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Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 1 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes ESTADO COMO FORMA POLÍTICA CONCEITO: O estado é uma entidade abstracta que actua através dos seus órgãos, e é uma realidade a qual é objecto de interesse de várias ciências e com métodos de análise variados. De acordo com o Professor Freitas do Amaral podemos encarar o estado como entidade actuante na ordem internacional e nesse caso ele é estudado pelo direito internacional. Mas também pode ser encarado como uma pessoa colectiva do direito público que desenvolve uma actividade administrativa e nesta perspectiva ele é estudado pelo direito administrativo. E por último pode ser encarado como 1 forma de organização política e nesta perspectiva é estudado pelo direito constitucional. Para fazermos a sua análise vamos partir de uma concepção do estado que pressupõe a existência de três elementos: Povo, o território, e o poder político. Esta concepção de estado foi teorizada por Jellinek já no início do séc. XX. Para Jellinek só podemos falar na existência de estado quando se verificar as seguintes situações: existir um povo que se vai fixar num determinado território com carácter permanente e vai instituir 1 poder político autónomo. ORIGEM DO ESTADO: Até aos finais do séc. XVI, não existiu estado tal como hoje é entendido, pois não existia um território fixo, um poder que se exercesse de forma molecular sobre todo o território, e não existia ainda um vínculo de nacionalidade. Sobre a origem do estado existem várias teses: Tese Naturalista: Partem da ideia de o homem ser, por natureza um ser que tende a viver em sociedade. O 1º a defender esta Tese foi Aristóteles, no séc. IV a.C. “ o homem é naturalmente um animal político (...) feito para viver em sociedade. Teses contratualistas: Estas têm a sua base numa explicação racionalista, têm raízes no pensamento medieval. A ideia base é a de que o homem é um animal social, tem necessidade de viver em comunidades, maiores ou menores. De início, vive no chamado estado natureza que é uma forma desorganizada, sem regras e com um permanente conflito de interesses. Até que entende as vantagens de associar-se, para melhor se defender. Reúne-se em comunidades organizadas, alienando parte dos seus direitos a favor da sociedade em geral em que fica incorporado. Esta incorporação faz-se através de um contrato social que se desdobra em: Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 2 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes a) Pactum Unionis: Esta leva à criação de uma sociedade civil organizada b) Pactum Subjections: Traduz a subordinação à vontade da maioria que designa os governantes que por sua vez vão criar e executar as regras necessárias à comunidade Esta tese é defendida por Thomas Hobbes na sua obra “ Leviathan “, por Jonh Locke na sua obra “Dois tratados de Governo” e J.J Rousseau na sua obra “Contrato Social” Teses organicistas: Que oscilam entre a consideração do estado como uma unidade espiritual e a equiparação a um organismo natural ou biológico. A 1ª consideração surge no seguimento da escola histórica alemã, para a qual o direito e o estado são expressões do espírito do povo. A 2ª consideração, liga-se ao positivismo e ao cientismo que procuram alargar ao domínio do político e do jurídico os esquemas dos cientistas da natureza, encarando o estado como um ser vivo. Para Hegel: Este intentou caracterizar o estado segundo uma posição predominantemente filosófica. O estado é a realidade em acto da ideia moral objectiva. E se o estado é o espírito objectivo, só como seu membro o indivíduo tem objectividade, verdade e moralidade. Concepção Marxista: O estado surge sem substância própria perante a economia, consequência da sociedade sem classes e máquina de domínio de uma classe sobre as outras. É um produto da sociedade quando esta chega a um determinado grau de desenvolvimento. Teses Voluntaristas: Esta tese é defendida por o Professor Marcelo Caetano, e por Lassale. Esta baseia-se em explicações Etnológicas, ou seja explicações com base na evolução das sociedades. Segundo esta o homem foi obrigado a agrupar-se para poder sobreviver. Daí o aparecimento das tribos, dos clãs, nos quais existia intensa solidariedade entre os seus membros que acatavam uma certa ordem de regras naturais de sobrevivência que era imposta pelo mais forte, visto que o aparecimento do estado nunca pode resultar da vontade de todos. Destes pequenos grupos, ter-se-ia passado a outros mais amplos, devido à acção de indivíduos ou grupos minoritários cuja autoridade, acabou por ser aceite pelas massas, umas vezes com maior resistência outras vezes com menor. O estado resulta assim de um acto de vontade. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 3 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes ORGANIZAÇÃO POLITICA MEDIEVAL ORGANIZAÇÃO POLÍTICA DA IDADE MÉDIA A COMUNIDADE POLÍTICA MEDIEVAL COMO AUSÊNCIA OU “NEGAÇÃO DO ESTADO” Deverá considerar-se de alguma forma que a Idade Média política será a antítese do Estado no seu conceito de Idade Moderna. (James Bryar) Formação e aparecimento do Estado No tempo em que não havia Estado, existiam diferentes organizações políticas das comunidades: - Famílias patriarcais (onde o Patriarca era o chefe da família); clãs; tribos; teocracias (baseado no poder religioso); polis e feudalismo. O Estado não é uma inevitabilidade como o progresso. Há quem defenda que a nossa forma de Estado é a mais desenvolvida, a mais sofisticada, mais complicada, em aperfeiçoamento constante. Mas quem nos garante que cada forma de Estado é melhor do que a anterior?! Na teoria do desenvolvimento político, o grau de progresso e o grau de sofisticação política estão directamente relacionados. Existem três estádios: O Estado subdesenvolvido 1- não há funções políticas/administrativas diferenciadas (qualquer pessoa pode desempenhar as funções), não há sanções/sistema para quem infringe a lei; daí que existam processos como a vingança privada. Exemplo disso é a Lei de Talião "Olho por olho; dente por dente" e a Teoria da Natureza (guerra de todos contra todos) de Thomas Hobbes no século XVII. 2 - Sociedade em que não há propriamente autoridades políticas, mas já há um certo tipo de ordem social onde se destacam: o grande proprietário (poder político) e o feiticeiro (poder religioso). O facto de já desempenharem funções políticas e serem como autoridade política demonstra um certo progresso, porque já se verifica uma certa autonomia do poder. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 4 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes 3- Estado onde se verifica uma certa especialização/diferenciação dos poderes. É também de notar o crescimento no interior da sociedade de um departamento que se debruça sobre as questões políticas. É o caso do Absolutismo dos séculos XVII e XVIII. Com as Revoluções Atlânticas (Americana e Francesa) no século XVIII, aparecem os Estados Liberais, nos quais se verifica uma especialização do departamento político (legislativo, executivo e judicial). O Estado é uma forma política historicamente condicionada, que só surgiu por volta dos séculos XVI e XVII, exceptuando o caso da Inglaterra (século XI), da Sicília (século XII) e de Portugal (século XIV). O primeiro autor a falar de Estado foi Maquiavel (séculos XV e XVI) -, "Lo Stato" que significa a forma como as coisas estão, como se organizam. Maquiavel foi um cientista político (política afastada da religião), que escreveu o livro "O Príncipe", onde as linhas mestras são "O que é o Poder?O que é a política?". Pode-se dizer que se tem verificado, ao longo dos anos, uma tendência para a crescente complexidade das formas humanas; das formas de organização política, uma crescente sofisticação das instituições - Lei Histórica da complexidade crescente das formas políticas. É, pois, para designar um modelo mais complexo de sociedade política que usamos a expressão "Estado". Comunidade Política Medieval (séc. V ao XV Sociedade Política Estadual (época actual) - Fragmentação do poder - Centralização do poder - Personalização do poder - Territorialização do Poder - Individualização do poder - Institucionalização do Poder Caracterização da Comunidade Política Medieval. Contrariamente àquilo que se pensa e que se diz, foi um tempo culturalmente riquíssimo, marcado pela arte, pelo pensamento, por inventos e muito mais. O mundo político medieval caracteriza-se por: Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 5 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes FRAGMENTAÇÃO; PERSONALIZAÇÃO E INDIVIDUALIZAÇÃO DO PODER 1. Fragmentação do Poder - Decorre do séc. V ao XV Deverá definir-se como Pluralidade de poder, Rede de Poder, Inexistência de Poder Geral, sociedade entrelaçada. A sociedade política é composta por um conjunto de organizações corporativas: Rei, Clero, Comunas, Mosteiros, Confrarias, Hierarquia de senhores feudais, Ordens Militares e religiosas e Cidades livres. Existia uma panóplia de entidades/organizações, cada uma com seu poder próprio. Nenhuma delas tinha o poder geral sobre todas as outras, tendo todas uma prestação/parcela no Poder, um dado "status", pelo que estavam todas interlaçadas sem que houvesse um poder único e superior - pelo que se profere que o poder é fragmentado. É assim, composta por um conjunto de díspares unidades ou instâncias com poder Político, que tem um determinado catálogo de prerrogativas e obrigações: surgem as figuras do Rei, Príncipes, vassalos, ordens religiosas, ordens militares, universidades, abadias, conselhos, guildas de comerciantes, comunas, etc., todas elas organizações políticas ou com sentido político, organizações desse aparelho que passavam pela componente financeira e burocrática, com o direito de cobrar impostos, cunhar moeda, esboçar máquinas de justiça e dispor de meios militares próprios. Em rigor as comunidades políticas da idade média estavam reguladas entre si. Os vários centros de poder dependiam uns dos outros (sociedade compactual). Não existe entidade com monopólio do poder. Não existiam leis gerais. Desigualdade estrutural. Ausência de Estado. Desempenham todas, um papel próprio na economia, tendo funções e obrigações específicas. Desta forma, não há nenhuma figura central, nem mesmo o Rei, que apesar de ter mais poderes que os senhores feudais, também têm deveres específicos. Pelo facto de haver um Imperador e um Papa, nenhum destes detinha o poder de "Imperium", dado que, em vez de concentrarem em si os poderes que se encontravam dispersos, constituem apenas mais duas figuras que disputam o poder de "Imperium". Constituem, pois, um limite exterior ao poder do Príncipe. Para além de estar dividida em Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 6 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes instâncias, esta sociedade divide-se também em estamentos (classes ou ordens sociais): Rei, Nobreza, Clero, Povo e Burguesia. Segundo Hegel, esta sociedade da Idade Média é caracterizada por uma poliarquia, uma espécie de partilha de soberania, uma separação de poderes em sentido político - o Poder era de muitos. Em suma, pode-se concluir que este período se caracteriza por um ideal clássico da Constituição mista, ou seja, verifica-se uma mistura de poderes, não sendo uma monarquia, uma democracia ou uma aristocracia puras. Com o nascer da Modernidade, vai-se proceder a uma unificação do poder, a uma centralização do poder, deixando este de pertencer às diversas instâncias para se concentrar numa só: o príncipe - este vai ser o detentor originário do poder. Afirma-se, um poder homogéneo e monopolizador. 2. Personalização do Poder Ao longo dos anos, o poder foi-se centralizando. Surge uma consciencialização nacional. Com efeito, este processo, encabeçado pelo Rei, vai dar origem a um domínio do poder por parte do rei, que retira progressivamente os poderes aos senhores feudais. Há aqui uma clara relação pessoal e não territorial. Assim pode-se dizer que a autoridade medieval não assentava no território, dado que este era visto como uma ideia de "dominium" (propriedade) e não estava investido de "imperium" (autoridade). Princípio da personalidade: "as relações de autoridade nasciam de pactos de fidelidade pessoal" - relação de vassalagem senhor vs vassalo. Há duas regras, neste contexto: a regna usufrutuária - os bens de que o Rei dispõe não são sua propriedade, mas estão sob a sua administração e a regna patrimonialia - os bens de que o Rei dispões são sua propriedade. Na idade média esta pluralidade tinha o seu vínculo na realidade da personalização da aplicação do direito. As relações de poder têm a sua fonte em relações de natureza pessoal que assentam sobretudo nas relações de vassalagem que nascem directamente dos pactos de fidelidade pessoal, (o cavaleiro oferecia a sua vassalagem e recebia do Senhor a sua protecção, assim aceitando o seu domínio), no fundo falámos de um contrato pessoal, i.e., é nos contratos que se estabelece a relação de poder. À época, as pessoas são o nexo, o vínculo que fundamenta o direito de poder, vínculos humanos assumidos. Aquilo que se pode exigir é aquilo que se pode ter. Concluímos que na sociedade medieval não existiu regra usufrutuare. A ideia que melhor caracteriza a Idade Média é a concórdia (contrato). Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 7 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes Na sociedade moderna, o território passa a ser sinónimo de autoridade e o poder já não é determinado pelo laço pessoal. 3. Individualização do Poder/Institucionalização/Fulanização O processo de institucionalização do poder traduz-se na devolução da titularidade do poder a uma entidade abstracta (Rei, Crown, Estado). Na Idade Média, o poder era individualizado, não havendo uma distinção clara entre a titularidade e o exercício do poder. O estado é titular do poder. O titular do poder desaparece mas não o cargo. Ausência de instituições e de regras institucionais. Os recursos que estão ao serviço do poder são aqueles que estão em regime de propriedade privada ao dispor desse órgão. Todo o poder é carismático (Max Webber), atribuído a quem tenha qualidade pessoais dignas de um verdadeiro chefe, não sendo chefe aquele que descende de um chefe ou que é eleito. O chefe era o mais rico, o mais bravo guerreiro/forte, o mais inteligente e hábil. Evoque-se a disputa do poder retratada em “O combate dos chefes”, da b.d. Astérix, o Gaulês. O melhor guerreiro, o melhor comandante ditava regras sem continuidade. Este tipo de poder caracteriza-se por uma instabilidade crescente, na medida em que o chefe pode a qualquer momento ser substituído por outro com qualidades mais dignas de chefia. Há, por outro lado, uma descontinuidade e uma ruptura nas próprias regras do regime, uma vez que é o chefe que dita as regras e, se ele é afastado, as regras que ele ditou perdem valor e deixam de vigorar e é necessário novas regras. Não havia, também, distinção entre o património pessoal do Chefe e aquele que lhe cabia por força do cargo que desempenhava. Estas características valiam mais na Alta Idade Médiado que na Baixa Idade Média. Fala-se nos dias de hoje de uma medievalização do poder, de uma Nova Idade Média, pois existem muitas analogias entre o nosso Estado e o tipo de Estado da Idade Média: grande variedade de entidades; fragmentação do poder; insegurança geral e incerteza em relação ao futuro. Com o suceder da institucionalização, o processo político pauta-se pela estabilidade e continuidade. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 8 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes . Nota: Max Webber, nas suas obras "Economia e a Sociedade" e “O Político e a ciência", fala-nos de uma caracterização do poder em 3 tipos: - Poder Carismático: resulta das qualidades pessoais; a pessoa impõe-se por si só. - Poder Tradicional: resulta de um costume/tradição (ex. Legitimidade monárquica - Rei). - Poder legal-racional: tem uma base normativa; estabelecimento prévio de certas regras. Excurso – Transição da política Medieval para a política actual Evolução do Estado – Absoluto; Liberal; Totalitário; Social TEORIA DOS TRÊS ELEMENTOS DE GEORG JELLINEK - Diz que o Estado é igual à soma de 3 elementos: Povo, território e soberania do Estado Alega-se acerca desta teoria que tal concepção reveste interesse para uma perspectiva Internacional do Estado de fora e por fora (não na sua essência interior), e por ser uma teoria formal sem se reportar à essência do próprio Estado, apesar de nos dias de hoje exercer forte influência, tanto na Teoria do Estado como no Direito Internacional Público. O Estado deverá hoje ser visto como comunidade de homens/comunidade global que obedece a um princípio de unidade. A DIMENSÃO TERRITORIAL DO ESTADO O Princípio Territorial é a base da configuração política do mundo no séc. XX. A dimensão Territorial reflecte-se imediata e dinamicamente nos mais diversos domínios da vida estadual, por outro lado, a capacidade de penetração territorial pelas ondas hertzianas, os efeitos da poluição, o terrorismo, etc., documentam exemplarmente a superação e dinamitam a concepção de Território enquanto fortaleza inexpugnável LIMITES TERRITORIAIS T.I.J. – “Estabelecer os limites entre estados vizinhos, é traçar a linha exacta de confronto em que se exercem respectivamente os poderes e direitos soberanos”. 1º - O Território É o espaço geograficamente fechado onde se exerce o poder do Estado, pelo que, delimita o âmbito de decisões Estaduais e limita o espaço de competências do estado. O território é o "palco da autoridade estadual", uma vez que o Estado não detém sobre o território uma relação de dominium (propriedade), mas sim de imperium (autoridade). Contudo, existem ainda territórios que não pertencem a nenhum estado Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 9 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes (Antártida e Alto Mar), assim como parcelas territoriais onde se verificam disputas de territórios (Palestina). Vigora o Princípio da territorialidade que afirma que o poder do Estado abrange todas as pessoas e a todas as coisas que se encontrem em território nacional - lado positivo da Jurisdição do Estado no território. Contudo, isto não implica que as regras se estendam de forma igual. E o caso dos estrangeiros que, apesar de se encontrarem temporária ou definitivamente no território nacional, gozam de diferentes direitos e obrigações, tais como o de não poderem exercer o direito de voto ou de prestar serviço militar. Contudo, é actual o conceito de cidadania europeia e a noção de integração europeia, pelo que surge o Princípio de Standard Mínimo que diz que qualquer estrangeiro terá direito a um conjunto de garantias mínimas. No território, não se exerce outro poder que não o do seu próprio Estado - é o princípio da impermeabilidade (Jellinek) que corresponde ao lado negativo da jurisdição do Estado no território. Em relação a este princípio, há hoje muitas excepções que derivam da progressiva integração europeia e da consequente submissão à autoridade exterior. Em 1º lugar, vejamos o caso da União Europeia, a maior manifestação desta integração, que, como organização supra-estadual, emite normas obrigatórias (Regulamentos Comunitários) e vinculativas para todos os Estados-membros. Estas normas entram directamente na ordem jurídica interna (Princípio da aplicabilidade directa), sobrepondo-se às normas nacionais. De seguida, refira-se o Direito Internacional Privado, onde por vezes terão de ser aplicadas normas estrangeiras para a solução de um caso concreto. Há ainda outros exemplos como a presença de forças de Estado de outros territórios (Base das Lages), as zonas desmilitarizadas de 50km (o Estado abdica do direito de ter tropas em certas zonas), o privilégio de extra-territorialidade (poderes dos diplomatas e embaixadores e Presidente da República). Note-se que todas estas excepções necessitam do consentimento do Estado. O território não tem de ser contínuo. No caso português, o território é descontínuo; os arquipélagos não estão ligados ao território Portugal Continental. • Como é que o Estado divide o seu território? - Inicialmente, era por Bulas Papais. Contudo, quando começaram as descobertas, o território começou a ser definido segundo o Princípio Ocupante (o primeiro a chegar era dono do território). Segundo Hugo Grócio Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 10 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes (grande jurista holandês), será território de um Estado aquilo que este controle, ou seja, só pode ser titular de um território aquele que efectivamente domina esse território - Princípio da efectividade. Este princípio está implícito na Conferência de Berlim (1885), acerca da partilha de África após o Ultimato Inglês. As potências europeias vão, dividir o território africano e vai então surgir e ser aplicado o Princípio da efectividade. Nos nossos dias, fala-se em Princípio (teoria) da Efectividade virtual: um Estado não tem de ocupar efectivamente o território, mas tem de demonstrar o seu domínio sobre esse território. É a capacidade de afirmar a soberania sempre que necessário, assim como a capacidade de deslocar tropas para o território. FRONTEIRA – É uma linha contínua e fechada que delimita o território do Estado, espaço onde se exercem os poderes estaduais. Os Estados coincidem historicamente com a época dos descobrimentos. - “Primo ocupantis”, (o primeiro que chega). Mais tarde Hugo Grócio defendendo “O Princípio da Efectividade”, diz-nos que o Território é de quem o domina, princípio este, sancionado durante a “Conferência Africana de Berlim em 1885”. Limites territoriais/Aquisição Territorial – Poderão resultar dos usos, tradição, tratados internacionais. Sentido sociológico ou político do território: Território, desde logo é um factor de extrema importância e mesmo decisivo para a integração de uma comunidade, enquanto objecto de defesa, povoamento, aproveitamento e elemento de destino político colectivo, factores que na prática estão na base da maior parte dos mais variados conflitos. Modos de aquisição Territorial - “Aquisição Originária” Res nullius = ocupação ((território já existente mas sem Estado (Sibéria)) = Acessão ((território cresce ou aumenta (Holanda)) “Aquisição Derivada” = Cessão (tratado onde se transfere uma porção de um estado para outro) = Sucessão ((Secessão de um estado (Alemanha pós 2º guerra) ou fusão ou unificação de dois ou mais Estados até aí independentes (Alemanha federal e democrática) ou descolonização (Angola, Moçambique)) . ELEMENTOS COMPONENTES DO TERRITÓRIO Universidade Católica Disciplina: Ciência Política11 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes - Domínio terrestre (solo e subsolo), domínio aéreo (milhas/campo de efectividade), domínio lacustre (linha média entre margens como critério de delimitação de fronteiras), domínio fluvial aquático (navegáveis e não navegáveis), domínio marítimo (mar territorial). • Domínio terrestre - É o espaço situado dentro das linhas de fronteiras. É constituído não apenas pela superfície (solo), mas também pelo subsolo (toma uma posição importante em matérias como as minas, o petróleo, infra-estruturas). • Domínio aéreo - É importante na navegação aérea. Há diferentes opiniões sobre o limite do domínio aéreo: 25 milhas; gravidade; Princípio da efectividade; não há limite. • Domínio lacustre - lagos, mares interiores • Domínio fluvial - RIOS → Contíguos: são aqueles que separam dois Estados (como por exemplo o Rio Minho). Sucessivos: são aqueles que atravessem dois ou mais Estados (como por exemplo o Rio Danúbio, Tejo, Reno, Douro). - Problemas: poluição; navegabilidade; construção de barragens. Como se faz a definição das fronteiras?! - Se o rio não for navegável é pela linha média; Se o rio for navegável é pelo sulco mais profundo. DOMÍNIO MARÍTIMO - Divide-se em águas interiores, mar territorial, zona contígua e zona económica exclusiva(ZEE). Determinam-se 3 milhas marítimas como limite próprio do princípio da efectividade - (jurisdição absoluta permitindo apenas passagem inofensiva) A linha que separa o Território terrestre do Território marítimo é a baixa-mar. Linha de base do mar Territorial Águas Interiores ((é a porção de terra que está limitada pela linha de maré alta e a linha de maré baixa (linha base do Mar Territorial). O Estado dispõe de toda a soberania que exerce em território terrestre, excepto em relação ao Direito de Passagem Inofensiva, ou seja, no espaço de mar territorial, tem de tolerar a passagem de navegação de outros Estados, sem intenção de ofensa. Consideram-se também águas interiores os mares completamente fechados, os lagos e os rios, bem como as águas no interior da linha de base do mar territorial). Esta fronteira foi estabelecida em 1982 na Convenção de Montego Bay. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 12 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes Mar Territorial - É uma faixa de águas costeiras que alcança 12 milhas náuticas a partir da linha da baixa-mar ao longo da costa de um Estado que são consideradas parte do território soberano daquele Estado. Dentro do mar territorial, o Estado goza de direitos soberanos idênticos aos de que goza no seu território e nas águas interiores, para exercer jurisdição, aplicar e regulamentar o uso e a exploração dos recursos no seu leito e subsolo. Entretanto, as embarcações estrangeiras civis e militares têm o "direito de passagem inocente" pelo mar territorial, desde que não violem as leis do Estado nem constituam ameaça à segurança. Zona Contígua - permite que o Estado mantenha sob seu controle uma área de até 12 milhas náuticas, adicionais às 12 milhas do mar territorial, ou seja 24 milhas náuticas, para o propósito de evitar, fiscalizar, policiar ou reprimir as infracções às suas leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração, sanitários ou de outra natureza no seu território ou mar territorial. Zona Económica Exclusiva - é uma faixa de água que começa no limite exterior do mar territorial de um Estado costeiro e termina a uma distância de 200 milhas náuticas a contar a partir da linha de maré baixa (excepto se o limite exterior for mais próximo de outro Estado) na qual o Estado costeiro dispõe de direitos especiais sobre a exploração e uso de recursos biológicos e não biológicos da água super jacente, do solo e subsolo marinhos, instalação de infra-estruturas submarinas e investigação científica, respeitando escrupulosamente o regime de liberdade de navegação à superfície. Plataforma Continental - compreende o leito e o subsolo das áreas submarinas que se estendem além do seu mar territorial, em toda a extensão do prolongamento natural do seu território terrestre, até ao bordo exterior da margem continental ou até uma distância de 200 milhas marítimas das linhas de base a partir das quais se mede a largura do mar territorial, nos casos em que o bordo exterior da margem continental não atinja essa distância. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 13 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes 2º - POVO - Elemento humano. Unidade de poder. Conjunto de pessoas que estão ligadas ao Estado por um vínculo jurídico comum, o vínculo da nacionalidade, residentes ou não no território - conceito jurídico-político. POPULAÇÃO- Formada por nacionais, estrangeiros e apátridas que independentemente da sua nacionalidade residem sob a alçada/autoridade estadual – conceito demográfico – económico. NAÇÃO – Corresponde ao estado, idade trans-temporal, ideia espiritual de princípio de cultura, ideológico. Conjunto de pessoas que está ligado por um sentimento de pertinência comum (segundo Zipellius), a uma mesma Comunidade que radica em factores de ordem étnica, cultural e política; é uma apologia do Estado, uma ligação à sua história e aos seus valores - conceito sociológico-espiritual “ as Nações são mistérios, cada uma é um todo, um mundo a sós” F. Pessoa. LEI DA NACIONALIDADE - - A Nacionalidade é um vínculo de carácter jurídico o que significa que é a Lei que define quais os Nacionais do Estado, e orienta-se fundamentalmente por dois critérios básicos: aquisição originária da nacionalidade que é aquela que se adquire no momento do nascimento. Se é o direito que estabelece esse vínculo, é o estado que vai, naturalmente, estabelecer critérios para definir quem é Nacional: Ius soli – “Local de nascimento - território”("direito do solo") estabelece como critério originário de atribuição de nacionalidade o território onde nasceu o indivíduo. Segundo esta regra, não importa a nacionalidade dos pais, apenas o local do nascimento do sujeito. É a regra mais favorecida pelos países de imigração (como os das Américas e mais recentemente regra adoptada por Portugal), que buscam acolher a família do imigrante e assimilá-la à sociedade local. Ius sanguinis –("direito de sangue") É nacional de um Estado o filho(a) de um nacional daquele Estado; em outras palavras, trata-se da nacionalidade por filiação. A maioria dos países que adoptam o ius sanguinis como regra de atribuição de nacionalidade que estipula que esta é transmitida tanto pelo pai quanto pela mãe. Países como a Alemanha, e outros Europeus mais conservadores preocupados com a imigração restringem este critério. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 14 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes Pode-se falar em e em aquisição derivada da nacionalidade que será adquirida por factor posterior ao nascimento ((adopção, reconhecimento de filiação, casamento e por factores não familiares (naturalização, mudança de Estado, sucessão de Estado)). • Aquisição originária da nacionalidade - 1º Critério) São cidadãos nacionais aqueles que reúnam o critério do ius sanguinis + ius solis. Também são nacionais, aqueles que nasceram em território estrangeiro mas que estão ao serviço de Portugal. 2° Critério) São cidadãos nacionais aqueles que são filhos de portugueses que (vivem no estrangeiro, desde que registados pelos pais no registo. 3° Critério) Aqueles que são filhos de estrangeiros mas que nasceram em Portugal só serão cidadãos nacionais se os pais residirem em Portugal há mais de 10 anos. No caso de os pais serem de umpaís de língua portuguesa, o requisito dos 10 anos baixa para 6 anos. 4° Critério) Aquelas pessoas que não tendo qualquer outra nacionalidade e nasceram em Portugal, o Estado Português concede-lhes a nacionalidade portuguesa. • Aquisição derivada da nacionalidade - - Uma pessoa que tenha nacionalidade portuguesa e que tenha um filho menor ou incapaz; - Por casamento: ao casar-se com um/uma português, pode adquirir a nacionalidade ao fim de 3 anos, isto para evitar casamentos com o propósito de se ficar com nacionalidade portuguesa; Por adopção: se uma criança for adoptada por portugueses, passa a ser portuguesa; Pela sucessão dos Estados (Ex: Angola; Guiné; Moçambique; Macau); Pela naturalização: requer certos requisitos como ser maior, residir em território português há pelo menos 10 anos ou há 6 anos se for cidadão de língua portuguesa oficial ter idoneidade cívica (nunca ter cometido um crime em Portugal). • Como se trata as situações de dupla ou tripla nacionalidade? Que nacionalidade prevalece? E prevalece alguma? À luz do Direito Internacional Privado, a lei que se aplica nas situações jurídicas é a lei da nacionalidade (estatuto pessoal). Em princípio aplica-se o critério da efectividade, ou seja, das duas/três nacionalidades prevalece aquela do país onde reside. No Direito Internacional Público, foi decidido no Tratado de Nottebohm que o que vigora é o Principio da nacionalidade efectiva. Contudo, foi corrigido pela Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 15 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes jurisprudência da Fleggenheimer: a nacionalidade efectiva só conta quando se tem mais do que uma nacionalidade; mas quando se tem só uma nacionalidade, é essa que conta. A nacionalidade nem sempre se identifica com a nação. Existem factores que contribuem para o sentimento de, pertinência comum: origem étnica ou rácica (ascendência comum); factores de ordem cultural, como o costume e a tradição; factor linguístico ("A minha pátria é a língua portuguesa" Fernando Pessoa); religião; destino político comum (autoridades políticas). Não há nenhuma causa /factor única; há sim uma interacção entre todas elas. Ainda respeitante ao tema da nacionalidade, existem alguns princípios que se vieram a afirmar e, por sua vez, a aumentar este orgulho de nacionalidade: 1 - O Princípio das Nacionalidades “cada Nação tem o direito de constituir um Estado”, e a cada Estado deve corresponder uma Nação, vai afirmar-se com rigor e perigosamente a partir do séc. XIX. As potências ganhadoras; Rússia, USA, vão desenvolver os princípios de organização política da Europa onde é desenvolvido o princípio das Nacionalidades na Áustria, no congresso de Viena, como princípio da autodeterminação dos povos (que afirmava que cada população tem direito a escolher e a seguir os seus próprios destinos, ou seja; cada povo tem direito à independência e à liberdade), possibilitando-lhes a sua independência, que por mera questão maquiavélica se permitem dominar as Nações através das mais variadas instrumentalizações. Quando este princípio não é devidamente realizado, surgem os problemas com as denominadas minorias nacionais, ou seja, problemas de protecção, respeito pela sua individualidade e especificidade, usos, costumes, cultura, dando origem a problemas especialmente agudos, nomeadamente, terrorismo, fundamentalismo, etc. 3º - A SOBERANIA Na actual forma de sociedade política do Estado, surge a Soberania como elemento de poder político unificado, concentrado e homogéneo. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 16 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes A teoria do poder soberano remonta a Jean Bodin, pensador e filósofo político do séc. XVII, que a caracteriza a soberania como poder supremo sobre os cidadãos e os súbditos e que não está condicionado pelas leis, quer como poder absoluto no plano interno quer como poder independente no plano externo. Por outro lado o Rei não podia legislar sobre algumas matérias, nomeadamente sobre a Lei Natural e sobre a lei Divina. Não podia legislar sobre o acto de sucessão (família), nem sobre a propriedade das pessoas. Limites (teoria de Bodin) – Limites geográficos legais, limites económicos, limites externos (multinacionais), estados mais poderosos), limites jurídicos (positivo – o Estado elabora leis, é obrigado a cumpri-las, está vinculado a essas mesmas leis), limites transpositivos (pessoas julgadas por obedecerem às leis do seu próprio país). Em nome de quê? em nome de um princípio de tal maneira importante (valores da dignidade humana), devo obediência, tenho o dever de a desobedecer. Importa no entanto referir que a teoria do poder soberano não se ajusta inteiramente à situação histórica actual. Teoria entretanto aperfeiçoada completando-se com a institucionalização do Estado, abandonando a soberania do soberano, passando em definitivo a soberania do Estado. Na mais moderna concepção enquanto modelo evoluído de estado, esta soberania é considerada por Zipellius em duas notas fundamentais – o Estado detém a competência das competências (ter o poder de definir, aumentar ou diminuir as competências, de possuir a soma de todas as competências) e unidade de poder de Estado. Concretizando, poderemos dizer que a competência das competências se revela antes de mais, na prerrogativa do estado, se dotar de uma Constituição, de elaborar a sua própria Constituição (em que define os princípios e fins essenciais da sua organização e a regra de distribuição dessas competências entre os seus órgãos). A soberania actual manifesta-se também na unidade do Poder do estado, pelo Princípio da Territorialidade que diz que, no contexto territorial e no âmbito de competências apenas se faz sentir o Poder do Estado. Tem de se encontrar, contudo, um equilíbrio entre esta ideia de unidade do Poder do Estado e a separação dos poderes do Estado. ' É importante referir que o grande limite à soberania é que o Estado está vinculado às próprias leis que ele faz - Estado juridicamente vinculado. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 17 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes Fundamentos/Étimos da Democracia: São valores que fundamentam e justificam o modelo político democrático e o que ele visa realizar. Trilogia da Revolução Francesa: * liberdade - cada um é responsável pelo seu próprio destino (capacidade de autodeterminação moral do Homem) * igualdade - reconhecimento a todos os outros a dignidade igual àquela que nós temos. * fraternidade - reconhecimento do respeito pelos outros, de que cada Homem, na sua autonomia e dignidade, só pode realizar-se na solidariedade com os outros. A Democracia só pode valer quando ao serviço destes valores! Mas o verdadeiro fundamento da democracia é o valor da dignidade da Pessoa Humana (que se desdobra em liberdade, igualdade e fraternidade e que, por sua vez. se desdobram nos vários princípios fundamentais). A vida é um valor absoluto! Contudo, por vezes, estes valores entram em conflito/tensão. A liberdade entregue a si mesma, tende a gerar ou a acentuar as desigualdades e a realização da igualdade implica restrições à liberdade; ou seja, muitas vezes, quando se aumenta a liberdade diminui a igualdade e vice-versa. Ex: Capitalismo Selvagem - total liberdade económico e total ,desigualdades. Sorteios - total igualdade mas não dá espaço para a liberdade. Alargamento do sufrágio - realiza a igualdade e a liberdade. Para a realização plena da Democracia tem de haver uma realização plena destes valores fundamentais. Mas serão estes os valores fundamentaispara a nossa sociedade, passado tantos anos?! Resolverão eles os nossos problemas?! São Paulo já dizia nas suas cartas que "Não há judeu nem grego; não há Homem nem mulher; não há escravo nem livre", ou seja, todos os Homens são iguais perante Deus; mas entre todos os Homens somos todos diferentes. Denniger propôs uma nova trilogia: * diversidade - variedade de raças, religiões, cultura, ... Vivemos numa sociedade multicultural! Hoje, o que é igual é o direito à diferença. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 18 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes * solidariedade - se há igualdade, deve haver mais solidariedade. É preciso sermos exigentes nas prestações sociais. * segurança - a liberdade sempre andou ligada, à segurança. Não há liberdade sem segurança. Segurança, porque vivemos numa sociedade de risco! É necessário segurança tecnológica, ambiental, física e no trabalho. Ronald Dworkin, falou em democracia substantiva, ou seja, tinha uma concepção de democracia como um regime que se caracteriza pela protecção, de determinados direitos e princípios (direitos fundamentais). Tem implícita a ideia de pluralismo (separação de poderes). Os valores já fazem parte do sistema democrático e não estão dependentes dos resultados eleitorais. John Ely defendeu uma democracia processual/deliberativa, ou seja, vê a Democracia como um processo de tomar decisões/deliberações. A Democracia não deve estar pré-vinculada a certos valores. Isto porque, em cada momento, em cada geração, o Povo deve determinar os seus valores. Os valores/condições democráticos que devem estar garantidos ou predefinidos: * liberdade de expressão/pluralismo * regras eleitorais * protecção das minorais Representação Política Uma democracia representativa é aquela em que há uma representação política. Existem vários mecanismos de escolha de representantes. * A eleição * 0 Sorteio – (a sua democraticidade estará na igualdade que realiza) raramente utilizado pelo facto deste não medir a preferência dos cidadãos nem reconhecer a capacidade dos candidatos * Cooptação - os titulares dos poderes escolhem os próprios titulares do Poder. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 19 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes * Hereditariedade dinástica – podem ser compatíveis com a democracia, porque os poderes são essencialmente simbólicos e com moderação. Os representantes do povo têm um mandato revogável; é um mandato limitado (eleições periódicas) o que garante que exerçam de acordo com a vontade do eleitorado. A forma da democracia semi-directa é o referendo. Reduz-se ao sim/não, reduz as alternativas da escolha sendo frequentemente discutida a sua democraticidade. Para que o referendo possa ser considerado como forma democrática é necessário que não seja um órgão a convocá-lo, que se trate de decisões de matéria de consciência e que sejam grandes reformas. Vídeo Democracia/Democracia Mediática Grande parte da participação política é feita pelos órgãos de Comunicação social; Todas as decisões políticas são tomadas sob pressão dos media; Isto fez com que os Partidos e os sindicatos perdessem algum poder. Sartori dizia que "deixamos de viver numa sociedade onde existe o homo Sapiens para existir o homo videns (Homem que vê televisão) Sondagens – Democracia de opinião Muitas decisões dos partidos são influenciadas pelas sondagens. A popularidade dos políticos é muito importante e os partidos tomam muitas vezes decisões em função das audiências. As sondagens não transmitem aquilo que as pessoas pensam mas o que os mass média as levam a pensar Passagem da Democracia liberal Típica para a Democracia dos Partidos A representação popular e o sufrágio (Soberania Nacional) No século XIX, havia restrições ao sufrágio censitário em razões de ordem socio-política: em função do sexo, em função da idade, em função da raça, por indignidade e relativas aos militares. Exemplo disto revela-se: O Sufrágio restrito: o direito de voto era reconhecido só a certas categorias de cidadãos; era o sufrágio censitário pois o direito de voto condicionava-se à posse de uma certa fortuna, expressa no nível de contribuição directa paga, ou seja só votava quem tinha dinheiro. - 0 Sufrágio capacitário: o direito de voto era reservado a quem possuísse certo nível de instrução, ou seja, só votava quem sabia ler e escrever ou tivesse dinheiro. Era raro, dado a Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 20 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes capacidade económica praticamente inexistente. Tal servia para que a burguesia conservasse o Poder político → vão-se escolher os melhores para traçarem as metas → Doutrina da Soberania Nacional (é da Nação e não do povo a obrigação). Nota: Votar era uma função e não um direito - eleitorado função - Mandato representativo: o deputado, sempre que é eleito, está a representar toda a nação. Por isso, tem plena e total liberdade de voto e consciência. No fundo, cada deputado era independente e racional. - Avanço para um sistema político em que o órgão que comanda a vida política é o Parlamento - século XIX. Os partidos só já nasceram no Parlamento. O direito de sufrágio foi, progressivamente, alargado, até chegar ao conceito de "um Homem, um voto". SÉC XX - Deste modo, desapareceram alguns limites ao voto: em função do sexo, em função da idade, em função da raça. É agora sufrágio universal (soberania popular ou fraccionária): é o dto de voto para todos os cidadãos juridicamente capazes. A consagração do sufrágio universal representa o culminar de 1 longo processo evolutivo. A consagração do sufrágio universal será o reencontro dos ppios lógicos da democracia; vai constituir 1 entendimento da "Soberania do Povo”: a todos e cada 1 dos cidadãos (cada cidadão dispõe de 1 parcela da Soberania). O voto não é 1 simples função mas passa a ser 1 dto - eleitorado de direito. Os deputados não representam necessariamente a nação, mas aquelas pessoas que efectivamente os elegeram. Por isso, o mandato toma-se imperativo: o deputado tem de cumprir as suas funções e as directrizes do partido: Embora teoricamente não haja um mandato imperativo, na prática existe, organizado pelos partidos que os deputados representam. Democracia dos Partidos Nas modernas democracias, o papel fundamental nas eleições é dos partidos. • Partidos do Quadro - são aqueles que não têm muitos militantes; são constituídos por pessoas notáveis. Ex: partido trabalhista; Partidos Conservadores (mais à direita); Partidos liberais (mais progressistas). Estes Partidos deram origem aos Partidos na América. (Nascem no final do séc. XIX, princípios do séc. XX. Começaram a defender que, antes das eleições, tem de haver uma votação dentro do próprio partido - votação primária, onde só votam os militantes. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 21 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes • Partidos de massas - têm uma organização muito forte, devidamente estruturada sempre com muitos militantes. Partidos Socialistas: (1ºs a aparecer): a militância servia par obter fundos. Lógica da formação. Integração social (Catch all Parties) Partidos comunistas: organização impecável baseada em células, composta por poucas pessoas, nos locais de trabalho: centralismo democrático (pirâmide hierárquica muito rigorosa). (Catch all Parties) Partidos Fascistas: assentavam na força física; os militantes • Partidos de eleitores - são aqueles que têm muitos militantes, cujo o fundamento é o arregimentar eleitores (peloque utilizam discursos mediáticos, atractivos e abstractos) e o inter-classicismo. • Partidos de Protesto - como por exemplo o PP (causa Ultramar; aumento das reformas, ... ) e o Bloco de Esquerda (aumento dos impostos sob as empresas; legalização das drogas leves; direitos dos homossexuais). Funções dos Partidos 1°) Enquadramento dos eleitores: - Ideológico (posicionamento ideológico dos eleitores) - Os partidos políticos desenvolvem a consciência política dos cidadãos, permitindo que estes percebam mais claramente as opções políticas e seleccionarem os candidatos que vão participar nas eleições. Sem partidos, os eleitores não poderiam conhecer as orientações dos diferentes candidatos e votariam nos notáveis tradicionais (pessoas mais suas conhecidas), princípio este defendido pelos partidos de esquerda que se opunham veementemente a este tipo de escolha, a escolha das elites tradicionais sociais. - Selecção dos candidatos → Métodos: (primárias) ___________ * votação por todos os militantes - disciplina de voto (directas) ___________ * nomeação pelo Director Partidário * eleitores descubram o quadro de preferências Os partidos escolhem os candidatos a propor aos eleitores, mas qualquer pessoa se pode autopropor a uma eleição (dentro de certos requisitos), sem o apoio de um partido. A Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 22 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes maior parte dos candidatos eleitos são apresentados por partidos políticos utilizando vários processos segundo a sua própria estrutura. 2°) Enquadramento dos eleitos: - Sociológico (procuram impulsos para a sua actuação no meio da sociedade) e Ligação parlamentar. Relação que se estabelece entre a Direcção Partidária e o Grupo Parlamentar: • Partidos de Quadro: a relevância/predominância é o grupo parlamentar. • Partidos de Massas: quem domina é a direcção - direcção introvertida. • Partidos de Eleitores: quem manda na Direcção Partidária são os deputados, embora não chegue ao extremismo dos Partidos de Quadros; é virado para os eleitores - direcção extrovertida Catch all Parties – são partidos populares, interclassistas, adaptados às exigências funcionais dos tempos modernos, da Mediocracia. Consideram-se partidos Nacionais dispondo de um “programa de agregação”, com direcção extrovertida que promove os eleitos que tendem a ganhar primazia sobre os eleitores em detrimento da própria burocracia partidária Onde há disciplina de voto, há um partido rígido (rigorosa disciplina partidária). Onde não há disciplina de voto, fala-se em partidos flexíveis, onde um deputado pode votar no Parlamento de forma autónoma, mesmo que isso implique votar de forma contrária ao seu partido. Ex: Daniel Campelo em Ponte de Lima O sistema português caracteriza-se: * representação eleitoral, * não há maiorias absolutas mono partidárias (dentro de um só partido). Contudo, isto nem sempre se verifica, como por exemplo com o Prof. Doutor Cavaco Silva, dado o seu carisma e a introdução por ele do conceito "estabilidade". Estado no tocante aos seus fins Os Estados de acordo a relação Estado/Sociedade: • Estado Absoluto/Totalitário • Estado Liberal • Estado Social de Direito Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 23 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes • Estado Pós-Social 1º) - Século XVII/XVIII - Estado Absoluto - Tem a sua realização perfeita no Estado-de- Polícia: intervenção do Estado na vida dos cidadãos. Com o decorrer do tempo, foi-se verificando uma centralização do poder do Rei, até que concentrou em si a totalidade dos poderes – absolutismo. Ex: D. João V; Marquês de Pombal. O Estado-de-Polícia é aquele, em que o Soberano, deve promover a nação em termos técnicos, culturais, económicos, políticos, etc., para manter a nação no Mundo das nações civilizadas, na vanguarda. No Estado-de-Po1ícia está implícita a ideia de que o Príncipe/Rei (o Soberano) é a pessoa mais independente (não depende de ninguém; só depende de Deus) e mais esclarecida a mais iluminada, que está em condições de reunir todos os sábios e decidir com conhecimento de causa e sabedoria. O Rei está, assim, em condições de decidir o que é melhor para todos! Como dizia Otto Mayer "o soberano iluminado conseguia fazer tudo sozinho". Isto implica que o Rei queira fazer do seu Estado um Estado de admiração dos outros, um Estado progressista, avançado, imponente. O Príncipe tinha de velar pelo programa do Estado, mas também pela felicidade do Estado. Trata-se da construção, de um Estado não como realidade jurídica, mas como um conjunto de meios à disposição da Comunidade. Este tipo de Estado vai nivelar a sociedade: a sociedade feudal vai desaparecer e surge a sociedade com duas categorias: o Príncipe e os súbditos (não têm direitos individuais). Ao fazer esta divisão (dualismo), vai criar um sentimento de humildade. Ao contrário do que muitas vezes se pensa, o absolutismo fez surgir o conceito de igualdade. O Estado modela, interfere e regula a sociedade! 2°) Estado liberal - (Estado negativo) - corresponde ao séc. XIX e ao Estado não intervencionista, e abstencionista do “laissez faire, laissez passer”. Surge, no pós revoluções liberais. Consiste na transposição para o plano liberal de certas concepções filosóficas ideias (o Iluminismo que identifica o Homem como o centro da sociedade), o que levou a uma ruptura com os valores anteriores, culminando com a Revolução Francesa. Pretendia-se acabar com o Estado-de-Polícia do século XVII. A Revolução é, de certo modo, como um continuar a ideologia do absolutismo. A burguesia passou a caracterizar-se também como Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 24 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes independente (tem direitos) e iluminada (tem saber). Então interrogou-se por que razão não era detentora de poder?! O Estado Liberal é um Estado de Direito que tem uma Ordem Jurídica que regula a sociedade. A liberdade é entendida como 1 dto à abstenção do Estado. Fala-se aqui num "status libertatis", por Jellinek. Por outro lado, '' status activa civitatis” refere a liberdade de participação para formação da vontade comum. Assim, para os Homens serem totalmente livres; não pode haver qq forma de integração ou associação, na medida em que, deste modo, os seus membros estariam submetidos às suas normas - Lei de Chapelieu de 1790. A ideia de Soberania Popular de Bodin serve de base ao Liberalismo de Rousseau no século XVIII, que assentava num contrato social entre cada indivíduo e a colectividade traduzindo uma "vontade geral". Dá-se a sua implantação também com o novo sentido de Direito Natural, que então surge, dando primazia à defesa dos direitos originários e naturais do indivíduo. Afirma-se, deste modo, a existência de dtos naturais, inalienáveis, imprescindíveis, fundamentais, originários, que nunca poderão deixar de existir e ser refutados. Com o movimento do século XVIII, surge o conceito de Constituição escrita. O Estado passa a estar vinculado a um documento escrito: A Constituição surge com certas características: - instituir a separação dos poderes - garantir e assegurar os Direitos Fundamentais e individuais A Constituição é 1 conquista, 1 triunfo da Nação sobre o Monarca (é diferente de Carta Constitucional, visto que esta é 1 constituição que é dada pelo príncipe à nação). A grande constante do Estado liberal é o abstencionismo económico do Estado; é um domínio ajurídico, ou seja, o Estado não deve interferir na economia, havendo assim a iniciativa individualde cada um. Este movimento autónomo vai formar um mercado de concorrência perfeita, deixando agir livremente os mecanismos da Oferta e da Procura. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 25 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes O mesmo acontece com a Administração Pública; pelo que o Estado deverá assumir una atitude passiva ou não perturbadora da esfera dos direitos privados. Com efeito, a salvaguarda dos direitos das pessoas é conseguida com a não intervenção do Estado, sendo o papel da Administração Pública diminuto, pelo que se afirma neste contexto, o Princípio da Legalidade administrativa: a actividade administrativa vai estar ligada ao Parlamento, logo ligada à Nação. Segundo o entendimento negativo deste ppio, não pode haver administração contra a lei (as entidades públicas não podem actuar contra a lei), mas podem agir livremente (praeter legeur) desde que não vá contra a lei. Com o decorrer do tempo e o aumento do domínio de acção do Estado, deu-se a reformulação deste princípio: a Administração não pode actuar em certos domínios, a não ser com base na lei (matérias ligadas à propriedade e à liberdade) - Princípio da reserva de lei. Nos finais do século XIX, o sentido de legalidade é visto num sentido positivo, isto é, a Administração Pública tem de ter base numa lei (secundum legeur). Pela primeira vez afirma-se os Direitos Fundamentais do Homem (Direitos negativos porque defendem o cidadão contra o Estado) - primado do Homem. Afirma-se, finalmente, a ideia de que a moral não pode ser imposta externamente. Cada um é responsável pela sua salvação e felicidade. O Homem é um ser com autonomia moral. Riscos inerentes à liberdade: O Estado de Direito Liberal começou por ser material mas tomou-se formal, restando a ideia de que a administração deve estar vinculada à lei (desaparece a vinculação à ideia de justiça). O desenvolvimento da economia sem intervenção do Estado revelou-se um sistema de exploração desumana: Caiu-se num liberalismo desenfreado e o Estado teve de começar a intervir contra os abusos de liberdade. 3°) Estado Social de Direito A ideia de socialização surge com a lª guerra Mundial, situação onde se começa lentamente a pedir a intervenção do Estado. O Estado deveria, pois actuar ao nível Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 26 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes económico e social, em ordem a realizar "as necessidades de satisfação passiva" (abastecimento, obras públicas, etc.). O Estado devia defender uma política de preços e salários, uma política fiscal, ou seja, uma intervenção do Estado na economia, na educação, no emprego, na saúde, na habitação, ... O Estado tem, agora, também, o objectivo de justiça social A Administração Pública passa a ser encarada como agente de realização de "necessidades colectivas", como a justiça social, a realização do bem-estar ou a prossecução do princípio da igualdade em sentido material. Implanta-se, assim, o Estado Social de Direito com a criação de 1 novo conjunto de direitos, que consistem nos direitos a prestações positivas do Estado, exigidas pelos cidadãos. As primeiras"constituições que os consagram são as saídas do pós-guerra mundial, nomeadamente a Constituição da República de Weimar de 1919. Trata-se de um Estado de Providência de Bem-estar Social - o "Welfare State". O Estado está em todo o lado, é omnipresente e modela as relações sociais - é a colonização da sociedade pelo Estado Verificou-se ainda um alargamento do direito ao voto, assim como foi instituída a liberdade sindical e o direito à greve, evidenciando a necessidade de protecção da classe operária. É importante realçar que se parte de uma ideia de igualdade de todos perante a lei igualdade meramente formal. Contudo, esta sobrevalorização da liberdade fez com que a sociedade evoluísse para uma situação se desigualdades. 4) Estado Pós-Social O estado Social entrou em crise, principalmente em crise financeira. O Estado é muitas vezes burocrático, lento, pelo que o recurso ao privado, torna-se muito mais eficaz. Por outro lado, o Estado tem novos objectivos, como por exemplo as questões ambientais. Paralelamente, a sociedade evoluiu e mudou; é uma sociedade consumista e individualista: Deste modo, fala-se agora de um Estado Pós-Social, com novos objectivos e novas questões. ► Formas de Estado Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 27 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes Para distinguir as diversas formas do estado, importa conhecer a titularidade do poder para agrupar os Estados: - Quem são/Quantos são os titulares do Poder? Os titulares do poder estão a agir com legitimidade? • Aristóteles Defendia que as 3 formas usuais de Estado são: * - Monarquia - o poder reside num só * - Aristocracia - o poder reside numa classe ou elite * - República - o poder reside em todos, é o poder do povo (equivale à Democracia) Este era o critério utilizado em tempos (critério da Titularidade do Poder - elemento quantitativo), isto é, para a divisão das diferentes formas de Estado atendia-se ao número de titulares do Poder, até que Aristóteles veio trazer um novo critério que atendia ao modo como o poder era exercido, ou seja, se era exercido em prol da comunidade ou exclusivamente para o bem de alguns (Critério da legitimidade dos titulares). Assim, Aristóteles concluiu que: Se o Rei usa o poder que tem ao serviço do bem comum, encontramo-nos perante uma Monarquia. No entanto, se este o usa em proveito próprio, estamos numa Tirania. Do mesmo modo, a Aristocracia apresenta como lado corrupto a Oligarquia, enquanto que o regime de perversão/vício da Democracia é a Demagogia. Mas qual a forma de Governo preferida por Aristóteles? Acha que todas têm as suas qualidades todos os regimes são bons desde que exercidos na sua verdadeira essência. O paradigma da Constituição era a Constituição Mista, ou seja, uma mistura de todos os elementos positivos/com o melhor de cada regime. Isto porque para Aristóte1es, as formas puras de Monarquia, Democracia (República) e Aristocracia ir-se-iam auto-viciar, defendendo, assim urna politeia. Contudo, a grande falha de Aristóteles foi nunca ter explicado como combinar os poderes (não nos deu um modelo de Constituição Mista). Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 28 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes Para encontrarmos o modelo de Constituição Mista temos de avançar no tempo. • Barão Montesquieu – (Presidente do Parlamento de Bordéus) - século XVII – XVIII, viveu em pleno período absolutista de Luís XIV e Luís XV. Defendia que as formas de Governo podem ser divididas em 3 regimes: * Monarquia - o seu valor seria a honra , * República Aristocracia - o seu valor seria a moderação, o equilíbrio (oligarquia) Democracia – o seu valor seria a virtude – (Demagogia) * Despotismo - seria a perversão da Monarquia e o seu princípio seria o medo. Montesquieu fez uma crítica ao despotismo dos Turcos (do Sultão), para demonstrar o seu lado perverso, pois não o podia fazer directamente em relação ao despotismo do regime francês. Nesta perspectiva, o despotismo é equivalente à tirania de Aristóteles. Note-se que Montesquieu curiosamente associou a Aristocracia à República, ao contrário de Aristóteles, dado que ele próprio era um barão e, portanto, membro da Aristocracia. Também para Montesquieu não há um regime puro, ou seja, todos são mistos, o ideal é a Constituição Mista, onde o Poder reside nos 3 sistemas. Com efeito, Montesquieurefere a: necessidade de equilibrar os poderes sociais, em ordem a extinguir as diferenças sociais. Nomeadamente, quando refere o exemplo da Monarquia, no qual é imperativo o respeito é o equilíbrio de poderes sociais, é que se aproxima mais do ideal de Constituição Mista. Esta ideia de Const. Mista é também recuperada com o Princípio da Separação de poderes, inscritos na Const. Inglesa, pelo que a lei depende da vontade reunida das forças sociais que constituem: o Estado. Contudo, a partir de uma certa altura, nomeadamente com a Revolução Inglesa, a tricotomia de Montesquieu deixa de fazer sentido, pelo que se dá a afirmação da Democracia como forma de Governo paradigmática/ideal. Passa a existir uma dicotomia em vez de tricotomia, isto é, contrastam a Democracia e a Autocracia ou Não Democracia Surgem estes novos conceitos, destruindo as noções de Monarquia e República anteriormente "propostas" por Aristóteles. No entanto, há ainda nos dias de hoje formas de Monarquia, que hoje assumem um significado bem diferente do anterior, embora ligadas Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 29 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes ou integradas num conceito democrático, como acontece na Grã-Bretanha, Suécia, Dinamarca, Espanha, etc. Actualmente, poderá fazer-se distinção entre Monarquia e República através da observação da forma de designação dos Chefes de Estado. Nas democracias, apesar de todos os seus princípios, o que acaba por se verificar é que o poder está entregue a uma classe política. É sempre a mesma classe que se alimenta a si mesma. Verifica-se que a classe política se tem mantido por vários anos, ou seja, pouco se renova em todos os países democráticos, sendo assim um tipo de Oligarquias. Esta é a chamada Lei de Bronze das Oligarquias, isto é, consiste na verificação por exames empíricos que a classe política se renova pouco; mesmo nos regimes democráticos, o poder está entregue a uma classe política de elites. O nome "Bronze" justifica-se exactamente porque se trata de uma liga metálica particularmente indéstrutíve1 - lei forte. Com efeito, assiste-se a uma oligarquia na classe política, dado que está reservada só a alguns, nem todos a podem integrar (há certos cargos extremamente exigentes que não é qualquer pessoa que os pode exercer - qualificação profissional). Em todas as Democracias, faz-se sentir o efeito de perversão da Lei de Bronze. Então o que distingue as democracias das não-democracias?! São os seus mecanismos de funcionamento. Enquanto que nas democracias existem referendos, votações, etc., com a recondução à vontade popular, nas não-democracias a classe política não vai a votos, pelo que os actos eleitorais são disfarçados (não há "vontade popular"). Para além disso, nas Oligarquias, o poder emana de cima para baixo, ao contrário das Democracias. Contudo, é importante realçar que há mecanismos para suavizar o efeito de perversão da Lei de Bronze das Oligarquias: • Pluralismo, porque quanto maior, mais partidos haverá e, consequentemente, maior liberdade de expressão e mais se combate este fenómeno. Isto acontece porque poderá assim haver mais facilidade de renovação - rotatividade política. • Descentralização da estrutura do Estado, porque, se há descentralização, o poder aproximar-se-á dos cidadãos. • Transparência dos partidos (vida democrática), na medida em que os partidos são actualmente muito fechados ao exterior. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 30 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes • Subida do nível geral de cultura ou Educação/Instrução dos cidadãos. Em suma, pode-se concluir que, nos dias de hoje, importa distinguir entre os regimes autocráticos e os regimes democráticos na medida em que, na maioria dos Estados ditos democráticos, o poder está concentrado numa elite ou grupo - a classe política. Estados autocráticos serão então aqueles em que não existe um autêntico mecanismo de representação do povo, por parte da classe política; regimes democráticos serão aqueles cuja classe política se destine verdadeiramente à representação popular e, consequentemente à satisfação da vontade do povo Regra da Maioria Até John Locke, nenhum autor fala da Regra da Maioria. Marsílio de Pádua já se tinha referido a esta regra, mas num contexto diferente ligado aos Conventos (onde era preciso encontrar um critério de eleição do abade). John Locke (Liberalismo = Liberdade - século XVII Defendia que o povo não pode ter uma vontade própria; tem sim uma vontade individual de cada pessoa. Era impossível existir um sistema de unanimidade, dada a heterogeneidade que caracteriza uma sociedade. Por isso, o critério mais adequado era o da maioria. Rousseau, (Democracia = Igualdade, no "Contrato Social", veio afirmar que a vontade do Povo era a vontade geral, a vontade da maioria; porque a maioria dos Homens é racional então a maioria é a vontade mais racional. Contudo, este argumento é fraco, porque isto abre portas para ditaduras da maioria. A justificação tem de ser outra: é a maioria que melhor realiza os valores democráticos, ou seja, a igualdade (todos os votos contam o mesmo) e a liberdade (podemos optar/escolher por vontade própria). Nenhuma das justificações encontrada é totalmente certa. Contudo, temos de encarar que este critério é o "menos mau" de todos os critérios de justificação. A Regra da Maioria não vale apenas para o universo eleitoral mas também para os órgãos do Estado (ex: Assembleia, Tribunais). • Maioria relativa: é a simples pluralidade dos votos, ou seja, a diferença nem que seja de um voto. Tanto vale para os actos eleitorais como para os órgãos do Estado. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 31 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes • Maioria absoluta: quando se tem 50% dos votos expressos mais um. Vale para os actos eleitorais e para os órgãos do Estado. • Maioria qualificada: a exigência da maioria está previamente determinada na lei. A lei exige que se tenha uma maioria superior à absoluta (ex.: 3/4 2/3: maioria dos deputados em efectividade de funções - 116 deputados). Também se considera maioria qualificada sempre que a lei exige a maioria absoluta dos votos, contados não a partir do número de votos mas sim do número total de membros do colégio de votantes. • Maioria duplamente qualificada: a Constituição exige a maioria de 2/3 desde que superior à maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções. Quanto mais importante é a matéria, mais exigente é a maioria. A Regra da Maioria é o processo pelo qual se decide/resolve alguma coisa. Contudo, também tem os seus limites: • Não é uma maioria abstracta, mas concreta Tem sempre um quadro organizatório de referência, pelo que só tem os poderes/competências desse quadro. • As propostas são sempre feitas em nome de interesses colectivos. As maiorias quando governam e exercem o Poder, devem fazê-lo em representação do Todo. • A Regra da Maioria não pode ser usada contra a democracia. Ela só faz sentido para ser usada no sistema-democrático. A Regra da Maioria não é um critério de verdade, mas de decisão/escolha. Contudo, a Regra da Maioria não pode ter como consequência o desrespeito, o silenciamento das minorias. Estamos num sistema democrático enquanto for possível às minorias tomarem- se maiorias. Estado Totalitário • O totalitarismo consiste na intervenção do Estado em todos os domínios da vida social, ou seja, de uma conformação da vida social de toda a Sociedade pelo Estado. • O Estado controla todo o sistema social. O Estado é total na medida em que engloba todaa sociedade (define o que está dentro e fora da comunidade). • Define, também, quem faz parte e quem não faz, pelo que define desde logo os inimigos (que eram marginalizados, eliminados e internados para cura). Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 32 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes • O poder político concentra-se no monarca, que controla e planifica a economia a religião, controla a cultura, a educação e a comunidade social - doutrina sistemática. Os Estados totalitários modernos caracterizam-se pela: • Concentração do poder político; •Planificação da economia;•Emanação de directivas ideológicas Não se pretende apenas controlar a economia, mas também os tempos livres, o ensino, os costumes. Não se pretende apenas a obediências à lei, mas a obediência à ideologia inerente ao Estado. Nestes Estados, os direitos fundamentais ou não existem, ou então destinam-se à prossecução dos princípios ideológicos do Estado. O que interessa é o bem comunitário mesmo que isso implique o atropelo das liberdades individuais (estão em 2° plano). O Estado define, ainda, o modelo de cidadão - há uma doutrina ortodoxa. Um outro factor importante é o desaparecimento do dualismo Estado/Sociedade. O Estado detém, de facto, o controlo da vida social, económica e política da Comunidade, através de diversos factores ao seu dispor: - Criação de polícia política secreta; - Censura dos meios de comunicação; - Vigilância de informação - Afastamento de agentes políticos com ideais revolucionários ou contrários; - Terror e medo O Estado sobrepõe-se à sociedade! Vejamos algumas experiências totalitárias do século XX: ► Estado Comunista Soviético (Totalitário) O Comunismo foi implantado na Rússia em 1917, após a Revolução Bolchevique (Revolução de Outubro) e assenta na doutrina Marxista-leninista, que defendia a luta por uma sociedade sem classes de modo a criar uma sociedade igualitária. Em1917. Lenine assume a liderança do Partido bolchevique abolindo todos os outros partidos políticos e estabelecendo a censura. Instala uma organização que se destinava a controlar os contra- Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 33 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes revolucionários - a "vetcheka". Com Estaline, mais tarde, surge a ideia de crime político, a ideia de responsabilidade colectiva. Só com este homem é que o Partido Comunista assumiria plenos poderes. É caricato verificar que a Rússia era a que tinha menos condições e razões para ser o 1º país onde se deu 1 revolução deste tipo. A verdade é que na Rússia ainda não tinha havido a revolução industrial; era ainda 1 país de servos da gleba (da terra) extremamente atrasado. Daí que seja estranha a Revolução, ligada ao proletariado. O que a explica são as desigualdades que se faziam sentir. Parte da ideia de que a classe burguesa explora a classe operária (proletariado). Daí que fosse necessário criar uma sociedade sem classes; mas para se atingir esta sociedade era necessário instaurar uma Ditadura do Proletariado, onde o poder é entregue aos operários. Características do Estado Soviético: • Inexistência de uma separação de poderes, pelo que, todos os poderes estavam concentrados nos "Sovietes". Não existe um conceito formal de lei, na medida em que não há nenhum órgão competente para a elaboração das leis • O Poder Judicial não é "independente, sendo os juízes eleitos pelos "Sovietes" por período de 5 anos e podendo ser destituídos a qualquer momento. Estavam, pois, sujeitos às directivas do Partido • Existia um regime de Sovietes combinado com um regime de partido único. Havia o "Soviete Supremo" com duas Câmaras e o partido Único era o Partido Comunista, que ditava as eleições para os cargos dos Sovietes, escolhendo os candidatos. Por outro lado, reuniam-se na mesma pessoa os cargos chaves do partido e do estado. Para além disso, o Partido Comunista tinha a possibilidade de emanar ordens concretas aos órgãos de Estado. Assim, o facto de o Partido Comunista escolher os candidatos para os Sovietes, de deter os cargos-chave do estado e de ter a possibilidade de vincular os órgãos de Estado são três formas de influência do Partido sobre os órgãos de estado. • Rege-se por um princípio de Assembleia, isto é, o poder Supremo Soviete deve estar submetido a uma Assembleia de representantes (poder legislativo e judicial), para além de estar submetido a um regime monopartidário. Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 34 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes • Ideia de centra1ismo democrático onde todos os órgãos são eleitos, mas todas as decisões finais são da cúpula do Partido Comunista; os órgãos inferiores devem obediência aos órgãos superiores do partido • Planificação imperativa da economia - os acordos económicos estavam conforme aquilo que era fixado • Propriedade privada só existe nos bens de consumo. Os bens de produção são propriedade colectiva. • O Direito é visto como um instrumento do estado, como algo que ajuda na realização dos seus objectivos. O Direito tinha 3 funções: * Função repressiva - visa reprimir todos os comportamentos contrários os interesses do Estado. * Função preventiva - visa dissuadir as pessoas da adopção de comportamentos contrários aos interesses do estado. * Função educativa e organizatória da vida social - o Estado dirige toda a vida colectiva. • Os Direitos Fundamentais são exercidos no sentido da construção de uma sociedade sem classes; são também funcionalizados, isto é, são direitos-deveres (os. Direitos estão sempre acompanhados de um dever), pelo que o seu exercício terá de estar de acordo com os princípios do Estado. ► Estado Fascista Italiano (Totalitário) É 1 Estado que surge com 1 grande base filosófica, com 1 doutrina bem elaborada. Após a 1ª Guerra Mundial, a Itália cai numa grave crise económica, originando quase um clima de guerra civil e um sentimento de injustiça perante o Tratado de Versalhes. Deste modo, surge em 1919 o movimento fascista político liderado por Mussolini, que apoia uma burguesia amedrontada com precárias condições sociais. Este movimento era inicialmente apoiado por grupos de jovens militares hierarquizados como os célebres "camisas negras", que procedem a um controlo das revoltas dos trabalhadores. Em 1921 este movimento torna-se um verdadeiro partido político, com representação parlamentar, ainda que minoritário - é o Partido Nacional Fascista Universidade Católica Disciplina: Ciência Política 35 Professor: Paulo Rangel Apontamentos: Sousa Gomes Em 1922, dá-se a "Marcha sobre Roma", com os "camisas negras", onde depois o Rei convida Mussolini a subir ao poder. Em 1923, Mussolini sobe então ao poder e começa rapidamente a controlar os meios de comunicação social. Em 1926, surgem as leis de excepção, dando origem a um novo Estado Totalitário Europeu. o Estado Fascista Italiano tinha como características: • A exaltação do Estado – todos devem obediência ao Estado, sendo a Nação vista como um conjunto de valores, que é representada pelo Estado. O Estado representa a encarnação jurídica da nação. Contudo, verifica-se uma harmonização dos interesses colectivos com os interesses particu1ares. Forma-se uma ideia de eticismo e de: pedagogismo educacional, pelo que as instituições estaduais são formas eficazes de tutela dos valores morais. • É autoritário (é necessário exaltar a ordem, pela dignificação do Estado), pedagógico (preocupação em educar os cidadãos para a ordem) e altamente ético. • Os direitos fundamentais assumem um carácter
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