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1 2 3 4 5 AGRADECIMENTOS À minha querida mãe por acreditar em mim, me apoiar e, mesmo estando distante em alguns momentos, me fazer sentir a certeza de que estava sempre ao meu lado. Agradeço pela sua imensa paciência e compreensão das diversas fases que vivi em minha vida até este momento. À toda minha família: pai, irmão e irmãs, sobrinhos, primos... A duas grandes mestras que dividiram comigo muitos conhecimentos durante meu período na Universidade. Profª. MSc. Kalynka Cruz por me guiar no meio acadêmico-científico, além de orientar este trabalho. Profª. Adelaide Oliveira por me fazer sentir paixão pela carreira acadêmica, pelo audiovisual e por me inspirar a ser um pai amoroso e companheiro assim como a mãe que ela é; um profissional competente, responsável e sempre de bem com a vida assim como ela é; um cidadão preocupado e comprometido com os direitos dos que menos assistem deles, da mesma forma que ela é. A todos os amigos e colegas de curso por compartilharem diversos momentos comigo dentro e fora da Universidade. A todos os colegas e amigos que me fizeram companhia, na maioria das vezes virtual, durante as horas de elaboração deste trabalho. À sempre dedicada, competente, companheira e amiga Andreza Vasconcelos por aceitar o desafio de me ajudar a produzir a HQtrônica “A equipe do PH” e por aturar a minhas constantes cobranças e brincadeiras. Aos três membros da família Carvalho Pires pelo respeito, amor, por me mostrarem o outro lado da vida, pelo constante apoio, força, carinho e confiança. À família Siqueira Chaar pela dedicação, ajuda, apoio e amor que me deram durante anos. A todos os colegas de trabalho da Assessoria de Comunicação da UFPA pelo incentivo, acolhimento e por serem minha segunda família. Ana Carolina Pimenta, Rosyane Rodrigues e em especial à Júlia Lopes, revisora deste trabalho. Aos líquidos: Diolene Machado, Brena Freire, Larissa Bezerra e José Fonteles por dividirem comigo muitas alegrias sólidas. 6 RESUMO O presente trabalho propõe e investiga a utilização de Histórias em Quadrinhos eletrônicas (HQtrônica) como ferramenta educacional voltada para cursos de Comunicação Social do Brasil no intuito de fornecer uma contribuição para o processo de ensino-aprendizagem nesses cursos. A investigação é feita por meio da aplicação da HQtrônica "A equipe do PH", a qual utiliza recursos transmidiáticos para retratar temas do cotidiano da sociedade, apoiada no conceito de modernidade líquida de Zygmunt Bauman. Palavras-chave: ferramenta educacional; história em quadrinhos eletrônica; HQtrônica; divulgação científica; objetos de aprendizagem; modernidade líquida; cognição. 7 8 9 LISTA DE SIGLAS HQ – História em Quadrinhos HQtrônica – História em Quadrinhos eletrônica AO – Objetos de Aprendizagem CD-ROM – Compact Disc Read-Only Memory (Disco Compacto - Memória Somente de Leitura) HQ-ROM – História em Quadrinhos Read-Only Memory LISTA DE FIGURAS Figura 01 ......................................................................................................... 12 Figura 02 ......................................................................................................... 13 Figura 03 ......................................................................................................... 14 Figura 04 ......................................................................................................... 15 Figura 05 ......................................................................................................... 15 Figura 06 ......................................................................................................... 17 Figura 07.......................................................................................................... 18 Figura 08 ......................................................................................................... 18 Figura 09 ......................................................................................................... 23 Figura 10 ......................................................................................................... 25 Figura 11 ......................................................................................................... 25 Figura 12 ......................................................................................................... 27 Figura 13 ......................................................................................................... 28 Figura 14 ......................................................................................................... 46 Figura 15 ......................................................................................................... 47 Figura 16 ......................................................................................................... 49 Figura 17 ......................................................................................................... 50 Figura 18 ......................................................................................................... 51 Figura 19 ......................................................................................................... 54 Figura 20 ......................................................................................................... 63 Figura 21 ......................................................................................................... 79 Figura 22 ......................................................................................................... 80 10 INTRODUÇÃO A segunda metade do século XX e o início do século XXI marcaram um acelerado desenvolvimento tecnológico e científico que se deu, principalmente, por meio da inserção gradativa do computador e da internet no cotidiano da sociedade. Nesse contexto têm-se também o desenvolvimento das telecomunicações, fato que reconfigurou o papel da comunicação e determinou a importância crescente da capacidade de elaborar, armazenar, circular, buscar e receber informação de maneira cada vez mais instantânea. É dado então um importante passo na resignificação da relação humana com a tecnologia, onde o homem passa a se apropriar desses instrumentos tecnológicos de múltiplas funções em busca de múltiplos objetivos. Mais do que apropriar-se, ele passa a viver de modo híbrido, associando a tecnologia a suas atividades cotidianas. Na área da Educação, a utilização dessas tecnologias e suas potencialidades têm oportunizado ferramentas/instrumentos mais dinâmicos, acessíveis e práticos no sentido de facilitar o processo de ensino- aprendizagem possibilitando um desenvolvimento amplo e eficaz aos envolvidos em tal processo sejam em escolas, universidades e demais estabelecimentos de ensino. Tais tecnologias, que têm se mostrado uma alternativa pedagógica para o ensino e aprendizado de conteúdos, comumente são denominados de Objetos de Aprendizagem, como cartilhas, vídeos, jogos eletrônicos, softwares educativos, conteúdos interativos, histórias em quadrinhos, por exemplo, entre outros. Voltados não somente nos ensinos básico, fundamental e médio, os Objetos de Aprendizagem também podem ser utilizados por professores e estudantes do ensino superior. Neste sentido, o presente trabalho pretende abordar a produção de uma História em Quadrinhoseletrônica (HQtrônica) e a sua utilização, como ferramenta educacional, por graduandos do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Pará (UFPA), onde no capítulo inicial se expõe um breve panorama do surgimento das histórias em quadrinhos no Brasil e no mundo, no sentido de fornecer uma noção do percurso histórico e as diversas mudanças que ocorreram nesse meio de comunicação ao longo do tempo. Este capítulo também abordará as principais 11 características e tipos de HQ’s e a nomenclatura que é dada para esse tipo de publicação em várias partes do mundo. O capítulo seguinte, As tecnologias da inteligência e a percepção no processo educativo, discute acerca da percepção, que abrange desde questões sobre os órgãos dos sentidos, o funcionamento do cérebro, a memória, as capacidades de sentimento e de organização lógica e a influencia que a tecnologia exerce em algumas partes do sistema cognitivo humano, em especial, a aprendizagem, a percepção e a imaginação do homem. Este capítulo também caracteriza o funcionamento da aprendizagem com o uso de ferramentas educacionais e aponta o uso da História em Quadrinhos como ferramenta educacional (Objeto de Aprendizagem), O terceiro capítulo deste trabalho discorre a respeito de um novo formato de História em Quadrinhos: a história em quadrinhos eletrônica (HQtrônica), expondo sua transposição do suporte papel, passando pelo suporte CD-ROM até a sua presentificação no ciberespaço caracterizando-o como uma produção transmidiática. Na sequência, o quarto capítulo diz respeito à HQtrônica “A equipe do PH”, mostrando o contexto em que a mesma foi idealizada, os métodos e técnicas usados em seu processo de produção, suas características próprias que a constituem como HQtrônica, apresentação das edições que compõem a publicação, além de outras informações peculiares a essa história em quadrinhos eletrônica, a qual é objeto de estudo deste trabalho. No último capítulo, é apresentado o resultado de uma pesquisa piloto sobre a aplicação da HQtrônica “A equipe do PH” como objeto de aprendizagem, realizada no ano de 2010 com uma turma de estudantes do curso de Comunicação Social da UFPA no sentido de verificar a possibilidade de uso e a eficácia desse meio de comunicação como ferramenta educacional voltada para estudantes o ensino superior. 12 13 Figura 01. A batalha de Hastings, parte da tapeçaria de Bayeux. C. 1070-80 1.1 Surgimento e História As histórias em quadrinhos, como conhecemos atualmente, surgiram no final do século XIX e início do século XX. No início, as HQ’s eram publicadas no formato de tiras diárias e, posteriormente, começaram a ser publicadas em revistas periódicas. Entretanto, alguns estudiosos de HQ’s consideram que representações de outras épocas tenham influenciado e atuado como precursoras das histórias em quadrinhos. Inscrições pré-históricas feitas nas cavernas, por exemplo, possuem, mesmo que de forma primitiva, características das HQ’s, pois nessas inscrições pictóricas eram retratadas, sequencialmente, ações do dia a dia dos habitantes do período pré-histórico. Outras manifestações artísticas do passado também podem ser apontadas como precursoras das HQ’s. Nesse sentido, Scott McCloud (apud FRANCO, 2008:21) considera a tapeçaria francesa de Bayeux (Figura 01) um desses exemplos, porque a peça narra a conquista normanda da Inglaterra, iniciada em 1066. Outro exemplo é um manuscrito pré-colombiano, encontrado em 1519, composto por imagens sequenciais, divididas por barras verticais, as quais contam a história de um herói militar. Trabalhos artísticos, especialmente arte sacra, como vitrais, afrescos e pinturas com cenas da paixão de Cristo, em madeira ou marfim, encontrados em igrejas e catedrais europeias, também fazem uso da justaposição sequenciada de imagens com a finalidade de contar uma história, como um modo de narrar que atravessa os tempos. (FRANCO, 2008). Os exemplos acima citados demonstram como a junção de imagens em sequência sempre foi usada pela humanidade para contar histórias, retratar o dia a dia e relatar fatos. Porém, esses embriões das HQ’s não possuíam 14 articulação entre texto verbal e imagem para compor cenas de uma mesma história que se desenvolve em um mesmo espaço. Em relação à definição de quando foi, de fato, marcado o início das histórias em quadrinhos que conhecemos atualmente e quem foi o precursor delas ainda existem algumas divergências. Para muitos estudiosos de HQ’s, o alemão Rodolphe Töpffer, com suas caricaturas e requadros, é o pai das HQ's modernas, principalmente por ter sido o primeiro a combinar, de forma independente, palavras e imagens para criar as histórias de “Mr. Jabot” (Figura 02), desenhadas em 1827 e publicadas apenas em 1833. Outros consideram o marco inicial dos quadrinhos modernos o trabalho do norte-americano Richard Outcault, com o personagem “Yellow Kid” (Figura 03), publicado em 1895. (FRANCO, 2008). Figura 02. Rodolphe Töpffer The Complete Comic Strips, Histoire de monsieur Jabot 15 É nítida a percepção de alguns elementos de diferenciação se compararmos os trabalhos de Rodolphe Töpffer e Richard Outcault. Os trabalhos de Outcault, em sua maioria, são coloridos, com mais de três quadros, não possuindo somente legendas abaixo de cada quadro. Desta vez, os personagens ganham mais vida, “aprendem a falar”, com textos que parecem sair de suas bocas. Cabe aqui explorarmos um pouco mais a HQ Yellow Kid devido às diversas contribuições que ela trouxe para a configuração das HQ’s modernas pelas mãos de Richard Outcault. “As histórias do Menino Amarelo” [tradução para o português] foram publicadas no jornal norte-americano The Sunday New York e faziam referências ao beco onde moravam os personagens, oriundos de diversas etnias. No início, Yellow Kid era publicada num só quadro em que os textos ficavam distribuídos em várias localizações da página, inclusive na roupa do garoto (Figura 04). Posteriormente, as histórias de Outcault passaram a ser construídas em quadros isolados (Figura 05). Figura 03. Yellow Kid de Richard Outcault. 16 Dois momentos foram marcantes nessa HQ: um deles é marcado no momento em que a fala do Menino Amarelo passou da legenda abaixo da imagem, em discurso indireto, para o seu camisolão, em discurso direto (1ª pessoa). Em seguida, por sugestão do editor do jornal, que havia visto balões de fala em outra publicação, as falas expostas no camisolão passaram a ser colocadas dentro de balões. Portanto, “Yellow Kid” acaba por firmar a configuração de quadros isolados e com balões de fala para cada personagem, marcando, assim, a identidade dos quadrinhos produzidos daí por diante. Essa Figura 04. Yellow Kid de Richard Outcault. Figura 05. Yellow Kid de Richard Outcault. 17 nova forma de dispor a narrativa em quadros divididos e o texto em balões próprios de cada personagem tornou o visual mais leve e a leitura mais fluida. (MENDONÇA, 2008). Segundo Mendonça (2008): É por essa razão que a maioria dos estudiosos dos quadrinhos concorda em, convencionalmente, apontar as aventuras do Menino Amarelo como as primeiras HQ’s modernas, pois elas estabeleceram uma configuração específica que se tornaria o padrão das HQ’s posteriormente produzidas (MENDONÇA, 2008:33). No percurso histórico das HQ’s no mundo, faz-se importante citar autores que contribuírampara desenvolver, aperfeiçoar e, principalmente, manter viva a produção desse “meio de comunicação de massa caracterizado como frio”. (McLuhan, 1969). Entre eles, estão: Alex Raymond, Harold Foster, Will Einer, Burne Hogarth, Al Capp, Lee Falk, Goscini, Milton Cannif e outros. Desde o início do século XX, as HQ’s têm passado por diversas fases, chegando à massificação nos EUA, configurando-se como um importante e útil meio de comunicação e também de linguagem artística. Já sofreram preconceito e repressão, estão presentes em diversos gêneros, como ação, aventura, infantil, ficção científica, erótico, entre outros. Ainda hoje é objeto de estudo da ciência e da academia (como neste trabalho) e é considerada por muitos como a “Nona Arte”. (FRANCO, 2008). 1.1.1 História em quadrinhos no Brasil Da mesma maneira que existem divergências em relação à primeira HQ moderna a ser produzida no mundo, existe também incerteza quanto à primeira história em quadrinhos brasileira. Um dos imigrantes italianos que chegaram ao Brasil entre os séculos XIX e XX colocou o País entre os primeiros países do mundo a criar uma história em quadrinhos. De acordo com Mendonça (2008), algumas pessoas e estudiosos apontam o italiano naturalizado brasileiro, Angelo Agostini, como o "verdadeiro" criador das histórias em quadrinhos brasileiras. 18 Uma das produções mais importantes desse autor foi a criação de um herói, genuinamente nacional, chamado de “Zé Caipora” (Figura 6), por vezes, acompanhado da índia de seios nus, Inaiá, a primeira heroína dos quadrinhos brasileiros. Enquanto a tendência mundial nas HQ’s era das narrativas humorísticas, em “Zé Caipora”, os personagens protagonizavam aventuras de ação em cenários locais, como as matas e as cidades brasileiras. Essas características fazem com que essa HQ se constitua, conforme Cardoso (apud MENDONÇA, 2008:35), “o único repositório iconográfico dos costumes nacionais do fim do Segundo Império e começo do século XX”, confiando extrema importância e relevância à publicação. Agostini também foi fundador da Revista Ilustrada, um marco editorial da época, considerada como a primeira revista de quadrinhos, com um personagem fixo, a ser lançada no Brasil. A primeira revista a publicar HQ’s no Brasil de forma sistemática foi O Tico-Tico (Figura 07), lançada em 1905, mantendo-se na ativa até os anos 60. A Revista publicava plágios de autores estrangeiros, como o popular personagem Chiquinho, criado por Richard Outcault. A Revista O Tico-Tico marcou a infância de gerações, especialmente por ser a única revista dedicada às crianças na época. Além de Agostini, merecem destaque os quadrinhistas Ziraldo, que obteve sucesso com A turma do Pererê, e o criador da mais famosa HQ brasileira, ainda produzida atualmente, Maurício de Souza, com a Turma da Mônica. Figura 06. Zé Caipora de Angelo Agostini 19 Uma característica peculiar dos quadrinhos no Brasil foi a produção de tiras em quadrinhos que passaram a ser amplamente desenvolvidas devido à escassez de espaço e à popularidade de certos personagens que o leitor podia encontrar diariamente no jornal. Essas tiras, ou tirinhas como são comumente conhecidas, diferenciam-se das HQ’s por serem curtas, com três quadros geralmente (às vezes, chegando a cinco), e por sempre trabalharem com a quebra de expectativas para produzir humor, além de desenvolverem características tipicamente nacionais, como a sátira política e social, além de temáticas underground, estes últimos tendo expansão principalmente na década de 1960 (MENDONÇA, 2008). Merecem destaque como produtores de tiras em quadrinhos Angeli (Figura 08), Fernando Gonsales, Glauco e Laerte, entre outros, os quais criaram personagens voltados para os públicos adolescente e adulto, por abordarem em suas produções diversos temas, como sexo, drogas e outros discursos politicamente incorretos. Figura 07. O Tico-Tico, de Angelo Agostini Figura 08. Rê Bordosa, personagem de Angeli 20 1.2 Definições Parece simples elaborar um conceito para histórias em quadrinhos, entretanto muitos quadrinhistas e estudiosos de HQ’s dedicaram muitas horas de estudo e muitas páginas de livros para alcançarem uma definição abrangente e completa e, até hoje, nunca se chegou a um consenso. De acordo com Franco (2008), muitas divergências existem quanto a um conceito de HQ’s, pois grande parte das definições feitas não consegue abarcar a totalidade das HQ’s e acaba sendo generalistas ou muito específicas. Um dos conceitos elaborados é do quadrinhista e pesquisador de HQ’s Will Eisner, que tentou renomear as histórias em quadrinhos para Arte Sequencial. Entretanto esse conceito peca no sentido de ser muito amplo, permitindo a inserção dos desenhos animados na categoria de HQ’s visto o termo designar que tudo o que for considerado arte e for produzido ou reproduzido de maneira sequencial seja considerado uma arte sequencial, ou melhor, uma HQ. Já Scott McCloud (apud FRANCO 2008:23) define as HQ’s como “Imagens pictóricas e outras justapostas em sequência deliberada, destinadas a transmitir informações e/ou a produzir uma resposta no espectador”. Essa definição é bastante defendida e também bastante criticada, uma vez que delimita exatamente o que seria uma HQ, sem deixar espaço para que os desenhos animados sejam incluídos na categoria de HQ’s, porém McCloud não considera uma HQ nem como arte nem como um meio de comunicação, além de excluir o Cartum1, a Charge2 e a Caricatura3, três tipos de produções muito próximas das HQ’s e que são consideradas histórias em quadrinhos por 1 Segundo Andraus (apud FRANCO, 2008) “Cartum vem da palavra inglesa cartoon e significa literalmente cartão, que é o suporte onde eram feitos os desenhos ingênuos e descompromissados de humor, para serem inseridos nos jornais, em seus primórdios. O cartum geralmente constitui-se de um só desenho, uma imagem geralmente cômica e universal e matriz da charge”. 2 Palavra de origem francesa que significa “carregar” ou “ataque” no sentido figurado é bem semelhante ao cartum, porém está diretamente ligada á temporalidade, retratando fato do cotidiano e situações que fazem sentido apenas a época ou período em que é publicada. 3 “A caricatura vem do vocábulo italiano caricare e significa carregar, exagerar e embora em nosso país, esteja muito ligada aos desenhos que satirizam rostos, pode estar presente também como a caricaturização de alguma cena ou fato e por isto, na verdade, a Caricatura se torna sinônima de Charge, podendo existir em qualquer uma das três modalidades anteriores, seja o Cartum, a Charge ou as Histórias em Quadrinhos”. Andraus (apud FRANCO, 2008). 21 muitos estudiosos e quadrinhistas, como Edgard Guimarães, pois se, para o autor dessa definição, uma HQ seria uma sequência de dois ou mais quadros que criam uma narrativa textual e/ou visual, essas três manifestações artísticas citadas acima não se enquadrariam nessa definição, já que ambas são compostas unicamente por uma imagem ou um quadro. (FRANCO, 2008). De acordo com Franco (2008), das várias definições já elaboradas, duas são amplamente mais aceitas pela comunidade acadêmica e quadrinhistas em geral por serem mais simples e objetivas. Uma delas é dada pelo pesquisador espanhol Roman Gubern: “Estrutura narrativa formada pela sequência progressiva de pictogramas nos quais podem integrar-se elementos de escrita fonática”. (GURBEN apud FRANCO, 2008). A outra definição, formulada por Antonio Cagnin, diz que:“A história em quarinhos é um sistema narrativo formado por dois códigos de signos gráficos: a imagem, obtida pelo desenho; [e] a linguagem escrita”. (CAGNIN apud FRANCO, 2008). Semelhante uma da outra, elas conseguem, com objetividade e clareza, expor as características básicas das HQ’s: união entre texto, imagem e narrativa visual que formam um conjunto com múltiplas possibilidades expressivas. (FRANCO, 2008). Vale a pena ressaltar que essas definições são de conhecimento mundial e amplamente conhecidas por pesquisadores de HQ’s e também quadrinhistas, independente de como esse tipo de publicação seja conhecida. A saber, no Brasil, conhecemos uma sequência narrativa de quadros formados por imagens e texto como História em Quadrinhos ou pelo termo popular Gibi, entretanto, nos Estados Unidos, uma HQ é conhecida por Comics, já na França e na Bélgica, são chamadas de Band Dessiré (tiras desenhadas). Em Portugal, são as Bandas Desenhadas. Na Itália, conhecidas como Fumetti (fumacinha – com referência ao balão de fala). Em países de língua hispânica da América Latina e Argentina, são as Historietas. Os espanhóis a denominam de Bandas Deseñadas ou TBO e os japonesas as designam de Mangá. Segundo Franco (2008), o termo brasileiro História em Quadrinhos é considerado por muitos como o melhor termo para designar essa expressão artístico-literária, por não se referir unicamente a um gênero, como o termo americano comics, nem a um elemento de linguagem, como o italiano fumetti. 22 Além disso, é mais amplo do que os termos usados na França e em Portugal, que se referem somente às tiras. Assim, o termo brasileiro congrega o aspecto narrativo na palavra “histórias” a um dos principais elementos de sintaxe das HQs, os quadrinhos ou vinhetas; como o termo quadrinhos é sempre usado no plural ele se coaduna perfeitamente com as definições de que as HQs são formadas por uma sequência de uma ou mais imagens e nunca só um quadrinho. Talvez o único porém da denominação brasileira seja o fato de o termo “quadrinhos” estar na forma diminutiva o que acaba trazendo um caráter pejorativo a ele (FRANCO, 2008:26). Discussões acerca de termos e definições mostram que as HQ’s são importantes como formas artísticas de expressão e que estão cada vez mais sendo estudadas tanto em seu formato quanto em sua linguagem. A prova é que quadrinhistas renomados, pesquisadores e até mesmo novatos na produção de HQ’s estão experimentando na criação de quadrinhos utilizando- se de recursos hipermidiáticos que o ciberespaço oferece, fundindo a linguagem tradicional das HQ’s com elementos multi e hipermidiáticos. Sobre essa união, trataremos de forma mais aprofundada no Capítulo 3. 1.3 Características das histórias em quadrinhos Para admiradores, leitores e até mesmo fãs de HQ’s, muitas de suas características e as funções de cada uma são facilmente notadas. Entretanto outras características passam despercebidas por muitos que leem histórias em quadrinhos e muitas dessas características se fazem fundamentais para a compreensão da narrativa e para a constituição do que chamamos HQ’s modernas, por sua singularidade expressiva e artística. De maneira simples, como dito anteriormente, a estrutura de uma HQ é composta pela união da imagem e do texto, gerando no leitor a necessidade de uma interpretação mental e visual, aliada a uma interpretação literária também. Planos, perspectivas, luz, sombra, onomatopeias, gramática e sintaxe do idioma em que foi escrito o diálogo são elementos que, ao longo do século XX, foram sendo usados e aprimorados nas produções de HQ’s, reunindo itens simbólicos que, aos poucos, foram constituindo um sentido marcante e fixador das características das HQ’s. (FRANCO, 2008). 23 De maneira geral, na linguagem dos quadrinhos, temos os elementos semióticos não verbais e os verbais, exatamente nessa ordem de importância, pois uma HQ pode continuar sendo uma HQ sem perder seu objetivo, mesmo sem texto verbal, mas nunca sem imagens. Entre os recursos não verbais que compõem tal linguagem, encontram-se os desenhos, os requadros (espécie de “moldura” para as cenas desenhadas), a sarjeta (o espaço em branco entre os requadros), os balões que abrigam as falas ou o discurso do narrador, o letreiramento (o tipo de fonte usada), a perspectiva e o plano ou enquadramento, entre outros. Uma das principais características não verbais das HQ’s, as quais as tornam singulares, é a sua gestalt, ou melhor, sua percepção visual, diferenciado-as das de outras narrativas visuais, como o cinema e o desenho animado, pois são nas HQ’s que podemos ter a nítida percepção visual simultânea de passado, presente e futuro. (MENDONÇA, 2008). [...]nossa fóvea está concentrada no quadrinho que estamos lendo (momento presente da narrativa) a visão periférica está varrendo os quadrinhos anteriores (o passado da narrativa) e os posteriores (o futuro da narrativa) da página ou da tira. Isso não acontece no cinema nem na animação onde o que ocorre é uma sucessão de imagens em movimento, onde podemos visualizar apenas o instante narrativo presente (FRANCO, 2008:44). Outro elemento comumente presente nas HQ’s é a elipse, uma figura de linguagem que consiste em omitir uma ou mais palavras na oração, mas facilmente identificada(s) pelo contexto. Nos quadrinhos, a elipse está presente nas imagens que são omitidas entre um quadrinho e outro, o que nos leva a completar mentalmente esses espaços “mortos”, gerando, assim, uma leitura elíptica permanente de toda a narrativa quadrinizada, exigindo uma participação atenta do leitor. As HQs dependem desse efeito elíptico para existirem e é a ele que se deve atribuir a participação mais efetiva do leitor na narrativa, pois sem essa complementação mental dos espaços “vagos” na sequência entre um quadrinho e outro, ela não poderia configurar-se (FRANCO, 2008:44). Característica que, para muitos, marca o início dos quadrinhos modernos, os balões de fala não são tão necessários em uma narrativa quadrinística, fato este comprovado por muitos artistas que não usam este 24 recurso em seus trabalhos, preferindo dispor os diálogos e textos abaixo de cada quadrinho como se fossem legendas. Alguns desses artistas são: Harold Foster e Alex Raymond (Figura 09). Além de funcionarem como elementos gráficos que abrigam falas de personagens, os balões também podem ser usados para expressar onomatopeias e ícones que expressam atitudes ou ações dos personagens funcionando assim como convenções linguísticas e metáforas visuais. Alguns exemplos bastante conhecidos são os “ZzZzzzZ”, que representam sono ou que algum personagem está dormindo, e o ponto de interrogação para representar dúvida. O próprio formato do balão já possui uma significação que reforça matrizes psicológicas ou fonéticas da mensagem. (FRANCO, 2008). Pode-se citar como exemplo um balão com linhas arredondadas, que lembram uma nuvem, para representar que determinado personagem está sonhando ou imaginando algo. A representação gráfica da reprodução de um som é conhecida como onomatopeia, outro recurso comumente utilizado nas HQ’s. Essas representações gráficas ajudam a ampliar e reforçar a mensagem “sonora” que está sendo transmitida. Uma ou algumas notas musicais podem representar o toque de um telefone ou o som de uma campainha; letras trêmulas podem Figura 09. HQ de Alex Raymond 25 significar um estado de desespero ou um gemido; uma batida na porta pode ser representada fielmente, de forma gráfica, pelo som emitido durante a realização do ato (TocToc), entre outros elementos onomatopaicos. Como dito anteriormente, nas HQ’s, o leitor pode ter a percepção do passado, do presente e do futuro em uma mesma página. Isso decorre, principalmente, em função dos quadrinhos que representam o espaço físico e determinam o tempo transcorrido da narrativa. Essa definição acontece de acordo com o tamanho que cada quadrinho possui. Por exemplo, um quadrinho de tamanho maior representa um maior período de tempo decorrido na narrativa, uma vez que este será visualizado por mais tempo pelo leitor por, geralmente, conter mais elementos visuais que um quadrinho de dimensões reduzidas. Assim, os quadrinhos definem os padrões temporais da narrativa para que o leitor possa situar-se em relação à cena e à duração do evento. Scott McCloud (apud FRANCO, 2008) diz que “O espaço é para os quadrinhos o que o tempo é para o filme”, dessa forma, podemos compreender que o espaço ocupado pelo quadrinho, bem como o espaço que separa um quadrinho do outro determina a duração de uma cena, de uma ação nas HQ’s. Além das características expostas acima, as HQ’s também contam com enquadramento e linhas de movimento como recursos fundamentais. Uma história em quadrinhos é constituída por uma série de quadrinhos sucessíveis que, no início, eram todos da mesma forma e tamanho, entretanto, com o passar do tempo, muitos quadrinhistas foram tomando consciência da importância do enquadramento e percebendo que diferenças no tamanho e no formato influenciam o ritmo de leitura, a percepção e a compreensão de seus trabalhos. Com isso, esses artistas passaram a “ousar” com quadrinhos horizontais, verticais, estreitos, largos, com formatos circulares, quadrinhos com plano geral que ocupavam uma página inteira. Mas experimentações não foram feitas somente no tamanho e formato dos quadrinhos. Ângulo, perspectiva e luz também foram explorados para dar mais vida e ritmo de leitura às HQ’s. Cenas sob o ponto de vista da câmera, com profundidade, efeitos de luz e contra luz. Algumas cenas passaram a ser reproduzidas em páginas duplas com efeitos importados do cinema, como uma grande angular, onde a cena é mostrada em sua totalidade horizontal e vertical. Outro recurso bastante utilizado nas HQ’s, principalmente naquelas desenvolvidas em 26 suporte impresso, são as “linhas cinéticas”, que funcionam como convenções gráficas que exprimem movimento, para fazerem alusão quando algum personagem está correndo, acenando, dançando etc. 1.4 Os tipos de histórias em quadrinhos O tipo mais conhecido das HQ’s é o veiculado em formato impresso, como em revistas, tiras em jornais, entre outros. Todavia podemos encontrar diversas outras categorias de histórias em quadrinhos que se encaixam nos formatos tradicionais, bem como experimentais. Abaixo serão citadas e, sucintamente, descritas as mais variadas manifestações midiáticas das HQ’s, como bem demonstra Franco (2008). • Página Dominical: A primeira e principal forma de publicação das HQ’s moderna. Em meados do século XX, alguns jornais norte-americanos publicavam nos suplementos de domingo algumas páginas de quadrinhos. Na maioria dos casos, a história completa ou um capítulo dela era desenvolvido em uma única página do suplemento. • Tira de jornal: Ainda muito popular em muitos jornais do mundo, foi um dos primeiros tipos de HQ’s a serem veiculados. Caracteriza-se pelo seu formato, na maioria das vezes, horizontal, com dois a quatro quadrinhos (podendo variar) dispostos de maneira enfileirada em uma única coluna e publicados, em geral, diária ou semanalmente. • Fanzines: Inicialmente, eram publicações independentes de fãs de personagens de quadrinhos, seriados de cinema e TV, ficção científica literária, entre outros. Atualmente, os fanzines de quadrinhos ou revistas alternativas de quadrinhos, como preferem alguns, possuem alta liberdade de expressão por não estarem inseridos nas leis que regem o mercado dos quadrinhos, sendo distribuídos pelos correios e com tiragem bem menor em relação aos quadrinhos ligados às editoras. Normalmente, são compostos por desenhos ou colagens e copiados para diminuir os custos. Veja um exemplo de fanzine abaixo (Figura 10): 27 Figura 10. Exemplo de Fanzine. • Revista Periódica ou Comic Book: Com o sucesso da primeira revista em quadrinhos, chamada The Funnies, publicada em 1929, muitas outras revistas começaram a surgir e, com isso, os artistas passaram a ter mais espaço e páginas para publicação de seus trabalhos, o que não poderia acontecer nos jornais que somente publicavam tiras em quadrinhos. No Brasil, temos o exemplo da Revista em Quadrinhos da Turma da Mônica dos estúdios Maurício de Souza (Figura 11). • Álbuns e Graphic Novels: Esse tipo de HQ’s difere das Revistas em Quadrinhos por lembrarem livros com papel de qualidade, arte refinada e encadernação de luxo. Chegam a levar mais de um ano para serem produzidas e são distribuídas em livrarias com o intuito de alcançar um público mais intelectualizado. Esse tipo de publicação é bastante difundido na Europa, onde o aspecto artístico dos quadrinhos é muito valorizado. • Manuais didáticos: As histórias em quadrinhos também servem para a composição de manuais e cartilhas com os mais variados fins. Por reunir potencialidades didáticas, como expressão visual e escrita, os manuais didáticos já foram e ainda são usados em inúmeras campanhas de Figura 11. Capa da Revista em Quadrinhos Turma da Mônica 28 conscientização ambiental e de combate à Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST’s), por exemplo. As principais características desse tipo de publicação é a objetividade da linguagem e da composição visual com a intenção de facilitar a apreensão e aprendizado do leitor. • Story Boards: Os Story Boards não são comercializados, servem apenas como um elemento de ligação entre a linguagem dos quadrinhos e o cinema. Sua função é ilustrar o roteiro escrito de um filme com sugestões de ângulos, tomadas para servirem como orientação para diretor, atores e demais envolvidos em uma produção cinematográfica. Exemplo de story board abaixo (Figura 12). • HQ Radiofônica e HQ ao vivo: Esse tipo de publicação funciona como transposições de linguagem das HQ’s para outro suporte, nesse caso, o audiofônico. No início do ano de 2000, o quadrinhista Gazy Andraus realizou duas experimentações ao tentar transpor as HQ’s Esquizofrenia das Agradáveis, de Xalberto, e Um Diálogo Além do Humano, de autoria Figura 12. Story Board do Filme Street Fighter. 29 Figura13. Vídeo HQ baseado na HQ "Atemporal", criada originalmente por Luendey Maciel. própria, para o suporte rádio. Nessa experiência, o autor criou uma narrativa com efeitos sonoros que fizeram lembrar as novelas radiofônicas. Andraus também realizou uma experimentação de quadrinhos em tempo real, o que ele designou de HQ ao vivo, na qual ele tentou representar a simultaneidade dos tempos passado, presente e futuro em uma única cena. Essas experimentações foram feitas na Rádio Universitária AM de Goiânia. • Vídeo BD ou BD Clip (HQ em vídeo): Similar às HQ’s radiofônicas em sua experimentação, as histórias em quadrinhos no suporte audiovisual geralmente são produzidas com técnicas como digitalização e efeitos visuais provenientes de software de edição de vídeo. A primeira HQ em vídeo que se tem conhecimento data de 1985 quando o quadrinhista Enki Bilai produziu um vídeo clip usando como base os croquis feitos para produção de sua HQ Los Angeles. Em 1993, o quadrinhista Will Eisner também realizou uma experiência de HQ em vídeo quando adaptou o livro Moby Dick, um clássico da literatura americana, paraa televisão. Nessa produção, Eisner se utilizou de textos e balões que se sobrepunham às imagens dando uma noção de movimento para a HQ em vídeo. Clique na imagem (Figura 13) para conferir um exemplo de HQ em Vídeo brasileira. 30 • E-comics ou BD Interative ou HQtrônica: A mais recente experimentação de linguagem das HQ’s que resulta em uma produção híbrida com a junção de elementos tradicionais das HQ’s aliados a recursos visuais, sonoros e elementos hipermidiáticos, como diagramação dinâmica, hipertextualidade, animação, entre outros. No capítulo seguinte, serão mais detalhadas as características de uma HQtrônica. 31 32 As inovações e avanços da tecnologia em diversas áreas nos séculos XX e XXI marcaram a vida do ser humano de maneira expressiva. A escrita, a invenção da imprensa, o telefone, o rádio, o cinema, depois a televisão e o vídeo, entre outras, são exemplos dessas inovações tecnológicas. Hoje, agregam-se a essas tecnologias o computador, a internet, a multimídia e o conjunto de ferramentas que compõem a informática. O desenvolvimento dessas tecnologias que nos rodeiam em nossa vida cotidiana, no trabalho, no lazer, no entretenimento, nas transações financeiras, nas práticas comunicacionais, nos ambientes educacionais, seja na vida privada seja nos espaços públicos, são tecnologias da inteligência, tecnologias cognitivas com as quais convivemos em todos os momentos e interagimos sob os signos da troca e do diálogo, falando conosco e mantendo-nos conectados nas redes de troca de informações. A aplicabilidade das tecnologias encontra-se, atualmente, em várias esferas da sociedade, nas relações sociais, nas formas de trabalhar, de se informar, de entretenimento, de consumir, de falar, de escrever, de comunicar- se, de pensar e, também, na educação. Novas maneiras de pensar e de conviver estão sendo elaboradas no mundo das telecomunicações e da informática. As relações entre os homens, o trabalho, a própria inteligência dependem, na verdade, da metamorfose incessante de dispositivos informacionais de todos os tipos. Escrita, leitura, visão, audição, criação, aprendizagem são capturados por uma informática cada vez mais avançada (LÉVY, 1993:7). Na área educacional, as novas tecnologias podem desenvolver uma série de atividades com objetivos e interesses didático-pedagógicos. Uma das suas contribuições dá-se na formação do indivíduo presente no processo educativo, quando auxiliam, em parte, seu desenvolvimento intelectual, pois, apesar de seu avanço, as tecnologias da informática não atingem amplamente a plenitude da capacidade da mente humana. (ANJOS, 2007). “Assim, as tecnologias intelectuais não se conectam sobre a mente ou o pensamento em geral, mas sobre certos segmentos do sistema cognitivo humano” (LÉVY, 1993). [...]as tecnologias da inteligência com seus respectivos sistemas, incondicionalmente, exercem uma certa influência no processo educativo quando capacitam o sujeito a manipular as 33 ferramentas disponíveis em seus respectivos programas. Uma das funções dos sistemas de informática é justamente a de facilitar a vida do homem em suas atividades cotidianas, através da aplicabilidade de recursos. Na escola, a utilização dessa tecnologia informática deve fazer parte do processo educativo, pois contribui de uma forma significativa – dadas suas limitações – ao desenvolvimento das capacidades intelectuais do ser humano, que são, portanto, o objetivo central de todo processo educativo (ANJOS, 2007:5). As tecnologias intelectuais influenciam algumas partes do sistema cognitivo humano, em especial, a aprendizagem, a percepção e a imaginação do homem. Tudo o que nos é externo e que de alguma forma chega até nós e que apreendido por nós, Pierce (apud SANTAELLA, 1998) chama de percepto, ou seja, “aquilo que tem realidade própria no mundo que está fora de nossa consciência e que é apreendido pela consciência perceptiva” (SANTAELLA, 1998). De acordo do Lévy (1993), deveríamos contabilizar três grandes capacidades cognitivas humanas. São elas: a faculdade de perceber, a de imaginar e a de manipular. Estas três faculdades combinadas, bem como sua articulação com as tecnologias intelectuais, permitem dar conta de todas as realizações do pensamento dito abstrato. A faculdade de percepção ou do reconhecimento de formas é caracterizada por sua grande rapidez. O sistema cognitivo se estabiliza em uma fração de segundo na interpretação de uma determinada distribuição de excitação dos captadores sensoriais. Reconhecemos imediatamente uma situação ou um objeto... A percepção imediata é a habilidade cognitiva básica (LÉVY, 1993:157). A faculdade de imaginar, ou de fazer simulações mentais do mundo exterior, é um tipo particular de percepção, desencadeada por estímulos internos. Ela nos permite antecipar as conseqüências de nossos atos. A capacidade de simular o ambiente e suas reações tem, certamente, um papel fundamental para todos os organismos capazes de aprendizagem (LÉVY, 1993:157). Finalmente, dispomos de uma faculdade operativa ou manipulativa que seria muito mais específica da espécie humana que as anteriores... Na verdade, é por que possuímos grandes aptidões para manipulação e bricolagem que podemos trafegar, reordenar e dispor parcelas do mundo que nos acerca de tal forma que elas acabam por representar alguma coisa. Agenciamos sistemas semióticos da mesma forma como trabalhamos o sílex, como construímos cabanas de madeira ou 34 barcos. As cabanas servem para abrigar-nos, os barcos para navegar, os sistemas semióticos para representar (LÉVY, 1993:157). Pesquisas demonstram que 75% da percepção humana é visual, 20% dizem respeito à percepção sonora e os 5% restantes a todos os outros sentidos, como olfato, tato e paladar. (SANTAELLA, 1998). Apesar desta informação, ao vermos, sentirmos, cheirarmos, tocarmos ou degustarmos algo não imediatamente e obrigatoriamente estamos percebendo esse algo, pois o processo de percepção não está sob nosso controle. Tomamos controle sobre o processo perceptivo a partir do momento em que interpretarmos o percepto, ou seja, quando atribuímos significação para esse algo. (PIERCE apud SANTAELLA, 1998). 2.1 Cibercultura e o processo educativo A interação entre cibercultura e educação segundo Lévy (1999), não se limita, por exemplo, em encurtar distâncias, mas promove a mudança de formação do indivíduo, de institucionalizada para a generalizada. De acordo com Anjos (2007), a perspectiva generalizada, o ciberespaço canaliza e torna acessível o conhecimento elaborado pela própria sociedade. Mas, apesar dessa possibilidade educacional propiciada pela cibercultura, a escola não perde sua relevância, por ser uma instituições que segue alguns padrões educacionais que fornecem a capacitação básica ao sujeito. A transição de uma educação é uma formação estritamente institucionalizada (a escola, a universidade) para uma situação de troca generalizada de saberes, o ensino da sociedade por ela mesma, de reconhecimento auto-gerenciado, móvel e contextual das competências (LÉVY, 1999:172). A prática pedagógica por meio das relações com a tecnologia contribui para o processo de ensino-aprendizagem possibilitando para professores a diversificação de busca da eficiência para garantir seu espaço no campo profissional de atuação e nele avançar e também para os estudantes proporcionando-lhes alternativas de aprendizagem. Mas o essencial se encontra em um novo estilo de pedagogia,que favorece ao mesmo tempo as aprendizagens personalizadas e a aprendizagem coletiva em rede. Neste 35 contexto, o professor é incentivado a tornar-se um animador da inteligência coletiva de seus grupos de alunos em vez de um fornecedor direto de conhecimentos (LÉVY, 1999:158). Na concepção de Pierre Lévy sobre cibercultura e educação, a aplicabilidade dos recursos tecnológicos, como: computadores e o ciberespaço no processo educativo atuam como ferramentas que contribuem para o desenvolvimento de partes do sistema cognitivo, como memorização, percepção, apreensão e imaginação, por exemplo. O ciberespaço contribui no reconhecimento de saberes pertinentes, segundo o interesse do usuário da rede. Apesar da diversidade de indivíduos, as tecnologias intelectuais são perceptíveis no sistema cognitivo, pois possibilitam a posterior criação de novos mecanismos de informática que contribuem para o aperfeiçoamento da tecnologia e da vida do homem. (ANJOS, 2007). Portanto, a interação entre educação e cibercultura se processa quando os profissionais de educação utilizam os recursos tecnológicos disponíveis no bojo do processo educativo. Na medida em que o indivíduo amplia seu acesso a informações, incondicionalmente desenvolve algumas partes do sistema cognitivo, os quais contribuem no aperfeiçoamento de conhecimentos adquiridos em ambiente familiar ou escolar. O ciberespaço tem a condição de proporcionar ao aluno uma interatividade que, por sua vez, amplia a troca de experiências e de informações que, a posteriori, transformam-se em conhecimento. A interconexão dos computadores, no ciberespaço se torna uma ferramenta útil para o sujeito, pois esse mecanismo possibilita a troca mútua de informações sobre diferentes áreas de conhecimento, tais como: matemática, história, filosofia, etc. “Eu defino ciberespaço como o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores”. (LÉVY, 1999:92). Um dos elementos da relação entre educação e cibercultura seria o computador, que se torna uma ferramenta fundamental, devido a sua aplicabilidade em várias instâncias de nossa sociedade. No processo educativo, o computador pode ser utilizado para ampliar a forma de comunicação do educando, na transformação da informação em conhecimento, além da aprendizagem dos sistemas de informática, incondicionalmente 36 capacita o indivíduo para inserir-se na sociedade de forma eqüitativa. (ANJOS, 2007). . 2.2 Aprendizagem com o uso de ferramentas educacionais (Objetos de Aprendizagem) Na tentativa de alcançar a eficiência e eficácia do processo de aprendizagem, algumas estratégias de ensino têm sido elaboradas para que o professor possa incentivar os alunos à aprendizagem juntamente com o envolvimento para com o educando num diálogo ativo. De acordo com Bruner (apud FLÔRES; TAROUCO, 2008) entende-se o processo da aprendizagem como: [...]um processo ativo, no qual os sujeitos constroem novas idéias, ou conceitos, com base nos seus conhecimentos passados e atuais. O aluno seleciona e transforma a informação, constrói hipóteses e toma decisões, utilizando, para isto, a sua estrutura cognitiva. É a estrutura cognitiva (esquemas, modelos mentais) que fornece significado e organização para as experiências e permite ao indivíduo "ir além da informação dada (BRUNER, 1966 apud FLÔRES; TAROUCO, 2008). O objetivo do professor é reconstruir a informação a ser aprendida de maneira e num formato adequados às características, competências e habilidades dos alunos. Dessa forma, o ensino do professor deve estar baseado no aspecto do processo de aprendizagem atentando para maneiras mais efetivas de apresentação dos conteúdos; nos modos de estruturação e organização dos conhecimentos, para que estes sejam facilmente compreendidos pelo aluno. (FLÔRES; TAROUCO, 2008). O psicólogo educacional americano, Robert M. Gagné, referência nos estudos acerca do conceito de Design Instrucional4, constatou a existência de diferentes tipos ou níveis de aprendizagem e, além disso, a necessidade de considerar para cada um deles tipos diferentes de instrução. Para ele, devem ser consideradas cinco categorias principais na aprendizagem: informação 4 Design Instrucional consiste numa engenharia pedagógica que abarca o conjunto de métodos, técnicas e recursos utilizados em processos de ensino-aprendizagem em qualquer contexto, desde o ensino clássico até tendências contemporâneas quanto ao uso de tecnologias, seja na concepção de cursos, aulas individuais e seja na construção de materiais didáticos como impressos, CD-ROM’s, vídeos, softwares ou, qualquer objeto de aprendizagem. 37 verbal; competências intelectuais; estratégias cognitivas; competências motoras e atitudes. (FLÔRES; TAROUCO, 2008). Nesse sentido, para cada tipo ou nível de aprendizagem fazem-se necessárias a oferta de determinadas condições internas e externas. Ou seja: [...]para que se aprendam estratégias cognitivas, é preciso que existam oportunidades se pratique o desenvolvimento de novas soluções para os problemas. Para aprender atitudes, o aluno deve ser colocado em situações em que desempenhe papéis adequados e verossímeis (BRUNER, 1966 apud FLÔRES; TAROUCO, 2008). Grande parte dos modelos de ensino admite que os melhores produtos ou meios ambientes de aprendizagem estão focados em problemas e implicam quatro fases: ativação das experiências anteriores; demonstração das competências; aplicação das competências e integração dessas competências no mundo real. A aprendizagem funciona melhor em um ambiente onde o instrutor (professor) e o aprendiz (estudante) têm uma responsabilidade comum para a aprendizagem e o instrutor deve envolver o estudante na sua própria aprendizagem, fazendo com que este sinta-se participante da ação interagindo com o ambiente de aprendizagem para realizar uma aprendizagem significativa. (FLÔRES; TAROUCO, 2008). De acordo com Moreno e Mayer (apud FLÔRES; TAROUCO, 2008): A aprendizagem mais eficaz é realizada em ambientes que combinam as representações do conhecimento em verbais (palavras impressas, palavras faladas) e não-verbais (ilustrações, fotografias, vídeo e animação), utilizando a modalidade mista para as apresentações desse conhecimento (visuais e auditivas) (MORENO; MAYER, 2007 apud FLÔRES; TAROUCO, 2008). Ferramentas educacionais que reúnem essas características no auxílio do processo de ensino-aprendizagem são denominadas de Objetos de Aprendizagem e vem sendo produzidas por diversas instituições de ensino. A Secretaria de Educação a Distância do Ministério da Educação (MEC) tem desenvolvido recursos educacionais multimídia interativos na forma de objetos de aprendizagem os quais têm apresentado bons resultados na comunidade educacional brasileira. Centenas de recursos didáticos (objetos de aprendizagem) para uso no computador foram desenvolvidos e publicados, 38 para uso público, por inúmeras equipes de alunos e professores de instituições de ensino superior. A definição de Objetos de Aprendizagem (OA) ainda é considerada vaga, não existindo um conceito que seja universalmente aceito, segundo Muzio (apud BETTIO; MARTINS, 2004): Existem muitas diferentes definições para Objetos de Aprendizado e muitos outros termos são utilizados. Isto sempre resulta em confusão e dificuldade de comunicação, o que não surpreende devido a esse campo de estudo ser novo (MUZIO, 2001, apud BETTIO; MARTINS, 2004). Deacordo com a terminologia tomada pelo Learning Technology Standards Committee (LTSC) do Institute of Electrical and Electonics Engineers (IEEE), objetos de aprendizagem são recursos pedagógicos com objetivos educacionais, que estimulam a educação e a busca pelo conhecimento, podendo ser usados mais de uma vez em diferentes contextos. Segundo Longmire (apud BETTIO; MARTINS, 2004), objetos de aprendizado são considerados como: Uma entidade, digital ou não digital, que pode ser usada e reutilizada ou referenciada durante um processo de suporte tecnológico ao ensino e aprendizagem. Exemplos de tecnologia de suporte ao processo de ensino e aprendizagem incluem aprendizagem interativa, sistemas instrucionais assistido por computadores inteligentes, sistemas de educação à distância, e ambientes de aprendizagem colaborativa. Exemplos de objetos de aprendizagem incluem conteúdos de aplicações multimídia, conteúdos instrucionais, objetivos de aprendizagem, ferramentas de software e software instrucional, pessoas, organizações ou eventos referenciados durante o processo de suporte da tecnologia ao ensino e aprendizagem (LONGMIRE, 2001 apud BETTIO; MARTINS, 2004). Os objetos de aprendizagem também podem ser compreendidos como peças disponíveis em ambientes virtuais de ensino. Seu funcionamento em conjunto é equivalente ao jogo/brinquedo LEGO, pois também pode ser reconectados e inventar uma infinidade de configurações (VIEIRA, 2007). É importante ressaltar que objetos de aprendizagem não precisam ser única e exclusivamente baseados em tecnologias. “Um cronograma instrucional, uma determinada atividade de ensino, um livro, uma apostila, 39 histórias, tutoriais [também] são outros exemplos de objetos de aprendizagem” (MAEDA et al, 2005). Entretanto, o termo passou a ser muito utilizado por profissionais que desenvolvem e aplicam novas tecnologias com fins educacionais. Segundo Longmire (apud BETTIO; MARTINS, 2004), os objetos de aprendizagem possuem algumas características que buscam facilitar e melhorar a qualidade do ensino-aprendizagem, proporcionando aos tutores, alunos e administradores diversas ferramentas facilitadoras do processo. As principais características expostas por são: • Flexibilidade: Como os objetos de aprendizado são construídos de forma qual possua inicio, meio e fim, eles já nascem flexíveis, podendo ser reutilizados sem nem um tipo de manutenção. • Durabilidade: Possibilidade de uso independente da tecnologia do da época em que for utilizado. • Customização: Com a independência dos objetos de aprendizagem (conteúdo em partes para facilitar reuso), a idéia de utilização dos mesmos em um curso ou qualquer outro tipo de qualificação torna-se real, sendo que cada entidade educacional pode utilizar-se dos objetos e em contextos diferentes e passíveis de combinação e /ou articulação com outros objetos de aprendizagem. • Reusabilidade e Adaptabilidade: Um objeto de aprendizagem é passível de uso mais de uma vez e em quaisquer ambientes de ensino- aprendizagem. • Fixação do conhecimento: A partir do momento que um objeto é reutilizado diversas vezes, este objeto vem ao longo do tempo sendo melhorado e a sua consolidação cresce de uma maneira espontânea. • Interoperabilidade: A criação de um padrão para armazenagem de Objetos de Aprendizado cria mais uma vantagem do modelo, a interoperabilidade, ou seja, a reutilização dos objetos na capacidade de operar em multi-plataformas. A idéia de um objeto de aprendizado ser 40 criado e poder ser utilizado em qualquer plataforma de ensino em todo o mundo aumenta ainda mais as vantagens destes objetos, logo que a barreira lingüística seja quebrada e a interoperabilidade entre bancos de objetos de todo o mundo será sanada. • Facilidade para atualização: Como os mesmos objetos são utilizados em diversos momentos a atualização dos mesmos em tempo real é relativamente simples, desde que todos os dados relativos a este objeto estejam em um mesmo banco de informações. • Indexação e Acessibilidade: A padronização dos objetos e a utilização de assinaturas digitais tende a criar uma maior facilidade de acessibilidade dos objetos com mesmas características em qualquer banco de objetos que esteja disponível para eventuais consultas. Com a inter-relação entre tecnologia e aprendizagem muitos ambientes de aprendizagem interativos contribuem substancialmente para o processo de ensino-aprendizagem. Moreno e Mayer (apud BETTIO; MARTINS, 2004) sugerem vários tipos de ambientes interativos de aprendizagem. Os principais são: • Jogos interativos e simulações: Capazes de melhorar a aprendizagem baseado na Web, pois os usuários as consideram divertidas e motivadoras devido as habilidades e competências de cognição. • Agentes pedagógicos: Tutores que não somente ajudam os alunos a aprender, mas também ajudam a encontrar estratégias para uma aprendizagem eficaz. Fornecem linhas de orientação, aconselhamento, feedback, e apoio adequado às necessidades do aluno. • Materiais pedagógicos: Numa tendência crescente esses materiais são desenvolvidos em suportes textuais, em vídeo ou em ambiente multimídia. • Bibliotecas digitais: Com a disponibilização on line de uma enorme quantidade de materiais de apoio para contribuição no ensino- aprendizagem, as bibliotecas digitais configuram-se como um ambientes 41 que agregam essas ferramentas e geralmente requerem prática e orientação sobre a sua utilização. De acordo com Nunes (2004), no processo de aprendizagem, os objetos de aprendizagem, quando bem escolhidos, podem ajudar os alunos a relacionarem novos conhecimentos com os que já sabiam, fazerem e testarem hipóteses, pensarem onde aplicar o que estão aprendendo, expressarem-se a por meio de várias linguagens, aprenderem novos métodos, novos conceitos, aprenderem a ser críticos sobre os limites de aplicação dos novos conhecimentos, entre outras vantagens. Segundo Gallotta (2040), os objetos de aprendizagem permitem a construção de contextos digitais para os conteúdos que serão explorados. Esses contextos fazem uso de uma série de ferramentas midiáticas, tais como música, desenhos, gráficos, simulações, jogos etc. A contextualização permite aos alunos traçar mais facilmente uma relação entre determinado conteúdo e suas aplicações práticas e enxergar a interdependência das várias disciplinas. Uma fórmula de física, por exemplo, deixa de ser uma seqüência de variáveis, operações e números e passa a ser a base para uma atividade cotidiana representada pelo objeto. O aluno de hoje sofre um intenso bombardeio de informações digitais, é um ambiente que ele entende muito bem, nada mais natural do que se utilizar desse mesmo ambiente para incorporar conteúdo e conhecimento. Existem objetos de aprendizagem muito bons para motivar ou contextualizar um novo assunto a ser tratado, outros ótimos para visualizar conceitos complexos, alguns que induzem o aluno a certos pensamentos, outros ideais para uma aplicação inteligente do que estão aprendendo ... Quando os objetos são interativos, consegue-se que o aluno tenha um papel bastante ativo. Permite-se ainda que o aluno se aproprie do objeto e o utilize inserindo em seus próprios trabalhos para comentários, ilustrações, críticas etc, e assim consegue-se uma aprendizagem ainda mais significativa (NUNES; GALLOTTA, 2004). Os objetos de aprendizagem não trazem benefícios unicamente para os alunos. Para o professor o processo é semelhante ao do aluno. Se o professor tem à sua disposição uma grande quantidade de objetos, dos mais diferentes tipos, ele pode planejar suas aulas fazendo uso deles, conseguindo maiorflexibilidade para se adaptar ao ritmo e ao interesse dos alunos, mantendo 42 seus objetivos de ensino podendo chegar mais facilmente no mundo de interesse dos alunos. Essa forma de transmissão do conhecimento, mais colaborativa e com maior interação do aluno deixa de ser uma passagem unilateral do conhecimento e o aluno passa a ter um papel mais ativo no processo. (NUNES; GALLOTTA, 2004). 2.3 Histórias em quadrinhos como ferramenta educacional De acordo com Vergueiro (apud ARAÚJO et al. 2008), o Brasil é o pioneiro em pesquisas e estudos acerca do meio de comunicação de massa histórias em quadrinhos na universidade. Segundo esse autor, na Universidade de Brasília (UnB) foi criada a primeira disciplina de história em quadrinhos em um curso de graduação, como os cursos de Artes Visuais (licenciatura e bacharelado) e de Letras (licenciatura). (VERGUEIRO, 2004 apud ARAÚJO et al. 2008). A história em quadrinhos pode ser utilizada na educação como instrumento para a prática educativa como suporte, ferramenta, apoio no processo de ensino e aprendizagem e compreensão de conteúdos das variadas disciplinas, como história, português, biologia, geografia entre outras, como também em outras áreas do conhecimento. Segundo Araújo et al. (2008), pode-se trabalhar a utilização dos quadrinhos como um meio artístico e, como recurso pedagógico em sala de aula por meio da transmissão da mensagem em dois processos. [...]por meio da linguagem verbal – expressa a fala, o pensamento dos personagens, a voz do narrador e o som envolvido – e por meio da linguagem visual – no qual o leitor interpretará as imagens contidas nas histórias em quadrinhos. Unindo estes dois processos, chega-se ao escopo que o enunciado verbal pretende transmitir ao leitor (ARAÚJO et al. 2008:5). De acordo com Ferraz e Fusari (apud ARAÚJO et al. 2008), as histórias em quadrinhos, além de serem uma linguagem artística e de comunicação social, despertam no público infantil e jovem grande interesse devido as suas diversas possibilidades interativas e imaginativas, que podem nos auxiliar a compreender a diversidade de interpretações de imagens e temas. (FERRAZ; FUSARI, 1993 apud ARAÚJO et al. 2008). 43 A respeito do uso de histórias em quarinhos na sala de aula, como ferramenta educacional, Vergueiro (apud ARAÚJO et al. 2008) nos diz que o aparecimento desse meio de comunicação de massa na sala de aula começou lento e tímido. Muitas histórias em quadrinhos eram utilizadas, no inicio, para fazerem ilustração de algum texto ou para auxiliarem um conteúdo que necessitasse ser explicado de forma visual, como em muitos livros didáticos de Língua Portuguesa. Entretanto, após a percepção dos bons resultados que os quadrinhos estavam trazendo para o processo de ensino-aprendizagem, passou-se a haver um maior interesse pelo uso deste recurso didático- pedagógico na sala de aula. Atualmente, o uso de histórias em quadrinhos no âmbito escolar é reconhecido pela Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional (LDB) n.º 9.394/96 e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (VERGUEIRO, 2004 apud ARAÚJO et al. 2008). Os quadrinhos estimulam muito a inteligência e a imaginação dos jovens, aliando-se a um raciocínio e comunicação mais direta e objetiva. Assim, os quadrinhos também podem funcionar como um estimulante objeto de aprendizagem pelo fato de utilizar dois códigos indispensáveis para o desenvolvimento cognitivo: o visual e o verbal, mas também por ser um instrumento pedagógico viável e prático no sentido de poder levar o aluno a uma melhor compreensão do conteúdo apresentado durante as aulas. (ARAÚJO et al. 2008). Portanto, as histórias em quadrinhos não possuem somente a função de objeto de leitura e entretenimento, as mesmas também podem ser utilizadas de forma eficiente para transmissão de conhecimentos específicos. O mesmo pode-se afirmar em relação às histórias em quadrinhos eletrônicas (HQtrônicas), as quais não estão desatreladas do conceito de HQ, entretanto possuem características específicas que a tornam singulares. Com base em pesquisas realizadas por Mayer (apud KUPCZIK et al. 2008), a eficiência na transmissão de informação através de imagens atreladas a conteúdos verbais se mostrou mais eficiente que a utilização única de palavras, pois a linguagem visual tem a capacidade de permitir que o ser humano integre e sintetize mais eficientemente grandes quantidades de informação. Portanto, a integração entre palavras (elementos textuais) e imagens (elementos visuais), reforça a 44 idéia de utilizar as HQtrônicas como Objeto de Aprendizagem. (MAYER, 2001 apud KUPCZIK et al. 2008). Uma das principais características das HQtrônicas é hipertextualidade, que consiste em hiperlinks para informações, documentos, páginas entre outros destinos capazes de tornar fácil e agradável a busca de informações. Para Madej (2003) o desenvolvimento do hipertexto forneceu as narrativas um novo meio no qual crescer, pois a propriedade do hipertexto de abranger as histórias que incluem exploração e descoberta interativas oferece um potencial para a criação de novas formas de contar histórias. (MADEJ, 2003 apud KUPCZIK et al. 2008). [...]utilizar a história em quadrinho enquanto recurso didático- pedagógico poderá ser de grande valia e de enriquecimento para o aluno, que poderá conhecer profundamente a sua linguagem enquanto meio de comunicação de massa e artística e, principalmente, obter conhecimento relacionado ao conteúdo da disciplina em que esteja trabalhando ou estudando (ARAÚJO et al. 2008). . 45 46 3.1 A passagem do papel para o computador Historicamente produzidas para serem publicadas no suporte papel as histórias em quadrinhos sempre mantiveram seu processo de criação intimamente ligado com a reprodutibilidade gráfica. Entretanto, com o passar dos anos, os quadrinhistas sentiram que suas possibilidades expressivas e artísticas estavam sendo limitadas neste suporte, uma vez que o uso de cores, auto-relevo e outros recursos podiam ser raramente utilizados devido ao alto custo da impressão, além das barreiras que uma produção a ser veiculada no suporte papel imprime. Foi a partir de meados da década de 1980 que quadrinhistas e artistas produtores de HQ’s passaram a se utilizarem da tecnologia disponível na época (mesmo pouco avançadas se comparadas com o que conhecemos atualmente) e perceberam as inúmeras possibilidades que o computador e softwares dispunham. No início dessa descoberta, as primeiras HQ’s foram digitalizadas para poderem ser lidas no computador, ou seja, nesse momento a máquina tinha unicamente a função de servir também como um suporte, assim como o papel. Poucos anos depois, com a tecnologia a seu favor, alguns quadrinhistas que se permitiam conhecer e produzir por meio dela passaram à experimentação dos softwares e começaram a desenvolver as primeiras HQ’s produzidas totalmente no computador, ou seja, o computador estava sendo utilizado como principal ferramenta para composição dos desenhos, para a colorização, e todos os outros elementos que compõem uma HQ, não havendo o uso de papel, lápis, borracha, tinta, etc. Os pioneiros dessa experimentação foram os quadrinhistas americanos Mike Saenz e Peter Gillis que em 1984 desenvolveram a história em quadrinhos intitulada Shatter (Figura 14). Essa HQ teve todos os seus desenhos feitos diretamente na tela do computador com o auxilio do mouse experimentandoassim a imaterialidade da imagem digital. Por esse motivo, Shatter é considerado um trabalho visionário por muitos estudiosos como Álvaro de Moya e Scott McCloud, pois na época, os equipamentos possuíam pouca velocidade e memória para armazenamento de dados. Apesar de ter sido produzida na íntegra no computador, essa HQ foi impressa no suporte papel no formato revista. (FRANCO, 2008). 47 Com a utilização do computador e de softwares de manipulação de imagem os quadrinhistas ganham novas possibilidades no sentido de intervenção e manipulação das imagens, refazendo uma cena semelhante à outra, mudando a cor um cenário ou de um objeto em questão de segundos com um simples comando, inaugurando uma mudança significativa na arte de produzir histórias em quadrinhos. Os artistas que trocam o lápis e o papel pelos tubos de raios catódicos podem visualizar imediatamente cada imagem e explorar as novas possibilidades, modificando-as interativamente. Esse feedback com o terminal catódico oferece a possibilidade de improvisar livremente as variações do computador[...] (PARENTE, 1996 apud FRANCO, 2008:58). Com o avanço da tecnologia e o domínio das ferramentas dos softwares foram feitas as primeiras cenas apresentando efeitos tridimensionais (3D), criando imagens até então não vistas em nenhuma HQ anterior. A primeira publicação em quadrinhos a apresentar, até então, essa novidade foi a grapic novel Crash de Mike Saenz. Apesar das imagens possuírem ainda algumas falhas de resolução deixando o rosto dos personagens com uma aparência dura e robótica, elas proporcionavam um detalhado efeito tridimensional jamais obtido pelos desenhos feitos no suporte papel. Figura 14. Capa de Shatter 48 As possibilidades e facilidades que o uso do computador proporcionou para os quadrinhistas foram inúmeras. Alguns produtores de HQ’s puderam utilizar uma caneta gráfica que conectava os movimentos da mão do artista como o monitor, dessa forma o que era desenha em alguma superfície específica era transmitido fielmente para o computador, possibilitando com que aqueles que não possuíam habilidade para desenhar e colorir no computador pudessem produzir uma HQ utilizando esses recursos computacionais. Outra possibilidade está relacionada com a capacidade de armazenamento que os computadores possuem para gravar em sua memória cenas de ambientes nos mais diversos ângulos, pois como foram construídos em 3D podiam ser visualizados de vários pontos de vista como se uma câmera cinematográfica estivesse em um espaço real. Isso também facilitou os movimentos dos personagens que já possuíam sua base sempre pronta possibilitando ao quadrinhista a mobilidade dos membros e cabeça para serem usados em diversas posições e ângulos nas cenas, ou seja, passou-se a estruturar uma biblioteca de imagens em 3D. Um dos primeiros quadrinhistas a se utilizar desses artifícios foi Michael Götze na obra “O Império dos Robôs”, de 1988 (Figura 15). “A vantagem do método de Götze é a possibilidade de criar um sem-número de narrativas dentro dos ambientes gerados sem precisar redesenhar nada”. (FRANCO, 2008). “Trabalhar com o computador apresenta uma considerável vantagem: guardar cada imagem disponível, sempre em condições de poder ser alterada”. (LADRIN, 1989 apud FRANCO, 2008). No Brasil, a produção de uma HQ com o uso do computador data de 1991. A tira Nacional e Popular, executada pelos quadrinhistas Maracy, Tony e Smiroff foi publicada no caderno Ilustrada do jornal Folha de São Paulo. 3.2 Do computador para o CD-ROM Durante essa transposição de suporte, as HQ eram produzidas no computador ou para serem impressas ou mesmo para serem lidas no próprio Figura 15. Império dos Robôs de Michael Götze 49 computador, ambas com pouca ou nenhuma possibilidade de interação e ainda limitadas. Porém, a partir de meados de 1990 um novo rumo é dado às transformações que as HQ’s vinham sofrendo. Um novo suporte passou a ser utilizado, dessa vez o CD-ROM, que possibilitou a utilização de novos recursos multimídia5, como o efeitos sonoros, a animação, o uso de cores sem a preocupação com custos de impressão que não irá exercer influência nos custos finais da produção. Além disso, agora as HQ’s poderiam ser reproduzidas e distribuídas em maior número uma vez que a reprodução digital idêntica à original era mais fácil de ser feita e também mais barata. Essa significativa mudança proporcionou uma gama de possibilidades quanto a forma e linguagem das HQ’s tradicionais, tanto que muitos quadrinhistas passaram a realizar experimentações, criando as HQ-ROM’s ou BD-ROM’s (histórias em quadrinhos veiculadas no suporte CD-ROM). (FRANCO, 2008). As HQ-ROM’s puderam possuir trilhas e efeitos sonoros, cenas animadas, mapas interativos, visualização de fotografias, documentos, entrevistas, etc. Uma das primeiras HQ-ROM’s cujo lançamento data de 1991, intitulada “Sinkha”, de Marco Patrito, se utilizava da fusão entre texto escrito, trilha sonora e animação, o que era algo novo para a época. Outra precursora de HQ’s para CD-ROM é a “Opération Teddy”, de Edouard Lussan lançada em 1995, que contava com uma narrativa hipertextual onde o leitor podia acompanhar e, se desejasse, obter informações complementares da história, uma vez que “Opération Teddy” é baseada em situações da Segunda Guerra Mundial, possuindo inclusive um caráter didático. Os recursos multimídias começam a estar mais presente nas HQ’s para CD-ROM e um exemplo que explorar bastante esse recurso é a HQ-ROM “Superman: The Mysterious Mr. Myst” que se utiliza de forma ampla da interatividade. O menu dessa produção dispõe da possibilidade de controle manual ou automático, as vozes das personagens e a trilha sonora podem ser comandadas pelo leitor que decide ligá-las ou desligá-las. Para época a disponibilização desses recursos era algo bastante inovador tendo em vista a história dos quadrinhos que no suporte papel jamais poderia oferecer tais 5 De forma mais abrangente multimídia pode ser entendida como o conjunto de textos, imagens, sons, animações, interações e vídeos. 50 possibilidades. O leitor pode selecionar a página que irá iniciar a leitura, porém para compreender a história o leitor deveria clicar em todas as páginas, ou seja, o seu ritmo de leitura era linear e determinado pelos criadores da HQ- ROM. A estrutura de “Superman: The Mysterious Mr. Myst” conta com botões explicativos de todos os comandos presentes no menu, botões de avançar e retroceder, além da possibilidade de ver os créditos da produção. Percebesse então uma falsa multilinearidade uma vez que é dada a opção do leitor escolher por qual caminho irá percorrer sua leitura, porém se ele não começar por onde se deve começar (do início) sua compreensão é prejudicada. 3.3 HQ’s e a internet As primeiras inserções de histórias em quadrinhos na internet que se tem conhecimento foram bem simples e superficiais. Os quadrinhos eram somente transpostos de sua forma impressa e disponibilizados na rede, ou seja, as páginas das HQ’s eram apenas digitalizadas para serem acessada e/ou “baixadas” para serem lidas na tela do computador. Nessa primeira fase não havia a preocupação em adaptar o formato, a linguagem e nem de utilizar recursos que a internet possibilitava. A partir de 1990, alguns quadrinhistas começaram a realizar experimentações visando à publicação de HQ’s na internet. Tradicionalmente o formato das páginas das HQ’s impressas era no sentido vertical, mas para adaptar a leitura e visualização na
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