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Textos sobre Historia das Mulheres - andre bueno

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ANDRÉ 
[André Bueno] 
Prefácio 
Dulceli T. Estacheski 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TEXTOS SOBRE 
HISTÓRIA DAS MULHERES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Ebook, 2016 
 
 
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André Bueno [ANDRÉ] Textos sobre História das Mulheres. 
Prefácio Dulceli T. Estacheski. Rio de Janeiro: Ebook, 2016. 
ISBN 978-85-65996-44-0 
 
 
5 
 
ÍNDICE 
 
Prefácio, 9 
Introdução, 13 
Glossário de Autores e Obras, 23 
Antologia, 43 
Retorno ao templo, Enheduana, 45 
Cuidados com a mulher, Instruções de Shuruppak, 48 
Leis sobre as mulheres, Código de Hamurabi, 49 
Conselhos para lidar com mulheres, Instruções de Ptah-Hotep, 52 
O nascimento de Hatshepsut, Inscrição no templo de Hatshepsut, 53 
Devoção de Ísis, Hino a Ísis ou Hino do trovão da mente perfeita, 55 
Sobre as mulheres, Leis de Manu [Manavadhasrmashastra], 58 
Questões femininas, Livro das leis [Arthashastra], 60 
Habilidades necessárias à mulher, Livro do desejo [Kama Sutra], 63 
Lições femininas, Banzhao, 68 
Mulheres fortes – A mãe de Mêncio, Liu Xiang, 71 
A saúde da mulher, Tratado interno [Neijing], 72 
A tristeza de ser mulher, Fu Xuan, 73 
Hino a Terra, deusa-mãe, Hinos Homéricos, 74 
Pandora e a origem das desgraças, Hesíodo, 75 
Mulheres espartanas, Aristóteles, 79 
O cuidado da casa, Aristóteles, 82 
Poema de amor, Safo de Lesbos, 84 
Consolação a minha mãe Hélvia, Sêneca, 86 
O machismo na arte de amar, Ovídio, 89 
A mulher sem pudor, Juvenal, 91 
O pecado original, Gênesis, 93 
A menstruação, Levítico, 96 
Respeito pela união conjugal, Levítico, 97 
Cuidado com a mulher estranha, Livro dos Provérbios, 99 
Sobre as mulheres, Eclesiástico, 101 
A mulher adúltera, Evangelho de João, 104 
6 
 
Sobre o divórcio, Evangelho de Marcos, 105 
Matrimônio ou celibato?, Paulo de Tarso, 106 
O véu das mulheres, Paulo de Tarso, 109 
Mulheres sábias, Evangelho de Maria Magdalena, 111 
Hipácia, a última filósofa do mundo antigo, Damascius, 115 
A mulher para os primeiros pensadores medievais, 117 
A mulher no Islã, Alcorão, 119 
A mulher infiel, As Mil e uma Noites, 123 
O filósofo que não sabe amar, Heloísa, 127 
Os males humanos, Romance da Rosa, 129 
Natividade e virgindade de Maria, Jacopo de Varazze, 133 
Assunção de Maria, Jacopo de Varazze, 135 
Lilith, a primeira mulher, Alfabeto Ben-Sirá, 137 
Mulher, ser defeituoso, Tomás de Aquino, 139 
Entre Eva e Maria há uma grande diferença, Alfonso X, 141 
Por uma literatura feminina, Cristina de Pisano, 143 
A atração das mulheres pelo oculto, O Martelo das Feiticeiras, 149 
A tentação da bruxaria, O Martelo das Feiticeiras, 152 
Opiniões de pensadores modernos, 154 
A miséria das mulheres, L. Thomas, 160 
Sobre as mulheres, Denis Diderot, 164 
Crítica ao livro de Thomas, Madame d’Epinay, 166 
Declaração dos direitos da mulher e da cidadã, Olympe de Gouges, 170 
A igualdade dos sexos e os direitos femininos, Mary Wollstonecraft, 174 
Contra a escravidão, Soujourner Truth, 179 
Liberdade e educação para a mulher brasileira, Nísia Floresta, 181 
Igualdade de direitos no socialismo, August Bebel, 184 
Igualdade de direitos entre os sexos no espiritismo, Allan Kardec, 186 
Contra a sujeição feminina, Stuart Mill, 189 
Sufrágio feminino, Emmeline Pankhurst, 191 
O dia da mulher, Alexandra Kollontai, 193 
A luta política da mulher socialista, Rosa Luxemburgo, 196 
Controle de natalidade e aborto, Margaret Sanger, 199 
7 
 
A descoberta da sexualidade, Sigmund Freud, 201 
Identidades são construídas, Margaret Mead, 205 
O segundo sexo, Simone de Beauvoir, 208 
De palmares às escolas de samba, tamos aí, Lélia Gonzalez, 212 
Revolução sexual, Shere Hite, 216 
A luta dos sexos é uma luta política, Kate Millett, 220 
A ditadura da beleza, Naomi Wolf, 224 
Revendo conceitos, Judith Butler, 228 
Falando de gênero, Joan Scott, 231 
História das Mulheres no Ocidente, Michelle Perrot, 234 
Ecofeminismo, Vandana Shiva, 238 
Sejamos todos feministas, Chimamanda Adichie, 241 
Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação 
contra a mulher, Nova York, nações unidas, 1979, 243 
Lei no 11.340: Lei Maria da Penha. Brasil, 2006, 249 
Referências, 259 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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9 
 
PREFÁCIO 
§ 
 
A História das Mulheres possui uma trajetória significativa. Sua 
escrita surgiu como uma forma de superar um longo silêncio em 
relação a elas, ou romper com o que Joan Scott chama de 
“problema da invisibilidade” 1 . É interessante notar que os 
primeiros escritos surgem dando destaque a trajetórias daquelas 
que eram consideradas ‘grandes mulheres’, rainhas, 
revolucionárias. A ‘História da Mulher’, que trazia, sobretudo 
essas biografias exemplares, veio como resposta a uma história 
que, no século XIX, em seu anseio pela afirmação como ciência, 
privilegiava determinados temas e fontes dos quais as mulheres 
estavam excluídas. Com o tempo, passamos a usar o termo 
‘história das mulheres’, e isso se deu pela percepção de que não 
apenas ‘grandes mulheres’, aquelas que se destacavam no espaço 
público, eram dignas de ter sua história escrita, mas todas as 
mulheres, todas as pessoas, são sujeitos ativos da história e suas 
vivências, suas experiências, contribuem para a compreensão 
histórica das diferentes sociedades. 
O espaço na academia foi conquistado por feministas que nela 
ingressavam e passaram a reivindicar debates e disciplinas que 
considerassem o tema. Eventos foram surgindo, revistas 
especializadas e as reflexões avançaram ganhando diversidade e 
maturidade. E isso não foi uma caminhada fácil, já que as 
discussões em relação a uma legitimidade acadêmica eram 
constantes. A história das mulheres colocava em xeque uma 
 
1 SCOTT, Joan. El problema de la invisibilidad. In: SCANDÓN, Carmem 
Ramos (org.) Género y Historia. México: Universidad Autónoma 
Metropolitana, 1992. p. 38. 
10 
 
preocupação latente da historiografia, a neutralidade, a 
imparcialidade. A escrita da história das mulheres é política, é 
militante. A partir do momento que surge para romper com um 
silêncio, com uma exclusão, ela toma partido, não é neutra. 
Rüsen2 afirma que o pensamento histórico depende de carências 
de orientação causadas por interesses próprios e, portanto, 
histórias têm que tomar partido, pois são ‘estabilizadoras’ de 
identidade no fluxo do tempo. A noção de orientação é uma 
crítica à neutralidade científica. A ciência da História deve 
orientar a ação humana no presente e assim, a história das 
mulheres visa, não apenas preencher espaços antes vazios na 
escrita, mas contribuir para a superação das discriminações de 
gênero que inferiorizam as mulheres. 
Uma das preocupações apontadas por pensadoras como Scott3 e 
Dias 4 era com uma possível marginalização da história das 
mulheres. Que ela ficasse restrita a determinados grupos de 
pesquisa, sempre como um apêndice da História e não como parte 
dela. Isso foi superado com o crescente avanço nas pesquisas e o 
número cada vez mais elevado de publicações na área. A história 
das mulheres não é escrita apenas por historiadoras feministas. Ela 
é ampla. Passou a ser valorizada por diferentes pesquisadoras e 
pesquisadores. Diferentes fontes históricas passaram a ser 
analisadas, diários, imagens, documentos pessoais, bem como 
registros policiais, jornalísticos, literários, entre outros. Não era a 
 
2 RÜSEN, Jörn. Razão Histórica: Teoria da História, os fundamentos e 
métodos da
ciência Histórica. Brasília: UnB, 2001. 
3 SCOTT, Joan. El problema de la invisibilidade. Op. cit. p. 50. 
4 DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Teoria e método dos estudos feministas: 
perspectiva histórica e hermenêutica do cotidiano. In: COSTA, Albertina de 
Oliveira; BRUSCHINI, Cristina (orgs.). Uma questão de gênero. Rio de 
Janeiro: Rosa dos Tempos; São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 1992. p. 40. 
11 
 
falta de fontes o problema da invisibilidade, era a falta de 
interesse. 
A obra que aqui apresentamos é reflexo da crescente valorização 
do tema. O historiador André Bueno assume que essa história é 
muitas vezes dolorosa por revelar exclusão, inferiorização e 
violência, porém ao mesmo tempo, sua existência evidencia a 
humanização da historiografia. Escrevemos para que? Para encher 
as prateleiras de bibliotecas, sites acadêmicos e currículos ou para 
provocar o pensamento que pode romper com estruturas 
discriminatórias ao entender que sim, somos produtos culturais, 
mas também somos produtores de cultura? Tanto o pensamento 
exposto pelo autor, quanto a trajetória da história das mulheres, 
demonstram que a mudança social é possível quando o 
pensamento histórico é estimulado. 
A coletânea de fontes aqui apresentada e realizada com maestria 
pelo autor, é significativa. Perpassa diferentes períodos e espaços 
históricos e representa uma série de discursos, masculinos e 
femininos sobre as mulheres. E qual a importância disso? Qual a 
utilidade de uma obra que resgata trechos de fontes históricas 
sobre as mulheres? Vejo isso em duas perspectivas: 1. A obra é 
estímulo para estudantes de história que muitas vezes tem o 
interesse em pesquisar sobre a história das mulheres, mas 
desconhecem as fontes possíveis. A leitura desses trechos traz o 
conhecimento sobre diferentes materiais e diferentes autores e 
autoras que tratam da temática, sendo útil para quem quer se 
aventurar nas primeiras leituras. 2. A obra é uma excelente 
coletânea de textos que podem compor o material didático de 
docentes. É sabido que o uso adequado de fontes históricas em 
sala de aula auxilia na aprendizagem histórica de estudantes. Ao 
analisarem fontes, desenvolvem sua capacidade de pensar 
historicamente. Como os livros didáticos escolares são ainda 
12 
 
precários em relação à inserção da história das mulheres nos 
diferentes períodos históricos que compõem o currículo, e a 
formação docente em relação ao tema é recente (quando 
acontece), estes recortes de fontes podem suprir tal carência. 
Aprendi muito com a obra. Descobri textos que não conhecia, 
principalmente em relação a períodos mais antigos da história. É 
um material que faltava para indicar a novos pesquisadores e 
pesquisadoras e para utilizar em sala de aula. 
Uma boa leitura e que ela estimule mais pesquisas, mais escritas, 
mais debates e mais transformação social. 
 
Dulceli de Lourdes Tonet Estacheski5 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 Coordenadora do Projeto Gênero e diversidade: ações afirmativas para 
combater a violência – UNESPAR; Direção da Revista Mais que Amélias 
http://rstmaisqueamelias.wix.com/maisqueamelias 
13 
 
INTRODUÇÃO 
§ 
 
Após adquirir certa experiência em produzir alguns livros fontes 
no campo da História Asiática6, comecei a delinear o projeto de 
construir um novo livro fonte sobre a História das Mulheres. O 
tema já estava presente, de modo específico, nas outras produções. 
Todavia, esse empreendimento exigiria um esforço bastante 
amplo, tanto em termos materiais como espaciais. A História das 
Mulheres no mundo é um tema vastíssimo, que pode ser 
abordado de múltiplas formas. Como minha pretensão era de 
criar um livro fonte, isso exigiu certas limitações de propósito. O 
objetivo do livro, em si, não é o de se tornar uma antologia 
definitiva ou completa: mas, antes de tudo, uma coleção de 
fragmentos sobre a História das Mulheres, com fins didáticos, que 
poderia ser utilizada como instrumento de aprendizagem histórica 
ou simplesmente, como referencial de pesquisa. 
A unidade da pesquisa, portanto, foi centrada em dois pontos 
fundamentais: a imagem e o feminino. Os fragmentos recolhidos 
visam proporcionar uma imagem da mulher num determinado 
período, contexto histórico e sociedade. Obviamente, tais relações 
variam: no caso de civilizações como Egito ou Mesopotâmia, 
falamos de processos históricos fundadores, que já não mais 
existem de forma direta, mas que influenciaram diretamente a 
história europeia e asiática. Já Índia e China construíram sistemas 
culturais que atravessaram a história, dando uma continuidade 
sem precedentes para seus alicerces morais e intelectuais. Seria na 
 
6 Cem textos de História Chinesa [2009]; Cem textos de História Indiana 
[2010]; Cem textos de História Asiática [2011]; Textos de História da China 
Antiga [2016]; Textos de História da Índia Antiga [2016]. 
14 
 
Europa, pois, que a construção de uma nova perspectiva sobre o 
Feminino iria se fundar e revolucionar a história humana, 
principalmente a partir do século 19. Desse momento em diante, 
pode-se dizer que a maior parte dos fragmentos responde, 
igualmente, ao surgimento e desenvolvimento dos movimentos 
feministas. 
Novamente, foi necessário aqui fazer uma escolha de sentido nos 
textos. Há uma vasta literatura escrita por mulheres; e todas elas 
são fontes para a pesquisa histórica de uma determinada época. 
Contudo, como comentei anteriormente, o objetivo do livro é 
mais restrito; um empreendimento que tentasse englobar todas as 
escritoras seria monumental, levaria anos, e demandaria um 
trabalho que, admito, não teria condições de fazer sozinho. Assim, 
retornei a unidade proposta dos textos, buscando encontrar neles 
a imagem da Mulher que constituía o imaginário de uma época. 
Havia divergências, obviamente. O pensamento grego clássico 
sobre o feminino, por exemplo, é sinteticamente bem exposto por 
Aristóteles; mas Safo já fora capaz, antes dele, de mostrar as falhas 
do discurso ‘oficial’, revelando uma mulher autônoma e 
independente. Nesse ponto, é sempre bom lembrar um conceito 
fundamental do pensamento histórico chinês, que nos serve de 
baliza aqui: todo discurso oficial é uma tentativa de impor uma 
ideologia. Isso tanto pode significar que muitos compartilhavam 
dele, enquanto muitos outros faziam algo bastante diferente – e 
por isso, alguém precisava idealizar, legislar e aplicar tais propostas 
para impor, de cima pra baixo, uma visão de mundo. 
Ademais, o tema da História das Mulheres, hoje, é multifacetado. 
Por conta disso, a escolha das fontes aqui presentes foi pensado, 
conscientemente, como objeto de críticas. Alguns poderão objetar 
que o livro é tendencioso em tal ou tal sentido. Minha intenção 
foi montar um quadro geral, o que me levou a colocar fontes 
15 
 
díspares e conflitantes, dependendo do ponto de vista do leitor. A 
ideia é essa mesma: como historiador, penso que precisamos 
construir consciência crítica, e essa mesma consciência não virá 
sem uma análise prudente e lúcida das fontes. 
Afinal, a escolha dos fragmentos foi um processo longo e, muitas 
vezes, doloroso. A antiguidade tentou suprimir a voz feminina, e 
por isso, as leituras que temos são basicamente feitas por homens. 
Há brechas; mas o que temos pra ler é, de certa forma, o ‘discurso 
oficial’, aquilo que se pretendia a ‘mentalidade corrente’. Até o 
período moderno, isso seria basicamente uma regra – com as 
exceções notáveis de Heloísa e da pensadora medieval Cristina de 
Pisano, como veremos adiante. Há um sofrimento muito grande 
nesse material: raiva, desconfiança, insegurança e violência. 
Alguém poderia afirmar que, tendo em vista que a história [qual? 
feita por quem?] delegou ‘esse papel
para a mulher’ – de ser 
submissa, reprimida –, discutir a História das Mulheres seria a 
tentativa de contestar um tabu cultural. Ora, a leitura desses 
fragmentos mostra justamente que a Humanidade evolui, ainda 
que isso demore. Se o argumento de que ‘o passado é melhor que 
o presente’ fosse verdadeiro, então, ainda usaríamos sangrias ao 
invés de aspirina. Isso se aplica às questões morais: a moralidade e 
os costumes tem se modificado, e num sentido positivo. Apesar da 
luta árdua que ainda se encontra pela frente, a conquista dos 
direitos humanos tem se ampliado em várias direções. A 
escravidão, antes geral, hoje é abominada; o racismo, antes 
comum, é combatido; o mesmo pode ser dito da luta 
empreendida para mudar a situação da Mulher na História 
humana. Ela se constrói como um contínuo processo de luta. 
Mas, apesar de suas raízes históricas, suas conquistas são muito 
recentes. Para termos uma ideia, como referência, o direito a voto 
só surge no século 20; a convenção para erradicação da violência 
16 
 
contra a mulher só foi firmada em 1979. Isso significa, portanto, 
que ainda temos muito a fazer em termos educacionais. O 
contexto atual diverge amplamente em como tratar essas questões, 
oscilando muitas vezes em direção aos extremos. E, no entanto, 
muitas vezes o meio ideal só surge da compreensão e do alcance 
desses extremos. Mas quaisquer mudanças ou mediações só 
podem ser estabelecidas com conhecimento das condições 
históricas que permearam esse processo – e muitas vezes, é o 
próprio conhecimento, justamente, um dos elementos mais 
ausentes nas discussões atuais. Ao mesmo tempo, a vivência 
líquida da modernidade [como diria Zygmunt Bauman] nos leva 
a rever as condições de que dispomos para analisar nossas 
vivências e experiências pessoais e sociais, conjunto esse cuja 
dimensão é fundamental para estabelecer nosso papel nas 
mudanças culturais. 
Assim sendo, a construção desse livro objetiva a criação de um 
instrumento para o ensino e a aprendizagem histórica. Sendo um 
ponto de partida, esperamos que ele sirva como material para 
reflexão e formação, fornecendo subsídios para uma discussão 
mais consciente sobre nossa história e sociedade. 
 
Uma breve introdução histórica 
Essa concisa introdução histórica não se pretende uma História 
das Mulheres completa e acabada. Antes de tudo, nos dispomos a 
montar um roteiro geral para guiar na leitura dos textos 
escolhidos. 
Pode-se dizer que a História escrita sobre o feminino acompanha 
o desenvolvimento das sociedades patrilineares, fundadas no 
domínio da agricultura e do pastoreio. Antes disso, é possível que 
existissem muitas comunidades nômades e semi-nômades 
matrilieneares. Um grande conjunto de evidências nesse sentido 
17 
 
foi levantado por historiadores como J. Bachofen e Marija 
Gimbutas. Bronislau Mallinowski e Margaret Mead provaram, no 
campo da antropologia, a viabilidade dessas hipóteses. 
Contudo, o alvorecer da urbanização humana, em algum 
momento distante entre o 10º e o 5º milênio aec, trouxeram o 
fortalecimento gradual e contínuo da ideologia patriarcal. As 
sociedades antigas da Mesopotâmia, Egito, Índia e China nos 
mostram os traços desse processo, em que os sistemas matriarcais e 
patriarcais conviveram durante um longo período, envoltos em 
conflitos e apropriações. As formações sócio-culturais dessas 
civilizações – seus mitos, crenças, linguagem, costumes – mostram 
inúmeras aberturas ao feminino, revelando sua presença ativa, e a 
tentativa de evitar uma completa submissão ao patriarcalismo. 
Todavia, a preponderância do masculino firmou-se. As legislações, 
a escrita autoral, as produções intelectuais, a sua grande maioria 
será masculina, e masculinizada; a produção feminina decai, ou 
não se salva. As exceções, porém, nos mostram as falhas de um 
enganoso discurso misógino. Enheduana, a sacerdotisa acadiana, é 
a primeira autora reconhecida na história mundial. Antes dela, 
todos os textos são de autores desconhecidos – usualmente, 
atribuídos a alguém, ou ao seu personagem principal – mas 
ninguém sabe de fato quem os fez. Enheduana nos mostra, pois, 
que naquela época muitas mulheres sabiam ler, escrever, e 
defender seus direitos – com sucesso, inclusive – numa sociedade 
em que os escribas eram homens. 
Como dissemos antes, a questão é que as civilizações da 
Mesopotâmia e do Egito desapareceram, mas deixaram seu 
legado. O ‘Hino do Trovão da mente perfeita’, que apresentamos 
nessa coletânea, é um exemplo disso: o texto louva a ‘Sabedoria’, 
fundindo sincreticamente a figura da Sophia grega, judaica e 
egípcia. Fragmentos de sua escrita e estilo reproduzem passagens 
18 
 
egípcias. Por isso, ele também é considerado um Hino a Isis – 
numa época em que a religião egípcia tradicional declinara quase 
ao fim. 
Por outro lado, Indianos e Chineses, embora de culturas muito 
diferentes, conseguiram manter uma continuidade cultural 
duradoura. Por isso, os textos usados aqui, apesar de centrados na 
antiguidade, serviram por milênios na história dessas civilizações – 
e como tal, mostram as dificuldades de ser mulher no mundo 
asiático. 
O mundo Greco-romano era igualmente masculinizado. Alguns 
dos mitos fundadores da cultura ocidental estão ali: Pandora, que 
libertou todas as desgraças sobre a face da terra; que ela deve ser 
dona de casa, como disse Aristóteles; que toda mulher é disponível 
e não resiste a uma sedução bem feita, como diz Ovídio; e que 
nenhuma delas é confiável, como informa Juvenal. 
O conjunto Judaico-cristão não seria muito diferente: o pecado 
original de Eva está na Bíblia, junto com as determinações rígidas 
do Levítico, e as recomendações vigilantes dos textos de 
Sabedoria. A figura paradigmática de Jesus manifesta um papel 
especial à mulher; mas as austeras recomendações de Paulo 
defenderão novamente sua submissão. O Evangelho apócrifo de 
Magdalena, porém, mostra que nem todos os cristãos 
concordavam com isso no início. Mas os pensadores envolvidos 
na consolidação do Cristianismo trabalharam assiduamente para 
apagar essa subversão feminina. Hipácia, em Alexandria, a última 
grande filósofa do mundo antigo, foi apedrejada até a morte pela 
turba cristã instigada pelo bispo Cirilo; Tertuliano e Agostinho 
teriam sérios problemas com a castidade e a concupiscência, 
recomendando distância e controle do feminino; por fim, Isidoro 
de Sevilha, mostra a tônica da sabedoria medieval sobre a mulher, 
afirmando que o sangue menstrual deixa a terra infértil... 
19 
 
A Idade Média une o romano ao cristão, criando os três modelos 
femininos do imaginário: Eva, Maria e Madalena [a pecadora, a 
pura, e a arrependida, respectivamente]. Elas são cantadas, 
louvadas e tomadas como referência. O amor cortês as torna 
distante, objetos de veneração, de erotismo contido. Mas são 
submissas. Exceto, claro, Heloisa. Apesar das tentativas de 
Abelardo, ela recusou-se a casar com ele. O filósofo não sabia o 
que fazer. Reclamou, passou pelas suas calamidades, mas não 
conseguiu dela o compromisso que ela não quis lhe dar. Casos 
como esse nos mostram que as mulheres podiam ter mais opinião 
do que se costuma acreditar. 
Mas foi Cristina de Pisano, e seu livro A Cidade das Damas, que 
mudaram de forma significativa esse panorama. A experiência 
com uma literatura absolutamente masculina transtornou a 
autora; ela se revolta, e elabora um texto inteiramente dedicado a 
Mulher. Tão bom que sobreviveu ao tempo. Muitas outras 
escritoras mulheres já existem nessa época: mas seus textos 
funcionam dentro da lógica cultural e religiosa do momento. Elas 
conquistaram espaço, mas não mudaram radicalmente as regras 
do jogo. Cristina de Pisano, porém, estava disposta a inventar um 
novo. 
A Idade Moderna respondeu a essas liberdades com a ampliação 
massificada da caça às bruxas e hereges. Muito se fala da
Inquisição na Idade Média, quando ela teria surgido; mas ela 
atuou com muito mais ênfase e violência, de fato, quando as 
primeiras caravelas do novo mundo antropocêntrico singravam o 
mar. O Martelo das Bruxas, junto com o Manual do Inquisidor, 
se transformam nos dois grandes guias para reprimir bruxas, 
hereges, judeus, muçulmanos, pobres, loucos ou simplesmente 
diferentes. O Estado nascente, junto com a Igreja, buscava manter 
o monopólio da violência por meio da escolha de novos inimigos. 
20 
 
A massa, ignorante, aplaudia a execução dessas ameaças, e a 
tomada de seus bens. E nesse processo, a Mulher é indiciada como 
a criatura fadada ao serviço das trevas. Desde Eva, ela cede a 
tentação ao Mal. 
O curso da história transformaria, aos poucos, essa situação. A 
França e a Inglaterra do final do século 18 apresentam um mundo 
radicalmente diferente. Muitas já escrevem, estudam, debatem sua 
própria condição junto à sociedade. Quando L. Thomas lançou 
seu desastrado livro sobre a História das Mulheres, em 1772, ele 
foi criticado por pensadores e pensadoras importantes. Como 
veremos, o debate surgido desse episódio frutificou numa 
constatação importante para a história acerca da condição 
feminina e sua construção cultural. 
O final desse século revela mulheres revolucionárias, como 
Olympe de Gouges e Mary Wollstonecraft. Essa é uma questão 
importante: elas estão protagonizando a mudança de suas posições 
dentro da sociedade, buscando suas próprias conquistas, e não 
apenas concessões pontuais. No Brasil, Nísia Floresta responderá a 
esse desafio, tornando-se, no século 19, a primeira feminista no 
Brasil Imperial, lutando pela educação da mulher e pela igualdade 
de direitos. 
O século 19 foi intenso. A conscientização pelos direitos 
femininos alcançou novos patamares. Em meio a filósofos 
misóginos como Schopenhauer e Nietzsche, Stuart Mill combate 
de forma lógica e coerente a sujeição feminina. A literatura 
produzida pelas mulheres aumentara significativamente. O 
movimento espírita francês revoluciona o Cristianismo, 
afirmando que a espiritualidade não possui sexualidade definida. 
Delineiam-se dois tipos de feminismos nessa época: um defendia a 
integração mais abrangente das mulheres nas atividades políticas e 
públicas, desenvolvido principalmente na Inglaterra e Estados 
21 
 
Unidos. Outro modelo é o feminismo socialista, que propunha 
um novo modelo de sociedade igualitária, mostrando que sem 
equilíbrio econômico e legal, não haveria equidade moral e 
cultural. Na virada do século 19 para 20, uma geração de 
mulheres revoluciona a história: Emmeline Pankhurst e o 
movimento sufragista alcançam o direito a voto em 1918 na 
Inglaterra. Alexandra Kollontai e Rosa Luxemburgo trabalham 
por um novo modelo de civilização socialista, no qual o papel da 
mulher seria valorizado. O século 20 marcaria a grande 
transformação na história da História das Mulheres. 
Foi um longo século, como os fragmentos escolhidos nos 
mostrarão. As mulheres protagonizaram a formação de suas 
próprias linhas de pensamento sobre a História das Mulheres. 
Essa experiência seria multifacetada, e não isenta de contradições, 
discussões e questionamentos. Todavia, a inserção acadêmica 
feminina cresceu consideravelmente, e esse movimento esteve 
intimamente ligado tanto à constatação das capacidades e 
conhecimento científico da Mulher quanto a sua ação política e 
social, marcada pelo ativismo e pela preocupação constante pela 
construção de mudanças culturais necessárias. A instituição de 
Leis universais, salvaguardando os direitos da Mulher, marca 
avanços notáveis; mas o século 21 será, ainda, um grande desafio. 
Há muito ainda para se fazer no campo da educação, buscando-se 
preparar os seres humanos para uma sociedade mais justa, 
equilibrada, menos preconceituosa, ignorante e violenta. Nesse 
sentido, esse pequeno trabalho se propõe, pois, a ser uma humilde 
contribuição. 
 
 
 
 
22 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
23 
 
GLOSSÁRIO DE AUTORES E TEXTOS 
§ 
 
Enheduana 
Princesa e sacerdotisa do período Acádio, em torno do século 23 
aec. É dela o primeiro texto com autoria reconhecida na história 
da humanidade. No Nin-me-sara, Enheduana narra como foi 
expulsa de seu templo por um rei [Lugal-Ane], mas após invocar a 
deusa Inanna [Ishtar] e apelar para o imperador Sargão, ela 
consegue sua posição de volta, retomando o controle do santuário 
dentro da cidade de Ur. Além desse texto, ela também escreveu 
vários hinos religiosos, dando início ao fenômeno da autoria. 
 
Instruções de Shuruppak 
Texto do 3º milênio aec. De autoria desconhecida, narra como 
Shuruppak teria instruído Ziusudra [em acádio, Utnaphstin, o 
Noé mesopotâmico] em uma série de conselhos morais, 
necessários à uma vida adequada. É um classificado como um dos 
‘textos de sabedoria’ da literatura suméria. 
 
Hamurabi 
Soberano babilônico do século 18 aec, teria empreendido diversas 
conquistas na Mesopotâmia, tornando-se um soberano poderoso. 
Seu código, famoso na história mundial do Direito, consolida a 
concepção de uma lei universalista, que abrangesse povos e 
culturas diferentes. O principio fundamental era a equiparação da 
pena ao crime, embora haja diversidade de punições na obra. Não 
foi o primeiro dos códigos jurídicos mesopotâmicos, mas foi o 
primeiro preocupado em criar uma lei comum a todas as 
sociedades submetidas aos babilônios. 
 
24 
 
Instruções de Ptah-Hotep 
Inserido na literatura de sabedoria egípcia, os conselhos ou 
instruções dados por Ptah-Hotep se assemelham ao texto de 
Shuruppak. Ptah teria sido tjati [primeiro ministro, ou vizir] do 
faraó, e de sua experiência de vida, ele extrai as orientações que dá 
para o filho, de modo a encontrar uma vida segura e longa. 
 
Inscrição no templo de Hatshepsut 
Hatshepsut foi uma das faraós mulheres na história do Egito, 
tendo sido sua administração extremamente bem sucedida em 
vários campos. Uma das primeiras mulheres a escrever seu nome 
na lista dos grandes soberanos da antiguidade, área usualmente 
dominada pelo masculino. 
 
Hino a Ísis ou Hino do Trovão da Mente Perfeita 
Ísis era uma das principais divindades do Egito, sendo considerada 
a Mãe de todos. Progenitora de Hórus, o deus que governava o 
Egito, Ísis era representada também na forma de uma mãe que 
amamentava o filho, criando a iconografia mundialmente 
conhecida da mãe com o filho no colo, encontrada em quase 
todas as culturas mediterrânicas e depois, no Cristianismo. O 
hino em questão foi feito numa época em que o paganismo 
declinava [em torno dos séculos 1 a 3ec], mas encontrava-se vivo 
por meio de sincretismos com o Judaísmo e o Cristianismo. Esse é 
um dos textos encontrados em Nag Hammadi, Egito, pertencente 
a uma vasta coleção de textos gnósticos originais. 
 
Leis de Manu [Manavadhasrmashastra] 
Texto de autoria desconhecida, mas atribuído a Manu [o Noé 
indiano], que teria redigido esse código de leis após o 
renascimento do mundo pós-diluviano. É possível que tenha sido 
25 
 
escrito em torno de 1500 aec, mas não há certeza sobre essa data. 
Ele diz respeito ao aspecto da manutenção do principio religioso 
da cultura, Dharma, apresentando a lista de restrições das castas e 
sexos. 
 
Livro das Leis [Arthashastra] 
Escrito por Kautilia [370-283?aec], o ‘Maquiavel’ indiano, o livro 
aborda as leis sociais [Artha], criando um meio de disciplinar a 
conduta humana através de regras raciocinadas. 
 
Livro do desejo [Kama Sutra] 
Kama [desejo] é o terceiro aspecto fundamental da mentalidade 
religiosa hindu, e tema do livro de Vatsyayana [século 2ec?]. 
Diferente da visão comum ocidental, o livro propõe, de fato, a 
articulação do casamento, do prazer e da vida a dois como uma 
das questões fundamentais na
existência humana. Quase todo o 
livro trata, pois, de regras e conselhos para o bom casamento. 
 
Banzhao 
Autora do século 2ec, intelectual reconhecida na corte chinesa da 
época, foi historiadora oficial e filósofa. Seu livro, Lições 
Femininas [Nujie], é um controverso texto de conselhos para a 
boa conduta da mulher em sociedade. 
 
Liu Xiang 
Historiador, Liu [77-6aec] escreveu uma Biografia de Mulheres 
Notáveis [Lienu Zhuan], no qual destacava modelos de mulheres 
boas, más, inteligentes, imorais, entre outras. A mãe de Mêncio é 
um texto famoso, pois mostra uma mulher sozinha que fez tudo 
ao seu alcance para tornar seu filho um sábio. Mãe Meng é um 
exemplo feminino de dedicação e força na cultura chinesa. 
26 
 
Tratado Interno 
De autoria desconhecida, o Tratado Interno [Neijing] é um texto 
do século 1 ou 2 ec, fazendo uma explanação abrangente sobre a 
questão da saúde e da medicina na cultura chinesa. 
 
Fu Xuan 
Poeta e intelectual destacado, viveu no século 3 ec, num período 
conturbado da história chinesa. Parte substancial de seus poemas 
são sobre as mulheres, manifestando sua admiração e preocupação 
com o feminino. 
 
Hinos Homéricos 
Coleção de Hinos atribuídos ao escritos Homero [séc. 10 aec], 
sem data identificada, mas preservados pela tradição grega. 
 
Hesíodo 
Junto com Homero, foi o outro grande escritor do período 
pré-clássico grego. É Hesíodo [séc. 8aec] que lança o Mito de 
Pandora, no qual a mulher é origem de todas as desgraças 
humanas. Seus livros principais são Teogonia [Origem dos 
Deuses] e Os Trabalhos e os dias, nos quais apresenta-nos essa 
história. 
 
Aristóteles 
Um dos grandes nomes da filosofia grega no século 4aec, 
Aristóteles [384-322aec] escreveu uma vasta obra filosófica, mas 
suas considerações sobre o feminino repercutem as ideias da 
época. Aqui, analisaremos um fragmento da Política e outro de 
Economia [que significa ‘cuidado da casa’]. 
 
 
27 
 
Safo de Lesbos 
Conhecida escritora e poetisa grega, fundadora de uma escola 
feminina, legou poesias belíssimas para a humanidade. Sua relação 
amorosa com uma de suas alunas grifou o termo ‘Lesbianismo’, 
embora Safo mantivesse relações amorosas com ambos os sexos 
[Vida: séc. 7 aec]. 
 
Sêneca 
Pensador romano [-4aec -65ec], seguidor do estoicismo, foi um 
dos mentores do imperador Nero. Em Consolações a Mãe Hélvia, 
Sêneca chama a matrona aos deveres de sua posição, dentro da 
lógica machista romana. 
 
Ovídio 
Arte de Amar é o livro que inaugura o mito machista de que todas 
as mulheres são seduzíveis, e que só são infelizes as decepcionadas. 
Ovídio [43aec – 18ec] é considerado um dos grandes nomes da 
literatura latina, e nesse livro, ele revela muito das práticas 
machistas romanas. 
 
Juvenal 
Juvenal [60-127ec] escreveu suas Sátiras, e a número 6, em 
especial, traz uma forte carga misógina. Nesse texto, o autor 
mostra o desprezo romano pela condição feminina, e sua 
preocupação com a dominação do sexo oposto. 
 
Gênesis 
Texto inicial do Antigo Testamento, mas de redação ou edição 
atribuída a Moisés [séc. 13aec?]. Nesse fragmento, o Mito de Eva 
e o pecado original, que marcariam a história do Ocidente, são 
apresentados. 
28 
 
Levítico 
Parte do Antigo Testamento que mostra uma série de normas 
para a vida religiosa na comunidade judaica antiga. 
 
Livro dos Provérbios 
Atribuído ao Rei Salomão [séc. 10aec?], mas as datas e autorias de 
fato são incertas. Há um grande paralelismo desse texto com os 
Conselhos de Amenemope, do Egito, o que levanta discussões 
sobre possíveis intertextualidades. O livro se insere na tradição dos 
livros de conselhos do Oriente antigo, todo organizado em 
aforismos. 
 
Eclesiástico 
Um dos poucos livros de Sabedoria aceito e amplamente utilizado 
nas comunidades judaica e cristã. Na Idade Média, ele foi 
bastante utilizado pela Igreja cristã, e será amplamente utilizado e 
citado no Martelo das Feiticeiras. 
 
Evangelho de João, Evangelho de Marcos e Paulo de Tarso 
Textos integrantes do Novo Testamento, que marca o surgimento 
dos textos cristãos. Os Evangelhos são atribuídos tradicionalmente 
aos apóstolos, mas não há comprovações plenas disso. Quanto a 
Paulo [5-67ec], este foi um dos grandes difusores do pensamento 
cristão no Mediterrâneo, imprimindo uma nova face para o 
Cristianismo, tornando-o ecumênico e universalista. Aqui, o 
fragmento presente é a Primeira Carta aos Coríntios, quando ele 
dialoga com a comunidade cristã de Corinto. 
 
Evangelho de Maria Magdalena 
Escrito apócrifo, do início do Cristianismo, provavelmente dos 
séculos 1 ao 3 ec. Propunha que Maria Magdalena era uma das 
29 
 
apóstolas de Cristo, superior mesmo aos homens, e uma das 
principais divulgadoras do Cristianismo nascente. Esse evangelho 
desenhava um novo papel para a mulher dentro do pensamento 
cristão pós-Paulino, mas acabou sendo banido. 
 
Damascius 
Escritor do século 6ec, escreveu uma Vida de Isidoro, filósofo 
cristão que teria sido companheiro de Hipácia. Curiosamente, é o 
trecho sobre Hipácia que mais se destaca em sua obra, enquanto 
Isidoro foi eclipsado pela história. 
 
Tertuliano 
Pensador cristão radical, um dos mais severos combatentes dos 
costumes pagãos [após sua conversão], adepto de uma teologia de 
culpabilidade e severidade contra o pecado. Dono de vasta obra, 
no qual a figura feminina não é valorizada.[Vida: 160-220ec] 
 
Agostinho de Hipona 
Considerado um dos pais da Igreja cristã, Agostinho [354-430ec] 
teve uma trajetória de vida conturbada, que o levou a conversão 
após um esgotamento espiritual. Agostinho tinha um ponto de 
vista complexo, que é objeto de debate até os dias atuais. Seu 
tratamento ao feminino era severo e distante; todavia, era grande 
admirador de sua mãe, considerada por ele modelo de mulher. De 
qualquer modo, a leitura de seus textos aponta para o surgimento 
do modelo interpretativo Eva-Maria-Magdalena, que veremos no 
mundo medieval. 
 
Isidoro de Sevilha 
Um dos principais escritores da Antiguidade Tardia, realizou uma 
reinterpretação do vocabulário latino dentro de moldes filosóficos. 
30 
 
Sabe-se hoje de muitos equívocos de sentido que o mesmo teria 
criado: todavia, sua obra foi referência no pensamento medieval 
posterior.[Vida: 560-636ec] 
 
Alcorão 
Livro sagrado e fundador do Islamismo, cuja redação teria 
começado ainda no tempo de vida do profeta Muhammad 
[Maomé], no século 7ec. O texto estrutura os fundamentos da 
história, das crenças e práticas da religião islâmica, sendo um dos 
textos religiosos fundamentais da história da humanidade. 
 
As Mil e uma Noites 
Coleção de histórias diversas, redigido em árabe, e composto em 
torno do século 9 ec. Os episódios são entrelaçados por uma 
história central, narradas pela princesa Xerazade, a grande heroína 
do romance. O rei Chariar, cansado de ser traído, institui a lei 
terrível de deitar-se com mulheres e executá-las na manhã 
seguinte. O terror se instaura em seu reino, e é a sabedoria de 
Xerazade, ilustrada pelas diversas histórias que conta, que o 
levarão a mudar de ideia. 
 
Heloísa 
Heloísa [1090-1164ec] foi um jovem estudante de filosofia no 
período medieval, cujo romance com o pensador Abelardo tornou 
o casal famoso. Embora conheçamos melhor A História de 
minhas calamidades, de Abelardo, as cartas trocadas entre Heloisa 
e ele mostram o quão inteligente e ousada essa jovem era. No 
fragmento dessa antologia, Heloísa critica o comportamento de 
Abelardo em relação a sua estreita visão de amor. 
 
 
31 
 
Romance da Rosa 
Romance francês do século 13 ec, escrito primeiramente por 
Guilherme de Lorris, e continuado por Jean de Meun. É a 
obra-prima do amor cortês medieval, que nos mostra a construção 
de muitos personagens do imaginário medieval em relação ao 
feminino. 
 
Jacopo de Varazze
Autor italiano [1228-1298] que redigiu a Legenda Áurea, 
resgatando a biografia dos principais santos da igreja católica. Sua 
obra uma enciclopédia da vida dos santos, fundamental para 
conhecermos esses personagens basilares na história cristã. 
 
Alfabeto Ben-Sirá 
Texto judaico de autoria desconhecida, que teria sido composto 
em torno do século 8ec. No entanto, só foi conhecido muitos 
séculos depois [em torno do século 12 ec], encontrando uma 
divulgação razoável na Europa Medieval. O texto traz tradições 
folclóricas do Judaísmo, incluindo o mito de Lilith – que depois, 
foi incorporado as tradições de feitiçaria ocidentais. 
 
Tomás de Aquino 
Considerado o grande ‘Doutor da Igreja’, o italiano Tomás 
Aquino [1225-1274] foi canonizado por escrever sua Suma 
Theologica, na qual conseguia cumprir o desafio de unir 
Aristóteles e Pensamento Cristão. Em sua consideração, a Mulher 
era um ‘ser defeituoso’, incompleto, reforçando os velhos 
estereótipos cristãos, como veremos adiante. 
 
Alfonso X 
Rei de Castela e Leão [1221-1284ec], era considerado um sábio, 
32 
 
pensador ativo, que empreendeu uma reforma na escrita, 
estimulou os estudos nos mais diversos campos filosóficos e ainda, 
devoto fervoroso de Maria, organizou as Cantigas de Santa Maria 
– coleção de quatrocentos e trinta cantigas e poemas de louvor a 
Nossa Senhora. No fragmento selecionado, vemos claramente o 
embate do modelo feminino medieval ‘Eva x Ave [Maria]’. 
 
Cristina de Pisano 
Intelectual e escritora veneziana [1363-1430ec], sua obra marca 
um momento de inflexão na literatura mundial. Cidade das 
Damas é o primeiro livro ocidental a questionar o papel 
masculinizado da literatura e da filosofia, propondo um novo 
modelo de pensar através da ótica feminina. 
 
O Martelo das Feiticeiras, de Heinrich Kraemer e James 
Sprenger 
Publicado em 1487, esse manual de caça as bruxas marcaria o tom 
da Idade Moderna europeia: a perseguição cruel e insana contra as 
bruxas, escolhidas muitas vezes entre as mulheres pobres, 
prostitutas, judias ou simplesmente, indefesas. A inquisição, nesse 
momento, buscava retomar as rédeas do poder religioso numa 
Europa convulsionada por crises sociais e culturais. 
 
Nicolau Maquiavel 
Conhecido pela razão prática na política, o pensador florentino 
[1469-1527ec] não atentou as questões de gênero em sua época, 
mas revela em um curto fragmento de sua obra máxima, O 
Príncipe, sua noção sobre o tratamento feminino. 
 
Michel de Montaigne 
Em seus Ensaios, o escritor francês Michel de Montaigne 
33 
 
[1533-1592ec] erudito de amplos conhecimentos clássicos, revela 
uma visão diferenciada e consciente com relação ao feminino, 
mostrando uma mudança lenta e gradual do pensamento 
europeu. 
 
Jean Bodin 
Francês [1530-1596ec], Jean Bodin escreveu Os seis livros da 
república, propondo uma análise dos sistemas políticos na 
história. Ele considerava a Ginecocracia [governo de mulheres] 
uma das piores possibilidades políticas existentes, manifestando 
sua concepção sobre o feminino. 
 
Martinho Lutero 
O grande reformador alemão [1483-1546ec] tinha uma visão 
controversa sobre a questão da mulher. Sua ampla obra parece 
contraditória, ora concedendo um papel relevante à mulher, ora 
caindo numa misógina clara. Uma leitura definitiva de suas 
posições constitui um objeto de difícil definição, e passível de 
debates contínuos. 
 
João Comenius 
Comenius é conhecido pela sua fundamental obra educativa, a 
Didática Magna, um dos textos iniciadores da moderna 
pedagogia. Em sua visão, a educação deveria ser proporcionada 
igualmente para as mulheres, embora suas opiniões sobre o 
feminino ainda estivessem carregadas de preconceitos próprios da 
época. [1592-1760ec] 
 
Immanuel Kant 
O notável pensador alemão I. Kant [1724-1804ec] aprofundou-se 
nos mais diversos campos do pensamento e da ciência, 
34 
 
constituindo uma obra paradigmática. Todavia, suas observações 
antropológicas sobre a questão sexual eram absolutamente 
conservadoras, repetindo considerações próprias da época, sem ter 
nada acrescentado nesse quesito. 
 
Leonard Thomas 
Em 1772, Antoine Leonard Thomas lançou, na França, o seu 
livro O ensaio sobre o caráter, os costumes e o espírito das 
mulheres em diferentes séculos. O livro foi criticamente arruinado 
por não menos que Denis Diderot e Madame d’Epinay, duas das 
maiores figuras intelectuais francesas da época. O autor era 
reconhecidamente virgem sexualmente, e por isso, considerado 
por seus detratores como ‘inapto’ para a missão de falar do outro 
sexo. Além disso, ele trazia uma série de informações que eram 
razoavelmente conhecidas na época, o que parecia torná-lo 
redundante. Todavia, a enxurrada de críticas tornou o livro 
abominável – e ao mesmo tempo, um sucesso – justamente por 
ser tão criticado. Thomas, porém, lançara indiretamente a 
pergunta que influenciaria, de modo profundo, o pensamento 
sobre o feminino nos séculos seguintes – questão essa reconhecida 
mesmo por Diderot e D’Epinay, e talvez só resolvida com Simone 
de Beauvoir: o que é ser mulher? 
 
Denis Diderot 
No ensaio Sobre as Mulheres, o iluminista francês [1713-1784] 
Diderot busca responder a obra de Thomas, criticando-a nos mais 
diversos aspectos. Suas reflexões, porém, apontam para o 
surgimento de novas questões no campo da História das 
Mulheres. 
 
 
35 
 
Madame d’Epinay 
Pensadora francesa, ativa, de vasta obra literária, correspondente 
de Diderot, Rousseau, D’Alembert e Von Grimm, mas 
praticamente desconhecida no Brasil. Premiada na época [1783] 
por sua produção literária, escreveu uma carta sucinta sobre a obra 
de Thomas, mas cujo trecho, esclarecedor, mostra muito sobre a 
consciência crítica de suas posturas intelectuais. [1726-1783ec] 
 
Olympe de Gouges 
Na escalada política da Revolução Francesa, as mulheres pareciam 
esquecidas. Olympe de Gouges [1784-1793ec] assistiu a 
proclamação dos Direitos do Homem, mas não das Mulheres. 
Reagiu escrevendo o efemérico Declaração dos Direitos da 
Mulher e da Cidadã, documento que marca uma clara mudança 
de atitude em relação à participação feminina na política. Como 
muitas, na época, foi executada. Sua frase: ‘a mulher tem o direito 
de subir ao cadafalso, então ela deve ter o direito igualmente de 
subir à tribuna’ fora premonitória sobre a intolerância que as 
mulheres teriam que enfrentar doravante. 
 
Mary Wollstonecraft 
Do outro lado do Canal, a inglesa Mary Wollstonecraft 
[1759-1797ec] iniciara também a luta pelos direitos das mulheres 
inglesas. Escreveu o seu livro Reivindicação dos Direitos da 
Mulher [A Vindication of the Rights of Woman, 1792], e 
participou da Revolução Francesa, tentando difundir suas ideias, 
na mesma época que Olympe de Gouges. Acabou viajando por 
toda a Europa, voltando ao Inglaterra por fim, mas continuou 
sempre ativa na luta pelos direitos da Mulher. 
 
 
36 
 
Soujourner Truth 
Falecida em 1883, a ex-escrava americana Soujourner Truth 
colocou seu nome na história ao realizar, em 1851, um célebre 
discurso contra a escravidão. Simples, direto, consciente, sua breve 
apresentação marcou a história dos Estados Unidos, sendo 
registrado e difundido como uma importante peça na luta contra 
a Escravidão. 
 
Nísia Floresta 
A primeira feminista brasileira, Nísia Floresta [1810-1885ec] 
escreveu um importante tratado sobre a questão da igualdade no 
país, intitulado ‘Direitos das mulheres e injustiça dos homens’ 
[1832]. Sua inspiração teria sido a leitura de Mary Wollstonecraft, 
mas Nísia revela originalidade própria, adaptada a realidade 
brasileira. É, pois, uma autora fundamental na compreensão da 
História de nosso país. 
 
August Bebel 
Revolucionário socialista alemão [1840-1913ec], cuja obra mostra 
a preocupação em criar uma nova concepção de igualdade sexual a 
partir do socialismo.
Allan Kardec 
Fundador do Movimento Espírita, Kardec [França, 1804-1869ec] 
publicou sua primeira grande obra espiritualista, o Livro dos 
Espíritos, em 1857. Nela, era defendida a igualdade entre os 
sexos, posto que o espírito, em sua essência, não teria sexualidade 
definida. O mecanismo da reencarnação garantiria, igualmente, 
que os espíritos revezassem de corpos, podendo ser homens ou 
mulheres em vidas distintas. 
 
37 
 
Stuart Mill 
A sujeição das mulheres é o texto fundamental do pensador inglês 
Stuart Mill [1806-1873ec], que defendeu vigorosamente a 
instituição dos direitos femininos e o seu direito a voto. Nele, o 
autor examina, numa interpretação filosófica e histórica, a questão 
da submissão e da igualdade feminina na sociedade. 
 
Emmeline Pankhurst 
Ativista inglesa [1858-1928ec] do sufrágio feminino, suas 
estratégias para chamar a atenção pública foram consideradas 
violentas e ilegais, levando-a a prisão e a várias condenações. Ela 
dividiu o movimento feminino inglês, e publicou suas memórias, 
Minha própria história, em 1914, defendendo seus pontos de 
vista. Conseguiu, porém, o direito a voto, reconhecido na 
Inglaterra em 1918. 
 
Alexandra Kollontai 
Revolucionária russa [1872-1952ec], uma das principais 
pensadoras do feminismo socialista, uma alternativa integradora e 
equitativa do papel dos sexos na sociedade. Aqui, apresentamos o 
fragmento em que ela defende a instituição do Dia da Mulher, tal 
como hoje conhecemos. 
 
Rosa Luxemburgo 
Intelectual socialista de origem russa [Vida: 1871-1919ec], mas 
que atuou principalmente na Alemanha, onde viveu até o fim da 
vida, quando foi executada pela polícia. Uma das principais 
articuladoras do fracassado movimento socialista alemão para 
governar o país, após o final da Primeira Guerra. Rosa nos 
apresenta um importante texto sobre como o papel da mulher 
estava indissociavelmente ligado à luta de classes. 
38 
 
Margaret Sanger 
Pensadora americana [1897-1966ec], responsável pela 
popularização de métodos contraceptivos e pela teoria do controle 
de natalidade. Embora sua defesa sobre a posse do corpo feminino 
pela própria mulher seja considerada legítima, sua trajetória 
intelectual foi maculada pelo envolvimento com teorias 
eugenistas, racistas, xenofóbicas, por sua associação com a Ku 
Klux Klax e por projetos controversos aos quais estava ligada, 
como o de esterilização compulsória dos pobres. Todavia, esse era 
um discurso comum na época, como evidenciado no contexto da 
Segunda Guerra Mundial. Alguns elementos dessas questões estão 
presentes em seu livro A Mulher e a nova Raça, de 1920. 
 
Sigmund Freud 
Fundador do movimento Psicanalítico, o vienense Sigmund 
Freud [1856-1939ec] preocupou-se em entender a questão do 
psiquismo e da sexualidade na formação da personalidade, criando 
uma nova perspectiva para os estudos de gênero. Aqui, 
apresentamos um fragmento do texto Sobre a Sexualidade 
Feminina [1931], em que algumas de suas teorias [bastante 
discutidas e criticadas atualmente] são apresentadas. 
 
Margaret Mead 
Em Sexo e Temperamento [1935], a pesquisadora americana M. 
Mead [1908-1978ec] conseguiu provar, de forma definitiva, que 
as identidades sexuais são construídas culturalmente. Ao examinar 
três tribos bastante diferentes entre si, ela pode demonstrar que 
atitudes, hábitos e costumes usualmente classificados como 
‘masculinos’ ou ‘femininos’ podiam ser encontrados de modo 
absolutamente distinto em sociedades ‘primitivas’. 
 
39 
 
Simone de Beauvoir 
A filósofa francesa [1908-1986ec] foi autora do livro O Segundo 
Sexo [1949], praticamente um divisor de águas na História das 
Mulheres. Examinando elementos históricos, culturais, sociais e 
filosóficos da questão do Feminino na trajetória da humanidade, 
Beauvoir lançou o famoso epíteto: ‘Não se nasce mulher: 
torna-se’, que explica como o ser mulher é uma construção 
cultural. O livro funde seus estudos e uma apreciação pessoal das 
questões levantadas, tornando-se uma leitura fundamental. 
 
Lélia Gonzalez 
Feminista Negra, Lélia Gonzalez [1935-1994ec] foi uma 
importante intelectual brasileira, defensora dos direitos da Mulher 
e árdua combatente contra as questões de preconceito racial. 
Defendia um novo entendimento do papel da cultura 
afro-descendente na formação da história do Brasil, e associava a 
exploração racial e de gênero num plano único, realizando um 
novo tipo de ativismo nesse sentido. Possui uma obra ampla e 
significativa, cuja divulgação ainda não tem sido suficiente. 
 
Shere Hite 
Pesquisadora americana [1942], autora do conhecido Relatório 
Hite [publicado em 1976] no qual se revelava uma nova visão do 
entendimento do corpo feminino, relacionado às questões do 
prazer e do erotismo. Na época, o texto foi considerado 
impactante, por mostrar que muitas crenças relacionadas ao prazer 
feminino eram, de fato, elaborações masculinas [machistas], que 
não encontravam reciprocidade nos dados levantados pelo estudo. 
 
Kate Millett 
Escritora e intelectual Americana [1934] cujo livro Política Sexual 
40 
 
[1970] colocou em questão a continuidade das relações patriarcais 
na cultura contemporânea. Para ela, a relação entre patriarcalismo 
e política é indissociável, e sua compreensão seria a chave para 
qualquer nova forma de elaboração política possível. 
 
Naomi Wolf 
Escritora Americana [1962] que revelou os padrões autoritários e 
masculinos de beleza sobreviventes na cultura moderna. Cunhou 
os termos ‘ditadura da beleza’, ‘ditadura da moda’, mostrando que 
os padrões estéticos ainda se impõem ante a História das 
Mulheres. Seu principal trabalho é O mito da Beleza [1991]. 
 
Judith Butler 
Uma das principais teóricas sobre a questão de gênero na 
atualidade, a pesquisadora americana Judith Butler [1956] tem 
atuado fortemente na elaboração da agenda feminista atual, 
propondo novas interpretações e questões conceituais. Seu 
trabalho principal, ao qual nos remetemos, é Problemas de 
Gênero [Gender Trouble, 1990] 
 
Joan Scott 
Igualmente ativa na História das Mulheres, pela perspectiva do 
Gênero, Joan Scott [Estados Unidos, 1941] tem se destacado na 
elaboração de um novo tipo de interpretação histórica, 
reconstruindo visões e personagens. Seu trabalho mais divulgado é 
Gênero: Uma Categoria Útil para a Análise Histórica [1990]. 
 
Michelle Perrot 
Historiadora francesa [1928], uma das principais responsáveis 
pela construção do novo campo da História das Mulheres na 
França, tendo colaborado na revolucionária coleção História das 
41 
 
Mulheres no Ocidente [1993], escrito o marcante Mulheres ou os 
silêncios na História [2005] e mais recentemente, Minha História 
das Mulheres [2007]. Atuando a partir da linha da História Social 
Francesa, e influenciada por Michel Foucault [História da 
Sexualidade], é uma importante ativista feminista no campo 
universitário da atualidade. 
 
Vandana Shiva 
[1952] é uma importante ativista ambiental na Índia, tendo unido 
a causa feminista com a preservação ambiental e a educação. Em 
sua visão, a conservação da natureza deve começar por uma 
reforma educacional, que priorize a conscientização de mulher 
acerca das questões ecológicas, permitindo sua atuação mais direta 
frente à família. Vandana tem conseguido resultados 
revolucionários na economia e na sociedade indiana. Seu principal 
trabalho é Ecofeminismo [1993-97]. 
 
Chimamanda Adichie 
Escritora Nigeriana [1977] com amplo destaque internacional, 
tanto por seus romances quanto por suas obras acadêmicas. Seus 
ensaios ‘O perigo das histórias únicas’ [2009] e ‘Sejamos todos 
feministas’ [2012] alcançaram uma grande divulgação mundial, 
mostrando a força de uma nova geração de pensadoras africanas. 
 
Convenção sobre a eliminação de todas as formas de 
discriminação contra a mulher, Nova York, Nações Unidas, 
1979:
Documento produzido a partir de convenção realizada pela 
ONU, visando o estabelecimento de um projeto internacional 
para o combate à violência e a sujeição feminina. O texto é 
revelador sobre a conscientização acerca dos problemas 
enfrentados pela mulher em diversas partes do mundo, bem 
42 
 
como, da persistência de práticas misóginas. 
 
Lei No 11.340: Lei Maria da Penha. Brasil, 2006: Embora a 
convenção para erradicação da violência contra a mulher tenha 
sido constituída em 1979, apenas em 2006 o Brasil instituiu uma 
lei contra a violência sexual e de gênero. A Lei Maria da Penha 
tem esse nome em função de sua figura emblemática, Maria da 
Penha Maia Fernandes [1945], que sofreu duas tentativas de 
assassinato pelo próprio marido. Desde então, o movimento 
contra a violência feminina no Brasil tem aumentado 
significativamente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
43 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ANTOLOGIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
44 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
45 
 
RETORNO AO TEMPLO 
Enheduana 
§ 
 
No Girapu, determinada pelo destino, eu tinha entrado para você. 
Eu, a sacerdotisa, eu, En-Heduana. 
Enquanto eu carregava a cesta, 
Cantando em júbilo 
Como se eu nunca tivesse vivido ali 
Fui sacrificada de morte, banida 
A luz se tornou escaldante 
Fui tomada pela sombra 
Encoberta pela tempestade 
Minha doce boca tornou-se venenosa 
Retornei ao barro 
Meu destino, com Suen e Lugal-Ane, 
Eu vou denunciar a An 
An pode resolver isso! 
Eu vou denunciar a An: 
'Sua senhor foi arrancada do destino por Lugal-Ane 
Foi lançada em terra hostil 
E no meio de inundações 
Pela mentira 
Ela fará tremer a cidade 
E no tribunal 
Ela tornará meu coração calmo por mim!' 
En-Heduana sou eu! 
Agora, eu farei essa prece 
Minhas lágrimas, como cerveja doce 
Eu agora as lanço contra você, livre 
E que Inana determine seu destino 
46 
 
Esse será o seu julgamento! 
Quanto a Asimbabbar, não se preocupe 
Ao mudar os ritos de purificação 
Lugal-ane mudou tudo para ele 
Ele arrancou o templo de An! 
Ele não mostrou nenhum temor. 
Essa casa, que nunca foi conspurcada em sua beleza 
Não faltou em abundancia 
Lugal-ane transformou esse templo numa casa desprezada! 
Ele aqui chegou, tempo atrás, como amigo 
Mas se aproximou por inveja 
A minha deusa, vaca selvagem, me guie! 
Você deve afastar esse alguém 
Você deve medir esse alguém 
Nesse lugar inóspito, quem sou eu? 
Esse lugar rebelde, Nanna deve forçar sua rendição! 
Sacuda essa cidade com violência, de cima a baixo! 
Enlil, amaldiçoe-a! 
A mãe não deve acalmar o grito de sua criança 
Rainha, seu lamentos forma ouvidos pela terra 
Seu choro ficou pra trás nas terras estranhas 
Seu canto determinou seu destino 
Inanna cuidou de mim 
Me protegeu em terra estranha 
Asimbabbar não lançou uma decisão final sobre mim 
Ele [Lugal-ane] se perguntava: haverá algo? Ele falava: haverá 
algo? 
Depois que me expulsou, ficou lá em triunfo 
Me fez voar como andorinha 
E destruiu minha vida [...] 
Eu sou a radiante sacerdotisa de Inanna! 
47 
 
Minha rainha, só você pode acalmar meu coração 
Isso deve ser conhecido: 
Ela me disse: 'Ele é seu!' 
Nanna proclamou seu decreto! 
Que você é tão alta quanto o céu, deve ser conhecida! 
Que você é tão grande quanto a terra, deve ser conhecida! 
Aniquila os inimigos, deve ser conhecida! 
Ruge contra os adversários, deve ser conhecida! 
Devora os cadáveres dos predadores, deve ser conhecida! 
Esmaga os líderes, deve ser conhecida! 
Seu olhar é terrível, deve ser conhecida! 
Sua visão aterradora,deve ser conhecida! 
Seu olhar fulminante,deve ser conhecida! 
Inabalável, inflexível,deve ser conhecida! 
triunfante, sempre, deve ser conhecida! 
Inanna proclamou seu decreto: 'ele é seu!' 
 
[...] 
 
A canção de Enheduana foi recebida pela Deusa 
Inana a ama mais uma vez 
O dia foi bom para Enheduana 
Ela colocou suas joias 
Vestiu-se de modo soberbo 
Nanna desponteou, adornada de Lua 
Quando Ningal, mãe de Inana, surgiu 
Ele abençoou o templo 
E em seu portal, declarou-lhe: 
Retornaste! 
 
 
48 
 
CUIDADOS COM A MULHER 
Instruções de Shuruppak 
§ 
 
Você não deve brincar com uma jovem mulher casada: as calúnias 
podem ser graves. Meu filho, você não deve sentar-se sozinho em 
um quarto com uma mulher casada. 
Uma mulher fraca é sempre guiada pelo destino. 
Diga ao seu filho para vir à sua casa; diga a sua filha para ir para os 
aposentos de suas mulheres. 
Uma mulher com a posse de suas próprias propriedades é a ruína 
da casa. 
Você não deve sequestrar uma mulher; você não deve fazê-la 
chorar. 
As amas de leite dos aposentos das mulheres determinam o 
destino de seu senhor. 
Você não deve ter relações sexuais com a tua escrava: ela irá 
prejudicá-lo. 
Você não deve estabelecer um lar com um homem arrogante: ele 
vai tornar sua vida como a de uma escrava. Você não poderá ir a 
casa de mais ninguém sem ouvir os gritos: ‘lá vai você, lá vai 
você!” 
Quando você traz uma escrava das colinas, ela traz o bem e o mal 
com ela. O bem está em suas mãos; o mal está no seu coração. 
Você não deve escolher uma esposa durante um festival. Seu 
interior é ilusório; sua parte externa é ilusória. A prata nela é 
emprestada; os lápis-lazúlis são emprestados. As joias são 
emprestadas. O vestido é emprestado; a veste é emprestado. 
Você não deve comprar uma prostituta: ela é uma boca que 
morde. 
 
49 
 
LEIS SOBRE AS MULHERES 
Código de Hamurabi 
§ 
 
Se uma irmã de um deus [sacerdotisa] abrir uma taverna ou entrar 
numa taverna para beber, então esta mulher deverá ser condenada 
à morte. 
Se alguém "apontar o dedo" (enganar) a irmã de um deus ou a 
esposa de outro alguém e não puder provar o que disse, esta 
pessoa deve ser levada frente aos juízes e sua sobrancelha deverá 
ser marcada. 
Se um homem tomar uma mulher como esposa, mas não tiver 
relações com ela, esta mulher não será esposa dele. 
Se a esposa de alguém for surpreendida em flagrante com outro 
homem, ambos devem ser amarrados e jogados dentro d'água, 
mas o marido pode perdoar a sua esposa, assim como o rei perdoa 
a seus escravos. 
Se um homem violar a esposa (prometida ou esposa-criança) de 
outro homem, o violador deverá ser condenado à morte, mas a 
esposa estará isenta de qualquer culpa. 
Se um homem acusar a esposa de outrém, mas ela não for 
surpreendida com outro homem, ela deve fazer um juramento e 
então voltar para casa. 
Se o "dedo for apontado" para a esposa de um homem por causa 
de outro homem, e ela não for pega dormindo com o outro 
homem, ela deve pular no rio por seu marido. 
Se um homem for tomado como prisioneiro de guerra, e houver 
sustento em sua casa, mas mesmo assim sua esposa deixar a casa 
por outra, esta mulher deverá ser judicialmente condenada e 
atirada na água. 
 
50 
 
Se um homem for feito prisioneiro de guerra e não houver quem 
sustente sua esposa, ela deverá ir para outra casa, e a mulher estará 
isenta de toda e qualquer culpa. 
Se fugir de sua casa, então sua esposa deve ir para outra casa. Se 
este homem voltar e desejar Ter sua esposa de volta, por que ele 
fugiu, a esposa não precisa retornar a seu marido. 
Se um homem quiser se separar de uma mulher ou esposa que lhe 
deu filhos, então ele deve dar de volta o dote de sua esposa e parte 
do usufruto do campo, jardim e casa, para que ela possa criar os 
filhos. Quando ela tiver criado os filhos, uma parte do que foi 
dado aos filhos deve ser dada a ela, e esta parte deve ser igual a de 
um filho. A esposa poderá então se casar com quem quiser. 
Se um homem quiser se separar de sua esposa que lhe deu filhos, 
ele deve dar a ela a quantia do preço que pagou por ela e o dote 
que ela trouxe
da casa de seu pai, e deixá-la partir. 
Se a esposa de um homem, que vive em sua casa, desejar partir, 
mas incorrer em débito e tentar arruinar a casa deste homem, 
negligenciando-o, esta mulher deverá ser condenada. Se seu 
marido oferecer-lhe a liberdade, ela poderá partir, mas ele poderá 
nada lhe dar em troca. Se o marido não quiser dar a liberdade a 
esta mulher, esta deverá permanecer como criada na casa de seu 
marido. 
Se uma mulher brigar com seu marido e disser "Você não é 
compatível comigo", as razões do desagrado dela para com ele 
devem ser apresentadas. Caso ela não tiver culpa alguma e não 
houver erro de conduta no seu comportamento, ela deverá ser 
eximida de qualquer culpa. Se o marido for negligente, a mulher 
será eximida de qualquer culpa, e o dote desta mulher deverá ser 
devolvido, podendo ela voltar para casa de seu pai. 
Se ela não for inocente, mas deixar seu marido e arruinar sua casa, 
negligenciando seu marido, esta mulher deverá ser jogada na água. 
51 
 
Se um homem tomar uma esposa e esta der ao seu marido uma 
criada, e esta criada tiver filhos dele, mas este homem desejar 
tomar outra esposa, isto não deverá ser permitido, e que ele não 
possa tomar uma segunda esposa. 
Se um homem tomar uma esposa e esta não lhe der filhos, e a 
esposa não quiser que o marido tenha outra esposa, se ele trouxer 
uma segunda esposa para a casa, a segunda esposa não deve ter o 
mesmo nível de igualdade do que a primeira. 
Se um homem for culpado de incesto com sua filha, ele deverá ser 
exilado. 
Se um homem prometer uma donzela a seu filho e seu filho ter 
relações com ela, mas o pai também tiver relações com a moça, 
então o pai deve ser preso e ser atirado na água para se afogar. 
Se alguém for culpado de incesto com sua mãe depois de seu pai, 
ambos deverão ser queimados. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
52 
 
CONSELHOS PARA LIDAR COM MULHERES 
Instruções de Ptah-Hotep 
§ 
 
Evitar as mulheres 
Se desejas conservar a amizade numa casa em que entres como 
senhor, irmão ou amigo, em qualquer lugar onde entres evita 
aproximar-te das mulheres Não é bom o lugar onde isso acontece 
nem é perspicaz quem se insinua a elas. Mil homens podem 
enlouquecer por seu (próprio) impulso: num breve momento, 
parecido a um sonho, e a morte chega por havê-las conhecido. É 
um delito. (como se) concebido por um inimigo, e (já) ao sair (de 
casa) para cometê-lo o coração o rejeita. Aquele que se consome 
por causa de seu desejo por elas não prosperará. 
 
Conduta com a esposa 
Quando prosperares e construíres teu lar, ama tua mulher com 
ardor, enche seu estômago, veste suas costas. O ungüento é um 
tônico para seu corpo. Alegra seu coração enquanto viveres, ela é 
um campo fértil para o seu senhor. Não a julgues. (mas) afasta-a 
de uma posição de poder. Reprime-a, (pois) seu Olho é um vento 
de tempestade quando ela encara. [Abranda seu coração com o 
que acumulaste], assim ela permanecerá em tua casa. Se a 
repelires, virão lágrimas. Uma vagina é o que ela oferece por sua 
condição, (contudo) O que indaga é quem lhe fará um canal? 
 
Conduta com a concubina 
Se tomares uma mulher como concubina, alegre e conhecida pelos 
de sua cidade, ela está duplamente (protegida) na lei. Sê bom para 
ela (durante) algum tempo. Não a repilas. Deixe-a comer (à 
vontade). (Uma mulher) alegre distribui felicidade. 
53 
 
O NASCIMENTO DE HATSHEPSUT 
Inscrição no templo de Hatshepsut 
§ 
 
Amon chamou a Grande Enéada no céu e proclamou a eles sua 
decisão de criar, para a terra do Egito, um novo rei, e ele fez os 
deuses prometerem que seriam todos bons com ele. Como 
sucessor, Hatshepsut foi a única mulher escolhida; e assim, 
reivindicou sua posição . 
"Ela constrói seus santuários", disse Amon a Enéada. "Ela 
consagra templos... Ela faz ofertas ricas... O orvalho do céu cairá 
em seu tempo... E o Nilo deve ser elevado em sua época. 
Cerquem-na com sua proteção, com a vida, a felicidade até a 
eternidade". 
A Enéada respondeu: "Vimos tudo isso. Nós a cercaremos com 
nossa proteção, com vida e felicidade..." Amnn cobrou Thoth, o 
deus da sabedoria e das letras, para buscar a rainha Iahmes, a 
esposa do faraó reinante, a quem ele selecionou como a futura 
mãe da sucessora, e Thoth lhe respondeu da seguinte forma:... 
"Esta jovem mulher é uma princesa. Ela é chamada Iahmes. Ela é 
mais bonita do que todas as mulheres em toda a terra Ela é a 
esposa do rei, o rei do Alto e do Baixo Egito, Tutmés I, e sua 
majestade ainda é um jovem. Vamos, pois, para ela...” Então 
Thoth levou Amon à rainha Iahmes. 
Chegando o grande deus, Amon, Senhor do trono das Duas 
Terras, assumiu a forma da majestade de seu marido, o rei do Alto 
e do Baixo Egito, Tutmés I. Encontrou-a enquanto ela descansava 
na mais íntima (área) de seu palácio. Então ela acordou por causa 
do cheiro do deus, e ela sorriu para sua majestade. Ao mesmo 
tempo, ele foi lá para ela, e estava cheio de desejo por ela. Ele 
deu-lhe o seu coração e lhe permitiu reconhecer-lo em sua forma 
54 
 
divina, depois que ele se aproximou dela. Ela regozijou-se para 
mostrar sua beleza, e seu amor passou por cima em seu corpo. O 
palácio foi inundado com a fragrância do deus. Todo o cheiro 
dele era a fragrância de Punt. 
A esposa real e mãe, Iahmes, falou com a majestade do esplêndido 
deus Amon, o senhor do trono das Duas Terras, "Meu senhor, 
quão grande é a sua glória. Como é bonito ver o seu rosto. Você 
domina minha majestade com o teu olhar. Sua fragrância está em 
todas as minhas partes ". [Assim falou,] após o Deus ter feito com 
ela tudo o que ele desejava. 
Em seguida, Amon, o senhor do trono das Duas Terras falou com 
ela, "Hatshepsut é, portanto, o nome desta sua filha que eu 
coloquei em seu corpo, de acordo com as palavras de sua boca. Ela 
vai exercer o esplêndido reinado na terra inteira. Minha glória irá 
pertencer a ela, a minha autoridade pertence a ela, e minha coroa 
irá pertencer a ela. Ela vai governar as Duas Terras (o Egito)... Eu 
vou envolvê-la todos os dias com a minha proteção em comum 
com o deus que rege cada respectivo dia". 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
55 
 
DEVOÇÃO DE ÍSIS 
Hino a Ísis ou Hino do Trovão da Mente Perfeita 
§ 
 
Eu fui emitida do poder, 
e eu vim para aqueles que refletem sobre mim, 
e eu fui encontrada entre aqueles que me buscam. 
Olhem-me, vocês que refletem sobre mim, 
e vocês ouvintes, ouçam-me. 
Vocês que estão me esperando, tomem-me para si próprios. 
E não me expulse da sua visão. 
E não faça a sua voz me odiar, nem a sua audição. 
Não seja ignorante a meu respeito em qualquer lugar ou qualquer 
hora. Esteja em guarda! 
Não seja ignorante a meu respeito. 
Pois eu sou a primeira e a última. 
Eu sou a estimada e a rejeitada. 
Eu sou a prostituta e a sagrada. 
Eu sou a esposa e a virgem. 
Eu sou a (mãe e) a filha. 
Eu sou os membros da minha mãe. 
Eu sou a estéril 
e muitos são os filhos dela. 
Eu sou aquela cujo casamento é grandioso, 
e eu não tomei um marido. 
Eu sou a parteira e aquela que não dá à luz. 
Eu sou o consolo das minhas dores do parto. 
Eu sou a noiva e o noivo, 
e foi meu marido quem me gerou. 
Eu sou a mãe do meu pai 
e a irmã do meu marido 
56 
 
e ele é a minha prole. 
Eu sou a escrava daquele que me preparou. 
Eu sou a governanta da minha prole. 
Mas ele é quem me gerou antes do tempo numa data de 
nascimento. 
E ele é a minha prole no devido tempo, 
e o meu poder vem dele. 
Eu sou o bastão do poder dele na juventude dele, 
e ele é o cajado da minha velhice. 
O que quer que ele deseje, me acontece. 
Eu sou o silêncio que é incompreensível 
e a idéia cuja recordação é frequente. 
Eu sou a voz cujo som é diversificado 
e a palavra cuja aparência é múltipla. 
Eu sou a declaração do meu nome. 
Por que, você que me odeia, me ama, 
e odeia aqueles
que me amam? 
Você que me nega, me admite, 
e você que me admite, me nega. 
[...] 
Pois eu sou sabedoria e ignorância. 
Eu sou timidez e coragem. 
Eu sou impudente; eu sou envergonhada. 
Eu sou força e eu sou medo. 
Eu sou guerra e paz. 
Atente para mim. 
Eu sou aquela que é desonrada e a grandiosa. 
[...] 
Eu sou a sabedoria da minha averiguação, 
e a descoberta daqueles que me buscam, 
e a influência daqueles que me solicitam, 
57 
 
e o poder dos poderes na minha sabedoria 
dos anjos que foram enviados pela minha palavra, 
e dos deuses em suas estações pelo meu conselho, 
e dos espíritos de cada homem que existe comigo, 
e de mulheres que habitam dentro de mim. 
Eu sou aquela que é reverenciada e que é glorificada, 
e que é menosprezada com desprezo. 
[...] 
Pois eu sou aquela que existe sozinha, 
e eu não tenho ninguém que irá me julgar. 
Porque muitas são as formas agradáveis que existem em 
numerosos pecados, 
e incontinências, 
e paixões vergonhosas, 
e prazeres fugazes, 
que os homens aderem até que eles fiquem sóbrios 
e subam até o lugar de repouso deles. 
E eles me encontrarão lá, 
e eles viverão, 
e eles não morrerão novamente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
58 
 
SOBRE AS MULHERES 
Leis de Manu [Manavadhasrmashastra] 
§ 
 
Uma mulher está sob a guarda do seu pai durante a infância, sob a 
guarda do marido durante a juventude, sob a guarda de seus filhos 
em sua velhice; ela não deve jamais conduzir-se à sua vontade. 
O testemunho isolado de um homem isento de cobiça, é 
admissível em certos casos; enquanto que o de um grande número 
de mulheres, ainda que honestas, não o é (por causa da 
inconstância do espírito delas) como não o é o dos homens que 
cometeram crimes. 
Dia e noite, as mulheres devem ser mantidas num estado de 
dependência por seus protetores; e mesmo quando elas têm 
demasiada inclinação por prazeres inocentes e legítimos, devem 
ser submetidas por aqueles de quem dependem à sua autoridade. 
Deve-se sobretudo cuidar e garantir as mulheres das más 
inclinações, mesmo as mais fracas; se as mulheres não fossem 
vigiadas, elas fariam a desgraça de suas famílias. 
Que o marido designe para função à sua mulher a receita das 
rendas e despesa, a purificação dos objetos e do corpo, o 
cumprimento de seu dever, a preparação do alimento e a 
conservação dos utensílios do lar. 
Se se compara o poder procriador masculino com o poder 
feminino, o macho é declarado superior porque a progenitura de 
todos os seres animados é distinta pelos sinais do poder 
masculino. 
Uma mulher dada aos licores inebriantes, tendo maus costumes, 
sempre em contradição com seu marido, atacada de uma moléstia 
incurável, como a lepra, ou de um gênio mau e dissipa seu bem, 
deve ser substituída por outra mulher. 
59 
 
Uma mulher estéril deve ser substituída no oitava ano; aquela 
cujos filhos têm morrido, no décimo; aquela que só põe no 
mundo filhas, no undécimo; aquela que fala com azedume, 
imediatamente. 
Mas, aquela que, embora doente, é boa e de costumes virtuosos, 
não pode ser substituída por outra, senão por seu consentimento e 
não deve jamais ser tratada com desprezo. 
Um homem de trinta anos deve desposar uma rapariga de doze 
que lhe agrade; um de vinte e quatro, uma de oito; se ele acabou 
antes seu noivado, para que o cumprimento de seus deveres de 
dono da casa não seja retardado, que ele se case logo. 
Ter pequenos cuidados com uma mulher, mandar-lhe flores e 
perfumes, gracejar com ela, tocar nos seus enfeites ou nas suas 
vestes, sentar-se com ela no mesmo leito, são provas de um amor 
adúltero. 
Se uma mulher, orgulhosa de sua família e de suas qualidades, é 
infiel ao seu esposo, que o rei a faça devorar por cães em um lugar 
bastante freqüentado. 
Que ele condene o adúltero seu cúmplice a ser queimado sobre 
um leito de ferro aquecido ao rubro e que os executores 
alimentem incessantemente o fogo com lenha até que o perverso 
seja carbonizado. 
Quando não se tem filhos, a progenitura que se deseja pode ser 
obtida pela união da esposa, convenientemente autorizada, com 
um irmão ou com um outro parente. 
Que uma fidelidade mútua se mantenha até a morte, tal é, em 
suma, o principal dever da mulher e do marido. 
 
 
 
 
60 
 
QUESTÕES FEMININAS 
Livro das Leis [Arthashastra] 
§ 
 
Prostitutas 
Pagando-lhe um salário fixo, o superintendente das prostitutas 
empregará na corte uma prostituta, reputada pela sua beleza, 
juventude e qualificações, seja ou não de uma família de 
prostitutas. Será também nomeada uma prostituta substituta com 
um salário de metade do valor do primeiro. Quando uma dessas 
prostitutas viajar, ou se vier a falecer, a filha ou irmã poderá tomar 
o seu lugar, recebendo seu salário e patrimônio. Este poderá caber 
a sua mãe ou a uma outra prostituta. Se isso não ocorrer, o 
patrimônio ficará para o soberano. Para acrescentar ao brilho das 
prostitutas que levam as insígnias do soberano e que o servem 
quando está no leito real, no trono ou numa carruagem, as 
prostitutas devem ser classificadas em três graus, de acordo com 
sua beleza e as joias que usam; e seu salário variará da mesma 
forma. 
A prostituta que perder sua beleza será empregada como serviçal. 
Se, depois de ter recebido a quantia que lhe for devida, uma 
prostituta se recusar a atender quem a pagou, será multada em 
duas vezes essa quantia. 
Quando uma prostituta recusar seu cliente, será multada em oito 
vezes o valor da quantia cobrada, a menos que o cliente esteja 
prejudicado por uma doença ou defeito pessoal. 
Se uma prostituta matar seu cliente será queimada viva ou 
afogada. 
Ao cliente de uma prostituta que roubar sua roupa ou suas joias, 
ou deixar de pagar-lhe o que é devido, será imposta multa igual a 
oito vezes o valor do que foi roubado. Toda prostituta informará 
61 
 
o superintendente sobre seus clientes, sua receita diária e renda 
prevista. 
A propriedade da mulher está representada por meios de 
subsistência e joias, para as quais não há limite de valor. No caso 
dos meios de subsistência, seu dote será sempre superior a dois mil 
dinheiros. A esposa poderá lançar mão desses recursos para 
manter-se, ou para manter os filhos ou a nora, caso o esposo esteja 
ausente e não tenha deixado recursos para isso. Quanto ao esposo, 
poderá também utilizar esses recursos em caso de calamidade, 
doença ou fome, para afastar perigo ou em atos de caridade. 
Se uma viúva voltar a casar-se com um homem que não tenha 
sido escolhido pelo seu sogro perderá tudo o que lhe tiver sido 
dado por este e pelo falecido esposo. 
 
Os deveres da esposa 
A esposa que praticar quaisquer atos sexuais, ou beber, violando 
desta forma uma proibição, pagará multa de três dinheiros. No 
caso de sair durante o dia para assistir a um evento esportivo ou 
um espetáculo, pagará multa de doze dinheiros. Se a falta ocorrer 
durante a noite, a multa será dobrada. A esposa que sair quando o 
esposo estiver dormindo, ou embriagado, será penalizada com 
doze dinheiros; o mesmo se impedir a entrada do cônjuge em sua 
casa à noite. Se um homem e uma mulher trocarem palavras ou 
sinais com o propósito de marcar um encontro amoroso, a mulher 
será multada em 24 dinheiros, o homem em 48. 
 
Relações sexuais com meninas 
Aquele que violar uma virgem da sua casta, quando for uma 
menina, terá a mão amputada ou pagará a multa de quatrocentos 
dinheiros. 
Se a virgem vier a morrer, o violador será executado. No caso da 
62 
 
virgem ter mais idade, o violador terá o dedo médio da mão 
amputado, ou pagará a multa de duzentos dinheiros, além de dar 
ao pai da moça uma compensação adequada. 
Nenhum homem pode ter relações sexuais com uma mulher sem 
o consentimento dela. 
Aquele que violar uma virgem com o seu consentimento pagará 
multa de 54 dinheiros; a virgem pagará também uma multa de 
metade

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