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VILLALTA, Luiz Carlos. Liberdades imaginárias

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Liberdades Imaginárias*
Luiz Carlos Villalta**
O final do século XVIII na América Portuguesa marcou-se pela ocorrência das 
denominadas Inconfidências: em Minas Gerais (1789), no Rio de Janeiro (1794) e na 
Bahia (1798). 
A denominação comum Inconfidência segreda diferenças substantivas: em 
Minas, tratou-se de uma conspiração abortada, protagonizada por pessoas cujas origens 
se circunscreviam às elites; na outrora capital do Vice-Reino do Brasil, os supostos 
conspiradores, pertencentes a um espectro social mais amplo, embora restrito à limitada 
camada dos homens livres, não foram além de discussões e tertúlias, não cogitando 
nenhuma ação contra a monarquia portuguesa ou contra o domínio colonial; enquanto 
em solo soteropolitano assistiu-se à gestação de um projeto de revolução que articulava, 
de modo fluido e, ainda hoje, difícil de precisar, as elites locais e indivíduos egressos da 
escravidão ou que ainda se encontravam no estado de cativos. 
Essas “Inconfidências” de fins do século XVIII, protagonizadas por gentes de 
perfil socioeconômico tão distinto, não se inspiraram num modelo comum: a 
Inconfidência Mineira pode ser associada tanto às rebeliões ocorridas anteriormente na 
capitania de Minas Gerais quanto à independência dos Estados Unidos e à Restauração 
Portuguesa de 1640; já no Rio de Janeiro e na Bahia, a fonte de inquietação e inspiração 
foi a Revolução Francesa. 
Esses movimentos, ademais, não beberam das mesmas fontes intelectuais: 
enquanto em Minas Gerais as Luzes conjugaram-se com tradições histórico-culturais 
luso-brasileiras, com destaque para a Segunda Escolástica1 e para os escritos do padre 
* Conferência proferida no Museu Nacional de Belas Artes, no dia 10 de outubro de 2000, dentro do curso 
A Invenção da Liberdade, promovido pela Prefeitura do Rio de Janeiro, Artepensamento e Universidade 
Federal do Rio de Janeiro, de 25 de setembro a 31 de outubro de 2000. Capítulo publicado em: NOVAES, 
Adauto (Org.). O Avesso da Liberdade. São Paulo, 2002, v. , p. 319-341.
** Professor Adjunto do Departamento de História da UFMG.
1 Segunda Escolástica ou Neo-Escolástica designa o sistema teológico-filosófico constituído no início da 
Idade Moderna, em torno da revitalização da escolástica medieval, relendo as idéias de Aristóteles e os 
ensinamentos de são Tomás de Aquino, assentando-se fundamentalmente no método dedutivo e refutando 
o experimentalismo. Dentro desse sistema, destacavam-se as concepções corporativas de poder, segundo 
as quais esse último, embora fosse oriundo de Deus, não transitava diretamente para o Rei, passando, ao 
contrário, pela mediação da comunidade, cujo bem estar deveria ser objeto de cuidado do soberano e que, 
caso o governante se tornasse um tirano, teria legitimidade para insurgir-se, ainda que em relação a isso 
alguns teóricos fossem bastante cautelosos, descrevendo os modos apropriados de fazê-lo. Na Ibéria, tais 
concepções predominaram até meados do século XVII, impregnando a doutrinação política até o século 
XVIII, constituindo-se como as premissas do pensamento político luso-brasileiro e hispano-americano 
(SKINNER, Quentin. As fundações do pensamento político moderno. Trad. de Renato Janine Ribeiro e 
Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 417 e 450-454; MORSE, Richard M. O 
Antônio Vieira e, ainda, para livros de história da Restauração Portuguesa de 16402, no 
Rio de Janeiro, as Luzes ampliaram seu espaço, sem contudo eliminar totalmente a 
influência da Neo-Escolástica, e, na Bahia, as idéias ilustradas imperaram, ainda que se 
conjugando com elementos místicos e ocultistas de proveniência francesa3. A influência 
das Luzes, elemento comum às Inconfidências, é preciso salientar, foi bastante 
matizada. Em Minas sobressaiu a Histoire philosophique et politique des etablissements 
et du commerce des européens dans les Deux Indes, do abade Raynal4. Na capital do 
Vice-Reino do Brasil também houve, ao que parece, influência de escritos de 
pensadores ilustrados, mais precisamente de Mably e de Rousseau, porém nenhum 
desses foi tão onipresente quanto os jornais, alguns proibidos (Correio da Europa e 
Mercúrio), outros autorizados pela censura portuguesa (Gazeta de Lisboa e Correio de 
Londres), e que, ao noticiarem os fatos contemporâneos, emanavam e popularizavam 
máximas ilustradas ou narravam fatos revolucionários. Na Bahia, por fim, essa vertente 
espelho de Próspero: cultura e idéias nas Américas. Trad. de Paulo Neves. São Paulo: Companhia das 
Letras, 1995, p. 28-29, 64, 72 e 92-93; TORGAL, Luís Reis. Ideologia política e teoria do Estado na 
Restauração. Coimbra: Biblioteca Geral da Universidade, 1981, vol. 1, p. 110 e 245; XAVIER, Ângela 
Barreto. “El Rei aonde póde, & não aonde quér”: razões da política no Portugal Seiscentista. Lisboa: 
Colibri, 1998; MACEDO, Jorge Borges de. Formas e Premissas do Pensamento Luso-Brasileiro, Revista 
da Biblioteca Nacional, Lisboa, 1(1): 76-77, jan./jun. 1981; MIRANDA, Tiago Costa Pinto dos Reis. 
“Ervas de Ruim Qualidade”: a expulsão da Companhia de Jesus e a aliança anglo-portuguesa: 1750-
1763. São Paulo: FFLCH-USP, 1991, p. 256-257 (Dissertação de Mestrado); e HOLANDA, Sérgio 
Buarque de. Capítulos de literatura colonial. Org. e notas de Antônio Cândido. São Paulo: Brasiliense, 
1991, p. 447-448). 
2 Com relação à Inconfidência Mineira, a influência mais perceptível de Antônio Vieira foi o sermão feito 
na Bahia, aos 2 de julho de 1640, em homenagem ao marquês de Montalvão, d. Jorge de Mascarenhas, 
primeiro vice-rei do Brasil. Sobre este Sermão (que pode ser encontrado em VIEIRA, Padre Antônio. Por 
Brasil e Portugal. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1938, p. 156-158),veja: CIDADE, Hernani. 
Antônio Vieira. Lisboa: Editorial Presença, 1985, p. 22. Dos livros de história de Portugal, são influências 
presumidas: sobretudo História de Portugal restaurado, de D. Luís de Menezes, Conde da Ericeira; e, 
ainda, Histoire des révolutions de Portugal, do Abbé Vertot; Histoire générale de Portugal, de Nicolas de 
La Clède; e História genealógica da Casa Real Portuguesa, de D. Antônio Caetano de Souza.
3 Os textos místicos encontrados pela devassa na Bahia são: Aviso de Petesburgo – Fevereiro de 1796 e 
Les ruines ou méditation sur les révolutions des empires, de Volnay, este último extraído do capítulo 
XXII, intitulado “Origem da idéia de Deus” (MATTOSO, Katia de Queirós. Presença francesa no 
movimento democrático baiano de 1798. Salvador: Itapuã/ Secretaria de Educação e Cultura do Estado da 
Bahia, 1969, p. 122-124 e 139).
4 Obra publicada inicialmente em 1770, analisa a colonização européia nas duas Índias e narra a 
Independência das Treze Colônias Inglesas da América do Norte; contém uma parte, o tomo 5, 
inteiramente dedicada à América Portuguesa. Segundo Raynal, a dualidade entre riqueza e pobreza; 
opressão fiscal e comercial, válida para o Novo Mundo em geral, também se encontrava na América 
Portuguesa. Raynal criticava as alterações tributárias feitas pela Coroa portuguesa e o descuido desta com 
as atividades econômicas não-mineratórias após a descoberta das minas (RAYNAL, G. T. [Guillaume-
Thomas François]. Histoire philosophique et politique des etablissements et du commerce des européens 
dans les Deux Indes. nouvelle edition, corrigée et augmentée d’après les manuscrits autographés de 
l’auteur... par M. Peuchet. Paris, Amable Costes et C.ie., 1820, vol. 5, p. 74-75). Esse tomo, bem como a 
narrativa sobre a Independência dos Estados Unidos foram editados em português recentemente: 
RAYNAL, Guillaume-Thomas François. A Revolução da América. Trad. de Regina Clara Simões Lopes. 
Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1993 e Idem,O estabelecimento dos portugueses no Brasil. Trad. 
Mônica F. Campos de Almeida e Flávia Roncari Gomes. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional: Brasília: 
Editora UnB, 1998.
2
vulgarizada do pensamento ilustrado, isto é, das Luzes aplicadas e repensadas no calor 
da ação, em meio ao clima revolucionário francês, teve uma repercussão sem par, por 
meio de O Orador dos Estados Gerais de 1789, texto de grande êxito internacional, 
encontrado praticamente entre todos os participantes do movimento baiano, que contém 
idéias frontalmente contrárias ao absolutismo de Luís XVI e aos abusos e privilégios de 
sua Corte; e Fala de Boissy d’Anglas – 30 de janeiro de 1795, texto elaborado pelo 
conde de mesmo nome, que tinha por objetivo desarticular a coligação formada contra a 
França, apresentando, para tanto, a Rússia e a Inglaterra como as duas grandes inimigas 
dos países europeus, secundadas pela Áustria, e conclamando esses últimos a se unirem 
com a França, cujo governo, por ser “plenipotenciário e nomeado pela totalidade do 
povo francês” para fazer a paz, poderia, por isso mesmo, assegurá-la de forma “muito 
mais sólida”5. 
Nas discussões e/ou nos projetos de que as Inconfidências se constituíram, 
consequentemente, a palavra e a idéia de liberdade apresentaram amplitudes e 
significados radicalmente diversos. Este artigo propõe-se a falar dessas liberdades 
diversas, na verdade imaginárias, posto que não se traduziram nem em Minas, nem no 
Rio, nem na Bahia, em práticas vitoriosas.
‘Libertas quae sera tamen’:
a liberdade imbricada entre a ânsia de riqueza e de comando do poder político
Nos idos de 1788-1789, figuras proeminentes da sociedade de Minas Gerais 
fizeram sucessivas reuniões, nas quais debateram a situação da Capitania, a 
possibilidade, as estratégias e os alvos de uma sedição, traçando as linhas muito gerais 
de uma nova ordem política e econômica. Desses homens, 24 foram condenados por 
Dona Maria I em 1792, prevalecendo numericamente, dentre esses últimos, os que se 
dedicavam a um ofício que pressupunha uma formação específica: 17 eram ou clérigos, 
ou advogados, ou dentistas, ou oficiais de tropa paga. Mais da metade (14) dos 
condenados eram senhores de escravos; metade deles (12) dedicava-se à agropecuária, 8 
5 “Discurso de Boissy D’Anglas”. In: MATTOSO, Katia de Queirós. Presença francesa no movimento 
democrático baiano de 1798. Salvador: Itapuã/ Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Bahia, 
1969, p. 122,-124 e 129. Sobre os textos que influenciaram os Inconfidentes da Bahia, veja: MATTOSO, 
Katia de Queirós, op. cit.; Idem, Bahia 1798: os panfletos revolucionários: proposta de uma nova leitura. 
In: COGGIOLA, Osvaldo. A Revolução Francesa e seu impacto na América Latina. São Paulo: Edusp/ 
Novastela: Brasília: CNPq, 1990, p. 341-356; NEVES, Guilherme Pereira das. Bahia, 1798: uma leitura 
colonial da Revolução Francesa: a propósito da tradução portuguesa de um texto de Jean-Louis Carra. 
Acervo: Revista do Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, 4 (1): 121-125, jan. jun. 1989.
3
dos quais conjugavam-na à mineração; 4 desenvolviam só a agricultura; 1, apenas a 
mineração6. 
Por que homens como o mineralogista José Álvares Maciel e os poetas Cláudio 
Manuel da Costa, Inácio José de Alvarenga Peixoto e Tomás Antônio Gonzaga, esses 
dois últimos também magistrados, todos eles formados pela Universidade de Coimbra, 
engajaram-se numa conspiração? Por que o fizeram clérigos como o cônego Luís Vieira 
da Silva, o padre Carlos Correia de Toledo, o padre José da Silva e Oliveira Rolim e o 
padre Manuel Rodrigues da Costa? O que movera na mesma direção o tenente-coronel 
Francisco de Paula Freire de Andrade, o segundo homem na hierarquia militar da 
Capitania; o alferes Joaquim José da Silva Xavier; grandes proprietários de terras 
minerais e agrícolas como José Aires Gomes, Francisco Antônio de Oliveira Lopes, e 
José Resende Costa, o pai, e seu filho homônimo; e, ainda, contratantes de impostos 
como Domingos de Abreu Vieira, devedor da Fazenda Real? Por fim, por que também 
conspiraram os devedores e contratantes João Rodrigues de Macedo e Joaquim Silvério 
dos Reis, ambos escapando ilesos da devassa e da condenação ordenadas pela Coroa? 
Todos esses homens envolveram-se numa conjura, empunhando a bandeira da 
liberdade, mas o que exatamente entendiam por liberdade?
Um dos sentidos da liberdade imaginada pelos Inconfidentes insinua-se num 
brinde, ocorrido em São José del Rei, hoje Tiradentes, no dia 08 de outubro de 1788, 
quando várias pessoas se reuniram para o batizado de dois filhos de Inácio José de 
Alvarenga Peixoto e de Bárbara Heliodora. Nessa ocasião, houve manifestações de 
descontentamento contra o governo, tendo um dos presentes brindado à saúde de 
“Silvério dos Reis, dizendo-lhe que ‘cedo se havia de ver livre da Fazenda Real’”7. 
Liberdade, pode-se depreender desse brinde, consiste em escapar do fisco régio; 
liberdade imbrica, ao mesmo tempo, a economia e a política, a ânsia pela riqueza e a 
contestação velada da ordem política instituída. A liberdade sonhada pelos 
Inconfidentes se inscreveu nessa imbricação, transitando do econômico para o político, 
envolvendo a oposição às diretrizes governamentais que vinham de Lisboa e que tinham 
nas autoridades coloniais seus executores. 
É certo, assim, que o envolvimento daqueles homens numa conspiração tinha, 
primeiramente, motivações socioeconômicas. No último quartel do século XVIII, a 
6 FURTADO, João Pinto. Inconfidência Mineira: crítica histórica e diálogo com a historiografia. São 
Paulo: FFLCH-USP, 2000 [Tese de Doutoramento], p. 131.
7 GONÇALVES, Adelto. Gonzaga, um poeta do Iluminismo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p. 
224-226.
4
economia de Minas Gerais experimentava um processo de diversificação, que produzia 
demonstrações de relativa auto-suficiência, e paralelamente enfrentava o declínio da 
produção aurífera e a mudança de eixo da região central para o sul, mais precisamente 
para a comarca do Rio das Mortes.
Existiam, além disso, motivos de ordem política para aqueles homens 
conspirarem: de um lado, sobretudo questões de política econômica ou, ao menos, de 
impacto econômico e, de outro, de representação política. As restrições impostas pela 
política imperial da rainha Dona Maria I, dentre elas a proibição às manufaturas e 
principalmente as medidas implementadas e/ou anunciadas por Luís da Cunha Menezes, 
e Luís Antônio Furtado de Castro do Rio de Mendonça, Visconde de Barbacena, 
governadores de Minas, respectivamente, entre 1783 e 1788 e 1788 e 1797. Em sua 
maioria apresentando um cunho fiscal e impactos econômicos, tais medidas, de algum 
modo, reforçavam o sistema colonial, provocavam danos e suscitavam temores, 
agudizando as tensões políticas entre aquelas figuras proeminentes de Minas e o 
governo local e, em última instância, a própria Coroa portuguesa. 
Cunha Menezes afastou muitos dos membros da elite local de posições e 
possibilidades lucrativas, lícitas e ilícitas. Assumiu o controle da rede de contrabando, 
da qual antes o padre José da Silva e Oliveira Rolim, Cláudio Manuel da Costa e Tomás 
Antônio Gonzaga conseguiam ganhos. Promoveu muitos de seus protegidos na carreira 
militar e, inversamente, suspendeu os pagamentos de soldos aos soldados e oficiais 
irregularmente listados por Freire de Andrada. Preteriu o alferes Tiradentes em várias 
promoções e tirou-o do comando do destacamento da Mantiqueira, afastando-o da 
possibilidade de lucrar com o contrabando. Iniciou uma ação paraque o sogro de Freire 
de Andrada pagasse seus débitos com a Fazenda Real. Deu ordem de banimento da 
Capitania ao padre Rolim e, ainda, contrariou os interesses do ouvidor Tomás Antônio 
Gonzaga em diversos momentos8.
8 Em 1784, como Presidente da Junta da Fazenda, impôs José Pereira Marques como contratante do 
arrendamento das entradas, enquanto Gonzaga se opôs, defendendo outro candidato; deu a Pereira 
Marques e a Joaquim Silvério dos Reis poderes especiais para cobrar dívidas e executar hipotecas, com o 
que Gonzaga perdeu ganhos correspondentes a custos e remunerações legais; desrespeitou a autoridade 
do ouvidor ao dar uma contra-ordem em relação à prisão de Basílio de Brito Malheiros, acusado de 
assassinato; e feriu suas suscetibilidades estamentais, fazendo concessões a indivíduos de cor ou que 
exerciam ofícios mecânicos – MAXWELL, Kenneth. A devassa da Devassa: a Inconfidência Mineira, 
Brasil – Portugal, 1750-1808. 3 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985, p. 120-121; SOUZA, Laura de 
Mello e. Os ricos, os pobres e a revolta nas Minas Gerais do século XVIII (1707-1789). Análise & 
Conjuntura, Belo Horizonte, 4 (2-3): 35, mai./dez. 1989; e GONZAGA, Tomás Antônio. Cartas Chilenas. 
In: PROENÇA FILHO, Domício (Org.). A poesia dos Inconfidentes: poesia completa de Cláudio Manuel 
da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e Alvarenga Peixoto. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996, p. 809, 833, 
836 e 889. A animosidade de Gonzaga com Menezes tinha também motivações particulares: o 
governador tomara a amante do ouvidor, Maria Joaquina Anselma de Figueiredo (GONÇALVES, Adelto, 
5
As instruções trazidas pelo Visconde de Barbacena, passadas por Martinho de 
Mello e Castro, ministro de Dona Maria I, em 1788, continham medidas para aumentar 
a receita e ampliar a dependência da economia mineira em relação a Portugal. Tais 
medidas afetavam especialmente os rendimentos dos clérigos, a autonomia dos 
magistrados, a riqueza dos arrematadores de impostos e, ainda, as condições 
econômicas do povo em geral. Neste último caso porque se cogitava a decretação da 
derrama: obrigação, extensiva à toda a população, de complementar as 100 arrobas 
anuais de ouro através do pagamento per capita, soma essa devida ao fisco e que não 
estava sendo paga. Todo esse rol, obviamente, desagradava aos arrematadores de 
impostos, aos magistrados, aos clérigos, aos envolvidos com o contrabando e, ainda, às 
Câmaras e às gentes no geral. 
A isso se somava o fato da região Rio das Mortes encontrar-se sub-representada 
politicamente, na medida em que localidades como Campanha do Rio Verde, Borda do 
Campo e Igreja Nova não possuíam o status de vila, não tendo, assim, câmaras9. 
Significativamente, dos 24 réus condenados pelo crime de Inconfidência, 14 eram da 
comarca mais rica, a do Rio das Mortes, os quais, ademais, eram os mais ricos e os 
maiores proprietários de escravos. 
Esses fatos todos fizeram com que a idéia de liberdade, bem como sua 
amplitude, transitasse do âmbito econômico para o campo da gestão do poder. A 
imbricação do político ao econômico encontra-se sintetizada numa afirmação feita pelo 
alferes Joaquim José da Silva Xavier. Segundo Tiradentes, “os mazombos [isto é, os 
naturais da Colônia] também tinham valimento e sabiam governar; e que dando a sua 
terra tantos haveres, se achavam pobres por lhe tirarem tudo para fora, mas que a 
haviam de pôr em liberdade, que só esperavam se botasse a derrama, pois que a terra 
não podia pagar e que tudo ia para o Reino”10. Nessa afirmação vê-se, primeiramente, 
uma percepção econômica, aquela segundo a qual a terra comportava “tantos haveres’, 
sendo, portanto, compreendida como potencialmente rica. A isso, mistura-se uma crítica 
velada, senão ao sistema colonial, ao menos à política tributária da metrópole em 
relação à Colônia: os mazombos seriam pobres “por lhe tirarem tudo para fora”, ou seja, 
devido ao fato da riqueza ser drenada para o Reino, sendo a derrama algo impossível de 
pagar. Essas idéias complementavam-se com a crença na capacidade de governar dos 
op. cit., p. 153 e 217).
9 FURTADO, João Pinto, op. cit., p. 214.
10 AUTOS de Devassa da Inconfidência Mineira [ADIM]. 2 ed. Brasília: Câmara dos Deputados: Belo 
Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1980, vol. 1, p. 124. 
6
mazombos e, por fim, com o anúncio de um movimento político pelo qual a terra seria 
posta em liberdade, sendo essa conquista associada à decretação da derrama, medida 
que demarcava um arrocho tributário, o que, conforme o alferes e outros conjurados 
disseram várias vezes, acirraria os ânimos das gentes, colocando-as ao lado de uma 
sedição. A liberdade surgia, portanto, de uma análise e uma compreensão que 
transitavam do econômico para o político: confunde-se com uma ruptura política, que 
seria desencadeada tendo como estopim um arrocho tributário; ruptura esta, ainda, cujo 
conteúdo não é declarado, mas que claramente anuncia o fim da pobreza, a realização de 
um potencial de riqueza.
Sob as inspirações assinaladas no início deste artigo e premidos pelo anseio de 
garantir e ampliar as possibilidades de enriquecimento para si mesmos e para sua 
“pátria”, nutrindo ambições em relação à gestão do poder, os conjurados de Minas 
Gerais defendiam liberdades de caráter econômico e liberdades políticas. Do ponto de 
vista econômico, primeiramente, advogavam a liberdade de comércio, a qual, segundo 
Tiradentes, alçaria o ouro ao seu legítimo valor, fazendo com que se tornasse 
desnecessário contrabandeá-lo. O livre-comércio, esperava-se, ademais, granjearia o 
apoio das potências estrangeiras, possivelmente interessadas em ter liberdade de 
negociar nos portos da América, tendo portanto uma conotação também política11. 
Liberdade, além disso, significava para os Inconfidentes pôr abaixo os limites até então 
estabelecidos à extração dos diamantes, tornando-a a livre; implicava, ainda, a 
destinação dos dízimos aos vigários e a alforria para alguns cativos, proposta esta 
motivada por fatores táticos – era possível que os escravos, “para conseguirem a 
liberdade”, tomassem o “partido contrário” da sedição – e que não contava com o 
consenso12. 
Os Inconfidentes propunham mudanças políticas cujo conteúdo fica difícil 
precisar com rigor, mesmo porque eles mesmos contemplavam alternativas diversas, 
11 VILLALTA, Luiz Carlos. 1789-1808 – O Império Luso-Brasileiro e os Brasis. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2000, p. 47-48.
12 Alvarenga Peixoto e o padre Correia de Toledo defenderam a alforria dos mulatos e dos crioulos (isto é, 
negros nascidos na Colônia), inscrevendo-a numa estratégia de confronto com a metrópole; outros 
Inconfidentes, contudo, posicionaram-se contra a medida. Álvares Maciel afirmou que os “‘serviços das 
Minas ficariam muito mal’” com a abolição da escravidão; paradoxalmente, Maciel familiarizara-se na 
Inglaterra com a produção fabril e o trabalho assalariado (ADIM, vol. 5, p. 330 e FURTADO, João Pinto, 
op. cit., p. 98-101). As liberdades econômicas propugnadas pelos Inconfidentes, bem como a associação 
entre a sua falta e a situação de pobreza e às críticas veladas ou explícitas à tributação ecoam idéias 
presentes na obra já citada do abade Raynal. É certo, porém, que as críticas à tributação encontram 
reforço em obras de história referentes à Restauração Portuguesa, nas quais se atribui a aspectos fiscais 
um papel importante na caracterização do domínio espanhol como tirânico e, por conseguinte, na 
legitimação do levante dos portugueses contra o mesmo.7
liberdades distintas. É certo que implicavam o fim da tirania representada pelas 
medidas tomadas pelo governo da Capitania. A oposição à tirania, de forma mais 
genérica, sem ter claramente um sentido anti-colonial ou, muito menos, envolver uma 
oposição à Coroa portuguesa, encontra-se claramente nas Cartas Chilenas, de Tomás 
Antônio Gonzaga13. Outros exemplos são os pronunciamentos feitos pelo Tiradentes a 
favor da liberdade. O alferes criticava o Vice-Rei do Brasil, dizendo que “não podia 
habitar” na “cidade do Rio de Janeiro, porque eram tantas as violências que o 
Excelentíssimo Senhor Vice-Rei praticava que todo o povo estava aflito e desesperado, 
de tal sorte que, se houvesse um que gritasse “Viva a liberdade’, todo o resto o seguia” 
14 Tiradentes, porém, queixava-se “amargamente dos Governadores destas Minas: que 
se achavam assoladas e que já se faziam intoleráveis os seus despotismos”, 
classificando Luís da Cunha Menezes como um “demônio” e dizendo desejar que assim 
também fosse o Visconde de Barbacena, pois isso legitimaria a eclosão de um levante, 
com a subseqüente instalação de uma república15. A recusa à tirania, portanto, assumiu 
também contornos mais definidos: a instalação de uma República em Minas Gerais,. 
Nessa República, haveria um parlamento central e vários parlamentos locais, que não 
parecem ser senão as câmaras já existentes das vilas, projeto este que aparece nas falas 
de Tiradentes e também de outros conjurados16. Não se dizer que essa via republicana 
tenha sido a tendência dominante entre os Inconfidentes, mas o fato de ser aventada 
indica que havia, em algum grau, propósitos decididamente anti-coloniais e anti-
monárquicos. 
Contraditoriamente, no entanto, a variante monárquica também foi cogitada. 
Enquanto Tiradentes, Alvarenga Peixoto e Joaquim Silvério dos Reis, o traidor dos 
Conjurados de Minas, aludiam vagamente à transformação da Capitania num “Império 
florente”17, o cônego Luís Vieira da Silva sonhava com a constituição de um Império 
13 Nas Cartas Chilenas de Tomás Antônio Gonzaga, obra em que se costumou enxergar há até bem pouco 
tempo influências ilustradas pela denúncia que faz da tirania e, inversamente, pelo que apresenta como o 
modelo do bom governo, é nítida a adesão às idéias da Segunda Escolástica. Lá estão a compreensão de 
que o soberano não pode tudo, de que deve respeitar as leis, as diferenças de direito e as hierarquias no 
interior da sociedade, a capacidade dos povos de pagar os tributos; necessita procurar a felicidade do 
reino, repartir com justiça prêmios e castigos (VILLALTA, Luiz Carlos. 1789-1808 – O Império Luso-
Brasileiro e os Brasis, op. cit., p. 52-53). 
14 AUTOS de Devassa da Inconfidência Mineira [ADIM]. 2 ed. Brasília: Câmara dos Deputados: Belo 
Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1980, vol. 1, p. 220.
15 ADIM, vol. 1, p. 200. Tiradentes dissera que, antes Barbacena, “fosse um demônio; porque se 
disporiam as coisas ao estabelecimento de uma República: e que agora com a nova derrama se 
desesperariam os povos para fazer algum levante” (ADIM, vol. 5, p. 48).
16 Ibidem, vol. 5, p. 33, 48 e 180-181 e vol. 1, p. 156 e 251. 
17 Ibidem, vol. 5, p. 125, 251 e vol. 1, p. 169, 199 e 203.
8
Luso-Brasileiro com sede na América, isto é, com a transferência da Corte portuguesa 
para a Colônia. Nesta última proposta vê-se explicitamente a defesa da via monárquica, 
da manutenção da submissão à dinastia de Bragança e da preservação dos laços, embora 
invertidos, com a pátria mãe-portuguesa18. Tal ideal foi esboçado também por Inácio 
José de Alvarenga Peixoto quando, já preso sob acusação de Inconfidência, rogava a 
Dona Maria I que viesse ser aclamada no Rio de Janeiro19. 
Essas opções distintas que emergem das falas dos diferentes conjurados – anti-
tirania no genérico e anti-tirania confundida com a implantação de uma República ou de 
um Império Luso-Brasileiro sediado na América – sinalizam uma indefinição política. 
Ecos dessa ambigüidade foram as discussões sobre a bandeira a ser adotada. Na casa de 
Cláudio Manuel ou de Gonzaga, assim, falou-se em “umas bandeiras, que o Alferes 
Joaquim José da Silva Xavier tinha ideado para servirem na nova premeditada 
República, que eram três triângulos enlaçados em comemoração da Santíssima 
Trindade”20. Então, “se lembrou o Doutor Cláudio Manuel da Costa das bandeiras da 
República Americana Inglesa, que era um gênio da América, quebrando as cadeias com 
a inscrição – Libertas aquo Spiritus – e que podia servir à mesma”21. Divergindo da 
sugestão, Alvarenga Peixoto “disse que seria pobreza” o uso dessa inscrição, tendo, 
então, Cláudio replicado que “podia servir a letra – Aut libertas, aut nihil”22. Alvarenga, 
no entanto, apresentou aquilo que pareceu agradar aos demais: “se lembrou do versinho 
de Virgílio – Libertas quae sera tamem – que ele achou, e todos os que estavam 
presentes, muito bonito”23. Se toda essa discussão traduzia uma patente simpatia dos 
Inconfidentes de Minas pelos norte-americanos, sua causa, suas conquistas e sua 
república, contudo, não significava que os mesmos fossem ao extremo de querer 
meramente copiá-los. A adesão à América, ao que parece, prendia-se aquilo que parecia 
ser mais essencial e elemento comum a todas as inscrições latinas descartadas: a 
liberdade. O conteúdo político dessa, enfim, não era clara e definitivamente 
republicano, confundindo-se com uma expectativa senão propriamente de romper os 
grilhões que atrelavam Minas a Portugal, pela via de uma República Independente, ao 
18 O cônego Luís Vieira da Silva afirmou que, “se no tempo da aclamação do Senhor Rei Dom João IV, 
viesse esse Príncipe para o Brasil, que a esta hora se acharia a América constituindo um formidável 
Império; e que ainda seria felicíssimo este continente se viesse para ele algum dos príncipes portugueses; 
mais, que a suceder assim, sempre corria risco de o quererem cá aclamar; e que o melhor de tudo seria 
mudar a Rainha a sua corte para a América” (ADIM, vol. 1, p. 158).
19 VILLALTA, Luiz Carlos. 1789-1808 – O Império Luso-Brasileiro e os Brasis, op. cit., p. 59.
20 ADIM, vol. 5, p. 122.
21 Ibidem, loc. cit.
22 Ibidem, loc. cit.
23 Ibidem, loc. cit.
9
menos de afrouxá-los, pelo rearranjo no poder local ou pela instituição de um Império 
Luso-Brasileiro com sede na América. Um denominador comum, enfim, subsiste a 
essas propostas: ou a conquista de autonomia política plena para a Capitania de Minas 
Gerais, ou, ao menos, o cerceamento do que se compreendia como desmandos do 
governo local. Algo, ademais, era-lhes subjacente: a compreensão de que a falta de 
liberdade política, a subordinação das Minas a Lisboa, tinha conseqüências econômicas 
prejudiciais. Para os Inconfidentes, por conseguinte, a liberdade política, correlata e 
necessariamente, remetia à possibilidade de enriquecer-se enquanto indivíduos e, ao 
mesmo tempo, enquanto pátria, respondendo assim aos interesses mais imediatos dos 
que a anunciavam e, ao mesmo tempo, àqueles que se imaginava, de um modo um tanto 
abstrato, enraizarem-se em uma demarcação territorial que não era senão o espaço da 
própria capitania de Minas Gerais.
Utopias no Rio de Janeiro em 1794: 
a liberdade como o “avesso” do Antigo Regime 
A denominada Inconfidência do Rio de Janeiro de 1794 resumiu-se a conversas, 
discussões, algumas ocorridas em espaços públicos, outras em locais privados. Não 
comportando nenhuma ação quer contra o governo local, quer contra a Coroa 
portuguesa, quer contra o domínio colonial, a Inconfidência do Riode Janeiro, contudo, 
encerrou utopias. Utopias que possuíam a peculiaridade de levantar a bandeira da 
liberdade como o avesso do Antigo Regime24.
Quem foram os acusados de Inconfidência? Como já se afirmou no início deste 
artigo, tratava-se de gentes cujas origens encontravam-se num espectro social mais 
amplo. Dos onze acusados, naturais da América e do Reino, predominantemente 
homens maduros e solteiros, dois pertenciam à camada de proprietários de bens de raiz, 
ambos brasileiros de nascimento: Francisco Coelho Solano da Silva e o bacharel 
Mariano José Pereira da Fonseca, então com cerca de 20 anos, conhecido como Biscoito 
e que, na maturidade, seria figura proeminente da nobreza imperial. Havia, além disso, 
quatro artesãos, todos eles portugueses: o marceneiro João da Silva Antunes, o sapateiro 
João Sá da Conceição, o ourives Antônio Gonçalves do Santos e o entalhador Francisco 
Antônio Lisboa. Reinol também era o médico Dr. Jacinto José da Silva. Ao lado deles, 
figuravam o estudante José Antônio de Almeida, o mais jovem de todos, e dois 
24 VILLALTA, Luiz Carlos, op. cit., p. 69-70.
10
professores régios: o poeta Manuel Inácio da Silva Alvarenga e João Marques, professor 
de grego25. 
A concepção de liberdade que os movia encontra-se sintetizada na “Oração feita 
por José Antônio de Almeida e recitada na aula de Retórica no mês de outubro do ano 
de 1794”, de que era mestre o poeta Manuel Inácio da Silva Alvarenga. Essa oração, de 
acordo com o parecer do juiz da devassa aberta contra os acusados, inspirava-se em 
Mably26, trazendo uma concepção de liberdade do homem, em última instância, como 
originada na natureza e em seu “autor”, o “Ente infinito e perfeitissimamente sábio”. 
Segundo a Oração, este último criara o homem, para que seu “eterno poder fosse de 
alguma sorte conhecido por uma criatura” que, dotada “de uma alma racional”, 
“soubesse admirar a sua grandeza e gratificar os seus benefícios”27. Providenciara, 
ademais, “tudo o que deveria servir de recrear o espírito do homem”, sustentando seu 
corpo e recreando seu espírito. De todas as maravilhas criadas pelo Onipotente, 
entretanto, nenhuma era mais valorizada pelo homem do que sua própria vida28. Uma 
coisa, porém, animaria o homem “a tirar a vida a si próprio”, este bem que estimaria 
mais do que tudo: ele arriscaria a vida excitado por um “valor”29, o princípio de que “a 
ninguém devia estar sujeita a sua vida senão à vontade daquele que lhe deu o ser, e que 
em nenhum tempo deveria sujeitar a sua liberdade aos rigores do seu semelhante, a 
quem não deve, nem cooperou a sua essência”30. A Oração concluí-se com um pesar: 
“qual não deve ser a fraqueza e vileza dos espíritos daquele que chega a submeter-se 
totalmente às disposições de outrem, na consideração de ser ele uma criatura a quem 
ainda seu Supremo Senhor concedeu a livre disposição da sua vontade! e que esse 
mesmo que o pretende oprimir e abater não recebeu da mão do seu criador outra alma 
mais perfeita que lhe possa infundir uma natural superioridade!”31. A liberdade, assim, 
era sinônimo de recusa à opressão, implicando a compreensão de que haveria uma 
igualdade inata a todos os homens, intrínseca à própria criação, considerando-se 
aviltante à sujeição a outrem.
A partir dessa concepção de liberdade, os “Inconfidentes” do Rio de Janeiro 
puseram em xeque um ou mais elementos do Antigo Regime. Conforme a avaliação do 
25 Ibidem, p. 77-78.
26 AUTOS de devassa: prisão dos letrados do Rio de Janeiro (1794). Niterói: Arquivo Público do Estado 
do Rio de Janeiro: Rio de Janeiro: UERJ, 1994, p. 147-148.
27 Ibidem, p. 212.
28 Ibidem, p. 212-213.
29 Ibidem, p. 213.
30 Ibidem, p. 213.
31 Ibidem, p. 213.
11
Conde Resende, Vice-Rei do Brasil, os acusados haviam se esquecido “de si e da honra 
do nome português, que até o presente consistia principalmente no amor e fidelidade 
aos nossos clementíssimos soberanos”, do que se subentende que rejeitavam a 
monarquia absolutista portuguesa32. Os acusados, além disso, em “casas particulares” e 
“nos lugares públicos” da cidade do Rio de Janeiro, teriam debatido, naquele contexto 
de guerra das potências européias contra a França, “questões sobre o governo público 
dos estados”, proferindo algumas pessoas afirmações como as de “que os reis não são 
necessários; que os homens são livres e podem, em todo o tempo, reclamar sua 
liberdade; que as leis por que” se governava “a nação francesa” seriam “justas e que o 
mesmo que aquela nação praticou se devia praticar neste continente”, ou seja, além de 
se oporem ao absolutismo, os implicados refutavam a monarquia, advogavam a 
liberdade do homem, defendiam as leis francesas e sua implantação na América33. 
Completava, ainda, o Vice-Rei, informando que os Inconfidentes achavam “que os 
franceses deviam vir e conquistar” o Rio de Janeiro e “que a Sagrada Escritura, assim 
como dá poder aos reis para castigar os vassalos, o dá aos vassalos para castigar os 
reis”: os direitos dos reis e dos vassalos eram colocados, portanto, em condições de 
igualdade, derivados ambos que eram da Bíblia34. 
De fato, o entalhador Francisco Antônio defendeu que o “rei era como qualquer 
de nós”; que “matar o rei não era pecado”, “sendo bem feito” o que sucedera a Luís XVI 
– com o que, aliás, concordava o não-acusado Jacó Munier35. O sapateiro João da 
Conceição afirmou que a “lei dos franceses” era “justa e santa porque” fora “tirada da 
Sagrada Escritura”, a partir do que concluía que era legítimo o rei matar os homens e 
também o inverso, sacralizando-se, assim, o direito dos governados36. Outros, ainda, 
prognosticavam o fim da monarquia,37 ou então, passavam da oposição ao absolutismo 
na França para a crítica da monarquia no mundo luso-brasileiro e, ainda, resvalando da 
Coroa para a religião, mais precisamente para pronunciamentos contra o fanatismo 
religioso. Assim, Manoel Inácio da Silva Alvarenga e outros acusados, falando sobre a 
“liberdade, depois de haverem lido alguns discursos na língua francesa contra a 
Soberania dos Monarcas, disseram que o nosso reino estava entregue a frades”, 
censuravam alguns procedimentos do príncipe regente Dom João, avaliando-os como 
32 Ibidem, p. 37.
33 Ibidem, loc. cit.
34 Ibidem, loc. cit.
35 Ibidem, p. 44, 53 e 69.
36 Ibidem, p. 41-42.
37 Ibibem, p. 41 e 63.
12
“nascidos fanatismo”38. Atingiam também, em cheio, a própria monarquia portuguesa e, 
ainda, aliavam a isso um outro importante elemento, a repulsa à influência dos fidalgos: 
Manoel da Costa Santos considerava que os reis, aconselhados pelos fidalgos, 
procuravam-se apoderar dos bens do seus vassalos, motivo pelo qual simpatizava com a 
eliminação dos mesmos na Espanha e França39. Francisco Antônio ia além, pois 
classificava os reis portugueses como corruptos, em razão da ascensão que tinham sobre 
eles os fidalgos, e defendia que essa situação fosse superada, no Brasil, com a vinda das 
leis francesas40. João Marques, depois de considerar injusta uma ação de Dom João, 
sentenciou que o rei deveria ser enforcado quando cometesse injustiça, do que se deduz 
que defendia o regicídio também em relação ao soberano português41. 
Tudo isso, enfim, vem corroborar as afirmações do Vice-Rei. Escapou aos seus 
olhos, porém, um importante aspecto: houve quem associasse entre o acusados – e entre 
os que não estavam incluídos entre eles – liberdade e igualdade. Por instaurarem a 
igualdade, as leis francesas mereciam a admiração do entalhador Francisco Antônio; o 
não acusadoJoão Veloso, homem pardo, disse que gostaria de estar na França para 
“gozar da minha liberdade”, do que se pode inferir que tomava esta última no sentido de 
igualdade, visto que ele vivia numa sociedade em que havia discriminação dos homens 
de cor42. Liberdade e igualdade levaram alguns dos supostos Inconfidentes a 
defenderem a República. Nada veemente, essa defesa parece ter seduzido mais aqueles 
que ocupavam uma posição inferior na hierarquia social: João Antunes, marceneiro, 
para quem “as repúblicas pagavam tudo o que tiravam aos vassalos” e “o governo de 
muitos era melhor porque sabiam mais” várias “cabeças do que uma só”; Antônio 
Gonçalves dos Santos, o Passageiro Bonito, ourives, considerava a república melhor 
que o “governo monárquico”43.
O Conde de Resende, saliente-se, temia profundamente as “conseqüências 
muitos perigosas” que tais máximas poderiam produzir e que seria conveniente 
“atalhar”44. Aqui haveria algum exagero? O próprio Vice-Rei e o juiz da devassa 
admitiam que jamais se deixara o terreno das palavras para a ação, que não se concebera 
nenhum projeto de rebelião. De fato, não se cogitou fazer um levante. Limitando a 
38 Ibidem, p. 38.
39 Ibidem, p. 43.
40 Ibibem, p. 53 e 82.
41 Ibibem, p. 46-47.
42 Ibidem, p. 81.
43 Ibidem, p. 59, 67 e 69. 
44 Ibidem, loc. cit.
13
análise, além disso, unicamente às idéias, poderemos concluir que nem mesmo o perigo 
compreendido como numa rejeição ao domínio metropolitano, aos vínculos entre 
Portugal e América, deveria ser objeto de muita preocupação do Vice-Rei. Este, na 
verdade, poderia ficar quase totalmente tranqüilo pois os acusados raramente esboçaram 
uma percepção sobre as especificidades do viver numa Colônia, do ser português na 
América e, por conseguinte, muitos menos se opuseram ao domínio metropolitano. 
Embora raras, as percepções dessas especificidades existiram. Mariano José Pereira da 
Fonseca, defendendo-se do seu acusador, o frei Raimundo Penaforte, disse que o 
mesmo era “inimigo dos brasileiros”, denunciando a discriminação dos nascidos no 
Brasil e, de algum modo, deixando entrever a possibilidade de os “brasileiros” 
contestarem-na45. Numa correspondência recebida pelo Dr. Jacinto, encaminhada por 
seu amigo e colega de ofício lisboeta, o Dr. Manuel José de Novais de Almeida, em 
1791, este último discordava das reclamações apresentadas pelo primeiro no sentido de 
que, na América, haveria mais “injustiças” que no Reino, afirmando que isso também se 
verificava “no centro da Corte”, isto é, em Lisboa46 – o Dr. Jacinto, portanto, 
demonstrava perceber que ser português na América era pior do que na Corte. 
Sem terem cogitado nenhuma rebelião, mas feito pronunciamentos e esboçado 
sonhos de liberdade que representavam a morte de elementos característicos do Antigo 
Regime– absolutismo monárquico, fanatismo religioso, preeminência dos fidalgos e 
discriminação dos homens de cor –, os acusados, em suma, mostravam-se atentos ao 
que sucedia na Europa, animados com os sucessos da revolução francesa, partidários do 
regicídio. Alguns levaram suas divagações a um terreno mais abstrato, situando a 
liberdade fora da sociedade humana. Os letrados Silva Alvarenga, João Marques, 
Mariano Pereira da Fonseca e o Dr. Jacinto, capitaneados pelo primeiro, sonharam com 
uma “república de animais nas cabeceiras ou sertão do rio Tageaí”. República 
imaginária, expressava a necessidade de Silva Alvarenga, “nas horas de melancolia”, de 
evadir-se da sociedade em que vivia, negando, com isso, os fundamentos em que se 
assentava; seria uma república de animais, “porque era melhor viver entre os bichos do 
que entre os homens maus”47. A “República do Tageaí”, na realidade, evocava às 
45 Ibidem, p. 156-157.
46 Na carta escrita por Almeida em 24 de fevereiro de 1791, o missivista apresenta sua Utopia, localizada 
no longínquo ano de 2440, momento em que os direitos do homem seriam respeitados, inexistiriam 
privilégios sociais e políticos para alguns grupos, os filósofos seriam reis, haveria tolerância religiosa e 
estariam constituídas duas repúblicas na América, uma ao norte e outra, “ao meio dia”. Em 2440, pode-se 
supor, portanto, a América Portuguesa constituiria uma República, separada de Portugal, segundo o Dr. 
Novais de Almeida (Ibidem, p. 119-120)
47 Ibidem, p. 145 e 167-168.
14
críticas de Rousseau à sociedade: para o grande filósofo das Luzes, o homem, ao 
abandonar o estado de natureza, ingressar na cultura e sujeitar-se a uma forma coercitiva 
de sociedade, entregara-se aos vícios, corrompendo sua natureza, valorizando o amor 
próprio e a vaidade e empenhando-se em dominar os seus semelhantes48. Essa República 
imaginária, assim, apontava para uma liberdade existente fora das fronteiras da 
existência humana, segredando simpatias por uma modificação radical e, ao mesmo 
tempo, por mais paradoxal que possa aparecer, abstrata da sociedade.
“Revolução” na Bahia: Liberdade e Igualdade
Trinta e três homens – presos, fugidos ou mortos – foram acusados de 
Inconfidência na Bahia, sendo que 22 deles eram reconhecidamente pardos, dois negros; 
dez eram simples artesãos; dezesseis não tinham bens, encontrando-se oito 
provavelmente nas mesmas condições; 9 deles eram escravos. Dentre esses homens de 
condição social bastante precária, destacavam-se Luiz Gonzaga das Virgens, pardo, 
liberto, soldado granadeiro do 1º regimento de linha; Lucas Dantas d’Amorim Torres, 
pardo livre, soldado do regimento de artilharia; João de Deus do Nascimento, pardo 
livre, alfaiate cabo da esquadra do segundo regimento de milícias e Manoel Faustino 
dos Santos Lira, pardo forro, alfaiate. Ao lado deles, figuravam pessoas de origem 
social mais abastada: Cipriano José Barata d’Almeida, cirurgião, bacharel em filosofia 
pela Universidade de Coimbra e seu irmão José Raimundo Barata D’Almeida; 
Francisco Moniz Barreto d’Aragão, professor de Gramática Latina na Vila de Rio das 
Contas; e Hermógenes Francisco de Aguilar Pantoja, tenente do 2º regimento da linha49. 
Esse perfil dá uma idéia da abrangência social do movimento, ainda que oculte o 
envolvimento de algumas pessoas oriundas dos estratos superiores da sociedade baiana, 
como o padre Francisco Agostinho Gomes, rico comerciante; o cônego Salvador Pires 
de Carvalho e Albuquerque; Luiz Gercente e José Porfírio, dentre outros. Essas 
ausências devem-se ao fato de o governador da Bahia Dom Fernando José de Portugal 
ter conduzido a devassa, aberta para investigar a conjura, de modo a demonstrar que 
para ela “não concorreram pessoas de consideração”50. 
48 CASSIRER, Ernst. Filosofia de la Ilustración. Trad. Eugenio Ímaz. 2 ed. Madrid: Fondo de Cultura 
Económica, 1993, p. 177-181.
49 A INCONFIDÊNCIA da Bahia: devassas e seqüestros [IBDS]. Separata de Anais da Biblioteca 
Nacional Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1931,vol. 1, p. 90-91.
50 IBDS, op. cit., vol. 1, p. 57-61.
15
As origens e o teor da idéia de liberdade cultivada pelos conjurados baianos, 
homens de maior e menor distinção, encontram-se traduzidos com bastante clareza em 
um poema cuja autoria é atribuída ao professor Francisco Muniz Barreto, poema este 
decorado por alguns outros, dentre eles Lucas Dantas. Segundo o poema, Igualdade e 
Liberdade encontravam-se no “sacrário da razão”, preenchendo, ao lado da “Justiça”, o 
“meu coração”:
Igualdade e liberdade
No sacrário da razão
Ao lado da sã Justiça
Preenchem o meu coração51
Liberdade e igualdade, ademais, seriam leis infalíveise imprescritíveis de Deus, na 
medida em que os entes marcar-se-iam pela eqüidade, tendo em comum uma mesma 
“causa motriz”, iguais “sensações”, “órgãos” e “precisões”:
Se a causa motriz dos entes
Tem as mesmas sensações
Mesmos órgãos e precisões
Dados a todos os viventes
Se a qualquer suficientes
Meios da necessidade
Remir deu com eqüidade
Logo são imprescritíveis
E de Deus Leis infalíveis
Igualdade e liberdade.52
Tal “dogma”, sendo seguido por todos, tornaria “bem aventurado” o “povo rude e 
polido”; florescera nos Estados Unidos da América, fora imitado pelos “franceses”, que, 
“afoitos”, entraram “no sacrário da razão”:
Se este dogma for seguido,
E de todos respeitado,
Fará bem aventurado
Ao povo rude e polido.
E assim que florescido
Tem da América a Nação!
Assim flutue o Pendão
Dos franceses, que a imitaram
Depois que afoitos entraram
No Sacrário da razão.53
51 Francisco Muniz Tavares apud. TAVARES, Luís Henrique Dias. História da sedição intentada na 
Bahia em 1798: a conspiração dos alfaiates. São Paulo: Pioneira, 1975, p. 89-91.
52 Ibidem, loc. cit.
53 Ibidem, loc. cit.
16
O poema anunciava a “doce comoção” que nasceria das futuras “venturas” dos baianos 
quando viessem a se levantar contra os “mil despóticos tiranos”, ficando, então, “felizes 
e soberanos”: 
Quando os olhos dos Baianos
Estes quadros divisarem,
E longe de si lançarem
Mil despóticos tiranos
Quão felizes e soberanos,
Nas suas Terras serão!
Oh, doce comoção
Experimentam estas venturas
Se elas me que futuras
Preenchem o meu coração54
Em suma, o poema, atrelando-se às Luzes, à Revolução Americana e à 
Revolução Francesa, exprimia uma crítica à tirania e associava liberdade e igualdade em 
termos muito próximos aos defendidos pelos acusados de Inconfidência no Rio de 
Janeiro. No entanto, o poema sinalizava que, ao contrário do que sucedera na capital do 
Vice-Reino do Brasil, os baianos estavam dispostos a apearem os tiranos do poder, 
ensaiando um projeto de revolução. Na verdade, movidos por esse propósito, os baianos 
tentaram até mesmo uma aliança com a França Revolucionária, de que é testemunho o 
projeto de invasão da Bahia apresentado ao governo do Diretório, aos 24 de agosto de 
1797, pelo comandante Antoine René Archer, que estivera meses antes em Salvador55.
Representantes das elites baianas e pessoas oriundas das camadas populares 
tentaram articular uma revolução contra o domínio português e a Coroa, situados numa 
conjuntura revolucionária em que despontavam os sucessos dos franceses, imersos num 
sistema colonial que restringia as possibilidades de acumulação por parte da camada 
senhorial, marcados pelas barreiras legais que limitavam o desenvolvimento de 
atividades produtivas de tipo urbano pelo povo mecânico e por um recrutamento militar 
que atingia a setores mais amplos da população, envolvendo pardos e negros, sem 
contudo permitir aos não-brancos ter maiores expectativas de progressão na carreira 
militar e, ainda, colocados diante da contradição entre a prosperidade econômica, dada 
pela alta de preços dos produtos de exportação, e seu efeito inflacionário na Colônia, 
perverso para aqueles que não se ligavam ao setor exportador, obrigados a lidar com o 
aumento dos preços dos gêneros alimentícios sem uma compensação em seus próprios 
54 Ibidem, loc. cit.
55 TAVARES, Luís Henrique Dias, op. cit, p. 81-82 e JANCSÓ, István. Bahia, 1798: a hipótese de auxílio 
francês ou a cor dos gatos. In: FURTADO, Júnia (org.). Diálogos oceânicos. Belo Horizonte: UFMG, 
2000 (no prelo), p. 1.
17
ganhos56. Os contornos desse projeto são difíceis de precisar, porém sabe-se que o 
mesmo gorou duplamente: por um lado, houve o afastamento das elites, temerosas em 
relação à perda de controle das camadas populares e, sobretudo, prisioneiras de 
preconceitos sobre a capacidade de pessoas de “baixa-ralé” promover um levante e, por 
outro, o governo local reprimiu com rigor a tentativa de sedição.
A formulação, o abandono e a destruição desse projeto de revolução têm uma 
cronologia. De fins de 1793 até agosto-setembro de 1797, alguns “homens de 
consideração” manifestaram seu repúdio à exploração colonial e sua simpatia pela 
França e pelos ideais de sua revolução, formando um pensamento contrário ao 
absolutismo monárquico, localizando nele os males que afligiam os povos. Essas 
conversas desenvolveram-se dentro de um círculo restrito de familiares e amigos. A 
presença de Antoine René Larcher na Bahia, entre fins de 1796 e inícios de 1797, fez 
recrudescer a contestação política57. Essas reuniões, de cunho político explícito, deram-
se inicialmente em residências particulares, mas avançaram depois para o espaço 
público, “ganhando as ruas, tanto na esfera urbana quanto nas cercanias do 
Recôncavo”58. 
Algumas pessoas pertencentes às elites, como o padre Francisco Agostinho 
Gomes, o tenente Hermógenes Pantoja, o professor Muniz Barreto e o cirurgião 
Cipriano Barata de Almeida envolveram-se nessas discussões e pronunciamentos, ao 
mesmo tempo em que artesãos pobres e escravos miseráveis conseguiram ter acesso às 
idéias revolucionárias, eivadas de influências das Luzes e das máximas e notícias dos 
acontecimentos revolucionários franceses59. Certamente foi nesse momento que o 
soldado pardo Lucas Dantas, por exemplo, conseguiu gravar na memória aqueles versos 
supracitados, de autoria do professor Muniz Barreto60. Nos idos de agosto-setembro de 
1797, D. Fernando José de Portugal e Castro, governador da Bahia, informado pelo 
coronel José de Mattos Ferreira e Lucena sobre essas conversas, advertiu os 
56 Sobre a situação econômica da Bahia e as tensões existentes em seu território, veja sobretudo: 
JANCSÓ, István. Na Bahia, contra o império: história do ensaio de sedição de 1798. São Paulo: Hucitec: 
Salvador: UFBA, 1996, p. 57-67 e 90-97 e MATTOSO, Katia de Queirós. Bahia 1798: os panfletos 
revolucionários: proposta de uma nova leitura, op. cit., p. 342.
57 JANCSÓ, István. Bahia, 1798: a hipótese de auxílio francês ou a cor dos gatos, op. cit., p. 9-10.
58 Ibidem, p. 10
59 NEVES, Guilherme Pereira das. “Bahia, 1798: uma leitura colonial da Revolução Francesa: a propósito 
da tradução portuguesa de um texto de Jean-Louis Carra”. Acervo, Rio de Janeiro (4-1):121-125, jan. jun. 
1989, p. 122.
60 TAVARES, Luís Henrique Dias. História da sedição intentada na Bahia em 1798, op. cit., p. 89-91 
18
participantes sobre os perigos que corriam, com o que alguns deles saíram de 
circulação61.
A segunda fase estendeu-se do final de 1797 até o início das prisões em 1798. 
Nessa fase, as conversas ganharam um desenvolvimento relativamente autônomo em 
relação às elites, cativando “alguns soldados e artesãos de suas relações profissionais e 
domésticas”62. Nessa ultrapassagem, homens livres “socialmente discriminados, 
mulatos, soldados, artesãos, ex-escravos e descendentes de escravos” conceberam a 
idéia de instalar uma república que garantisse igualdade63; no início de agosto de 1798, 
foram afixados em locais diferentes da cidade dez boletins-pasquins sediciosos64. No dia 
12 de agosto de 1798, o governador, tomando conhecimento dos boletins, ordenou a 
abertura de uma devassa para descobrir os autores dos pasquins, tendo-se seguido a isso 
as prisões do pardo Domingos da Silva Lisboa e, depois da afixação de dois novos 
boletins, em 22 de agosto, de Luís Gonzaga das Virgens, também pardo65. 
Com as prisões, começou a terceira fase do movimento. Nessa fase, as pessoas 
de “condição”, porventura ainda envolvidas nas conversasde sedição não obstante as 
advertências anteriores do governador, por medo da repressão ou dos rumos que a 
“gente ordinária” dava à iniciativa66, afastaram-se do projeto. A exceção, ao que parece 
única, foi José Raimundo Barata de Almeida, irmão de Cipriano Barata, negociante que 
mascateava pelos sertões67. Nos dias imediatamente posteriores às prisões, sucederam-se 
conversas daqueles que provinham dos estratos inferiores da hierarquia social, ficando 
acertado entre eles uma reunião para a noite do dia 25 de agosto, no campo do dique do 
Desterro, durante a qual os conjurados avaliariam se havia número suficiente de 
partidários para realizar o levante ou se, pelo contrário, esses eram poucos, sendo mais 
conveniente calarem-se68. Essa reunião, no entanto, foi denunciada por Joaquim José da 
Veiga e Joaquim José de Santa Ana69, tendo os presentes percebido o malogro. 
61 Ibidem, p. 37, 59 e 94-95.
62 Ibidem, p. 94-95.
63 Ibidem, p. 96.
64 Ibidem, p. 19-35.
65 Ibidem, p. 36. A prisão de Luís Gonzaga parece ter acelerado o movimento. Após sua realização, 
Romão Pinheiro afirmou: “nos é preciso adiantar este particular, antes que o dito Gonzaga declare as 
pessoas que nele estavam metida” (IBDS, vol. 1, p. 35).
66 Sobre o afastamento das elites, veja: NEVES, Guilherme Pereira das. “Bahia, 1798: uma leitura 
colonial da Revolução Francesa: a propósito da tradução portuguesa de um texto de Jean-Louis Carra”, 
op. cit., p. 124. Segundo esse autor, até às vésperas de 1822, a “elite brasileira não planejava uma ruptura 
com Portugal. Ela recusava apenas os excessos de um sistema colonial agonizante” (Ibidem, loc. cit).
67 TAVARES, Luís Henrique Dias. História da sedição intentada na Bahia em 1798, op. cit., p. 52.
68 Ibidem, p. 51.
69 Ibidem, p. 57.
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Que liberdades postulavam esses homens? Nos pasquins-boletins afixados em 
agosto de 1798, vêem-se máximas contra a monarquia absolutista portuguesa, 
qualificada como “péssimo jugo reinável da Europa”: por “ordem da Rainha de Lisboa” 
se fariam “latrocínios” nos “títulos, imposturas, tributos e direitos”70. Essas máximas 
traziam implícitos o reconhecimento do princípio segundo o qual todos os homens 
livres seriam cidadãos e também a idéia de nação enquanto sinônimo de Estado, 
instaurado pela soberania popular. Não continham, entretanto, uma rejeição à nação 
portuguesa: o alvo era o trono, o “despotismo”, o “rei tirano”, à subordinação a 
Lisboa71. Nos pasquins, no entanto, é preciso dizer, havia idéias contra o jugo colonial e 
defendia-se o livre-comércio, a elevação dos soldos e o apoio externo para o extermínio 
do “péssimo jugo reinável da Europa”. As liberdades, portanto, atingiam dois pilares 
básicos do Antigo Regime: o absolutismo e o sistema colonial, visto que este tinha no 
monopólio comercial um de seus alicerces. Os conjurados sonhavam, além disso, com 
uma “república democrática”, “onde os acessos e lugares representativos” seriam 
“comuns, sem diferença de cor, nem de condição, onde eles ocupariam os primeiros 
ministérios, vivendo debaixo d’uma geral abundância e contentamento”72. Na revolução 
preconizada pelos pasquins e pelo discurso preponderante entre os conjurados, frise-se, 
não se colocava a abolição. Segundo Lucas Dantas, a revolução seria envolveria uma 
guerra no interior da sociedade baiana e instituiria uma sociedade fundada na igualdade 
jurídica entre os indivíduos de cores diferentes, um governo democrático estabelecido 
nos limites da capitania da Bahia e exercido por homens capazes e de maior juízo, não 
importando de que nação. A democracia, assim, fundava-se na crença de que havia 
pessoas mais e menos preparadas para o governo, devendo apenas os mais capazes 
governar; a nação do governante não seria critério de inclusão ou exclusão para sua 
escolha73. A igualdade pressuposta na idéia de liberdade abraçada pelos conjurados da 
Bahia repercutia também no âmbito militar: o soldado pardo Lucas Dantas, “andava 
falando, em revoluções, e sistemas de liberdade”, tentando persuadir a José Joaquim de 
Sirqueira, homem branco, soldado, “a segui-lo, representando-lhe a escravidão, que 
70IBDS, op. cit., vol. 1, p. 7 e Aviso ao Clero e ao Povo Bahiense indouto. Apud TAVARES, Luís 
Henrique Dias. História da sedição intentada na Bahia em 1798, op. cit., p. 30.
71 JANCSÓ, István & PIMENTA, João Paulo G. “Peças de um mosaico (ou apontamentos para o estudo 
da emergência da identidade nacional brasileira)”. In: MOTTA, Carlos Guilherme (org.). Viagem 
Incompleta. A experiência brasileira (1500-2000). Formação: histórias. São Paulo: SENAC, 2000, p. 
145-149 e Aviso ao povo bahiense. Apud TAVARES, Luís Henrique Dias. História da sedição intentada 
na Bahia em 1798, op. cit., p. 24.
72 IBDS,vol. 2, p. 170.
73 IBDS, vol. 1, p. 262.
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viviam sujeitos aos seus Coronéis, e seus Superiores, e a severidade dos seus castigos”74
. 
Alguns conspiradores radicais estenderam a um universo mais amplo de relações 
a associação entre as idéias de liberdade e igualdade, pronunciando-se contra a 
desigualdade de riqueza e a escravidão. O pardo João de Deus, conversando com 
Antônio Joaquim de Oliveira que se locomovia sentado em uma cadeira, segurada por 
escravos, acusou-o de não ter “medo ao tempo” porque seria “rico, não quer[endo] 
molhar os pés”, ouvindo de Oliveira, em resposta, que seriam “mercês do Céu”. João de 
Deus, então, retrucou: “Está feito, e o tempo virá em que possa ser que eu ande de 
cadeira e vossa mercê, de pé”75. Ao ver passando “um homem carregado em uma 
cadeira”, João de Deus fez outro pronunciamento contra a desigualdade dada pela 
riqueza, dizendo: “Grande cousa é ter dinheiro; como vai aquele repimpando na sua 
cadeira, e eu que não tenho dinheiro ando a pé; e acaso haverá tempo que andem a pé 
todos, sem serem carregados por criaturas?”76. A rejeição à desigualdade de riqueza, 
portanto, aos olhos de João de Deus, somava-se à crítica velada ao escravismo e à 
defesa da superação dessa ordem das coisas. João de Deus, ademais, defendia a 
liberdade para presos e frades e sonhava com uma igualdade fugidia de riqueza: dizia 
que os revoltosos iriam saquear a cidade, constranger o governador a apoiá-los e, caso 
houvesse resistência dele, iriam matá-lo, “destruir ao mesmo tempo todas as Pessoas 
Públicas, atacar os Mosteiros, franquear aos que quisessem sair, saqueá-los de todo o 
preciso, arrombar as cadeias, pôr os presos e os forçados em liberdade, reduzindo tudo a 
uma inteira revolução, que todos ficariam ricos, tirados da miséria em que se achavam, 
extinta a diferença de cor branca, preta, e parda: porque uns e outros seriam sem 
diferença chamados e admitidos a todos os Ministérios e Cargos”77. Outro conjurado, 
Manoel Faustino, foi mais explícito nos seus ideais abolicionistas, afirmando que o 
“levante” teria por fim “serem libertos todos os pretos, e pardos cativos, e viverem em 
uma igualdade tal, que não houvesse distinção de cores, e assim viveriam todos 
contentes”78. Em suma, se é certo que, na Conjuração Baiana, egressos da escravidão 
ingressaram na sociedade política além dos “limites do que poderia ser assimilado pelas 
classes dominantes”79, se é certo também que a abolição não fazia parte do projeto 
74 Ibidem, vol. 1, p. 18.
75 Ibidem, vol. 1, p. 55.
76 Ibidem, vol. 1, p. 66.
77 Ibidem, vol. 1, p. 8.
78 Ibidem, vol. 2, p. 182.
79 JANCSÓ, István & PIMENTA, João Paulo G., op. cit., p. 145-148.
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político dos conspiradores explicitado nos pasquins e no discurso predominante entre os 
conjurados, é verdadeiro tambémque, entre os partidários da sedição, houve quem 
sonhasse com uma igualdade, quase etérea, de riqueza e quem defendesse “que todos os 
cativos pardos, e pretos ficariam libertos sem que houvesse mais escravo algum”80.
Conclusão
As “Inconfidências” de fins do século XVIII imaginaram liberdades distintas. 
Em Minas Gerais, enfatizou-se a liberdade para produzir e apropriar-se das riquezas, 
instituindo-se o livre-comércio, promovendo-se uma mera reocupação dos postos de 
mando na Capitania ou então constituindo-se um governo autônomo, monárquico ou 
republicano. No Rio de Janeiro, a liberdade foi concebida em termos de rejeição a um 
poder monárquico absoluto, ao fanatismo e a uma sociedade assentada em privilégios, 
sem postular a ruptura com Portugal ou uma rebelião. Já na Bahia, a liberdade foi 
entendida como superação do vínculo colonial, como instalação do livre-comércio e 
como eliminação da discriminação contra negros e mulatos, agora cidadãos.
Ao final do século XVIII, as “Inconfidências”, conspirações ou meras 
divagações político-literárias, colocaram em questão o problema da liberdade, 
apreendendo-o sob diversos ângulos e, ainda, segundo, um repertório intelectual e 
político variado e complexo. Liberdades imaginárias, foram, além disso, liberdades 
derrotadas, à exceção verdadeiramente de uma delas: a idéia de liberdade presente no 
projeto de edificação de um Império, sob o domínio da dinastia de Bragança, centrado 
na América e, no limite, autônomo em relação à pátria-mãe portuguesa. Esse projeto 
sairia vitorioso mais tarde, em 1808 e em 1822.
80 IBDS, vol. 1, p. 202-203.
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