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Caso dos Exploradores de Cavernas - Escola de Cada Juiz

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Dos Papéis dos Juizes n”O Caso dos Exploradores de Cavernas”
“Se vocẽ está sentado à mesa há 30 minutos e não sabe ainda quem é o pato, o pato é você.”
Warren E. Bufett d'aprés jogadores de poquer
A análise do livro em questão, ”O Caso dos Exploradores de Cavernas”, deve iniciar-se por uma análise de autor, seu papel vis-a-vis o status quo politicoacadêmico e sua linha filosófica na tentativade estabelecer uma mínima idéia da ideologia subjacente e do objetivo deste trabalho. Uma peça alegórica interpretada literalmente certamente levará a conclusões distintas das pretendidas pelo autor.
Comecemos, pois, examinando o contexto temporal, geográfico, social e político quando este livro foi escrito. Boston, Massachussetts, 1949. Trata-se período climáceo do que chama-se mccarthyismo, processo de expurgo de supostos simpatizantes de esquerda do establishment estadunidense. É a era do Comitê de Atividades Antiamericanas, criado por Truman e eventualmente capitaneado pelo próprio Senador McCarthy, de Ronald Reagan promovendo uma limpa no Sindicato dos Atores de Hollywood, de Ayn Rand ditando a linha da propaganda literária estadunidense, do início da Guerra Fria e de Bobby Kennedy, filho ilustre do maior donatário de Harvard à época, à frente da Procuradoria Geral dos EUA nos processos da chamada “caça às bruxas”. Ninguém era publicado na Ivy League em geral e em Harvard especificamente sem passar por um rigoroso e sistemático processo de censura prévia�. Conclui-se que Lon L. Fuller era um membro do establishment.
No universo jurídico, os EUA passavam por um período de revisão dogmática
“The Morality of Law”, considerada sua opus maximus, propõe uma ponderação entre o jusnaturalismo e o juspositivismo, colocando-o no panteão dos grandes doutrinadores estadunidenses do século XX. Seu trabalho está ativamente inserido no processo transicional do Direito estadunidense do século XIX para a segunda metade do século XX, quando situam-se em primeiro plano as discussões sobre os procedimentos de interpretação da Lei (“statutory interpretation”), com um debate acirrado� entre aplicar-se o princípio de equidade consoante com o jusnaturalismo e o direito consuetudinário ou restringir-se a latitude de interpretação� de magistrados numa direção mais normativista, respeitando a “letra da Lei” o que chamam por lá de textualismo�, que em outras partes poder-se-ia equacionar em linhas gerais com o historicismo. 
O Professor Fuller equaciona o juspositivismo com o “distinguir a lei que é da lei que deveria ser�” 
Quanto aO Caso dos Exploradores de Cavernas, é justo supor que o autor jamais imaginou que este exercício acadêmico viralizasse e pereniza-se, atingindo o papel de destaque internacional que hoje tem no estudo do direito romanogermânico em países de direito romanogermânico. Seus alunos em Harvard, o público para quem este conto foi originalmente escrito, estava estudando Common Law. É um atestado da competência do autor, principalmente de sua capacidade de síntese do pensamento das diversas escolas do Direito, que sua obra tenha alcançado tal abrangência. 
No gênero de estrutura narrativa, examinar os papéis dedicados a seus personagens para, finalmente, pesar o conteúdo do exercício proposto pelo Prof. Fuller em Harvard no início dos anos 60. Legal realism?
A obra é alegórica e faz referência estilística e estrutural aos contos de moralidade ingleses da baixa Idade Média, dos quais Everyman é emblemático. Geralmente, a narrativa neste gênero gira em torno de um desafio às ou julgamento das falhas trágicas do Herói, que representa a Humanidade, e tem como objetivo passar à plateia um ou mais ensinamentos morais. 
Antes de prosseguirmos, considere-se que, neste estilo dramático, as personagens são unidimensionais e personificam cada qual uma qualidade ou vício da natureza humana, como Avareza ou Força, ou são abstrações, como Juventude ou Conhecimento. A simplicidade e a transparência da alegoria têm como objetivo garantir que a audiência atingisse plena e clara compreensão do ensinamento final, de cunho eminentemente moralizante.
Na obra do prof. Fuller, a escolha dos nomes das personagens acompanha a cartilha acima: Truepenny (moeda de centavo verdadeira [literal], valor de face [figurado]), Foster (acolher, criar), Tatting (forma de bordado rebuscado, também lembra “in tatters”, que significa “em frangalhos”), Keen (aguçado) e Handy (conveniente). Para dirimir quaisquer dúvidas acerca da intencionalidade das escolhas, o autor teve cuidado de garantir que também os nomes das personagens secundárias seguissem esta regra�, bem como o da comunidade (Commonwealth), Newgarth (novo quintal [literal], Nova Harvard� [figurado]).
Cada juiz representa uma escola do Direito e analisa o caso do ponto de vista desta, a saber: Truepenny, juspositivismo ou textualismo no jargão estadunidense�; Foster, jusnaturalismo clássico; Tatting, subjetivismo; Keen, direito puro; e Handy, utilitarianismo teleológico. É difícil não enxergar em algumas destas personagens referências a grandes doutrinadores representativos de suas vertentes de pensamento: Foster no papel Rousseau, Keen como Kelsen e Handy no lugar de Ihering. Truepenny não é desenvolvido o suficiente ao longo da trama e Tatting é peripatético demais para posar de Kant.
Por debaixo da estrutura narrativa formal percebe-se um toque de ironia direcionada principalmente ao encastelamento intelectual das personagens e de alguns daqueles que elas visam retratar. Algumas personagens oferecem críticas às outras doutrinas, o que ajuda a ressaltar as diferenças entre cada escola jurídica. 
A premissa do autor é que existe um evento jurídico que contrapõe o direito positivado e os valores de uma comunidade, justificando-se moralmente o ilícito penal com o argumento do despertar do instinto de sobrevivência em uma situação extrema e imprevista. 
O Professor Fuller discute se, na eventualidade da lei natural reforçada por um contrato privado�, ir de encontro com o que está positivado, o magistrado, quando empatizar com o que concluiria um defensor da lei natural deve aplicar a lei moral ou tecnicamente.
A moral da história é que, no impasse, deve prevalecer a lei conforme está positivada�. Um ensinamento secundário é que a sentença pode diferir de acordo com a doutrina aplicada.
contrapõe ao código penal vigente a este aplica uma camada de complexidade: a disputa entre o e a aversão a cometer-se atos que ou sejam ilegais e/ou que provoquem repugnância moral, para todos os efeitos universal�. Neste caso, o tabu atávico que proíbe o canibalismo. É importante notar que não discute-se a legalidade do ato de canibalismo. O mesmo serve tão somente para exacerbar a situação limítrofe na qual os exploradores encontram-se e os obstáculos que tiveram de galgar. Nem tampouco quem examina o caso deve ater-se à opinião pessoal acerca do ato de canibalismo, o que importa é que os juízes todos concordam moralmente a respeito do dilema e que seu senso comum, a bússola moral coletiva da comunidade, aponta em sentido oposto do que dita a Lei.
Os elementos importantes são: situação desesperadora, contrato social depois revogado, contrato privado em conflito com norma agendi, 
O exercício propõe uma medida de abstração� tão elevada que sua validade existe num plano superior tanto àquele onde situa-se seu objetivo manifesto quanto ao da própria barreira entre common law e o direito romanogermânico. Uma observação empírica, fruto da reiterada e eficaz aplicação deste exercício com centenas de milhares de alunos tanto de direito romanogermânico quanto de common law� ao longo de décadas é prova irrefutável disto.
�	BELLAH, ROBERT McCarthyism at Harvard New York: NYTimes Book Review, 10/2/2005
�	A discussão ainda mantém-se viva e pode ser observada em disputas doutrinárias contemporâneas entre os juízes da Suprema Corte, Antonin Scalia, falecido, e Stephen Bryer, ambos eméritos ex-alunos de Harvard formados precisamentena década de 1960.
�	Vide Parol Evidence Rule
�	Nas palavras do falecido Juiz Antonin Scalia "the Constitution tells us not to expect nit-picking detail, and to give words and phrases an expansive rather than narrow interpretation – though not an interpretation that the language will not bear." SCALIA, ANTONIN Arguing About Law New York: Routledge, 2009, p. 426
�	The Law in Quest of Itself BeaconPress 1966
�	Whetmore é um trocadilho entre “whet [the appetite]” que significa atiçar o apetite e “whet [a knife]” que significa amolar uma faca, geralmente antes de batalha ou de retalhar-se um animal e “more” que equivale a “mais”; Commonwealth (comunidade) v. Staymore (“fica mais” foi o nome dado pelo autor a uma personagem que estaciona o veículo e naõ consegue ir embora); Fehler (fulano) v. Neegas (onomatopaico que lembra negação); Commonwealth v. Parry (“defender-se [de golpes de espada]” é o nome do réu do caso de defesa própria); Commonwealth v. Scape (“[bode] expiatório” é o paciente no caso de justiça pelas próprias mãos); Commonwealth v. Makeover (“reforma” refere-se ao caso de reabilitação); Commonwealth v. Valjean (o autor faz referência explícita a Jean Valjean o protagonista dOs Miseráveis, que é condenado por furtar um pedaço de pão)
�	“Garth” é inglês medieval para “yard”, que significa literalmente quintal. O coração da Universidade de Harvard é o seu jardim central, Harvard Yard.
�	Como quase toda sua participação é dedicada ao relato dos fatos e como o textualismo é uma escola bastante particular do Common Law, talvez o Juiz Truepenny possa ser equacionado, para efeito de uma análise mais condizente com a realidade do direito romanogermânico com o historicismo.
�	Mesmo este contrato estando em conflito direto com o direito objetivo vigente
�	A concluir a partir do entendimento da corte de primeira instância, confirmada após recurso.
�	com exceção de algumas tribos com fortes resquícios de costumes paleolíticos nas ilhas pacíficas, África, Caribe e Américas Central e do Sul, estatística e culturalmente irrelevantes para a análise do que podemos extrapolar sobre o que seria o perfil cultural do cidadão do Commonwealth de Newgarth.
�	Desde o local fictíco quanto à 
�	D'AMATO, ANTHONY The Speluncean Explorers – Further Proceedings Palo Alto: Stanford Law Review, 1980, p. 467

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