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TextoComplementar TAP ElaineNunes 10112015(1)

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Texto Complementar 
 
PEDAGOGIA E A PEDAGOGIA SOCIAL: EDUCAÇÃO NÃO FORMAL 
Profa. Dra. Evelcy Monteiro Machado 
Mestrado em Educação 
Universidade Tuiuti do Paraná 
O Curso de Pedagogia no Brasil, desde sua origem em 1930, tem se centrado 
nas questões relacionadas à formação do educador para atuar na educação formal, 
regular e escolar. As três regulamentações do Curso, ocorridas em 1939, 1962 e 
1969, propiciaram pouca flexilibilização e inovações nos projetos das instituições 
formadoras, já que continham um currículo mínimo indicado que era implantado 
como referência nacional. 
A Reforma da Educação ocorrida em 1996 rompe com a tradição da oferta 
padrão – o currículo mínimo é substituído por diretrizes curriculares – além de 
possibilitar diversidade e diversificação de projetos educacionais. 
Na tramitação da nova regulamentação do Curso se acentua o debate sobre a 
formação e trabalho do pedagogo. Além de questões conflitantes, como a proposta 
de fragmentação do trabalho do pedagogo, com a restrição da formação para a 
docência e ênfase na gestão e da proposta de novos agentes formadores para 
docência (os Institutos Superiores de Educação), são incluídas nas discussões 
novas demandas de trabalho que propiciam atuação em diferentes espaços. 
O presente texto teórico-reflexivo pretende situar, a Pedagogia como 
perspectiva de inovação para o Curso de Pedagogia em relação à questão da 
educação fora da escola. A sociedade moderna apresenta demandas sócio-
educacionais que ultrapassam os limites formais e regulares da escola. Apesar de 
ainda não esgotado o debate sobre a questão prioritária da educação escolar 
básica, essas novas demandas se incorporam aos desafios à formação do 
educador, já que são crescentes as intervenções e ações educativas em âmbitos, 
meios e organizações diferenciados do sistema educacional. As perspectivas de 
educação permanente e educação ao longo da vida também ratificam a necessidade 
de se discutir a educação além dos limites da escola. 
Dessa forma, a Pedagogia Social se insere no debate como a ciência que 
referenda políticas de formação do educador para atuar na área social e como 
 
prática intervencionista, justificando-se, assim, a dimensão teórico-prática nesta 
discussão. 
A Pedagogia Social apresenta-se, nos diferentes autores, como uma ciência 
que propicia a criação de conhecimentos, como uma disciplina que possibilita 
sistematização, reorganização e transmissão de conhecimentos e como uma 
profissão com dimensão prática, com ações orientadas e intencionais. 
Como ciência, traz implícitos critérios e paradigmas próprios das teorias e da 
metodologia das ciências. É ciência da Educação, que se identifica com o saber que 
se constrói na Pedagogia, dividindo espaço e diferenciando-se da Sociologia, da 
Antropologia e da História da Educação. Associada à Sociologia da Educação na 
metade do século XX atualmente se especifica com clareza e distinção frente a 
outras áreas. O objeto formal da Pedagogia Social é a intervenção na realidade, 
como ciência normativa, comprometida com o fazer. Apropria-se da análise de 
indivíduos e da sociedade desenvolvida por outras áreas. Necessita, portanto, de 
outras ciências que lhe dêem suporte à ação. 
Enquanto teoria e/ou prática, a Pedagogia Social, fundamentada e presente 
em diversos países, atende a critérios que a caracterizam por possuir condições de 
desenvolvimento intelectual da área, estrutura acadêmica, estrutura social com 
associações, publicações especializadas, além de ter um título profissional, código 
próprio e marco deontológico. Nos países da América Latina, entre os quais o Brasil, 
a Pedagogia Social, apesar de praticamente desconhecida enquanto abordagem 
teórica e qualificação profissional regular, está presente em intervenções de 
diferentes naturezas. 
Ainda que as intervenções sócio-educacionais estejam presentes em 
diferentes espaços formais e não formais da educação a expansão e a consolidação 
da Pedagogia Social ocorre na educação não formal. Essa educação não formal que 
se amplia nas ofertas é para Trilla1 “o conjunto de processos, meios e instituições 
específicas organizadas em função de objetivos explícitos de formação ou instrução 
que não estão diretamente vinculados à obtenção de graus próprios do sistema 
educativo formal”. É distinta da escola, mas é ato planejado, intencional e apresenta 
organização específica. Tal espaço está presente na LDB de 1996 que amplia a 
concepção de educação incluindo novos agentes e espaços educativos. 
No Brasil, na década de 60, destacam-se os modelos de educação popular 
com a abordagem teórica desenvolvida por Paulo Freire para a educação de adultos 
 
com abordagem teórica desenvolvida por Paulo Freire. A pedagogia de Freire 
difundiu-se e influenciou nas campanhas de alfabetização. 
Como vem ocorrendo em outros países, a prática tem pressionado para que 
se amplie o debate teórico. Assim, apesar de incipientes as discussões a respeito da 
área sócio-educacional como um todo, alguns aspectos específicos apresentam 
avanços. 
Dessa forma as intervenções não formais que no início estiveram 
relacionadas a projetos de educação popular desarticulados ou a projetos 
exclusivamente assistencialistas têm se transformado e passam a incluir discussões 
sobre políticas sociais públicas para os setores específicos. A própria sociedade civil 
passa a participar desse debate, ainda que de maneira restrita, e a assumir 
responsabilidades práticas. 
Na América Latina a educação popular se amplia na atenção a estruturas 
sociais diversificadas e com projetos educacionais relacionando a: 1) programas 
relativos a populações indígenas, nativas, referentes a questões de língua, 
multiculturalismo, identidade étnica, resistência à assimilação da cultura dominante; 
2) programas de pesquisa participativa em ação de resgate à cultura e 
conhecimento popular para reapropriação do poder de grupos dominantes (de 
informação, de ideologia), apoiados na coerção e na força; 3) programas de 
participação comunitária, de identificação de programas educacionais, envolvendo 
pais, professores e alunos; 4) programas de educação popular relacionados a 
questões da terra, reforma agrária e educação rural; 5) programas de formação 
política por meio de recursos e atividades educacionais – alfabetização e 
necessidades de classes marginalizadas – para organização e mobilização na 
contestação de estruturas sociais e o poder do Estado. 
Além desses programas de educação não formal são desenvolvidos com 
enfoques diferenciados projetos que priorizam atenção às classes menos 
favorecidas, na questão da cidadania, na questão de carências urbanas e rurais e 
nas situações de vícios e dependência de drogas. 
Inclui-se, também, como programas de educação não formal com enfoques 
da Pedagogia Social as questões ecológicas, ambientais do trânsito, da terceira 
idade, das minorias (os sem-terra, os índios, a mulher, os negros, os presos, os 
hospitalizados), a questão cultural (desde o resgate de origens até a ampliação de 
horizontes), entre outras. Surgem outras demandas com atendimento em programas 
 
fora da escola regular formal – em geral desvinculados da Pedagogia Social. São 
relacionadas a escolas de música, línguas, esporte e comunicação; e ainda a 
questão da pedagogia na empresa, sob o enfoque de educação de adultos ou do 
treinamento de recursos humanos na perspectiva de modernização e formação de 
capital humano. 
Na literatura espanhola, percebe-se que, para explicar as tendências atuais 
da Pedagogia Social, muitos autores retomam dados da evolução histórica do tema. 
Tal fato se justifica pela amplitude, variedade de enfoques,de orientações e 
perspectivas teóricas, presentes nas referências à Pedagogia Social. 
Para.Quintana5, uma das indicações mais constantes nos textos teóricos, as 
concepções presentes nos diversos autores podem ser organizadas em cinco 
grupos: 
a) Pedagogia Social como doutrina da formação social do indivíduo. 
Representa o modo clássico de compreender a Pedagogia Social, que está latente 
na história da Pedagogia e é entendida como parte da Pedagogia Geral. Refere-se a 
preposições da educação para a vida em sociedade por intermédio de processos de 
socialização. Encontra-se em autores como H. Pestalozzi, H. Nohl e B. Suchodolski, 
e persiste nas discussões atuais. 
b) A Pedagogia Social como doutrina da educação política e nacionalista do 
indivíduo. Como maneira radical de implementar a concepção anterior, compreende 
a educação do indivíduo para a sociedade, sendo esta identificada com o Estado. 
Apresentou-se como expressão mais contundente na Alemanha entre as duas 
guerras. Está presente em trabalhos como os de Hegel, G. Kerschensteiner, E. 
Krieck e G. Giese, e encontra-se superada na maioria dos países. 
c) A Pedagogia Social como teoria da ação educadora da sociedade. Refere-
se a propostas de extrair das cidades suas potencialidades educadoras. Extrapola-
se da escola para a educação extra-escolar. Essa concepção de cidade educativa 
tem repercussão mais ampla na Itália. É defendida, entre outros, por A. Agazzi, por 
A. Fischer e pela UNESCO. Apesar de não ser destacada na classificação de 
Quintana, essa concepção está presente também na Espanha, citada, entre outros, 
por Requejo e Caride, por Trilla e divulgada nos países da América Latina. 
d) A Pedagogia Social como doutrina de beneficência pró-infância e 
adolescência. Uma concepção voltada para atender a necessidades sociais, que 
extrapola a visão tradicional da educação escolar por se propor a intervir na 
 
sociedade. Surgiu no contexto de necessidade pós-guerra, na Alemanha, de 
atendimento a órfãos e desabrigados, inicialmente dirigida a crianças e, 
posteriormente, à juventude e a adultos. São representativos autores como Nohl; 
Mollenhaner; Baüner e Wilhelm. Nessa concepção, inclui-se o Trabalho Social, nas 
perspectivas atuais. 
e) A Pedagogia Social como doutrina do sociologismo pedagógico. Objetiva a 
incorporação dos indivíduos a estruturas e circunstâncias sociais. Incorpora todas as 
formas de conceber Pedagogia Social, sendo mais do que uma disciplina ou 
corrente pedagógica, tornando-se uma Pedagogia Sociológica. Apesar de sua 
importante contribuição, como concepção de Pedagogia Social está superada. Está 
presente, entre outros, nos trabalhos de Natorp, Durkheim, Weber e Willmann. 
As classificações têm auxiliado na busca do objeto da Pedagogia Social, por 
conter indicações sociais próprias da atualidade em que se consolida a necessidade 
de educação permanente, em que se discutem as relações entre educação formal, 
não formal e informal, em que se propõe que a escola possa ser entendida como 
educação comunitária, em que surgem novas formas de instituições educativas, em 
que os meios de comunicação de massa, já ao alcance de quase todos os 
segmentos da população, passam a estar presentes também na educação e, mais, 
no momento em que a própria cidade é vista como meio de educação, com a 
evolução dos estudos sobre cidades educadoras. 
Assim, têm sido considerados, como objetos da Pedagogia Social, dois 
campos distintos: o primeiro referente à socialização do indivíduo, socialização 
compreendida como ciência pedagógica da educação social do indivíduo, que pode 
ser desenvolvida por pais, professores e família; o segundo relacionado ao trabalho 
social, com enfoque pedagógico, direcionado ao atendimento a necessidades 
humano sociais, desenvolvido por equipe multidisciplinar da qual participa o 
Educador Social, como profissional da Pedagogia Social. 
Este profissional é definido, segundo Petrus, por dois âmbitos: pelo social, em 
função de seu trabalho, e pelo caráter interventivo de sua ação, cuja demarcação 
teórica persiste controvertida devido a ideologias, filosofia e visão antropológica. 
Petrus aponta que, de maneira geral, na Espanha, a educação social realizada e 
pensada apresenta função de ajuda educativa a pessoas ou grupos que configuram 
a realidade social menos favorecida, função validada constitucionalmente. 
 
Além da intervenção sobre a inadaptação social, o autor destaca outros 
enfoques da educação social no contexto espanhol: 
a) é compreendida como sinônimo de correta socialização; 
b) pressupõe intervenção qualificada de profissionais, a ajuda de recursos e 
presença de umas determinadas circunstâncias sobre um sistema social; 
c) refere-se também à aquisição de competências sociais; 
d) representa o conjunto de estratégias e intervenções sócio-comunitárias no 
meio 
social; 
e) é concebida como formação social e política do indivíduo, como educação 
política do cidadão; 
f) atua na prevenção de desvios sociais; 
g) define-se como trabalho social, entendido, programado e realizado desde a 
perspectiva educativa e não meramente assistencialista; 
h) é definida como ação educadora da sociedade. 
 
Ressalta-se que o Educador Social tem a Pedagogia Social como referência. 
Distingue-se do Trabalhador Social pelo caráter de sua intervenção: o Educador 
Social atua no campo de intervenção sócio-educativa, enquanto ao Trabalhador 
Social compete a assistência social, a análise sistemática da realidade, a coleta de 
dados e de informações que subsidiam a própria intervenção do Educador Social. 
Torna-se evidente o caráter interdisciplinar do trabalho social em ação. É a 
partir da integração em equipe, incluindo profissionais de diferentes áreas, que se 
viabilizam planos, programas, projetos de implementação, acompanhamento e 
avaliação nessa área. 
A Pedagogia Social, como uma das áreas no campo de Trabalho Social, 
envolve uma série de especialidades que, na classificação de Quintana, são as 
seguintes: 
01- atenção à infância com problemas (abandono, ambiente familiar 
desestruturado...); 
02- atenção à adolescência (orientação pessoal e profissional, tempo livre, 
férias...); 
03- atenção à juventude (política de juventude, associacionismo, voluntariado, 
atividades, emprego...) 
 
04- atenção à família em suas necessidades existenciais (famílias 
desestruturadas, adoção, separações...); 
05- atenção à terceira idade; 
06- atenção aos deficientes físicos, sensoriais e psíquicos; 
07- pedagogia hospitalar; 
08- prevenção e tratamento das toxicomanias e do alcoolismo; 
09- prevenção da delinqüência juvenil. (reeducação dos dissocializados); 
10- atenção a grupos marginalizados (imigrantes, minorias étnicas, presos e 
ex- presidiários); 
11- promoção da condição social da mulher; 
12- educação de adultos 
13- animação sócio-cultural. 
 
Por serem decorrentes de necessidades sociais, essas áreas sofrem 
alterações. O próprio Quintana apresenta a questão dos meios de comunicação de 
massa e a polêmica em torno da existência ou não de uma Pedagogia Social dos 
meios de Comunicação Social. Coloca-se na defesa do duplo objeto da Pedagogia 
Social: socialização do indivíduo e Trabalho Social, remetendo à Pedagogia Especial 
as questões dos Meios de Comunicação, bem como da Pedagogia do Tempo Livre e 
Pedagogia Empresarial. 
Para autores como Ventosa educação para o trabalho distingue-se de 
educação de adultos, pela natureza das propostas; inclui novas áreas como 
educação cívica e educação para a paz. 
Entretanto, para fins de estruturação e estudo, pelas características próprias, 
as áreas de intervenção sócio-educacionalpodem ser organizadas em três grandes 
grupos que, separados ou integrados, respondem à diversidade de contextos e de 
intervenções. São eles: a Animação Sociocultural, a Educação de Adultos e a 
Educação Especializada. 
Ressalta-se, em conclusão, a necessidade de aprofundar discussões, ampliar 
domínio de conhecimentos teóricos e investir em pesquisas na área de Pedagogia 
Social – um dos desafios à formação do pedagogo – como alternativa à superação 
de práticas e intervenções sócio-educacionais determinadas pelo senso comum e 
pela cultura escolar. 
 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
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Fonte: www.boaaula.com.br/iolanda/producao/me/pubonline/evelcy17art.html

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