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Introdução à Epidemiologia e Saúde Coletiva

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FUNDAMENTOS DA EPIDEMIOLOGIA 
Aula 1:Introdução à Epidemiologia 
Etimologia da palavra epidemiologia
Formada pela junção do prefixo epí- (em cima de, sobre) com o radical - demos significando povo. O sufixo -logos, também vem do grego que corresponde a estudo, doutrina.
Então, etimologicamente a palavra epidemiologia significa “ciência do que ocorre sobre o povo”.
Definição de Epidemiologia 
Existem várias definições para o termo epidemiologia. 
O conceito original se restringia ao estudo de doenças transmissíveis, entretanto, houve uma evolução no conceito que passou a abranger todos os eventos relacionados ao processo saúde/doença da população.
Segundo Rouquayrol (1999) epidemiologia é a ciência que estuda o processo saúde/doença em coletividades humanas, propondo medidas específicas de prevenção, controle ou erradicação de doenças. Enquanto a abordagem clínica se dedica ao estudo da doença no indivíduo, a epidemiologia estuda os problemas de saúde em coletividades humanas .
A epidemiologia se constitui na principal ciência da informação em saúde e é considerada a ciência básica da saúde coletiva
Saúde Coletiva
É a ciência e a arte de evitar doenças, prolongar a vida e desenvolver a saúde física, mental e a eficiência, através de esforços organizados da sociedade, para:
o saneamento do meio ambiente;
o controle das infecções entre as pessoas;
a organização de serviços médicos e paramédicos para prevenção, diagnóstico precoce e o tratamento da doença;
o aperfeiçoamento da máquina social que assegurará a cada individuo, dentro da sociedade, um padrão de vida adequado à manutenção da sua saúde.
(Winslow citado por Rouquayrol, 1999)
De acordo com Rita Barradas, em seu artigo Epidemiologia Social, os epidemiologistas, atores da saúde coletiva, vem desenvolvendo novas estratégias de investigação e novas ferramentas de análise que possam, cada vez mais, fornecer elementos corretos para orientar as intervenções sociais no campo da saúde e a formulação de políticas públicas baseadas no reconhecimento dos direitos de cidadania, na garantia da liberdade democrática e na busca da felicidade humana.
Formação histórica da Epidemiologia
Antiguidade: a contribuição de Hipócrates (c. 460 a 377 a.C.) 
No Tratado de “Ares, águas e lugares” Hipócrates discutiu os fatores ambientais ligados às doenças, defendendo um conceito ecológico de saúde/doença. Daí, surgia a Teoria Miasmática. 
O Renascimento
Movimento de resgate dos elementos filosóficos, estéticos e ideológicos mais avançados da cultura greco-latina. O pensamento renascentista propiciou as bases para a compreensão racional da realidade que resultou na constituição das ciências modernas. A partir dessa nova visão de mundo, “explodiu”, entre os séculos XVI e XVIII a necessidade da produção de conhecimento em todos os saberes. 
Formação histórica fundamentada em 3 eixos (tríade):
Ø Clínica: saberes sobre saúde/doença – século XVII
Fisiologia, Patologia, Bacteriologia, etc. 
Ø Estatística: diretrizes metodológicas quantitativas – século XVII;
Ø Medicina social: práticas de transformação da sociedade – século XVIII.
Hegemonia da medicina “cientifica” (“biologização”) apesar do desenvolvimento da medicina social no final do século XIX:
Ø Fisiologia;
Ø Patologia;
Ø Bacteriologia.
Rudolf Virchow (1821-1902), médico alemão, é um importante personagem da medicina social. Extremamente versátil, desenvolveu intensa e criativa atividade em várias áreas: patologia, antropologia, política (ativista da saúde pública). 
Entretanto, com o avanço da fisiologia, da patologia e da bacteriologia no século XIX, devido principalmente a Bernard, Virchow e Pasteur, houve um fortalecimento da medicina científica. As enfermidades de maior prevalência eram as de natureza infecto-contagiosa, o que favoreceu a abordagem individual e curativa, superando o enfoque coletivo e os determinantes socias da saúde. 
Medicina Social – práticas de transformação da sociedade
• A Revolução industrial, iniciada na Inglaterra em meados do século XVIII e expandida para o mundo a partir do século XIX, produziu um grande impacto nas condições de vida e saúde das populações. Com a organização e aumento da participação política das classes trabalhadoras, evidenciados principalmente na França, Alemanha e Inglaterra, temas relativos à saúde foram incorporados na pauta das reivindicações dos movimentos sociais. Era o início do movimento pela medicina social: a medicina deveria ser um instrumento de transformação social. Postulava-se que a participação política é a principal estratégia de transformação da realidade de saúde e que as revoluções populares deveriam resultar nos principais determinantes da saúde social: democracia, justiça, igualdade, liberdade e fraternidade. As práticas de transformação da sociedade, inicialmente propostas pela Medicina Social no século XVIII, estão relacionadas à necessidade de aprofundamento e sistematização das reflexões sobre as questões de saúde. Se pararmos para analisar as aproximações e distanciamentos entre os âmbitos da ciência e da política chegaremos a conclusão de que os pesquisadores em Saúde Coletiva podem ser considerados, também, agentes políticos. Os estudos nessa área se relacionam tanto direta quanto indiretamente com campos de atuação e formulação de políticas e requerem dos agentes da área da saúde elevado comprometimento ético, reflexão, produção, ação política e transformação da sociedade. Essas práticas nortearão a forma de se avaliar o processo saúde-doença na sociedade.
Alguns marcos históricos no desenvolvimento da Epidemiologia 
Epidemia de cólera em Londres (1854): destaque aos estudos do médico inglês John Snow (1813-1858), considerado o Pai da “epidemiologia de campo” devido às coletas planejadas de dados. 
Nos anos 50
- Desenvolvimento/aperfeiçoamento dos desenhos epidemiológicos;
- Substituição da Teoria Monocausal por uma tendência ecológica (multicausalidade);
- Definição clara dos indicadores de saúde: prevalência e incidência;
- Formalização do conceito probabilístico de risco;
- Introdução da Bioestatística.
1960 e 1970 
-. Entre os anos 1960 e 1970, houve uma verdadeira revolução na Epidemiologia com a introdução da computação eletrônica. Pode-se dizer que houve uma forte “matematização” da área. 
-. Na década de 60 várias questões sociais, como os direitos humanos, mobilizaram o mundo inteiro e o impacto dessa mobilização repercutiu, é claro, na saúde e na educação.
-. John Cassel (1915-1978) contribuiu significativamente na sistematização do conhecimento epidemiológico com a teoria compreensiva da doença, fruto da integração dos Fundamentos Socioantropológicos na Saúde.
Nos anos 70 e 80:
Três tendências principais: 
aprofundamento das bases matemáticas, 
proposta de uma Epidemiologia clinica (tendência à “biologização),
reafirmação do processo saúde-enfermidade-cuidado, considerando os aspectos econômicos e políticos de seus determinantes, em oposição à “biologização”.
Na Europa e na América Latina surgiram abordagens mais críticas da Epidemiologia em resposta a essa tendência de “biologização” da Saúde Pública, reafirmando a influência dos determinantes sociais da saúde (DSS) no processo saúde-doença. 
Novos desafios surgiram: doenças antigas reapareceram e novas enfermidades despontaram, as chamadas doenças emergentes destacando, nesse contexto, a pandemia da SIDA ou AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida).
O filme mais famoso sobre a AIDS, que retrata muito bem sua gravidade e seu caráter estigmatizante, talvez seja Philadelphia (1993), com o ator Tom Hanks.
Objetivos, Aplicações e Interfaces disciplinares da Epidemiologia
Principais objetivos da Epidemiologia 
- Descrever a distribuição e a magnitude dos problemas de saúde nas populações humanas;
- Proporcionar dados para planejar, executar e avaliar ações de prevenção, controle e tratamento das doenças; 
- Identificar fatores etiológicos na gênese das enfermidades.
Algumas Aplicações:
Diversas fases do ciclo davida;
Diversos tipos de problemas de saúde:
 - Epidemiologia da AIDS, 
. - Epidemiologia das doenças infecciosas;
Interfaces da epidemiologia 
- Ciências biológicas (clínica, patologia, microbiologia, parasitologia, imunologia): Epidemiologia clínica e a aplicação do método epidemiológico na clínica; 
- Ciências Sociais: A epidemiologia social representa o renascer da determinação social da doença;
- Estatística (coleta e análise de dados).
Raciocínio Epidemiológico: pessoa, espaço e tempo 
As doenças humanas não são encaradas como eventos que ocorrem ao acaso, mas estão relacionadas a uma rede de outros eventos que devem ser identificados e estudados. 
Vale a pena refletir que para o clínico o que mais interessa é o diagnóstico de uma determinada doença em um determinado indivíduo. Enquanto, para o epidemiologista o que interessa realmente é como se dá a ocorrência de uma determinada doença inserida em uma estrutura social. Os questionamentos epidemiológicos “como”, “por que”, “quando” e “em quem” são fundamentais para entender melhor os problemas de saúde. 
A epidemiologia explora a ecologia da doença humana!
A epidemiologia estuda os Determinantes Sociais da Saúde (DSS) e as condições de ocorrência, bem como as possíveis formas de intervenção e controle das doenças e agravos à saúde em populações humanas. A epidemiologia vai muito além do estudo do "risco biológico". Na verdade, a Epidemiologia transcende a “biologização”, visto que investiga problemas de cunho social, por isso é definida pelo seu caráter social, considerando os aspectos socioeconômicos e políticos de seus determinantes, ou seja, a determinação social da saúde.
O principal foco de interesse dos estudos epidemiológicos está relacionado às principais causas de morte das sociedades modernas: mortes violentas e DCNT (doenças crônicas não transmissíveis). 
Afirmação do compromisso histórico da epidemiologia com a melhoria da saúde das populações e com a redução das desigualdades sociais.
Reflexão: Transição Epidemiológica na população brasileira 
A partir da primeira década do século XXI houve uma transição epidemiológica na população brasileira, ou seja, uma mudança no perfil epidemiológico. 
As epidemias e os ciclos de transmissão das doenças infecciosas, tão estudados no século XVIII, deram lugar ao estudo de complexas redes de multicausalidade. 
Vale a pena destacar que as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) ou não-infecciosas, como a obesidade e a síndrome metabólica, doenças cardiovasculares, diabetes, doenças cerebrovasculares e câncer assumiram proporções alarmantes.

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