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1 UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC CURSO DE PSICOLOGIA MORGANA MILIOLI UM ESTUDO SOBRE OS SENTIMENTOS QUE ENVOLVEM E CONDUZEM O ADOLESCENTE À DEPENDÊNCIA QUÍMICA: UMA REVISÃO CRICIÚMA, JUNHO DE 2009 MORGANA MILIOLI 2 AS VÁRIAS FACES DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA NA ADOLESCÊNCIA: UM ESTUDO SOBRE OS SENTIMENTOS QUE ENVOLVEM E CONDUZEM O ADOLESCENTE À DEPENDÊNCIA QUÍMICA. Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado para obtenção do grau de Psicólogo no Curso de Psicologia da Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC. Orientadora: Profª Denise Nuernberg CRICIÚMA, JUNHO DE 2009. MORGANA MILIOLI 3 AS VÁRIAS FACES DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA NA ADOLESCÊNCIA: UM ESTUDO SOBRE OS SENTIMENTOS QUE ENVOLVEM E CONDUZEM O ADOLESCENTE À DEPENDÊNCIA QUÍMICA. Trabalho de Conclusão de Curso aprovado pela Banca Examinadora para a obtenção do Grau de Psicólogo, no Curso de Psicologia da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC, com Linha de Pesquisa em Educação e Cidadania. Criciúma, 22 de junho de 2009. BANCA EXAMINADORA Profª Denise Nuernberg - Especialista - (UNESC) - Orientadora Profª Elenice de Freitas Sais – Especialista – (UNESC) Profª Vânia K. Menegalli Moojen – Mestre – (UNESC) 4 “O homem se torna muitas vezes o que ele próprio acredita que é. Se insisto em repetir para mim mesmo que não posso fazer uma determinada coisa, é possível que acabe me tornando realmente incapaz de fazê-la. Ao contrário, se tenho a convicção de que posso fazê-la, certamente adquirirei a capacidade de realizá-la, mesmo que não a tenha no começo.” Mahatma Gandhi 5 Dedico este trabalho a todos os educadores que passaram pela minha vida, que contribuíram na minha trajetória acadêmica, que foram exemplos de dedicação, ética, comprometimento e, acima de tudo, humanos, possibilitando uma visão limpa do quanto são fundamentais em nossas vidas. 6 AGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOS Agradeço a Deus sempre, por cada batalha, cada conquista, por estar aqui mais um dia e ser o que sou hoje. Aos meus pais, independente de onde eles estejam olhando e torcendo por mim. A Marilucia Milioli que sempre me incentivou e me fez ser o que sou hoje, ensinando bons valores e princípios, sendo o exemplo vivo do quanto a vida é maravilhosa e o quanto devemos lutar por nossos objetivos, sempre buscando forças para seguir em frente. Pela generosidade e honestidade, por me ensinar a ser digna, acreditando que o mundo pode, com a contribuição de todos, ser um pouco melhor e por me proporcionar os estudos, a base do saber. Ao meu amado noivo Mateus, pelo seu exemplo de vida, força e coragem para vencer, e por toda a sua compreensão, não me deixando fraquejar nos momentos mais difíceis. À minha adorável orientadora, por todo o carinho, dedicação, sabedoria e contribuição para a concretização deste trabalho. Por fim, a todos que contribuíram de alguma forma neste momento da minha vida, por não me deixarem desistir. 7 RESUMO A presente pesquisa trata-se de uma pesquisa exploratória descritiva de natureza bibliográfica e analítica que busca compreender dentro do universo da dependência química os sentimentos que conduzem os adolescentes ao caminho das drogas. Para responder a esta questão norteadora parte-se da premissa que a adolescência é um período conturbado na cultura ocidental em busca da autoafirmação enquanto sujeitos e por isso nessa fase de muitas angústias, problemas de relacionamentos, de descobertas amorosas, sexuais etc, as drogas trazem prazer ao jovem, pois aliviam momentaneamente suas tensões, conduzem-no a outros caminhos, por isso os jovens adolescentes se envolvem com ela. Dessa forma a pesquisa constata que é preciso muita informação para os adolescentes, pois as drogas trazem consequências sociais e psíquicas maléficas ao homem. Desse modo o único caminho de ajudá-los é procurar dar atenção, carinho e compreensão nesse momento tão difícil para os jovens. Palavras chave: Adolescência. Drogas. Dependência Química. 8 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Critérios para o diagnóstico de dependência de substâncias psicoativas, segundo DSM-IV.................................................................................26 Tabela 2 - Classificação dos tipos de drogas........................................................30 Tabela 3 - Substâncias psicoativas........................................................................31 9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................10 2 ADOLESCÊNCIA..........................................................Erro! Indicador não definido. 2.1 Características da Adolescência. .........................Erro! Indicador não definido.4 3 DROGAS NA ADOLESCÊNCIA ...........................................................................20 3.1 Dependência Química .........................................Erro! Indicador não definido.4 3.2 Tipos de Drogas ...................................................Erro! Indicador não definido.8 4 OS SENTIMENTOS ENVOLVIDOS NA ADOLESCÊNCIA QUE CONDUZEM AO USO DE DROGAS ...................................................................................................33 5 OS CAMINHOS NA RECUPERAÇÃO DO ADOLESCENTE COM DEPENDÊNCIA QUÍMICA .....................................................................Erro! Indicador não definido.41 6 CONCLUSÃO ........................................................................................................48 REFERÊNCIAS............................................................Erro! Indicador não definido.51 REFERÊNCIAS COMPLEMENTARES ..............................Erro! Indicador não definido.54 10 1 INTRODUÇÃO O universo dos jovens transforma-se a cada dia, velhos paradigmas são mudados e trazem muitas mudanças de comportamento, tanto nos aspectos sociais quanto nos psicológicos, no modo de observar e de enfrentar as situações deste período. Com essas mudanças muitas vezes algumas confusões se instalam, pais não sabem qual o seu verdadeiro papel diante da educação dos filhos, sentem-se confusos diante das mudanças e das novas leis que surgem em relação ao adolescente. Por outro lado, os adolescentes conseguem perceber essa insegurança dos pais e, nessa fase que se configura como extremamente complexa para a auto afirmação da identidade, eles buscam cada vez mais caminhosque, muitas vezes, os conduzem ao universo das drogas. Nesta direção, o presente estudo busca investigar a adolescência para, em suas características intrínsecas, procurar entender o mundo da dependência química entre os jovens. Diante disso, delimitou-se como questão norteadora para esse estudo: quais os sentimentos que envolvem e conduzem o adolescente à dependência química? O presente estudo parte do pressuposto que, para os adolescentes, as drogas são algo bom, algo que pode aliviar suas tensões, algo que momentaneamente pode lhes dar prazer e relaxamento nesse período tão conturbado, mas que em longo prazo trazem muitas conseqüências, tanto sociais quanto psíquicas. A presente pesquisa objetiva-se de maneira geral em compreender as várias faces da dependência química entre os adolescentes, buscando entendimento sobre os sentimentos que envolvem as drogas para esse público em especial. De maneira específica, o estudo ainda pretende observar o fenômeno da adolescência e as suas características; investigar a dependência química entre os jovens, aprofundar os conhecimentos teóricos sobre o tema e contribuir com a 11 temática em estudo, para que se busquem soluções eficazes no tratamento da dependência. O projeto justifica-se no cerne do meio acadêmico, pois as drogas fazem parte do cotidiano da vida moderna e os adolescentes são os clientes que mais se inserem nesse meio, devido às características peculiares de busca de si e de resolução de conflitos. Portanto, nos consultórios psicológicos, a abordagem sobre a dependência química entre adolescentes estará presente, de modo que é preciso buscar subsídios teóricos e técnicos sobre o tema para poder atender essa demanda. Justifica-se ainda a relevância da pesquisa no aspecto social, pois a questão da dependência química entre os jovens é um problema que tem afetado, e com graves consequências, as questões de saúde e de segurança pública, haja vista que as drogas também abarcam um grande e milionário mercado, tendo como os adolescentes os seus principais clientes. Portanto o estudo destaca que é preciso que a família e a sociedade estejam atentas e sempre com o olhar carinhoso para o jovem, para que este consiga enfrentar as situações que envolvem a dependência química de maneira construtiva. Diante destes expostos para dar conta desses objetivos e da amplitude da temática, optou-se por uma pesquisa qualitativa de natureza bibliográfica e analítica. Tal opção ocorreu, pois desta forma esta pesquisadora teria mais liberdade de trilhar por várias áreas do conhecimento e assim conhecer, aprofundar-se e produzir mais conhecimentos empíricos sobre o tema. A seguir apresenta-se a pesquisa que está dividida em cinco capítulos e que se espera que possa contribuir para a discussão acadêmica, para os conhecimentos dos profissionais de psicologia e, por consequência, dessa pesquisadora. 12 2 ADOLESCÊNCIA A adolescência é uma fase de extremas mudanças tanto nos aspectos físicos quanto emocionais das pessoas, porque produzem alterações hormonais que irão influenciar no psicológico humano. É o corpo e a mente em transformação, configurando-se num período conturbado e difícil para quem os vivencia. A adolescência, nas sociedades ocidentais modernas, caracteriza-se exatamente como essa fase de transição entre a infância e a maturidade. É um período marcado por transformações bio-psicológicas que se iniciam com a puberdade. Conceito que remete especificamente às mudanças fisiológicas que promovem a definição das características sexuais secundárias nos meninos e nas meninas, tornando seus corpos aptos para a reprodução. Para muitos dos estudiosos do fenômeno da adolescência, esta é marcada como um tempo de crise psicossocial, de instabilidade emocional, de incertezas, buscas, escolhas e conflitos. (MELO, 2008, p. 03). Percebe-se que, ao se falar de adolescência, algumas ambivalências emergem, pois o crescimento, desenvolvimento cognitivo, físico e emocional de cada um é muito particular. Por isso, para alguns esse período começa mais cedo e para outros mais tardiamente, de acordo com o desenvolvimento de cada um. Nesse sentido, constata-se que a maioria dos teóricos descrevem ser esta uma fase intermediária entre a infância e a fase adulta, ou como etapa de desenvolvimento, desencadeada pelo surgimento das transformações orgânicas da puberdade que é encerrada através do amadurecimento psicossocial. A adolescência, portanto, é vista como uma das fases mais importantes do desenvolvimento humano, pois é neste período que muitas mudanças e transformações físicas e emocionais acontecem. (PAPALIA, OLDS & FELDMAN, 2006). A adolescência inicial (de 10 a 14 anos) é caracterizada pelas transformações corporais e as alterações psíquicas derivadas desses acontecimentos. A adolescência média (de 14 a 15 ou 17 anos) tem como seu elemento central as questões relacionadas à identidade sexual. A adolescência final (de 16 a 20 anos) tem vários elementos importantes, entre os quais estabelecimento de novos vínculos com os pais, a questão profissional, a aceitação do novo corpo e dos processos psíquicos do mundo adulto. (SOARES, 2002, p. 20). 13 Segundo Carvalho (1995), o termo adolescência é oriundo do latim e significa crescer, desenvolver, tornar-se jovem e pode ser definida a partir do critério cronológico, do desenvolvimento físico, sociológico e psicológico, ou seja, é na adolescência que acontecem as grandes mudanças. Diante disso, destaca-se que a palavra ‘adolescência’ tem sua origem etimológica no Latim “ad” (‘para’) + “olescere” (‘crescer’); portanto ‘adolescência’ significaria, strictu sensu, ‘crescer para’. Pensar na etimologia desta palavra remete à idéia de desenvolvimento, de preparação para o que está por vir, algo já estabelecido mais à frente; preparação esta para que a pessoa se enquadre neste “à frente” que está colocado. (PEREIRA & PINTO, 2003). Se seu início é definido pelas alterações fisiológicas da puberdade, o final da adolescência, em nossas sociedades, seria definido por fatores psicológicos e sociais: o jovem se tornaria capaz de assumir as responsabilidades próprias da vida adulta, de fazer escolhas, de superar as instabilidades emocionais características da adolescência. Esta não teria, assim, uma delimitação etária rígida. (MELO, 2008, p. 04). É importante salientar que as teorias sobre a adolescência geralmente são muito reducionistas, demonstrando apenas esse período como uma etapa ou um período da vida que se inicia na puberdade e termina com a maturidade, mas no campo psicológico deve ficar claro que as configurações da adolescência são bem mais amplas e observam o processo da adolescência não apenas como um período, mas sim um estado que pode variar muito de duração e de comportamentos. Parece que a duração da adolescência pode ser razoavelmente definida em termos de processos psicológicos, em face das limitações no emprego de outros elementos. Segundo esta estrutura de referência, a adolescência começa com as reações psicológicas do jovem diante de suas mudanças físicas da puberdade e se prolonga até a razoável resolução de sua identidade pessoal. Para alguns, o processo de maturação sexual pode começar na primeira década da vida e, para outros, jamais se conseguirá um firme senso de identidade pessoal. Entretanto, para a maioria das pessoas jovens, estes eventos ocorrerão principalmente entre as idades de 11 e 20 anos, que limitam a fase da adolescência. (CAMPOS, 1998, p. 125). Observa-se a coerência quanto à idade cronológica para a adolescência, pois a maioria dos teóricos aponta este período, como o início da puberdade. A adolescência duraaproximadamente dez anos, indo dos onze anos até pouco antes ou depois dos vinte anos, considerando o fato de que seu início e término não 14 podem ser claramente definidos atualmente. No entanto, considera-se que o início do adolescer se dá com a entrada na puberdade, processo que conduz a maturidade sexual ou fertilidade, ou seja, a capacidade de reprodução. (PAPALIA, OLDS & FELDMAN, 2006). Dá-se o nome de adolescência ou juventude à fase caracterizada pela aquisição de conhecimentos necessários para o ingresso do jovem no mundo do trabalho e de conhecimentos e valores para que ele constitua sua própria família. A flexibilidade do critério, que nos pode levar a categorizar alguém com vinte e cinco anos como adolescente e alguém com quinze como adulto {...}. (BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 1997, p. 294). Campos (1998) esclarece que delimitar a adolescência não é uma tarefa muito fácil, em razão dos fatores biológicos específicos, atuantes na faixa etária, se somarem as determinantes sócio - culturais, advindas do ambiente onde o fenômeno da adolescência ocorre. Ou seja, o adolescente não apenas está vulnerável aos efeitos das transformações biológicas corporais mas, também, às mudanças vividas no mundo moderno, do progresso científico, da tecnologia, das comunicações, das novas aspirações humanas e rápida evolução social, que se estabelecem em seu dia-a-dia e compõem sua construção como sujeito. São estes aspectos que determinarão grande parte deste jovem e a maneira dele se posicionar diante da vida de uma forma muito pessoal. Eles indicarão o momento em que ele estará apto ou não para adentrar no estágio de jovem adulto ou adulto. 2.1 Características da Adolescência. Esta fase do desenvolvimento é bastante caracterizada por fatores como: as chamadas crises de identidade pela transição da infância à maturidade juvenil; o início da escolha profissional; a constante busca por autonomia; pelo ingresso na vida sexual; pelos comuns conflitos familiares e de caráter emocional, as transformações orgânicas e inconstâncias hormonais, associadas a uma nova compreensão de mundo que se alia à necessidade da representação de novos papéis e responsabilidades do jovem na sociedade, como sujeito desejante e portador de conceitos próprios da realidade e, ainda, principalmente pela reconstrução e formatação da identidade. (ZAGURY, 2002). 15 As necessidades dos adolescentes não são fundamentalmente diferentes de quando eram crianças. Na verdade, eles precisam de um espaço muito mais amplo do que o mundo da família para desenvolver sua identidade. Os adolescentes deixam claro que a necessidade de terem seu próprio espaço e de serem reconhecidos como jovens adultos é primordial. Os adolescentes estão buscando novas maneiras de ser, de se comportar e de se mostrar ao mundo. Essa busca de uma nova identidade é cheia de desvios, com oscilações acentuadas que variam, desde sentimentos infantis até aos de um adulto. (ASUSUMPÇÃO, KUCZYNSKI et al, 1999). Segundo Schenker (APUD & MINAYO, 2003),"o estabelecimento de uma identidade de ego saudável representa a tarefa primordial deste período". Isso porque, Schenker descreve a adolescência como uma moratória psicossocial, uma fase durante a qual o jovem experimenta vários papéis, na esperança de descobrir uma posição adequada para si próprio na sociedade. Os compromissos adultos são adiados; a sociedade é de alguma forma, permissiva e concede ao jovem um tempo para "descobrir-se". Para Schenker (2003), a verdadeira identidade depende do apoio que o jovem recebe do senso coletivo que caracteriza os grupos sociais significativos para ele: sua classe, sua nação, sua cultura. Para constituir sua identidade de ego, o adolescente precisa separar-se das identificações parentais infantis, definindo seus próprios valores. Nesta direção, recorre-se a Tiba (2003), pontuando que as características psicossociais não são como as biológicas, que tem a época de emergir, mas vão se determinando à medida que o adolescente se depara com a resolução de conflitos. Sendo este um momento em que há o típico afastamento do jovem da família, devido ao seu engajamento em inserir-se em grupos sociais. Mudanças cognitivas levam os adolescentes ao pensamento abstrato, a refletir mais sobre “o que deveria ser”, “o que poderia ser”, do que sobre “o que é”. Refletir sobre algo e fazer conjecturas a respeito do futuro deixam de ser atitudes estranhas para eles, que se sentem cada vez mais inclinados a especular e imaginar. Na medida em que fazem suas emoções se conectarem mais intimamente a seus pensamentos. (ELIAS; TOBIAS & FRIEDLANDER, 2001, p. 65). Fenwick & Smith (1996) concordam com a idéia de que os adolescentes, à medida que amadurecem, vão se desinteressando pelas atividades 16 da família, dos programas de final de semana e querem ficar, cada vez mais, com os amigos, ressaltando que esta fase pode ser bastante conflituosa. Pois, apesar de haver pais que compreendem este processo como uma atitude que marca o fim da infância, o que de fato é real, existem aqueles que vêem isso como uma ameaça à estrutura familiar, apesar de não haver nada pessoal nesta “rejeição” e o adolescente estar simplesmente afrouxando os laços familiares, para ampliar a sua maneira de interagir com o outro. No aspecto afetivo, o adolescente vive conflitos. Deseja libertar-se do adulto, mas ainda depende dele. Deseja ser aceito pelos amigos e pelos adultos. O grupo de amigos é um importante referencial para o jovem, determinando o vocabulário, as vestimentas e outros aspectos de seu comportamento. Começa a estabelecer sua moral individual, que é referenciada à moral do grupo. Os interesses do adolescente são diversos e mutáveis, sendo que a estabilidade chega com a proximidade da idade adulta. (BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 1997, p. 106). A percepção pelos pais de que os filhos estão tentando trocar os ideais familiares por outros externos, geralmente os deixam ressentidos e resistentes a compreender os esforços do adolescente em criar uma identidade própria. Então passam a recriminar os filhos por suas novas atitudes, prejudicando, em grande parte, sua tarefa de seleção e integração das identificações parciais que constituem o processo de formação de sua identidade. (ZAGURY, 2002). Existem ainda outros pontos que podem aparecer na relação do adolescente com sua família: a dependência financeira, a dificuldade de aprendizagem, a escolha profissional, o vestibular, as companhias, os programas, os horários, o uso de cigarros, bebidas alcoólicas e drogas, entre outros. Cada pessoa, seja o adolescente ou um familiar, se posicionará de forma particular diante dessas questões (OSÓRIO, 1989). À medida que os adolescentes começam a separar-se de suas famílias e passar mais tempo com os colegas, eles têm menos tempo e menos necessidade da gratificação emocional que costumam obter dos laços com os familiares. O que normalmente é chamado de separação dos pais é um momento descrito por Freud antes como precursor à latência, ou seja, anterior mesmo à puberdade, e que implica a incorporação dos pais. Essa incorporação se dá através de uma identificação com os pais que, assim internalizados, passam a integrar o super eu, herdeiro do complexo de Édipo. A dificuldade da adolescência dependeria então da própria ferocidade desse super eu, que, quanto mais terrível, tanto maiores as dificuldades do sujeito, maiores os conflitos que teria, sobretudo no que diz respeito ao campo de sua 17 sexualidade, ao campo do desejo que, de uma forma ou outra, sempre é sexual. (ALBERTI, 1995, p. 34). Diante do exposto, as questões referentes à sexualidade na adolescência são significativamente importantes e vão desde asvivências que estes têm sobre a sexualidade até mesmo a concepções históricas e do meio em que vivem. Neste contexto destaca-se que o jovem, dependendo da formação que tem, precisa de muitas informações para sua segurança como: gravidez, contracepção, doenças sexualmente transmissíveis, aborto e complicações na gravidez. Para os adolescentes, a sexualidade pode trazer também conflitos psicológicos como a identidade de gênero, na qual o jovem se percebe sexualmente e se ele não estiver inserido dentro de um padrão culturalmente aceito pela maioria, com certeza encontrará problemas de ordem íntima em aceitar sua orientação sexual, quanto assumi-la diante da sociedade. Isso, por consequência, trará grandes conflitos emocionais. Nesta direção, Connell (1997) pontua que a ordenação de gênero tem como referência o que o autor chama de arena reprodutiva, na qual inclui os desejos sexuais, os atos sexuais e suas conseqüências, e as diferenças sexuais do corpo humano. O conceito de arena reprodutiva, segundo o autor, permite referir-se o que os corpos fazem enquanto práticas sociais não determinadas pela base biológica, mas por um processo histórico. As relações de gênero, dentro desta ótica, se definem como relações entre pessoas e grupos, organizadas através dessa arena reprodutiva e se constituem como uma das principais estruturas de nossas sociedades. Connell (1997) ressalta que masculinidade e feminilidade são configurações da prática de gênero, e demonstra interesse nas formas como se processam essas configurações, no sentido de compreender masculinidades e feminilidades como projetos de gênero. Sexualidade é menos um produto do impulso biológico e mais um produto dos significados vinculados a esses desejos ou impulsos, e que variam no interior da mesma cultura. Seres sexuais e reprodutivos são construídos socialmente, sendo o gênero a principal dimensão dessa construção e os significados atribuídos ao sexo e à reprodução – muitas vezes com força de crença – diferentes para homens e mulheres. (GARCIA, 2008, p. 410). Por conseguinte, pode-se inferir que a vivência da sexualidade na adolescência interfere com a qualidade de vida desses sujeitos, porque a qualidade 18 de vida depende também do que acontece entre as experiências passadas e as expectativas e circunstâncias atuais, variando o tempo, o lugar e a experiência. Dessa forma, constata-se que o adolescente tem a necessidade de vivenciar sua sexualidade, para que assim seu desenvolvimento em todos os sentidos possa ir se potencializando, para direcioná-lo a maturidade. Destaca-se que, para Zagury (2002), é na adolescência que os indivíduos costumam apresentar padrões imaturos de pensamento, característicos da idade como: identificar defeitos nas figuras de autoridade, tender a discutir, indecisão, vulnerabilidade e, aparentemente, hipocrisia. Nesta fase, o adolescente busca se conhecer; adota valores e começa a ter responsabilidades. Começa a desenvolver suas potencialidades unindo forças com os amigos que, como eles, buscam independência. Carvalho & Guimarães (2003) evidenciam que, neste período de maturação psicológica, biológica e social, se estabelece a aquisição de novas capacidades cognitivas e responsabilidades. Sendo que a inserção do jovem em novos papéis sociais torna-se mais evidente, assim como as exigências e expectativas de familiares, amigos e da própria comunidade sobre o adolescente, que instigam seu desenvolvimento gradual de autonomia, para que este venha a se apropriar da fase adulta sem restrições. Nesse sentido, o jovem faz escolhas e, de acordo com Bock, Furtado & Teixeira (2002, p. 85). Escolher significa ter que se posicionar entre as possibilidades colocadas que são igualmente atrativas e contém também desvantagens. São possibilidades que brigam entre si. Por isso se diz que qualquer escolha implica conflito, ou melhor, escolher significa resolver conflitos. Qualquer escolha implica em riscos. Por conseguinte, dependendo das escolhas que o adolescente fazer, elas serão muito significativas para sua vida, de modo que é preciso aos pais, professores e sociedade enfim observarem com cuidado e auxiliá-los quando necessário, para que estes não tomem decisões precipitadas. Embora tenhamos de tomar muitas decisões durante a vida, grande parte delas não implicam grandes dificuldades porque são realizadas rotineiramente. Com outras, acontece exatamente o contrário. É o caso da opção profissional. Ela é muito importante porque irá afetar, praticamente, 19 toda a existência do indivíduo. (BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 2002, p. 25). Consequentemente inicia-se nesta fase uma ruptura. O adolescente torna-se mais independente, o que proporciona um misto de tristeza e alegria. Descobre-se diante do seu futuro, mas experiência também a alegria responsável de traçar o seu próprio caminho. Portanto, a adolescência constitui-se como processo de desenvolvimento de potencialidades pautado por movimentos e relações complexas e, muitas vezes, paradoxais e ambivalentes, geradoras de obstáculos e angústias, mas também de oportunidades únicas de crescimento e enriquecimento pessoal e social. Esta fase de desenvolvimento influi significativamente e caracteriza um dos momentos fulcrais do ciclo vital da família, dado que novas tarefas e funções lhe são exigidas. Assim, perante o “desconhecido”, adolescentes confrontam-se com o novo que esta por vir, quase sempre interpretando e compreendendo a realidade numa lógica patológica de conflito e desequilíbrio, pelo que se impõe uma reflexão acerca das características de reconstrução e de criação que constituem este momento específico que, atualmente, se estende até cada vez mais tarde, implicando redes de relação cada vez mais complexas e abrangentes. Nessa direção, a ajuda e o olhar de um adulto, como o profissional psicólogo, podem contribuir muito para a atenuação dos conflitos oriundos nessa fase tão difícil para os jovens e para os pais, entretanto conforme demonstrado aqui, etapa extremamente importante para o desenvolvimento do ser humano. 20 3 DROGAS NA ADOLESCÊNCIA Conforme o capitulo anterior, a adolescência é um período complexo cheio de intensas transformações e descobertas. Neste sentido emerge, nesta fase, uma gama de opções para os jovens que estão descobrindo o mundo, dentre estas destaca-se as drogas. A droga aparece na adolescência muitas vezes como uma ponte que permite o estabelecimento de laços sociais, propiciando ao indivíduo o pertencimento a um determinado grupo de iguais, ao tempo que buscam novos ideais e novos vínculos, diferentes do seu grupo familiar de origem. (FILHO & TORRES, 2002, p. 31). A adolescência os jovens buscam uma identificação com o grupo, eles buscam no grupo autoafirmação enquanto sujeitos e com isso, se no grupo a questão das drogas estiver presente, este jovem com certeza também tenderá a utilização da mesma como o seu grupo. Para um adolescente, o seu grupo de pares é o lugar onde, através de comportamentos padronizados, busca certa segurança e um aumento de sua auto-estima. O espírito de grupo lhe dá a gratificante sensação de ser alguém. Alguém até certo ponto importante, porque acentua a diferença do tratamento recebido pelo grupo familiar. É um espaço protegido em que os aspectos geradores de angústia são atuados e respeitados pelos companheiros, pois todos vivem os mesmos conflitos. (FREITAS, 2002, p. 38). Entretanto, deve-se destacar que cada adolescente é único e que a questão das drogas é mais complexa do que parece, pois a relação com as drogas vai depender da individualidade de cada um. A intensidade das amizadesé maior na adolescência do que em qualquer outra época da vida. Os adolescentes tendem a escolher amigos que sejam como eles, e os amigos influenciam uns aos outros para se tornarem ainda mais parecidos. (PAPALIA & OLDS, FELDMAN, 2006, p. 361). Por outro lado, destacam-se também as questões sociais e econômicas em que o jovem está inserido, pois se vive em uma sociedade consumista e o comércio da droga tem sido um dos grandes negócios do momento, o que para 21 jovens com menos poder aquisitivo, às vezes se torna uma fonte fácil de renda. Isso porque o jovem tem muitos impulsos consumistas e, dependendo da sua situação financeira, vai buscar meios de conseguir dinheiro. O uso de drogas na adolescência como uma crise em que os jovens se defrontam com o meio social em que vivem e sua história individual. Dessa maneira os jovens acreditam estar dando provas de sua autonomia e auto- suficiência, sendo eles capazes de alcançar seus objetivos, muitas vezes não tão claros. Neste contexto, o uso de drogas emerge como um protesto a sua impotência de lidar com a realidade e com as forças que se movimentam dentro de si próprio, ao mesmo tempo. (GRYNBERG & KALINA, 2002, p. 46). O aspecto familiar também merece destaque. O jovem precisa encontrar um ambiente familiar capaz de suportar as crises que vivencia, onde este não seja propício a resistências excessivas às suas proporções e impulsos ainda tão desordenados. De outra maneira, o jovem buscará outras formas de compensação para sua frustração e, nesta procura, as drogas podem ser o primeiro caminho encontrado. Existem ainda outros fatores. Para Tiba (2003), atualmente a droga é usada: por simplesmente curiosidade; como aventura sem compromisso, devido a banalização de seu uso; na busca do prazer, sem se importar com os riscos; por falhas na educação; por baixa auto-estima, que faz absorver comportamentos indesejáveis dos seus conviventes. Nesse sentido, a curiosidade escapa ao controle e a vontade dos pais. Dependem exclusivamente do adolescente. Entretanto, nos outros fatores os pais podem interferir, adotando atitudes que mudem o rumo da história. Por conseguinte, percebe-se que a família é algo extremamente relevante nesse período e na orientação do adolescente, pois muitas famílias cultivam um tipo de comportamento irresponsável, como se o dever de monitorar e supervisionar o comportamento dos adolescentes fosse algo mecânico, robótico, sem a necessidade de construção prévia da relação de confiança. Quanto mais a família é "desengajada" nas suas relações interpessoais, maior risco os filhos correm de desenvolver comportamentos anti-sociais. (MINUCHIN, 1974 apud SCHENKER & MINAYO, 2003). Portanto, é necessário que a família se faça presente e limite o jovem em suas atitudes, funcionando como um filtro, pois ao estabelecer limites, os pais 22 estarão passando valores e as experiências de vida, para que os filhos assimilem noções de perigo, para que saibam valorizar as cosias e as pessoas e, principalmente, para que tenham noção do que é certo e do que é errado. Outro fator importante é a utilização da mídia que propaga a utilização de drogas lícitas como álcool e cigarros, muitas vezes veiculados a idéia de prazer, dinheiro e sexualidade, o que seduz o jovem e pode influenciá-lo a certos comportamentos que podem desencadear em uma dependência química. Como se pode observar de acordo com os autores aqui apresentados, várias multifaces podem conduzir o adolescente as drogas. O desafio da transgressão às normas estabelecidas pelo mundo dos adultos, a curiosidade pelo novo e pelo proibido, a pressão de seu grupo para determinados comportamentos, são alguns dos fenômenos típicos da adolescência que podem levar à primeira experiência com as drogas lícitas e/ou ilícitas. (CALDEIRA, 1999, p. 15). Neste contexto, deve-se ressaltar ainda que os adolescentes usam drogas porque é bom para eles, a droga lhes traz prazer, sensações de bem estar, lhes permite o mundo do sonho, da fuga, da contemplação meditativa; é claro que isso é apenas momentâneo e ilusório, mas o adolescente não consegue perceber isso, para ele a droga funciona como um remédio que alivia suas angústias. Por parte dos adolescentes, a ilusão de que as drogas os “libertam”, quando na verdade os “submetem” ou “escravizam”, para escapar ao jugo dos pais ou dos “valores burgueses da sociedade de consumo”, como apregoam, deixam-se dominar pelos tóxicos. (OSÓRIO, 1989, p. 44). Portanto, o adolescente só experimenta a droga quando já tem uma opinião favorável ao seu uso. Antes de usar, ele observa quem usa. O grupo de usuário se isola em festas, escolas, bares e é assediado por quem deseja experimentar. De acordo com Paula e Pires (2002), de forma geral são inúmeros os fatores que influenciam no uso de drogas, que podem ser de ordem cultural, econômica ou social. Entre os motivos apresentados por dependentes, familiares e profissionais da área de prevenção e tratamento das dependências químicas, destacam-se os seguintes: 1) Pressão do grupo; 2) Curiosidade; 3) Transgressão e Protesto; 4) Fuga; 5) Individualidade e pressão social; 6) Gratificação e a busca do prazer. 23 Pressão do grupo: há grupos na sociedade que fazem uso de drogas e os adolescentes que pretendem fazer parte destes “grupos” estão sujeitos ao uso também. Os grupos podem significar um estimulo para o uso de substâncias, porque para fazer parte deste grupo, na maioria das vezes, se faz necessário acompanhar os costumes de todo o grupo, incluindo o uso de drogas. A dependência não decorre necessariamente e exclusivamente da pressão do grupo. Porém, para muitos adolescentes, a participação em grupos de usuários marca o início do uso contínuo de drogas. (PAULA & PIRES, 2002). A influência dos amigos ou pares, conforme cita as autoras Papalia, Olds e Feldman (2006), estariam balanceadas pelo papel que os pais cumprem no desenvolvimento dos filhos. Já que é justamente nesta época que os adolescentes se voltam intensamente para os amigos de mesma faixa etária, em busca de apoio, orientação, auto-estima e identidade. Neste período, os adolescentes passam muito tempo na companhia uns dos outros, valorizando as diferentes opiniões e, de forma geral, acabam convergindo para o padrão que o seu grupo assume. Curiosidade: patrimônio de toda humanidade, a curiosidade é a motivação mais freqüente para justificar o uso de drogas. A curiosidade induz ao uso experimental das drogas, porque depois de um tempo de uso nada mais é novidade. Mas, segundo Paula e Pires (2002), o desejo de repetir o uso em quantidades maiores não é um sintoma da curiosidade e sim de outros fatores como: busca de prazer ou fuga de situações não agradáveis. Como o proibido parece ser mais gostoso, a iminência de praticar um ato ilegal aumenta o prazer, a emoção. Sendo assim, o primeiro encontro acaba sendo uma aventura sedutora, surgindo a curiosidade de experimentar mais. Repetir essa experiência corresponde o uso com a finalidade de voltar a sentir o que já sentiu. Quanto maior o prazer da primeira vez, tanto maior será a vontade de tornar a senti- lo. (PAULA & PIRES, 2002). Como forma de protestar: os adolescentes muitas vezes não entendem seus próprios conflitos e seus sonhos são grandes, ultrapassando expectativas e capacidades atuais. Estes adolescentes na maioria das vezes, são contestados pelos adultos, gerando atritos, comprometendo o diálogo entre os adolescentes e adultos. Como forma de suprir a falta de diálogo, os adolescentes procuram e encontram refúgio em grupos iguais (amigos). Segundo Paula e Pires (2002), o 24 desejo de aumentar as novas experiências, as sensações e as impressões podem contribuir para a iniciação nasdrogas ou ser a porta de entrada para a dependência. Como fuga dos problemas: quando as pessoas se encontram em momentos difíceis, o uso de drogas pode parecer uma forma de fuga desses estados psicológicos ou sociais indesejados. A fuga através das drogas não resolve nada, só adia ou, na maioria das vezes, aumenta os problemas já existentes. Geralmente, esta forma é usada por adolescentes que querem ou buscam esquecer problemas, frustrações, insatisfações, fugir do tédio, da timidez e da insegurança para enfrentar a realidade. ( PAULA & PIRES, 2002). Segundo Tiba (2003), o adolescente saindo do banho de hormônios, parte em busca da identidade social. Na infância, o filho adquire o sobrenome; na puberdade, a identidade sexual; na adolescência, o próprio nome e busca ligar-se às pessoas com quem se sente bem. Acaba se incorporando a uma turma, sua nova família. A adolescência é como segundo parto: o nascimento da família para entrar na sociedade. Longe dos pais, o adolescente tem a liberdade de pôr em prática tudo que tem vontade. Na sociedade, existem coisas boas e ruins. Umas das piores é a droga. Se o adolescente foi educado com os erros de amor, tem maior risco de usá- las. Diante destes expostos, fica evidente que a condução das drogas na adolescência realmente possui muitas faces e cada caso é um caso com suas configurações próprias. Diante disso, ressalta Gikovate (1992) quando pontua que, cada ser humano tem uma história diferente, não existe uma fórmula que explique como, porque ou com que consequências um jovem procura as drogas. A seguir apresentam-se algumas noções sobre dependência química e tipos de drogas, e seus efeitos para que assim compreendam-se melhor as faces da dependência química na adolescência. 3.1 Dependência Química A dependência química configura-se a necessidade química de alguma substância, sendo que esta é necessária às necessidades físicas e, por conseguinte, emocionais do adolescente. 25 A dependência química pode ser vista como uma desordem do comportamento de abuso e uma aprendizagem envolvendo aspectos do meio ambiente. Neste modelo, o usuário de álcool, tabaco e outras drogas, não é visto como irresponsável ou mau-caráter e nem como vítima de uma doença, mas como alguém que apresenta um comportamento mal adaptado. O dependente precisa aprender estratégias para enfrentar sua rotina de vida sem precisar usar as substâncias psicoativas. (LESSA, 2007, p. 01). Nessa direção, observa-se que a dependência deve ser vista como uma desordem, algo aprendido e que, portanto, pode ser superado. Por conseguinte, a dependência química, como no caso de outras doenças crônicas, demanda episódios de tratamento e mesmo que, por vezes, ocorra a recaída, esta deve ser vista não como um fracasso, mas como uma possibilidade de aprender e faz parte do processo de enfrentamento e administração do problema de saúde. Segundo Schenker & Minayo (2003) definem como dependentes os comportamentos dos drogaditos, pois eles são movidos pelo desejo poderoso, compulsivo de utilizar uma substância psicoativa, que invade, progressivamente, toda sua existência. Consideram a dependência uma patologia que tende a se tornar crônica, porque o adicto é ambivalente com relação à abstinência, nega a importância de sua dependência, recusa-se admitir a gravidade da situação ao evitar suas angústias com o uso crescente das drogas, recorrendo tardiamente a cuidados especializados. O uso de substâncias psicoativas afeta, diretamente, a cognição, capacidade de julgamento, humor e as relações interpessoais, áreas que, frequentemente, já são problemáticas no período da adolescência. O prejuízo na capacidade de processar novas informações associado às alterações na capacidade de concentração e retenção causadas pelo uso dessas substâncias podem prejudicar o desempenho escolar e o rendimento final de muitos adolescentes que fazem uso dessas substâncias (ZAGURY, 2002). A adolescência, passagem da infância para vida adulta, é um período crítico na formação da identidade e desenvolvimento da personalidade. O uso regular e eventual de dependência nessa fase pode resultar em inconsistências ou deficiências de personalidade futura. O uso de drogas na adolescência também afeta o desenvolvimento de funções sociais e o estabelecimento de relações interpessoais. Os adolescentes dependentes de drogas são freqüentemente afastados dos outros adolescentes da 26 mesma faixa etária, assim como das normas existentes nas atividades rotineiras da adolescência. (ASSUMPÇÃO JUNIOR, 1999). Essas atividades que são preparatórias para vida adulta, incluem namorar, formar laços fortes de amizades, e participar de grupos e atividades que requerem o desenvolvimento de algumas habilidades sociais, como cooperação e interdependência. Os relacionamentos estabelecidos pelos adolescentes dependentes são, muitas vezes, baseados no consumo de drogas. (ASSUMPÇÃO JUNIOR, 1998). Tabela 1- Critérios para o diagnóstico de dependência de substâncias psicoativas, segundo DSM-IV Um padrão mal-adaptativo de uso de substância, levando o prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por três (ou mais) dos seguintes critérios, ocorrendo a qualquer momento no mesmo período de 12 meses: 1.Tolerância caracterizada por uma das seguintes situações: a) Necessidade de aumentar a quantidade de substância usada para obter o mesmo efeito; b) Diminuição do efeito como uso contínuo da mesma quantidade de substância. 2. Abstinência, manifestada por qualquer dos seguintes aspectos: a) Síndrome de abstinência caracterizada para a substância; b) Substância (ou uma substância estreitamente relacionada) é utilizada para aliviar ou evitar sintomas de abstinência. 3. A substância é usada frequentemente em quantidades maiores ou períodos maiores do que o indivíduo deseja. 4. Desejo persistente ou tentativas malsucedidas para diminuir ou controlar o uso. 5. O indivíduo depende grande parte do tempo em atividades para obter a substância, usa-la ou recuperar-se de seus efeitos. 6. Atividades sociais, profissionais ou recreativas anteriormente importantes são abandonadas ou reduzidas devido ao uso de drogas. 7. O uso da substância é mantido apesar de problemas físicos e psicológicos recorrentes, sabidamente causados ou exacerbados pela droga. Especificar: Com dependência física: evidência de tolerância ou abstinência (item 1 ou 2). Sem dependência física: sem evidência de tolerância ou abstinência (ausência dos itens 1 e 2). Especificar a evolução: Remissão precoce parcial: por pelo menos 1 mês e menos de 12 meses, um ou mais critérios para o diagnostico de dependência ou abuso estiveram presentes. Remissão precoce total: por pelo menos 1 mês e menos de 12 meses, nenhum critério diagnóstico de dependência ou abuso esteve presente. Fonte: DSM IV, 1994. Segundo Assumpção Junior, (1998) os adolescentes que chegam aos centros de tratamento diferem dos adultos quanto ao tempo e intensidade do uso de drogas, assim como quanto aos tipos de prejuízos causados pelo consumo. Muitas das diferenças encontradas entre essas duas populações estão relacionadas com a idade desses dependentes químicos. Os adolescentes começam o consumo de 27 substâncias psicoativas mais precocemente que os adultos, mas iniciam o tratamento com menor tempo de uso. Dessa forma, os adolescentes teriam menos tempo para apresentar deterioração de suas funções sociais, assim como para apresentar problemas físicos e psicológicos significativos conseqüentes do abuso de substâncias. Segundo DSM-IV (1994), os critérios para o diagnóstico de dependência incluem, além da constatação não-obrigatória de sintomas de tolerância e abstinência, a perda de controle sobreo uso e a manutenção deste, apesar dos prejuízos em diferentes áreas (psicológicos, sociais e físicos) causados pelo consumo de substâncias. No momento, há tendência maior para aumentar a relevância das alterações sociocomportamentais, em detrimento da importância da presença de sintomas físicos para o diagnóstico de dependência. (LESSA, 2007). A dependência pode ser vista como uma desordem do comportamento de abuso e uma aprendizagem envolvendo aspectos do meio ambiente. A dependência química ainda está revestida de uma forte conotação moral e carrega um estigma que causa vergonha, medo, preconceito e rejeição por parte da população em geral e até de profissionais da saúde. Segundo Lessa (2007), o usuário de álcool, tabaco e outras drogas, não é visto como irresponsável ou mau-caráter e nem como vítima de uma doença, mas como alguém que apresenta um comportamento mal adaptado. O dependente precisa aprender estratégias para enfrentar sua rotina de vida sem precisar usar as suas substâncias psicoativas. Em alguns organismos, a droga vai modificar uma ou mais funções, levando o indivíduo a modificar o seu comportamento, como exemplos: faltar à escola, se tornar agressivo, não cumprir com suas obrigações, buscar cada vez mais a droga, etc. A droga exerce uma atração, ela chega proporcionando prazer dependendo das estruturas físicas, psíquicas e biológicas de cada um. (ARATANGY, 1998). São vários os fatores que levam o indivíduo em direção à droga. O ser humano sempre buscou experiências novas e cada vez mais busca contato com o diferente atrás de novas descobertas, enfrentando o desafio do desconhecido. Sintetizando, evoca-se Amar (1998), apontando alguns fatores que levam o indivíduo a usar drogas são: a necessidade de fugir de problemas, estimular, 28 acalmar, ficar acordado ou dormindo, busca de prazer, inspiração para ficar mais forte, mais disposto, mais relaxado, evitar o desprazer, aliviar dores, tensões, angústias, depressão, fatores externos como: pressão de outras pessoas ou grupo, indução ao consumo por propaganda, sentimento de abandono e isolamento, modismo cultural, adolescentes que vivenciam o luto e a desinformação, entre outros. 3.2 Tipos de Drogas Segundo Zagury (2002), para se falar em drogas e dependência química é preciso considerar o tipo de droga, a forma de administração, a dosagem e as motivações de uso. As drogas dividem-se em duas categorias, as drogas lícitas que são vendidas legalmente sejam elas controladas ou não como: álcool; cola de sapateiro; moderadores de apetite, entre outras; e as drogas ilícitas que são as comercializadas ilegalmente como: a cocaína, maconha, crack, LSD, entre outras. (LOPES, 1996). De acordo com o COMAD1 (2005), as drogas podem, ainda, ser classificadas quanto aos mecanismos de ação e origem. Quanto aos mecanismos de ação, as drogas psicotrópicas ou psicoativas atuam sobre o cérebro, alterando o estado emocional, sensações e consciência. Elas podem ou não causar dependência e são classificadas em três grandes grupos: depressoras, estimulantes e alucinógenas. Conforme Zagury (2002), as drogas depressoras diminuem ou deprimem a atividade cerebral, levando ao relaxamento, à sedação, à calma e consequentemente, ao desligamento dos problemas, reduzindo a ansiedade. As pessoas que as utilizam sentem-se mais tranquilas em relação aos seus problemas. Podem provocar também uma desinibição, isto é, o indivíduo sente-se com coragem ou à vontade para falar o que sente e o que o incomoda. (ZAGURY, 2002, p. 101). Dentre as drogas depressoras encontram-se as bebidas alcoólicas; os barbitúricos (remédios anticonvulsivantes, soníferos, hipnóticos e analgésicos); os calmantes (tranqüilizantes ansiolíticos e sedativos); a cadeína (componente de 1 Conselho Mundial Antidrogas. 29 certos xaropes) e inalantes (cola de sapateiro, cheirinho-de-loló, éter, esmalte, gasolina, verniz, clorofórmico). As drogas estimulantes já têm outra reação, elas oferecem ao usuário uma sensação de dinamismo, potência, força, rendimento maior no trabalho, coragem. Sendo elas, a cafeína (causa dependência psíquica); a nicotina (leva à dependência física e psíquica); a cocaína (dependência física e psíquica) e as anfetaminas (dependência física e psíquica). A cafeína e a nicotina são drogas perfeitamente toleráveis na sociedade, no entanto, ambas promovem danos à saúde, principalmente a nicotina. A cocaína é a droga atualmente mais utilizada pelas classes altas. Seu uso leva à dependência psíquica, ao isolamento, à insônia, medos irreais e à sensação de perseguição. Outra mais letal e perigosa é o crack (pasta da coca), ambas tem grave perigo da superdosagem e induzem rapidamente ao vício. As anfetaminas são utilizadas por estudantes para melhorar a concentração ou para ficarem acordados por mais tempo quando têm que estudar, provocam sensação de força e disposição. O uso prolongado, no entanto, leva à dependência, irritabilidade, insônia, agressividade e até à morte. (ZAGURY, 2002, p. 102). As drogas alucinógenas provocam distorção na percepção das cores e das formas, porque o cérebro funciona desordenadamente, alterando as mensagens nervosas, dentre elas as mais conhecidas são: a maconha e o LSD (ácido lisérgico), ambas provocam dependência. (ZAGURY, 2002) A maconha provoca deformações na percepção de espaço e tempo e leva à introspecção. Em caso de uso prolongado, pode levar à desmotivação para o estudo e até aos relacionamentos afetivos. Em altas doses, pode provocar alucinações, dependência psíquica e desinteresse crescente pelas atividades do dia- a-dia, podendo ainda afetar a memória. O LSD provoca efeitos psicodélicos fortes, alucinações e, mesmo em quantidades mínimas, pode provocar confusão mental. As alucinações nem sempre são agradáveis, podendo transformar-se em terríveis pesadelos (viagens “boas” e “más”). Tabela 2 - Classificação dos tipos de drogas. DEPRESSORAS Ação quanto a legalidade Funcionam como inibidores do SNC, diminuindo a atividade cerebral. Lícitas tipo A heroína e os solventes inalantes (cola de sapateiro, éter, esmalte).Álcool, os barbitúricos (sedativos), os ansiolíticos (tranquilizantes), a morfina, a heroína e os solventes inalantes (cola de sapateiro, éter, esmalte). a heroína e os solventes inalantes (cola de sapateiro, éter, esmalte). 30 Efeito Deprimem a atividade cerebral, levando o usuário ao relaxamento, sedação. Pode,ainda, provocar a desinibição, proporcionando coragem e desprendimento nas relações interpessoais. Dependência Causam dependência física e psíquica (ZAGURY, 2002). ESTIMULANTES Ação quanto a legalidade Agem, geralmente, aumentando a atividade mental. lícitas: nicotina, cafeína, anfetaminas. Ilícitas: cocaína. Tipo Nicotina(Tabaco), afentaminas, cocaína e cafeína. Efeito Causam sensação de dinamismo, potência, força,maior rendimento no trabalho. Dependência Física e psíquica. ALUCINÓGENEAS Ação quanto a legalidade Alteram no funcionamento mental, de modo a ocasionar estados psíquicos. Complexos de perturbação (delírios e alucinações). Ilícitas: Ecstasy, maconha, LSD e alguns cogumelos. Tipo Provocam distorções na percepção, devido ao funcionamento desordenado do cérebro, alterando assim as mensagens nervosas. (ZAGURY, 2002). Efeito Psíquicas. Fonte: PAULA; PIRES, 2002; ZAGURY, 2002. Quanto à origem, elas podem ser naturais, semi-sintéticas e sintéticas. As naturais são encontradas disponíveis na natureza, obtidas a partir de plantas. Essas podem ser usadas diretamente como droga ou extraída e purificada. Entre as drogas naturais encontramos a maconha e algunschás (cogumelo e a trombeteira). (ZAGURY, 2002) As sintéticas são drogas obtidas a partir de síntese química. São produzidas inteiramente em laboratórios, não necessitando de substâncias vegetais ou animais como matéria-prima. Temos como exemplo de drogas sintéticas o ecstasy e o LSD. (ZAGURY, 2002) As semi-sintéticas são as drogas que após serem extraídas passam por um processo químico com a finalidade de se adequarem ao consumo. Entre elas encontramos o cigarro, álcool e a cocaína. As conseqüências do uso de drogas podem ser manifestadas de forma individual, por meio de danos físicos, psíquicos e sociais, através das recuperações familiares e sociais. Dentre as substâncias psicoativas, destaca-se: 31 Tabela 3 - Substâncias psicoativas. DROGA CONCEITO ALCOOL É um líquido volátil, sem cor e sem odor e sabor característico. É produzido pela fermentação do caldo de cana e de cereais e raízes ( Paula, 2002). É uma droga depressora do SNC levando a comportamentos que vão de euforia à tristeza profunda. TABACO O tabaco é uma planta da qual é extraída uma substância chamada nicotina que é seu principio ativo. Na sociedade essa substância é vinculada ao cigarro no qual, ainda se encontram um número muito grande de outras substâncias, algumas muito tóxicas, como por exemplo, terebentina, formol, amônia, naftalina, entre outras. No corpo, o tabaco produz um pequeno aumento nos batimentos cardíacos, na pressão arterial, na freqüência respiratória e na atividade motora. No sistema digestivo diminui as contrações do estômago, dificultando a digestão. É irritante para os brônquios (pulmões) e provoca insônia (tira o sono). Na mente, após uma tragada, a nicotina é absorvida pelos pulmões chegando ao cérebro geralmente em 9 segundos. Quando em jejum e se a tragada for grande, a pessoa pode ficar ligeiramente tonta. Outros efeitos são: leve estimulação do cérebro e diminuição do apetite. Não há, na realidade nenhum efeito mais intenso ou importante. MACONHA Os efeitos físicos mais freqüentes são avermelhamento dos olhos, ressecamento da boca e taquicardia (elevação dos batimentos cardíacos, que sobem de 60 - 80 para 120 - 140 batidas por minuto). Com o uso contínuo, alguns órgãos, como o pulmão, passam a ser afetados. Devido à contínua exposição com a fumaça tóxica da droga, o sistema respiratório do usuário começa a apresentar problemas como bronquite e perda da capacidade respiratória. Os efeitos psíquicos são os mais variados, a sua manifestação depende do organismo e das características da erva consumida. As sensações mais comuns são bem-estar inicial, relaxamento, calma e vontade de rir. Pode-se sentir angústia, desespero, pânico e letargia. Ocorre ainda uma perda da noção do tempo e espaço além de um prejuízo na memória e latente falta de atenção. COCAÍNA A cocaína é uma droga psicoativa que estimula e vicia, promovendo e alterando processos cerebrais muito importantes. É extraída da folha da coca e se consumida por muito tempo ocasiona muitos problemas de saúde, como por exemplo: a aceleração do envelhecimento e danos cerebrais. Devido os efeitos de euforia e prazer que a cocaína proporciona, as pessoas são seduzidas a utilizá-la para vivenciar sensações de poder. Entretanto esses efeitos duram pouco tempo, onde a pessoa entra em contato com a realidade e experimenta depressão e ansiedade por utilizá-la novamente. SOLVENTE Solventes ou inalantes são substâncias capazes de dissolver coisas. É uma substância altamente volátil, isto é, que se evapora facilmente, daí é que pode ser inalada (introduzida no organismo através da aspiração, pelo nariz ou boca). Na mente, após a inalação de um solvente, a pessoa sente inicialmente uma estimulação que é seguida por uma depressão, sendo este efeito o mais importante. Mas pode também ter sensações estranhas, chegando até a alucinações. No corpo, a inalação crônica pode levar à morte de neurônios (células do cérebro), causando lesões irreversíveis. Além disso, a pessoa que usa cronicamente solventes fica apática, com dificuldades de concentração e déficit de memória. Fonte: PAULA; PIRES, 2002; ZAGURY, 2002. 32 Diante desses dados, observa-se o que a droga pode trazer alterações físicas e mentais aos adolescentes, de modo que fica evidente ser necessário muito cuidado no atendimento a esse cliente, haja vista que determinadas substâncias ou drogas tem um alto poder de alterar o psicológico de um adolescente, trazendo sérios danos a sua saúde psíquica e física, e também muitos problemas sociais. Deste modo, é preciso que a sociedade comece a buscar alternativas que conduzam os jovens para práticas mais saudáveis de superação no período da adolescência. 33 4 OS SENTIMENTOS ENVOLVIDOS NA ADOLESCÊNCIA QUE CONDUZEM AO USO DE DROGAS De acordo com as características presentes na adolescência, novamente pontua-se que a mesma é uma fase que, devido às transformações biológicas e psicológicas, os conflitos são mais suscetíveis, dando vazão às curiosidades, os questionamentos, à vontade de conhecer, de experimentar o novo. Mesmo sabendo dos riscos, é uma fase onde todos estão à procura de sua própria identidade. Segundo Steinberg (1996 apud RIBEIRO, PERGHER & TOROSSIAN, 1998), a adolescência é um período de crescimento no qual o indivíduo precisa realizar diversas tarefas para efetuar a passagem da infância à vida adulta. Essas tarefas estão relacionadas a algumas mudanças e características deste período. A principal tarefa da adolescência é a busca pela identidade sexual, social e psíquica. A adolescência se caracteriza como um período complexo no qual as drogas podem ser usadas, entre outras coisas, como um artifício para catalisar a resolução dessas tarefas. Abadi (1991 apud RIBEIRO, PERGHER & TOROSSIAN, 1998) afirma que o uso de drogas pode ser visto como uma forma pela qual o adolescente poderá tentar rebelar-se contra a autoridade representada pela família, pelas leis e pela sociedade. Além disso, as drogas representam para o adolescente uma forma de socialização, que lhe permite integrar-se a um grupo e não ser excluído dele. É o momento em que o adolescente procura a sua identidade, não mais se baseando apenas nas orientações dos pais, mas também nas relações que constrói com o grupo social no qual está inserido, principalmente o grupo de amigos. A identidade social e psíquica se constitui através dos conflitos entre a necessidade de independência dos pais, por um lado, e a aproximação e dependência do grupo de amigos, por outro. Pais e amigos têm uma grande importância para a formação de um código de valores próprios do adolescente. Esse será constituído a partir da interação social e da escolha de elementos adquiridos na infância, tornando-se parte de sua identidade adulta. (STEINBERG 1996, apud RIBEIRO, PERGHER & TOROSSIAN, 1998, p. 2). 34 É na adolescência também que se registra uma grande preocupação em relação ao uso de drogas, pois é nessa fase que se encontram mais vulneráveis, sendo este momento da vida um terreno fértil à experimentação, o que poderá, ou não, levar ao início do abuso ou da dependência. Para Zagury (2002) as características pessoais tem forte influência na forma pela qual um acontecimento qualquer ocorrido na vida irá repercutir no comportamento do indivíduo. Um fato simples para um pode ser percebido de maneira totalmente diferente pelo outro. Esse jeito individual de ser de cada filho é percebido muito cedo pela maioria dos pais. Cada filho é diferente um do outro e cada um reage de forma diferente diante dos problemas, principalmente em relação às drogas.Nessa direção, é preciso que os pais estejam atentos às mudanças comportamentais dos filhos para quando perceberem algo errado poderem intervir, pois uma vez no caminho da dependência, mais complicado se torna para fazer o caminho de volta. Por conseguinte, a prevalência do uso de substâncias psicoativas entre os adolescentes deve ser observada, lembrando-se das influências sociais, econômicas e culturais, fatores esses que são particularmente importantes na adolescência. (ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI, 1999). O uso precoce é, sem dúvida, o maior problema. A maioria absoluta dos jovens que utiliza algum tipo de substância química, geralmente iniciou seu consumo por volta dos quatorze anos ou ainda antes. Desta forma, o adolescente tenta se mostrar onipotente e corajoso perante seu grupo de amigos e familiares (ZAGURY, 2002; SCIVOLETTO, 2001; ASSUMPÇÃO JUNIOR, 1999). Para Campos (1998), as amizades nesta fase se tornam muito mais influentes durante o início da adolescência, desde estar com um grupo grande no pátio da escola, ou na rua, até as conversas no telefone com um confidente ou um parceiro amoroso, pois as relações com os colegas são vitais para a transição da infância para a vida adulta. Nesta direção, Zagury (2002) aponta que a amizade torna-se uma relação de pessoas específicas no qual o adolescente cria novos laços afetivos, estabelecendo assim, um círculo social homogêneo, no qual os mesmos encontram sua própria identidade num processo de interação social. 35 De acordo com Espinho e Souza (2001), os adolescentes atribuem o consumo de drogas mais pelo fato de se sentirem bem com o uso das mesmas e também por estarem na companhia de amigos do que às emoções desagradáveis, conflitos interpessoais, desconforto físico ou tentação para o uso. Em relação aos fatores de personalidade, o uso de drogas pode ser utilizado no sentido de desenvolver a coragem, a segurança e a confiança necessárias para a obtenção de idéias criativas e originais, levando-os assim a ficarem mais confiantes quando confrontados a expor seus pensamentos e senso criativo. (ESPINHO & SOUZA, 2001). De acordo Kessler et al (2003), ao passar para a adolescência, o jovem sofre uma mudança tanto fisiológica quanto psicológica. Também é nessa fase que surgem transformações nas suas percepções em relação a si próprio e aos outros. Ele passa por um período no qual o ego fica suscetível a mudanças, ou seja, fica mais fragilizado. É uma fase também de formação de grupos e, concomitantemente, de isolamento, em que o jovem busca compreender as mudanças pelas quais está passando. Em muitos adolescentes e adultos dependentes de drogas foi identificado um corte no desenvolvimento, no qual a maturação interrompeu-se quando se desenvolveu a dependência de substâncias psicoativas. Um dos principais pontos na formação da identidade na adolescência é a uindividuação que, quando completada com sucesso, é caracterizada pelo autocontrole e auto-estima. (ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI, 1999, p. 134). Sendo assim, pode-se afirmar que o adolescente que faz uso de substâncias químicas tem mais dificuldades em estabelecer um propósito de vida e também em buscar autonomia para direcionar sua vida. O entendimento psicodinâmico dos adolescentes tem sido um desafio para os profissionais da saúde mental. Torna-se ainda mais complexa a compreensão daqueles que utilizam substâncias psicoativas. (KESSLER et al, 2003). O adolescente começa a admitir o uso de drogas, segundo Tiba (2003), quando não há mais como negar as evidências. Nesse caso, cita-se quando o mesmo é pego pela polícia, quando surpreendido sob efeitos da droga ou em posse da mesma. De qualquer maneira, o adolescente tenta de todas as formas se 36 esquivar da responsabilidade, inventando diversas desculpas ou atribuindo a culpa a outra pessoa. A droga faz com que o usuário minta, roube, prostitua-se, etc. Quanto maior a vontade de consumi-la, mais o valores e a ética ficam em segundo plano. (TIBA, 2003). Ribeiro, Pergher e Torossian (1998) ressaltam que o jovem é, geralmente, colocado numa situação de passividade em relação à sua realidade social. Ele é um sujeito que não age sobre sua realidade. O sujeito (adolescente) está submetido à turma e os membros desta estão submetidos ao poder das drogas, sem ter vontade nem opinião próprias, sendo impelidos pela droga a tomar suas decisões. Não se faz quase nenhuma diferenciação entre uso e abuso de drogas, percebendo-se palavras como usuário, dependente, viciado, experimentador e drogado sendo utilizadas de maneira aleatória. (RIBEIRO, PERGHER & TOROSSIAN, 1998). As conseqüências na vida dos adolescentes decorrentes do uso de drogas são inúmeras e muito graves. O suicídio na adolescência, por exemplo, apresenta uma forte relação com o uso de substâncias psicoativas. (KESSLER et al, 2003; ZAGURY, 2002). De acordo com Simkin (2002 apud KESSLER et al, 2003; ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI , 2003), encontrou-se como fatores de risco, as seguintes condições: • Cultural e social: permissividade social, disponibilidade de droga, extrema privação econômica e morar em favela; • Interpessoal: a) na infância – família com conduta ao álcool e drogas relacionadas, pobre e inconsistente manejo familiar, personalidade dos pais e abuso físico b) na adolescência – conflitos familiares e/ou sexuais, eventos estressantes (como mudança de casa e escola), rejeição dos seus pares na escola ou outros contextos, associação com amigos usuários; • Psicocomportamental: precoce e persistente problema de conduta, fracasso escolar, vínculo frágil com a escola, comprometimento ocupacional, personalidade anti-social, psicopatologia (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, depressão e transtorno de conduta ou ansiedade nas mulheres), atitudes favoráveis para drogas, inabilidade de esperar gratificação; 37 • Biogenético: genealogia positiva para dependência química e vulnerabilidade psicofisiológica ao efeito de drogas. A expressão “fatores de risco” compreende variáveis associadas à possibilidade de ocorrência de resultados negativos para a saúde, o bem estar e o desempenho social. No caso do uso de drogas, por exemplo, ao fumar maconha, o adolescente pode aumentar as chances de desenvolver doenças pulmonares, sofrer conseqüências psicossociais ou sanções legais, conflito com os pais, perda de interesse na escola, culpa ou também desenvolver um quadro de ansiedade. (SCHENKER & MINAYO, 2005). Nesse sentido, o lado negativo do desejo do adolescente de obter prazer com o uso de drogas é que o mesmo pode se tornar dependente e, com isso, comprometer a realização de tarefas normais do desenvolvimento e, dessa maneira, deixar de cumprir os papéis sociais esperados, influenciando assim, a sua trajetória como adulto jovem. (SCHENKER & MINAYO, 2005). Em contrapartida, Newcomb (1995 apud KESSLER et al, 2003) descreve alguns fatores de proteção como: ambiente estável, alto grau de motivação, forte vínculo pais-criança, supervisão parental e disciplina consistentes, ligação com instituições pró-sociais e associação com amigos não-usuários. Para Kessler et al (2003, p. 35), ”quanto maior o número de fatores de proteção, menor será o consumo de drogas pelos adolescentes e, caso inverso, quanto maior o número de fatores de risco, maior a prevalência de consumo”. Portanto é preciso que a sociedade busque alternativas e, principalmente, os pais dêem limites aos seus filhos e busquem protegê-los das situações de risco com muita acuidade. De acordo com Liddle e Dakof (1995 apud SCHENKER e MINAYO, 2003), os distúrbios provocados pelo uso abusivo de drogas são uma ameaça à saúde pública. Um prejuízo tanto para o usuário como para toda a família, geralmente o vícioleva a perdas de emprego, rupturas familiares, instabilidade financeira e abuso físico e psicológico. A sociedade também é onerada, porque há vítimas de crimes e acidentes relacionados com as drogas, altos custos de encarceramento e também com o tratamento da dependência. Segundo Assumpção Junior & Kuczynski (2003), um dos sentimentos que levam os adolescentes a buscar drogas é a curiosidade e este é um dos fatores de 38 maior influência na experimentação de substâncias psicoativas, ao lado de fatores externos, como a opinião dos amigos e a facilidade com que se conseguem as mesmas. A curiosidade do adolescente o impulsiona a experimentar novas sensações e prazeres. O adolescente vive o presente, busca realizações imediatas e os efeitos das drogas vão de encontro a esse perfil, proporcionando o prazer passivo e imediato. Atualmente, o fácil acesso, o baixo custo das drogas e a maior aceitação do uso de algumas substâncias, como o maconha, tornam quase inevitável o acesso dos adolescentes às mesmas e à oportunidade de experimentação. (ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI, 2003, p. 518). Os modismos também são um dos fatores externos que mais influenciam no consumo de substâncias químicas. A moda reflete a tendência do momento e os adolescentes são particularmente vulneráveis a estas influências. Os adolescentes estão saindo da infância e começando a ganhar liberdade para escolherem as próprias roupas, suas atividades de lazer, enfim, estão definindo seu próprio estilo. Salienta-se aqui também a pressão dos amigos, os modelos dos ídolos e os exemplos que estes jovens tiveram dentro de casa. (KANDEL, 1993 apud ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI, 2003). Os sintomas depressivos e as crises de angústia, segundo Yamagushi (1984 apud ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI, 2003), também são fatores que em muitos casos conduzem o adolescente ao uso de drogas. O jovem que está triste, desanimado, ou mesmo ansioso, tende a buscar atividades ou situações que o ajudem a melhorar, sendo assim os efeitos das drogas podem proporcionar, de forma imediata, um alívio desses sintomas. Quanto mais impulsivo e menos tolerante à frustração for o adolescente, maior será o risco de o mesmo se envolver com drogas. Segundo estudos desenvolvidos com adolescentes dependentes, aqueles que apresentavam sintomas depressivos evoluíram mais rápido da experimentação para o uso regular de cocaína, em alguns casos sem o uso anterior de substância “menos nocivas”, como a maconha. (YAMAGUSHI, 1984 apud ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI, 2003). Todos esses fatores envolvidos interagem e provocam sentimentos de impotencialidade nos adolescentes, fazendo com que os mesmos se distanciem de seus objetivos e busquem na droga um porto seguro para seus anseios. (SCIVOLETTO, 1997 apud ASSUMPÇÃO JUNIOR, 2003). 39 Nesse sentido, Dupre (1995 apud ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI, 2003, p. 519) salienta: “Quanto maior o número de fatores de risco presentes, maior a intensidade de uso e maior o risco de progressão para drogas mais fortes. Por outro lado, quanto menos fatores de risco presentes, mais protegido estará o jovem em relação ao uso de drogas. Acredita-se que, dessa forma, os jovens não encontrariam nas drogas um recurso para lidar com as dificuldades.” Numa área tão controversa e polêmica como é o uso de drogas, não existem intervenções neutras, mas sim toda uma atividade preventiva e ideologicamente orientada, pois envolve permanentemente questões de valores, determinados socialmente, mas podendo entrar em choque com as opções pessoais do adolescente usuário. Para Fraga (2000 apud FORMIGA, 2006), a novidade e a intensidade com que vivem os adolescentes, fazem parte da tendência que o jovem tem em buscar comportamentos conturbados e esse tipo de atitude o leva a descobrir prazer ou camuflar sentimentos através do uso de drogas. Quanto maior a busca pela intensidade e novidade, maior a possibilidade de o jovem apresentar conduta anti-social e delitiva, e diante desses fatores sua tendência em relação ao uso de substâncias químicas se torna mais vulnerável. (FORMIGA, 2006). Segundo Omar & Uribe (1998, apud FORMIGA, 2006), por ser o comportamento do jovem destinado, seja devido ao desenvolvimento biológico, ou seja, pela construção sócio-cognitiva, a necessidade de expandir seu mundo, é possível conceber que esse comportamento pode ser caracterizado como busca de sensações que podem conduzir o jovem ao uso de drogas. Esse sentimento, típico dos adolescentes, acaba levando-os às transgressões das normas que lhes foram impostas dentro da família e pela sociedade. Os usuários de droga passa se valer da droga para seu deleite e em momentos de angústia, mas esta nunca se transforma na razão maior de sua existência. Os toxicômanos, porém, são compelidos à sua ingestão por forças físicas e psíquicas poderosas. As drogas passam a representar, para esse grupo, o valor soberano na regulação de sua existência. (BIRMAN, 2001 apud LIMA, 2008, p. 06). Arruda (1983 apud SCISLESKI & MARASCHIN, 2008) se refere à criação, por parte dos jovens, de um sistema de valores capaz de organizar suas visões de 40 mundo, que explica e fornece elementos afetivos e cognitivos que sustentam suas ações com relação às drogas. Para o autor, a capacidade de consumo de cada um é tomada como sinônimo de qualidade de vida, de êxito pessoal, de poder. Para os profissionais que lidam com adolescentes, saber que tipo de droga é consumida e como ela é transmitida é de suma importância para que se possa esclarecer e interagir de forma adequada com o jovem, tendo em vista o conhecimento adquirido por ele. Vários são os fatores que desencadeiam os sentimentos permissivos que conduzem os adolescentes a usarem drogas, mas de acordo com os autores que colaboraram com este trabalho, a família e os problemas que emergem da nossa sociedade competitiva e imediatista são os maiores propulsores para que os jovens, cada vez mais cedo, comecem a consumir drogas. 41 5 OS CAMINHOS NA RECUPERAÇÃO DO ADOLESCENTE COM DEPENDÊNCIA QUÍMICA Por definição, a dependência constitui, por si só, uma patologia com sua própria psicopatologia, caracterizada por compulsão, perda de controle e manutenção do uso de substância químicas. Trata-se de uma condição crônica, progressiva, incurável e potencialmente fatal, se não tratada. (ASSUMPÇÃO JUNIOR & KUCZYNSKI, 2003). O início do uso de drogas está ocorrendo com pessoas cada vez mais jovens e com substâncias de teor tóxico cada vez mais elevado e que, diante da complexidade do problema, é prudente evitar uma posição limitada, seja ela biológica, social ou psicológica. (BUCHERR, 1996 apud RIGOTTO & GOMES, 2002). Partindo do pressuposto de que o consumo de drogas é um problema social e que o usuário de drogas é um cidadão que tem direito de usar o que quiser, vale ressaltar que, diante dos malefícios que as mesmas causam, o indivíduo deve se conscientizar de sua situação de risco e das implicações que as drogas trazem para sua rede de relações. (LIMA, 2008). Destaca-se que existem várias formas de tratamento para a dependência química, entre elas estão a internação, várias formas de abordagem psicoterápica do paciente e/ou dos familiares, tratamentos à base de medicamentos, tratamentos aversivos, de uma substância por outra, medicamentos para diminuir o desejo de consumir as drogas, entre outros. (RIGOTTO & GOMES, 2002). De acordo com Morrison (1993 apud ASSUMPÇÃO JUNIOR KUCZYNSKI, 2003) as estratégias de tratamento vão depender de uma avaliação prévia adequada do paciente que permitirá a definição da gravidade do problema, mas é correto afirmar que, geralmente, o tratamento de abuso
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