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CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES 1.1 Introdução Talude é qualquer superfície inclinada que limita um maciço de terra, de rocha ou de ambos. Pode ser natural, caso das encostas ou vertentes, ou artificial, quando construído pelo homem, caso dos cortes e aterros. A Figura 1.1 mostra a terminologia comumente adotada para os taludes. Figura 1.1 – Terminologia usada para taludes de terra Fonte: Fiori e Carmignani (2009) Os taludes naturais (Figura 1.2) possuem estrutura particular e está intimamente ligado ao histórico de tensões sofridas ao longo do tempo: erosão, tectonismo, intemperismo, etc. Vários fatores atuam isoladamente ou conjuntamente durante o processo de formação de um talude natural, classificados em dois grupos: Fatores geológicos: litologia (constituintes); estruturação (dobras, falhas) e geomorfologia (tendência evolutiva dos relevos) Fatores ambientais: clima, topografia, vegetação, etc. Figura 1.2 – Taludes naturais: Serra da Capivara(a) e Serra das Confusões(b) Do ponto de visa teórico, um talude se apresenta como uma massa de solo submetida a três campos de forças distintos: forças devidas ao peso dos materiais, forças devidas ao escoamento de água e forças devidas à resistência ao cisalhamento. O estudo da estabilidade dos taludes deve, necessariamente, considerar o equilíbrio entre essas forças, uma vez que as duas primeiras se somam, e tendem a movimentar a massa de solo encosta abaixo, enquanto a última atua como um freio a essa movimentação. Em termos gerais, um escorregamento (movimento de massa) ocorre quando a relação entre a resistência ao cisalhamento do material e a tensão de cisalhamento na superfície potencial de movimentação decresce até atingir uma unidade, no momento do escorregamento. Na estabilidade dos taludes intervêm condicionantes relativos à natureza dos materiais constituintes e dos agentes perturbadores, quer sejam de natureza geológica, antrópica ou geotécnica. Quanto a sua importância, basta atentar para os numerosos acidentes ocorridos e que ocorrem com (a) (b) CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES frequência, em todas as épocas e em todas as partes do mundo, não raramente com perdas de vidas humanas e grandes prejuízos materiais. Portanto, a seguir são apresentados os tipos de movimentos de massa de solo, as possíveis causas da instabilização dos taludes, a descrição de alguns métodos de verificar a estabilidade de taludes, assim como algumas alternativas de estabilização. 1.2 Tipologia dos Movimentos de Massa Os movimentos de massa podem ser de diversos tipos, pois envolvem uma variedade de materiais e processos. Uma das classificações mais utilizadas internacionalmente, devido a sua simplicidade, é a proposta por Varnes (1978) que se baseia no tipo de movimento e no tipo de material transportado. Dentre as classificações brasileiras, destacam-se as de Freire (1965), de Guidicini & Nieble (1984) e de Augusto Filho (1992), das quais esta última é apresentada na Tabela 1.1. Vale ressaltar que qualquer esquema proposto apresenta limitações, uma vez que na natureza os escorregamentos tendem a ser mais complexos, dificultando estabelecer limites entre classes ou ainda pela manifestação de várias classes num mesmo movimento. Tabela 1.1 – Principais tipos de movimentos de massa em encostas Processos Dinâmica/Geometria/material Rastejos Vários planos de deslocamento (internos); Velocidades muito baixas (cm/ano) a baixas e decrescentes com a profundidade; Movimentos constantes, sazonais ou intermitentes; Solo, depósitos, rocha alterada/fraturada; Geometria indefinida Escorregamentos Poucos planos de deslocamento (externos); Velocidades médias (m/h) a altas (m/s); Pequenos a grandes volumes de material; Geometria e materiais variáveis: Planares – solos pouco espessos, solos e rochas com um plano de fraqueza; Circulares – solos espessos homogêneos e rochas muito fraturadas; Em cunha – solos e rochas com dois planos de fraqueza. Quedas Sem planos de deslocamento; Movimentos tipo queda livre ou em plano inclinado; Velocidades muito altas (vários m/s); Material rochoso; Pequenos a médios volumes; Geometria variável: lascas, placas, blocos, etc. Rolamento de matacão; Tombamento. Corridas Muitas superfícies de deslocamento; Movimento semelhante ao de um líquido viscoso; Desenvolvimento ao longo das drenagens; Velocidades médias a altas; Mobilização de solo, rocha, detritos e água; Grandes volumes de material; Extenso raio de alcance, mesmo em áreas planas. Fonte: Augusto Filho (1992) CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES 1.2.1 Escorregamentos Dentre os processos de movimentos de massa, os mais frequentes são os escorregamentos. O termo escorregamento tem diversos sinônimos de uso mais generalizado na linguagem popular como deslizamento, queda de barreira, desbarrancamento, etc. Trata-se de movimentos rápidos, de porções de terrenos (solos e rochas), com volumes definidos, deslocando-se sob ação da gravidade, para baixo e para fora do talude ou da vertente. Em termos gerais, um escorregamento ocorre quando a relação entre a resistência ao cisalhamento do material e a tensão de cisalhamento na superfície potencial de movimentação decresce até atingir uma unidade, no momento do escorregamento. Ou seja, no momento em que a força gravitacional vence o atrito interno das partículas, responsável pela estabilidade, a massa de solo movimenta-se encosta abaixo. Normalmente, a infiltração de água no maciço de solo provoca a diminuição ou perda total do atrito entre as partículas. Quando o solo atinge o estado de saturação com perda total do atrito entre as partículas, em processo conhecido como solifluxão, passa a se mobilizar encosta abaixo, formando os movimentos de escoamento do tipo corridas. A velocidade do movimento depende da inclinação da superfície de escorregamento, da causa inicial de movimentação e da natureza do terreno, variando de quase zero a alguns metros por segundo. Os movimentos mais bruscos ocorrem em terrenos relativamente homogêneos, que combinam coesão com atrito interno elevado. Levando em consideração a geometria e a natureza dos materiais instabilizados, os escorregamentos podem ser subdivididos em três tipos: escorregamentos rotacionais ou circulares, escorregamentos translacionais ou planares e escorregamentos em cunha. Escorregamentos rotacionais ou circulares Os escorregamentos rotacionais caracterizam-se por uma superfície de ruptura curva ao longo da qual se dá um movimento rotacional do maciço de solo (Figura 1.3). Figura 1.3 – Esquema de escorregamento rotacional(a) e Escorregamento rotacional em Jaraguá do Sul, SC, dez/2008(b). Fonte: Tominaga et. al. (2009) A ocorrência destes movimentos está associada geralmente à existência de solos espessos e homogêneos, como os decorrentes da alteração de rochas argilosas. O início do movimento muitas vezes é provocado pela execução de cortes na base destes materiais, como na implantação de uma estrada, ou para construção de edificações, ou ainda pela erosão fluvial no sopé da vertente. O escorregamento rotacional de solo é um fenômeno frequente nas encostas do sudeste brasileiro, mobilizando geralmente o manto de alteração. Podem se tornar processos catastróficos, com o deslizamento súbito do solo residual que recobre a rocha ao longo de uma superfície qualquer de ruptura, ou ao longo da própria superfície da rocha. CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADEDE TALUDES Escorregamentos translacionais ou planares Os escorregamentos translacionais são os mais frequentes entre todos os tipos de movimentos de massa. Formam superfícies de ruptura planar associadas às heterogeneidades dos solos e rochas que representam descontinuidades mecânicas e/ou hidrológicas derivadas de processos geológicos, geomorfológicos ou pedológicos. A morfologia dos escorregamentos translacionais caracteriza-se por serem rasos, com o plano de ruptura, na maioria das vezes, a 0,5 a 5,0 m de profundidade e com maiores extensões no comprimento. Ocorrem em encostas tanto de alta como de baixa declividade e podem atingir centenas ou até milhares de metros (Figura 1.4). Os materiais transportados pelos escorregamentos translacionais podem ser constituídos de rocha, de solo e de solo e rocha. Nos escorregamentos translacionais de rocha, a movimentação se dá em planos de fraqueza que correspondem às superfícies associadas à estrutura geológica, tais como, estratificação, xistosidade, gnaissificação, acamamento, falhas, juntas de alívio de tensões e outras. Figura 1.4 – Esquema de escorregamento planar ou translacional de solos(a). Escorregamentos planares em: (b) Campo Limpo Paulista (2009); (c) Várzea Paulista (2006) e (d) Nova Lima, MG. Fonte: Tominaga et. al. (2009) Escorregamentos translacionais de solo são movimentos ao longo de uma superfície plana condicionada a alguma feição estrutural do substrato. Ocorrem dentro do manto de alteração, com forma tabular e espessuras que dependem da natureza das rochas, do clima e do relevo. Em geral, o movimento é de curta duração, de velocidade elevada e grande poder de destruição. Os escorregamentos translacionais associados com maior quantidade de água podem passar a corridas, ou podem se converter em rastejo, após a acumulação do material movimentado no pé da vertente. Nos escorregamentos translacionais de solo e rocha, a massa transportada pelo movimento apresenta um volume de rocha significativo. O que melhor representa tais movimentos é a que envolve massas de tálus/colúvio. Os depósitos de tálus/colúvio que, em geral, encontram-se nos sopés das CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES escarpas, são constituídos por blocos rochosos e fragmentos de tamanhos variados envolvidos em matriz terrosa, provenientes do mesmo processo de acumulação. Os escorregamentos translacionais, em geral, ocorrem durante ou logo após períodos de chuvas intensas. É comum que a superfície de ruptura coincida com a interface solo-rocha, a qual representa uma importante descontinuidade mecânica e hidrológica. A ação da água nestes movimentos é mais superficial e as rupturas ocorrem em curto espaço de tempo, devido ao rápido aumento da umidade durante eventos pluviométricos de alta intensidade. No Brasil, são frequentes os casos de escorregamentos translacionais, principalmente na Serra do Mar, como os ocorridos nas Serras de Caraguatatuba e das Araras em 1967. Em perfis de alteração como os da Serra do Mar, estes movimentos não transportam apenas materiais terrosos, mas envolvem também blocos rochosos mais ou menos alterados. Escorregamentos em cunha Os escorregamentos em cunha têm ocorrência mais restrita às regiões que apresentam um relevo fortemente controlado por estruturas geológicas. São associados aos maciços rochosos pouco ou muito alterados, nos quais a existência de duas estruturas planares, desfavoráveis à estabilidade, condiciona o deslocamento de um prisma ao longo do eixo de intersecção destes planos. Ocorrem principalmente em taludes de corte ou em encostas que sofreram algum tipo de desconfinamento, natural ou antrópico (Figura 1.5). Figura 1.5 – Escorregamento em cunha em: (a) Quartizito em Rio Acima, MG; (b) Talude de filito alternado com quartzito da Formação Cercadinho em Belo Horizonte, MG. Fonte: Tominaga et. al. (2009) 1.2.2 Queda de blocos A queda de blocos é outro tipo de movimento gravitacional de massa comum nas escarpas da Serra do Mar. Define-se uma queda de blocos como uma ação de queda livre a partir de uma elevação, com ausência de superfície de movimentação. Nos penhascos ou taludes íngremes, blocos e/ou lascas dos maciços rochosos deslocados pelo intemperismo, caem pela ação da gravidade (Figura 1.6). A queda pode estar associada a outros movimentos como saltação, rolamento dos blocos e fragmentação no impacto com o substrato. As causas das quedas de blocos são diversas: variação térmica do maciço rochoso, perda de sustentação dos blocos por ação erosiva da água, alívio de tensões de origem tectônica, vibrações e outras. CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Figura 1.6 – Queda de blocos rochosos em Santos, 1992 e 2009. Fonte: Tominaga et. al. (2009) 1.2.3 Corridas Corridas são formas rápidas de escoamento de caráter essencialmente hidrodinâmico, ocasionadas pela perda de atrito interno das partículas de solo, em virtude da destruição de sua estrutura interna, na presença de excesso de água. Estes movimentos são gerados a partir de grande aporte de materiais como solo, rocha e árvores que, ao atingirem as drenagens, formam uma massa de elevada densidade e viscosidade. A massa deslocada pode atingir grandes distâncias com extrema rapidez, mesmo em áreas pouco inclinadas, com consequências destrutivas muito maiores que os escorregamentos (Figuras 1.7 e 1.8). Figura 1.7 - Esquema de corrida detrítica(a) e Corrida detrítica no Morro do Baú, SC, dez.2008.(b) Fonte: Tominaga et. al. (2009) Figura 1.8 – Materiais arrastados nos desastres que assolaram o Estado de Santa Catarina em novembro de 2008, no município de Ilhota (Braço do Baú). CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Fonte: Tominaga et. al. (2009) 1.2.4 Rastejos Rastejos são movimentos lentos e contínuos de material de encostas com limites indefinidos. Envolvem, muitas vezes, grandes volumes de solos, sem que apresente uma diferenciação visível entre o material em movimento e o estacionário. A ocorrência de rastejo pode ser identificada através da observação de indícios indiretos, tais como: encurvamento de árvores, postes e cercas, fraturamento da superfície do solo e de pavimentos, além do "embarrigamento" de muros de arrimo. A causa da movimentação nos rastejos é a ação da gravidade, associada também aos efeitos das variações de temperatura e umidade. O processo de expansão e contração da massa de material, devido à variação térmica, provoca o movimento, vertente abaixo. 1.3 Causas dos movimentos de massa O material que compõe um talude tem a tendência natural de escorregar sob a influência da força da gravidade, entre outras, que são suportadas pela resistência ao cisalhamento do próprio material. Para Dyminski (2015) os mecanismos de ruptura são aqueles que levam a um aumento dos esforços atuantes ou a uma diminuição da resistência do material que compõe o talude ou do maciço como um todo (Figura 1.9). Figura 1.9 – Tensões atuantes no talude Fonte: Dyminski (2015) Guidicini e Nieble (1984) discutem os condicionantes da instabilização utilizando os termos agentes e causas de instabilização, e entendem como causa o modo de atuação de um determinado agente no processo de instabilização de um talude ou encosta. Descrevem as causas e agentes de movimentos de massa e subdividem as causas em internas, externas e intermediárias e os agentes em predisponentes e efetivos, preparatórios e efetivos imediatos. As causas do tipo internas são aquelas quedesencadeiam movimentos sem qualquer alteração na geometria da vertente ou talude, mas que resultam da diminuição da resistência interna do material. As causas externas provocam aumento das tensões de cisalhamento sem que haja variação na resistência do material associadas, por exemplo, as sobrecargas oriundas de aterros, abalos sísmicos e vibrações. 𝜏𝑅 = tensão resistente = 𝑐 + 𝜎 tan 𝜙 𝜏𝐴 = tensão atuante CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES As causas intermediárias são resultantes de efeitos causados por agentes no interior do talude como, liquefação espontânea, rebaixamento rápido do nível da água e erosão retrogressiva. Os agentes do tipo predisponentes são os fatores naturais intrínsecos às condições geológicas, geométricas e ambientais onde ocorrerá o movimento, não incluindo ações do homem. Os agentes efetivos, por sua vez, são o conjunto de elementos diretamente responsáveis pela deflagração dos movimentos, incluindo ações antrópicas, que em função da forma de participação, são preparatórios ou imediatos. Na Tabela 1.1 constam os principais agentes e causas dos movimentos de massa com base nos autores. Tabela 1.1 – Causas e Agentes dos movimentos de massa Causas Internas Efeito das oscilações térmicas; Redução dos parâmetros de resistência ao cisalhamento por intemperismo (aumento da pressão hidrostática, diminuição da coesão e ângulo de atrito interno do material). Intermediárias Elevação do nível piezométrico em massas homogêneas; Elevação da coluna da água em descontinuidades; Rebaixamento rápido do lençol freático; Erosão subterrânea retrogressiva (piping); Diminuição do efeito da coesão aparente. Externas Mudanças na geometria da encosta; efeitos de vibrações: mudanças naturais na inclinação das encostas por processos naturais ou artificiais. Agentes Predisponentes Condições geológicas (mineralógicas, tectônica e estratigráfica), geomorfológicas (inclinação e forma das vertentes) e climatológicas (regime hidrológico), além da ação gravitacional, calor e vegetação. Efetivos Preparatórios Pluviosidade, erosão pela água e vento, congelamento e degelo, variação de temperatura, dissolução química, ação de fontes e mananciais, oscilação do nível de lagos e marés e do lençol freático, ação de animais e humana, inclusive desflorestamento. Imediatos Chuvas intensas, fusão de gelo e neve, erosão, terremotos, ondas, ventos, ação do homem, etc. Fonte: Guidicini e Nieble (1984) Na sequência consta uma descrição das principais variáveis condicionantes (agentes) dos movimentos de massa que podem ser agrupadas, de forma geral, em seis fatores principais: geomorfologia, precipitações, geologia, solos, cobertura vegetal, e ação antrópica. 1.3.1 Geomorfologia Com relação aos aspectos associados ao relevo, os fatores de cunho geomorfológico englobam parâmetros como, declividade, forma da encosta, área de contribuição, orientação da encosta, espessura do solo, simetria do vale e elevação. Dentre estes parâmetros, a declividade vem sendo usada como o principal, ou mesmo o único, parâmetro de caráter topográfico incorporado aos estudos de previsão e definição das áreas instáveis. Além da declividade, a curvatura vertical e a curvatura horizontal merecem destaque: a primeira se refere ao caráter convexo/côncavo do terreno quando analisado em perfil, e a última, ao caráter divergente/convergente dos fluxos de matéria sobre o terreno quando analisado em projeção horizontal. A combinação de ambas caracteriza a forma do terreno. CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Em encostas com forma convexa, a água subterrânea é dispersa e as pressões neutras são menores do que em outros locais. Já em encostas côncavas tende a concentrar a água de recarga, assim, são mais propícias a apresentarem elevação do nível freático e a desenvolver pressões neutras mais elevadas. 1.3.2 Precipitações A água é um dos principais agentes detonadores dos movimentos gravitacionais de massa e, dessa maneira, a maioria das movimentações de encostas acontece no período chuvoso, porém estes movimentos não ocorrem somente diante dos índices pluviométricos, é necessário considerar o tempo de duração das chuvas, a condutividade hidráulica dos solos e a variação do grau de saturação. Entre as principais formas de atuação da água no solo, destacam-se: O aumento do grau de saturação reduzindo a coesão; A elevação da lâmina d’água facilitando o encontro com a frente de saturação; O estabelecimento de fluxo subterrâneo nas zonas de contato entre o manto de alteração e a rocha sã; Aumento do peso da massa detrítica; Incremento de pressões hidrostáticas em planos de descontinuidades estruturais de rochas e solos (fendas e trincas). 1.3.3 Geologia O estudo das características geológico-geotécnicas, como tipo de rocha e solo, presença de descontinuidades, falhas, fraturas, juntas e foliações, forma de alteração das rochas, são importantes no estudo dos processos geradores de áreas de perigo, tendo em vista que estes fatores tem implicação direta na potencialidade e pré-disposição a processos de dinâmica superficial, como os movimentos de massa. Nos taludes rochosos os mecanismos de instabilização são controlados pelo grau de alteração e pelas anisotropias existentes no maciço, tais como xistosidade, juntas e fraturas, cujas relações com o mecanismo de instabilização são regidas pelos seguintes fatores: Distribuição espacial das descontinuidades, Geometria dos taludes e encostas; Presença e natureza dos materiais e das descontinuidades; Cisalhamentos e movimentos anteriores. Com relação ao intemperismo, Porto (1996) divide os fatores condicionantes em dois grupos: exógenos ou endógenos. Os fatores exógenos dependem das condições climáticas e geomorfológicas. A questão climática está relacionada ao volume de precipitação e à temperatura. O processo de alteração química é maior quanto maior a disponibilidade de água em temperaturas mais elevadas. O papel do relevo relaciona-se ao tempo da reação entre a solução aquosa e a possibilidade de lavagem dos produtos das reações. Já os fatores endógenos são: a composição mineralógica do protolito, ou seja, rochas de composição básica tendem a se alterar mais facilmente do que as ricas em quartzo; a granulometria dos minerais presentes, sendo que quanto menor o grão maior a sua exposição aos agentes intempéricos, porém os grãos recristalizados são mais coesos; e a existência de planos de fratura, que facilitam o acesso de fluidos intempéricos. 1.3.4 Solos e Materiais de Alteração A espessura do manto de alteração é condicionada pela litologia e pelos sistemas de fraturas. Quando a quantidade de água infiltrada é maior que a possibilidade de vazão, há saturação e perda de coesão interna do material alterado. A supersaturação dos solos pela água provoca a diminuição da resistência ao cisalhamento, permitindo o início da movimentação do material intemperizado. CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Ainda, com relação aos solos, estes podem influenciar e sofrer a ação dos processos erosivos, em virtude da sua textura, estrutura, permeabilidade e densidade. A textura refere-se à proporção relativa das partículas sólidas no solo, influenciando na capacidade de infiltração e absorção de água da chuva. Solos mais arenosos são mais porosos, permitindo rápida infiltração da água e, consequentemente, menor capacidade de armazenamento. Já a estrutura, que corresponde ao arranjo espacial das partículas no solo, influencia no direcionamento e na velocidadede infiltração da água. Além disso, a espessura e as características gerais do solo (permeabilidade, homogeneidade, porosidade, etc.) podem favorecer a ocorrência de movimentos de massa. As encostas côncavas e retilíneas apresentam menores espessuras de solo em relação às encostas convexas, sendo mais favoráveis ao processo de escorregamentos translacionais, que envolvem uma fina camada do solo. 1.3.5 Vegetação A retirada de vegetação de uma encosta é um importante fator que pode desencadear os movimentos de massa. A ausência da vegetação expõe o solo, que deixa de estar ligado por ação das raízes, tornando-se vulnerável à infiltração e também diminui a proteção ao impacto das gotas da chuva que altera os materiais, acelerando a desagregação. A vegetação com os seus sistemas de raízes controla o escoamento superficial e a infiltração das águas no manto de intemperismo, diminuindo a excessiva penetração da água no subsolo mais profundo. Os deslizamentos em áreas florestadas ocorrem apenas nas vertentes muito íngremes e em decorrência da alta pluviosidade que saturam os solos rasos existentes sobre a superfície com rochas pouco alteradas. No entanto, alguns autores destacam que a vegetação pode desempenhar um efeito alavanca, que corresponde à força cisalhante transferida pelos troncos das árvores ao terreno quando as copas são atingidas pelo vento; também pode causar um efeito cunha, que corresponde a pressão lateral causada pelas raízes ao penetrar em fendas, fissuras e canais no solo ou rocha; e ainda, pode auxiliar nas movimentações pela sobrecarga vertical, causada pelo peso das árvores. 1.3.6 Ação Antrópica A modificação antrópica das encostas com a construção de moradias é um importante fator que contribui para o desencadeamento de movimentos de massa, tanto pela retirada de material para implantação das fundações, quanto pelo aumento de peso da estrutura, que aumenta a pressão nos materiais, podendo induzir as movimentações. Através do processo de apropriação e transformação do relevo o homem implica mudanças na sua evolução, por oferecer condições à indução e/ou à intensificação dos processos exógenos. O grande causador dos escorregamentos é a ocupação desordenada das encostas, quando a população constrói moradias nas encostas, ela realiza cortes e aterros, desmatamentos, despeja a água utilizada no próprio solo, joga lixo e entulho nas encostas e cultiva plantas impróprias, como as bananeiras. Todas essas alterações potencializam a ocorrência de movimentos de massa. Dentre as principais ações antrópicas indutoras dos escorregamentos, destaca-se: a remoção da cobertura vegetal; lançamento e concentração de águas pluviais e/ou servidas; vazamentos na rede de abastecimento, esgoto e presença de fossas; execução de cortes com geometria inadequada (altura/inclinação); execução deficiente de aterros (compactação, geometria, fundação); lançamento de lixo nas encostas; e vibrações produzidas por tráfego pesado. 1.4 Soluções de Estabilização O objetivo principal das técnicas de estabilização de taludes é aumentar a segurança dos mesmos. Algumas vezes, com uma simples modificação de geometria do talude, pode-se torná-lo estável. Outras vezes, é necessária a execução de obras complexas de engenharia. A Tabela 1.3 apresenta um resumo das soluções de estabilização, que podem ser divididas em três grandes grupos (Fernandes, CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES 2009): alteração da geometria, medidas de natureza hidráulica e medidas de natureza estrutural. Com frequência, os projetos de estabilização dos grandes taludes naturais envolvem combinações desses três tipos de medidas. CAPÍTULO 1 – ESTABLIDADE DE TALUDES Tabela 1.3 – Resumo de medidas para estabilização de taludes Tipos de medidas Descrição Vantagens Observações Alteração da geometria do talude Remoção de massa da zona ativa e/ou redução da inclinação Reduz o peso da zona ativa; Reduz a resistência mobilizada Pode ser inviável em zonas construídas; Deve ser sempre processada de cima para baixo; Em geral, é acompanhada de drenagem superficial e vegetação. Colocação de aterro na base Aumenta o peso na zona passiva Pode ser inviável em zonas construídas; Pode constituir medida de emergência; O material colocado tem que ser mais permeável do que o do talude. Medidas de natureza hidráulica Drenagem superficial: rede de valetas distribuídas à superfície para atenuar infiltração da água pluvial Reduz a pressão da água dos poros, as forças de percolação e peso do maciço; Melhora a resistência dos solos muito plásticos É de modo geral complementada com proteção vegetal Drenagem profunda: galerias, valas e poços de drenagem. Idem a anterior Mantém o nível freático afastado de parte ou da totalidade da Zonta instável A drenagem pode ser feita por gravidade ou por bombeamento Preenchimento de fendas superficiais na zona ativa com material impermeável, como argila ou calda de cimento. Contraria a infiltração de água para o interior do talude e em especial para a superfície de deslizamento Em caso de emergência, pode ser substituída por cobertura do terreno com material sintético impermeável; Proteção da face do talude com vegetação, concreto projetado ou gabiões. Protege o terreno da erosão superficial O concreto projetado é pouco conveniente em termos paisagísticos; Os gabiões tem o inconveniente de aumentar o peso da zona ativa Medidas de natureza estrutural Aplicação de forças exteriores por ancoragem pré-esforçada, ligados a muros ou vigas de concreto armado na face do talude. A componente normal aumenta a resistência na superfície de deslizamento; A componente tangencial atua como força exterior estabilizadora aplicada à massa instável. As ancoragens têm cabeças amarradas a elementos de concreto armado para a distribuição das forças na face do talude; os bulbos de selagem tem que se situar fora da zona instável. Reforço do terreno na zona de superfície de deslizamento com grampos de aço, estacas de concreto armado ou colunas de jet-grout. Aumenta a resistência ao cisalhamento na superfície de deslizamento. Os reforços precisam penetrar certo comprimento para além da superfície de deslizamento. Fonte: Fernandes (2014) CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES 1.4.1 Alteração da geometria A alteração da geometria do talude, em particular o chamado retaludamento, com remoção de parte da zona ativa e redução da inclinação média, esquematizado na Figura 1.10a, pode constituir medida muito apropriada, e é geralmente menos onerosa do que soluções eminentemente estruturais. Está muitas vezes fora de questão, todavia, quando de se trata de taludes com construções e infraestrutura relevantes. Por sua vez, o aterro no pé, indicado na Figura 1.10b, quando se trata de taludes naturais, envolverá grandes volumes, estando também fora de questão em zonas construídas, sendo complementar, no entanto, ao retaludamento anteriormente mencionado. Figura 1.10 – Esquema de alteração de geometria de talude natural De maneira generalizada, a execução do retaludamento consiste em realizar a escavação (cortes em formatos de degraus), implantação de sistema de drenagem superficial (canaletas, descidas d’água, etc.) e posteriormente a fixação de cobertura vegetal ou artificial, conforme mostra esquematicamente a Figura 1.11. Vale ressaltar que a geometria deve obedecer rigorosamente ao projeto, que por sua vez deve ter como referência as seguintesnormas técnicas brasileiras: NBR 8044 – Projetos geotécnicos, NBR 11682 – Estabilidade de Encostas; NBR 6122 – Projeto e Execução de Fundações; NBR 9288 – Emprego de aterros reforçados. A Figura 1.12 mostra o retaludamento com biomanta (manta com mudas que vão penetrando no solo e germinando) e a implantação do sistema de drenagem, com escada hidráulica e canaletas, executadas pela prefeitura de Juiz de Fora/MG em 2014. CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Figura 1.11 – Esquema de retaludamento com drenagem superficial Fonte: http://infraestruturaurbana.pini.com.br Figura 1.12 – Obra de contenção no bairro Vila Fortaleza – Juiz de Fora/MG Fonte: http://www.pjf.mg.gov.br 1.4.2 Drenagem superficial e profunda Sendo a água, pelas mais diversas vias, causa de grande parte dos escorregamentos de taludes naturais, compreende-se que a drenagem, tanto superficial quanto a profunda, constitua uma das medidas mais eficazes de estabilização, podendo em certos casos dispensar soluções estruturais, com maior impacto paisagístico. A drenagem superficial destina-se a minimizar a infiltração das águas pluviais. Para isso, é preciso conceber uma rede de canais ou valetas que evite que a água, depois de incidir num CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES ponto do talude, percorra distâncias significativas escorrendo sobre a superfície dele antes de ser coletada e conduzida por gravidade pra a sua base. A proteção dessa superfície, nas zonas não construídas, com vegetação é complemento essencial da rede de drenagem. A Figura 1.13 mostra um sistema de drenagem superficial. Figura 1.13 – Drenagem profunda de taludes naturais – galerias sub-horizontais visitáveis Fonte: Fernandes (2014) Uma das soluções envolvendo drenagem profunda consiste na abertura a partir da face do talude, zona próxima ao sopé dele, de galerias de drenagem. A abertura pode ser efetuada com recurso a equipamentos que executam microtúneis (túneis de pequeno diâmetro), sendo as galerias revestidas com um material permeável. A inclinação deve permitir a drenagem por gravidade para a face do talude, onde se articula com a drenagem superficial, de modo a manter o nível freático mais afastado possível da superfície da zona potencial instável do talude. Figura 1.14 – Drenagem profunda de taludes naturais – vala de drenagem Fonte: Fernandes (2014) Outra solução seria construir poços de drenagem, nesse caso a custa de bombeamento, acionado automaticamente quando a água nos poços atingir o nível considerado perigoso, o que tem o inconveniente de exigir frequentes operações de manutenção do sistema. É possível concluir que o sistema de drenagem profunda envolve custos elevados, justificando ponderar seu uso no caso de grandes taludes naturais. É preciso também considerar os impactos ambientais, pois haverá alterações significativas no regime hidrológico local. CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES 1.4.3 Soluções Estruturais Entre as medidas de natureza estrutural, serão abordadas neste item duas soluções que envolvem o reforço do maciço por meio de elementos instalados de modo a interceptarem a superfície potencial de deslizamento, usadas com frequência para estabilizar taludes naturais, são elas: terra armada e solo grampeado. É importante salientar que as obras de contenções, tratadas com mais detalhes no Capítulo 6, também se enquadram como soluções estruturais para estabilização de taludes naturais, principalmente a cortina atirantada. a) Terra Armada A NBR 9286/86 especifica o dimensionamento deste tipo de estrutura e define o método de reforço em terra armada como: “sistema constituído pela associação do solo de aterro com propriedades adequadas, armaduras (tiras metálicas ou não) flexíveis, colocadas, em geral, horizontalmente em seu interior, à medida que o aterro vai sendo construído, e por uma pele de paramento flexível externo fixado às armaduras, destinando a limitar o aterro”. Normalmente são usados em obras rodoviárias, ferroviárias, industriais e em outras aplicações de engenharia civil. O princípio da tecnologia da terra armada é a interação entre o aterro selecionado e os reforços – armaduras de alta aderência que, corretamente dimensionados, produzem um maciço integrado no qual as armaduras resistem aos esforços internos de tração desenvolvidos no seu interior passando a se comportar como um corpo “coeso” monolítico, suportando, além de seu peso próprio, as cargas externas para as quais foram projetados. Essas estruturas de contenção flexíveis, do tipo gravidade, que associam: aterro selecionado e compactado; elementos lineares de reforço que serão submetidos à tração; e elementos modulares pré-fabricados de revestimento, têm alta capacidade de suportar carregamentos e são ideais para muros de grande altura, ou que estejam sujeitos às sobrecargas excepcionais. As inclusões geralmente usadas na técnica de terra armada são denominadas inextensíveis (metálicas) chamadas fitas metálicas; podendo ser nervuradas ou não nervuradas. As fitas metálicas nervuradas são as que oferecem maior atrito. Essas armaduras podem ter larguras que variam de 40 até 120 mm, e o seu comprimento que é obtido por cálculos, deve ser superior a 0,7H; em que H é a altura total do muro. As armaduras são conectadas a painéis pré- moldados de concreto, cruciformes, que constituem a face do maciço. Figura 1.15 – Técnica da terra armada Fonte: http://www.terraarmada.com.br CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES b) Solo Grampeado Solo grampeado é uma técnica de melhoria de solos, que permite a contenção de taludes por meio da execução de chumbadores, concreto projetado e drenagem. Os chumbadores promovem a estabilização geral do maciço, o concreto projetado dá estabilidade local junto ao paramento e a drenagem age em ambos os casos. O processo construtivo tem início com a execução de chumbadores verticais, como medida de melhoria do solo, e o corte descendente do solo na geometria do projeto (Figura 1.16), excetuando-se os casos de taludes pré-existentes. Segue-se com a execução da primeira linha de chumbadores e aplicação do revestimento de concreto projetado. A Figura 1.17 mostra a execução do solo grampeado na cidade de Teresina. Caso o talude já esteja cortado pode-se trabalhar de forma descendente ou ascendente, conforme a conveniência. Simultaneamente ao avanço dos trabalhos, são executados os drenos profundos e os de paramento, assim como canaletas ou descidas d’água, conforme especificado no projeto. Figura 1.16 – Etapas construtivas do solo grampeado Fonte: http://www.solotrat.com.br/ Figura 1.17 – Contenção de talude através de solo grampeado executado na cidade Teresina CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Fonte: http://www.solotrat.com.br 1.5 Análise da Estabilidade de Taludes Devido às graves consequências que qualquer movimento de massa pode causar, o estudo da estabilidade de taludes é um dos grandes desafios da engenharia geotécnica. Na maioria dos casos os problemas envolvendo a estabilidade de taludes naturais são muito diversos, sendo difícil estabelecer métodos de aplicação geral. Segue uma lista dos principais objetivos de uma análise de estabilidade de taludes: Averiguar a estabilidade de taludes em diferentes tipos de obras geotécnicas, sob diferentes condições de solicitação, de modo a permitir a execução de projetos econômicos e seguros; Averiguar a possibilidade de escorregamentosde taludes naturais ou construídos pelo homem, analisando-se a influência de modificações propostas → Análise de sensibilidade → Estudo da influência relativa de parâmetros, como por exemplo, de resistência, variando-se as condições de fluxo; Analisar escorregamentos já ocorridos, obtendo-se subsídios para o entendimento de mecanismos de ruptura e da influência de fatores ambientais → Retroanálise da estabilidade; Executar projetos de estabilização de taludes já rompidos, investigando-se as alternativas de medidas preventivas e corretivas que possam ser necessárias; Estudar o efeito de carregamentos extremos naturais ou decorrentes da ação do homem, tais como, terremotos, maremotos, explosões, altos gradientes de temperaturas, execução de obras, etc. Entender o desenvolvimento e forma de taludes naturais e os processos responsáveis por diferenças em características naturais regionais, As técnicas de análise de estabilidade podem ser divididas em dois grandes grupos: a) Análise Probabilística: Requer o conhecimento das distribuições de probabilidade ou das funções de densidade de probabilidade das variáveis aleatórias associadas ao problema. Figura 1.18 – Distribuição de probabilidade CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Fonte: Dyminski (2015) O número de dados disponíveis e o grau de dispersão dos mesmos em relação a uma média afetam sensivelmente a probabilidade calculada. A interdependência de fatores (p.ex.: grau de intemperismo x resistência; Intensidade de chuva x tipo de solo x variações de resistência; inclinação do talude x tipo de solo x condições de drenagem; etc.) e o número pequeno de informações tornam as análises probabilísticas, no momento, restritas do ponto de vista de aplicação prática na previsão de problemas de ruptura de um modo geral. As análises probabilísticas são essenciais para a confecção de Mapas de Potencial de Ruptura, Mapas de Risco de Ruptura, Mapas de Ocupação/Aproveitamento de solos, e outros. b) Análises Determinísticas: A tarefa do engenheiro encarregado desse tipo de análise é determinar o fator de segurança (F), que pode ter diversas definições, como: Fator que minora os parâmetros de resistência ao cisalhamento em termos de tensões efetivas ou totais; 𝜏 = 𝑐′ 𝐹 + 𝜎 tan 𝜙′ 𝐹 ou 𝜏 = 𝑐 𝐹 + 𝜎 tan 𝜙 𝐹 Relação entre momentos resistente e atuante; 𝐹 = 𝑀𝑅 𝑀𝐴 Relação entre forças resistente e atuante; 𝐹 = 𝐹𝑅 𝐹𝐴 Relação entre resistência ao cisalhamento do solo e tensões cisalhantes atuantes no maciço. As análises determinísticas envolvem os seguintes métodos: Análise limite: baseia-se no uso das teorias de limite inferior e superior da Teoria da Plasticidade; Tensão – Deformação: análise do comportamento de um talude envolvendo métodos numéricos, sendo o MEF – Método dos Elementos Finitos – o mais comum; Equilíbrio Limite: encontrar a superfície crítica de ruptura, ou seja, a que corresponde ao menor valor de F. 1.5.1 Método de Equilíbrio Limite Frequentemente os engenheiros civis devem verificar a segurança de taludes naturais, taludes de escavações e aterros compactados. Essa verificação envolve a determinação da tensão de cisalhamento desenvolvida ao longo da superfície de ruptura mais provável e a comparação dela com a resistência do solo ao cisalhamento (Figura 1.19). CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Figura 1.19 – Superfície potencial de ruptura para taludes Fonte: Nunes (2010) O método de equilíbrio limite permite a determinação do fator de segurança do talude, utilizando dados como as propriedades de resistência ao cisalhamento do solo, a poro-pressão e outras propriedades do maciço. As análises consistem em determinar se existe resistência suficiente no talude (rocha ou solo) para suportar as tensões de cisalhamento que tendem a provocar a falha ou deslizamento. Apresentam as seguintes hipóteses básicas: Assume-se a existência de uma superfície de ruptura bem definida; A massa de solo ou rocha encontra-se em condições de ruptura generalizada iminente (um estado de equilíbrio limite); Assume-se um critério de ruptura (em geral MOHR-COULOMB), o qual é satisfeito ao longo de toda a superfície de ruptura; Assume-se um coeficiente ou fator de segurança (F) constante e único ao longo da superfície potencial de ruptura). a) Fator de Segurança Figura 1.20 – Representação das tensões em um talude qualquer O fator de segurança é definido como: 𝐹𝑠 = 𝜏𝑅 𝜏𝐷 (1.1) 𝜏𝑅 𝜏𝐷 CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Onde: 𝐹𝑠 = fator de segurança em relação à resistência; 𝜏𝑅 = resistência média ao cisalhamento do solo; 𝜏𝐷 = resistência média ao cisalhamento desenvolvida ao longo da superfície potencial de ruptura. Já vimos que a resistência ao cisalhamento de um solo tem duas componentes, coesão e atrito, dada pela seguinte equação: 𝜏𝑅 = 𝑐 ′ + 𝜎′ tan 𝜙′ (1.2) Onde: c′ = coesão; ϕ′ = ângulo de atrito; σ′ = tensão normal na superfície potencial de ruptura. De forma similar, temos: 𝜏𝐷 = 𝑐 ′ 𝑑 + 𝜎 ′ 𝑑 tan 𝜙′𝑑 (1.3) Onde 𝑐′𝑑 e 𝜙′𝑑 são, respectivamente, coesão e ângulo de atrito mobilizados ao longo da superfície potencial de ruptura. Substituindo as equações 1.2 e 1.3 na equação 1.1, temos: A partir desse fator de segurança podemos definir outros dois fatores, com relação à coesão (𝐹𝑐′), e também ao atrito (𝐹𝜙′). Quando comparamos as equações 1.4 e 1.6, percebe-se que se 𝐹𝑐′ = 𝐹𝜙′ , portanto: 𝐹𝑐′ = 𝐹𝜙′ = 𝐹𝑠 Quando o fator de segurança é igual a 1,0, o talude está em um estado de ruptura iminente. Geralmente, um valor de 1,5 é aceitável para o projeto de um talude estável. 𝐹𝑠 = 𝑐′+ 𝜎′ tan 𝜙′ 𝑐′𝑑+ 𝜎′𝑑 tan 𝜙′𝑑 (1.4) 𝐹𝑐′ = 𝑐′ 𝑐′𝑑 (1.5) 𝐹ϕ′ = 𝜙′ 𝜙′𝑑 (1.6) CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES b) Taludes Infinitos Para um talude infinito sem percolação, conforme mostrado na Figura 1.21, o fator de segurança é calculado pela seguinte equação: Figura 1.21 – Esquema de talude infinito 𝐹𝑠 = 𝑐′ 𝛾𝐻 cos2 𝛽 tan 𝛽 + tan 𝜙′ tan 𝛽 (1.7) Onde: H = profundidade; β = inclinação do terreno. Para solos granulares, c’ = 0 e o fator de segurança, Fs, torna-se igual a (tg ɸ’/ tg β), isso indica que, em taludes infinitos em areia, o valor de Fs é independente da altura H e o talude é estável enquanto β < ɸ. Se um solo possui coesão e atrito a profundidade do plano ao longo do qual o equilíbrio crítico ocorre pode ser determinada substituindo Fs = 1,0 e H = Hcr na equação 1.7. Assim, temos: 𝐻𝑐𝑟 = 𝑐′ 𝛾 1 cos2 𝛽 (tan 𝛽− tan 𝜙′) (1.8) Assumindo que há percolação através do solo e que o nível d’água coincide com a superfície do terreno, o fator de segurança é dado por: 𝐹𝑠 = 𝑐′ 𝛾𝑠𝑎𝑡𝐻 cos2 𝛽 tan 𝛽 + 𝛾′ 𝛾𝑠𝑎𝑡 tan 𝜙′ tan 𝛽 (1.9) Onde: γ′ = 𝛾𝑠𝑎𝑡 − 𝛾𝑎 β H CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES c) Taludes Finitos (Método de Culmann) A análise de Culmann tem como base a hipótese de que a ruptura de um talude ocorre ao longo de um plano quando a tensão média de cisalhamento, que tendea causar o deslizamento, é maior que a resistência ao cisalhamento do solo. Além disso, o plano mais crítico é aquele que tem uma relação mínima entre a tensão média de cisalhamento que tende a causar a ruptura e a resistência ao cisalhamento do solo. Figura 1.22 – Método de Culmann A Figura 1.22 mostra um talude de altura H e inclinação β com a horizontal. Tomando AC como um plano tentativo de ruptura, e considerando um comprimento unitário perpendicular à seção do talude, é possível calcular o peso da cunha ABC pela seguinte equação: 𝑊 = 1 2 𝐻(𝐵𝐶)𝛾 (1.10) A partir do equilíbrio de forças de um corpo rígido (massa de solo delimitada pela cunha), podemos escrever que: 𝑁𝑎 = 𝑊 cos 𝜃 (componente normal) (1.11) 𝑇𝑎 = 𝑊 sin 𝜃 (componente tangencial) (1.12) As tensões normais e de cisalhamento no plano AC com base nas equações (1.11) e (1.12) são respectivamente: 𝜎′ = 𝑁𝑎 𝐴𝐶 (1) (1.13) 𝜏 = 𝑇𝑎 𝐴𝐶 (1) (1.14) A tensão média de cisalhamento mobilizada ao longo do plano AC é dada por: 𝜏𝐷 = 𝑐′𝑑 + 𝜎′ tan 𝜙′𝑑 (1.15) CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES Substituindo as equações (1.5), (1.6), (1.13) e (1.14) na equação (1.15) temos que: 𝑇𝑟 𝐴𝐶 (1) = 𝑐′ 𝐹𝑠 + 𝑁𝑟 𝐴𝐶 (1) . tan 𝜙′ 𝐹𝑠 (1.16) É possível também determinar a altura H para uma inclinação β e fator de segurança maior que 1,0 através da seguinte equação: 𝐻 = 4𝑐′𝑑 𝛾 [ sin 𝛽 cos 𝜙′𝑑 1− cos(𝛽−𝜙′𝑑) ] (1.17) A altura máxima do talude para o qual o equilíbrio crítico ocorre pode ser obtida substituindo 𝑐′𝑑 = 𝑐′ e 𝜙 ′ 𝑑 = 𝜙′ na equação (1.17). Assim, 𝐻𝑐𝑟 = 4𝑐′ 𝛾 [ sin 𝛽 cos 𝜙′ 1− cos(𝛽−𝜙′) ] (1.18) d) Taludes Finitos (Método das Fatias) A análise de estabilidade usando o método das fatias pode ser explicada com o uso da Figura 1.23a, na qual AC é um arco de círculo representando a superfície tentativa de ruptura. O solo acima da superfície de ruptura é dividido em várias fatias verticais. A largura das fatias não precisa ser igual. Considerando um comprimento unitário perpendicular à seção transversal mostrada, as forças que atuam em uma fatia estão mostradas na Figura 1.23b. Figura 1.23 – Método das Fatias Através do somatório dos fatores de segurança para cada fatia, calculado a partir do equilíbrio de forças de um corpo rígido, é possível determinar o fator de segurança para a superfície potencial de ruptura analisada como: CAPÍTULO 1 – ESTABILIDADE DE TALUDES 𝐹𝑠 = ∑ (𝑐′∆𝐿𝑛+ 𝑊𝑛 cos 𝛼𝑛 tan 𝜙 ′) 𝑛=𝑝 𝑛=1 ∑ 𝑊𝑛 sin 𝛼𝑛 𝑛 = 𝑝 𝑛=1 (1.19)
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