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01A - CRIANÇAS SELVAGENS.doc

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Crianças Selvagens
 
As crianças selvagens são crianças que cresceram com contacto 
humano mínimo, ou mesmo nenhum. Podem ter sido criadas por 
animais (frequentemente lobos) ou, de alguma maneira, terem 
sobrevivido sozinhas. Normalmente, são perdidas, roubadas ou 
abandonadas na infância e, depois, anos mais tarde, descobertas, 
capturadas e recolhidas entre os humanos.
Os  casos  que  se  conhecem  de  crianças  selvagens  revestem-se  de  grande  interesse  científico.  Elas  constituem  uma 
espécie  de  grau  zero  do  desenvolvimento  humano,  ensinam-nos  o  que  seríamos  sem  os  outros, mostram  de  forma 
abrupta a fragilidade da nossa animalidade, revelam a raiz precária da nossa vida humana.
Em  termos  de  linguagem,  as  crianças  selvagens  só  conhecem  a  mímica  e  os  sons  animais,  especialmente  os  das 
suas  famílias  de  acolhimento.  A  sua  capacidade  para  aprender  uma  língua  no  seu  regresso  à  sociedade  humana  é 
muito variada. Algumas nunca aprendem a falar, outras aprendem algumas palavras, outras ainda aprenderam a falar 
corretamente o que provavelmente indicia que tinham aprendido a falar antes do isolamento.
Em termos de comportamento, as crianças selvagens exibem o comportamento social das suas famílias adotivas.  Não 
gostam em geral de usar roupa e alimentam-se, bebem e comem tal como um animal o faria. 
A  maioria  das  crianças  selvagens  não  gosta  da  companhia  humana  e  percorrem  longas  distâncias  para  evitá-la. 
Algumas  crianças  selvagens  não mostram  interesse  algum  noutras  crianças  da  sua  idade  nem  nos  jogos  que  estas 
jogam. Na medida em que não gostam da companhia humana, procuram a companhia dos animais, particularmente 
dos animais semelhantes à espécie dos seus pais adotivos. Ao mesmo tempo,  também os animais  reconhecem estas 
crianças, aproximando-se delas como não o fariam em relação a outros humanos.
As crianças selvagens não se riem ou choram, apesar de eventualmente poderem desenvolver alguma ligação afetiva. 
Manifestam pouco ou nenhum controle emocional e, muitas vezes,  têm ataques de  raiva podendo então exibir uma 
força particular e um comportamento claramente selvagem. Algumas crianças têm ataques de ferocidade ocasionais, 
mordendo ou arranhando outros ou até eles mesmos.
As meninas lobo
“Nas regiões da Índia, onde os casos de crianças-lobos foram 
relativamente numerosos, descobriram-se, em 1920, duas meninas - 
Amala e Kamala de Midnapore – que viviam numa família de lobos. A 
primeira, a mais nova, morreu um ano depois; a segunda, Kamala, que 
deveria ter uns oito anos, viveu até fins de 1929.
Segundo a descrição do Reverendo Singh que as recolheu, elas nada 
tinham de humano, e o seu comportamento era exatamente 
semelhante ao dos pequenos lobos, seus irmãos: incapazes de 
permanecerem de pé caminhavam a quatro patas, apoiadas nos 
cotovelos e nos joelhos para percorrem pequenos trajetos e apoiadas 
nas mãos e nos pés, quando o trajeto era longo e rápido; apenas se 
alimentavam de carne fresca ou putrefata comiam e bebiam como os 
animais, acocoradas, com a cabeça lançada para a frente, sorvendo os 
líquidos com a língua. Passavam o dia escondidas e prostradas, à sombra; de noite, pelo contrário, eram 
ativas e davam saltos, tentavam fugir e uivavam, realmente, como os lobos. Nunca choravam ou riam, 
característica que se encontra em todas as crianças-selvagens.
Reintegrada na sociedade dos homens onde viveu oito anos, Kamala 
humaniza-se lentamente, mas, note-se, sem nunca recuperar o atraso: 
passaram seis anos antes de conseguir caminhar na posição ereta. Na altura 
da morte apenas dispõe de umas cinquenta palavras. Contudo, se esses 
progressos são lentos, são também contínuos e realizam-se simultaneamente 
em todos os sectores da sua personalidade. Surgem atitudes afetivas: Kamala 
chora, pela primeira vez, quando morre a irmã, torna-se, pouco a pouco, 
capaz de sentir afeições pelas pessoas que cuidam dela, especialmente pela 
senhora Singh; sorri quando lhe falam. A sua inteligência desperta também; 
consegue comunicar com as outras pessoas, por meio de gestos, 
gradualmente reforçados com algumas palavras simples de um vocabulário 
rudimentar; consegue compreender e executar ordens simples, etc.
No entanto, a dar crédito a outro observador, o bispo Pakenham Walsh, que 
viu Kamala seis anos depois de ser encontrada, a criança não tomava qualquer iniciativa de contacto, nunca 
utilizava espontaneamente as palavras que aprendera e, especialmente, mergulhava numa atitude de total 
indiferença mal as pessoas deixavam de a solicitar.”
REYMOND-RIVER, O Desenvolvimento Social da Criança e do Adolescente, Ed. Aster.
Caso Isabel
Maria Isabel Quaresma dos Santos nasceu em 6 de Julho de 1970  no distrito de Coimbra, na vila de Tábua. A sua mãe 
denotava alguma debilidade mental. O pai de Isabel não era membro da família. Isabel vivia com a mãe no Lugar Da 
Vacaria, pequena aldeia onde a agricultura e a pecuária constituem as principais atividades econômicas. A pequena 
Isabel habitava um galinheiro onde supostamente a mãe a teria colocado apenas algum tempo após o seu nascimento. 
Aí  viveu  durante  oito  anos  da  sua  infância  tendo  como  companhia  as  galinhas  enquanto  a mãe  ia  trabalhar  para  o 
campo. Alimentava-a de milho, couves cortadas e uma caneca de café.
O caso de  Isabel  foi divulgado pela comunicação  social no  início de 1980, quando  tinha a  idade de 9 anos e  tinha 
vivido  cerca  de  oito  anos  num galinheiro. A  primeira  tentativa  de  tirar  Isabel  desta  situação  parece  ter  surgido  de 
uma organização de caráter religioso, que foi buscar a criança. Através de um acordo com o Hospital da Tábua,  tal 
organização conseguiu o internamento da criança por um curto espaço de tempo, até encontrar uma instituição melhor 
preparada e adequada para recebê-la. Como a instituição não foi encontrada, o Hospital acabou por devolver a criança 
à sua vida anterior. 
Entretanto, uma técnica de radiologia no Hospital de Torres Vedras, teve conhecimento, por intermédio das religiosas 
deste hospital, da situação de Isabel. Decidiu levar a Isabel para sua casa em Torres Vedras, onde ficou durante cerca 
de 15 dias. Porém, sentindo-se incapaz de recuperar uma criança como esta a técnica tentou interná-la num hospital, 
mas apenas conseguiu o interesse de alguns médicos em observarem a Isabel e realizaram-lhe alguns exames. Como 
não foram assinaladas razões suficientes para o seu internamento, Isabel voltou para as suas condições anteriores. O 
caso acabou por ser denunciado à polícia, pelos vizinhos. No decorrer deste processo, Isabel foi internada no Colégio 
Ocupacional Luís Rodrigues, em Lisboa que, entretanto, foi fechado pela Segurança Social. Atualmente encontra-se 
na Casa do Bom Samaritano.
Quando Isabel foi encontrada possuía algumas características físicas específicas, tais como:
• Subdesenvolvimento ósseo;
• Grande debilidade;
• Cabeça demasiado pequena para a idade;
• Face com semelhanças flagrantes com os galináceos (perfil, posição labial, dentição formada como se fosse 
um bico);
• Olhos grandes (rasgados no sentido descendente);
• Posição dos braços muito idêntica às asas das galinhas;
• Calos nas palmas das mãos.
• Uma catarata no olho direito, certamente originada por uma picada de galinha.
Em termos comportamentais, revelava:
• Atitudes extremamente agressivas, destruindo tudo o que tivesse ao seu alcance,
• O seu comportamento mais usual era mexer os braços como se fossem asas de galinha e guinchar,
• Comia os seus próprios cabelos, 
• Defecava em qualquer parte e ingeria as próprias fezes. 
Como se encontra Isabel? (em 1998)
Dezoito anos depois, Isabel não cresceu muito. Já anda sozinha, embora 
não em zonas de piso irregular ou com degraus. Diminuiu a agressividade 
e conseguecompletar jogos de colocação de peças. Tem um fascínio pelo 
tiquetaque dos relógios.
Continua com problemas de estômago que lhe causam grande debilidade 
pois a obrigam a comer pouco e a ter uma alimentação muito cuidada.
Segundo os relatórios do colégio onde esteve durante 15 anos, Isabel era 
afetiva e simultaneamente agressiva na tentativa de estabelecer relações. 
Não  falava,  batia  os  braços,  mordia-se,  arrancava  cabelos  que  comia  e 
tinha problemas de cicatrização por arrancar crostas das feridas.
Foi  internada na Casa do Bom Samaritano, onde, segundo a  irmã Maria 
José,  chegou  com  «uma  grande  anemia  e  muitos  parasitas,  não  se 
controlava e não conseguia estar sentada cinco minutos, apesar de não se 
equilibrar  (...)  não  possuía  qualquer  concentração,  comia  cabelos,  papel 
e maçarocas de milho em grão». Por outro lado, «agarrava-se às pessoas 
e,  se  não  tinha  resposta,  beliscava-as,  utilizando  a  agressividade  para 
chamar a atenção. Com a mesma intenção, despia-se da cinta para cima».
Isabel Quaresma 1998
Segundo  a  psicóloga  Isabel  Costa,  da Casa  do Bom Samaritano,  Isabel  teria,  em  1998,  uma  idade mental  de  dois 
anos. «Tem um nível de compreensão simples e responde a pequenas ordens, do gênero de se pedir alguma coisa e 
ela ir buscar. Mas, se pedirem duas, ela só traz uma, porque só capta uma ordem de cada vez». Por outro lado, refere 
que «a jovem não fala mas tem linguagem receptiva, se lhe falar em termos simples e sem grandes sequências». Isabel 
Costa  salienta  ainda  a  evolução,  nos  últimos  três  anos,  da  sua  capacidade  de  atenção  e  concentração.  «Com  a 
colaboração de alguém, já consegue ter uma atividade durante dez minutos seguidos e, no que respeita a socialização, 
já sabe estar em grupo, é participativa e tem iniciativa própria por necessidade de contacto físico.»
Na Casa do Bom Samaritano, Isabel desenvolve jogos simples e grafismos.  Aprendeu a pegar num lápis e a riscar. 
Separa as cores e encaixa peças, frequentando o atelier psico-educativo.
E Isabel Costa acrescenta: «Percebe bem a expressão facial dos outros e sabe, pelo nosso olhar, se estamos contentes 
ou tristes com as suas atitudes.» Aliás, «com alguma malandrice», até reage aos nossos comportamentos.
Tudo leva a crer que é feliz.
Texto com base na reportagem sobre a "Menina Galinha - 18 anos depois", publicada no Diário de Notícias, em 14 
Novembro de 1998
***
Adaptado de textos disponíveis no site da Universidade de Lisboa
http://www.ie.ul.pt
http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/opombo/hfe/cselvagens/

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