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Natureza das previsões de demanda e estoques José Roberto Fornazza Segundo o Dicionário Aurélio, Demanda (Dev. de demandar) [...] 6. Econ. Procura. Demandar (do latim demandare) [...] 3. Ter necessidade de; precisar de; ne- cessitar. Demanda significa uma necessidade a ser atendida. Da demanda coletiva dos agentes do mercado, (o conjunto de consumidores e clientes para um produto), tem-se a necessidade total a ser atendida por um agente provedor (o fornecedor). As necessidades de mercado podem ser expressas diretamente pelos clientes e consumidores. Podem ser geradas por processos produtivos entre indústrias (ou na mesma indústria), ou trabalhadas entre os diferentes elos da cadeia de abastecimento (fornecedores, distribuidores, centros de distri- buição, clientes varejistas e atacadistas, consumidor final). Nesta aula vamos tratar da incerteza que está presente na geração da demanda, os diferentes padrões que a demanda pode apresentar, as técnicas mais comuns para o processo de previsão de vendas e como melhorá-la, o ciclo de vida dos pro- dutos, e o processo conhecido como S&OP (Sales and Operations Planning – Planejamento de vendas e operações) no mundo dos negócios. A incerteza e sua compreensão Um verso de um compositor popular brasileiro ilustra bem o que é a in- certeza quanto ao futuro: “Nada do que foi será, de novo, do jeito que já foi um dia” (Lulu Santos). Para o bom gerenciamento de estoques o estudo da demanda é com- ponente obrigatório, processo pelo qual clientes e consumidores ordenam, compram, repõe, substituem, abastecem, suprem suas necessidades para movimentar seu próprio negócio. 240 Natureza das previsões de demanda e estoques O ciclo de abastecimento requer consistência. O desempenho operacio- nal consistente é possível de ser conquistado através do estudo e entendi- mento das incertezas, e seu impacto no processo de apuração da demanda. Os principais agentes da incerteza, que precisam ser entendidos e trata- dos, na medida do possível, podem ser agrupados nas dimensões a seguir. A dimensão cenário econômico As empresas operam em cenários econômicos, que podem ser mais ou menos estáveis, dependendo dos seguintes fenômenos: inflação, flutuações de câmbio, tendências de depressão ou aceleração econômica, população, renda e PIB (Produto Interno Bruto), custos de capital (normalmente altos), custos de reposição, qualificação e disponibilidade de recursos humanos e, não menos importante, as regulamentações governamentais. Todos esses fenômenos criam cenários de maior ou menor incerteza nos negócios, que se traduzem nas previsões de demanda, ou estimativas de vendas, como são mais conhecidas no dia a dia. A dimensão base de clientes A clientela de uma empresa precisa ser compreendida e analisada, res- pondendo-se a perguntas cruciais tais como: Quantos clientes temos? � Quantos clientes pretendemos ter? � Quem são eles? Onde eles estão localizados? � Qual a participação percentual de cada um? � Como podemos classificá-los por canal de distribuição? � O que os clientes querem? � Como os competidores atendem suas necessidades? � Como foram as vendas passadas? � Natureza das previsões de demanda e estoques 241 A dimensão base de produtos Olhando para o próprio portfólio de produtos, uma empresa precisa também questionar-se sobre sua adequação ao negócio (quantos produtos necessitamos?), sua localização em relação aos clientes (onde eles estão?), a participação de cada um nas vendas e nos lucros, como funciona o ciclo de vida dos produtos, e qual o mix adequado para cada categoria de clientes. A dimensão processos produtivos Ainda olhando para seu próprio negócio, a análise da incerteza requer que se conheçam os processos produtivos. Trabalha-se com fluxo linear de produção, ou as produções são por � lotes predefinidos em quantidade? Os produtos podem ser produzidos por encomenda, ou apenas em � fluxo contínuo? O processo produtivo é arranjado em linhas de montagem, células de � manufatura, ou outra forma? O atendimento dos pedidos dos clientes obedece a que estratégia: � produção para atender os pedidos, à medida em que são recebidos (o make-to-order), ou produção para constituição de estoques regulado- res (o make-to-stock)? A dimensão fluxo de informações Um processo efetivo de tomada de decisões requer, a cada etapa da cadeia de abastecimento, uma clara definição das informações necessárias para análise e escolha de alternativas. As características das informações que vão fluir entre cada etapa da cadeia precisam ser perfeitamente entendidas pelos agentes de decisão. Padrões de demanda O que se espera de um produto é que ele permaneça no mercado pelo maior tempo possível. Isto apesar da corrente estratégia de mercado, de 242 Natureza das previsões de demanda e estoques profunda diversificação e customização de produtos, que buscam a criação de nichos de mercado, grupos de consumidores com necessidades muito específicas. As vendas dos produtos, ao longo do tempo, vão gerar padrões de de- manda, cujo tratamento possibilitará previsões de vendas e informação para os fornecedores construírem seus estoques, para melhor atender essa demanda. Para fins didáticos, os diferentes padrões de demanda podem ser agrupa- dos de acordo com a forma a seguir. Demanda regular É a demanda mais aplicável a produtos de consumo, com padrão de repe- tibilidade e frequência bastante alto. A diferença entre dados de um perío- do e outro, no tempo, deve-se a fatores aleatórios (a incerteza), combinados com as tendências. Dependendo do estágio do ciclo de vida do produto, a demanda pode ser regular, porém adicionada por uma tendência. Se o produto está nos es- tágios iniciais de sua presença no mercado essa tendência é positiva. Se, pelo contrário, aproxima-se o final de sua vida, esta tendência é declinante. Na dimensão tempo, um produto dificilmente tem uma única tendência. Em certos períodos, a demanda pode estar regular crescente, alternando com períodos de regularidade sem tendência, e assim por diante. Para complicar um pouco mais, a componente de sazonalidade atua também sobre os padrões de demanda regular, provocando, em longos pe- ríodos, tendências regulares compostas com sazonalidade. Um exemplo: as vendas de um produto achocolatado para crianças, em princípio, têm características de um padrão de demanda regular crescente (baseado no crescimento da população). No entanto, por ações de promo- ções próprias, ou de ações da concorrência, a demanda pode ter sua ten- dência de crescimento fortalecida ou atenuada. A variável temperatura (in- verno e verão, principalmente) adiciona uma componente de sazonalidade à demanda. Natureza das previsões de demanda e estoques 243 Nas ilustrações a seguir temos exemplos de padrões de demanda regu- lar e suas variações, sendo que nos eixos dos gráficos temos as quantidades consumidas (no eixo y) ao longo do tempo (eixo x). Tipos de demanda Demanda uniforme Demanda regular Demanda sazonal Qtde Qtde Qtde Tempo Tempo Cresc ente Estável Decrescente Tempo Jo sé R ob er to F or na zz a. A demanda regular levada ao limite é a demanda uniforme. Difícil de imaginar, num cenário econômico influenciado por tantos agen- tes (governo, consumidores, clientes, concorrência, taxa de câmbio, promo- ções etc.), a situação em que um produto é consumido a uma taxa constante, com mínimas variações ao longo do tempo, como mostra uma das ilustra- ções anteriores. Porém, isso é perfeitamente possível em algumas situações. Isso ocorre normalmente em processos longe da atuação do consumidor individual, o grande introdutor das variáveis nos padrões de demanda. E é bastante frequente em processos industriais que não podem ser interrom-pidos. Há processos de manufatura, normalmente com o uso de fornos de alta temperatura, ou reatores químicos, cuja parada acarretaria prejuízos de grande monta, seja pela limpeza necessária, seja pelos materiais em proces- sos destruídos ou danificados, seja pelo tempo demandado para retornar a operação ao seu fluxo normal. Um exemplo disso é a indústria do vidro. A demanda pelas garrafas pro- duzidas obedece aos padrões já citados de regularidade, com tendências e tudo mais. Porém, a produção das garrafas precisa ser absolutamente unifor- me, linear ao longo do tempo, pois o forno não pode parar por longos perí- odos de tempo. Dessa forma, os ingredientes para a produção das garrafas (areais principalmente), tem demanda absolutamente contínua, uniforme. As garrafas também serão produzidas em taxas uniformes mas, como não serão consumidas pela indústria de cerveja, por exemplo, a taxas uniformes, deverão ser armazenadas por algum tempo até sua utilização. 244 Natureza das previsões de demanda e estoques Demanda irregular Há diferentes circunstâncias que geram padrões de demanda comple- tamente irregulares, de difícil tratamento, e que podem criar situações de abastecimento fora dos padrões habituais da indústria. São situações com elevada variação de quantidades, e a frequência das ocorrências tem grau de previsibilidade bastante baixo, incerto. Como a Cruz Vermelha Internacional se prepara? Esse é um bom exemplo de tratamento da demanda irregular. A Cruz Vermelha Internacional é uma entidade que atua, entre outras coisas, em conjunto com outras organizações internacionais no atendimen- to a acontecimentos e catástrofes da natureza, com grande impacto para as populações e o ambiente. A ocorrência de terremotos, maremotos, tsunamis, inundações, explosões de vulcões e outros fenômenos naturais é um bom exemplo de demanda irregular que a Cruz Vermelha precisa estar preparada para atender. Com efeito, isso é um exemplo espetacular de eficiência logística. A Cruz Ver- melha mantém estoques de remédios, alimentos, barracas, roupas etc., em permanente disponibilidade, para atender, rapidamente, situações como as descritas. No mundo dos negócios, as concorrências públicas, para suprimento aos diferentes níveis de governo (municipal, estadual, federal), são um bom exemplo de demanda irregular. Usualmente as quantidades envolvidas são grandes, e os prazos para atendimento são exíguos, o que força os fornece- dores desses órgãos a preparativos logísticos flexíveis para atender grandes compras, que só acontecerão após a concorrência vencida. Demanda por encomenda Aplicável em princípio a uma série de produtos, normalmente de alto valor agregado (aviões, plataformas petrolíferas, navios, plantas e processos industriais, imóveis etc.), a produção sob encomenda encontra espaços hoje em dia em uma enorme lista de produtos, que podem ser customizados ao gosto do cliente, a partir de uma plataforma básica, esta obedecendo a pa- drões de demanda mais regulares. Natureza das previsões de demanda e estoques 245 Um exemplo é a indústria automobilística. A partir de modelos básicos, que obedecem a padrões de demanda regulares, a indústria passou a ofere- cer uma série de equipamentos alternativos, que praticamente torna a venda “sob encomenda”. Hoje o consumidor escolhe a cor e uma série de equipamen- tos opcionais diretamente na indústria e recebe o produto personalizado. A noção de independência e dependência A demanda por um produto é chamada independente quando não há ne- nhuma relação com a demanda de nenhum outro produto, e as variações em sua própria demanda ocorrem apenas por causa dos fatores aleatórios, cíclicos e sazonais provenientes do mercado e da concorrência. A decisão de tomar um sorvete, consumir um chocolate, comprar um sa- bonete, um novo carro, e outras como essas, afetam a demanda única e ex- clusivamente do produto em questão. A demanda de um produto é dependente quando há uma relação direta com a demanda de outro produto “aparentado”. Por exemplo, quando compramos um novo carro estamos comprando, “no pacote”, quatro rodas, um motor, uma bateria, cinco pneus, um volante, bancos etc. Os produtos com demanda dependente são utilizados, consumidos e neces- sários somente quando se produz o produto cuja demanda o comanda. A demanda pelos produtos dependentes é calculada matematicamente, em função de sua participação na fórmula, na composição, na montagem do pro- duto principal. No exemplo a seguir, temos a relação de dependência no caso de um produto chamado “maionese a melhor”. O item “pai” está no topo da relação, sendo uma embalagem contendo 12 unidades de maionese. Outros itens podem fazer o papel de “filho”, por exemplo uma etiqueta colada à caixa e à própria caixa de papelão. Outros itens podem representar o papel de “filho” para o item que o controla, e “pai” para os itens que são dependentes. Exem- plo disso é o vidro ou frasco de maionese, que é dependente do produto pronto, porém controla os ingredientes da receita. 246 Natureza das previsões de demanda e estoques Árvore de demanda com dependência Produto acabado caixa com 12 frascos de 500g Óleo Vinagre Sal Etc. Fórmula Rótulo Frasco Tampa Etiquetas Caixa de papelão Divisórias 12 frascos Jo sé R ob er to F or na zz a. A previsão de venda – uma abordagem técnica O que é uma previsão de vendas Um dos mais delicados e importantes processos de uma organização, a previsão ou estimativa de vendas, como é conhecida nas empresas, é a infor- mação de entrada, a informação vital que dá início a todos os processos de manufatura, montagem, compra, movimentação e armazenagem de produ- tos. De sua qualidade resulta a qualidade de toda a operação da organização. Quanto mais tempo e recursos uma organização dedica à melhoria desse processo, melhor será seu desempenho medido em serviço aos clientes e no capital empatado em estoques. Um ditado muito comum na área de com- putação, “trash in, trash out”, que se pode traduzir como “entra lixo, sai lixo”, é perfeitamente aplicável ao caso. Uma boa definição para o processo de estimativa de vendas é: organização e análise de informações, para que se possa estimar como � serão suas vendas no futuro, levando-se em conta os períodos de tempo cobertos pelos pedidos dos clientes, tamanho e composição, produtos requeridos, pontos de entrega etc. Natureza das previsões de demanda e estoques 247 Ou, simplesmente, a definição específica do que será suprido, quando e onde. Na previsão de vendas devem ser considerados: componentes de tendências � – crescimento ou declínio no tempo, li- gados ao ciclo de vida do produto; variações cíclicas acompanhando as tendências � ; variações sazonais � – aquelas cujo padrão se repete a cada ano da mesma forma; componente aleatório � – via de regra, a previsão de vendas é sujeita a alguma forma de distribuição estatística, não englobada em tendên- cia, ciclo ou sazonalidade. Métodos utilizados na preparação de previsão de vendas D ig ita l J ui ce . Métodos quantitativos ou qualitativos podem ser empregados para a preparação de previsões de vendas. 248 Natureza das previsões de demanda e estoques Métodos quantitativos Os métodos quantitativos, fortemente baseados em conhecimentos de estatística, são mais favoráveis em situações de alta disponibilidade de dados e séries históricas, e quando essas séries históricas podem ser extrapoladas para o futuro. Dentro do ciclo de vida dos produtos, métodos quantitativos podem ser usados quando o produto está maduro no mercado, com alguns anos de história, de forma que se tenha uma massa de dados estatisticamen- te válida para projeções. São os mais usados para apoio à decisão, e contem- plam os padrõesde comportamento mais comuns, tais como tendências, sazonalidade, variações cíclicas e aleatórias. Não são recomendados para produções em seu estágio inicial, de introdu- ção no mercado, pois nesse momento o nível de incerteza é muito elevado para adequado tratamento estatístico. Análise de séries temporais de dados � As análises de séries de dados no tempo são aplicáveis quando os volu- mes de vendas para períodos futuros podem ser projetados, tendo como base os dados reais coletados em períodos passados. As formas mais comuns são: A média móvel � – baseados na média aritmética, nesse caso, todos os dados do passado têm peso igual, e se consideram algumas das últimas observações para projetar os períodos futuros. Vamos ver um exemplo de aplicação. As vendas de televisores em uma determinada loja de eletrodomésticos, nos últimos seis meses, foram as seguintes: Mês Unidades Janeiro 100 Fevereiro 200 Março 300 Abril 800 Maio 600 Junho 400 Natureza das previsões de demanda e estoques 249 Assumindo uma média móvel, que leve em conta apenas os últimos 3 meses, qual é a previsão de vendas para julho? O cálculo levará em conta os últimos três meses, e a previsão para julho será a média aritmética dos três meses, a saber: (800 + 600 + 400) 3 = 600 unidades. Dependendo da situação, levam-se em conta mais ou menos períodos pas- sados, para a previsão dos períodos futuros. A média móvel exponencial � – também conhecida como suavização exponencial. Uma variante da média móvel, em que se usam pesos di- ferentes para os períodos passados, normalmente atribuindo-se pesos maiores aos últimos períodos. Os dados mais recentes pesam mais na previsão do futuro. Uma forma prática é atribuir porcentagens a cada período considerado, de forma que no total tenhamos os dados consi- derados somando 100 %. No exemplo anterior, se atribuíssemos 20% de peso para abril, 30 % de peso para maio e 50 % de peso para junho teríamos a previsão para julho calculada da seguinte forma: ((800 . 0.2 ) + (600 . 0.3)+(400 . 0.5)) = 540 unidades previstas para julho. Observação– Repare que nesse exemplo cada parcela tem um peso diferen- te (em porcentagem). No exemplo anterior todas as parcelas têm um peso igual. Por isso é feita uma divisão pelo número de fatores (no caso do exemplo 3). Modelos causais – regressão linear e múltipla � Há situações em que se identificam uma ou mais variáveis, para fazer a previsão de vendas de um determinado produto que dependente, de alguma forma, das variáveis identificadas. Há uma relação clara de causa e efeito. A previsão de uma variável é derivada a partir da interpretação de outras variáveis relacionadas. 250 Natureza das previsões de demanda e estoques Exemplos: a) a venda de sorvetes tem dependência direta da variável temperatura. Portanto, pode-se fazer uma previsão de vendas de sorvete baseada numa tabela de temperaturas. b) a previsão de vendas dos DVDs aumenta conforme aumenta a compra dos aparelhos de DVD. c) aumentam as vendas de livros à medida que aumenta a educação da população. d) há um claro correlacionamento entre os casos de câncer de pele e o tem- po de exposição à luz solar. Esses relacionamentos são tratados nos chamados métodos estatísticos de regressão linear ou múltipla. Há uma vasta literatura na estatística para comprovar a qualidade dos resultados, e uma excelente referência é o livro do Professor Pedro Luiz de Oliveria Costa Neto1. Métodos qualitativos São métodos de previsão que confiam mais em julgamento humano, ex- periência, intuição, análise de tendências, sensibilidade, formadores de opi- nião e outras formas não quantitativas. O uso de métodos qualitativos é especialmente desenvolvido nas ativida- des de pesquisa de marketing, para novos produtos e tendências de hábitos de consumidores. O julgamento e previsão são feitos com base em coleta e análise de informações das mais variadas fontes, inclusive utilizando-se de séries de dados históricos para ajudar, mas o resultado final não é resultado direto nem calculado a partir das séries históricas. No ciclo de vida dos produtos, métodos qualitativos são muito emprega- dos na fase inicial de desenvolvimento, quando se buscam os conceitos que vão suportar o lançamento de um produto, e as razões pelas quais os consu- midores se interessariam por esse produto. Tendo como resultado uma pri- meira estimativa de volumes de vendas para eles. Alguns exemplos de métodos qualitativos: 1 COSTA NETO, Pedro Luiz de Oliveira. Estatística. Edgard Blucher, 1997. Natureza das previsões de demanda e estoques 251 Painel de consumidores � – grupos de aproximadamente 10 potenciais consumidores de um produto são reunidos para opinar sobre várias ca- racterísticas físicas (perfume, sabor, cor) ou mercadológicas (apelo publi- citário, promocional) do mesmo. Seus comentários são posteriormente analisados, e conclusões tiradas sobre o potencial de mercado daquele produto. Outra utilização muito comum desse tipo de método qualitativo de previ- são ocorre nas novelas da televisão. Periodicamente, “consumidores” do pro- duto novela “A” são reunidos para opinar sobre a performance, o caráter, e o futuro de cada um dos personagens da novela, e seus comentários são levados em conta pelos autores para direcionar o futuro (as “estimativas de vendas”) de cada um dos personagens. Método Delphi � – um grupo de especialistas é chamado a debater e atin- gir opiniões de consenso sobre o que o futuro nos reserva. É a predição de um evento via consenso de um grupo de alto nível. Pesquisas de mercado � – também utilizadas na prospecção de mercado, para testar hipóteses, junto a grupos de consumidores, sobre as possi- bilidades de sucesso de novos produtos. Seus resultados, em especial o dimensionamento do tamanho do mercado e a participação possível para um novo produto, são essenciais para a decisão de lançar ou não um novo produto. Como medir a qualidade de uma previsão de vendas Relembrando o princípio do “entra lixo, sai lixo”, a qualidade de uma ope- ração, e seus indicadores financeiros, é diretamente afetada pela qualidade da previsão de vendas que a suporta. Na medida de qualidade da previsão de vendas utiliza-se o termo acuraci- dade. Nas empresas, a medida do sucesso de uma previsão de vendas é a sua comparação com as vendas reais, quando elas ocorrerem. Vamos exemplificar: no mês de maio, um determinado produto tem suas vendas estimadas em 100 unidades para o mês de julho seguinte. Quando as vendas de julho forem afinal concluídas, ou seja, a “vida real” acontecer, sabere- 252 Natureza das previsões de demanda e estoques mos efetivamente quantas unidades foram comercializadas. Vamos supor que as vendas reais em julho foram de 106 unidades. Portanto, a previsão de vendas foi superada em 6 %. Essa é a chamada medida de “acuracidade de vendas”. Cada empresa desenvolve seu método próprio de medir, seguindo esse conceito. No exemplo citado foi utilizado o chamado “leg 2”, isso é, a medida é aplicada para previsões dois períodos de vendas à frente. Lembre-se que a previsão de julho foi feita em maio (2 meses antes, o “leg2”). Obviamente, não faz muito sentido prever as vendas do próprio mês, a previsão deve sempre se referir a períodos futuros. Quantos períodos de vendas à frente é preciso en- xergar, depende de cada tipo de negócio, e das respostas que cada processo produtivo pode dar em termos de agilidade, flexibilidade e rapidez. A medida da acuracidade também pode ser feita em termos absolutos, pela medida do erro absoluto. Previsões erradas para mais ou para menos podem ser danosas ao negócio, de diferentes formas. Portanto, há muitas empresas que trabalham com intervalos de erro na medida da acuracidade e medida do erroabsoluto, não importando se este foi para mais ou para menos. No nosso exemplo, supondo que a empresa em questão tenha como ob- jetivo uma acuracidade de previsão de vendas de 5 %, na forma absoluta, as vendas reais do mês de julho deverão estar no intervalo 95 a 105 unidades, para atender à expectativa do negócio. Para concluir, uma boa prática de mercado, para aferir se a previsão de vendas de um particular produto está sendo bem feita, é que, no “leg 2”, isso é, a previsão feita com 60 dias de antecedência, se obtenha 90 % como medida chave de desempenho. Um erro de 10 % em sua forma absoluta. Por exemplo, a previsão é de venda de 3 000 unidades, portanto as vendas reais deverão se situar no intervalo 3 000 +/– 300 unidades, isto é, entre 2 700 e 3 300 unidades. Os benefícios de uma boa previsão de vendas A acuracidade de uma previsão de vendas tem impacto direto no nível de estoques que uma empresa precisa ter. Quanto melhor o processo de previ- são de vendas menos dinheiro é investido em estoques, para contrabalançar os erros de previsão. Lembramos que, nos dias de hoje, a pressão nas organizações é sempre por Natureza das previsões de demanda e estoques 253 redução nos níveis de estoques, para liberar dinheiro para investimentos em outras áreas da empresa, tais como investimentos em propaganda, preparação de novas instalações e produtos, remuneração ao acionista etc. São usos muito mais nobres para o dinheiro, do que deixá-lo na forma de pilhas de produtos armazenados, por conta de estimativas de vendas de qualidade pobre. O nível de serviço oferecido aos clientes também é resultado direto da qualidade da previsão de vendas. Entende-se por nível de serviço presta- do aos clientes, ao atendimento de seus pedidos nas seguintes dimensões: quantidades exatas por item solicitado, entregues no prazo combinado e sem erros de qualquer espécie. Previsões de vendas com alto grau de acura- cidade evitam a falta de produtos para entrega aos clientes, figura que nas empresas tem vários nomes: pendente, back order, stock shortage, atraso etc. Todos esses termos, de uso comum nas empresas, têm uma tradução única: faltou produto para atender aos clientes! O não atendimento dos pedidos é uma fonte constante de atritos e prejuí- zos a ambas as partes, ao supridor e ao seu cliente. Ambos perdem negócios e lucros, oferecendo oportunidades para a concorrência. Estimativas conserva- doras indicam que, no mínimo, as empresas perdem 3% de suas vendas pela incapacidade de atender aos pedidos de seus clientes na sua totalidade e no prazo combinado. É uma consequência de baixa acuracidade em estimativas de vendas, que pode ter impacto devastador em lucratividade, é uma opor- tunidade perdida e oferecida ao concorrente. Voltando-nos para as operações internas de uma empresa, os benefícios de uma previsão de vendas bem feita são encontrados também nos proces- sos de manufatura: ocorrem menos trocas de produtos nas linhas, com melhorias de pro- � dutividade; diminuem as necessidades de trabalho em horas extras, com redução � de custos; os materiais utilizados podem ser comprados obedecendo a lotes � econômicos, com boas negociações, evitando compras de último mo- mento ou no mercado livre, a preços mais altos. Outro benefício de alto valor, esse no lado gerencial e de planejamento da empresa, é obtido nas fases de preparação do orçamento anual e suas revisões periódicas. 254 Natureza das previsões de demanda e estoques A alta administração, trabalhando com estimativas de vendas mais pre- cisas, mais confiáveis, com elevada acuracidade, pode fazer o planejamento financeiro e de longo prazo com melhor qualidade, mais realista, mais preci- so, e com isso obter reconhecimento e aprovação dos conselhos de adminis- tração e assembleias de acionistas. Em resumo, a qualidade das previsões de vendas afeta todas as áreas do negócio: sua produtividade nas áreas industriais, seus níveis de estoque e capacidade financeira, seu relacionamento com os clientes e sua confiabili- dade junto aos acionistas ou controladores. Quem usa a previsão de vendas De forma direta ou indireta todas as áreas de uma empresa utilizam as informações da previsão de vendas. As áreas de manufatura e cadeia de abastecimento baseiam-se nelas para a preparação de todo o ciclo de planejamento e programação da produção, dimensionamento e controle de estoques, estabelecimento de políticas e prá- ticas de abastecimento e compras dos insumos e, em conjunto com a área de Recursos Humanos, para dimensionamento e planejamento da mão de obra. As áreas voltadas ao estudo do mercado, mais conhecidas pelo termo inglês marketing, e as áreas operacionais de vendas, as utilizam para formu- lação de estratégias para suas marcas e produtos, planejamento de ativida- des de comercialização, promoções e gastos correlatos. Nas áreas financeiras e administrativas para os exercícios anuais e perió- dicos de preparação de orçamentos, fluxo de caixa, investimentos de capital e outras análises voltadas ao aspecto financeiro da empresa. Finalmente, como já citamos, a alta administração baseia-se também em estimativas de vendas, entre outras informações, para o mais alto nível de planejamento e controle operacional do negócio. Ferramentas utilizadas e cuidados na preparação A planilha Excel, junto com o clip para papel, são duas das maiores inven- ções da humanidade, no ponto de vista do autor. Natureza das previsões de demanda e estoques 255 É difícil de imaginar o mundo dos negócios antes da existência dessas planilhas, com penosas tabulações e processamentos de informações. A ferramenta mais fácil, barata e prática para acúmulo de informações, e trabalho com previsão de vendas, é a planilha eletrônica, empregada em 100 % das empresas nos dias de hoje. A planilha eletrônica tem, inclusive, funções estatísticas básicas, úteis para cálculo de médias, desvios-padrão e regressões. Para aplicações mais amplas, com grande número de variáveis e correla- ções, e possibilidades de análises mais profundas, há programas aplicativos (software) oferecidos por inúmeras empresas, variando desde aplicativos pu- ramente estatísticos até peças de software especialmente projetados para estimativas de vendas. Alguns cuidados são necessários na preparação dessas estimativas de vendas, e o primeiro deles se faz necessário antes de se realizar o exercício de previsão. É a limpeza e ajuste das bases de informações que serão utiliza- das, que, se não for bem feita, pode levar a conclusões erradas baseadas em dados de alguma forma distorcidos da realidade que se pretende projetar. Algumas situações que requerem ajustes: adição ou perda de clientes com volume de negócios importantes, o efeito de promoções, as alterações efe- tuadas em embalagens ou preços etc. A manutenção da integridade dos dados históricos assegura que, seja qual for o método ou programa aplicativo utilizado, e independente das pes- soas que hoje os utilizam, o processo estará sempre preservado para cumprir com suas funções, sem interrupções ou “perda de memória” da organização. Isso evita o que se chama, no jargão das empresas, “reinventar a roda”, ou seja, procurar novamente por soluções e informações que já estiveram dis- poníveis dentro da própria organização mas, que por descontrole ou falta de manutenção, perderam-se no tempo. Como melhorar o processo de previsão de vendas Os consumidores tornam-se mais exigentes a cada dia, demandando mais variedade de produtos, velocidade de entrega, acesso e disponibilidade. As empresas se confrontam com o dilema de manterem-se lucrativas, ao mesmo
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