioeducação não se faz com prisão. Brasília: 
Conselho Federal de Psicologia; 2013.
3. Schoemaker DJ. Theories of delinquency. An examination of explanations of delinquent. Nova York: Oxford 
University Press; 1996.
4. Zappe JG, Dias ACG. Violência e fragilidades nas relações familiares: refl etindo sobre a situação de 
adolescentes em confl ito com a lei. Estud Psicol. 2012;17(3):389-95.
5. Wahdan I, El-Nimr R, Wahdan KA. Risk of aggression and criminal behaviour among adolescents living in 
Alexandria Governorate, Egypt. East Mediterr Health J. 2014;20(4):265-72.
6. Winnicott D. Privação e delinquência. São Paulo: Martins Fontes; 2012.
7. Araújo SMB. Pai, aproxima de mim esse cálice: signifi cações de Juízes e Promotores sobre a Função 
Paterna no contexto da Justiça [tese]. Brasília: Programa de Pós Graduação em Psicologia, Universidade 
de Brasília; 2006.
8. Resende AC. A personalidade de adolescentes que cometeram homicídio por meio do método de 
Rorschach. Estudos. 201138(1/3):29-48.
9. Souza CC. Características psicológicas de adolescentes que cometeram homicídio [dissertação]. Goiânia: 
Pontifícia Universidade Católica de Goiás; 2013.
10. Mazoyera A, Harratib S, Berdoulatc E, Adé C. Contributions of projective methods tests to understand the 
violent adolescent’s affective and emotional life. Ann Medico-Psychol. 2013:268-72.
11. Pereira S N, Sudbrack MFO. Drogadição e atos infracionais na voz do adolescente em confl ito com a lei. 
Psic Teor Pesq. 2008;24(2):151-9.
12. Silva HC, Oliveira HD. Envolvimento com o crime e cotidiano. Cad Pesq Interdisc Ci-s. Hum-s. 
2011;12(100):105-25.
13. Priuli RMA, Moraes MS. Adolescentes em confl ito com a lei. Cien Saude Colet. 2007;12(5):1185-92.
>
nares mais efi cientes. As ações voltadas para os 
fatores preditores da criminalidade devem: (a) 
contemplar a assistência psicossocial e a saúde 
de todos os membros da família; (b) fomentar a 
escolarização dos adolescentes por meio de ofi -
cinas pedagógicas e do acompanhamento psi-
cossocial; (c) aumentar o nível de escolaridade 
da população brasileira para que possa se profi s-
sionalizar e, consequentemente, obter melhores 
condições de trabalho e de renda.
Além disso, são necessárias ações que re-
caiam sobre as consequências do crime, o que 
implica em: (a) banir a maioridade penal, já 
que os adolescentes precisam de um interdito, 
o que pode ser oferecido, também, pelo Esta-
do; (b) prover programas de reinserção social 
que abordem não somente o adolescente, mas 
a família. Há necessidade do desenvolvimento 
de intervenções que visem mudanças para um 
futuro familiar e individual melhor, em todos os 
contextos de saúde, social, e do trabalho.
Deve-se, ainda, fomentar práticas que per-
mitam reconhecer, cada vez mais, a situação de 
estar em confl ito com a lei como algo em mo-
vimento, não intacto, mas passível de mudança, 
em busca de um desenvolvimento humano e 
digno. Por fi m, para aprofundar o conhecimen-
to desta temática é necessário prosseguir com 
estudos para ampliação de dados relacionados 
aos fatores de risco das condutas homicidas.
15Welter e Scortegagna ADOLESCENTES QUE COMETERAM 
HOMICÍDIO: QUAIS OS FATORES DE RISCO?
Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 7-15, abr/jun 2016Adolescência & Saúde
14. Martins MC, Pillon SC. A relação entre a iniciação do uso de drogas e o primeiro ato infracional entre os 
adolescentes em confl ito com a lei. Cad Saude Publica. 2008;24(5):1112-20.
15. Coelho BI, Rosa EM. Ato infracional e medida socioeducativa: representações de adolescentes em L.A. 
Psicol Soc. 2013;25(1):163-73.
16. Bazon MR, Silva JL, Ferrari RM. Trajetórias escolares de adolescentes em confl ito com a lei. Educ Rev. 
2013;29(2):175-99.
17. Patterson GR. Developmental changes in antisocial behavior. In: Peters RD, Mcmahon RJ, Quinsey VL. 
(Orgs.). Aggression and violence throughout the lifespan. Newbury Park: Sage; 1992.
18. Rassial JJ. O adolescente e o psicanalista. Rio de Janeiro: Companhia de Freud; 1999.
19. Feijó MC, Assis SG. O contexto de exclusão social e de vulnerabilidades de jovens infratores e de suas 
famílias. Estud Psicol. 2004;9(1):157-66.
20. Carvalho MCN, Gomide PIC. Práticas educativas parentais em famílias de adolescentes em confl ito com a 
lei. Estud Psicol. 2005;22(3):263-75.

Continue navegando