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Direito Penal I aula 9


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Disciplina: Direito Penal I
Docente: Ana Ketsia B. M. Pinheiro
Aula 9
Crime Impossível
Faculdade Estácio de Sá - FAL
ARREPENDIMENTO POSTERIOR
Conceito e Natureza jurídica
CP, Art. 16 - Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.
 
É causa de diminuição de pena que ocorre nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, em que o agente, voluntariamente, repara o dano ou restitui a coisa até o recebimento da denúncia ou queixa.
 
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Requisitos:
Crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa: a lei só se refere à violência dolosa, podendo a diminuição ser aplicada aos crimes culposos em que há violência, tais como homicídio e lesão corporal culposa. 
Do mesmo modo, se a violência é empregada contra a coisa e não contra a pessoa, como, por exemplo, no crime de dano, é possível a aplicação do benefício.
 
b) Reparação do dano ou restituição da coisa: deve sempre ser integral, a não ser que a vítima ou seus herdeiros aceitem a reparação parcial, renunciando ao restante.
 
c) Voluntariedade do agente: não significa espontaneidade. A reparação ou restituição por conselho ou sugestão de terceiro não impede a diminuição, uma vez que o ato, embora não espontâneo, foi voluntário (aceitou o conselho ou sugestão porque quis). 
Atenção! É admissível o benefício no caso de ressarcimento feito por parente ou terceiro, desde que autorizado pelo agente, por tratar-se de causa objetiva de redução obrigatória da pena, a qual não exige que o ato indenizatório seja pessoalmente realizado pelo sujeito
 
d) Até o recebimento da denúncia ou queixa: se posterior, é circunstância atenuante genérica (CP, art. 65, III, b)
 
Distinção do instituto de Arrependimento Eficaz.
1ª) O arrependimento eficaz aplica-se também aos crimes cometidos com violência ou grave ameaça (agente descarrega a arma na vítima e depois se arrepende, a socorre e evita sua morte); o posterior só incide sobre crimes cometidos sem violência ou grave ameaça. 
2ª) O arrependimento eficaz faz com que o agente não responda pelo resultado visado, mas somente pelos atos até então praticados; o posterior é uma simples causa de diminuição de pena, prevista na Parte Geral do CP, que permite a redução da pena de 1/3 a 2/3.
3ª) O arrependimento eficaz é anterior à consumação, enquanto o posterior, o nome já diz, pressupõe a produção do resultado.
Distinção da circunstância atenuante genérica prevista no art. 65, III, alínea b, do Código Penal
CP, Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
(...) III - ter o agente
(...)b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as consequências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;
CRIME IMPOSSÍVEL
Conceito e natureza jurídica
CP, Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.
 
Também chamado de tentativa inidônea.
Muitas vezes, após a prática do fato, constata-se que o agente jamais conseguiria consumar o crime, quer pela ineficácia absoluta do meio empregado, quer pela absoluta impropriedade do objeto visado pela ação executiva.
Não se trata de causa de isenção de pena, como parece sugerir a redação do art. 17 do Código Penal, mas de causa geradora de atipicidade (ou de exclusão do fato típico), pois não se concebe queira o tipo incriminador descrever como crime uma ação impossível de se realizar
Teorias sobre o Crime Impossível:
i. Teoria subjetiva
Para essa teoria, o realmente decisivo é a intenção do agente. Toda tentativa é em si mesma inidônea, uma vez que não alcança o resultado visado. A inidoneidade, porém, deve ser apreciada não conforme a realidade dos fatos, mas segundo a
avaliação do agente no momento da ação. Assim, o autor de um crime impossível deve sofrer a mesma pena da tentativa.
 
ii. Teoria objetiva
Para essa teoria, o que justifica a punibilidade da tentativa é o perigo objetivo que o início da execução representa para o bem jurídico protegido pela norma penal. E esse perigo só existirá se os meios empregados na tentativa forem adequados à produção do resultado e se o objeto visado apresentar as condições necessárias para que esse resultado se produza. 
Se não há nem idoneidade do meio, nem propriedade do objeto, não se pode falar em tentativa punível.
Assim, não havendo idoneidade nem nos meios nem no objeto, não se pune essa ação. O crime impossível constitui figura atípica. 
Essa é a teoria adotada pelo nosso Código.
 
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iii. Teoria sintomática 
Essa teoria busca examinar se a realização da conduta do agente é a revelação de sua periculosidade. 
Mesmo na tentativa inidônea, isto é, na hipótese de crime impossível, se esta revelar indícios da presença de periculosidade no agente, deverá ser punida.
Requisitos
Há duas espécies diferentes de crime impossível: 
a) por ineficácia absoluta do meio empregado; 
b) por absoluta impropriedade do objeto. 
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Ineficácia absoluta do meio: o meio empregado ou o instrumento utilizado para a execução do crime jamais o levarão à consumação. Um palito de dente para matar um adulto, uma arma de fogo inapta a efetuar disparos ou uma falsificação grosseira, facilmente perceptível, por exemplo, são meios absolutamente ineficazes.
Obs.: a ineficácia do meio, quando relativa, leva à tentativa e não ao crime impossível.
 
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Impropriedade absoluta do objeto material: a pessoa ou a coisa sobre que recai a conduta é absolutamente inidônea para a produção de algum resultado lesivo. 
Obs.: a impropriedade não pode ser relativa, pois nesse caso haverá tentativa.
 
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 Crime putativo
 O crime putativo só existe na imaginação do agente, podendo-se afirmar que se trata de um “crime subjetivo”. O agente supõe, erroneamente, que está praticando uma conduta típica, quando na verdade o fato não constitui crime. Como o crime só existe na imaginação do agente, esse conceito equivocado não basta para torná-lo punível (o agente imagina proibida uma conduta permitida).
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O flagrante preparado é hipótese de crime putativo.
Súmula 145, STF: Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.
Delito putativo por obra do agente provocador (crime de flagrante preparado)
A polícia ou terceiro (agente provocador) prepara uma situação, na qual induz o agente a cometer o delito (investigadora grávida pede para médico fazer aborto ilegal e depois o prende em flagrante; detetive simula querer comprar maconha e prende o traficante etc.). 
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Nessa situação, o autor é o protagonista de uma farsa que, desde o início, não tem a menor chance de dar certo. Por essa razão, a jurisprudência considera a encenação do flagrante preparado uma terceira espécie de crime impossível, entendendo não haver delito ante a atipicidade do fato (Súmula 145 do STF).
 
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 TIPICIDADE
 O Delito como Ação Típica. Conceito de Tipo Penal
 
Tipo Penal e o Princípio da Legalidade
Greco: “Por imposição do princípio do nullum crimen sine lege, o legislador, quando quer impor ou proibir condutas sob a ameaça de sanção, deve, obrigatoriamente, valer-se de uma lei. Quando a lei em sentido estrito descreve a conduta (comissiva ou omissiva) com o fim de proteger determinados bens cuja tutela mostrou-se insuficiente pelos demais ramos do direito, surge o tipo penal”.
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Funções do Tipo Penal
Para Rogério Greco, o tipo penal exerce três funções: 
Função garantidora: o agente somente poderá ser penalmente responsabilizado se cometer uma das condutas proibidas ou deixar de praticar aquelas impostas pelo Código Penal.
O tipo exerce essa função de garantia à medida em que temos o direito de, ao analisa-lo, saber o que nos é permitido fazer.
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Função fundamentadora: através do tipo penal, o Estado fundamenta suas decisões,
fazendo valer seu jus puniendi.
Função selecionadora: seleciona as condutas que deverão ser proibidas ou impostas pela lei penal.
Nessa seleção de condutas feita por intermédio do tipo penal, o legislador, em atenção aos princípios da intervenção mínima, da lesividade e da adequação social, traz para o âmbito da proteção do Direito Penal somente aqueles bens de maior importância, deixando de lado as condutas consideradas socialmente adequadas ou que não atinjam bens de terceiros.
 
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Estrutura do Tipo Penal
Elementares
Elementares são dados essenciais à figura típica, sem os quais ocorre uma atipicidade absoluta ou relativa.
Atipicidade absoluta: ausência de elementar indispensável ao tipo, tornando-se o fato praticado pelo agente um indiferente penal.
Atipicidade relativa: ausência de uma elementar que leva à desclassificação do fato para outra figura típica.
 
	
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Elementares são os dados fundamentais de uma conduta criminosa. São os fatores que integram a definição básica de uma infração penal. No homicídio simples (CP, art. 121, caput), por exemplo, as elementares são “matar” e “alguém”.
Excluindo-se uma elementar, o fato se torna atípico, ou então se opera a desclassificação para outra infração penal. Assim, é atípica, sem correspondência em tipo penal, a conduta de “matar” um objeto, e não alguém. No caso do desacato (CP art. 331), a eliminação da elementar “funcionário público” desclassifica a conduta para o crime de injúria (CP art. 140).
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Os elementos do tipo se dividem em:
Elementos Objetivos do Tipo:
 
São aqueles que descrevem a conduta, o objeto ou o resultado do crime, assim como as circunstâncias externas do fato e aquelas relativas à pessoa do criminoso. Referem-se à materialidade da infração penal, ou à forma de execução, ao tempo, ao lugar, enfim, às circunstâncias externas do fato. Exs.: “repouso noturno” – art. 155, § 1º , CP; 
		“lugar ermo” - art. 150, § 1º , CP.  
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Elementos Subjetivos do Tipo:
 
São aqueles que se referem ao estado anímico do sujeito, ao fim especial da conduta ou ao estado de consciência do agente em relação a determinada circunstância constante do tipo penal. O dolo e a culpa são elementos subjetivos do delito, existindo outros elementos subjetivos específicos que podem integrar o tipo penal.
Exs.: “Se é intenção do agente” - art. 130, § 1º , CP;
		“ para fim libidinoso” - art. 219, CP.
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Elmentos Normativos do tipo:
Aqueles para cuja compreensão é insuficiente desenvolver uma atividade meramente cognitiva, devendo-se realizar uma atividade valorativa. Estes elementos exigem, para o perfeito entendimento de seu significado, um juízo de valor.
São exemplos característicos de elementos normativos expressões tais como “indevidamente” (arts. 151, § 1º, II; 162; 192, I; 316; 317; 319 etc.); “sem justa causa” (arts. 153; 154; 244; 246; 248);
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“sem permissão legal” (art. 292); “sem licença da autoridade competente” (arts. 166 e 253); “fraudulentamente” (art. 177, caput); “sem autorização” (arts. 189; 193; 281 e 282); “documento” (arts. 297; 298; 299); “funcionário público” (arts. 312; 331 e 333); “dignidade e decoro” (art. 140); “coisa alheia” (arts. 155; 157) etc
 
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Adequação Típica
Chama-se Adequação Típica a perfeita adequação do fato à norma penal. Apresenta-se sob duas formas:
Adequação Típica Direta (ou de subordinção imediata)
O fato se subsume imediatamente no modelo legal, sem a necessidade da concorrência de qualquer outra norma. Há um só dispositivo para fazer a adequação típica. 
Ex: matar alguém: essa conduta praticada por alguém amolda-se imediatamente ao tipo descrito no art. 121 do CP, sem precisar do auxílio de nenhuma outra norma jurídica.
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 Adequação Típica de Subordinação Mediata, ampliada ou por extensão
Constitui exceção e necessita da concorrência de outra norma, de caráter extensivo, normalmente presente na Parte Geral do Código Penal, que amplie a abrangência da figura típica.
Nesses casos, o fato praticado pelo agente não vem a se adequar direta e imediatamente ao modelo descrito na lei, o que somente acontecerá com o auxílio de outra norma ampliativa.
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Ex: a tentativa e a participação. Na hipótese da tentativa, há uma ampliação temporal da figura típica, e no caso da participação a ampliação é espacial e pessoal da conduta tipificada.
 
Tipicidade
Formal (ou legal)
Adequação do fato ao tipo penal descrito na lei.
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 Material
É o tipo formal adequado à lesividade que a conduta possa causar a bens jurídicos protegidos. Exige-se uma lesão significativa ao bem jurídico tutelado. Ex. art. 32, caput, da Lei n. 9.605/98, que dispõe: “praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”. Portanto, a castração de um animal doméstico, com a finalidade de evitar a reprodução desordenada, formalmente caracteriza a tipificação do art. 32 acima mencionado. Entretanto, não houve a tipificidade material, pois essa conduta é aceita socialmente.
 
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Conglobante
De acordo com essa teoria, o fato típico pressupõe que a conduta esteja proibida pelo ordenamento jurídico como um
todo, globalmente considerado. 
Assim, quando algum ramo do direito, civil, trabalhista, administrativo, processual ou qualquer outro, permitir o comportamento, o fato será considerado atípico.
 
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A tipicidade, portanto, exige para a ocorrência do fato típico (a) a correspondência formal entre o que está escrito no tipo e o que foi praticado pelo agente no caso concreto (tipicidade legal ou formal) + (b) que a conduta seja anormal, ou seja, violadora da norma, entendida esta como o ordenamento jurídico como um todo, ou seja, o civil, o administrativo, o trabalhista, etc (tipicidade conglobante).
Ex.: intervenções médico-cirúrgicas.
 
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Espécies de Tipos Penais.
Fundamentais e Derivados
Tipo fundamental ou básico: é o que nos oferece a imagem mais simples de uma espécie de delito. É o tipo que se localiza no caput de um artigo e contém os componentes essenciais do crime, sem os quais este desaparece (atipicidade absoluta) ou se transforma em outro (atipicidade relativa).
Tipos derivados: são os que se formam a partir do tipo fundamental, mediante o destaque de circunstâncias que o agravam ou atenuam. Ex.: homicídio privilegiado e qualificado.
 
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Incriminadores e Permissivos
Incriminadores: são os tipos que descrevem as condutas proibidas. Todo fato enquadrável em tipo incriminador, em princípio, será ilícito, salvo se também se enquadrar em algum tipo permissivo (causas de justificação).
Permissivos ou justificadores: são tipos penais que não descrevem fatos criminosos, mas hipóteses em que estes podem ser praticados. Por essa razão, denominam-se permissivos. São tipos que permitem a prática de condutas descritas como criminosas. 
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São os que descrevem as causas de exclusão da ilicitude (CP, art. 23), também conhecidas como causas de justificação, como é o caso da legítima defesa, que se encontra no art. 25 do Código Penal.
 
Fechados e Abertos
Tipos fechados: apresentam descrição completa do modelo de conduta proibida, bastando ao intérprete, verificar a simples correspondência entre a conduta e o dispositivo legal, para verificação da adequação típica.
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Tipos abertos: por apresentarem ausência de descrição ou de descrição incompleta, transferem ao intérprete a tarefa de tipificar cada conduta, valendo-se, para tanto, de elementos não integrantes do tipo. Ou seja, pela simples leitura, não há possibilidade de aferirmos, sem o necessário complemento.
Ex.: Art. 134 - Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
A expressão “desonra” requer um juízo de valor de quem a interpreta.
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OBS.: Os tipos penais culposos são, em regra, abertos, pois a avaliação de culpa deve ser feita pelo intérprete. 
A divisão tripartida do crime (tipicidade, antijuricidade e culpabilidade) permite a busca de um resultado final mais
adequado e mais justo, segundo Bittencourt.
“O fato só será crime se for típico, ilícito e culpável”. 
Esta divisão, para fins de avaliação e valoração, facilita a racionaliza a aplicação do direito, pois garante a segurança contra arbitrariedades e as contradições que podem vir a ocorrer. 
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Excludentes de ilicitude
Para que haja ilicitude em uma conduta típica, independentemente do seu elemento subjetivo, é necessário que inexistam causas justificantes. Isto porque estas causas tornam lícita a conduta do agente.
As causas justificantes têm o condão de tornar lícita uma conduta típica praticada por um sujeito. Assim, aquele que pratica fato típico acolhido por uma excludente, não comete ato ilícito, constituindo uma exceção à regra que todo fato típico será sempre ilícito.
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As excludentes de ilicitude estão previstas no artigo 23 do Código Penal brasileiro. São elas:
a) Estado de necessidade
CP, Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
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Natureza Jurídica
Trata-se de uma excludente de ilicitude que constitui no sacrifício de um bem jurídico penalmente protegido, visando salvar de perigo atual e inevitável direito próprio do agente ou de terceiro - desde que no momento da ação não for exigido do agente uma conduta menos lesiva. Assim, embora o fato seja considerado típico, não há crime em face da ausência de ilicitude.
Nesta causa justificante, no mínimo dois bens jurídicos estarão postos em perigo, sendo que para um ser protegido, o outro será prejudicado.
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Para que se caracterize a excludente de estado de necessidade é necessário dois requisitos: 
existência de perigo atual e inevitável e 
a não provocação voluntária do perigo pelo agente.
Quanto ao primeiro, importante destacar que se trata do que está acontecendo, ou seja, o perigo não é remoto ou incerto e além disso, o agente não pode ter opção de tomar outra atitude, pois caso contrário, não se justifica a ação.
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Enquanto o segundo requisito significa que o agente não pode ter provocado o perigo intencionalmente. 
A doutrina majoritária entende que se o agente cria a situação de perigo de forma culposa, ainda assim poderá se utilizar da excludente.
 
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Exemplos do estado de necessidade: 
agente que, por ocasião de incêndio ou desastre, invade domicílio alheio para salvar as pessoas que lá se encontram; 
o náufrago que, de posse de apenas um colete salva-vidas, deixa que seus companheiros se afoguem no mar; 
agente que, para transportar uma pessoa gravemente ferida, furta um carro para leva-la ao hospital.
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O furto famélico ocorre quando alguém furta para saciar uma necessidade urgente e relevante. É a pessoa que furta para comer pois, se não furtasse, morreria de fome. Mas o furto famélico não existe apenas para saciar a fome. Alguém que furta um remédio essencial para sua saúde, um cobertor em uma noite de frio, ou roupas mínimas para se vestir, também pode estar cometendo furto famélico. 
O furto famélico não é crime porque a pessoa age em estado de necessidade: para proteger um bem jurídico mais valioso – sua vida ou a vida de alguém – a pessoa agride um bem jurídico menos valioso – a propriedade de uma outra pessoa.
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Conforme o doutrinador Rogério Greco, não é qualquer dificuldade econômica que autoriza o agente a agir em estado de necessidade, somente se permitindo quando a situação afete sua própria sobrevivência. 
Como é o caso, por exemplo, do pai que vendo seus familiares com fome e não sem condições de prover sustento, furta alimentos num mercado. É razoável que prevaleça o direito á vida do pai e de sua família ante ao patrimônio do mercado. 
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b) Legítima Defesa
CP, Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
O conceito de legítima defesa, esta que é a excludente mais antiga de todas, está baseado no fato de que o Estado não pode estar presente em todos os lugares protegendo os direitos dos indivíduos, ou seja, permite que o agente possa, em situações restritas, defender direito seu ou de terceiro.
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Assim sendo, a legítima defesa nada mais é do que a ação praticada pelo agente para repelir injusta agressão a si ou a terceiro, utilizando-se dos meios necessários com moderação.
A formação da legítima defesa depende de alguns requisitos objetivos. São eles:
a) Agressão injusta, atual ou iminente;
b) Direito próprio ou alheio;
c) Utilização de meios necessários com moderação.
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O elemento subjetivo existente na legítima defesa é a vontade de se defender ou defender direito alheio. Além de preencher os requisitos objetivos, o agente precisa ter o animus defendendi no momento da ação. 
Se o agente desconhecia a agressão que estava por vir e age com intuito de causar mal ao agressor, não haverá exclusão da ilicitude da conduta, pois haverá mero caso de coincidência.
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Ofendículos
Tema bastante discutido entre os doutrinadores. 
Ofendículos são aparatos que visam proteger o patrimônio ou qualquer outro bem sujeito a invasões, como por exemplo, as cercas elétricas em cima de um muro de uma casa. 
Para alguns autores, constituem legítima defesa preordenada e para outros, exercício regular de direito, embora ambos enquadrem-se na exclusão da antijuricidade da conduta. 
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A jurisprudência entende que todos os aparatos dispostos para defender o patrimônio devem ser visíveis e inacessíveis a terceiros inocentes, somente afetando aquele que visa invadir ou atacar o bem tutelado alheio. 
Preenchendo estes requisitos, o agente não responderá pelos danos causados ao agressor, pois configurará caso de legítima defesa preordenada. Só serão conceituados como exercício regular de direito quando levados em consideração o momento de sua instalação.
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Por fim, faz-se necessário analisar quando o agente deverá responder por excesso, em caso de legítima defesa. São três as situações: a primeira refere-se à forma dolosa, a segunda culposa e a última é aquela que se origina de erro.
Na forma dolosa, o agente tem ciência de que a agressão cessou, mas mesmo assim, continua com sua conduta, lesando o bem jurídico do agressor inicial. Neste caso, o agente que inicialmente se encontra em estado de legítima defesa e excede conscientemente seus limites, responderá pelos resultados do excesso a título de dolo. 
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A forma culposa se configura quando o agente que age reagindo contra a agressão, excede os limites da causa justificante por negligência, imprudência ou imperícia. O resultado lesivo causado deve estar previsto em lei como crime culposo, para que o agente possa responder. 
E a última, que é proveniente do erro, se configura no caso de legítima defesa subjetiva. Aqui, o agente incide em erro sobre a situação que ocorreu, supondo que a agressão ainda existe. Responderá por culpa, caso haja previsão e se for evitável.
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É o caso do agente que, em face de injusta agressão, desfere golpe de faca no agressor, que vem a cair. Pretendendo fugir, o agressor tenta levantar-se e, pensando o agente que o agressor iria novamente ataca-lo, desfere-lhe novas facadas, matando-o. Nesse caso, com a queda do agressor em virtude da primeira facada, já havia cessado a agressão injusta. O agente, entretanto, por erro de tipo escusável, supõe que o agressor pretendia levantar-se para novamente ataca-lo, razão pela qual, agindo com excesso, mata-o com novas facadas. 
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c) Estrito cumprimento do dever legal.
O agente que cumpre o seu dever proveniente da lei, não responderá pelos atos praticados, ainda que constituam um ilícito penal.
 Isto porque o estrito cumprimento de dever legal constitui outra espécie de excludente de ilicitude, ou causa justificante.
O primeiro requisito para formação desta excludente de ilicitude é a
existência prévia de um dever legal. Este requisito engloba toda e qualquer obrigação direta ou indireta que seja proveniente de norma jurídica. 
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Dessa forma, pode advir de qualquer ato administrativo infralegal, desde que tenham sua base na lei. Também pode ter sua origem em decisões judiciais, já que são proferidas pelo Poder Judiciário no cumprimento de ordens legais.
Outro requisito é o cumprimento estrito da ordem. Para que se configure esta causa justificante, é necessário que o agente se atenha aos limites presentes em seu dever, não podendo se exceder no seu cumprimento. Aquele que ultrapassa os limites da ordem legal poderá responder por crime de abuso de autoridade ou algum outro específico no Código Penal. 
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Por fim, o último requisito é a execução do ato por agente público, e excepcionalmente, por particular. Para que se caracterize a causa justificante, o agente precisa ter consciência de que pratica o ato em cumprimento de dever legal a ele incumbido, pois, do contrário, o seu ato configuraria um ilícito. 
Trata-se do elemento subjetivo desta excludente, que é a ação do agente praticada no intuito de cumprir ordem legal.
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É o caso do policial que viola o domicílio onde está sendo praticado um delito, ou emprega força indispensável no caso de resistência ou tentativa de fuga do preso, o soldado que mata o inimigo no campo de batalha, o do oficial de justiça que viola o domicílio para cumprir ordem de despejo, etc.
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d) Exercício regular do direito
Aquele que exerce um direito garantido por lei não comete ato ilícito. Uma vez que o ordenamento jurídico permite determinada conduta, se dá a excludente do exercício regular do direito.
O primeiro requisito exigido por esta causa justificante é a existência de um direito, podendo ser de qualquer natureza, desde que previsto no ordenamento jurídico. 
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O segundo requisito é a regularidade da conduta, isto é, o agente deve agir nos limites que o próprio ordenamento jurídico impõe aos direitos. Do contrário haveria abuso de direito, configurando excesso doloso ou culposo.
Como exemplos, pode-se citar:
Desforço imediato no esbulho possessório;
Intervenções médico-cirúrugicas;
Correção dos filhos pelos pais.
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Outra situação refere-se à violência desportiva. A sociedade tem ciência de que alguns esportes possuem riscos de lesões à integridade física de seus praticantes, como por exemplo, o boxe. 
No entanto, assim como na situação anterior, é essencial que as regras sejam respeitadas para que exista a excludente do exercício regular de direito. Havendo desproporcionalidade nas lesões, como por exemplo, a morte do adversário, haveria responsabilidade do agente.
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Segundo Capez, “a violência desportiva caracteriza um exercício regular de direito, desde que preenchidos os seguintes requisitos:
A agressão se dê dentro dos limites do esporte ou de seus desdobramentos previsíveis;
Haja consentimento prévio do ofendido, que deve estar ciente dos riscos inerentes ao esporte;
Regulamentação do esporte em lei;
Que a atividade não seja contrária aos bons costumes, apesar desse conceito ser vago, mas passível de delimitação.”
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