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Fisiologia 1 Fisiologia Ludmila Amitrano Mannarino 1ª e di çã o Fisiologia 33 Fisiologia dos sistemas de células excitáveis - nervoso e muscular 2 Fisiologia 34 A função dos sistemas que constituem o nosso corpo é baseada na organização das células que os compõe, e muitas destas possuem especializações exclusivas, o que permite classificar os neurônios (células nervosas) e as células musculares como excitáveis, o que significa dizer que essa células são capazes de alterar a condição de potencial elétrico da membrana quando são estimuladas, o que resultará em passagem de uma corrente elétrica (potencial de ação) que será responsável pela sua função. No caso do sistema nervoso, a função das células é propagar informações, e no muscular é a contração, e graças a essas especializações é que podemos andar, pensar, memorizar, utilizar nossos sentidos, executar movimentos como respiratórios e digestivos, controlar a secreção de hormônios e muito mais! Para melhor entendimento, essa unidade será subdividida em três partes: eletrofisiologia celular (estudo da atividade elétrica da célula); sistema nervoso e sistema muscular. Objetivos da unidade: Reconhecer os potenciais de membrana e suas variações; Entender os processos eletroquímicos que ocorrem nas células excitáveis e reconhecer os íons envolvidos; Correlacionar a divisão anatômica com a funcional, do sistema nervoso; Identificar as células que formam o tecido nervoso e suas funções; Reconhecer a sinapse e suas modalidades; Reconhecer os tipos de receptores e vias sensoriais envolvidas; Demonstrar o funcionamento do sistema nervoso pela sua divisão funcional; Correlacionar as vias somática e autônoma com as respostas orgânicas, os neurotransmissores e seus receptores; Apresentar algumas das funções integradas do sistema nervoso; Fisiologia 35 Diferenciar os tipos de músculos; Correlacionar a histologia com o funcionamento de cada tipo de músculo; Associar os tipos de músculos com suas funções. Plano da unidade: 1ª PARTE: Eletrofisiologia Celular Potencial de Repouso e de Ação em Células Excitáveis 2ª PARTE: Fisiologia do Sistema Nervoso (SN) Células do Sistema Nervoso Transmissão sináptica Divisão funcional do SN - Princípios Gerais Divisão funcional do SN - Vias Aferentes (Sensitivas) Divisão funcional do SN - Vias Eferentes (Autônoma e Motora) Função Integrada do SN - Atos Reflexos Função Integrada do SN - Coordenação dos Movimentos Função Integrada do SN - Regulação da Temperatura Corporal Função Integrada do SN - Regulação da Alimentação Função Integrada do SN - Regulação da Ingestão de Água Função Integrada do SN - Sono Função Integrada do SN - Sistema Límbico 3ª PARTE: Fisiologia Muscular Músculo Esquelético Músculo Liso Músculo Cardíaco Bons estudos! Fisiologia 36 1ª Parte: Eletrofisiologia celular Como visto na unidade anterior, existe uma diferença na composição e na concentração dos íons entre o meio intra e extracelular, e esta condição é gerada e mantida pela membrana que possui como característica a permeabilidade seletiva. No meio extracelular ocorre maior concentração dos íons sódio, cálcio e cloro, e no intracelular de potássio. Estes elementos foram destacados por serem os envolvidos na atividade elétrica da membrana. A facilidade de passagem de íons permeáveis pelos seus canais iônicos (proteínas integrais de membrana que apresentam permeabilidade seletiva aos íons) é dependente de sua hidratação, que resulta da valência e do peso atômico de cada um. Por exemplo, ao comparar o sódio (Na+), o potássio (K+), o cloro (Cl-) e o cálcio (Ca++) perceber-se-á que o potássio e o cloro são mais permeáveis do que o sódio, e que este é mais permeável que o cálcio, que é o íon que possui maior grau de hidratação (quanto mais hidratado, maior o tamanho do íon e menor a sua permeabilidade). É essa desigualdade nas concentrações dos íons que é responsável pela presença de carga elétrica nas faces da membrana, ou seja, existe uma diferença de potencial elétrico entre elas, sendo a externa mais positiva que a interna (pois as proteínas que são sintetizadas na célula não se difundem). A polaridade da membrana (diferença de potencial elétrico) ocorre praticamente em todas as células do nosso corpo sendo denominada potencial de membrana. Fisiologia 37 Como as células nervosas e musculares são capazes de gerar variações eletroquímicas em suas membranas devido à alteração da permeabilidade dos seus canais iônicos, são consideradas excitáveis, e o potencial de membrana é chamado de potencial de repouso. Quando ocorre alteração na polaridade da membrana nessas células, dizemos que está ocorrendo um potencial de ação, que é o responsável pela função que elas exercem. Potencial de repouso e de ação em células excitáveis Os eventos eletroquímicos associados à geração do potencial de ação serão apresentados de forma sucinta, permitindo a assimilação do que é necessário para o entendimento do funcionamento do tecido nervoso e muscular. A alteração da permeabilidade dos canais iônicos das células excitáveis pode ser induzida por estímulos elétricos, químicos, físicos e mecânicos, ou ocorrer espontaneamente, como também ocorre nas células musculares lisas e cardíacas. Para que o potencial de ação seja iniciado, é necessário que a célula esteja em repouso (com a membrana polarizada - positiva na face externa e negativa na interna), assim quando ela for estimulada ocorre a abertura temporária dos canais de sódio, que devido ao gradiente de concentração, irá difundir para o meio intracelular, resultando em uma despolarização da membrana, tornando-a mais negativa na face externa e positiva na interna. Pelo fato do potássio estar mais concentrado no meio intracelular, ser mais permeável e a face externa estar carregada positivamente, ele é atraído para o meio extracelular, ocorrendo a repolarização da membrana, tornando a face externa novamente positiva e a interna negativa. Nesse momento a célula é capaz de responder a novos estímulos, pois a quantidade de sódio que entrou foi pequena, e ele ainda é mais concentrado no líquido extracelular. Mas para que a célula seja capaz de manter a excitabilidade é necessário que ocorra a organização iônica após a despolarização, que é conseguida com a ativação da bomba de sódio-potássio (transporte ativo), transportando o sódio em excesso para fora da célula enquanto conduz o potássio para dentro, retornando a condição iônica e de polaridade inicial da célula, antes de iniciar o potencial de ação. Fisiologia 38 Quando o estímulo determinar a abertura dos canais de cloro, ocorrerá uma hiperpolarização da membrana, pois o cloro, que é um anion, irá reforçar a polaridade negativa da face interna, impedindo ou retardando um potencial de ação. Fisiologia 39 Para facilitar o entendimento, vamos montar uma associação do íon com o evento na membrana: Sódio → despolarização Potássio → repolarização Bomba de sódio-potássio → reorganização iônica Cloro → hiperpolarização Vale destacar que uma propriedade importante do potencial de ação é a propagação por toda a membrana a partir do ponto de estímulo, e que a repolarização normalmente ocorre onde a despolarização teve início. 2ª PARTE: Fisiologia do sistema nervoso (SN) O sistema nervoso (SN) é formado por um conjunto de células especializadas em gerar e transmitir informações entre si e para as célulasmusculares e glândulas, sendo o principal integrador das funções corporais. Vejamos como isso funciona... O SN é dividido anatomicamente em duas partes, o sistema nervoso central (SNC), constituído pelo encéfalo e pela medula espinhal, sendo responsável por processar as informações relativas ao ambiente interno e externo do nosso corpo, Fisiologia 40 por tomar decisões, gerar os comandos para serem executados pelos órgãos efetores (músculos e glândulas) e por ser o local de armazenamento das informações, do aprendizado, dos pensamentos, das emoções e de muitas outras funções. A outra parte é o sistema nervoso periférico (SNP), seguimento responsável por fazer a integração entre o SNC e todos os órgãos do nosso corpo. Quando o SNC recebe as informações e determina comandos, tem como função manter o organismo adaptado aos estímulos, garantindo dessa forma a homeostasia. Fisiologia 41 Células do sistema nervoso O tecido nervoso é formado principalmente por dois tipos de células, as nervosas (denominadas de neurônios), que são a unidade funcional desse sistema e as células da glia (células gliais ou neuroglias), responsáveis por funções metabólicas, nutritivas e de suporte, que correspondem a cerca de 75 a 90% do total de células do sistema nervoso. Sendo as neuroglias mais numerosas que os neurônios, apesar de não serem excitáveis, são fundamentais para manter o ambiente apropriado para o funcionamento neural. Atualmente são reconhecidas no SNC os astrócitos, os oligodendrócitos, as micróglias e as células ependimais, e no SNP, as células de Schwann Oligodendrócitos e células de Schwann são responsáveis pela formação da bainha de mielina que envolve o axônio dos neurônios do SNC e do SNP, respectivamente. Os astrócitos, que são as neuróglias mais numerosas, exercem funções diversas das quais podemos destacar a participação na formação da barreira hematoencefálica (protege o SNC contra substâncias presentes no sangue que podem ser nocivas); a manutenção da concentração de potássio extracelular (permitindo a excitabilidade neuronal); a remoção de neurotransmissores da fenda sináptica; a síntese e fornecimento de substratos para os neurônios utilizarem, como o lactato (para ser utilizado como fonte energética); além de guiarem os prolongamentos do axônio na organização do tecido nervoso. As micróglias realizam fagocitose de restos celulares e de corpos estranhos (como bactérias) e também protegem os neurônios do estresse oxidativo. Apenas a função das células ependimais ainda não foi reconhecida. O nosso sistema nervoso possui quase 100 bilhões de neurônios, que são células excitáveis e liberam mediadores químicos (neurotransmissores) que permitem que haja uma comunicação entre si e entre eles e os órgãos efetores. Estruturalmente esta célula é formada pelo corpo celular nucleado, que é responsável pelas funções metabólicas e de onde partem prolongamentos que são Fisiologia 42 os dendritos (dispersos e numerosos) que recebem os estímulos, sendo que também podem ocorrer no corpo celular e no axônio, e o axônio (ou fibra nervosa) que apesar de único possui uma ramificação onde a substância neurotransmissora fica armazenada em vesículas, sendo, portanto, a estrutura responsável em transmitir a informação para célula seguinte, por meio de sinapse. O axônio pode ser revestido pela bainha de mielina (mielínico) ou não (amielínico). A mielina é um isolante, onde potenciais de ação não podem ser gerados nem conduzidos, mas como ela é descontínua, o potencial de ação "salta" através dos nódulos de Ranvier (local do axônio entre duas junções de mielina), permitindo acelerar a velocidade da transmissão do impulso nervoso em até 10 vezes, essa é a condução saltatória da corrente elétrica. Nos axônios mielinizados ou não, a condução do potencial de ação que ocorre no sentido do axônio (ortodrômica), é a responsável pela passagem de informação, tendo em vista ser esse o local que possui o neurotransmissor. Fisiologia 43 Transmissão sináptica Sinapse é o local de passagem de informação entre um neurônio e outro ou entre ele e uma célula muscular ou glandular, sendo de dois tipos: a sinapse elétrica e a química. Nas sinapses elétricas o potencial de ação é passado de uma célula para outra pelas junções comunicantes, e ocorre com pouca frequência no SN, além de que pouco se sabe a respeito de seu funcionamento e sua função neste tecido. Por outro lado, as sinapses químicas é que predominam, sendo elas responsáveis pela modulação na passagem de informação entre neurônios. Nesse tipo de sinapse as células não se tocam, havendo entre elas um espaço denominado fenda sináptica, onde a substância neurotransmissora é liberada pelo neurônio pré-sináptico para atuar no receptor da célula pós-sináptica. Cada neurônio sintetiza apenas um tipo de neurotransmissor, que fica armazenado nas vesículas, assim o potencial de ação que se propaga no sentido do axônio permitirá a entrada do cálcio após a do sódio, fazendo com que ocorra a exocitose do neurotransmissor. Após a liberação deste na fenda sináptica, ele irá Fisiologia 44 interagir de forma reversível com o receptor pós-sináptico, e posteriormente será degradado por enzimas específicas. Seus subprodutos difundem-se para fora da fenda juntamente com os neurotransmissores que não foram degradados, ou estes são recaptados para serem degradados e utilizados para ressíntese, no próprio neurônio. Cada célula pós-sináptica possui receptores que são específicos para cada neurotransmissor, e a interação entre eles resultará em um tipo de potencial pós- sináptico. Se o resultado dessa interação abrir os canais de sódio, despolarizando a membrana, promoverá um potencial de ação na célula, e é denominado potencial pós-sináptico excitatório (PPSE). Porém se forem abertos os canais de cloro e até mesmo apenas os de potássio, haverá uma hiperpolarização da membrana, que impede ou torna mais difícil a geração de um potencial excitatório, sendo esse o potencial pós-sináptico inibitório (PPSI). Nos arranjos sinápticos divergentes ocorre a passagem de informação de um único neurônio para vários outros neurônios, permitindo a amplificação da informação. Nas sinapses convergentes, um neurônio recebe informação de terminais axônicos de vários neurônios, que podem estar transmitindo PPSE ou PPSI, e a somação desses potenciais determina qual resposta pós-sináptica irá ocorrer. A somação pode ser temporal, quando gerados de uma única sinapse, ou espacial, quando ocorrem de sinapses diferentes. A somação é fundamental para Fisiologia 45 que o limiar excitatório da célula seja atingido, pois de acordo com a lei do tudo ou nada, o estímulo tem que ser suficiente para que o potencial de ação ocorra e se propague pela fibra nervosa, e uma vez conseguida a resposta de despolarização, ela será igual, mesmo que aumente a frequência ou a intensidade do estímulo. Divisão funcional do SN - princípios gerais Nosso estudo será baseado na anatomia e no funcionamento do sistema nervoso, procurando focar principalmente a divisão funcional. Abaixo, seguem tabelas ilustrativas das duas divisões didáticas Tabela 2.1- Divisão Anatômica do SN SN SNC Encéfalo Cérebro Cerebelo T. encefálico Mesencéfalo Ponte Bulbo Medula espinhal SNP Nervos Espinhais Cranianos Gânglios Terminações nervosas Adaptado da tabela 14.1 Singi (pag.132) Tabela 2.2 - Divisão funcional do SN SN SN Somático(Voluntário) Aferente Eferente (motor) SN Visceral (Involuntário) Aferente Eferente (autônomo) Simpático Parassimpático Adaptado da tabela 14.3 Singi (pag.132) Os nervos são estruturas formadas por fibras nervosas (axônios), que podem ser de neurônios aferentes ou sensitivos (quando trazem a informação para o sistema nervoso central); e eferentes ou motoras (quando levam a informação para Fisiologia 46 o órgão efetor), desta maneira formam os nervos sensitivos (apenas fibras sensitivas), os motores (apenas fibras motoras) e os mistos (fibras sensitivas e motoras). No SNC existem ainda os interneurônios ou de neurônios associação, que são responsáveis em integrar diferentes partes e seguimentos do SNC, e estão em maior número. Vamos refletir! Em relação ao seu corpo. Qual é o único seguimento que podemos movimentar de forma voluntária? Certamente é o músculo esquelético. Não temos controle consciente do funcionamento do nosso coração, da transpiração, dos vasos sanguíneos, nem mesmo dos movimentos peristálticos do trato digestório. Portanto, o sistema nervoso somático é segmento relacionado às respostas voluntárias, conscientes, que realizamos com os nossos músculos esqueléticos; já o visceral, também chamado de autônomo, é responsável pelas respostas involuntárias, ou seja, que ocorrem independente da nossa consciência, e está relacionado ao funcionamento dos músculos lisos, cardíaco e das glândulas. Fisiologia 47 Divisão funcional do SN - vias aferentes (sensitivas) O trabalho do SNC é baseado nas informações recebidas pela via sensorial (aferente), sendo os receptores a estrutura responsável por captar as variações do meio em que se encontram (seja no ambiente interno ou externo do nosso corpo), e quando são ativados eles transformam o estímulo em potenciais de ação no neurônio sensitivo, que irá conduzir a informação para centros nervosos (regiões específicas do SNC) onde serão processadas e integradas, resultando nas sensações que poderão promover respostas eferentes, sejam elas somáticas ou viscerais. Os receptores apresentam especificidade quanto ao tipo de estímulo que é capaz de ativa-los. Observe a tabela abaixo que mostra a classificação, o estímulo, e as sensações envolvidas. Tabela 2.3 - classificação dos receptores - especificidade Classificação Estímulo Sensação Mecanorreceptores Deformação mecânica Tato cutâneo, audição, equilíbrio e pressão arterial Termorreceptores Variação de temperatura Frio e calor Nociceptores Fortes estímulos Dor Eletromagnéticos (fotossensíveis) Variação de ondas luminosas Visão Quimiorreceptores Substâncias químicas Olfato, paladar, concentração dos gases no sangue, osmolaridade, concentração de glicose... Outra classificação está relacionada com a via sensitiva que o receptor participa. Proprioceptores: localizados nos músculos, ligamentos, capsulas articulares e tendões. Participam da via proprioceptiva que pode ser consciente ou Fisiologia 48 inconsciente. A consciente é capaz de localizar as partes do nosso corpo e perceber os movimentos que fazemos sem o auxílio da visão. A inconsciente informa ao SNC o grau de distensão muscular e articular para que os movimentos musculares esqueléticos possam ser ajustados. Interoceptores: localizados em vísceras e vasos sanguíneos. Estão envolvidos na interocepção, que também pode ser consciente ou não. As sensações conscientes viscerais são as de dor, que podem ser causadas por deficiência sanguínea ou distensão, por exemplo; e as sensações orgânicas, como as do apetite, da sede e da repleção de bexiga, sendo assim responsáveis para indicar uma necessidade orgânica para que possamos satisfazê-la, como nos alimentarmos, bebermos água, eliminarmos a urina e assim por diante. Já as inconscientes como as relacionadas com a percepção da osmolaridade, pressão arterial, composição de gases respiratórios e pH, são utilizadas para ajustar os sistemas orgânicos, garantindo a homeostasia. Exteroceptores: localizados na superfície do corpo e estão relacionados às sensações conscientes de temperatura, luminosidade, som, dor, olfato, paladar, entre outras. As percepções visuais, auditivas, gustativa, olfativas, táteis e de dor ocorrem baseadas nas estimulações de receptores específicos, que pela via aferente conduzem as informações para os respectivos centros nervosos, onde são interpretadas e associadas a outras informações. O seguimento aferente somático é responsável por conduzir principalmente informações proprioceptivas que permitem a integração do organismo com o meio ambiente, cujas respostas eferentes são realizadas pelos movimentos musculares esqueléticos, que ocorrem de forma voluntária, por meio de movimentos precisos. O aferente autônomo está relacionado a informações que permitem os ajustes viscerais independentes de nossa vontade, controlando o funcionamento do músculo cardíaco, liso e glândulas, sendo o sistema da vida vegetativa ou autonômica. A sua porção eferente é dividida em respostas simpáticas e parassimpáticas. Fisiologia 49 Divisão funcional do SN - vias eferentes (autônoma e motora) O segmento somático (motor) está relacionado ao controle voluntário que é possível ocorrer nos músculos esqueléticos. Os neurônios motores têm origem no SNC e levam a informação diretamente para cada fibra muscular esquelética, assim cada neurônio é responsável pela contração de um número determinado de fibras, e esse conjunto formado pelo neurônio motor e as fibras que ele inerva é chamado de unidade motora. Quando o neurônio motor é ativado resulta na liberação do neurotransmissor acetilcolina na placa motora, região da fibra muscular onde estão localizados os receptores para a acetilcolina, que são específicos para ela, os receptores colinérgicos nicotínicos. Na sinapse da junção neuromuscular (entre o terminal sináptico e a placa motora), o potencial pós- sináptico é sempre excitatório, isso quer dizer que a interação da acetilcolina no receptor nicotínico irá gerar na fibra muscular um potencial de ação, que conduzirá os eventos que resultarão na contração muscular. É na junção mioneural que ocorre a degradação da acetilcolina pela enzima acetilcolinesterase. Os órgãos efetores de respostas autônomas são inervados, na maioria das vezes, pelas duas divisões, simpática e parassimpática. Essa dupla inervação permite o controle do funcionamento do órgão efetor, onde uma predomina sobre a outra, dependendo da situação. O parassimpático é mais ativo nas situações de repouso, digestão e micção, e o simpático durante as atividades físicas e estados emocionais. Na maioria das vezes os efeitos são antagônicos, mas em alguns sistemas trabalham de forma sinérgica (um ajudando o outro), como na produção de saliva e no ato sexual masculino (parassimpático promove a ereção e o simpático a ejaculação) e sempre com o mesmo objetivo que é a manutenção da homeostasia. Alguns sistemas podem receber apenas um tipo de inervação, como o vascular. Fisiologia 50 Cada via eferente autônoma é formada por dois neurônios que fazem sinapse fora do SNC, em gânglios nervosos, os simpáticos localizam-se próximos à coluna vertebral, e os parassimpáticos próximo ou no próprio órgão efetor. O primeiro neurônio (pré-ganglionar) nas duas vias tem origem no SNC (em regiões diferentes) e libera o neurotransmissor acetilcolina na fenda sináptica ganglionar, que irá interagir no receptor colinérgico nicotínico presente no segundo neurônio (pós- ganglionar), e esse por sua vez faz sinapsecom o órgão efetor (músculo cardíaco, liso e glândulas), sendo que o neurotransmissor liberado depende da via que o neurônio pertence. Os neurotransmissores da via simpática são a adrenalina e a noradrenalina, que interagem em receptores adrenérgicos do tipo α e β, dependendo do tecido. A via parassimpática libera acetilcolina, sendo o receptor colinérgico muscarínico. As respostas da via simpática e parassimpática estão relacionadas a funções vegetativas (autônomas) para manutenção da homeostasia, sendo que o seguimento simpático é capaz de promover uma resposta generalizada, denominada reação de alarme em situações de estresse, emocionais e atividade física. Essa resposta só é possível, pois a via simpática estimula a região medular da glândula suprarrenal (adrenal) a liberar a adrenalina direto na corrente sanguínea, Fisiologia 51 esta, por sua vez, será distribuída por todo o nosso corpo, interagindo em todos os receptores adrenérgicos. A via simpática também é chamada de sistema de luta e fuga, resultando de forma geral no aumento da pressão sanguínea, do metabolismo celular e da glicose. Tentem imaginar uma pessoa fugindo de uma situação de perigo... agora vamos associar à resposta generalizada da reação de alarme: Vasoconstrição cutânea → palidez. Vasodilatação muscular → mais sangue para os músculos, pois eles irão desenvolver a atividade de fuga. Aumento da frequência cardíaca → maior volume de sangue circulando para atender a demanda corporal. Dilatação da árvore traqueobrônquica → maior ventilação pulmonar, com melhor oxigenação do sangue. Diminuição do peristaltismo intestinal, relaxamento do músculo da bexiga e contração dos esfíncteres uretral e retal internos → evita a eliminação de fezes e urina. Piloereção → arrepiar como um gato assustado! Sudorese → com suor frio nas extremidades. Dilatação da pupila e acomodação da visão à distância → melhora a percepção visual. As respostas vegetativas, simpática e parassimpática, estão esquematizadas na figura 2.11. Função integrada do SN - atos reflexos As respostas realizadas pela via eferente motora e autônoma (principalmente) podem ocorrer por mecanismos reflexos. Um ato reflexo significa uma resposta automática e ou inconsciente realizada por um órgão efetor mediante um estímulo, e eles podem ser organizados em categorias, como: Encefálicos ou medulares, de acordo com a origem. Fisiologia 52 Somáticos ou autônomos, de acordo com a via eferente envolvida. Inatos (nascem conosco) ou condicionados (temos que aprender). Monossinápticos (dois neurônios e uma sinapse) ou polissinápticos (mais de dois neurônios e várias sinapses). Agora iremos descrever alguns reflexos, lembrando que eles são agrupados em todas as categorias acima descritas. 1. Reflexo de estiramento. É a contração involuntária de um músculo após seu estiramento. Pode ser exemplificado pelo reflexo patelar, que ocorre com a percussão no tendão patelar, que resulta na contração do músculo quadríceps femoral. É o único monossináptico conhecido no homem, sendo denominado de arco reflexo, sendo inato, somático e de origem medular. 2. Reflexo de estiramento inverso. É o relaxamento involuntário de um músculo esquelético quando seu estiramento é muito intenso, sendo uma forma de proteção para evitar lesões no tendão ou no músculo que está Fisiologia 53 sendo contraído. Acontece quando pegamos um objeto mais pesado do que nossa capacidade de força, assim suportamos por um período, depois a força cessa repentinamente e largamos o objeto. Pode ser enquadrado na mesma categoria anterior, exceto por ser bissináptico. 3. Reflexo de retirada. É a contração que ocorre simultaneamente ao relaxamento de músculos esqueléticos flexores e extensores, respectivamente, na tentativa de afastar um segmento do corpo do local de um estímulo nocivo ou doloroso. É o que fazemos quando pisamos em um prego ou encostamos a mão em uma superfície quente. Também pode ser enquadrada na mesma categoria dos anteriores, exceto por ser polissináptico, o que nos permite tomar consciência da dor. 4. Reflexo pupilar. É a constrição da pupila com o estímulo luminoso. Este reflexo é inato, encefálico, autônomo e polissináptico. 5. Reflexo visceral. É a resposta de uma via autônoma mediante estímulo, como acontece com a produção de saliva quando pensamos em um alimento ou sentimos seu cheiro. Ele é encefálico, autônomo, polissináptico e condicionado, pois a salivação está relaciona a alimentos que gostamos. Existem os inatos, que estão relacionados ao controle da frequência cárdica, por exemplo. Fisiologia 54 Função integrada do SN - coordenação dos movimentos Cada movimento que executamos envolve uma série de eventos aferentes, eferentes e integrativos entre regiões encefálicas. O cerebelo é uma das estruturas fundamentais para a coordenação dos movimentos voluntários, pois recebe do córtex cerebral motor a intenção do movimento, das vias proprioceptivas o posicionamento do corpo, da visão o posicionamento espacial, além de outras informações, coordenando e uniformizando os movimentos para serem precisos, sejam eles suaves ou bruscos; rápidos ou lentos; fortes ou fracos. A regulação do equilíbrio e da postura corporal envolve tanto o cerebelo como o aparelho vestibular. Este segundo está situado no ouvido interno (labirinto) e é responsável por informar a movimentação e a posição da cabeça, que juntamente com informações proprioceptivas permite ao cerebelo coordenar as correções necessárias para manutenção correta da postura e do equilíbrio. Uma inflamação no labirinto (labirintite) conduz informações imprecisas para o cerebelo, dificultando o equilíbrio. Muitos dos movimentos voluntários não dependem de aprendizado, como os que permitem o choro, a sucção e a deglutição, porém outros necessitam de ser aprendidos, como andar, dançar, tocar um instrumento, alcançar um objeto. E depois de aprendidos são executados de forma automática, ou seja, fazemos sem ter necessidade de ficar "calculando" exatamente o que e como devemos nos movimentar. Fisiologia 55 Função integrada do SN - regulação da temperatura corporal O controle da temperatura corporal é realizado por centros nervosos localizados no hipotálamo, o de perda de calor e o de promoção de calor, que atuam como termostato, ajustando a temperatura de acordo com necessidade, mantendo o interior do corpo na faixa de 37°C. Sendo assim, quando os termorreceptores, que estão distribuídos por todo o corpo, registram a variação da temperatura, os centros hipotalâmicos são informados, e irão promover respostas de ajuste. As variações registradas pelos termorreceptores da pele permitem que tomemos medidas apropriadas para evitarmos variações na temperatura interna, como vestir agasalhos quando sentimos frio. Já as variações registradas na temperatura interna, causada por fatores externos (frio ou calor intenso) ou internos (alteração metabólica, exercício físico, entre outros) requisitam interferência dos centros termorreguladores. A diminuição da temperatura interna ativa o centro de promoção de calor, promovendo respostas como: diminuição do fluxo sanguíneo para pele (evitando a perda de calor para o ambiente); tremores musculares (contrações musculares produzem calor); aumento do metabolismo celular (estimulado principalmente pelo hormônio da tireoide, que é um hormônio termogênico), aumento do apetite (obtenção de nutrientes para o metabolismo e geração de calor pelo processo digestório)e piloereção (forma uma camada de ar entre o pelo e a pele, conservando calor). Por outro lado, se for registrado um aumento na temperatura interna, o centro de perda de calor irá aumentar o fluxo sanguíneo para pele, que junto com a sudorese favorece a perda de calor para o ambiente, o aumento da respiração (perda de calor pelo ar expirado), a diminuição do apetite e do metabolismo celular. Fisiologia 56 Função integrada do SN - regulação da alimentação A sensação de fome indica necessidade de nos alimentar, e é percebida pelo aumento das contrações gástricas (por isso sentimos fome no "estômago") e inquietação, que motiva a ingestão de alimentos, sendo diferente de apetite, que indica uma vontade específica do alimento a ser ingerido. Quando suprimos a necessidade do organismo de nutrientes (principalmente de glicose) ou ocorre a repleção gástrica (que é mais tardia), temos a sensação de saciedade. Essas sensações são controladas principalmente pelo hipotálamo, por mecanismos ainda não bem esclarecidos, e também são influenciadas por fatores ambientais e culturais. Estudos têm demonstrado a existência de dois centros nervosos envolvidos na regulação da ingestão de alimentos, o da fome e o da saciedade, onde o primeiro é sempre ativo, sendo inibido quando o segundo é ativado pela ingestão de alimentos. Uma das hipóteses de regulação seria a glicostática, que é baseada na existência de células sensíveis a glicose (glicostatos) no centro de saciedade. Quando a concentração de glicose nessas células está baixa, o centro para de inibir o da fome, e quando está elevada, o inibe, fazendo com que o indivíduo pare de comer. Existem hipóteses semelhantes relacionadas aos aminoácidos (aminostática) e de lipídios (lipostática). É reconhecido que as células adiposas secretam um hormônio chamado leptina, e quando ocorre um aumento do tecido adiposo a quantidade de leptina liberada também aumenta, estimulam o centro da saciedade, regulando em longo prazo, a ingestão de alimentos. Os centros hipotalâmicos também respondem a hormônios, como os da tireoide e as catecolaminas, que aumentam o metabolismo basal das células; a insulina e o glucagon, que regulam a glicemia (concentração de glicose no sangue); e a colecistocinina, hormônio produzido pelo intestino delgado (duodeno) que tem sua secreção aumentada na presença de gordura no alimento. Fisiologia 57 Distúrbios relacionados aos controles da fome e saciedade são responsáveis pela obesidade e pela anorexia. Função integrada do SN - regulação da ingestão de agua A sensação de sede é percebida como "secura na boca", indicando uma necessidade orgânica. O controle da ingestão de água é realizado pelo centro da sede (no hipotálamo), que pode ser ativado devido à variação da osmolaridade dos líquidos extracelulares, quando a perda de água é maior do que a obtenção ou por excesso de soluto, como o sódio, provocando a desidratação das células no centro da sede, na boca e no estômago, sendo percebida por osmorreceptores (receptores que percebem variação da osmolaridade); ou quando ocorre diminuição no volume desse líquido, o que envolve barorreceptores (receptores de pressão). A informação é conduzida ao centro da sede, que promove a vontade de ingestão de água ao mesmo tempo em que desencadeia respostas orgânicas para retenção de líquidos, ou seja, que diminuem a diurese. Dessa forma o plasma e o meio intercelular são reequilibrados. Fisiologia 58 Função integrada do SN - sono O sono consiste em uma necessidade orgânica justificada por diversas teorias, como as baseadas na função restauradora das atividades corporais e imunológica, na conservação de energia, no armazenamento de memórias e na organização de pensamentos. Independente da teoria é sabido que a privação do sono desencadeia confusão mental e distúrbios orgânicos e imunológicos. O estado de sono é definido como uma diminuição (mas não ausência) da atividade motora e de percepção quando comparado com o estado de vigília (quando estamos acordados). Existe uma alternância entre o estado de sono e de vigília, onde o tempo necessário de sono varia individualmente, sendo maior para bebês (mínimo de 17 horas) e menor para idosos (5 horas), e em média de 8 horas para adultos. Os adolescentes são menos alerta de manhã cedo e mais alerta durante a tarde e a noite. Apesar de não totalmente esclarecido como se estabelece o ciclo sono/vigília, já foi percebido a participação de alguns mediadores químicos em determinadas regiões encefálica envolvidas nesse processo, como a acetilcolina, noradrenalina, dopamina, histamina e atualmente o peptídeo orexina. Fisiologia 59 Função integrada do SN - sistema límbico Esse sistema consiste em várias estruturas encefálicas, inclusive o tálamo e o hipotálamo, e é responsável pelas respostas emocionais, aprendizado, e memória. As emoções são desencadeadas por informações sensoriais e pela recordação, promovendo respostas orgânicas, como alterações na frequência cardíaca, na pressão sanguínea, no apetite e no sono, assim como motoras e hormonais. Elas também estão relacionadas com as motivações pessoais (impulsos que direcionam nossas ações), como as necessidades fisiológicas (fome, sede e sexo) ou compensatórias. A emoção que produz maior motivação é o prazer, pois o estado encefálico de euforia motiva a repetição do que desencadeou essa emoção. A aprendizagem é um processo contínuo, tem início na infância e consiste na aquisição de novas informações e habilidades (andar, falar, tocar instrumentos...). A conservação do que aprendemos consiste na memorização, inicialmente em curto prazo (duração de segundos ou minutos), que necessita ser consolidada para tornar-se de longo prazo (anos e até mesmo a vida toda). Estudos demonstram que a consolidação pode ocorrer pela associação da informação a outros eventos (músicas, cheiros, fotos...) ou pela repetição (varias leituras do mesmo assunto e treinamento). Consequentemente, o sistema límbico está relacionado à nossa personalidade e nossas lembranças, e é ele que faz "sermos exatamente como somos". Fisiologia 60 3ª PARTE: Fisiologia muscular As células musculares são células excitáveis, assim como os neurônios. Isso significa dizer que são capazes de alterar a condição do potencial de membrana, gerando potenciais de ação, mas diferem desses, pois a consequência do estimulo elétrico não é a passagem de informação, e sim a contração muscular. Em nosso corpo podemos encontrar dois tipos de células musculares, as lisas, que formam os músculos lisos e as estriadas, que formam os músculos esqueléticos e o cardíaco. Essa classificação é baseada no aspecto microscópico das células, onde as estriadas apresentam uma alternância de faixa clara e escura devido à organização das miofibrilas (proteínas envolvidas na contração muscular) em sarcômeros. As células lisas não apresentam este padrão de estriamento, pois suas miofibrilas estão fixadas em estruturas dispersas no citoplasma e na membrana, os corpúsculos densos. Nosso estudo será baseado no músculo esquelético, e depois as informações serão aplicadas para o entendimento do funcionamento do liso e cardíaco. Fisiologia 61 Músculo esquelético A musculatura esquelética está sob controle voluntário do indivíduo, sendo estimulada pela via aferente somática do sistema nervoso, podendo ser denominada de musculatura somática. Essa segunda denominação seria maisapropriada, pois nem todo músculo esquelético está relacionado com o esqueleto, podendo ser encontrados conectados à pele da face, à cartilagem da laringe e formando os esfíncteres anal e uretral (que controlam, de forma consciente, a eliminação de fezes e urina, respectivamente). Durante a embriogênese os mioblastos (células precursoras) se fusionam, formando a fibra muscular, que perde a capacidade de multiplicação. O número de células é mantido após o nascimento, e a regeneração nesse tecido é possível graças às células satélites (alguns mioblastos que persistem no músculo maduro) que são capazes de fusionar com fibras lesadas ou entre si. As fibras musculares esqueléticas são multinucleadas, longas e estão fixadas ao periósteo do osso por meio dos tendões, que são prolongamentos de tecido conjuntivo (epimísio, perimíso e endomísio) que formam a fascia profunda dos músculos. O aspecto estriado permite identificar o sarcômero, que é a unidade funcional da fibra e corresponde ao espaço compreendido entre duas linhas Z (linha escura dentro da faixa clara). É onde as proteínas envolvidas na contração estão organizadas, as principais são a actina e a miosina, que formam os filamentos finos e grossos, respectivamente. Como a membrana celular (sarcolema) invagina em cada extremidade do sarcômero, formando os túbulos T, é possível identificar uma tríade, formada pelo túbulo T e as duas cisternas do retículo sarcoplasmático (equivale ao endoplasmático, onde o íon cálcio é armazenado) com os seus prolongamentos que se comunicam (túbulos L). Observe a figura 2.20. Fisiologia 62 Sendo o estímulo suficiente para desencadear um potencial de ação na fibra, ele é propagado pelo túbulo T, estimulando a liberação do cálcio do retículo sarcoplasmático para o sarcoplasma (equivale ao citoplasma), que irá interagir com a troponina (proteína muscular esquelética), dando início a contração que é resultante da aproximação das linhas Z, ou seja, do encurtamento do sarcômero, com consumo de energia. Cada estímulo irá liberar sempre a mesma quantidade de cálcio, com a formação de certo número de pontes cruzadas (ligação de actina e miosina), assim, uma vez desencadeado o estímulo, ele provocará a mesma resposta máxima na fibra, isso é a lei do tudo ou nada. Quanto mais estímulos forem dados à fibra mais cálcio é liberado, mais pontes são formadas e mais força cada fibra é capaz de realizar. Para que ocorra o relaxamento o cálcio é removido do sarcoplasma, pela bomba de cálcio (transporte ativo), retornando para as cisternas, mantendo a sua concentração no sarcoplasma muito baixa. Percebemos, assim, que tanto a contração quanto o relaxamento necessitam de energia para ocorrer. A fonte de energia é o ATP, sendo a fosfocreatina a primeira a ceder o fosfato para o ADP, passando para forma de creatina, só depois ocorre a utilização do ATP formado a partir da glicose, lipídeos e até mesmo dos aminoácidos. Parte dessa energia liberada pelo ATP para realização da contração/relaxamento é dissipada na forma de calor, que é utilizado para manutenção da temperatura corporal. Fisiologia 63 A transmissão do impulso nervoso ocorre através do neurônio motor, que apresenta na ramificação dos terminais axônicos, os botões terminais, ficando esses acomodados em depressões da membrana da fibra muscular (placa motora) formando a junção mioneural ou neuromuscular. É nessa sinapse que ocorre a liberação da acetilcolina que irá interagir com o receptor nicotínico da placa motora, desencadeando na fibra muscular o potencial de ação. Logo após a ação na sinapse, a acetilcolina é rapidamente degradada pela enzima acetilcolinesterase, interrompendo seu efeito. Nos músculos esqueléticos ocorre a formação de unidades motoras, que corresponde ao neurônio motor e as fibras que ele inerva, sendo assim, um músculo é formado por várias unidades motoras, e o potencial de ação em um neurônio motor irá desencadear a contração de todas as fibras relacionadas a ele. A importância dessas unidades é determinar a precisão do movimento, ou seja, quanto menos fibras musculares formarem a unidade, mais o movimento é preciso, como ocorre na laringe, sendo também relacionada à força que o músculo exerce, sendo maior quanto mais unidade forem ativadas. Fisiologia 64 Quando o músculo gera força e seu comprimento não altera, dizemos que está ocorrendo uma contração isométrica. Por exemplo, quando seguramos um objeto sem levanta-lo, nesse caso a força exercida pelo músculo equivale à mesma força realizada pelo do peso do objeto, apenas em sentido contrário. Mas quando movimentamos o objeto para cima ou para baixo alterando o comprimento, a contração é isotônica, que pode ser concêntrica quando o músculo encurta (levantar o objeto), ou excêntrica quando o músculo aumenta o comprimento (abaixar o objeto), sendo a força que ele exerce diferente da exercida pelo peso do objeto. Quando os músculos estão em repouso, algumas unidades motoras revezam sua atividade, mantendo assim um grupo de fibras contraídas, o que determina o tônus muscular, que é a tensão (força) parcial presente na condição de repouso. Um músculo pode entrar em fadiga quando realiza atividade por tempo prolongado ou uma contração vigorosa, pois o consumo energético torna-se maior do que a capacidade de restaura-lo, diminuindo a atividade neural na junção neuromuscular. Devido ao grande consumo de oxigênio, a fadiga pode progredir para câimbra, onde ocorrem contrações sucessivas, sem que haja tempo de relaxamento para reposição de oxigênio, logo de ATP. Quanto mais treinado for o atleta, maior a sua capacidade de realizar o trabalho muscular com menor consumo de oxigênio, pois as fibras adaptam-se ao trabalho exigido, aumentando o número de constituintes celulares para realiza-lo com maior eficiência. Fisiologia 65 Músculo liso Os músculos lisos são formados por células fusiformes com núcleo central e único, não apresentando o mesmo padrão estriado das células esqueléticas e cardíacas, sendo suas miofibrilas organizadas pelos corpúsculos densos. A distribuição desses pela membrana e no citoplasma, em posição fixa, permite que a contração da célula ocorra em vários eixos. São encontrados principalmente nos órgãos internos e nos vasos sanguíneos, e não estão sujeitos ao controle voluntário do indivíduo, para que ocorra sua contração. A organização das células e o padrão de inervação permite classificar os músculos lisos em dois tipos, os unitários (ou viscerais) e os multiunitários (ou de unidades múltiplas). Os multiunitários são formados por células independentes, sendo cada uma controlada por terminações nervosas individuais, formando unidades motoras, como nos músculos esqueléticos. Cada neurônio da via autônoma (simpática ou parassimpática) é responsável pela regulação de um número determinado de células. Estes são encontrados nas grandes artérias, vias respiratórias, músculo ciliar do olho (controla a abertura e fechamento da pupila) e nos músculos piloeretores, Fisiologia 66 locais onde as circunstancias de funcionamento necessitam de maior ou menor número de células ativadas. Nos unitários, as células estão unidas por junções comunicantes, sendo pequena a presença de terminações nervosas autônomas, que não ocorrem em todas as células e o neurotransmissor é liberado no líquido intercelular, atingindo apenas em um grupo de células. As junções comunicantes permitem a formação de um sincício funcional, ou seja, o potencial de ação de uma célula é propagado para outra, resultandona contração de todo grupamento muscular. Esse tipo de músculo é encontrado formando a musculatura oca das vísceras, como no trato gastrintestinal, útero, ureteres e vias biliares. A elevação da concentração de cálcio no mioplasma (citoplasma) também é o evento responsável pela contração, sendo que a membrana celular apresenta permeabilidade aumentada também para esse íon, além do sódio, quando o potencial de ação é gerado. Assim o cálcio para a contração da célula lisa é proveniente, inicialmente, do retículo sarcoplasmático sendo acrescido com cálcio extracelular. Nesse tipo de célula encontramos a calmodulina (proteína semelhante à troponina do esquelético), que interage com o íon favorecendo a ligação da Fisiologia 67 ponte cruzada e o encurtamento da célula. A contração no músculo liso ocorre com pouco gasto de energia, podendo ser tônica e prolongada. Para o relaxamento, o cálcio é devolvido para o retículo e para o meio extracelular pela bomba de cálcio (transporte ativo). Alteração do potencial de membrana na musculatura lisa pode ser de origem neural, onde ao simpático libera noradrenalina e o parassimpático, acetilcolina; o potencial desencadeado pode ser excitatório ou inibitório. Vai depender do neurotransmissor e do receptor ativado. Importante! É importante lembrar que dependendo do grupamento muscular ativado, a contração ou o relaxamento pode ser promovido por uma ou outra via aferente autônoma, ou seja, nem sempre o simpático contrai e o parassimpático relaxa. Por exemplo, o parassimpático é quem controla a micção, contraindo o músculo da bexiga e relaxando o da uretra, e o simpático relaxa o primeiro e contrai o segundo. Potenciais também podem ser gerados por estímulos diferentes dos neurais, que seriam os causados por hormônios, como a gastrina que promove contração gástrica; ou fatores locais como variação do pH, da concentração de oxigênio ou do gás carbônico sobre a musculatura lisa vascular, da temperatura e das concentrações iônicas. Algumas células, como as do intestino, podem sofrer despolarizações espontâneas, que podem ser seguidas ou não de potenciais de ação, sendo influenciadas pelo sistema nervoso autônomo. Fisiologia 68 Músculo cardíaco O músculo cardíaco forma a massa muscular do coração, sendo o responsável pelo bombeamento do sangue e pelo sistema circulatório. Como esse sistema será apresentado na próxima unidade, faremos apenas uma breve apresentação, para aprofundarmos quando formos estudar o sistema circulatório. Neste grupamento muscular, as células apresentam semelhança com a esquelética, pela organização em sarcômeros das miofibrilas (dando o aspecto estriado), por serem alongadas e por apresentarem até dois núcleos; e se assemelham a lisa na formação de sincícios por meio de discos intercalares (dobras da membrana que estão unidas a dobras de membranas adjacentes), formando uma trama de células musculares, unidas fortemente, permitindo a ativação elétrica em massa, resultando na contração simultânea do sincício. O mecanismo de contração é semelhante a da fibra esquelética, sendo que nas cardíacas o reticulo sarcoplasmático não forma cisternas, e, apesar dos túbulos T possuírem um diâmetro maior, a quantidade de cálcio armazenado é menor, sendo necessário o acréscimo de cálcio extracelular, que entra durante o potencial de ação, para que a contração ocorra. Para que ocorra o relaxamento, o cálcio é bombeado para o meio extracelular e para o retículo sarcoplasmático. Fisiologia 69 O controle da contração do miocárdio é involuntário, sendo regulado por um sistema miogênico (de origem em algumas células cardíacas) e um neurogênico (de origem no sistema nervoso autônomo). Algumas propriedades podem ser aplicadas às fibras cardíacas, vejamos: Cronotropismo → é a frequência de contração em uma determinada unidade de tempo. Inotropismo → é a força com que a fibra contrai, estando relacionada à quantidade de cálcio livre no citoplasma. Dromotropismo → é a condutibilidade do potencial de ação na fibra. Batmotropismo → e a excitabilidade de cada fibra. Essas propriedades podem ter caráter positivo ou negativo. Por exemplo, a estimulação simpática aumenta a frequência e a força de contração, resultando em cronotropismo e inotropismo positivo, e o parassimpático por diminuir a frequência e a força, promove efeitos negativos sobre as propriedades referidas. Aprofunde o seu conhecimento dos conteúdos abordados nessa unidade: STANFIELD, Cindy L., Fisiologia Humana – 5. ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2013. Cap. 7 - Célula nervosa e sinalização elétrica; cap. 8 - Transmissão sináptica e integração neural; cap. 9 - Sistema nervoso: sistema nervoso central; cap. 10 - Sistema nervoso: sistemas sensoriais; cap. 11 - Sistema nervoso: sistema autônomo e motor; cap. 12 - Fisiologia muscular. SINGI, Glenan. Fisiologia Dinâmica. 2.ed. São Paulo: Atheneu, 2007; cap. 3 - Eletrofisiologia Celular; cap. 4 - Célula Nervosa; cap. 5 - Células Musculares; Cap. 14 - Sistema Nervoso Central; cap. 15 - Sistema Nervoso Autônomo. É hora de se avaliar Lembre-se de realizar as atividades desta unidade de estudo. Elas irão ajudá-lo a fixar o conteúdo, além de proporcionar sua autonomia no processo de ensino-aprendizagem. Fisiologia 70 Exercícios - unidade 2 1. Analise as afirmativas sobre células excitáveis, e assinale a correta. a) Todas as células do corpo são células excitáveis. b) A despolarização da membrana ocorre pelo influxo de sódio e potássio, causando um potencial de ação. c) Os potenciais inibitórios são determinados pelo influxo de potássio. d) A organização iônica, que é realizada pela bomba de sódio-potássio, é importante para manter a excitabilidade da célula. 2. Sendo o neurônio a unidade funcional da célula, é correto afirmar que sua função consiste em: a) Causar potenciais excitatórios sempre que sofre potencial de ação. b) Liberar os neurotransmissores, pelos dendritos, causando potenciais pós- sinápticos em outra célula excitável. c) Transmitir informações por meio de neurotransmissores que são liberados em sinapses, que podem causar potenciais excitatórios ou inibitórios. d) Inibir contrações musculares esqueléticas, por meio da acetilcolina. 3. Na divisão funcional do sistema nervoso podemos afirmar que: a) As vias aferentes levam a informação para os órgãos efetores. b) A via eferente autônoma é dividida em simpático e parassimpático. c) O sistema nervoso somático e o autonomo são controlados de forma consciente. d) Os receptores são estruturas relacionadas às vias eferentes. Fisiologia 71 4. Quanto as vias aferente, é incorreto afirmar que: a) Os receptores relacionados às sensações apresentam especificações quanto ao estímulo que são capazes de perceber. b) A via proprioceptiva conduz informação consciente que permite reconhecer nossos movimentos sem olhar para as partes do corpo. c) Todas as informações conduzidas pela via interoceptiva são inconscientes, pois estão relacionadas as vísceras d) As informações geradas pelas vias aferentes são conduzidas a centros nervosos específicos 5. Quanto às vias eferentes é correto afirmar que: a) O órgão efetor da via somática é o músculo esquelético e da autônoma são os músculos lisos, cardíaco e as glândulas. b) O neurotransmissor da sinapse neuromuscular é a acetilcolina que pode causar potenciais excitatórios ou inibitórios. c) O neurotransmissor da sinapse autônoma com o órgão efetor é acetilcolina e o receptor nicotínico.d) A via autônoma possui o mesmo neurotransmissor no neurônio pós- ganglionar. 6. Dentre os reflexos abaixo, assinale a alternativa que indica o único que não é somático: a) Estiramento. b) Retirada. c) Pupilar. d) Estiramento inverso. Fisiologia 72 7. Considerando as diversas vias integrativas do sistema nervoso, assinale a alternativa que apresenta uma afirmativa incorreta: a) Na coordenação dos movimentos ocorre a participação do cerebelo como coordenador do movimento a ser executado. b) Os termorreceptores periféricos (da pele) motivam mudanças conscientes como vestir agasalhos, e os internos modificam as respostas geradas pelos centros termorreguladores do hipotálamo. c) O centro da fome só está inativo quando o da saciedade o inibe. d) A sensação de secura na boca indica uma necessidade de repormos água, pois os termorreceptores indicam um aumento da osmolaridade no líquido extracelular. 8. O sistema responsável pela nossa personalidade e por sermos como somos é o sistema: a) Somático. b) Visceral. c) Hipotalâmico. d) Límbico. Fisiologia 73 9. Descreva a importância da formação de unidades motoras nos músculos lisos multiunitários e nos esqueléticos: ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 10. Explique a importância da organização de fibras musculares em sincícios funcionais, citando em quais músculos ocorre: ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________
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