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Fichamento de Direito Constitucional O que é a constituição? ”Constituição é o conjunto de regras jurídicas definidoras das relações de poder em molde de limitação dos governantes e de legitimação ou validade dos atos do Estado” (Jorge Miranda) A pirâmide de Kelsen representa bem a hierarquia dos ordenamentos jurídicos (ver foto). As leis só são válidas se estão de acordo com a Constituição quanto ao seu teor e se tiverem sido editadas em conformidade com os procedimentos jurídicos prescritos constitucionalmente. A posição superior das constituições decorre, em primeiro lugar, da importância de seu conteúdo material. Ao positivar os direitos naturais, o liberalismo pretendia limitar a ação estatal em vista da máxima liberdade dos cidadãos. O ato de positivação dos direitos naturais reduz a antiga compreensão transcendental dos mesmos; a antiga primazia do direito natural (superior) sobre o direito positivo (inferior) foi substituída pela superioridade das normas constitucionais sobre as infraconstitucionais. Além da limitação estatal e a importância de sua matéria, agrega-se uma justificação de cunho político para a diferenciação da Constituição em relação as outras normas. A Constituição é criação do poder constituinte, que cria os poderes constituídos, os quais são incumbidos de produzir o direito ordinário. A criatura não pode contrariar o seu criador. São dois os principais fundamentos invocados para afirmação da supremacia da Constituição. Um é substantivo e se liga ao conteúdo da Constituição; o outro é genético, dizendo respeito à sua origem.7 O fundamento objetivo é complexo e comporta inúmeras variações e nuances. Em síntese, a ideia é a de que existem direitos e princípios tão essenciais que devem ser postos fora do alcance das maiorias. Por isso, eles são “entrincheirados” pela Constituição, que os protege até do legislador democraticamente eleito. Como visto acima, o jusnaturalismo seguia esse caminho, mas não é necessário aderir a qualquer teoria de direito natural para aceitá-lo. Basta reconhecer que existem certos valores — não importa se históricos ou transcendentes — que são tão importantes que devem ser subtraídos da luta política cotidiana. Uma conhecida versão desta justificativa é a teoria do pré-compromisso, bem simbolizada pela história grega de Ulisses e das sereias, contada no Canto XII da Odisseia de Homero. É que o povo, em momentos de maior lucide, pode também perceber a sua suscetibilidade a cometer erros grabes, pondo em risco princípios importantes. Por isso, ele se pré-compromete, por meio de mecanismos, que, no futuro, ele sacrifique esses princípios. A supremacia constitucional, neste sentido, é um arranjo institucional voltado à preservação de princípios superiores, adotada por um povo ciente das suas próprias limitações e fragilidades. A outra justificativa, não menos complexa, diz respeito à origem da Constituição. Em apertada síntese, afirma-se que, pelo menos do ponto de vista ideal, as constituições são o resultado de uma intensa mobilização cívica do povo, que ocorre apenas em momentos extraordinários da história nacional, e não se reproduz na vida política cotidiana. ● Concepções o Normativista – Kelsen A concepção normativista da Constituição se opõem ao idealismo liberal. A Constituição de Weimar positivava normas de teor bastante variado, portanto, não havia como definir a Constituição apenas a partir de seu conteúdo material, como propugnava a teoria idealista. Hans Kelsen, para abranger a variedade de textos constitucionais, propõe um conceito que se atêm somente aos aspectos formais do texto, não importando sua matéria. Quer estabeleça uma ditadura, quer institua um governo democrático, a Constituição, para Kelsen, define-se por ocupar o ápice do ordenamento jurídico. “O Direito deveria se ocupar das normas como são, e não como elas deveriam ser”. o Sociológica – Lassale Outra concepção que se opunha ao modelo idealista liberal, tido como um modelo que não correspondia à realidade concreta das sociedades. As normas constitucionais falhavam em positivar os direitos, já que a realidade era marcada pelo arbítrio e pela desigualdade. O conceito de Constituição deveria, por isso, ser formulado em termos sociológicos: a teoria da Constituição deveria refletir a “Contituição real’, espelhando os padrões sociopolíticos efetivamente em vigor em cada sociedade. Lassale defini a Constituição como a resultante dos fatores reais de poder atuantes em determinada sociedade. Outra variação análoga a esse argumento se encontra em Marx, que tinha o Direito e o Estado como manifestações superestruturais das relações de produção existentes na sociedade, plenamente subordinadas a essas. o Ideal – Liberal O conceito é ideal por ser formulado em razão da própria matéria que a Constituição deve conter: aquela correspondente ao modelo liberal do estado. O papel das constituições é organizar o exercício do poder político e limitá-lo. o Concretizadora – Hesse A teoria concretizadora se preocupa especialmente com a capacidade de normatização da Constituição. Com o advento das novas formas de constituições, muitas vezes permeadas por direitos de 2ª, 3ª geração, os juristas se defrontaram com a incapacidade muitas vezes da Constituição se impor como norma. Daí decorre a necessidade de se formular uma nova teoria que pudesse abranger essa nova realidade, pós-II Guerra. Para Hesse, o elemento essencial de uma Constituição é a normatividade. Mas o conteúdo material da Constituição deve ser extraído das “exigências substantivas” que se situam na sociedade que a Constituição se propõe a regular. Ao invés de a Constituição dirigir verticalmente a vida social, interage com ela em uma relação de influências recíprocas, que leva à determinação do conteúdo constitucional. Por um lado, a realidade influencia no significado das normas constitucionais, que não podem ser interpretadas com abstração do quadro empírico sobre o qual incidem. Mas, por outro, a norma constitucional não é apenas um reflexo da realidade, tendo algum poder de condicioná-la. É nesse sentido que Hesse resgata a proposta de Heller, para quem a Constituiçãodeveria ser definida simultaneamente como normatividade e normalidade social (norma e realidade). Seu objetivo é também operar uma síntese das duas posições (sociológica e normativa), ao formular a conhecida teoria da força normativa da Constituição. Nas suas palavras, “o significado da ordenação jurídica da realidade (...) somente pode ser apreciado se ambas — ordenação e realidade — forem consideradas em sua relação, em seu inseparável contexto, e no seu condicionamento recíproco”.30 Para que uma Constituição seja eficaz do ponto de vista social, ela não pode desconsiderar as condições históricas nas quais está inserida. A Constituição, para Hesse, não deve tratar de todos os assuntos. É preciso que algumas questões permaneçam conscientemente abertas, provendo um espaço para a livre discussão, decisão e configuração das forças políticas. Ela deve ser uma Constituição aberta porque a vida, que ela quer ordenar, é uma vida histórica. A abertura e incompletude são vistas por Hesse como necessárias nas constituições, desde que presentes na adequada medida. A interpretação do texto constitucional deveria ser como um processo de concretização, em que se deve considerar não apenas o texto em si, mas também a realidade sobre o qual este incide. ● Tipos/Classificação o Escrita e não escrita A Constituição, em forma escrita, encontra-se reunida em um texto, editado em um determinado momento da história do país. Cabe lembrar que as constituições escritas não são incompatíveis com outros elementos constitucionais não escritos: costumes constitucionais, normas implícitas etc. A Constituição, em forma não escrita, não está positivada em um único texto escrito único, editado em determinado momento da vida nacional. A Constituição britânica é o exemplo típico – ela é composta por precedentes judiciais, convenções constitucionais e também por documentos (Carta Magna, Bill of Rights e Habeas Corpus Act). o Rígida, flexível, semirrígida e superrígida Constituições flexíveis (Constituição brasileira de 1937 – Getúlio mudava unilateralmente) são aquelas que podem ser alteradas da mesma maneira como se edita a legislação ordinária. Rígidas são as que demandam um procedimento mais complexo para mudança dos seus preceitos do que o exigido para a elaboração da legislação infraconstitucional. Nas constituições semirrígidas (Constituição brasileira de 1824), uma parte dos dispositivos, tida como mais relevante, é dotada de rigidez e a outra não é. Já as constituições superrígidas (Constituição de 88 [?]) são aquelas em que parte das normas constitucionais é dotada de rigidez, mas há elementos que não podem ser modificados de nenhuma forma. As PEC’s só pode ser apresentada por um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, pelo Presidente ou por mais da metade das assembleias legislativas das unidades da Federação, enquanto, para se alterar a legislação ordinária, basta, em regra, a apresentação de projeto de lei por um deputado ou senador. A proposta de emenda constitucional é discutida e votada em cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros (CF, art. 60, §2º), e, para a modificação da legislação ordinária, é suficiente a aprovação pela maioria simples dos votos, estando presente a maioria absoluta dos membros da casa legislativa. o Constituição dirigente e Constituição garantia As constituições “garantia” apenas estruturam e limitam o exercício do poder político. São constituições liberais, sintéticas, em regra, cuja função é estabelecer anteparos de proteção do indivíduo contra o poder do Estado e organizar o governo com base no compromisso com a moderação. Trata-se do modelo clássico de Constituição, que havia sido concebido pelo constitucionalismo do século XIX. Em sua origem, as constituições modernas eram constituições garantia. As constituições dirigentes – a Constituição de 88 e a Constituição portuguesa de 1976, que determinava a transição para o socialismo, são exemplos - também podem estabelecer “garantias” da liberdade individual ante o poder do estado. Todavia, além de realizarem essa função, prescrevem objetivos a serem perseguidos, fixando um estado ideal de coisas que o constituinte deseja ver concretizado no futuro. A Constituição dirigente oferece às futuras gerações um plano de desenvolvimento econômico e social. Não apenas limita a atividade governamental futura: antecipa o teor que essa atividade deve conter, definindo, mesmo que por meio de princípios gerais, a própria substância das leis a serem editadas. A decisão constituinte não vincula o legislador apenas negativamente: vincula-o também de modo positivo.124 Elas são típicas do constitucionalismo social. o Constituição normativa, nominal e semântica Constituições normativas são as que efetivamente conformam o processo político e as relações sociais, sendo objeto de plena observância pela sociedade. Evidentemente, ela é violada algumas vezes, mas geralmente as ofensas à Constituição são combatidas e sancionadas. Constituições nominais são as que não correspondem à forma como a sociedade se organiza efetivamente. As condições sociais e econômicas para a Constituição ser de fato respeitada não estão presentes. Por fim, há ainda as constituições semânticas. São constituições que, além de não serem capazes de limitar o exercício do poder político, funcionam como instrumento para legitimação de regimes contrários à tradição democrática do constitucionalismo. Eles legalizam o exercício autoritário do poder. Uma Constituição que, após um golpe militar, conceda amplos poderes discricionários aos golpistas, eliminando os direitos dos seus opositores, será semântica. o Constituição outorgada, promulgada e czarista A Constituição outorgada são as impostas pelos governantes, elaboradas sem a participação do povo. Na história brasileira há três constituições formalmente outorgadas: a de 1824, 1937 e 1969 (também conhecida como EC nº1 à Constituição de 1967). Já as constituições promulgadas são elaboradas por assembleias constituintes. Em nossa história constitucional, as constituições de 1891, 1934, 1946, 1967 e 1988foram formalmente promulgadas. A Constituição Federal de 1988 foi aprovada pela constituinte mais democrática e participativa da história brasileira. Os constituintes foram eleitos democraticamente e os trabalhos ocorreram em um ambiente de liberdade, abertura e participação popular. A constituição cesarista é elaborada unilateralmente pelo líder político do país, e depois submetidas à aprovação popular. Não há participação de representantes eleitos pelo povo na redação do texto. ● Poder Constituinte Poder constituinte é o poder de criar a Constituição e de fundar ou refundar o Estado e a ordem jurídica. A expressão também é utilizada para designar o poder de modificar a Constituição, bem como o de elaborar, nos Estados federais, as constituições estaduais. Estes últimos são tidos como expressão do chamado poder constituinte derivado, que se subdivide, respectivamente, em poder de reforma da Constituição e poder constituinte decorrente. o Aspectos históricos No começo do constitucionalismo moderno, a justificação da supremacia constitucional não dependia da evocação de uma vontade soberana superior. A própria ideia de Constituição se vinculava à limitação do poder do monarca absoluto: o Estado constitucional era aquele em que o poder se exercia moderadamente. Não havia nenhum mecanismo de afirmação do poder. Por isso, as constituições embrionárias afirmavam solenemente os direitos naturais. A validade dos mesmos independia de sua positivação. Eles apresentavam-se como critérios para a aferição da legitimidade do exercício do poder político, fixando esferas de liberdade individual dentro das quais o Estado não poderia penetrar. Quando o poder ofendesse esses direitos, justificar-se-ia a desobediência civil. Com a positivação dos direitos naturais, a supremacia material que os caracterizava se transferia para os documentos que os reconheciam. A Constituição era concebida como “produto da razão”, e sua supremacia não dependia de ter emanado de uma decisão soberana. Emmannuel Sieyès, no seu livro O que é o Terceiro Estado, formulou o conceito ortodoxo de poder constituinte. O poder constituinte estruturaria o exercício do poder político, determinado os termos em que as autoridades públicas, inclusive os legisladores, poderiam licitamente atuar. Tal poder, que pertencia à Nação, além de criar os “poderes constituídos”, fixava-lhes limites. A representação ordinária, exercida fora dos limites impostos pelo constituinte, tornava-se ilegítima. A Constituição seria elaborada também por representantes, mas “representantes extraordinários”. A deliberação dos “representantes extraordinários” seria limitada apenas pelo direito natural, enquanto que os ordinários seriam limitados ao que o poder constituinte determinasse. A Constituição francesa de 1791 se declarava soberana, una, indivisível, inalienável e imprescritível, e que a Nação era a única da qual emanavam todos os poderes. Kelsen se opunha a limitação imposta pelos direitos naturais ao poder constituinte – a natureza do poder constituinte é um poder de fato. Ele é um poder ilimitado, bastando-lhe que esse poder seja razoavelmente praticado. o Titularidade A soberania é exercida por meio da elaboração da Constituição, que limita os poderes estatais. Ditada a Constituição, a soberania interna entra numa fase de latência, permanecendo o Estado juridicamente limitado pelo dever de observar as normas constitucionais, que não só organizam o exercício do poder político, como também enunciam direitos para os indivíduos. Quem é o titular do poder constituinte? A Nação ou o povo? A soberania popular (povo) se traduz como a autonomia pública, que tem lugar quando as normas jurídicas são elaboradas por seus próprios destinatários. Por meio da participação popular no processo de elaboração das leis, realiza-se o ideal democrático de liberdade política: “cada um, unindo-se a todos, só obedecesse a si mesmo”.22 A autonomia, quando referida ao direito estatal, se traduz na soberania popular. Para essa perspectiva, o povo é o soberano; é o titular do poder constituinte. A teoria da soberania nacional é, em sua origem, proposta como alternativa menos radical à teoria da soberania popular. Sua formulação tradicional se deve a Sieyès, para quem a Nação é “um corpo de associados que vivem sob uma lei comum e representados pela mesma legislatura”. Por conta dessa distinção entre a nação, em sua “unidade orgânica”, e a mera associação de indivíduos, participar da “representação” da vontade nacional, ao invés de ser um “direito do cidadão”, se convertia num atributo conferido a quem a nação desejasse. Ao contrário de veículo de “expressão” da soberania popular, a representação figuraria como “imputação” de um poder-dever pela nação.27 Ainda que se conteste essa interpretação do conceito de nação, é certo que a ênfase na representação, proposta por Sieyès, adotava o pressuposto de que o povo não tinha como participar permanentemente da tomada de decisões públicas, ao contrário do que pensava Rousseau.28 A teoria da soberania nacional reduzia, por isso, o potencial insurgente da ideia de que a soberania não era atributo da monarca, mas do povo, além de não estar, ao contrário da teoria da soberania popular, inerentemente vinculada ao princípio da igualdade política. Pelo contrário, historicamente, ela se prestou à legitimação do voto censitário. o Características ▪ Inicial O poder constituinte é concebido como inicial porque funda a ordem jurídica e institui o Estado, rompendo com o passado. Daí porque o poder constituinte, como expressão da “vontade nacional” é concebido como “a origem de toda a legalidade”. ▪ Ilimitado O poder constituinte é concebido como ilimitado, por não estar sujeito a limites jurídicos, especialmente às prescrições da ordem jurídica passada. A noção também é devida à Sieyès: “Uma nação é independente de qualquer formalização positiva; basta que sua vontade apareça para que todo direito político cesse, como se estivesse diante da fonte e do mestre supremo de todo o direito positivo”. ▪ Incondicionado O poder constituinte costuma ser caracterizado ainda como incondicionado, porque ele próprio pode estabelecer asua forma de manifestação, não devendo obediência a nenhum procedimento previamente definido. Sendo a Constituição o fundamento de validade do ordenamento, a sua juridicidade não depende da observância de regras de elaboração do novo texto, ditadas anteriormente. ▪ Indivisível É certo que decisões fundamentais precisam ser adotadas pelo poder constituinte, e as suas escolhas, de caráter vinculante, sempre importam na rejeição de outras alternativas porventura existentes. Contudo, a ideia de indivisibilidade do poder constituinte não pode ser aceita, se importar na adoção de uma compreensão fechada sobre a identidade constitucional, que não seria compatível com o pluralismo presente nas sociedades contemporâneas, nem com o ideário do constitucionalismo democrático, que se assenta no respeito às diferenças. O poder constituinte, no Estado Democrático de Direito, não pode ser compreendido como uma força homogeneizadora, que suprima a diversidade em nome da unidade, ou bloqueie a discussão sobre as decisões políticas fundamentais do Estado e da sociedade. A indivisibilidade significa também, de acordo com a concepção ortodoxa, que não há “poder constituinte pela metade”. Ou se está diante de um ato do poder constituinte originário, que não se sujeita a limites, ou que existe é uma manifestação de um poder constituído, que deve observar as limitações traçadas pelo primeiro. ● Poder Constituinte Derivado o Espécies ▪ Decorrente Poder de criar as constituições dos estados, porém todos sujeitos a Constituição Federal. ▪ Reformador ● Revisão ● Reforma o Limitações ▪ Circunstanciais Art. 60 Os limites circunstanciais visam a impedir que se aprovem mudanças constitucionais em contextos de grave crise institucional, em que provavelmente não existiria a tranquilidade necessária para a adoção de medida de tamanha importância ▪ Formais As limitações dizem respeito à forma como pode ser alterado o texto constitucional. Envolvem questões como: quem pode propor as mudanças, quem deve aprova-las; e quantas votações, qual o seu intervalo, e qual o quórum necessário para que haja a aprovação da modificação na Constituição. Procedimental (Art. 60, parágrafo 1, 2 e 3) ▪ Temporais Os limites temporais são instituídos para conferir maior estabilidade à Constituição, impedindo ou dificultando mudanças prematuras em seu texto, antes que tenha decorrido um tempo mínimo para que a ordem constitucional possa ser avaliada, ou impondo intervalos mínimos para tais alterações, de modo a evitar uma frequência excessiva de reformas constituições. ▪ Materiais A Constituição é decisão política fundamental, resultado de um momento específico e único, portanto, deve-se respeitar a essência do documento – as cláusulas pétreas. (A interpretação das cláusulas pétreas deve se inspirar no ideário do constitucionalismo democrático, voltando-se não só à proteção das condições necessárias ao funcionamento da democracia, como também à tutela de direitos básicos, decorrentes do reconhecimento da igual dignidade de todas as pessoas, e à salvaguarda de instituições políticas que assegurem e promovam a democracia e os direitos fundamentais. No afã de proteger esses fundamentos do Estado Democrático de Direito, pode-se até legitimar, em determinados contextos, uma interpretação mais abrangente das cláusulas pétreas. Trata-se, portanto, de uma atividade hermenêutica que deve se afastar do formalismo, buscando orientação nos fundamentos da democracia constitucional, concebidos em termos inclusivos. Nesta perspectiva, o art. 60, §4º, da Constituição, não deve ser concebido como vedação absoluta a qualquer tipo de modificação constitucional nos temas arrolados em seus incisos. Quando a Constituição proíbe as emendas “tendentes a abolir” as cláusulas pétreas, ela não impede mudanças redacionais, voltadas ao aperfeiçoamento dos institutos salvaguardados, nem alterações de menor monta, ainda quando importarem em alguma restrição a tais institutos.62 Não haveria óbice, por exemplo, a que uma emenda constitucional operasse alguma mudança na partilha das competências entre os entes federativos, ou modificasse algum aspecto do arranjo institucional da separação dos poderes do Estado, ou mesmo instituísse alguma restrição proporcional a um direito fundamental. O poder constituinte reformador pode aprovar emendas que alterem esses conteúdos constitucionais, e pode até mesmo restringi-los moderadamente. Só não pode aboli-los, nem tampouco promover mudanças que cheguem ao ponto de vulnerar o seu “núcleo essencial”.63 É o que vem decidindo o Supremo Tribunal Federal: “as limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 60, §4º, da Lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação nelas se protege”. ▪ Implícitas Art. 60, parágrafo 4. Normas Constitucionais A Constituição possui caráter normativo, deste podem-se inferir várias consequências concernentes à eficácia das normas constitucionais. Estas normas, em geral, incidem diretamente sobre a realidade social, e podem ser aplicadas a casos concretos independentemente de regulamentação infraconstitucional. Ademais, pela superioridade hierárquica de que desfrutam no sistema jurídico – que não é apenas formal (elas estão no patamar mais elevado da ordem jurídica), mas também material (elas, em geral, consagram os princípios e valores mais relevantes de uma comunidade política) – as normas constitucionais devem orientar o operador do Direito na interpretação e na aplicação de todo o ordenamento infraconstitucional. Finalmente, elas são parâmetros de validade de todas as demais normas, que são consideradas nulas quando incompatíveis com os seus ditames. A norma jurídica não se confunde com o seu texto. O texto, dispositivo ou enunciado normativo é o significante, a norma é o seu significado. Em outras palavras, o texto é algo que se interpreta; a norma é o produto da interpretação, que além do texto, deve considerar toda uma gama de outros elementos, dentro os quais o âmbito da realidade social sobre o qual a norma incide. Estas noções importantesde Teoria Geral do Direito são válidas também no campo constitucional. Por isso, pode existir norma constitucional sem texto correspondente – caso das normas implícitas. 1. Classificação quanto à eficácia jurídica José Afonso da Silva considerava todas as normas constitucionais como desfrutantes de algum tipo de eficácia, embora esta possa variar. Nas suas palavras, “cada norma constitucional é sempre executável por si mesma até onde possa, até onde seja suscetível de execução”. a. Normas de eficácia plena São aquelas que desde o advento da Constituição, já têm a aptidão de produzir todos os seus efeitos jurídicos, não dependendo do legislador infraconstitucional para tanto. Tais efeitos, ademais, não podem ser restringidos pelo legislador. (Art. 82 CF) b. Normas eficácia contida Essas normas também já reúnem todas as condições necessárias para a produção dos seus efeitos típicos, independentemente de regulamentação. Contudo, existe a possibilidade de restrição destes efeitos pelo legislador, diversamente do que ocorre com as normas de eficácia plena (Art. 5, XIII CF). c. Normas de eficácia limitada São normas de eficácia indireta e reduzida, que não receberam do constituinte a normatividade suficiente para a produção de todos os seus efeitos. Portanto, essas normas carecem de regulamentação infraconstitucional para se tornarem plenamente operativas. Essas normas subdividem-se em dois tipos; normas de princípio institutivo, que traçam linhas gerais de organização e estruturação de órgãos, entidades ou institutos jurídicos, mas necessitam de lei complementar para lhes conferir existência imediata. E normas de princípio programático, que definem os principais objetivos e finalidades a serem perseguidos pelos Poderes Públicos, sem especificarem o modo como estes devem ser atingidos. 2. Teoria dos Princípios a. Conceito A primeira fase dos princípios corresponde ao período histórico onde o jusnaturalismo predominava, os princípios eram encarecidos no plano moral, concebidos como postulados de justiça, mas não se lhes reconhecia natureza propriamente normativa. Na segunda fase, de domínio do positivismo jurídico, os princípios não eram concebidos como normas, mas sim como meios de integração do Direito. Naquele período, os princípios eram considerados como imanentes ao ordenamento, e não transcendentes a ele, e a sua construção dava-se por meio de um processo de abstração que extraía do próprio sistema jurídico as suas principais orientações. Já a fase atual, equivalente ao pós-positivismo, teria como característica central a valorização dos princípios, não só na dimensão ético-moral, como também no plano propriamente jurídico. Neste período, nas palavras de Bonavides, acentuar-se-ia a “hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas constitucionais”. Para Dworkin, o princípio é um standard que há de ser observado por uma questão de justiça, equidade, ou qualquer outra dimensão de moralidade. Por muito tempos os princípios foram vistos apenas como manifestações políticas, sem força normativa. Contudo, esse entendimento encontra-se obsoleto nos dias atuais. Atualmente, enfatiza-se não só a força normativa dos tais princípios, como também a máxima relevância dos princípios – especialmente os constitucionais. b. Princípios x Regras Uma das distinções muitas vezes invocadas diz respeito à indeterminação semântica dos princípios. Tal critério está diretamente relacionado ao texto normativo. Diz-se que os princípios são expressos em linguagem mais vaga, que não define com precisão nem o seu campo de incidência, nem a consequência jurídica deflagrada pela sua aplicação. Eles são, por outro lado, mais ambíguos, no sentido de que comportam, com maior frequência, interpretações divergentes. Já com as regras, estas características – vagueza e ambiguidade – não estariam presentes com tamanha intensidade e frequência (a distinção quanto à indeterminação é quantitativa e não qualitativa). Outra diferença diz respeito ao papel do intérprete no processo de aplicação normativa. A função do intérprete envolve mais criatividade no caso dos princípios, que demandam uma participação mais ativa para a sua concretização. Já com as regras, o seu papel é mais acanhado, pois a aplicação destas normas não deixa tanto espaço para valorações subjetivas. A doutrina mais sofisticada enfatiza apenas que a dimensão volitiva (constitutiva) da interpretação é mais intensa e manifesta nos princípios do que nas regras. Outro critério muito citado é o da importância na ordem jurídica. Os princípios são vistos como as normas mais relevantes do ordenamento – os seus alicerces básicos -, enquanto as regras teriam importância menor. Afirma-se que os princípios desempenham uma função argumentativa mais relevante do que as regras, por definirem um Norte para a interpretação e aplicação das normas que vigoram na área em que incidem. Nesse sentido, eles aplicam efeitos irradiantes, projetando-se mais amplamente pelo ordenamento. Além disso, diz-se que os princípios têm natureza normogenética, no sentido de que deles é possível extrair outras normas jurídicas implícitas, das quais constituem fundamento. Não obstante, a doutrina também enfatiza que a relação entre princípios e regras é “de mão dupla”: os princípios guiam a interpretação das regras que os concretizam, mas estas se prestam também ao esclarecimento do seu sentido. Outra distinção diz respeito ao conteúdo moral. Há quem enfatiza que os princípios possuem uma dimensão moral mais pronunciada do que as regras, na medida em que incorporam valores fundamentais, traduzindo-os em textos normativos. Nas regras, esse conteúdo moral não se apresentaria com a mesma intensidade ou nitidez. Esta ideia pode ser questionada, pois não há dúvida de que existem regras constitucionais dotadas de forte conteúdo moral, como a que proíbe a pena de morte e princípios que não ostentam esta dimensão tão nitidamente, como a da indelegabilidade das competências na federação. Para Dworkin, os princípios e regras apresentam uma distinção qualitativa que concerne ao seu modo de aplicação. As regras, segundo ele,são comandos disjuntivos, aplicados de acordo com o padrão do “tudo ou nada”. Se os fatos que a regra prevê ocorrerem, ela deve ser aplicada, com a produção integral das consequências nela estabelecidas, ou então será considerada inválida ou inaplicável ao caso. Depreende- se das lições de Dworkin que, no conflito entre regras, o intérprete deve socorrer-se de critérios formais para resolução de antinomias — cronológico, especialidade, hierárquico —, e, definida a norma aplicável, resolver a questão. Já os princípios, para Dworkin, seguem uma lógica inteiramente distinta, por possuírem o que ele denominou de “dimensão de peso”. Esta dimensão de peso faz com que, em hipóteses de colisão de princípios apontando soluções divergentes, seja necessário analisar qual a importância assumida por cada um no caso em questão, para definir aquele que deverá prevalecer.90 Tal análise não é formal, como aquela usada no conflito entre regras, mas substantiva, deixando-se impregnar pela argumentação moral. Segundo Ronald Dworkin, os princípios (em sentido amplo) dividem-se em duas espécies: princípios em sentido estrito e diretrizes políticas (policies).91 Os primeiros são relacionados aos direitos, e devem ser observados “não porque isto vá promover ou garantir alguma situação econômica, política ou social considerada desejável, mas porque se trata de uma exigência de justiça, de equidade ou de alguma outra dimensão da moralidade”. Já as segundas são “standards que estabelecem um objetivo a ser alcançado, geralmente a melhoria de algum aspecto econômico, político ou social da comunidade”.92 Fiel ao ideário liberal, Dworkin atribui primazia absoluta aos princípios em sentido estrito em relação às diretrizes políticas, afirmando que, em hipóteses de conflito, os primeiros devem sempre prevalecer. Outra contribuição fundamental ao tema foi dada pelo jurista alemão Robert Alexy, que também elaborou uma distinção qualitativa entre princípios e regras, que tem pontos de contato, mas também diferenças em relação à distinção formulada por Dworkin.93 Para Alexy,94 os princípios são “mandados de otimização”, que devem ser cumpridos na maior medida possível, dentro das possibilidades fáticas e jurídicas de cada caso.95 Eles comportam, portanto, o cumprimento em graus diferentes, que dependem não só das possibilidades reais, presentes no plano fático, como também das possibilidades jurídicas, relacionadas a possíveis colisões com princípios contrapostos. Já as regras não têm esta característica, pois não podem ser cumpridas de forma gradual: elas são cumpridas integralmente ou descumpridas.9495 Em outras palavras, para Alexy, os princípios são comandos prima facie,96 e não mandamentos definitivos, pois, mesmo quando válidos e incidentes sobre determinado caso, podem ter de ceder na sua solução, total ou parcialmente, em razão de colisão com outros princípios que apontem em direção contrária. Nesses casos, deve-se recorrer a uma ponderação entre os princípios,97 pautada pelos critérios da proporcionalidade.98 Já com as regras, isso não acontece. Tais normas, para Alexy, são comandos definitivos, que, quando válidos e incidentes, devem ser integralmente aplicados. O conflito entre regras, segundo o jurista germânico, é resolvido por meio da invalidação de uma delas, ou do reconhecimento da sua não incidência ao caso, pela introdução de uma cláusula de exceção.99 Em síntese, para Alexy, dessas diferenças estruturais entre regras e princípios resulta uma outra distinção concernente à resolução de conflitos normativos. Para equacionar as tensões entre princípios constitucionais, recorre-se à ponderação, que busca a otimização dos bens jurídicos em jogo. Já para as colisões entre regras da Constituição define-se, por intermédio de critérios lógicos, qual será a regra aplicável, e as respectivas consequências serão integralmente produzidas. 3. Colisão de Normas Constitucionais Colisão de Normas Constitucionais ocorre quando algum ato, que supostamente é garantido por alguma norma constitucional, fere outra norma/princípio/direito garantido na mesma Constituição. Ex.: Um veículo de comunicação social divulga fatos íntimos concernentes à vida amorosa de uma celebridade que se opõe a esta divulgação. a. Ponderação No campo jurídico, a ponderação, também chamada de sopesamento, pode ser definida de uma forma mais restrita, como técnica destinada a resolver conflitos entre normas válidas e incidentes sobre um caso, que busca promover, na medida do possível, uma realização otimizada dos bens jurídicos em confronto.61 Portanto, a simples consideração de argumentos antagônicos na apreciação de um caso, ou na busca da interpretação mais adequada para um determinado enunciado normativo não é suficiente para caracterizar a ponderação. Não fosse assim, quase toda a atividade interpretativa poderia ser classificada como ponderação e o instituto perderia os seus contornos. A técnica em questão envolve a identificação, comparação e eventual restrição de interesses contrapostos envolvidos numa dada hipótese, com a finalidade de encontrar uma solução juridicamente adequada para ela. Nem sempre, na ponderação, se logra alcançar um meio-termo entre os bens jurídicos em disputa. Algumas vezes, diante das alternativas existentes, a solução terá que priorizar um dos interesses em jogo, em detrimento do outro. Isto, porém, não significa que a norma que tutela o interesse derrotado vá sempre subordinar-se àquela que protege o interesse que prevaleceu. Em circunstâncias diferentes, pode se dar exatamente o contrário, e, em outras, pode ser possível encontrar uma solução intermediária. Isto porque, uma das características da ponderação é que ela deve sempre levar em consideração o cenário fático, as circunstâncias de cada caso e as alternativas de ação existentes 4. Lacunas Constitucional e sua Integração A Constituição é uma norma fragmentária, que não trata de todos os temas, mas tão somente daqueles escolhidos pelo poder constituinte, pela sua singular importância, ou por outras razões atinentes à conveniência do seu entrincheiramento. A lacuna Constitucional ocorre quando há ausência de norma constitucional sobre determinado tema de caráter eminentementeabarcado pela reserva de Constituição, que não pode ser determinado por norma infraconstitucional. Solução possível que menos se afaste da essência da Constituição (Anotação do Professor). Hermenêutica Constitucional 1. A evolução dos paradigmas de interpretação A atividade do juiz consiste em verificar se os fatos levados à sua apreciação se identificam com a hipótese de incidência prevista na lei. Para o formalismo mais estrito, toda a atividade do intérprete deveria se restringir a essa operação lógico-formal, em que a norma figura como premissa maior, o fato, como premissa menor, e a consequência jurídica é a síntese do silogismo. Segundo a Escola da Exegese, todo o Direito estaria compreendido no sistema composto pelas normas ditadas pelo legislador, e o papel do intérprete se resumiria a fazer com que a vontade legislativa, gravada nos textos legais, incidisse nos casos concretos. Não se concebia, portanto, que a interpretação operasse construtivamente. Frase típica que expressa perfeitamente o pensamento acima é a formulada por Montesquieu, para o qual o “juiz é a boca que pronuncia as palavras da lei”. Com a ampliação da intervenção do Estado na vida social dera ensejo à inflação legislativa, e a profusão das leis gerara a sua dessacralização. A ideia de separação dos poderes e a ideia de juiz como mero pronunciador das palavras da lei já não tinham tanta força. O marxismo ajudou a desmistificar a ideia de que o processo de interpretação e aplicação do Direito poderia ser neutro, asséptico e apolítico. A negação da dimensão política servia apenas como mascarar a realidade, com o propósito de imunizar o intérprete diante de críticas, colaborando para a manutenção do status quo. A Psicologia revelara, ademais, a impossibilidade de se conceber o intérprete do Direito como uma máquina de fazer subsunções. Outras teorias adotaram caráter totalmente anti-formal, como a do realismo jurídico. O Direito não é nada menos que profecias do que as cortes vão de fato fazer. Para o realismo, a interpretação do direito é sempre um ato de criação judicial, impregnado de conteúdo político. Após a Segunda Guerra, temeu-se a total separação do Direito e Moral, marca do profundo relativismo ético vivido anteriormente. Buscou-se, portanto, na filosofia argumentos que pudessem moralizar o Direito sem que se recorresse a argumentos de origem transcendentais. Utilizando a razão (Kant), os jusfilósofos passaram a dar mais interesses a princípios abstratos de justiça. Já o giro linguístico18 provocou uma mudança profunda na maneira como se concebe o conhecimento, envolvendo uma ruptura com o modelo cartesiano, que se baseava numa rígida separação entre sujeito e objeto. O foco filosófico, antes centrado na consciência do sujeito, se desloca para a comunicação intersubjetiva, mediada pela linguagem. A nova premissa é de que o conhecimento humano é necessariamente mediado pela linguagem, que permeia todo o nosso universo. É impossível que o sujeito não interfira no objeto e vice-versa; o sujeito traz pré-compreensões que interferem no processo de julgamento. No cenário contemporâneo, são diversas as correntes que buscam fornecer métodos ou critérios para a busca da melhor resposta em cada caso jurídico controvertido. Esta é uma característica do pós-positivismo — expressão genérica, que congrega uma série de concepções jurídicas diferentes, que têm em comum a rejeição tanto ao formalismo, como ao reconhecimento da plena discricionariedade do intérprete nos casos difíceis. No novo marco, a interpretação jurídica se abre para influências de outros domínios, como a Filosofia Política, a Sociologia e a Economia. Ela se torna mais complexa, incorporando novos instrumentos, como as teorias da argumentação, que procuram estabelecer procedimentos baseados na comunicação intersubjetiva para a busca das melhores soluções, e a ponderação de interesses. Em geral, reconhece- se o papel destacado do intérprete no processo de aplicação do Direito, que não é visto como um executor autômato das decisões legislativas ou constituintes. Porém, não se lhe concede o poder de fazer escolhas políticas de acordo com as suas preferências, buscando-se a definição de parâmetros para a orientação da sua atuação. Há uma reabilitação da ideia de racionalidade prática (razão voltada para a ação) na metodologia do Direito. Racional, na nova perspectiva, não é só aquilo que possa ser logicamente deduzido de normas jurídicas, ou empiricamente comprovado por meio da experimentação, mas também o que resultar de um deliberação fundada em argumentos razoáveis, a propósito do que é justo ou correto fazer, em cada situação. 2. Princípios de interpretação constitucional a. Princípios de máxima efetividade Prescreve que seja preferida a interpretação que confira maior efetividade à Constituição. Se determinada norma constitucional se abre a diversas interpretações, cabe ao intérprete optar pela que produza mais efeitos práticos concretos. b. Princípios da força normativa da Constituição A Constituição é uma autêntica norma jurídica e não uma mera proclamação política. c.Princípios da unidade da constituição Todos os artigos da Constituição têm a mesma posição hierárquica d. Princípio da concordância prática Princípios contraditórios não se anulam, cabe ao jurista ponderar as partes para chegar a uma concordância entre os princípios, otimizando-os. e. Princípio da razoabilidade princípios que tornam a decisão racional, se opondo mais ao racional do que sendo racional. i. Adequação a norma em questão está apta para alcançar o fim desejado? ii. Necessidade Há outro meio apto e menos gravoso para alcançar um fim? iii. Proporcionalidade em sentido estrito juízo de justiça feito o balanceamento entre o ônus recebido pelo indivíduo e o benefício pela sociedade. Métodos de Interpretação Constitucional 1. Conceito: “proceder racional e intencionalmente direcionado a alcançar um objetivo” (?) (Não há norma jurídica, senão norma jurídica interpretada) A Constituição tem de ser interpretada em contextos muito diferentes. Ela é interpretada quando incide sobre a realidade social, regulando determinadosfatos e comportamentos. A aplicação também é interpretada no exercício do controle de constitucionalidade: para invalidar um ato normativo, ou mesmo para afastar a sua aplicação num caso concreto, o Poder Judiciário tem de interpretar tanto a Constituição como a norma infraconstitucional questionada. Também o Poder Legislativo, para elaborar normas jurídicas, é obrigado a interpretar a Constituição, no mínimo para aferir se as suas decisões políticas estão dentro do marco das possibilidades de escolha estabelecidas em sede constitucional. 2. Relação intencional → método e lógica racional a. De exterioridade construtiva: “razão prescreve a priori um método que passa a ser objeto da razão. ” b. De reconstrução crítico-reflexiva: “o método é a assunção intencional de uma prática para depois fundamentá-la através de um pensamento crítico orientado por valores e padrões normativos vigentes. ” 3. Métodos Positivistas a. Literal ou Gramatical O elemento gramatical busca extrair a norma jurídica do texto que a consagra. Almeja-se, por meio do elemento gramatical, esclarecer o significado das palavras empregadas pelo legislador para, a partir daí, extrair as conclusões sobre a aplicação de determinada norma jurídica. Nos casos mais fáceis, o elemento gramatical já fornece a resposta à questão jurídica em discussão, dando ensejo à subsunção. Em outros casos, o elemento gramatical não será suficiente para o equacionamento do problema. Mesmo nessas hipóteses, o texto permanece relevante, atuando como um dos diversos elementos a serem considerados pelo intérprete na busca da resposta mais adequada à questão jurídica suscitada. b. Histórico O elemento histórico busca subsídios para a interpretação jurídica na vontade do legislador. Examina-se a occasio legis, as razões que motivaram a edição de um ato normativo, a exposição de motivos e os debates parlamentares, com o objetivo de perquirir a intenção do legislador em relação a determinada questão. O STF, por exemplo, no julgamento da ADPF nº 132 e da ADI nº 4.277, que versaram sobre a união homoafetiva, não atribuiu maior relevância ao elemento histórico, que apontava que, por ocasião da votação do art. 226, §3º, os membros da Assembleia Constituinte não quiseram estender o instituto da união estável aos casais homossexuais. O ponto foi destacado no voto do Ministro Lewandowski, que transcreveu trechos dos debates parlamentares travados à época sobre o tema. A Corte, com inteira razão, deu mais importância aos valores fundamentais da Constituição, como a igualdade, a liberdade e a dignidade da pessoa humana, que apontavam no sentido do reconhecimento dessas formações familiares, mantendo-se, no ponto, em sintonia com novas percepções sociais mais inclusivas sobre orientação sexual que emergiram no país depois de 1988. c. Sistemático O elemento sistemático é aquele que preconiza que cada norma jurídica deve ser interpretada com consideração de todas as demais, e não de forma isolada. Os preceitos devem ser considerados em sua unidade orgânica, não como normas que se bastam e vigoram isoladas dos demais. Savigny distinguia o elemento lógico do elemento sistemático. Para ele, o elemento lógico referia-se “à estruturação do pensamento, ou seja, à relação lógica na que se acham suas diversas partes”, e o elemento sistemático, “à conexão interna que enlaça a todas as instituições e regras jurídicas dentro de uma magna unidade”.70 Aqui os dois elementos não serão individualizados, como tampouco costuma ocorrer na doutrina. A premissa básica do elemento sistemático é a de que o Direito não é um mero conjunto de normas, mas compõe um ordenamento, em que cada parte tem conexão com o todo, à luz do qual deve ser compreendida. A interpretação sistemática busca promover a harmonia entre essas partes. A busca da harmonização e da coerência no ordenamento é uma tarefa que o intérprete deve perseguir; muitas vezes uma tarefa dificílima. Trata-se de um ponto de chegada que se aspira atingir, e não do ponto de partida do intérprete. O reconhecimento da união homoafetiva é um exemplo da interpretação sistemática da Constituição. O intérprete optou por considerar o todo, – dignidade da pessoa humana, igualdade etc – ao invés de interpretar gramaticalmente a Constituição. d. Teleológico A interpretação teleológica é a que busca a finalidade subjacente ao preceito a ser interpretado. Ao contrário dos elementos de interpretação anteriores, este não se deve a Savigny, mas a Jhering.71 A interpretação teleológica está prevista no art. 5º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro: “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”. Trata-se de um elemento especialmente importante no domínio constitucional, considerando a grandeza das tarefas a que se propõe uma Constituição.72 Na Constituição, os principais fins sociais do Direito brasileiro estão positivados expressamente, na forma de “normas programáticas”, ou implicitamente, em seu sistema de valores. Essas finalidades básicas são extremamente relevantes para a interpretação de outras normas constitucionais e infraconstitucionais. 4. Método Concretizador O método concretizador parte da premissa de que há criação do intérprete no momento de julgar . A criação é influenciada por uma certa 1 pré-compreensão, que seria a cultura. Como assinalou Konrad Hesse, “o 1 Virada linguística: o sujeito interfere no objeto e o objeto interfere no sujeito. A linguagem condiciona a vida das pessoas e, consequentemente, toda a realidade. intérprete não pode captar o sentido da norma desde um ponto (...) situado fora da existência histórica, e sim unicamente a partir da concreta situação histórica em que se encontra, cuja plasmação conformou seus hábitos mentais, condicionando os seus conhecimentos e os seus preconceitos”. Tomar consciência da pré-compreensão permite ao intérprete a fuga de decisões arbitrárias e, grosseiramente falando, etnocêntricas. O papel do intérprete, nessa concepção, é construir a solução mais razoável para o caso concreto. O compromisso central do intérprete deixa de ser com o sistemajurídico, e passa a ser com a solução do “problema” apresentado (Tópica). Topos configura um “lugar comum’’ da argumentação, que não vincula necessariamente o intérprete, mas lhe apresenta uma alternativa possível para a solução do problema. Os topoi (plural de topos) são diretrizes que podem eventualmente servir à descoberta de uma solução razoável para o caso concreto. Eles não são certos ou errados, mas apenas mais ou menos adequados para a solução do problema; mais ou menos capazes de fornecer uma resposta razoável para o caso, que se mostre persuasiva à comunidade de intérpretes. Dentre os topoi podem figurar elementos heterogêneos como o texto normativo, princípios morais, tradições compartilhadas etc. Não é incomum na nossa jurisprudência constitucional o recurso ao pensa mento tópicoproblemático, caracterizado pela preocupação com as especificidades do caso. Isso ocorreu, por exemplo, em decisão do STF em que se afastou a exigência de comprovação de três anos de prática jurídica para posse no cargo de Procuradora da República, de candidata que já exercia a função de Promotora de Justiça.86 A Corte, apesar de considerar constitucional a exigência em questão, imposta pelo poder constituinte derivado (art. 129, §3º), entendeu que, no caso específico, a sua impo sição não seria razoável, uma vez que a candidata já vinha atuando como membro do Ministério Público. A interpretação, segundo alguns autores, não pode ultrapassar a Constituição, admitindo-se todo tipo de interpretação, sem nenhum critério normativo. Um dos principais elementos incorporados pela metodologia constitucional contemporânea é a avaliação das consequências práticas das decisões. Trata-se de um dos elementos centrais do chamado pragmatismo.95 A interpretação deve envolver a avaliação das necessidades humanas e sociais. O Direito é entendido não como um fim em si mesmo, mas como um meio para a realização daquelas necessidades; deve, portanto, se adequar a elas. O que importa é o modo como a decisão reper cute no mundo social. O papel do intérprete é buscar prever qual será o impacto de sua decisão na sociedade: a interpretação que produzir as melhores consequências práticas é a que deve ser preferida. Ao invés de se voltar para o texto normativo, para as relações sistemáticas entre os preceitos constitucionais ou para o sentido que estes possuíam no momento da entrada em vigor da Constituição, o intérprete deve assumir uma postura pragmática e optar pela interpretação que produza melhores resultados práticos Argumentos consequencialistas prevaleceram no STF, por exemplo, quando do julgamento da inconstitucionalidade da Lei nº 8.024/90 (originada na Medida Provisória nº 168/90), a qual promoveu a retenção de valores depositados em cadernetas de poupança, que foi a principal medida do “Plano Collor”. A medida era um verdadeiro confisco, razão pela qual a lei estava em contradição direta com o direito de propriedade (CF, art. 5º). Ajuizada a ADI, o pedido cautelar, cujo deferimento levava à liberação imediata dos valores retidos, foi indeferido. → Só ocorre interpretação quando há dúvida → Se caracteriza pela utilização do ponto de vista (topos), questões e argumentos limitados pela norma → Interpretar é concretizar, ou seja, é a determinação do conteúdo da norma. a. Variáveis do método 2 i. Programa normativo (texto legal a ser necessitado) ii. Compreensão prévia do intérprete sobre a norma Doutrina, jurisprudência etc. iii. Âmbito normativo (problema a ser resolvido Teoria dos Direitos Fundamentais O avanço que o direito constitucional apresenta hoje é resultado, em boa medida, da afirmação dos direitos fundamentais como núcleo da proteção da dignidade da pessoa e da visão de que a Constituição é o local adequado para positivar as normas asseguradoras dessas pretensões. 2 Considere variáveis como partes do processo de interpretação. Correm paralelos no tempo o reconhecimento da Constituição como norma suprema do ordenamento jurídico e a percepção de que os valores mais caros da existência humana merecem estar resguardados em documento jurídico com força vinculativa máxima, indene às maiorias ocasionais formadas na efervescência de momentos adversos ao respeito devido ao homem. 1. Conceito: “São os assim reconhecidos em virtude de sua carga axiológica e protegidos pela Constituição ou tratados internacionais, assegurando ao indivíduo ou grupo de indivíduos uma garantia subjetiva ou pessoal. ” (Herman Benjamin) 2. Trajetória Histórica a. A filosofia antiga: estoicismo e a ética aristotélica. b. A filosofia moderna i. A ética utilitarista ii. O cristianismo e sua relação com o humanismo kantiano
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