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O Brasil e a Liga das Nacoes 1919 1926 v

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O BRASIL E A LIGA DAS NAÇÕES: 
 
VENCER OU NÃO PERDER 
 
 
 
 
 
 
 
 EUGÊNIO VARGAS GARCIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Arquivo de referência para o livro 
O Brasil e a Liga das Nações (1919-1926): Vencer ou Não Perder. 
Porto Alegre, Brasília: Editora da Universidade (UFRGS), 
Fundação Alexandre de Gusmão, 2000. Prefácio de Celso Lafer. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O BRASIL E A LIGA DAS NAÇÕES: 
 
VENCER OU NÃO PERDER 
 
(1919-1926) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 EUGÊNIO VARGAS GARCIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 3 
Notas ..................................................................................................................................... 6 
 
 
CAPÍTULO 1 
 
O BRASIL E O ESTABELECIMENTO DA LIGA DAS NAÇÕES 
 
1.1. O final da Primeira Guerra Mundial e a posição brasileira ............................................ 7 
1.2. A presença na Conferência da Paz de 1919 .................................................................. 10 
1.3. Epitácio Pessoa e a comissão da Liga das Nações ....................................................... 13 
1.4. O debate interno sobre a adesão do Brasil à Liga ...................................................... 18 
Notas .................................................................................................................................... 22 
 
 
CAPÍTULO 2 
 
LEALDADE E PRESTÍGIO NOS PRIMEIROS ANOS EM GENEBRA 
 
2.1. A inserção do Brasil na ordem internacional de Versalhes .......................................... 25 
2.2. 1920: entre o realismo pragmático e o idealismo principista ....................................... 29 
2.3. 1921: diplomacia reativa e improvisação na 2ª Assembléia ........................................ 33 
2.4. 1922: competição pelos assentos temporários no Conselho ........................................ 35 
Notas ................................................................................................................................... 39 
 
 
CAPÍTULO 3 
 
A META DO ASSENTO PERMANENTE NO CONSELHO 
 
3.1. O governo Artur Bernardes: política interna e externa ................................................. 42 
3.2. 1923: tentativa frustrada com a fórmula Brasil-Espanha ............................................. 45 
3.3. 1924: proposta de suplência dos Estados Unidos no Conselho ................................... 48 
3.4. 1925: expectativa de recompensa por serviços prestados ............................................ 51 
Notas ................................................................................................................................... 55 
 
 
CAPÍTULO 4 
 
DOS ACORDOS DE LOCARNO À CRISE DE MARÇO DE 1926 
 
4.1. Origem e significado dos acordos de Locarno ............................................................. 58 
4.2. Em nome da dignidade nacional: “vencer ou não perder” ........................................... 61 
4.3. O veto brasileiro à entrada da Alemanha na Liga das Nações ...................................... 65 
4.4. Reações da opinião pública no Brasil e no exterior ..................................................... 70 
Notas ................................................................................................................................... 76 
 
 
CAPÍTULO 5 
 
A RETIRADA DO BRASIL DA LIGA DAS NAÇÕES 
 
5.1. A comissão de estudos sobre a composição do Conselho ............................................ 79 
5.2. A notificação prévia da retirada do Brasil da Liga ....................................................... 81 
5.3. Impressões sobre o afastamento brasileiro de Genebra ................................................ 85 
5.4. A confirmação definitiva no governo Washington Luís .............................................. 89 
Notas ................................................................................................................................... 92 
 
 
CONCLUSÃO ................................................................................................................... 95 
 
 
ANEXO .............................................................................................................................. 99 
 
Pacto da Liga das Nações .................................................................................................... 99 
 
 
ARQUIVOS PESQUISADOS ........................................................................................ 110 
 
 
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................. 111 
 
1. Fontes impressas ........................................................................................................... 111 
2. Livros ........................................................................................................................... 111 
3. Artigos .......................................................................................................................... 116 
 4. Teses acadêmicas e trabalhos não publicados .............................................................. 117 
 5. Obras de referência ...................................................................................................... 118 
 6. Jornais .......................................................................................................................... 118 
 
 
SOBRE O AUTOR .......................................................................................................... 120 
 
INTRODUÇÃO 
 
 A Liga (ou Sociedade) das Nações, nascida dos escombros da Primeira Guerra 
Mundial, foi uma tentativa ambiciosa de se criar uma associação permanente de Estados, de 
escopo universal, destinada a preservar a paz e a assegurar o cumprimento das normas de 
direito internacional. Em termos de proposta para uma gestão coletiva da paz mundial e de 
ensaio para o estabelecimento de uma autoridade supranacional nas relações internacionais, 
o modelo do Pacto da Liga das Nações abriu o desafio deste século ao tradicional sistema 
de Estados soberanos, descentralizado e hierárquico, cuja idéia de estabilidade e de ordem, 
baseada na política de poder, costuma se fundamentar em precários equilíbrios de força. 
 O Brasil esteve presente na Conferência da Paz de Paris, em 1919, e aderiu como 
membro fundador à recém-criada Liga das Nações. O governo Epitácio Pessoa, não 
obstante a ausência norte-americana de Genebra, permaneceu leal à Liga em função do 
prestígio que o Brasil nela desfrutava como membro temporário do Conselho. Buscando 
elevar o status internacional do país, o governo Artur Bernardes elegeu como meta 
prioritária de política externa a conquista de um assento permanente no Conselho, em cujas 
atividades o Brasil passou a ter uma participação relativamente ativa. Quando da tentativa 
das potências européias de fazer implementar o que havia sido anteriormente acordado em 
Locarno, em relação à pacificação dos ânimos na Europa e à reincorporação da Alemanha 
no quadro político regional, o Brasil, em represália por não ter sido satisfeita a sua 
pretensão, vetou a admissão da Alemanha na Liga das Nações, em março de 1926. Nas 
palavras do próprio Presidente da República, que resumem a disposição do governo 
brasileiro no caso, a questão cifrava-seem “vencer ou não perder”. 
O episódio do veto colocou o Brasil por um momento no centro das atenções da 
política mundial, pois significou o adiamento da entrada em vigor dos acordos de Locarno, 
fundamentais para a manutenção da paz no continente europeu. Em junho de 1926, o Brasil 
notificou ao Secretariado da Liga a sua retirada da organização, acusando-a de ter-se 
desvirtuado de seu caráter universal. Com sua saída, confirmada em definitivo em 1928, o 
Brasil seguiu finalmente o exemplo dos Estados Unidos, afastando-se politicamente da 
Europa e retornando ao isolacionismo hemisférico. 
Este estudo é uma versão ligeiramente modificada de Dissertação de Mestrado 
apresentada, em 1994, ao Departamento de História da Universidade de Brasília. Até 
aquele ano, a historiografia ressentia-se de uma investigação mais abrangente sobre a 
atuação do Brasil na Liga das Nações, de especial importância para uma melhor 
compreensão da política externa brasileira na década de 1920. A literatura sobre a 
participação do Brasil na Liga tratava do assunto de forma dispersa, incompleta e com 
pouca profundidade, o que não vinha permitindo o avanço do conhecimento nessa área. 
Surgiram depois os trabalhos de Ricardo Seitenfus, em 1995, que escreveu capítulo sobre a 
Liga das Nações em livro póstumo de José Honório Rodrigues sobre a história diplomática 
do Brasil, e de Norma Breda dos Santos, que defendeu importante Tese de Doutorado, em 
1996, no Institut Universitaire de Hautes Études Internationales, em Genebra, na qual tratou 
em detalhe de vários aspectos relacionados com a política brasileira na Liga das Nações.
1
 
 Para a análise da conduta do Brasil em Genebra, à luz da perspectiva histórica de 
análise, recorre-se aqui sobretudo à narrativa, dada a necessidade de proceder primeiro a 
uma reconstituição dos fatos considerados essenciais. Com base nesse relato mais 
propriamente descritivo e na evidência empírica extraída das fontes compulsadas, são 
ensaiadas algumas tentativas de interpretação acerca da natureza, das motivações, dos 
interesses e dos fins da participação brasileira na Liga. O problema se encontra delimitado 
no tempo (1919-1926) e no espaço (contexto organizacional da Liga), e uma ênfase maior é 
dada às posições assumidas e aos papéis desempenhados pelo Brasil. Devido à 
especificidade do tema, predomina na análise um enfoque de política interestatal, 
contrabalançado por referências às conjunturas nacional e internacional no período em 
exame, aos condicionamentos estruturais da ação diplomática e aos movimentos da opinião 
pública no país e no exterior. Muitas perguntas levantadas no decorrer da pesquisa foram 
respondidas, outras permaneceram em suspenso, o que é natural, se entendermos que a 
história está sempre sendo constantemente reescrita e não comporta uma “palavra final”. O 
objetivo inicial, que motivou a realização da pesquisa, consistiu em elaborar, como 
primeira aproximação, uma síntese histórica que fosse minimamente consistente para 
permitir um necessário aprofundamento posterior. 
 Quanto à pesquisa documental, foram utilizadas fontes primárias de arquivos 
nacionais, a maior parte no Rio de Janeiro. A documentação sobre a Liga das Nações 
existente no Arquivo Histórico do Itamaraty é particularmente abundante e pode ser ainda 
objeto de novas e frutíferas investigações. Foi também de grande valia a consulta à 
Coleção Afrânio de Melo Franco, guardada na Biblioteca Nacional, especialmente no que 
se refere aos volumes encadernados de recortes de jornais que ali se encontram. A 
bibliografia, por sua vez, serviu para confrontar, recompor, julgar e dar inteligibilidade aos 
dados coletados, ajudando na elaboração das interpretações aqui propostas. 
Em uma abordagem interdisciplinar, faz-se uso neste estudo de categorias e 
conceitos da ciência política e das relações internacionais, pois, em conjunto com os 
procedimentos usuais da pesquisa histórica formal, um pluralismo de paradigmas pode, a 
meu ver, melhor servir à reconstrução do passado do que um modelo teórico fechado, 
definido a priori.
2
 Teorias fornecem insights úteis ao historiador, mas, à medida que 
 
1
 José Honório Rodrigues & Ricardo Seitenfus, Uma história diplomática do Brasil, 1531-1945 
(Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1995); Norma Breda dos Santos, Le Brésil et la Société des 
Nations, 1920-1926 (Thèse de Doctorat, Université de Genève, Institut Universitaire de Hautes 
Études Internationales, 1996). 
2
 Uma discussão sobre o uso da teoria na história das relações internacionais pode ser encontrada no 
artigo de Brunello Vigezzi, “La vita internazionale tra storia e teoria”, Relazioni Internazionali, 
Milano, anno LIV (III nuova serie), marzo 1990, p.24-35; ver também J.-B. Duroselle, Tout empire 
périra (Paris, Publications de la Sorbonne, 1982). Sobre a opção por um pluralismo de paradigmas 
ver Celestino del Arenal, “La teoría y la ciencia de las relaciones internacionales hoy: retos, debates 
y paradigmas”, Foro Internacional (116), México (vol.29, nº 4, abril-junio 1989. p.583-629), p.607. 
pretendem explicar movimentos internacionais mais amplos, vão perdendo a capacidade de 
se sustentar empiricamente, pois sucumbem à complexidade inerente ao cenário mundial e, 
por mais forte razão, à evolução das relações internacionais no tempo. 
Some-se a isso, matizada pelo princípio da discutibilidade científica, uma visão 
calcada na dialética histórico-estrutural como postura metodológica, no sentido empregado 
por Pedro Demo. Segundo ele, “dialética é sobretudo o respeito a uma realidade tão 
complexa, profunda e dinâmica, que nos impõe a reverência típica do mistério. Quanto 
mais pesquisamos, mais temos a perguntar”.3 Em geral, a dialética serve de modo mais 
apropriado a metodologias alternativas, mas não é necessariamente marxista ou 
antimarxista, “a começar pela constatação inevitável de que não existe um marxismo único 
dotado de um único materialismo dialético”. Tampouco tem a ver a dialética com o reino da 
“banalidade corriqueira”, onde, a título de “diversão mental”, as coisas “são e não são” e 
pode-se dispensar a lógica, a disciplina intelectual e a precisão dos métodos. A opção pela 
dialética histórico-estrutural busca, antes de tudo, captar e compreender a dinâmica da 
unidade de contrários, entendida como a coexistência na mesma totalidade de forças 
opostas que ao mesmo tempo se repelem e se atraem, e que apontam para a superação de 
estruturas históricas em contínuo processo de mudança. As totalidades históricas se mantêm 
processo e por isso mesmo se transformam, porque contêm dinâmica interna essencial, 
baseada na polarização: “são como medalha, que sempre tem duas faces, que se necessitam 
e se afastam”.4 Citando ainda Pedro Demo: “Na unidade de contrários são compreensíveis 
também coisas em si inexplicáveis, porquanto o domínio de uma situação histórica nunca é 
completo. Não é possível a dissecação de todas as variáveis componentes, de tal sorte que o 
controle cabal de cada uma fosse realizável”.5 
 Por fim, gostaria de expressar os meus agradecimentos ao Professor Amado Luiz 
Cervo, pela orientação sempre segura, ao Conselheiro Paulo Roberto de Almeida, pelo 
estímulo constante e apoio acadêmico, ao CNPq e à CAPES, pelas bolsas concedidas 
durante meu período de Mestrado, e aos amigos do Departamento de História da 
Universidade de Brasília. Meu reconhecimento também às famílias Giovanni Stehl e Olívio 
Vargas, a Rui Antonio Jucá Pinheiro de Vasconcellos, a meus pais, e a todas as pessoas ou 
instituições que colaboraram direta ou indiretamente para a realização de minha pesquisa. 
 
 Brasília, 16 de novembro de 1998.3
 Pedro Demo, Metodologia científica em ciências sociais (SP, Ed. Atlas, 1989), p.125. 
4
 Id., p. 97. 
5
 Id., p.88-132. Para um exemplo de aplicação da perspectiva dialética na análise das relações 
internacionais ver Robert W. Cox, “Multilateralism and world order”, Review of International 
Studies (vol.18, nº 2, April 1992, p.161-180). 
 
 
CAPÍTULO 1 
 
O BRASIL E O ESTABELECIMENTO DA LIGA DAS NAÇÕES 
 
 
 
1.1. O final da Primeira Guerra Mundial e a posição brasileira 
 
 A assinatura da rendição alemã, em 11 de novembro de 1918, pôs fim à Grande 
Guerra e abriu o caminho para o processo de negociações dos termos da paz. Tendo em 
vista a destruição e o sofrimento causados pela conflagração, a atmosfera do momento era 
de alívio e de esperança em dias melhores, na crença de que aquela tinha sido “a guerra 
para acabar com todas as guerras” e que o despertar da opinião pública para os assuntos 
internacionais seria o prenúncio de uma nova era de relações pacíficas entre os povos.
6
 
 A posição brasileira em relação ao conflito tinha evoluído da neutralidade inicial até 
o reconhecimento do estado de beligerância com a Alemanha, em 26 de outubro de 1917. A 
justificativa oficial para a entrada do Brasil na guerra ao lado dos aliados vinculou essa 
atitude à “política tradicional de amizade para com os Estados Unidos” e à “solidariedade 
continental” em um “momento crítico na história do mundo”.7 
 Segundo Francisco Luiz Teixeira Vinhosa, entre as várias razões que teriam levado 
o Brasil a entrar na guerra, relacionadas inclusive com problemas de ordem interna, uma 
delas seria a de contornar as pressões externas e as restrições impostas pelos aliados, 
principalmente devido ao policiamento dos mares realizado pela Marinha britânica e à 
introdução das listas negras. Ao decidir associar-se à coalizão que viria a ser vitoriosa nos 
campos de batalha, o Brasil procurava evitar arcar com os custos de um tratamento 
discriminatório por parte de seus tradicionais parceiros comerciais, na expectativa também 
de vir a obter em troca algum tipo de apoio ou recompensa no futuro.
8
 
O Brasil foi o único país da América do Sul a participar da guerra, ao contrário, por 
exemplo, da Argentina, que permaneceu neutra até o fim. Entretanto, sua colaboração 
econômica e militar ao esforço de guerra aliado foi em termos práticos irrelevante. Não 
obstante sua participação marginal já no período final das hostilidades, na qualidade de país 
beligerante o Brasil garantiu a sua presença na Conferência da Paz, marcada para iniciar-se 
em janeiro de 1919, em Paris, o que também teria sido uma motivação importante para o 
engajamento brasileiro no conflito. Pode-se dizer que a aspiração de participar das grandes 
decisões mundiais era um traço característico da política externa brasileira no período. 
 
6
 Para uma apreciação do idealismo no pós-guerra ver Edward H. Carr, Vinte anos de crise: 
1919-1939 (Brasília, Ed.UnB, 1981), p.35-49. 
7
 Apud Victor V. Valla, “Subsídios para uma melhor compreensão da entrada do Brasil na Primeira 
Guerra Mundial”, Estudos Históricos (nº 15, 1976, p.29-46), p.29. 
8
 Cf. Francisco Luiz Teixeira Vinhosa, O Brasil e a Primeira Guerra Mundial (RJ, IHGB, 1990), 
p.122. 
Francisco Vinhosa chega mesmo a afirmar que o principal interesse do Brasil, ao entrar na 
guerra, era: 
 
“(...) indubitavelmente, a sua participação na conferência da paz, pois, além dos 
interesses materiais que tinha de lá defender, os navios requisitados aos alemães e o 
dinheiro do café comprado por estes, ainda pensava em conquistar um lugar ao lado 
das grandes potências na Liga das Nações”.9 
 
A escolha da delegação que deveria representar o país na Conferência da Paz deu 
origem a uma polêmica disputa entre Domício da Gama, ex-Embaixador em Washington e 
então Ministro das Relações Exteriores, e Rui Barbosa, que havia liderado manifestações 
aliadófilas como Presidente da Liga Brasileira pelos Aliados. Domício da Gama pretendia 
ele próprio ocupar a chefia da delegação, não só pelos rumores de que todos os Chanceleres 
aliados iriam a Paris, mas sobretudo em função de seu extenso círculo de amizades pessoais 
com autoridades norte-americanas, que Domício esperava poder acionar com bastante 
proveito.
10
 Havia, no entanto, certa simpatia popular pelo nome de Rui Barbosa, por sua 
posição durante a guerra e pelo antecedente de sua participação na Segunda Conferência da 
Haia, em 1907.
11
 
 Em 14 de julho de 1916, por ocasião das comemorações do centenário da 
independência argentina, Rui havia pronunciado conferência sobre o dever dos neutros, na 
Faculdade de Direito e Ciências Sociais de Buenos Aires, intitulada “Os conceitos 
modernos do direito internacional”. Rui condenou a “agressão organizada” da Alemanha, 
afirmando que para ela os tratados internacionais seriam meros “farrapos de papel”. 
Sustentou que não eram os governos democráticos os que turbavam a paz do mundo, 
porque a democracia e a liberdade eram “pacíficas e conservadoras”. A guerra em 
andamento, argumentou, “seria impossível se os povos, e não o direito divino das coroas, 
dominassem a política internacional”. Os horrores do conflito e a destruição repercutiam 
longe e a ninguém era dado permanecer indiferente ante a barbárie. Os neutros sofriam as 
conseqüências da guerra tanto quanto os Estados beligerantes e a neutralidade, pois, 
implicava obrigações claras. Devia-se recorrer à “orientação pacificadora da justiça 
internacional”, já que os tribunais, a opinião pública e a consciência não podiam declarar-se 
neutros entre a lei e o crime. Para Rui Barbosa, as nações cristãs, zelosas do direito, não 
poderiam continuar à mercê dos interesses imorais da violência e da força. A Alemanha 
representava o egoísmo e a ambição, cinicamente camuflados em obras de filósofos e 
escritores militares alemães, na razão inversa da civilização.
12
 
 
9
 Id., p.190. 
10
 Heitor Lira, Minha vida diplomática (Brasília, Ed.UnB, 1981), vol.I, p.88. 
11
 “A Conferência da Paz: a delegação do Brasil”, artigo de Oto Prazeres, Jornal do Brasil, 8 dez. 
1918. 
12
 Rui Barbosa, Os conceitos modernos do direito internacional (RJ, Casa de Rui Barbosa, 1983), 
p.46. 
 O Presidente Rodrigues Alves, estando gravemente enfermo, enviou uma carta a 
Rui Barbosa, datada de 3 de dezembro de 1918, dizendo haver comunicado ao Presidente 
em exercício, Delfim Moreira, a resolução de indicar Rui como chefe da delegação 
brasileira, por ser esta a “vontade geral da nação”. 13 A resposta de Rui Barbosa foi 
divulgada depois de alguns dias, na forma de uma carta aberta a Rodrigues Alves, na qual 
ele expunha as razões que o levavam a recusar o convite, dando a sua versão dos 
acontecimentos.
14
 
 Rui Barbosa alegou ter o convite chegado demasiado tarde, “quase à hora da 
viagem”, quando o nome de Domício da Gama já havia sido cogitado pela imprensa.15 
Tendo Rui posteriormente denunciado ter sido vítima de uma “sórdida intriga 
internacional”, 16 Moniz Bandeira se valeu dessa versão para concluir que os Estados 
Unidos teriam vetado a indicação de Rui Barbosa para a Conferência da Paz, na suposição 
de que o nome de Rui desagradava ao governo norte-americano, que temia não contar com 
o “voto certo” do Brasil caso fosse ele o designado.17 
Essa afirmação, porém, é contestada por Francisco Vinhosa, que atribui a recusa de 
Rui a seu amor-próprio, pelo fato de não querer submeter-se às instruções de Domício no 
Itamaraty e por discordar dos outros nomes já escolhidos para compor a delegação. Vinhosa 
analisao episódio para concluir que: 
 
“Em primeiro lugar, conforme vimos, Rui Barbosa não foi à conferência da paz 
porque não quis, por uma questão de vaidade pessoal, por ter tido o seu orgulho 
ferido por não ter sido o seu o primeiro nome lembrado. Além disso, para ir a Paris, 
queria a substituição do Ministro das Relações Exteriores, o que não aconteceu. Não 
tendo também aceitado a missão por já terem sido nomeados para a delegação 
outros delegados que o ombreavam em autoridade”.18 
 
Seja como for, é irrelevante do ponto de vista histórico tentar-se saber se o 
principismo incondicional de Rui poderia ter eventualmente criado embaraços às pretensões 
norte-americanas nas negociações de paz. Não é de boa historiografia trabalhar-se com 
hipóteses e suposições acerca de eventos que nunca ocorreram. A polêmica resultou, como 
fato concreto, na escolha de um terceiro nome para a chefia da delegação: o de Epitácio 
Pessoa, Senador pela Paraíba e autor, em 1911, de um projeto de Código de Direito 
 
13
 Rodrigues Alves a Rui Barbosa, carta, RJ, 3 dez. 1918, Arquivo Rui Barbosa, Casa de Rui 
Barbosa/Rio de Janeiro, CR 56/1. 
14
 “Carta a Rodrigues Alves”, RJ, 8 dez. 1918, in Esfola da calúnia (RJ, Guanabara, 1933, 
p.243-256). Rui Barbosa voltaria a abordar o tema durante a campanha presidencial de 1919 em 
uma conferência em São Paulo, em 4 abr. 1919; cf. “O caso internacional”, in Obras completas, 
vol.XLVI (RJ, MEC, 1956), tomo I, p.165-259. 
15
 “Carta a Rodrigues Alves”, op.cit., p.248. 
16
 “O caso internacional”, op.cit., p.250. 
17
 Cf. M.Bandeira, Presença dos Estados Unidos no Brasil (RJ, Civilização Brasileira, 
1973), p.203-204. 
18
 Cf. F. Vinhosa, op.cit., p.187-210. 
Internacional Público.
19
 
 Ainda em dezembro de 1918, Domício da Gama tentou fazer com que o Brasil fosse 
convidado a participar das conferências preliminares da paz, anteriores à Conferência 
propriamente dita. Domício acreditava que a presença brasileira nas conferências 
preliminares teria um bom efeito na política interna, pois, nas suas palavras, “isso ajudaria 
o governo perante a opinião pública, que nos está julgando descuidados”.20 No entanto, 
apesar dos pedidos junto ao Departamento de Estado e ao Foreign Office, tal não foi 
possível devido à resistência das grandes potências européias. Segundo Heitor Lira, a 
França e a Grã-Bretanha, “vale dizer, Clemenceau e Lloyd George”, entendiam que “a 
participação do Brasil, tanto nas conferências preliminares como na conferência plenária, 
devia ser a mais limitada, de vez que nossa colaboração na guerra fora também a mais 
modesta”.21 
 Essa primeira tentativa frustrada de obter um reconhecimento no estrangeiro maior 
do que a realidade da política internacional assim o permitia parece sugerir um 
descompasso entre os fins perseguidos pela diplomacia da época e os meios disponíveis do 
país. A esse respeito, valeria citar o relatório do Cônsul Hamilton Pires sobre a posição 
brasileira perante a Europa do pós-guerra, no qual se preconizava para o Brasil a conquista 
de um lugar que não fosse “demasiado modesto” e que lhe garantisse “influência política”. 
 
“Alguns homens de boa vontade tiveram a idéia de constituir o que se chamaria a 
‘Sociedade das Nações’. Conquanto esse projeto se ache ainda em estudo, já tem 
recebido a adesão de todos os estadistas da Entente que nele vêem o meio mais 
eficaz de preservar o futuro. (...) Outro meio para as nações da Entente, de manter a 
paz no mundo, meio de mais imediata aplicação que o precedente, será a 
constituição entre elas de um bloco econômico. (...) Nesses dois agrupamentos, a 
‘Sociedade das Nações’ e o bloco econômico, o nosso país deve naturalmente 
ocupar o posto que lhe convém. A imensidade das suas riquezas naturais e o papel 
que brilhantemente desempenhou nas conferências da Haia bastam para que, sem 
hesitação, se preveja que o lugar ocupado pelo Brasil será honroso. (...) Trata-se de 
uma justa e legítima ambição”. 22 
 
Ao mesmo tempo, em contradição com a “legítima ambição” que se levantava, 
reconhecia-se a circunstância de ser o país pouco conhecido no continente europeu, como 
admitiu Hamilton Pires: “Sofra, embora, o meu orgulho nacional, exige a verdade que se 
diga que somos ignorados”. 
 
19
 Laurita Pessoa Raja Gabaglia, Epitácio Pessoa: 1865-1942 (SP, José Olimpio, 1951, 2 v.), 
passim. 
20
 Gama a Ipanema (Embaixador em Washington), teleg. confidencial, RJ, 5 dez. 1918, AHI 
273/2/11; Gama a Magalhães (Ministro em Paris), teleg., RJ, 5 dez. 1918, AHI 273/2/11. 
21
 H.Lira, op.cit., vol.I, p.86. 
22
 “O Brasil perante a nova Europa”, relatório do Cônsul Hamilton Pires, 31 dez. 1918, AHI 
322/1/24. 
 
 
1.2. A presença na Conferência da Paz de 1919 
 
 Para realizar um acompanhamento prévio dos trabalhos da Conferência e preparar o 
terreno para a chegada da delegação completa, partiu para a Europa, em dezembro de 1918, 
João Pandiá Calógeras, Deputado por Minas Gerais e ex-Ministro da Agricultura e da 
Fazenda no governo Venceslau Brás. Pandiá Calógeras já havia sido então delegado às 
conferências pan-americanas de 1906 e 1910, e chefe da delegação brasileira à Conferência 
Financeira Pan-Americana de 1916.
23
 
Neste ínterim, Heitor de Souza fez um pronunciamento na Câmara dos Deputados 
exortando os delegados brasileiros a defenderem as idéias, os sentimentos, as aspirações e 
os legítimos interesses da nação, filiados à sua vocação liberal e pacífica, de respeito à 
igualdade jurídica dos Estados, conforme a tradição oriunda da Segunda Conferência da 
Haia.
24
 
 Uma vez em Paris, Calógeras procurou dar sentido a esse discurso se mostrando 
contrário à tendência que havia de classificar os países em duas categorias: os países de 
“interesses gerais” e os de “interesses particulares” ou “limitados”. Segundo registrou em 
seu diário da Conferência, várias vezes Calógeras tentou mostrar, em seus contatos com 
autoridades européias, como era “ilógico proclamar o princípio da Liga das Nações, cuja 
base é a igualdade delas perante o Direito, e negá-lo na aplicação”.25 
 Contudo, ao combater o comportamento das principais potências aliadas de 
pretenderem alijar os demais países do processo de tomada de decisões, que implicava 
também a exclusão do Brasil, Calógeras não escondia por outro lado a esperança de ver o 
Brasil se projetar com destaque na arena internacional. No exame preparatório dos vários 
problemas que se delineavam para o país na Conferência, Calógeras dizia que, mesmo nas 
questões mais peculiares à Europa, o Brasil não poderia ser indiferente caso não quisesse 
fechar, “por inércia própria”, a porta que se abria “de par em par para nosso ingresso como 
grande potência na política mundial”.26 Essa conduta aparentemente contraditória, ou seja, 
a defesa dos direitos das potências menores concomitante à aspiração de conquistar um 
status equivalente ao das grandes potências, iria permear toda a política brasileira na 
Conferência da Paz. 
 Diante da hipótese levantada nas conferências preliminares de permitir ao Brasil ter 
somente um delegado plenipotenciário nas sessões plenárias da Conferência, Domício da 
 
23
 Antonio G. de Carvalho, Calógeras (SP, Cia.Ed.Nacional, 1935), passim. 
24
 Anais da Câmara dos Deputados (1918), vol.XIV (RJ, Imprensa Nacional, 1920), sessão de 28 
dez. 1918, p.238-240. 
25
 Cf. “Conferência da Paz: Diário”, in Roberto Simonsen et alii, Calógeras na opinião de seus 
contemporâneos (SP, Tipografia Siqueira, 1934, p.59-78), p.66. 
26Id., p.64. 
Gama buscou o apoio dos Estados Unidos para aumentar a representação brasileira.
27
 Com 
efeito, na reunião de 14 de janeiro de 1919 do Conselho Superior de Guerra Aliado, 
confirmou-se que dos países beligerantes que haviam tomado parte menos direta na guerra, 
somente ao Brasil seria conferido o privilégio de se fazer representar por três delegados, 
sob a alegação de que a cifra de sua população dava ao Brasil uma condição diferenciada 
diante de outros países que se achavam em circunstâncias idênticas, porém com população 
muito menos densa.
28
 
 A imprensa francesa, no dia seguinte, criticou duramente essa decisão, atribuída à 
intervenção pessoal do Presidente norte-americano Woodrow Wilson, afirmando que o 
Brasil não merecia esse “tratamento especial”, já que a Bélgica e a Sérvia, com perdas 
muito maiores durante a guerra, só poderiam ter dois delegados.
29
 Em conseqüência, 
alguns dias depois ficou resolvido em definitivo que as grandes potências teriam cinco 
delegados cada uma, o Brasil, a Bélgica e a Sérvia, três delegados, e os demais países um 
ou dois delegados. Calógeras considerou ser esse “triunfo diplomático completo” o 
resultado da ação conjunta dos Estados Unidos e do Brasil, e que, com isso, “entrávamos 
para a Sala das Conferências com prestígio maior, realçado por uma vitória indiscutível, 
que nos coloca entre as maiores Potências, até que nos considerem, de fato, e é o que se 
dará, se Deus quiser, Grande Potência da mesma plana, do ponto de vista do Direito 
Internacional”.30 
 Consagrando o princípio da classificação das potências, o artigo 1º do regulamento 
da Conferência, aprovado na primeira sessão plenária, em 18 de janeiro de 1919, instituía 
que as potências com “interesses gerais” tomariam parte em todas as sessões e comissões, 
ao passo que as potências com “interesses limitados” só participariam das sessões em que 
fossem discutidas questões que as interessassem diretamente.
31
 Esse dispositivo, segundo 
Calógeras, seria “a exclusão, nas comissões, de todos os povos menos os chamados 
grandes”.32 
 Em resposta à proposta feita conjuntamente por Calógeras e Olinto de Magalhães, 
Ministro em Paris, de fazer oposição ao artigo 1º do regulamento.
33
 Domício da Gama, 
preocupado em não entrar em atrito com seus amigos norte-americanos, manifestou-se 
contra. Para Domício, convinha ponderar o seguinte: 1º) na realidade, cabia às nações 
vencedoras o principal papel naquela assembléia; 2º) sendo convidado para um congresso, 
cujo programa não fora chamado a colaborar, não cumpria ao Brasil reclamar contra seus 
 
27
 Cf. F. Vinhosa, op.cit., p.194-196. 
28
 Jornal do Commercio, 15 jan. 1919, p.1. 
29
 Magalhães a Gama, teleg., Paris, 15 e 16 jan. 1919, AHI 227/3/3. 
30
 “Conferência da Paz: Diário”, op.cit., p.67. 
31
 “Protocole nº 1 de la Conférence des Préliminaires de Paix”, séance plénière du 18 janvier 1919, 
AHI 273/2/14. 
32
 Pandiá Calógeras, “O Brasil e a Sociedade das Nações”, in Calógeras, Res nostra... (SP, Irmãos 
Ferraz, 1930), p.162. 
33
 Calógeras e Magalhães a Gama, teleg., Paris, 18 jan. 1919, AHI 227/3/3. 
termos; 3º) esses termos eram talvez prudentes, se visavam a evitar o perigo da influência 
nas deliberações e nos votos de interesse político avassalador; 4º) a marcha dos trabalhos 
seria demorada se desde o começo se entrasse a discutir e a reivindicar um direito fundado, 
mas dificilmente atendível naquele momento; e 5º) uma outra atitude poderia prejudicar o 
êxito das reclamações concretas que interessavam mais especialmente ao Brasil.
34
 
Essas reclamações concretas às quais se referia Domício da Gama eram basicamente 
duas: o pagamento pela Alemanha de depósitos relativos a venda de café do Estado de São 
Paulo no início da guerra e a questão da propriedade dos navios ex-alemães, apreendidos 
em portos brasileiros, como se verá a seguir.
35
 
 Apesar das recomendações de Domício, que não desejava comprometer “nossa 
situação de amigos agradecidos”,36 na manhã do dia 27 de janeiro, em reunião em separado 
dos delegados latino-americanos, Calógeras, fazendo-se líder do grupo, defendeu a tese do 
não-reconhecimento nem de grandes nem de pequenas potências, argumentando que 
mesmo se os interesses eram de fato desiguais, as soberanias deveriam ser consideradas 
iguais. No mesmo dia, Calógeras e Magalhães participaram de reunião de coordenação 
entre os países de “interesses limitados”, destinada a articular uma ação conjunta no caso da 
representação nas comissões, e insistiram naquela tese. Àquela altura, as pressões por 
mudanças no artigo 1º já haviam sortido algum efeito e as grandes potências se mostravam 
dispostas a aceitar a presença das potências menores nas diversas comissões da 
Conferência.
37
 
 Com a chegada a Paris de Epitácio Pessoa e dos demais membros da delegação 
brasileira, em 28 de janeiro, já havia sido estabelecido que o Brasil iria participar, como 
único representante latino-americano, da comissão encarregada de discutir e propor a 
organização da Liga das Nações. A delegação completa do Brasil à Conferência da Paz 
ficou assim constituída: Epitácio Pessoa, João Pandiá Calógeras, Olinto de Magalhães e 
Raul Fernandes, delegados plenipotenciários; Rodrigo Otávio de Langaard Menezes, 
consultor jurídico; Comandante Malan d’Angrogne, consultor militar; capitão-de-fragata 
Armando Burlamaqui, consultor naval; Hélio Lobo, secretário-geral; e mais sete secretários 
e oito adidos.
38
 
 A linha de ação que o Brasil iria seguir na Conferência já vinha sendo maturada na 
Chancelaria desde algum tempo. Em abril de 1918, um memorial do Itamaraty, de autor 
desconhecido, tecia considerações a respeito de assuntos que interessavam à política de 
 
34
 Gama à Legação em Paris, teleg., RJ, 23 jan. 1919, AHI 227/3/15. 
35
 Maiores detalhes sobre o encaminhamento dessas duas questões podem ser encontrados em: 
Epitácio Pessoa, Pela verdade (RJ, Francisco Alves, 1925), p.9-42; Mensagem de Epitácio Pessoa 
ao Congresso em 3 maio 1920, in: Mensagens Presidenciais: 1919-1922 (Brasília, Câmara dos 
Deputados, 1978), p.110-140; Amado Cervo & Clodoaldo Bueno, História da política exterior do 
Brasil (SP, Ática, 1992), p.198-201; F. Vinhosa, op.cit., p.211-231; ver também documentos 
diversos sobre o assunto nos volumes AHI 273/2/11 e 273/2/13. 
36
 Gama a Magalhães, teleg., RJ, 30 jan. 1919, AHI 227/3/15. 
37
 Calógeras, Res nostra..., op.cit., p.162-163. 
38
 “Composition de la Délégation du Brésil, Hotel Plaza Athénée”, AHI 273/2/14. 
liqüidação de guerra, com referência a interesses do Brasil. O texto, cuja leitura basta por 
si, dizia: 
 
“Nossa política definitivamente fechada com os Estados Unidos é a que melhor 
pode nos servir. A questão de nação satélite, sempre levantada, é puro e perfeito 
exagero de terceiro em detrimento de nossos reais interesses: de fato, em política 
nós temos procurado sempre acompanhar a orientação dos Estados Unidos, e isso 
nos tem servido para concertar muita cousa. Amapá, Acre, Peru, Panamá, questão 
Alsop, etc., etc. (...) O princípio da igualdade das nações soberanas não suprime a 
hierarquia e a categoria dentro dessa igualdade, e não são equívocas as 
demonstrações desse modo de pensar nos atos, nos gestos, nos discursos dos 
grandes responsáveis pela política do mundo”.39 
 
 
1.3. Epitácio Pessoa e a comissão da Liga das Nações 
 
 A idéia de se criar uma organização internacional com o intuito de preservar a paz 
entre os Estados e impedir a eclosão de novas guerras começou a ganhar vulto no início daPrimeira Guerra Mundial, tendo por base a adoção de princípios tais como a diplomacia 
aberta, o desarmamento, a arbitragem, a segurança coletiva e a cooperação 
econômico-social.
40
 Em sua mensagem dirigida ao Congresso norte-americano, em 8 de 
janeiro de 1918, conhecida como os “Quatorze Pontos”, o Presidente Wilson defendeu o 
estabelecimento de uma associação internacional de países com esses objetivos. O 14º 
ponto de Wilson dizia textualmente: 
 
“Uma associação geral de nações deve ser formada sob pactos específicos com o 
propósito de fornecer garantias mútuas de independência política e integridade 
territorial para grandes e pequenos Estados indistintamente”.41 
 
 A comissão da Liga das Nações reuniu-se pela primeira vez em 3 de fevereiro de 
1919, no Hotel Crillon, e dela faziam parte dez representantes das cinco grandes potências 
(Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, Itália e Japão) e cinco representantes das potências 
menores (Brasil, Bélgica, Sérvia, Portugal e China).
42
 
 Epitácio Pessoa, à semelhança de Calógeras, tivera a impressão geral de que em 
Paris tudo seria decidido exclusivamente pelas grandes potências, de acordo com seus 
interesses ou pontos de vista individuais, sendo a presença das pequenas nações destinada 
 
39
 Memoriais primitivos, AHI 273/2/13. 
40
 Frank P. Walters, A history of the League of Nations (London, Oxford Univ. Press, 1952), vol.I, 
p.15-24. 
41
 F.Hartmann (Ed.), Basic documents of international relations (Westport, Greenwood Press, 
1985), p.46. 
42
 Harold W.Temperley (Ed.), A history of the Peace Conference of Paris (London, Oxford Univ. 
Press, 1969, 6 v.), vol.VI, p.434. 
apenas a dar uma “aparência liberal” à organização da Conferência.43 Em virtude disso, 
Epitácio se uniu aos protestos do grupo de potências menores para aumentar em quatro o 
número de seus representantes na comissão da Liga das Nações, o que acabou sendo afinal 
aceito com a admissão, a partir da sessão de 6 de fevereiro, da Grécia, Tchecoslováquia, 
Polônia e Romênia.
44
 
 A propósito do projeto britânico de reservar somente às grandes potências a 
composição do Conselho Executivo da projetada Liga, limitando a participação dos demais 
países às discussões em que fossem parte diretamente interessada na questão, Epitácio 
Pessoa se opôs, pleiteando que todos os países tivessem representação permanente. Epitácio 
afirmara, na sessão de 4 de fevereiro da comissão, que pelo projeto britânico o Conselho 
não seria um órgão da Liga das Nações, mas “um órgão de cinco nações, uma espécie de 
tribunal”, ao qual todos teriam de se submeter. 45 Naquele momento, o Brasil firmou 
posição pela igualdade dos Estados e contra as fórmulas discriminatórias que estatuíam 
formalmente uma distinção entre países de primeira e de segunda classe. 
 Enquanto isso, prosseguiam os contatos entre as delegações brasileira e 
norte-americana em Paris. Em um encontro com Epitácio, Wilson chegou a pedir notícias 
de Domício da Gama, aparentemente surpreso por sua ausência na Conferência. Epitácio 
informou então que havia recebido a recomendação de apoiar os Estados Unidos em 
assuntos de seu interesse e que esperava também o auxílio da delegação norte-americana ao 
Brasil.
46
 
 Essa política de auxílio recíproco era visível mesmo nas matérias mais acessórias. 
Segundo um informe do Jornal do Commercio, durante a terceira sessão da comissão, 
Epitácio apresentou uma proposta na qual sugeria que se adotasse a expressão “Liga dos 
Estados” ou “União dos Estados”, em vez de “Liga” ou “Sociedade das Nações”. Wilson, 
achando razoável a mudança, ponderou que se conservasse a denominação de “Liga das 
Nações” por esta já ser uma expressão popular e consagrada pelo uso, solicitando enfim 
que não se insistisse na modificação, o que se fez, retirando Epitácio a sua proposta.
47
 
 A comissão encerrou a primeira fase de seus trabalhos em 13 de fevereiro, 
apresentando à apreciação pública um projeto de Pacto da Liga das Nações que foi lido por 
Wilson na sessão plenária da Conferência no dia seguinte. O projeto estabelecia que as 
potências menores teriam direito a quatro representantes no Conselho Executivo da Liga e 
que os quatro primeiros países a ocuparem esses postos, em caráter não permanente, seriam 
designados pela Conferência da Paz. Diante disso, Epitácio comunicou a Domício da Gama 
 
43
 Pessoa a Gama, teleg., Paris, 1 fev. 1919, reproduzido in Epitácio Pessoa, Obras completas, 
vol.XIV (RJ, INL, 1961), p.8. 
44
 “Rapport présenté à la Conférence par la Commission de la Société des Nations”, AHI 273/2/20. 
45
 Pessoa a Gama, teleg., Paris, 5 fev. 1919, in E. Pessoa, Obras completas, vol.XIV, op.cit., p.9, e 
Denys P. Myers, “Representation in League of Nations Council”, American Journal of 
International Law (vol.20, nº 4, October 1926, p.689-713), p.695. 
46
 Pessoa a Gama, teleg. confidencial, Paris, 7 fev. 1919, AHI 273/2/9. 
47
 Jornal do Commercio, 7 fev. 1919, p.1. 
a conveniência de que ele e Edwin V. Morgan, Embaixador norte-americano no Rio de 
Janeiro, telegrafassem a Wilson e a Robert Lansing, Secretário de Estado, para que fosse o 
Brasil um dos escolhidos. Epitácio lembrou na ocasião o prestígio que tal designação traria, 
pois o Brasil, único país beligerante na América do Sul, tinha a seu favor “títulos especiais” 
que o credenciavam ao posto.
48
 
 Cumpre mencionar, no decorrer da Conferência, o esforço brasileiro para ampliar 
ainda mais a participação das potências menores nas diversas comissões. No início de 
março, por exemplo, confirmando de certa forma seu papel de liderança no assunto, o 
Brasil garantiu na distribuição dos lugares sua presença na comissão econômica, 
posteriormente desdobrada em quatro subcomissões. Sobre esse fato, Epitácio fez questão 
de ressaltar que somente a Bélgica tinha-se feito representar em maior número de 
comissões do que o Brasil.
49
 
 A segunda série de reuniões da comissão da Liga das Nações iniciou-se a partir de 
22 de março, com o objetivo de discutir as emendas suscitadas pelo debate que se seguiu à 
apresentação do projeto de Pacto. Wilson, que havia viajado aos Estados Unidos para 
avaliar as reações internas às negociações de paz, retornou trazendo várias sugestões de 
emendas, entre elas a de se incluir uma referência explícita à compatibilidade entre a 
Doutrina Monroe e o Pacto, exigência do Senado norte-americano, de maioria 
republicana.
50
 
 Quando a questão foi levada à comissão, no dia 10 de abril, ficou claro que não se 
tratava de um apego a princípios por parte do Presidente Wilson, mas sim de uma 
necessidade política vital. Sabia-se, aliás, das restrições na Europa e na América Latina à 
validade universal da Doutrina Monroe. De qualquer modo, após uma dramática discussão, 
durante a qual Epitácio Pessoa permaneceu em silêncio todo o tempo, Wilson conseguiu 
que se formalizasse o reconhecimento da Doutrina Monroe no artigo 21 do Pacto da Liga, 
que ficou assim redigido: 
 
“Os compromissos internacionais, tais como os tratados de arbitragem, e os acordos 
regionais, como a doutrina de Monroe, destinados a assegurar a manutenção da paz, 
não serão considerados como incompatíveis com nenhuma das disposições do 
presente Pacto”.51 
 
 Frank Walters questionou, com relação a esse episódio, se o artigo 21 teria sido 
 
48
 Pessoa a Gama, teleg. confidencial, Paris, 13 fev. 1919, AHI 273/2/9; também in Obras 
completas, op.cit., p.14. 
49
 Pessoa a Gama, telegramas, Paris, 4 mar. 1919, 11 mar.1919 e 13 mar. 1919, todos in Obras 
completas, op.cit., p.18-20; “Protocolos das reuniões das potências com interesses particulares”, 
AHI 273/2/15. 
50
 A.LeRoy Bennett, International organizations: principles and issues (Englewood Cliffs, Prentice 
Hall, 1988), p.23. 
51
 Emilio R. Leuchsenring, La doctrina de Monroe y el Pacto de la Liga de las Naciones (Habana, 
Siglo XX, 1920), p.16-18. 
mesmo aceito caso fosse outro o país latino-americano representado na comissão e não o 
Brasil, mais propício a concordar com as teses norte-americanas.
52
 Para Afonso Arinos de 
Melo Franco, Epitácio estava preso à defesa de “modestos interesses econômicos” que 
dependiam, em última análise, da boa vontade do Presidente Wilson. Afonso Arinos foi 
taxativo: 
 
“O que Epitácio não disse então para não indispor o Presidente Wilson contra os 
nossos navios apreendidos e o café estocado - mesquinhas causas! - não deve deixar 
de provocar a atenção e a ação dos estadistas contemporâneos. Saber distinguir entre 
a grandeza histórica dos Estados Unidos e os riscos de seus interesses 
capitalistas”.53 
 
Na primeira dessas “mesquinhas causas”, tratava-se de garantir o recebimento do 
depósito feito na casa bancária Bleischroeder, de Berlim, ao iniciar-se a guerra, resultante 
da venda do café que o Estado de São Paulo possuía estocado em alguns portos europeus 
como garantia de dois empréstimos por ele contraídos. A partir de gestões conduzidas por 
Epitácio Pessoa, no âmbito da Comissão Financeira, obteve-se o reconhecimento da 
responsabilidade alemã pelo pagamento. A questão foi resolvida favoravelmente pelo 
Tratado de Versalhes, pois “à Alemanha foi determinada a restituição da importância 
referente à venda do café ao câmbio do dia do depósito e com os juros convencionados, a 
partir do dia do depósito”.54 O artigo 263 do Tratado, um dos poucos que fazia menção 
direta ao Brasil, dizia textualmente: 
 
“A Alemanha dá garantias ao governo brasileiro de que todas as somas 
provenientes da venda do café pertencente ao Estado de São Paulo nos portos de 
Hamburgo, Bremen, Antuérpia e Trieste, que foram depositadas no Banco 
Bleischroeder de Berlim, deverão ser reembolsadas com juros à taxa ou taxa que 
houverem sido convencionadas. A Alemanha, tendo-se oposto à transferência, em 
tempo útil, das ditas somas ao Estado de São Paulo, garante também que o 
reembolso será efetuado à taxa cambial ao dia do depósito”.55 
 
 A segunda questão teve um encaminhamento mais complicado. O Brasil contava, 
em julho de 1916, com um frota mercante de 169 navios de alto-mar, totalizando 297.800 
toneladas, dos quais 63 pertenciam ao Lloyd Brasileiro, 23 à Companhia Comércio e 
Navegação, 20 à Companhia Nacional de Navegação Costeira, e os restantes a companhias 
menores. Ao romper relações diplomáticas com a Alemanha, em abril de 1917, o Brasil 
 
52
 F.P. Walters, op.cit., p.56. 
53
 Afonso Arinos de Melo Franco, “As relações exteriores na década de 1920-1930”, in As relações 
exteriores na Primeira República, vol.III (SP, pesquisa bibliográfica/INSIDE, 1983, 6 v.), p.11-13. 
54
 Cervo & Bueno, op.cit., p. 198-199. Ver também Vinhosa, op. cit., p. 211-231. 
55
 O texto completo do Tratado de Versalhes pode ser acessado no site da Internet mantido pelo 
Departamento de História da Universidade de San Diego: 
<http://ac.acusd.edu/History/text/versaillestreaty/vercontents.html>. 
havia arrestado, a título de “posse fiscal”, 46 navios mercantes alemães surtos em portos 
brasileiros, o que representava, portanto, mais de um quarto da Marinha mercante 
brasileira.
56
 Destes, 30 foram posteriormente afretados à França, mediante convênio entre 
os dois países. 
Durante a Conferência, a comissão de finanças em dado momento resolveu que 
todos os navios alemães apreendidos seriam partilhados entre os aliados na proporção de 
suas perdas marítimas. Essa decisão iria atingir duramente o Brasil, que havia capturado 
tonelagem maior do que suas perdas e seria então obrigado a ceder navios a países que 
haviam perdido mais na guerra, como se pode ver pela tabela a seguir: 
 
 
PROPORÇÃO ENTRE PERDAS MARÍTIMAS E NAVIOS ALEMÃES CAPTURADOS 
 
 
País interessado 
Perda 
(toneladas) 
Captura 
(toneladas) 
 
Inglaterra 
 
8.000.000 
 
500.000 
 
França 
 
930.000 
 
50.000 
 
Estados Unidos 
 
430.489 
 
628.000 
 
Brasil 
 
25.000 
 
216.000 
 
Fonte: Francisco L. T. Vinhosa. O Brasil e a Primeira Guerra Mundial. RJ, IHGB, 1990, p. 225. 
 
 
 
 Os Estados Unidos estavam na mesma situação do Brasil (tonelagem de captura 
maior do que as perdas) e tinham todo o interesse em não permitir a adoção de uma medida 
que favoreceria claramente a Inglaterra e a França. Quando, em abril de 1919, cogitou-se da 
possibilidade de que o Brasil não assinasse o Tratado de Versalhes caso as resoluções sobre 
os navios ex-alemães não fossem alteradas, Epitácio Pessoa escreveu a Woodrow Wilson 
afirmando que aquela era “uma questão capital para o Brasil” e que, desse modo, fazia um 
apelo ao governo norte-americano, “seu antigo amigo e aliado”, a fim de que este 
intercedesse em favor da tese brasileira. Em sua resposta, Wilson prometeu tratar do 
assunto com a maior consideração, salientando que os Estados Unidos “jamais fariam 
intencional ou conscientemente qualquer coisa que pudesse prejudicar os interesses 
brasileiros”.57 E, como se sabe, ao amparo dos princípios contidos no artigo 297 do Tratado 
de Versalhes, prevaleceu afinal a tese do Brasil de não aceitar a partilha dos navios na 
proporção das perdas marítimas de cada país, como pretendia a França. 
 Quanto à indicação do Brasil como membro temporário do Conselho da Liga, 
 
56
 Cf. Relatório do MRE, 1918, p. 66 e 71. Ver também Ministério da Marinha, História naval 
brasileira (RJ, Serviço de Documentação Geral da Marinha, 1985, vol. 5, tomo II), p. 246. 
57
 E. Pessoa, in Obras completas, op.cit., p. 209-213. 
Epitácio teve ainda de solicitar a ação urgente de Domício da Gama junto à delegação 
norte-americana para esse fim.
58
 Domício fez saber a Polk, Subsecretário de Estado, a 
“importância política” que o Brasil ligava a essa representação, declarando-se “ansioso” 
pelo resultado.
59
 
 A seleção dos quatro países de “interesses limitados” a ocuparem assentos não 
permanentes no Conselho da nova organização foi decidida pelas grandes potências em 
conversações exploratórias no mês de abril. Tendo Robert Cecil, delegado britânico, 
concordado com a designação de pelo menos um país da América Latina, o coronel Edward 
House, conselheiro particular de Wilson, indicou o Brasil para o posto. A notícia foi 
comunicada em primeira mão a Epitácio por Stephen Bonsal, intérprete confidencial de 
Wilson na Conferência.
60
 Assim, em 28 de abril de 1919, na sessão plenária que aprovou o 
texto final do Pacto da Liga das Nações, foram homologadas as indicações do Brasil, da 
Bélgica, da Grécia e da Espanha. O Conselho ficaria então composto por cinco membros 
permanentes (as grandes potências: Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, Itália e Japão) e 
quatro membros não permanentes. 
 A entrada do Brasil para o Conselho da Liga, conseguida, portanto, graças à ação 
providencial dos Estados Unidos, foi interpretada pelo governo brasileiro como uma grande 
vitória, “honra vivamente ambicionada por todas as nações”.61 Pode-se afirmar que o Brasil 
adotou com relativo sucesso uma estratégia de troca com os Estados Unidos na Conferência 
da Paz, constituindo tacitamente umaparceria assimétrica instrumental à defesa de seus 
interesses materiais e ao fortalecimento de seu prestígio internacional. Epitácio Pessoa, 
cultor dessa política, barganhou a ajuda norte-americana nas questões concretas de interesse 
capital para o país, fazendo algumas concessões em relação ao Pacto da Liga. O limite dos 
protestos do Brasil era dado somente pela sua condição de aliado fiel dos Estados Unidos. 
 Quanto ao discurso em prol dos direitos das potências menores, cristalizado no 
princípio da igualdade dos Estados (idealismo), o Brasil terminou por negá-lo na prática 
aceitando o princípio inverso, o da classificação das potências (realismo), expresso na 
constituição do Conselho da Liga, que concedia unicamente às grandes potências o 
privilégio de ali permanecerem ad infinitum. Em outras palavras, enquanto sua própria 
participação nas decisões da Conferência era limitada pelo controle das grandes potências, 
o Brasil se uniu ao coro de protesto dos pequenos Estados, mas diante de um fato 
consumado que lhe foi dado pela dinâmica internacional, com a possibilidade de vir a 
pertencer ao órgão de cúpula da Liga, o Brasil se rendeu à sua aspiração de grandeza e 
aceitou de bom grado uma posição diferenciada no concerto das nações. 
 
 
58
 Pessoa a Gama, teleg. urgente, Paris, 12 abr. 1919, in Obras completas, op.cit., p.30. 
59
 Gama a Ipanema, teleg., RJ, 14 fev. 1919; Gama a Ipanema, teleg., RJ, 13 abr. 1919, AHI 
235/3/8. 
60
 Stephen Bonsal, Unfinished business (Garden City, Doubleday, Doran, 1944), p.204. 
61
 Pessoa a Gama, teleg., Paris, 2 jun. 1919, in Obras completas, op.cit., p.51. 
 
 
 
1.4. O debate interno sobre a adesão do Brasil à Liga 
 
 A opinião pública mundial manifestou durante a Grande Guerra o seu 
descontentamento com os métodos tradicionais de condução da diplomacia, como as 
políticas de equilíbrio de poder, os “conchavos de gabinete”, o sistema de alianças e a 
corrida armamentista, que se acreditava terem inexoravelmente levado o mundo à 
hecatombe. Dizia-se também que a aplicação do direito internacional esbarrava no princípio 
da soberania absoluta dos Estados, que não admitiam submeter-se a uma autoridade 
supranacional, argumento esse comumente utilizado por juristas internacionalistas. 
 No Brasil, esse tipo de abordagem esteve representado, entre outros, por Antonio 
Moreira de Abreu, que, escrevendo para o Diário de Minas, em 1918, preconizava o 
estabelecimento de um órgão protetor nas relações internacionais, “de um poder superior à 
vontade dos governos dos Estados singulares”, que viesse a traçar a rota jurídica a seguir na 
órbita internacional.
62
 Por este prisma, como assinala Lynn Miller, a Liga das Nações teria 
inaugurado o “desafio do século XX à ordem de Westfália”, em referência à paz concluída 
após a Guerra dos Trinta Anos, em 1648, quando os Estados europeus se reconheceram 
mutuamente como unidades políticas soberanas e independentes.
63
 
Contudo, a despeito de se apresentar na época como um experimento 
revolucionário, a Liga das Nações não representou uma alteração fundamental no sistema 
de Estados soberanos. Para Inis Claude, seus fundadores sancionaram o sistema interestatal 
vigente, com o seu núcleo na Europa, a inviolabilidade das soberanias e o predomínio 
político das grandes potências.
64
 A Liga, por conseguinte, possuía também uma natureza 
eminentemente conservadora, resultado de concessões de parte a parte entre as potências 
vitoriosas sobre como remodelar a nova ordem mundial do pós-guerra. 
 A estrutura da organização reproduziu os paradoxos existentes entre as tendências 
históricas de longa duração e as pressões e os interesses de curto prazo dos Estados. 
Delineou-se, dessa forma, o arcabouço político-ideológico implícito na constituição dos três 
órgãos principais da Liga: o Conselho, a Assembléia e o Secretariado. O Conselho, órgão 
restrito, incumbido da gerência da paz, foi por assim dizer uma nova edição revista do 
Concerto Europeu, destinada a garantir às grandes potências o controle sobre o poder de 
decisão da Liga; a Assembléia, aberta e universal, atendeu às reivindicações liberais e 
democráticas de debate público e de diplomacia parlamentar, consoante à tendência 
 
62
 Diário de Minas, 4 jul. 1918, artigo de Antonio Moreira de Abreu, in A.M. Abreu, A Liga das 
Nações (RJ, Papelaria Brasil, 1919), p.13. 
63
 Lynn H. Miller, Global order: values and power in international politics (Boulder, Westview 
Press, 1990), p.43-52. 
64
 Inis L. Claude, Jr., Swords into plowshares (New York, Random House, 1971), p.54. 
esboçada nas duas Conferências da Haia; o Secretariado, por fim, seria o escritório 
administrativo encarregado de coordenar a cooperação amistosa entre os Estados nas áreas 
técnicas de interesse comum, como já vinha ocorrendo por meio de agências internacionais 
tais como a União Telegráfica Internacional e a União Postal Universal.
65
 
 A adesão do Brasil à Liga das Nações recebeu algumas críticas internas. O 
Deputado Maurício de Lacerda, por exemplo, contrário ao alinhamento do Brasil com os 
Estados Unidos, entendia que a Liga já tinha nascido “falida, incapaz, desmoralizada pelo 
internacionalismo imperialista que introduziu em cada um de seus artigos”. Lacerda previa 
que a Liga seria formada primordialmente entre três ou quatro grandes países, aos quais 
iriam-se agregando os pequenos, o que lhe induzia a pensar que a Liga seria, enfim, um 
mero “instrumento de captação dos fracos na rede dos fortes”.66 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O cão da guerra contido pela focinheira da Liga das Nações. 
Extraído de Literary Digest, 13 de setembro de 1919. 
 
 
 O eixo central do debate girou em torno das eleições presidenciais de 1919, 
disputadas entre Rui Barbosa, pela oposição, e Epitácio Pessoa, candidato oficial, este 
último tendo sido eleito em 13 de abril quando ainda se encontrava em Paris. Essa 
circunstância trouxe para o âmbito da política interna os temas da participação brasileira na 
Conferência da Paz e, de forma mais ampla, da orientação de política externa seguida pelo 
governo. 
 Em sua primeira mensagem ao Congresso Nacional como Presidente da República, 
Epitácio Pessoa fez uma longa explanação sobre os esforços da delegação brasileira na 
 
65
 Id., ibid., p.43. 
66
 Anais da Câmara dos Deputados (1919), vol.I (RJ, Imprensa Nacional, 1920), sessão de 15 maio 
1919, p.279-289. 
 
questão do café e, principalmente, na dos navios ex-alemães. Somente no parágrafo final da 
parte relativa às relações exteriores algumas palavras foram dedicadas à organização da 
Liga das Nações e à colaboração do Brasil, que teria estado “sempre ao lado da causa dos 
fracos, de todas as reivindicações justas, de todos os nobres ideais”, sendo devido aos seus 
próprios méritos e à sua “elevação moral” que se obteve a “honra insigne” de figurar entre 
os nove membros do Conselho.
67
 
 Rui Barbosa contestou a interpretação oficial de que o Brasil havia granjeado uma 
elevada posição internacional como líder das pequenas nações na Conferência da Paz. 
Fazendo um paralelo com a sua própria atuação na Segunda Conferência da Haia, Rui 
centralizou sua argumentação nos reparos à política de “protetorado” seguida pelo Brasil, 
afirmando então: 
 
“Brasileiro sou; e, porque sou brasileiro, não abato a minha Pátria a nenhuma 
amizade internacional por mais alta, por mais gloriosa, por mais benfazente que 
seja. (...) Entre os Estados Unidose o Império Britânico, nenhuma tendência nutro, 
que me levasse jamais a converter o Brasil no protegido internacional desta ou 
daquela. Não. O que eu quereria, era ver a minha Pátria igualmente acatada por 
ambas, mantendo para com as duas essa independência, estritamente observada, que 
as menores de todas as nações, as Bélgicas e as Suíças, logram manter, quando é o 
povo que exerce a soberania. (...) Antes de amigo dos Estados Unidos, ou de 
qualquer outra nação do mundo, amigo sou do Brasil”.68 
 
 O Imparcial, jornal vinculado à campanha de Rui Barbosa, dedicou particular 
atenção à defesa do princípio da soberania nacional no tocante à Liga das Nações. Em 
editorial de 3 de maio de 1919, o jornal sustentou que na Conferência em Paris havia 
prevalecido a “oligarquia das grandes potências” na condução dos trabalhos, restando aos 
demais países a função de “penetras”. A Liga seria uma “sociedade das grandes e das 
pequenas nações” e seu Conselho composto de uma maioria formada pelos big five e uma 
“minoria de representantes transitórios da poeira impalpável das soberanias secundárias”. 
Assim, ao entrar para o Conselho, o Brasil aceitava a sua classificação “entre os povos de 
soberania subalterna” em relação às potências de primeira grandeza. Finalmente, 
levantando objeções jurídicas relativas à compatibilidade entre o Pacto da Liga e a 
Constituição brasileira, O Imparcial criticou o governo por ter aderido a um acordo 
internacional que transferia ao estrangeiro “atributos essenciais da nossa soberania”.69 
 Como resposta, o governo brasileiro fez publicar no Jornal do Commercio, de 6 de 
maio, um artigo de Clóvis Bevilaqua, consultor jurídico do Itamaraty. Nesse artigo, 
 
67
 “Mensagem do Presidente da República ao Congresso Nacional em 3 de maio de 1920”, in 
Mensagens Presidenciais:1919-1922, op.cit., p.141. 
68
 Rui Barbosa, “O caso internacional”, in Obras completas, vol.XLVI, op.cit., p.244 e 257. 
69
 “A Liga das Nações e a soberania nacional”, O Imparcial, editorial de 3 maio 1919; ver também 
O Imparcial de 4 maio 1919, “A vitória e os princípios”, e de 7 maio 1919, “Renúncia da 
soberania”. 
Bevilaqua defendeu o princípio da autolimitação e procurou legitimar a aceitação em tese 
de regras internacionais que pudessem porventura criar restrições à soberania de um 
Estado. Conforme se pode depreender de sua análise, a reciprocidade entre as partes 
contratantes era a chave da fundamentação jurídica que justificava a solidariedade do Brasil 
aos aliados no caso da Liga: 
 
“É bem de ver que nações ciosas de sua dignidade não entrariam para essa 
agreminação, por mais elevados que fossem os intuitos visados, se tivessem de 
abdicar de sua soberania, de aceitar uma posição que as diminuísse moral ou 
periodicamente. O Brasil aceita, em benefício da concórdia dos povos, os deveres 
que a Liga impõe, como os aceitam os Estados Unidos, a França, a Inglaterra e todas 
as potências que se congregaram para criar obstáculos à guerra”.70 
 
 Aníbal Pinheiro, jornalista enviado por O Imparcial a Paris, após estudar as 
atribuições previstas no Pacto da Liga para o Conselho e a Assembléia, concluiu que existia 
uma “supremacia absoluta” das cinco grandes potências nas deliberações da organização. 
Pinheiro estava convencido de que a representação brasileira no Conselho tinha sido “uma 
isca que nos atiraram, em bom anzol, para que subscrevêssemos esse pacto inominável”.71 
 Tendo sido incorporado à Parte I do Tratado de Versalhes, assinado em 28 de junho 
de 1919, o Pacto da Liga das Nações foi levado ao Congresso Nacional para a sua 
ratificação em novembro de 1919, o que se deu sem maiores dificuldades. O deputado 
Joaquim Osório, simbolizando o estado de espírito da maioria dos parlamentares, 
pronunciou-se a favor do Tratado por entender que não havia nele uma só medida que 
contrariasse os interesses do Brasil, muito pelo contrário, todas as medidas, segundo ele, 
correspondiam às aspirações brasileiras e aos “sentimentos gerais da humanidade”.72 O 
nascimento oficial da Liga das Nações, porém, só se deu em 10 de janeiro de 1920, quando 
da entrada em vigor do Tratado de Versalhes. 
 Em suma, o Brasil ingressou na Liga das Nações como membro originário por ter 
sido essa a conseqüência natural de sua decisão de integrar a aliança das potências 
vitoriosas na Primeira Guerra Mundial. As críticas da oposição, realizadas no contexto da 
campanha presidencial de 1919, denunciaram a posteriori a acomodação pragmática do 
Brasil na questão do Conselho. O apoio brasileiro à organização pela qual se bateu o 
Presidente Wilson não deixou de ser, por outro lado, mais um capítulo da política de 
aproximação entre o Brasil e os Estados Unidos na República Velha. 
 
 
 
70
 “A Liga das Nações e a soberania dos Estados”, artigo de Clóvis Bevilaqua, Jornal do 
Commercio, 6 maio 1919. 
71
 “A Liga das Nações: os seus poderes orgânicos”, artigo de Aníbal Pinheiro, O Imparcial, 10 
maio 1919. 
72
 Anais da Câmara dos Deputados (1919), vol.X (RJ, Imp. Nacional, 1920), sessão de 7 nov. 1919, 
p.562-575. 
 
CAPÍTULO 2 
 
LEALDADE E PRESTÍGIO NOS PRIMEIROS ANOS EM GENEBRA 
 
 
 
2.1. A inserção do Brasil na ordem internacional de Versalhes 
 
 As transformações engendradas pela Primeira Guerra Mundial tiveram um impacto 
duradouro no curso da história contemporânea. Suas conseqüências não se resumiram às 
alterações territoriais que redesenharam o mapa-múndi nem aos 440 artigos do Tratado de 
Versalhes, que os alemães receberam como um Diktat. Sobre os efeitos imediatos da 
guerra, bastaria dizer que o conflito assinalou a queda de pelo menos quatro grandes 
impérios: o Império Austro-Húngaro, o Império Alemão, o Império Russo e o Império 
Otomano.
73
 
 Visto com o distanciamento dos olhos de um historiador, parece lícito afirmar que o 
mundo no pós-guerra presenciou o advento de dois movimentos de reação à velha ordem 
colonial eurocêntrica, ambos acenando com a realização da utopia e a superação dos males 
do passado, consubstanciados em ideologias globalizantes e sedutoras: de um lado, Wilson, 
trazendo para a Europa o sonho americano da democracia e da autodeterminação dos 
povos; de outro, Lênin, com o chamado à revolução socialista que viria a pôr fim nas 
ambições imperialistas das potências capitalistas. Tanto Wilson como Lênin, apesar de suas 
divergências, criticavam o velho sistema europeu de equilíbrio de poder e apelavam 
diretamente à ação dos povos para a sua redenção, fazendo-se apóstolos de um novo tempo 
de paz universal.
74
 
 A ordem internacional que emergiu de Versalhes, no que se refere à diplomacia, 
marcou-se pelo embate entre forças contrárias, entre o velho e o novo, entre a conservação 
e a mudança. O período entreguerras pode ser caracterizado como uma era de crises e 
inquietações nas relações internacionais, já agora ampliadas para a dimensão de um sistema 
global, mas ainda artificialmente centradas na política européia, como se vê, por exemplo, 
pela escolha da cidade de Genebra, na Suíça, para a sede da recém-criada Liga das 
Nações.
75
 
 A inserção do Brasil se dava em um contexto histórico profundamente alterado, 
 
73
 René Rémond, O século XX: de 1914 aos nossos dias (SP, Cultrix, 1974), p.30-31. Sobre o 
legado da Primeira Guerra Mundial para as relações internacionais no período entreguerras ver, 
entre outros, A.J.P. Taylor, The origins of the Second World War (Greenwich, Fawcett Publications, 
1969), p.22-43. 
74
 Geoffrey Barraclough, Introdução àhistória contemporânea (RJ, Guanabara, 1987), p.113-118. 
75
 Uma análise mais detalhada da política internacional na Europa pós-Versalhes será feita no 
Capítulo 4, item 4.1. 
repleto de dificuldades econômicas, disputas políticas e dissensões internas. Alguns traços 
marcaram a política externa brasileira na década de 1920: alinhamento com os Estados 
Unidos e tentativa do Brasil de estabelecer uma relação especial entre os dois países; busca 
de reconhecimento internacional e uso da diplomacia multilateral como instrumento para 
fortalecer o prestígio do país no exterior; continuidade do modelo econômico de 
valorização do café e de estímulo à agroexportação; e resistência às propostas de 
desarmamento, tema dominante na agenda mundial nos anos vinte, em função da sensação 
de vulnerabilidade estratégica e de isolamento diplomático na América do Sul.
76
 
 A diplomacia brasileira na época era construída grosso modo sobre o legado de dois 
expoentes da República Velha: o Barão do Rio Branco e Rui Barbosa. Do Barão, homem 
pragmático, um executor mais do que um intelectual, permaneceu a idéia de “aliança não 
escrita” com os Estados Unidos e de restauração do status brasileiro no plano 
sub-regional.
77
 De Rui Barbosa, mestre da retórica e acima de tudo um doutrinador, 
conservou-se a matriz universalista de seu pensamento jurídico-liberal, cujas diretrizes se 
converteram pouco a pouco em princípios “tradicionais” que à política externa cabia 
cultivar e preservar no relacionamento internacional. Assim, as oligarquias dominantes 
conduziam as relações exteriores do país baseando-se a um só tempo em uma prática 
realista e em um discurso idealista, tendo de recorrer às vezes a grandes malabarismos para 
não manchar de manifesta incoerência a reputação diplomática do Brasil no estrangeiro. 
 Para essas oligarquias agromercantis então no poder, como assinala Clodoaldo 
Bueno, o Brasil era tipicamente uma “nação satisfeita”, sem ambições territoriais, de 
vocação pacífica e liberal, e de acordo com a divisão internacional do trabalho que lhe 
conferia o papel de exportador de produtos primários, notadamente o café. Além disso, o 
comparecimento às conferências internacionais americanas e às reuniões do Conselho da 
Liga das Nações dava ao Brasil “a ilusão de estar participando das decisões 
internacionais”. 78 Na América do Sul, buscava-se a consolidação das fronteiras e a 
estabilidade na Bacia do Prata, visando a conter a influência argentina nos países vizinhos. 
A rivalidade com a Argentina, aliás, não se limitava à luta pela supremacia regional, mas se 
estendia à competição por prestígio internacional na Europa e, em particular, na Liga das 
Nações. Parecia que o país já havia alcançado o seu ponto ótimo de desenvolvimento 
econômico, como país “essencialmente agrícola”, pouco restando a fazer senão garantir a 
defesa nacional contra agressões externas (o que alimentava certa preocupação defensiva na 
 
76
 Stanley E. Hilton, “Brazil and the post-Versailles world: elite images and foreign policy strategy, 
1919-1929”, Journal of Latin American Studies, (nº 12, part II, November 1980, p.341-364), 
passim; Amado Cervo & Clodoaldo Bueno, História da política exterior do Brasil (SP, Ática, 
1992), p.182-183; Afonso Arinos de Melo Franco, “As relações exteriores na década de 
1920-1930”, in: As relações exteriores na Primeira República, vol.III (SP, pesquisa 
bibliográfica/INSIDE, 1983, 6v.), passim. 
77
 Sobre a política exterior do Barão do Rio Branco ver Bradford Burns, The unwritten alliance: 
Rio-Branco and Brazilian-American relations (New York, Columbia Univ. Press, 1966) e Cervo & 
Bueno, op.cit., p.162-181. 
78
 Cervo & Bueno, op.cit., p.203. 
área militar)
79
 e desfrutar, com indisfarçável regozijo, dos ganhos simbólicos em termos de 
prestígio advindos da participação brasileira na Conferência da Paz de Paris. 
 Quanto a isso, digna de nota é a viagem de regresso da França de Epitácio Pessoa, 
durante a qual o Presidente eleito esteve de passagem pela Bélgica, Itália, Grã-Bretanha, 
Portugal, Estados Unidos e Canadá. Em todos os lugares que visitou, Epitácio recebeu 
manifestações de apreço e de simpatia pelo Brasil que confirmavam a boa imagem do país 
após a guerra, fato reconhecido mesmo pelos órgãos de imprensa da oposição, dentre eles O 
Imparcial.
80
 
 Durante o governo Epitácio Pessoa, foram elevadas à categoria de Embaixada as 
representações diplomáticas no Rio de Janeiro da Grã-Bretanha, Itália e França (1919), da 
Bélgica (1921), e do Japão, Argentina e Chile (1922).
81
 Anote-se, ainda, a visita dos reis 
belgas em 1920, que no entender de Laurita Gabaglia era “uma honra sem precedentes”, 82 
e a vinda de dois Secretários de Estado norte-americanos: Bainbridge Colby (1920) e 
Charles E. Hughes (1922). Lisonjeado por todos esses sinais de reconhecimento 
internacional, Epitácio não hesitou em definir as relações do Brasil com as outras nações 
como “excelentes”, destacando que “a situação de acatamento e prestígio” de que gozava o 
país no convívio internacional era “fato notório” que muito desvanecia o governo.83 
 O período posterior à Primeira Guerra Mundial marcou também o declínio da 
influência britânica e o avanço da penetração norte-americana na economia brasileira.
84
 Era 
grande a importância atribuída pelo Brasil à cooperação com os Estados Unidos, seja pela 
percepção de traços distintivos comuns que colaborariam para separar os dois países da 
América hispânica, seja pelos laços comerciais e financeiros cada vez mais estreitos, dos 
quais a dependência brasileira do mercado consumidor norte-americano era apenas uma de 
suas facetas. Entre 1921 e 1925, 42% do total das exportações brasileiras se dirigiam aos 
Estados Unidos. Em 1926, essa soma equivalia a 47% do total. Segundo Victor Valla, o 
Brasil, disputando a posição de líder sul-americano com a Argentina, procurava prestígio, 
apoio, proteção e um mercado permanente para suas exportações de café, ao passo que os 
Estados Unidos viam o Brasil como um parceiro confiável em um continente hostil e 
 
79
 Ver Lawrence H. Hall, João Pandiá Calógeras, minister of war, 1919-1922 (PhD Dissertation, 
New York University, 1984). 
80
 Os discursos, pronunciamentos e homenagens recebidas por Epitácio Pessoa nesses países estão 
coligidos in Obras completas, vol.XIV (RJ, INL, 1961), p.73-134. 
81
 Relatório do Ministério das Relações Exteriores, anos de 1919 a 1922. 
82
 Laurita Pessoa Raja Gabaglia, Epitácio Pessoa: 1865-1942 (SP, José Olimpio Ed., 1951), vol.I, 
p.385. 
83
 “Mensagem ao Congresso Nacional de 3 de maio de 1922”, in Mensagens Presidenciais: 
1919-1922 (Brasília, Câmara dos Deputados, 1978), p.415. 
84
 Cf. Cervo & Bueno, op.cit., p.183-187; Paul Singer, “O Brasil no contexto do capitalismo 
internacional (1889-1930)” in Bóris Fausto (org.), História Geral da Civilização Brasileira, vol.8 
(SP, Difel, 1975); Emily S. Rosenberg, World War I and the growth of United States 
preponderance in Latin America (PhD Dissertation, State University of New York, 1973), 
p.76-110; e Victor V. Valla, A penetração norte-americana na economia brasileira (1898-1928) 
(RJ, Ao Livro Técnico, 1978). 
antiamericanista, além de representar um mercado promissor para seus produtos 
industrializados.
85
 
No período 1919-1930, os Estados Unidos foram de longe o principal parceiro 
comercial do Brasil, tanto do ponto de vista das exportações quanto das importações, com 
expressivo superávit para o Brasil na balança comercial. A Grã-Bretanha ainda contribuía 
com parcela importante das importações brasileiras,