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Princípios do Direito Penal

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PRINCÍPIOS NORTEADORES, GARANTIDORES E LIMITADORES DO DIREITO PENAL
Os princípios constitucionais possuem a função de orientar, organizar e estruturar o ordenamento jurídico, especialmente quanto a aplicação do direito e interpretação da norma jurídica.
Diversos são os princípios de Direito Penal que estão assegurados na Constituição. Vejamos:
a) Princípio da dignidade da pessoa humana
. Trata-se do mais importante dos princípios penais e constitui um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, III). Proíbe a incriminação de comportamentos socialmente inofensivos, isto é, que não provoquem dano efetivo ou lesão ao corpo social (ex.: incriminar o ato de manifestar publicamente admiração por pessoas queridas). Impede, ademais, que a aplicação das normas penais ocorra de maneira totalmente divorciada da realidade.
b) Princípio da legalidade
. Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal (CF, art. 5º, XXXIX, e CP, art. 1º). 
c) Princípio da anterioridade da lei penal
. A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu (CF, art. 5º, XL, e CP, art. 2º). 
d) Princípio do ne bis in idem
. Ninguém pode ser condenado pelo mesmo fato mais de uma vez; além disso, uma única e determinada circunstância fática não pode ser utilizada mais de uma vez, seja para agravar, seja para beneficiar o agente. 
e) Princípio da insignificância ou da bagatela
. Foi desenvolvido por Claus Roxin. Para o autor, a finalidade do Direito Penal consiste na proteção subsidiária de bens jurídicos. Logo, comportamentos que produzam lesões insignificantes aos objetos jurídicos tutelados pela norma penal devem ser considerados penalmente irrelevantes. A aplicação do princípio produz fatos penalmente atípicos.
Na atualidade, a aceitação deste princípio é praticamente unânime. 
A divergência consiste, no mais das vezes, em definir, no caso concreto, se a lesão ao bem jurídico foi diminuta (e, portanto, penalmente relevante) ou insignificante (logo, atípica).
O Supremo Tribunal Federal vem adotando critérios que nos parecem ajustados para a verificação, em cada caso, sobre a possibilidade de aplicar o princípio. São eles: 
a mínima ofensividade da conduta do agente, 
a nenhuma periculosidade social da ação, 
o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento;
a inexpressividade da lesão jurídica provocada (HC 84.412/SP).
f ) Princípio da alteridade ou da transcendentalidade
. Proíbe a incriminação de atitude meramente subjetiva, que não ofenda bem jurídico alheio. Também foi desenvolvido por Claus Roxin. A ação ou omissão puramente pecaminosa ou imoral não apresenta a necessária lesividade que legitima a intervenção do direito penal. Por conta desse princípio, não se pune a autolesão, salvo quando se projeta a prejudicar terceiros, como no art. 171, § 2º, V, do CP (autolesão para fraudar seguro); a tentativa de suicídio (nosso CP somente pune a participação no suicídio alheio — art. 122); o uso pretérito de droga (o porte é punido porque, enquanto o agente detém a droga, coloca em risco a incolumidade pública).
g) Princípio da ofensividade
. Não há crime sem lesão efetiva ou ameaça concreta ao bem jurídico tutelado — nullum crimen sine inju-ria.Daí resulta serem inconstitucionais os crimes de perigo abstrato (ou presumido), nos quais o tipo penal descreve determinada conduta sem exigir ameaça concreta ao bem jurídico tutelado. Note-se, entretanto, que a jurisprudência dominante tende a admitir como válidos os delitos de perigo abstrato, por constituírem uma forma legítima de punição de infrações penais em sua fase embrionária (opinião com a qual concordamos).
h) Princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos (ou princípio do fato)
. Toda norma penal em cujo teor não se vislumbrar um bem jurídico claramente definido e dotado de um mínimo de relevância social será considerada nula e materialmente inconstitucional. (...). “Sem bem jurídico não existe infração penal” (Edilson M. Bonfi m e Fernando Capez, Direito penal: parte geral, p. 133).
i) Princípio da intervenção mínima
. Somente se deve recorrer à intervenção do direito penal em situações extremas, como a última saída (ultima ratio). A princípio, portanto, deve-se deixar aos demais ramos do direito a disciplina das relações jurídicas. A subtração de um pacote de balas em um supermercado, já punida com a expulsão do cliente do estabelecimento e com a cobrança do valor do produto ou sua devolução, já foi resolvida por outros ramos do direito, de modo que não necessitaria da interferência do direito penal.
j) Princípio da fragmentariedade.
Trata-se, na verdade, de uma característica do direito penal, mencionada por alguns autores também sob a forma de princípio, estabelecendo que as normas penais somente se devem ocupar de punir uma pequena parcela, um pequeno fragmento dos atos ilícitos, justamente aquelas condutas que violem de forma mais grave os bens jurídicos mais importantes.
k) Princípio da adequação social
. O fato deixará de ser típico quando aceito socialmente. Acompanhe esse exemplo extraído da jurisprudência: “Contravenção Penal — ‘jogo do bicho’ — Perda do monopólio do Estado às empresas de comunicações na exploração de jogos e loterias aliada a ausência de reprovabilidade na consciência da absoluta maioria dos cidadãos — Punição afastada pela aplicação do princípio da adequação social — Inaplicabilidade do art. 58 do Dec.-Lei 6.259/44. Convence que a adequação social supera contravenção denunciada. Em vez de punir um fato por ser típico, devemos adequá-lo à realidade vigente, aos costumes sociais, enfim, à consciência coletiva. A lei deveria ser interpretada pro societate, e, ao que tudo indica, a coletividade não se interessa pela punição dos ‘bicheiros’. Ao contrário, já inseriu o jogo do bicho em seu dia a dia” (TARS, RT, 753/699).
Tal princípio não tem merecido acolhida da maioria da jurisprudência, uma vez que sua aceitação implicaria a conclusão de que os costumes teriam força para revogar lei penal, o que é inadmissível em face 
do art. 22, I, da CF, e art. 2º, § 1º, da LINDB. 
l) Princípio da humanidade
. As normas penais devem sempre dispensar tratamento humanizado aos sujeitos ativos de infrações penais, vedando-se a tortura, o tratamento desumano ou degradante (CF, art. 5º, III), penas de morte, de caráter perpétuo, cruéis, de banimento ou de trabalhos forçados (CF, art. 5º, XLVII).
m) Princípio da proporcionalidade
. “Quando a criação do tipo penal não se revelar proveitosa para a sociedade, estará ferido o princípio da proporcionalidade, devendo a descrição legal ser expurgada de nosso ordenamento jurídico por vício de inconstitucionalidade. Além disso, a pena, isto é, a resposta punitiva estatal ao crime, deve guardar proporção com o mal infligido ao corpo social” (Edilson M. Bonfim e Fernando Capez, Direito penal: parte geral, p. 130).
n) Princípio da autorresponsabilidade ou das ações a próprio risco
. Aquele que, de modo livre e consciente, e sendo inteiramente responsável por seus atos, realiza comportamentos perigosos e produz resultados lesivos a si mesmo arcará totalmente com seu comportamento, não se admitindo nenhum tipo de imputação a pessoas que o tenham eventualmente motivado a praticar tais condutas perigosas (ex.: o agente que incentiva desafeto a praticar “esportes radicais” não responde pelos acidentes sofridos pela vítima, que optou por fazê-lo livremente).
o) Princípio da confiança
. Uma pessoa não pode ser punida quando, agindo corretamente e na confiança de que o outro também assim se comportará, dá causa a um resultado não desejado (ex.: o médico que confia em sua equipe não pode ser responsabilizado pela utilização de uma substância em dose equivocada, se para isso não concorreu; o motorista que conduz seu automóvel cuidadosamente confia que os pedestres se manterão na calçada e somente atravessarão a rua quando não houver movimento de veículos, motivo pelo qual não comete crime se atropela um transeunteque se precipita repentinamente para a via trafegável).
p) Princípio do estado de inocência ou presunção de não culpabilidade
. “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (CF, art. 5º, LVII).
q) Princípio da culpabilidade
. Como decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) e da presunção de não culpabilidade (CF, art. 5º, LVII), exsurge esse princípio, segundo o qual: a) não se admite responsabilidade penal objetiva, ou seja, desprovida de dolo ou culpa (v. art. 19 do CP) ou carente de culpabilidade (v. arts. 21 a 28 do CP); b) a pena há de ser dosada segundo o grau de reprovabilidade da conduta do agente.

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