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Aula 2 TGP Jurisdicao 2

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TEORIA GERAL DO PROCESSO 
JURISDIÇÃO 
FORMAS DE COMPOSIÇÃO DE LITÍGIOS 
Muito embora atualmente a tutela jurisdicional seja o meio primordial de solução de lides, 
comporta o processo civil outras formas de desaparecimento do conflito, ligadas ao consenso das 
partes, surgidas de maneira evolutiva no curso da história. São elas: 
AUTOTUTELA 
 A primeira forma de composição de conflitos de interesses, surgida quando da ausência de um 
Estado organizado, com poder insuficiente para coibir os homens de buscar a solução de suas lides 
através da lei do mais forte e subjugo forçado do mais fraco. 
Muito embora seja uma espécie primária de composição de litígios, ainda hoje os ordenamentos 
jurídicos prevêem a possibilidade do ofendido agir imediatamente para repelir a injusta agressão, ante 
uma situação de urgência. 
AUTOCOMPOSIÇÃO 
Com o início do convívio do homem em sociedade e sem que o Estado, ainda embrionário, 
tivesse poder para submeter coativamente os cidadãos às suas decisões, as próprias partes em litígio 
passaram a buscar amigavelmente a solução de suas pendências. A diferença entre a auto 
composição e a autotutela reside justamente na ausência de sujeição forçada de um dos litigantes, e, 
ainda hoje em nosso ordenamento, são previstas as três formas conhecidas dessa modalidade de 
composição de litígios: 
a) Renúncia (CPC, art. 487, III c). Nesses casos o que se diz titular de um direito material violado 
abre mão definitiva e voluntariamente de sua pretensão, pondo fim ao litígio de forma unilateral, por 
não mais desejar a obtenção do bem da vida. 
b) Reconhecimento jurídico do pedido (CPC, art. 487, IlI a). É o inverso da renúncia, já que nessa 
hipótese o réu, livremente e sem qualquer sujeição forçada, submete-se à pretensão material do 
adversário, pondo fim ao conflito através da entrega espontânea do bem da vida pertencente ao autor. 
c) Transação (CPC, art. 487, III b). Por essa forma de composição, o autor renuncia parcialmente à 
sua pretensão material, enquanto o réu reconhece a procedência da parte não renunciada, 
entregando espontaneamente parte do bem da vida, chegando ambos a um denominador comum. 
Referidas formas de auto composição são vistas como verdadeiros negócios jurídicos materiais 
e bilaterais, cuja eventual ineficácia não deve, como regra, ser argüida via ação rescisória, mas sim 
através de ação anulatória, perante o juiz de primeiro grau, na qual se provará a ocorrência de algum 
dos vícios de consentimento incidente sobre a manifestação de vontade. Tal distinção se mostra mais 
clara quando constatamos que, em casos de extinção do processo pela autocomposição das partes, o 
juiz não aplica o direito cabível na espécie conforme seu convencimento, mas se limita a acatar a 
vontade das partes. 
TUTELA JURISDICIONAL 
Como já visto, quando o Estado se organizou e adquiriu poder de decidir e sujeitar os cidadãos 
ao cumprimento dessas decisões, surge a tutela jurisdicional. É ela, portanto, a composição obtida 
pela intervenção dos órgãos jurisdicionais, substituindo a vontade das partes na decisão do litígio, 
através de uma sentença de mérito que aplique o direito material previsto na norma genérica de 
conduta ao caso concreto. 
 
 
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A TUTELA JURISDICIONAL ESTATAL 
CONCEITO 
A análise etimológica da expressão "jurisdição" indica a presença de duas palavras unidas: juris 
(direito) e dictio (dizer). 
E esse "dizer o direito", a partir do instante que o Estado chama para si a responsabilidade de 
solucionar as lides, transforma esta função em nítido poder estatal, poder este exercido não só pela 
obrigatoriedade da jurisdição estatal, mas também pela sujeição imposta à parte perdedora na 
demanda judicial de observar o julgado, sob pena de cumprimento coercitivo. Decorrer daí o princípio 
da inevitabilidade da jurisdição. 
De outro lado, o reverso da moeda é o surgimento de um dever do Estado de solucionar todo e 
qualquer tipo de lide submetida a seu crivo, posto que inexistente para os cidadãos outra forma de 
solução forçada do conflito. É o dever constitucional de que nenhuma lesão de direito deixará de ser 
apreciada pelo Poder Judiciário. 
E, por fim, sob o aspecto do agente que exerce a jurisdição, esta é a função ou atividade 
desenvolvida pelos juízes de direito, investidos pelo Estado no poder de julgar. 
Portanto, a jurisdição é definida como sendo o poder-dever do Estado de aplicar o direito ao caso 
concreto submetido pelas partes, através da atividade exercida pelos seus órgãos investidos Juízes. 
FINALIDADES 
Esta atividade do Estado tem por objetivo: 
a) a composição de litígios, através da aplicação e especialização das normas gerais de conduta 
(direito) ao caso concreto (escopo jurídico); 
b) a pacificação social (escopo social); 
c) a realização da justiça (escopo político). 
CARACTERÍSTICAS 
A jurisdição tem por características a aplicação do direito material, após provocação das partes, 
as quais não obtiveram êxito em resolver seus conflitos amigavelmente (escopo de atuação do 
direito), e a substitutividade, consistente em atuar no lugar das partes e de maneira obrigatória. 
PRINCÍPIOS DA JURISDIÇÃO 
lnevitabilidade: uma vez ativada pelas partes, a jurisdição é forma de exercício do poder estatal, e 
o cumprimento de suas decisões não pode ser evitado pelas partes, sob pena de cumprimento 
coercitivo (tutela executiva). 
lndeclinabilidade: é preceito constitucional que nenhuma lesão de direito deixará de ser apreciada 
pelo Poder Judiciário. Se o Estado exige dos seus cidadãos a observância da obrigatoriedade da 
jurisdição, tem ele o dever de solucionar os conflitos de interesse quando provocado. 
Investidura: o Estado atua através de seus órgãos. E assim sendo, somente os agentes políticos 
investidos do poder estatal de aplicar o direito ao caso concreto (julgar) é que podem exercer a 
jurisdição. Tal investi dura é realizada de duas formas: mediante aprovação em concursos públicos de 
títulos e conhecimento jurídico e pela nomeação direta, por ato do chefe do Poder Executivo, de 
pessoas com prévia experiência e notável saber jurídico, como nos casos de ingresso na magistratura 
pelo quinto constitucional ou nomeação de ministros dos tribunais supenores. 
lndelegabilidade: Como a jurisdição é investida após preenchimento de rigorosos critérios 
técnicos, tem-se que não pode ser objeto de delegação pelo agente que a exerce com exclusividade. 
Inércia: por decorrência do princípio da ação, a jurisdição não pode ser exercida de ofício pelos 
agentes detentores da investidura, dependendo ela sempre da provocação das partes. 
Aderência: o exercício da jurisdição, por força do princípio da territorialidade da lei processual, 
deve estar sempre vinculado a uma prévia delimitação territorial. 
 
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Unicidade: muito embora se fale em jurisdição civil e penal, Justiça Federal e Estadual, na 
realidade esse poder-dever é uno e indivisível. As divisões decorrentes de sua repartição 
administrativa entre os diversos órgãos só tem relevância para o aspecto de funcionalidade da justiça, 
não retirando da jurisdição sua natureza una. 
JURISDIÇÃO CONTENCIOSA E VOLUNTÁRIA 
Nenhum poder estatal exerce com exclusividade suas funções inerentes. Pelo contrário, existem 
zonas de interseção nas quais podemos vislumbrar o exercício de atividades típicas de um dos 
poderes da República por outro, como, por exemplo, no julgamento pelo Congresso Nacional dos 
crimes de responsabilidade do presidente da República (impeachment) ou na atividade legiferante do 
chefe do Poder Executivo nas leis delegadas e medidas provisórias. 
Da mesma forma o Judiciário exerce funções distintas daquela que lhe é inerente, oraassumindo 
função legislativa (regimentos internos dos tribunais, provimentos etc.), ora praticando atos de pura 
administração. 
O Código de Processo Civil, em seu art. 1 º, divide a jurisdição civil em contenciosa e voluntária. 
A jurisdição contenciosa é a atividade inerente ao Poder Judiciário, com o Estado-juiz atuando 
substitutivamente às partes na solução dos conflitos, mediante o proferimento de sentença de mérito 
que aplique o direito ao caso concreto. 
Já a jurisdição voluntária não é, na realidade, jurisdição na específica acepção jurídica do termo, 
correspondendo mais a uma administração pública de interesses privados. 
Não raramente determinados negócios jurídicos demandam, como requisito formal, a participação 
de autoridades públicas para atingirem validade. E o que ocorre com o casamento, que deve ser 
realizado e contraído perante o Oficial do cartório de registro de pessoas civis. 
E o legislador, por vezes, em lugar de exigir a participação de uma autoridade administrativa civil, 
opta por demandar a participação do juiz de direito como requisito formal essencial de validade do 
negócio jurídico. É o caso da separação judicial consensual, em que não existe qualquer conflito de 
interesses (lide), mas sim concordância de vontades. 
Na chamada jurisdição voluntária, portanto, não existem partes litigantes, mas sim simples 
interessados na produção dos efeitos do negócio jurídico formal; não existe também sentença de 
mérito, com aplicação do direito ao caso concreto, mas mera homologação formal do acordo de 
vontades. 
Podemos concluir, então, que na jurisdição voluntária o juiz não atua a jurisdição propriamente 
dita, mas sim simples atribuição administrativa conferida em lei, a qual pode ser inclusive objeto de 
alteração em legislação infraconstitucional, sem que haja ferimento aos princípios constitucionais da 
exclusividade dos órgãos da jurisdição. 
 
QUADRO COMPARATIVO 
 
JURISDIÇÃO CONTENCIOSA JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA 
lide acordo de vontades 
 
partes interessados 
sentença de mérito homologação 
função jurisdicional atribuição administrativa 
 
Em sendo a jurisdição voluntária verdadeiro negócio jurídico consensual, em regra é incabível 
falar em ação rescisória de suas decisões homologatórias, competindo ao interessado postular a sua 
ineficácia mediante ação declaratória de nulidade ou anulatória, nas quais se deverá demonstrar, 
respectiva- mente, a ausência de alguns de seus requisitos formais de validade ou, então, a existência 
de algum vício de consentimento na formação de sua vontade.

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