Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
(1) Licitação ________________________________________________________________________ 1 Licitação: conceito e “aspectos”. 2 Competência legislativa na matéria. 3 Leis sobre licitação. 4 Princípios específicos do processo licitatório. 5 Modalidades de licitação, regimes licitatórios e fases do processo. 6 Regime Geral de Licitações da Lei 8.666/93. 7 Regime Especial de Licitação da Lei 10.520/02: o pregão. 8 Regime Especial de Licitação da Lei 12.462/11: o regime diferenciado de contração (parte faltante!). ________________________________________________________________________ 1 Licitação: conceito e “aspectos” Licitação é o processo administrativo pelo qual a Administração Pública – quando pretenda alienar, adquirir ou locar bens, realizar obras, ou se beneficiar da prestação de serviços, segundo condições previamente por elas estipuladas –, convoca os interessados para apresentarem propostas, a fim de selecionar a mais vantajosa a partir dos parâmetros antecipadamente estabelecidos e divulgados.1 O que justifica a instauração de processo licitatório (motivo) é exatamente a necessidade de contratar (ou a alienação, a aquisição ou a locação de bens, ou a realização de obra, ou ainda a prestação de serviços). A análise da licitação sob os aspectos gerais de toda ação administrativa revela que ela consiste em um processo de disputa (forma, ou formalidade), que visa selecionar o negócio mais vantajoso à Administração (conteúdo, finalidade interna, efeitos jurídicos imediatos), assegurando a todos o direito de participar da disputa (em observância aos imperativos de isonomia, de impessoalidade, de moralidade e de eficiência) e o desenvolvimento nacional sustentável (finalidade pública). Este processo deve ser conduzido quase sempre por uma comissão de agentes públicos – ou eventualmente por um único agente (no caso de leilão, pregão e, facultativamente, de convite) –, embora alguns atos processuais caibam a autoridades superiores (competência). 1 Cf. Bandeira de Mello (2007, p. 505). (2) 2 Competência legislativa na matéria Em Direito Administrativo, a competência legislativa em rigor é exercida em comum pelas pessoas jurídicas de direito público com capacidade política (União, Estados, Distrito Federal e Municípios): daí uma das razões para a dificuldade de codificação total deste ramo do Direito. Há, porém, algumas exceções constitucionais que acenam para um Direito Administrativo uniforme em todo o território nacional. Uma delas é precisamente o tema de licitações e contratos. De acordo com o art. 22, XXVII da Constituição, compete privativamente à União legislar sobre “normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III”. Num certo sentido, toda norma legal é geral. A generalidade é critério de distinção dos atos estatais quanto ao destinatário: as leis (e mesmo alguns atos administrativos normativos, como os regulamentos e os editais) são gerais porque se dirigem indistintamente a todas as pessoas ou a várias pessoas que se encontrem numa mesma situação jurídica. Nisto se diferenciam dos atos administrativos em sentido estrito, que se dirigem a uma ou mais pessoas, todas elas determinadas (como, por exemplo, o provimento de nomeação de um ou de vários servidores, desde que expressamente referidos). As normas a que se refere o art. 22, XXVII da Constituição são gerais no sentido de que se aplicam indistintamente à União, Estados, Distrito Federal e Municípios. São normas nacionais (dirigidas a todas as unidades da federação), por oposição às normas restritivamente federais (dirigidas apenas à União). Isto não impede que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios editem suas “normas específicas”, em caráter (3) suplementar. 2 O regime é bastante parecido com o da competência legislativa concorrente (CR, art. 24, §§ 1º e 2º). A básica diferença reside em que a ausência de normas gerais sobre licitações, por parte da União, não implica na possibilidade de os Estados legislarem plenamente, como ocorre com as questões de competência legislativa concorrente (CR, art. 24, § 3º). 3 Leis sobre licitação As normas gerais de licitações e contratos encontram-se dispostas sobretudo na Lei 8.666/93 – que é a Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos. A Lei 10.520/02 dispõe ainda sobre o regime geral das licitações na modalidade de pregão. São os dois grandes regimes licitatórios mais gerais, vigentes no Brasil. Suas normas se aplicam inteiramente à União. Aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, aplicam-se, em princípio, somente as normas gerais. O problema é identificar, na Lei 8.666/93 e na Lei 10.520/02, quais são as normas gerais (aplicáveis à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, indistintamente) e quais normas são específicas (aplicáveis à União, apenas).3 Jurisprudência O Supremo Tribunal Federal deferiu medida liminar, em sede de ação direta de inconstitucionalidade, suspendendo a eficácia de vários dispositivos da Lei 8.666/93 em face dos Estados, até final decisão. CONSTITUCIONAL. LICITAÇÃO. CONTRATAÇÃO ADMINISTRATIVA. Lei n. 8.666, de 21.06.93. I. - Interpretação conforme dada ao art. 17, I, "b" (doação de bem imóvel) e art. 17, II, "b" (permuta de bem movel), para esclarecer que a vedação tem aplicação no âmbito da União Federal, apenas. Idêntico entendimento em relação ao art. 17, I, "c" e par. 1. do art. 17. Vencido o Relator, nesta parte. II. - Cautelar deferida, em parte. (STF, ADI 927 MC/RS, Pleno, j. 03/11/1993, rel. Min. Carlos Velloso) 2 No Estado do Paraná, a Lei 15.608/07 estabelece normas sobre licitações, contratos administrativos e convênios no âmbito de todos os Poderes do Estado. 3 “A competência da União para fixar normas gerais de licitação e contrato possibilita que Estados, Municípios e Distrito Federal legislem sobre normas específicas, para seus respectivos âmbitos de atuação. O problema está na separação precisa entre normas gerais e normas específicas. De regra, Estados e Municípios ou edital leis sem dispositivos que contrariem a lei da União ou não edital lei específica e pautam suas licitações por aquela.” (Medauar, 2013, p. 192). (4) Ainda não foi julgado o mérito da ação. Mas a Lei 11.952/09 alterou a redação da al. “f” do inc. I do art. 17. Na prática, no entanto, a maior parte dos Estados e Municípios adota integralmente a Lei 8.666/93 e a Lei 10.520/02, de modo que o problema, pelo menos em termos práticos, não se põe. Existem ainda dois outros regimes licitatórios, com menor grau de generalidade. A Lei 12.232/11 dispõe normas gerais sobre licitações e contratações pela administração pública especificamente para os serviços de publicidade, que devem ser prestados por intermédio de agências de propaganda, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art. 1º). Esta lei não cria nenhuma modalidade licitatória nova; apenas estabelece normas mais específicas quando os serviços de publicidade forem objeto da contratação. A Lei 12.462/11 dispõe sobre o regime diferenciado de contratações públicas (RDC) – aqui, sim, uma modalidade licitatória inteiramente nova –, de início aplicável apenas a licitações e contratos necessários à realização dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016; da Copa das Confederações de 2013, da Copado Mundo de 2014 (restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios); e das de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais antes referidos (art. 1º, I, II e III). Mais tarde, outras leis foram arrolando novas situações em que o uso deste regime poderia ser adotado. A Lei 12.688/12 incluiu as ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A Lei 12.745/12 incluiu as obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). A Lei 13.190/15 incluiu as obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma e administração de estabelecimentos penais e de unidades de atendimento socioeducativo; as ações no âmbito da segurança pública; as obras e serviços de engenharia, relacionadas a melhorias na mobilidade urbana ou ampliação de infraestrutura (5) logística; e as locações de bens móveis e imóveis, nos quais o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial, com ou sem aparelhamento de bens, por si mesmo ou por terceiros, do bem especificado pela administração. Ainda entre as leis que disciplinam as licitações e contratos públicos, cabe citar: a Lei 8.987/95 dispõe sobre o regime geral das licitações e contratos de concessão e permissão de serviço público; e a Lei 11.079/04 dispõe sobre o regime geral das parcerias público-privadas, que são contratos de concessão de obras públicas com certas peculiaridades. Além destas, há outras leis que tratam prioritariamente de outras matérias, mas dedicam algumas normas sobre licitações e contratos públicos. A Lei 12.351/10 dispõe sobre exploração e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos em áreas do pré-sal e em áreas estratégicas. A Lei Complementar 123/06 dispõe sobre o estatuto nacional das microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP), com poucas, mas importantes disposições neste tema (artigos 42 a 49). A Lei 11.488/07 estendeu a aplicação da Lei Complementar 123/06 às cooperativas (art. 34). Recentemente foi aprovada a Lei 13.303/16, estabelecendo o estatuto jurídico das empresas estatais, abrangendo empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços (CR/88, art. 22, XXXVII c/c art. 173, § 1°, III). Tal estatuto passou a prever normas gerais sobre licitação (artigos 28 a 67) e contratação de obras, serviços, compras e alienações (artigos 68 a 84), observados os princípios da Administração Pública. 4 Princípios específicos do processo licitatório Alguns princípios do regime jurídico administrativo ganham contornos específicos em tema de licitação. Princípio da legalidade (6) O princípio da legalidade se manifesta na determinação expressa de que a pessoa licitante guarde “fiel observância do pertinente procedimento estabelecido” na lei (Lei 8.666/93, art. 4º). A Administração Pública deve rigorosamente respeitar as normas procedimentais (isto é, a seqüência de atos ordenados e encadeados entre si) constantes da lei. Em matéria de licitação, constitui importante derivação da legalidade o princípio da estrita vinculação ao instrumento convocatório (Lei 8.666/93, artigos 3º e 41). A Administração Pública não deve guardar obediência apenas à lei, como em princípio poderia parecer, senão que deverá orientar-se pelas normas da Constituição (que está acima da lei) e inclusive de seus próprios regulamentos (que estão abaixo da lei): Constituição, lei e regulamento formam o chamado “bloco de legalidade” ou bloco (ou princípio) da juridicidade. O edital (e, por extensão, a carta convite) é o que regulamenta a licitação; é a “lei da licitação” – não podendo ser desobedecida nem pela Administração (pena de invalidade), nem pelo participante (pena de inabilitação ou desclassificação, etc.). Jurisprudência O Supremo Tribunal Federal já decidiu: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCORRÊNCIA PÚBLICA. PROPOSTA FINANCEIRA SEM ASSINATURA. DESCLASSIFICAÇÃO. PRINCÍPIOS DA VINCULAÇÃO AO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO E DO JULGAMENTO OBJETIVO. 1. Se o licitante apresenta sua proposta financeira sem assinatura ou rubrica, resta caracterizada, pela apocrifia, a inexistência do documento. 2. Impõe-se, pelos princípios da vinculação ao instrumento convocatório e do julgamento objetivo, a desclassificação do licitante que não observou exigência prescrita no edital de concorrência. 3. A observância ao princípio constitucional da preponderância da proposta mais vantajosa para o Poder Público se dá mediante o cotejo das propostas válidas apresentadas pelos concorrentes, não havendo como incluir na avaliação a oferta eivada de nulidade. 4. É imprescindível a assinatura ou rubrica do licitante na sua proposta financeira, sob pena de a Administração não poder exigir-lhe o cumprimento da obrigação a que se sujeitou. 5. Negado provimento ao recurso. (STF, RMS 23640/DF, 2ª T., j. 16/10/2001, rel. Min. Maurício Corrêa) (7) O Superior Tribunal de Justiça também: ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. DESCUMPRIMENTO DE REGRA PREVISTA NO EDITAL LICITATÓRIO. ART. 41, CAPUT, DA LEI Nº 8.666/93. VIOLAÇÃO. DEVER DE OBSERVÂNCIA DO EDITAL. I - Cuida-se, originariamente, de Mandado de Segurança impetrado por SOL COMUNICAÇÃO E MARKETING LTDA, contra ato do Senhor Presidente da Comissão Especial de Licitação da Secretaria de Serviços de Radiodifusão do Ministério das Comunicações, que a excluiu da fase de habilitação por ter entregue a documentação exigida para essa finalidade com 10 (dez) minutos de atraso. II - O art. 41 da Lei nº 8.666/93 determina que: "Art. 41. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada." III - Supondo que na Lei não existam palavras inúteis, ou destituídas de significação deontológica, verifica-se que o legislador impôs, com apoio no Princípio da Legalidade, a interpretação restritiva do preceito, de modo a resguardar a atuação do Administrador Público, posto que este atua como gestor da res publica. Outra não seria a necessidade do vocábulo "estritamente" no aludido preceito infraconstitucional. IV – “Ao submeter a Administração ao princípio da vinculação ao ato convocatório, a Lei nº 8.666 impõe o dever de exaustão da discricionariedade por ocasião de sua elaboração. Não teria cabimento determinar a estrita vinculação ao edital e, simultaneamente, autorizar a atribuição de competência discricionária para a Comissão indicar, por ocasião do julgamento de alguma das fases, os critérios de julgamento. Todos os critérios e todas as exigências deverão constar, de modo expresso e exaustivo, no corpo do edital.” ([Marçal Justen Filho], in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Editora Dialética, 9ª Edição, pág. 385) V - Em resumo: o Poder Discricionário da Administração esgota-se com a elaboração do Edital de Licitação. A partir daí, nos termos do vocábulo constante da própria Lei, a Administração Pública vincula-se "estritamente" a ele. VI - Recurso Especial provido. (STJ, REsp 421.946/DF, 1ª T., j. 07/02/2006, rel. Min. Francisco Falcão) Princípio da máxima competitividade e da razoabilidade O processo licitatório é, essencialmente, um processo de disputa, um processo de competição, travado entre os vários interessados em contratar com a Administração que cumpram as condições editalícias. Nos termos do art. 37, XXI da Constituição, as obras, serviços,compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública cujo ato convocatório somente poderá estabelecer as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (8) A Lei 8.666/93, de seu turno, proíbe os agentes públicos de “admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo” (art. 3º, §1º, I). Parte-se do suposto, portanto, de que quanto maior o número de competidores, maiores as chances de a Administração selecionar uma melhor proposta. Com base nesta ordem de ideias, em alguns casos os tribunais tem admitindo alguma refração do princípio da estrita vinculação ao instrumento convocatório em vista do princípio da razoabilidade, quando as exigências editalícias não forem consideradas adequadas, necessárias ou úteis a que a Administração alcance a contratação mais vantajosa, exatamente por limitar o número de competidores. Jurisprudência O Supremo Tribunal Federal já decidiu: ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. HABILITAÇÃO. EXIGÊNCIA EXCESSIVA. 1. É excessiva a exigência feita pela administração pública de que, em procedimento licitatório, o balanço da empresa seja assinado pelo sócio-dirigente, quando a sua existência, validade e eficácia não foram desconstituídas, haja vista estar autenticado pelo contador e rubricado pelo referido sócio. 2. Há violação ao princípio da estrita vinculação ao Edital, quando a administração cria nova exigência editalícia sem a observância do prescrito no § 4º, art. 21, da Lei nº 8.666/93. 3. O procedimento licitatório há de ser o mais abrangente possível, a fim de possibilitar o maior número possível de concorrentes, tudo a possibilitar a escolha da proposta mais vantajosa. 4. Não deve ser afastado candidato do certame licitatório, por meros detalhes formais. No particular, o ato administrativo deve ser vinculado ao princípio da razoabilidade, afastando-se de produzir efeitos sem caráter substancial. 5. Segurança concedida. (STJ, MS 5.631/DF, 1ª S., j. 13/05/1998, rel. Min. José Delgado) Princípio da liberdade de participação na disputa, da impessoalidade, da isonomia e da igualdade formal Em uma de suas dimensões, o princípio da impessoalidade se confunde com o princípio da isonomia ou da igualdade formal: em razão dele, a Administração Pública (9) não pode impor discriminações entre os particulares, sejam benéficas, sejam detrimentosas.4 Nos termos do art. 37, XXI da Constituição, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes. O mesmo princípio é proclamado pela Lei 8.666/93, que alude expressamente assim à isonomia como à impessoalidade (art. 3º). A licitação, portanto, deve assegurar a liberdade de participação de todos os interessados, desde que preencham os requisitos objetivos e razoáveis previstos em lei e no regulamento da licitação (edital). Para tanto, o edital deve indicar o objeto do contrato através de características gerais. A Lei 8.666/93, por exemplo, proíbe “a realização de licitação cujo objeto inclua bens e serviços sem similaridade ou de marcas, características e especificações exclusivas” (art. 7º, § 5º). A Lei 10.520/02, de igual modo, somente permite o uso do pregão para contratação de “bens e serviços comuns”, assim entendidos “aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado” (art. 1º, par. único). Portanto, em princípio, fica proibido qualquer direcionamento das contratações. Jurisprudência Entretanto, o Tribunal de Contas da União tem súmula no sentido de excepcionalmente admitir a designação de marca, desde que haja justificativa. Súm. 270/TCU – “Em licitações referentes a compras, inclusive de softwares, é possível a indicação de marca, desde que seja estritamente necessária para atender a exigências de padronização e que haja prévia justificação.” Diante de vários participantes, o processo de escolha do interessado em contratar com a Administração se sujeita em regra a julgamento segundo critérios objetivos, e não à vontade subjetiva dos agentes públicos: daí o subprincípio do julgamento objetivo, como 4 Cf. Bandeira de Mello (2007, p. 110). (10) derivação específica do princípio da impessoalidade, no aspecto em que se relaciona com o princípio da isonomia ou da igualdade formal (Lei 8.666/93, artigos 3º, cabeça, e 45).5 Há exceções a este princípio em caso de empate. A Lei 8.666/93 assegura, nestes casos, uma primeira regra: terão preferência os bens e serviços: (i) produzidos no país; (ii) produzidos ou prestados por empresas brasileiras; (iii) produzidos ou prestados por empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no país (art. 3º, § 2º). A Lei Complementar 123/06 estabeleceu ainda um outro critério de desempate: a preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte. Esta lei considera “empate” não a exata equivalência de propostas de preços, mas inclusive “aquelas situações em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% (dez por cento) superiores à proposta mais bem classificada”, ou “de até 5% (cinco por cento) superior ao melhor preço” quando a modalidade for o pregão (art. 44, §§ 1º e 2º). Princípio da igualdade material (discriminação positiva) A igualdade não se resume apenas a uma perspectiva formal, de asseguramento da igualdade perante a lei (CR, art. 5º, primeira parte); ela comporta também uma perspectiva material (CR, art. 5º, segunda parte), em que a igualdade se dá através da lei. Por esta perspectiva, a igualdade consiste em tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente, no limite de suas desigualdades. Os princípios da impessoalidade e da ampla liberdade de participação sofrem, portanto, uma certa refração pelo princípio da isonomia ou da igualdade material, que justifica uma discriminação no sentido de promover uma melhoria da situação dos menos favorecidos. 5 Deste subprincípio deriva ainda um outro, que Di Pietro (2013, p. 385) e Meirelles (1991, p.245) chamam de princípio da adjudicação compulsória, significando que, concluído o processo licitatório, obrigatoriamente tenha a Administração que atribuir o objeto (contrato) ao vencedor, ressalvada a hipóteses de desistência justa (art. 43, § 6º). A proclamação do participante como vencedor da licitação (adjudicação) não lhe garante o direito à celebração do contrato, já que pode haver anulação ou mesmo revogação do certame (art. 49). (11) Vários dispositivos da Constituição autorizam este tratamento discriminatório (artigos 3º, III; 43; 146, III, “d”; 165, § 7º; 179; etc.). Mas especialmente o art. 170, VII e IX indicam como princípios da Ordem Econômica a “redução das desigualdades regionais e sociais” e o “tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país.” Daí a previsão, na Lei Complementar 123/06, de que nas contratações públicas da União, dos Estados e dos Municípios, deva ser concedido “tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica”, desde que haja previsãolegal pela respectiva pessoa política (art. 47). Para tanto, a Administração Pública poderá realizar processo licitatório: (i) direcionado a licitação exclusivamente à participação de microempresas e empresas de pequeno porte, desde que o valor das contratações não ultrapasse R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); (ii) impondo aos licitantes a subcontratação de microempresa ou de empresa de pequeno porte, desde que o percentual máximo do objeto a ser subcontratado não exceda a 30% (trinta por cento) do total licitado; (iii) estabelecendo uma reserva de cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto licitado para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte, desde que se trate de aquisição de bens e serviços divisíveis (art. 48). O valor licitado por meio do disposto neste artigo não poderá exceder a 25% (vinte e cinco por cento) do total licitado em cada ano civil (art. 48, § 1º).6 No mesmo sentido, a Lei 8.666/93 (com a redação dada ulteriormente pela Lei 12.349/10) passou a prever a possibilidade de o Poder Executivo federal definir um regime de privilégio semelhante a uma reserva de cotas, consistente no estabelecimento 6 Nos termos da mesma lei (art. 49), este regime de privilégio somente será aplicado: (i) quando houver expressa previsão no edital (o que remete a Administração ao princípio da estreita vinculação ao instrumento convocatório); (ii) quando não resultar prejuízo à competitividade (é mister que haja um mínimo de três fornecedores competitivos enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório, conforme exige o art. 49, II); e quando não resultar prejuízo à Administração Pública (exigência que de certa forma esvazia a política, haja vista a tendência de as micro e pequenas empresas apresentarem preços superiores em relação às de médio e grande porte). (12) de uma “margem de preferência para os produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras” (art. 3º, § 5º).7 Produtos manufaturados e serviços nacionais resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País poderão ter uma margem de preferência adicional (art. 3º, § 7º) – desde que, na soma total, não seja ultrapassado o montante de 25% (vinte e cinco por cento) do preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros (art. 3º, § 8º).8 Publicidade “A licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura” (Lei 8.666/93, art. 3º, § 3º). Portanto, em regra, todos os atos do processo licitatório são públicos. Várias outras disposições da Lei 8.666/93 homenageiam este princípio, como aquela que faculta a “qualquer cidadão acompanhar o seu desenvolvimento, desde que não interfira de modo a perturbar ou impedir a realização dos trabalhos” (art. 4º, segunda parte), ou aquelas que disciplinam a forma de publicação dos atos (art. 21), e a que disciplina os registros cadastrais de fornecedores de bens e serviços (art. 34, § 1º). É exceção a este princípio a determinação de que as propostas sejam mantidas sob sigilo até o momento oportuno da audiência de julgamento e classificação (artigos 3º, § 3º; 43, II; e 94). Princípio da eficiência 7 Esta margem – poderá ser estendida, total ou parcialmente, aos bens e serviços originários dos Estados- partes do Mercosul (Lei 8.666/93, art. 3º, § 10) – deverá ser estabelecida com base em estudos, revistos periodicamente dentro de no máximo 5 (cinco) anos, que levem em consideração : “I - geração de emprego e renda; II - efeito na arrecadação de tributos federais, estaduais e municipais; III - desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País; IV - custo adicional dos produtos e serviços; e V - em suas revisões, análise retrospectiva de resultados.” (Lei 8.666/93, art. 3º, § 6º). 8 Os regimes de privilégios (isto é, as margens de preferência) não se aplicam aos bens e aos serviços cuja capacidade de produção ou prestação no País seja inferior: “I - à quantidade a ser adquirida ou contratada; ou II - ao quantitativo fixado para o fim de para preservar a economia de escala” (art. 23, § 7º), quando for o caso. (art. 3º, § 9º) (13) Presume a lei que a prévia licitação produza a melhor contratação.9 Daí dizer a Lei 8.666/93 que a licitação se destina a “selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração” (art. 3º).10 Princípio da moralidade e probidade A exigência constitucional de se estabelecer, como requisito formal de validade, um processo licitatório previamente a qualquer contratação com os particulares, sobre assegurar a igualdade e a impessoalidade (evitando o direcionamento dos contratos), assegura também automaticamente a preservação da moralidade administrativa (CR, art. 37). Além disso, “não há dúvida de que, sem usar a expressão improbidade administrativa, a Lei 8.666/93, nos artigos 89 a 99, está punindo, em vários dispositivos, esse tipo de infração”.11 A Lei 8.429/91 considera ato de improbidade frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente (art. 10, VIII). O Código Penal considera crime a conduta de utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de “exame ou processo seletivo previstos em lei” (art. 311-A, IV), prescrevendo pena de reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. 5 Modalidades de licitação, regimes licitatórios e fases do processo As principais modalidades de licitação são disciplinadas pela Lei 8.666/93: a concorrência, a tomada de preços, o convite, o concurso e o leilão. A Lei 10.520/02 instituiu uma nova modalidade: o pregão, à qual se aplicam subsidiária e supletivamente as normas do regime geral da Lei 8.666/93 (tanto sobre licitações como sobre contratos). Por fim, a Lei 12.462/11 instituiu o regime diferenciado de contratação (RDC) como 9 Cf. Justen Filho (2014, p. 228). 10 Há divergência de conteúdo do princípio da eficiência nas Leis 8.666/93 e 10.520/02, em comparação com a Lei 12.462/10. 11 Di Pietro (2012, p. 340). (14) modalidade nova, sem aplicação subsidiária da Lei 8.666/93, a não ser quando ela mesma o afirme. Qualquer seja a modalidade de licitação e o regime licitatório, de forma geral uma licitação possui dois grandes momentos: a) Momento interno: É o momento em que se instaura o processo, mediante requerimento de contratação pela autoridade interessada, com a indicação sucinta dos efeitos jurídicos da pretensão negocial e de seu objeto (alienação ou compra de bem, prestação de serviço, execução de obra), bem como dos valores e a justificativa da contratação.12 Este requerimento deve estar acompanhado da comprovação dos valores (orçamentos, laudos de avaliação, planilhas de custos, etc.) e, quando o contrato for oneroso para a Administração, deve também indicar a existência de recurso próprio para realizar a despesa. O requerimento (com os documentos que o acompanham) será devidamente autuado, protocolado e numerado, sendo nestes autos juntados oportunamente uma série de outros documentos (art. 38).13 Neste momento, tem lugar a elaboração das minutas de edital e de contrato (convênio ou outro ajuste de natureza diversa), convênio ou ajuste – para o quê se faz necessária a observância de alguns requisitos e vedações contidos na Lei 8.666/93.14 Ainda antes do momento externo, as minutasde editais de licitação e de contrato (ou convênio, etc.), devem ser previamente examinadas e aprovadas pelo órgão de assessoria jurídica da Administração, mediante parecer (art. 38, par. único). 12 Por vezes, a justificativa da contratação poderá ser bastante genérica ou implícita – por exemplo, para aquisição de material de expediente. Em outras, a ação administrativa que pretende implementar através da contratação deverá exigir maior motivação. 13 Excepcionalmente, quando “o valor estimado para uma licitação ou para um conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas for superior a 100 (cem) vezes o limite previsto no art. 23, inciso I, alínea ‘c’, o processo licitatório será iniciado obrigatoriamente com uma audiência pública concedida pela autoridade responsável, com antecedência mínima de 15 (quinze) dias úteis da data prevista para a publicação do edital, e divulgada, com a antecedência mínima de 10 (dez) dias úteis de sua realização, pelos mesmos meios previstos para a publicidade da licitação, à qual terão acesso e direito a todas as informações pertinentes e a se manifestar todos os interessados” (art. 39). O par. único deste artigo define o que sejam licitações simultâneas e sucessivas. 14 Há requisitos para a contratação de obras e serviços (art. 7º, § 2º), compras (art. 14). Também há vedações diversas conforme o objeto do contrato (art. 7º, §§ 3º, 4º e 5º), ou conforme os participantes (art. 9º). Há requisitos do edital e do contrato ou convênio (art. 40). (15) b) Momento externo: Tem início com convocação dos interessados, seguindo-se os demais atos do procedimento, que de maneira geram contemplam as seguintes outras fases, qualquer seja modalidade de licitação: habilitação dos proponentes, julgamento e classificação das propostas, homologação do processo e adjudicação do objeto do contrato.15 6 Regime Geral de Licitações da Lei 8.666/93 Destinatários do dever de licitar Ficam subordinados ao regime geral de licitações e contratos imposto pela Lei 8.666/93 os órgãos da Administração Pública direta e indireta (autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, inclusive as demais entidades controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público) de cada uma das esferas da Federação (art. 1º, par. único) – desde que desenvolvam atividade típica de Estado.16 Hipóteses de cabimento As modalidades de licitação estabelecidas pela Lei 8.666/93 têm ampla possibilidade de cabimento, podendo ser utilizadas para: (a) obras e serviços de engenharia (artigos 7º a 12); (b) serviços técnicos especializados (art. 13); (c) compras (artigos 14 a 16); (d) alienações (artigos 17 a 19). Comissão de licitações Os processos licitatórios regulados pela Lei 8.666/93 deverão ser conduzidos por “comissão permanente ou especial de, no mínimo, 3 (três) membros, sendo pelo menos 2 15 “85. Entendemos …” (Bandeira de Mello, 2007, p. 555). 16 As empresas estatais que explorem atividade econômica com fundamento no art. 173 da Constituição seguem regime próprio, estabelecido pela Lei 13.303/16. (16) (dois) deles servidores qualificados pertencentes aos quadros permanentes dos órgãos da Administração responsáveis pela licitação” (art. 51). Embora o dispositivo diga que a comissão deverá processar apenas a “habilitação preliminar, a inscrição em registro cadastral, a sua alteração ou cancelamento, e as propostas”, na prática ela acaba atuando mesmo antes, na fase interna de elaboração do ato convocatório (edital ou carta-convite). A investidura dos membros das comissões permanentes deve ser de no máximo um ano, vedada a recondução da totalidade de seus membros para a mesma comissão no período subsequente (art. 51, § 4º). Eles respondem solidariamente por todos os atos praticados pela Comissão, salvo se posição individual do membro divergente estiver devidamente fundamentada e registrada em ata lavrada na reunião em que tiver sido tomada a decisão (art. 51, § 3º). A comissão para julgamento dos pedidos de inscrição em registro cadastral, bem como sua alteração ou cancelamento, será integrada por profissionais legalmente habilitados no caso de obras, serviços ou aquisição de equipamentos (art. 51, § 2º). No caso de concurso, o julgamento será feito por uma Comissão Especial de Licitação, integrada por pessoas de reputação ilibada e reconhecido conhecimento da matéria em exame, servidores públicos ou não (art. 51, § 5º). No caso de convite, a Comissão de Licitação, excepcionalmente poderá ser substituída por servidor formalmente designado pela autoridade competente, desde que se cuide de pequena unidade administrativa e haja exigüidade de pessoal disponível (art. 51, § 1º). Concorrência, tomadas de preços, convite, concurso e leilão “Concorrência é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto” (art. 22, § 1º). “Tomada de preços é a modalidade de licitação entre interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o (17) terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualificação” (art. 22, § 2º). “Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas” (art. 22, § 3º). Basicamente, a definição da modalidade adequada entre a concorrência, a tomada de preços e o convite depende do valor e da natureza do contrato a ser celebrado (art. 23, I e II): (a) para obras e serviços de engenharia, pode a Administração adotar a modalidade de convite para contratos de valor até R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais); da tomada de preços para contratos de valor até R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais); e da concorrência para contratos de valor acima de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais); (b) para as compras e demais serviços, pode a Administração adotar a modalidade de convite para contratos de valor até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); da tomada de preços para contratos de valor até R$ 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais); e da concorrência para contratos de valor acima de R$ 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais). Nas licitações internacionais em regra deve se utilizar a concorrência, a menos que o órgão ou entidade disponha de cadastro internacional de fornecedores, ocasião em poderá ser utilizada a tomada de preços; quando não houver fornecedor do bem ou serviço no país, poderá ser utilizado o convite. Em um e outro caso, deverão ser observados os limites acima (art. 23, § 3º). Mesmo quando, pelo valor, “couber convite, a Administração poderá utilizar a tomada de preços e, em qualquer caso, a concorrência” (art. 23, § 4º), mas a recíproca não (18) é verdadeira. Tanto que a Lei 8.666/93 veda “a utilização da modalidade ‘convite’ ou ‘tomada de preços’, conforme o caso, para parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de ‘tomada de preços’ou ‘concorrência’, respectivamente” (art. 23, § 5º). A concorrência é a modalidade de licitação obrigatória, qualquer que seja o valor de seu objeto (art. 23, § 3º): a) nas concessões de direito real de uso; b) nas aquisições e alienações de bens imóveis – salvo para a alienação de bens “cuja aquisição haja derivado de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento” (art. 19), ocasião poderá ser utilizado o leilão. Nas alienações de bens móveis, também a regra será a utilização concorrência. Contudo, se os bens forem avaliados, isolada ou globalmente, em quantia não superior ao limite previsto no art. 23, II, “b” – de R$ 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil reais) –, também poderá ser utilizado o leilão. É ainda obrigatória a utilização da modalidade de concorrência: a) nos contratos de empreitada integral (art. 6º, VIII, “e” e art. 21, § 2º, I, “b” e II, “a” e “b”);17 b) nas concessões de obra ou serviço público (Lei 8.987/95, art. 2º, II). Por fim, a concorrência é modalidade obrigatória para formação de sistema registro de preços para as compras da Administração (art. 15, II e § 3º, I).18 Contudo, 17 Cf. Bandeira de Mello, 2007, p. 535. 18 “O ‘registro de preços’ e um procedimento que a Administração poder adotar perante compras rotineiras de bens padronizados ou mesmo na obtenção de serviço. Neste caso, como presume que irá adquirir os bens ou recorrer a estes serviços não uma, mas múltiplas vezes, abre um certame licitatório em que o vencedor, isto é, o que ofereceu cotação mais baixa, terá seus preços ‘registrados’. Quando a promotora do certame necessitar destes bens ou serviços irá obtê-los, sucessivas vezes se for o caso, pelo preço cotado e registrado.” (Bandeira de Mello, 2007, p. 547). Anota ainda que a existência de preços registrados não obriga a Administração a firmar futuramente os contratos com os respectivos fornecedores, posto que poderá, se quiser, obter os mesmos bens por outros meios (nova licitação específica); de toda forma, fica assegurado ao beneficiário do preço registrado o direito de preferência na contratação, em igualdade de condições (Ibidem, p. 548). (19) quando se tratar de aquisição de “bens e serviços comuns”, a Lei 10.520/02 admite a formação de sistema de registro de preços mediante modalidade de pregão (art. 11). O concurso “é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias” (art. 22, § 4º). Por fim, leilão “é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para a venda de bens móveis inservíveis para a administração ou de produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis prevista no art. 19, a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação” (art. 22, § 5º). Convocação dos interessados O ato por meio do qual a Administração convoca os interessados a participarem da disputa é o edital de licitação – ou a carta-convite, no caso específico do convite. É unilateral e tem conteúdo normativo (na medida em que regulamenta o procedimento). O edital deverá conter um preâmbulo com o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que é regida pela Lei 8.666/93, além do local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes (art. 40), indicando obrigatoriamente ainda uma série de condições enumeradas nos incisos do próprio art. 40, que, com base em Justen Filho (2016, p. 355), podem ser sintetizadas nos seguintes termos: (i) normas procedimentais e especificação de orientações gerais, abrangendo: (a) sequência de atos propriamente dita; (b) objeto do processo;19 19 Apesar de o art. 40, I dizer que o edital deve fazer apenas uma “descrição sucinta e clara” do objeto do contrato, o art. 14, afirma que “nenhuma compra será feita sem a adequada caracterização de seu objeto”. Embora uma leitura inicial dê a entender que a aplicação da disposição é restrita às compras, ela deve ser observada para toda e qualquer pretensão contratual da Administração. Daí o entendimento sumulado pelo Tribunal de Contas da União: “Súm. 177/TCU – A definição precisa e suficiente do objeto licitado constitui regra indispensável da competição, (20) (c) obtenção de informações (data, local, hora); (d) produção de atos (data, local, hora). (ii) condições de participação, abrangendo: (a) requisitos de habilitação; (b) casos de impedimento de participação; (c) admissibilidade ou não da participação de consórcios; (d) forma de apresentação de documentos e propostas; (iii) critérios de julgamento, abrangendo: (a) critérios de admissibilidade das propostas; (b) critérios de julgamento das propostas (tipos de licitação); (c) critérios de admissibilidade de preço unitário e global; (d) padrão de qualidade mínima e critérios de avaliação da vantajosidade; (iv) normas sobre o contrato, abrangendo: (a) obrigações e direitos das partes, inclusive as prerrogativas próprias de Poder Público da Administração; (b) preço e condições de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro; (c) hipóteses de rescisão de contrato; (d) sanções. O edital poderá ser impugnado por qualquer cidadão, que deverá “protocolar o pedido até 5 (cinco) dias úteis antes da data fixada para a abertura dos envelopes de habilitação” – indicado no edital (art. 40, caput) – “devendo a Administração julgar e responder à impugnação em até 3 (três) dias úteis”, além de poder denunciar tal irregularidade ao Tribunal de Contas e ao sistema de controle interno (art. 113, § 1º), ou mesmo ao Ministério Público (art. 41, § 1º). até mesmo como pressuposto do postulado de igualdade entre os licitantes, do qual é subsidiário o princípio da publicidade, que envolve o conhecimento, pelos concorrentes potenciais, das condições básicas da licitação, constituindo, na hipótese particular da licitação para compra, a quantidade demandada em uma das especificações mínimas e essenciais à definição do objeto do pregão.” (21) Também os interessados em participar da licitação poderão “impugnar os termos do edital de licitação perante a administração”, desde que “até o segundo dia útil que anteceder a abertura dos envelopes de habilitação” (art. 41, § 2º). Esta impugnação não tem efeito de recurso, e não “o impedirá de participar do processo licitatório até o trânsito em julgado da decisão a ela pertinente” (art. 41, § 3º). Dada a sua submissão ao princípio da legalidade, tem a doutrina entendido que mesmo a intempestividade de ambas as impugnações não impede a Administração de acatá-las. Habilitação e sistema cadastral (o que é, como ocorre) Nos termos do art. 27 da Lei 8.666/93, para a habilitação exigir-se-á dos interessados, exclusivamente a documentação relativa à: habilitação jurídica; qualificação técnica; qualificação econômico-financeira; regularidade fiscal; e cumprimento do disposto no inc. XXXIII do art. 7º da Constituição (que proíbe o uso de mão de obra infantil). Os documentos necessários à habilitação poderão ser apresentados em original, por qualquer processo de cópia autenticada por cartório competente ou por servidor da administraçãoou publicação em órgão da imprensa oficial (art. 32). Os artigos 28, 30, 31 e 29 arrolam, respectivamente, quis exigências poderão ser feitas para comprovar habilitação em cada uma dessas áreas. Todos estes dispositivos devem ser interpretados à luz da norma constitucional segundo a qual “as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública […], o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações” (art. 37, XXI). Como se vê, a Constituição autoriza a Administração a acautelar-se contra participantes que não tenham condições mínimas de cumprir as obrigações contratuais que lhes correspondam, mas sem frustrar o caráter competitivo do certame. Quanto às exigências relativas à habilitação jurídica, ainda que não mencionadas na norma constitucional, não parece que elas sejam desarrazoadas e ilegítimas. Com (22) efeito, o que exige o art. 28 são documentos mínimos que comprovem a presença de pressupostos necessários para produzir um contrato existente e válido, conforme a categoria da pessoa a ser contratada.20 As exigências de qualificação técnica e econômico-financeira disciplinadas nos artigos 30 e 31, respectivamente, também não suscitam maiores dúvidas, posto que mencionadas expressamente na norma constitucional. A qualificação técnica consiste em exigir dos participantes do torneio a comprovação de possuírem conhecimentos e habilidades práticas e teóricas para executar o objeto do contrato – podendo abranger (o que não significa que “devam sempre” abranger): o registro ou inscrição nos órgãos competentes, quando a lei assim o exigir;21 a comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos;22 a comprovação de que recebeu os documentos 20 Cf. Justen Filho, 2014, p. 309. Exige-se, portanto, a apresentação: de cédula de identidade para as pessoas físicas que, em nome individual, explorem, habitual e profissionalmente, qualquer atividade econômica de natureza civil ou comercial, com o fim especulativo de lucro, mediante venda a terceiros de bens ou serviços (cf. Lei 4.506/64, art. 41, § 1º, “b” e Decreto 3.000/99, art. 150, II); da inscrição da declaração de firma individual no registro competente; do ato constitutivo (estatuto ou contrato social em vigor), devidamente registrado, em se tratando de sociedades empresárias, acompanhado de documentos de eleição de seus administradores no caso de sociedades anônimas; registro do ato constitutivo no órgão competente, no caso de sociedades simples, acompanhada de prova de diretoria em exercício; e, nos casos ressalvados pelo par. único do art. 170 da Constituição, decreto de autorização, em se tratando de sociedade estrangeira com empresa em funcionamento no país, bem como o ato de registro ou autorização para funcionamento expedido pelo órgão competente, quando a atividade assim o exigir. 21 Cf. Justen Filho (2014, p. 327). Acentua ele que “o inc. I do art. 30 somente pode ser aplicado se e quando houver uma lei restringindo o livre exercício da profissão”, uma vez que “a Constituição veda a compulsoriedade de associação (art. 5º, inc. XX)” e “o art. 5º, inc. XIII, assegura a liberdade de profissão, ressalvando apenas as qualificações profissionais estabelecidas em lei” (Ibidem, p. 329). 22 Esta é sem dúvida a exigência mais problemática. Conforme anota Justen Filho, distingue-se “qualificação técnico-operacional” de “qualificação técnico-profissional”: a primeira relacionada à empresa que participa da licitação, envolvendo a comprovação de que tenha participado anteriormente de contrato cujo objeto era similar ao previsto no edital da licitação que esteja participando, sendo avaliada a habilidade de agrupar pessoas, bens e recursos, imprimindo a esse conjunto a organização necessária para executar a obra ou serviço; a segunda relacionada aos profissionais do quadro permanente da empresa, envolvendo a comprovação de acervo técnico que contemple responsabilização pela execução passada de obra ou serviço (de engenharia) semelhante àquela objeto do edital de licitação (cf. Justen Filho, 2014, pp. 332-333). Ocorre que o projeto de lei que resultou na Lei 8.666/93 (e posteriormente também o projeto de lei de que resultou a Lei 8.883/94) foi parcialmente vetado pelo Presidente da República, suprimindo o inc. II do § 1º do art. 30, que acabou ficando “meio capenga”, ao dizer apenas: “§ 1º. A (23) e, quando exigido, de que tomou conhecimento de todas as informações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da licitação;23 e a prova de atendimento de outros requisitos previstos em lei especial, se for o caso. A qualificação econômico-financeira concerne à disponibilidade de recursos para a adequada execução do objeto do contrato, haja vista que em regra o contratado deverá executá-lo com recursos próprios (Justen Filho, 2014, p. 351). Nos termos do art. 31 podem ser exigidos: balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social, que comprovem a boa situação financeira da empresa; certidão negativa de falência expedida pelo distribuidor da sede da pessoa jurídica, ou de execução patrimonial, expedida no domicílio da pessoa física;24 prestação de garantia, limitada a 1% (um por cento) do valor estimado do objeto da contratação, observadas as modalidades e critérios previstos no art. 56, cabeça e § 1º. A exigência de qualificação comprovação de aptidão referida no inciso II do caput deste artigo, no caso das licitações pertinentes a obras e serviços, será feita por atestados fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente registrados nas entidades profissionais competentes, limitadas as exigências a: I – capacitação técnico-profissional: comprovação do licitante de possuir em seu quadro permanente, na data prevista para entrega da proposta, profissional de nível superior ou outro devidamente reconhecido pela entidade competente, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, limitadas estas exclusivamente às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto da licitação, vedadas as exigências de quantidades mínimas ou prazos máximos”. Diante disso, formaram duas correntes: a primeira sustenta que “a exigência de capacidade técnica operacional pode ser imposta com fundamento diretamente no inc. II do art. 30”; a segunda “toma em vista que o § 1º do art. 30 explicitamente determina a extensão dos requisitos de qualificação técnica previstos no inc. II” para afirmar não ser possível a aplicação direta do inc. II, haja vista que o § 5º do mesmo art. 30 vedada quaisquer outras exigências não previstas nesta lei, que inibam a participação na licitação, o que exclui a exigência de capacidade técnica operacional. Na opinião do autor, embora a melhor interpretação isolada da lei seja a da segunda corrente, a que mais se coaduna com o interesse público protegido pela CF é a da primeira: “Diante disso, deve-se adotar para o art. 30 interpretação conforme à Constituição. A ausência de explícita referência, no art. 30, a requisitos de capacitação técnico-operacional não significa vedação à sua previsão. A cláusula de fechamento contida no § 5º nãose aplica à capacitação técnico-operacional, mas a outras exigências” (Ibidem, pp. 334-335). Ressalva, contudo, que o “exame da jurisprudência revela inclinações as mais diversas e opostas entre si” (Ibidem, p. 335). 23 Requisito este inútil, na medida em que não tem nada que ver com qualificação técnica: “Não se pode inferir que o conhecimento das peculiaridades do objeto autoriza alguma presunção acerca de qualificação técnica. As condições técnicas do licitante independem de requisitos formais e burocráticos dessa ordem” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, p. 347). 24 Justen Filho aponta, aqui, a inconstitucionalidade do dispositivo por violação ao princípio da isonomia: é que ele exige “certidão negativa de falência ou concordata” (o que pressuporia ação falimentar com decretação do estado de falência por decisão transitada em julgado) para pessoas jurídicas, e “certidão negativa de execução patrimonial” (em trâmite) para pessoas físicas. No seu entender, a “insolvência tanto de pessoas jurídicas como de pessoas físicas pode ser presumida pela existência de processos de falência, concordata ou execução”, de maneira que se deve interpretar a regra no sentido de que deva ser exigida certidão negativa de pedido de falência ou concordata, mesmo que não haja decisão (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, p. 355). Saliente-se que a L 11101/05 (Lei de Falências) aboliu o instituto da concordata. (24) econômico-financeira deverá ser proporcional ao vulto do contrato (obra, serviço, compra ou alienação), e a comprovação de boa situação financeira do estabelecimento empresarial será feita de forma objetiva, “através do cálculo de índices contábeis previstos no edital e devidamente justificados no processo administrativo da licitação que tenha dado início ao certame licitatório, vedada a exigência de índices e valores não usualmente adotados para correta avaliação de situação financeira suficiente ao cumprimento das obrigações decorrentes da licitação” (§ 5º)25. Com relação à documentação comprobatória da regularidade fiscal, exige o art. 29 da Lei 8.666/93 a: prova de inscrição nos cadastros nacionais de pessoa física ou jurídica, ambos do Ministério da Fazenda (CPF/MF ou CNPJ/MF), conforme o caso; prova de inscrição no cadastro de contribuintes estadual ou municipal, se houver, no domicílio ou sede do licitante, pertinente ao seu ramo de atividade e compatível com o objeto contratual; prova de regularidade para com a Fazenda Federal (Secretaria da Receita Federal do Brasil e Procuradoria da Fazenda Nacional), Estadual e Municipal do domicílio ou sede do licitante; prova de regularidade relativa à seguridade social e ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Malgrado o art. 37, XXI da Constituição não aluda a exigências de regularidade fiscal para habilitação em processo licitatório, outra norma constitucional estabelece que “a pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios” (art. 195, § 3º). Daí que a exigência do art. 29, IV seja legítima. Com relação aos demais, há bastante divergência. Há quem sustente a inconstitucionalidade de todas as demais exigências.26 Outros sustentam que poderá haver inconstitucionalidade apenas nas hipóteses dos incisos II e III, e ainda assim somente se o edital exigir prova da “quitação” de débitos com o 25 É dizer, para contratos de pequeno valor, não poderá ser feitas exigências exorbitantes. E todas as exigências que porventura sejam cabíveis de se fazer, é mister que os critérios objetivos de aferição e julgamento sejam pré-estabelecidos no edital, não havendo espaço para discricionariedade. 26 Cf. Di Pietro (2014, p. 371). (25) Fisco como condição para poder participar do certame, pois o licitante pode estar em débito sem que isso comprometa o desenvolvimento de suas obrigações.27 Com relação à exigência de comprovação do cumprimento do disposto no inc. XXXIII do art. 7º da Constituição pelo inc. V do art. 27 (“proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”), sua inconstitucionalidade é indiscutível na doutrina.28 Quando as licitações são realizadas com frequência, a Administração deve implementar um sistema de registro cadastral das empresas, no qual deverão constar os documentos necessários à habilitação exigíveis pelo art. 27 (artigos 34 e 35). O registro cadastral deve ser amplamente divulgado e ficar permanentemente aberto aos interessados. No mínimo anualmente o órgão responsável por ele deverá proceder, através da imprensa oficial e de jornal diário, ao chamamento público para a atualização dos registros existentes e para o ingresso de novos interessados (art. 34, § 1º), sendo facultado às unidades administrativas utilizarem-se dos registros cadastrais umas das outras (art. 34, § 2º). A qualquer tempo poderá ser alterado, suspenso ou cancelado o registro do inscrito que deixar de satisfazer as exigências do art. 27 desta Lei, ou as estabelecidas para classificação cadastral (art. 37). Os inscritos serão classificados por categorias (conforme sua especialização) e subdivididas em grupos (segundo a qualificação técnica e econômica avaliada pelos elementos constantes da documentação relacionada nos artigos 30 e 31), e receberão um certificado de registro cadastral – que faz presumir que cumpra com todos os requisitos de 27 É o caso de Bandeira de Mello, para quem “a existência de débitos fiscais só poderá ser inabilitante se o montante deles puder comprometer a ‘garantia do cumprimento das obrigações’ que possam resultar de eventual contrato. Isso porque o art. 37, XXI, da Constituição só admite exigências que previnam este risco (Bandeira de Mello, 2007, p. 567). Força é ver, todavia, que o risco de que a existência de débito comprometa a capacidade econômica de a empresa cumprir suas obrigações se aproxima mais da habilitação técnico-financeira do que de que deste requisito. Justen Filho, de seu turno, sustenta que haverá inconstitucionalidade conforme o caso, se: a exigência de “regularização” for ampla, a ponto de abranger toda sorte de débitos (não apenas as de natureza tributária, mas também administrativa, como uma multa de trânsito por exemplo), pois extrapola o mínimo necessário; a exigência de “regularização” for ampla, a ponto de abranger débitos tributários de outros Estados ou Municípios que não os da sede do participante (Justen Filho, 2014, p. 320). 28 “A introdução do inc. V para o art. 27 apenas pode ser lamentada” (Justen Filho, 2014, p. 310). (26) habilitação –, com vigência de no máximo um ano (art. 34, caput e § 1º c/c art. 36, § 1º). “A atuação do licitante no cumprimento de obrigações assumidas será anotada no respectivo registro cadastral” (art. 36, § 2º). Mesmo os interessados que não estejam cadastrados, no entanto, poderão habilitar-se em processo licitatório, desde que exibam todos os documentos exigidos pelo edital. Microempresa e empresa de pequeno porte A Lei Complementar 123/06 trouxe inovações nesta parte, prevendo regra específica sobre a habilitação das microempresas e empresas de pequeno porte. Elas deverão apresentar toda a documentação exigida para efeito de comprovação de regularidade fiscal, mesmo que esta apresente alguma restrição (art. 43). Havendo alguma restrição, elas ainda assim poderão participar da fase seguinte(julgamento e classificação das propostas de preço). Caso tenham apresentado a melhor proposta e se classifiquem em primeiro lugar, terão o prazo de cinco dias úteis (prorrogável por igual período, a critério da Administração Pública) para a regularização da documentação, pagamento ou parcelamento do débito e emissão de eventuais certidões negativas ou positivas com efeito de certidão negativa (art. 43, § 1º). Caso não regularizem os documentos de habilitação no prazo legal, decairão do direito à contratação, sem prejuízo das sanções legais (Lei 8.666/93, art. 81). Neste caso, a Administração poderá ou convocar os licitantes remanescentes para a assinatura do contrato, observada a ordem de classificação, ou revogar a licitação (art. 43, § 2º). Julgamento e classificação O ponto dramático do processo licitatório diz com o julgamento e classificação das propostas, observados os critérios previstos no edital. (27) As propostas são apresentadas em envelopes lacrados, os quais serão abertos em sessão pública, reduzido em termo ou ata, e serão rubricadas por todos os presentes (art. 43, § 3º). É uma fase que se reparte em dois momentos. Primeiro, o de “verificação da conformidade de cada proposta com os requisitos do edital e, conforme o caso, com os preços correntes no mercado ou fixados por órgão oficial competente, ou ainda com os constantes do sistema de registro de preços, os quais deverão ser devidamente registrados na ata de julgamento, promovendo-se a desclassificação das propostas desconformes ou incompatíveis” (art. 43, IV). Depois, propriamente, o de “julgamento e classificação das propostas de acordo com os critérios de avaliação constantes do edital” (art. 43, V).29 Tais critérios deverão ser objetivos – ou seja, em regra, não há espaço para discricionariedade – e não devem contrariar as normas e princípios estabelecidos pela Lei 8.666/93 (art. 44). “É vedada a utilização de qualquer elemento, critério ou fator sigiloso, secreto, subjetivo ou reservado que possa ainda que indiretamente elidir o princípio da igualdade entre os licitantes” (art. 44, § 1º).30 Esse julgamento objetivo será realizado na conformidade com os tipos de licitação e demais critérios previamente estabelecidos no edital, assim considerados apenas os seguintes: menor preço; melhor técnica; de técnica e preço; maior lance ou oferta (art. 45). “É vedada a utilização de outros tipos de licitação não previstos neste artigo” (art. 45, cabeça e § 5º). Serão desclassificadas as propostas (art. 48): 29 Segundo Di Pietro, esta fase do procedimento se desdobra em duas: “na primeira, há a abertura dos envelopes ‘proposta’ dos concorrentes habilitados, (…) em ato público previamente designado, do qual será lavrada ata circunstanciada, assinada pelos licitantes presentes e pela comissão”, sendo que “todas as propostas serão rubricadas” (art. 40, cabeça, c/c art. 43, §§ 1º e 2º); “na segunda, há o julgamento das propostas, que deve ser objetivo e realizado de acordo com os tipos de licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de acordo com os fatores exclusivamente nele referidos” (Di Pietro, 2012, p. 375). 30 Além disso, não será considerada qualquer oferta de vantagem não prevista no edital, inclusive financiamentos subsidiados ou a fundo perdido, nem preço ou vantagem baseada nas ofertas dos demais licitantes (§ 2º), nem se admitirá proposta que apresente preços global ou unitários simbólicos, irrisórios ou de valor zero, incompatíveis com os preços dos insumos e salários de mercado, acrescidos dos respectivos encargos, ainda que o ato convocatório da licitação não tenha estabelecido limites mínimos, exceto quando se referirem a materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração (art. 44, § 3º). (28) (a) que não atendam às exigências do ato convocatório da licitação; (b) com valor global superior ao limite estabelecido ou com preços manifestamente inexeqüíveis, assim considerados aqueles que não venham a ter demonstrada sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que os coeficientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especificadas no ato convocatório da licitação. Menor preço O menor preço é o tipo de licitação em que “o critério de seleção da proposta mais vantajosa para a Administração determinar que será vencedor o licitante que apresentar a proposta de acordo com as especificações do edital ou convite e ofertar o menor preço” (art. 46, § 1º, I). Em licitações deste tipo – o mais utilizado de todos –, os interessados apresentam uma única proposta: a de preço. A atividade de julgamento e classificação das propostas é bastante simples: verificada a conformidade de cada uma das propostas de preço com os requisitos do edital (art. 43, III), basta ordená-las conforme o valor. A classificação dos licitantes se dará pela ordem crescente dos preços propostos. Maior lance ou oferta O tipo de licitação de maior lance ou oferta tem lugar nos casos de alienação de bens ou concessão de direito real de uso (art. 45, § 1º, IV). Melhor técnica e técnica e preço Os tipos de licitação melhor técnica e técnica e preço serão utilizados exclusivamente para serviços de natureza predominantemente intelectual – em especial na elaboração de projetos, cálculos, fiscalização, supervisão e gerenciamento e de engenharia consultiva em geral e, em particular, para a elaboração de estudos técnicos (29) preliminares e projetos básicos e executivos (art. 46), ressalvada a contratação de bens e serviços de informática, em que será adotado “obrigatoriamente o tipo de licitação técnica e preço” (art. 45, § 4º).31 Em licitações deste tipo, os interessados apresentam sempre duas propostas: uma de preço, outra de técnica. A atividade de julgamento e a classificação das propostas se varia, conforme o tipo seja melhor técnica ou técnica e preço: Nas licitações do tipo melhor técnica deve ser adotado o seguinte procedimento, claramente explicitado no instrumento convocatório, o qual fixará o preço máximo que a Administração se propõe a pagar (art. 46, § 1º): (i) são abertos primeiramente os envelopes contendo as propostas técnicas: (a) são avaliadas cada uma das propostas técnicas dos proponentes previamente habilitados, de acordo conforme os critérios definidos em termos claros e objetivos no instrumento convocatório (os quais deverão considerar a capacitação e a experiência do proponente, a qualidade técnica da proposta, compreendendo metodologia, organização, tecnologias e recursos materiais a serem utilizados nos trabalhos, e a qualificação das equipes técnicas a serem mobilizadas para a sua execução);32 (b) são classificadas as propostas técnicas; (ii) são abertos os envelopes contendo as propostas de preço: (a) são avaliadas cada uma das propostas de preço dos proponentes previamente classificados e que tenham atingido a valorização mínima das propostas técnicas, de acordo conforme os critérios definidos no instrumento convocatório; (b) são classificadas as propostas de preço; (iii) negociação e julgamento: 31 Excepcionalmente estes tipos de licitação (melhor técnica e técnica e preço) “poderão ser adotados, (…), para fornecimento de bens e execução de obras ou prestação de serviços de grande vulto majoritariamente dependentes de tecnologia nitidamente sofisticada e de domínio restrito, atestado por autoridades técnicas de reconhecidaqualificação, nos casos em que o objeto pretendido admitir soluções alternativas e variações de execução, com repercussões significativas sobre sua qualidade, produtividade, rendimento e durabilidade concretamente mensuráveis, e estas puderem ser adotadas à livre escolha dos licitantes, na conformidade dos critérios objetivamente fixados no ato convocatório” (art. 46, § 3º). 32 Aos licitantes que não forem preliminarmente habilitados ou que não obtiverem a valorização mínima estabelecida para a proposta técnica, serão devolvidas intactas as propostas de preços (art. 46, § 1º, IV). (30) (a) se o titular da melhor proposta de preço for também o da melhor proposta técnica, ele será declarado o vencedor da disputa; (b) do contrário, a Administração deverá iniciar uma negociação de preço, com o titular da melhor proposta técnica (com base nos orçamentos detalhados apresentados e respectivos preços unitários), tendo como referência o limite representado pela proposta de menor preço entre os proponentes que obtiveram a valorização mínima; (c) se não houver acordo com o titular da melhor proposta técnica, procedimento idêntico será adotado com o titular da segunda melhor proposta técnica – e assim sucessivamente com relação às demais, observada a ordem de classificação –, até a consecução de acordo para a contratação. Já nas licitações do tipo técnica e preço será adotado o seguinte procedimento, claramente explicitado no instrumento convocatório (art. 46, § 2º): (i) são abertos primeiramente os envelopes contendo as propostas técnicas: (a) são avaliadas cada uma das propostas técnicas dos proponentes previamente habilitados, de acordo conforme os critérios definidos em termos claros e objetivos no instrumento convocatório (os quais deverão considerar a capacitação e a experiência do proponente, a qualidade técnica da proposta, compreendendo metodologia, organização, tecnologias e recursos materiais a serem utilizados nos trabalhos, e a qualificação das equipes técnicas a serem mobilizadas para a sua execução);33 (b) são valoradas as propostas técnicas, conforme os critérios de valoração previstos no edital; (ii) são abertos os envelopes contendo as propostas de preço: (a) são avaliadas cada uma das propostas de preço dos proponentes previamente classificados e que tenham atingido a valorização mínima das propostas técnicas, de acordo conforme os critérios definidos no instrumento convocatório; 33 Aos licitantes que não forem preliminarmente habilitados ou que não obtiverem a valorização mínima estabelecida para a proposta técnica, serão devolvidas intactas as propostas de preços (art. 46, § 1º, IV). (31) (b) são valoradas as propostas de preço, conforme os critérios de valoração previstos no edital; (iii) os proponentes são classificados de acordo com a média ponderada das valorizações das propostas técnicas e de preço, de acordo com os pesos preestabelecidos no instrumento convocatório. Empate e desempate Nas licitações tipo menor preço, em caso de empate, a seleção da melhor proposta será exclusivamente determinada através de sorteio realizado em ato público previamente designado (art. 45, § 3º) – afastados, portanto, outros critérios e ordem de precedência de aplicação previstos na lei (art. 3º, § 2º). Nas licitações tipo melhor técnica, técnica e preço e maior lance ou oferta, em caso de empate, a seleção da melhor proposta será determinada mediante observância dos critérios seguintes: (i) primeiro, os critérios quanto à origem (art. 3º, § 2º): (a) produzidos no país; (b) produzidos ou prestados por empresas brasileiras. (c) produzidos ou prestados por empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País. (d) produzidos ou prestados por empresas que comprovem cumprimento de reserva de cargos prevista em lei para pessoa com deficiência ou para reabilitado da Previdência Social e que atendam às regras de acessibilidade previstas na legislação. (ii) se, observados todos estes critérios, a “igualdade de condições” persistir, o último critério é a sorte, definida através de sorteio (art. 45, § 2º). Microempresa e empresa de pequeno porte A Lei Complementar 123/06 trouxe inovações nesta parte, prevendo regra específica sobre classificação microempresas e empresas de pequeno porte, assegurando, (32) como critério de desempate, a preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte (art. 44). A lei primeiramente amplia o que se deva entender por “empate”: assim considera “aquelas situações em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% (dez por cento) superiores à proposta mais bem classificada” (art. 44, § 1º). Neste caso, “a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada poderá apresentar proposta de preço inferior àquela considerada vencedora do certame, situação em que será adjudicado em seu favor o objeto licitado” (art. 45, I). Se a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada não apresentar proposta inferior, serão convocadas as remanescentes que porventura tenham apresentado propostas de preço iguais ou até 10% (dez por cento) superiores à proposta mais bem classificada, para que exerçam o mesmo direito (art. 45, II). Caso entre duas ou mais microempresas ou empresas de pequeno porte tenha havido empate na melhor proposta de preço igual ou até 10% (dez por cento) superior à proposta mais bem classificada (art. 44, § 1º), a identificação daquela que primeiro poderá apresentar melhor oferta ocorrerá mediante sorteio (art. 45, III). Somente na hipótese de nenhuma microempresa ou empresa de pequeno porte cobrir a melhor proposta originalmente vencedora do certame é que se fará ao seu titular a adjudicação do objeto do contrato (art. 45, § 1º). Evidentemente que se a melhor oferta inicial já tiver sido apresentada por microempresa ou empresa de pequeno porte, não terá lugar a aplicação destas normas de proteção especial. Homologação Homologação é o ato posterior de controle de legalidade do procedimento (cf. atos administrativos em espécie). (33) É o momento em que a autoridade competente tem para verificar se o processo respeito todas as exigências legais. Caso o tenha, deverá ser homologado. Se forem constatados vícios – de ofício ou mediante provação de terceiros –, deverá ser determinada a sua convalidação ou, se a convalidação não for possível, deverá ser “decretada” a nulidade absoluta do processo, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado (art. 49).34 A anulação nessa fase não gera obrigação de indenizar (art. 49, § 1º). Contudo, quando decretada a nulidade mais tarde, quando já houver sido adjudicado o objeto da licitação e assinado o contrato, fica a obrigada a Administração a indenizar o contratado pelo que este houver executado até a data em que ela for decretada, e “por outros prejuízos regularmente comprovados, contanto que não lhe seja imputável, promovendo- se a responsabilidade de quem lhe deu causa” (art. 49, § 1º c/c art. 59, par. único). A decretação de nulidade do processo licitatório induz a nulidade do contrato posteriormente assinado – igualmente com direito à indenização do contratado pelo que este houver executado até a data em que ela for decretada (art. 49, § 2º). Além de dever anular o processo licitatório com vício de ilegalidade, a autoridade competente poderá revogá-lo, mas somente “por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta”
Compartilhar