Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
7° Congresso de Pós-Graduação O MOVIMENTO CIÊNCIA, TECNOLOGIA, SOCIEDADE E AMBIENTE (CTS-A) E A INTERDISCIPLINARIDADE: O DESAFIO DA FORMAÇÃO CRÍTICA Autor(es) ALAIDE BONAGURIO JULIO Co-Autor(es) ELÂNIA MARIA MARQUES BERGAMASCHI Orientador(es) MARIA GUIOMAR C. TOMAZELLO 1. Introdução A crise ambiental e seus impactos sociais, advindos de um conjunto de variáveis interconexas tais como capitalismo, industrialismo, urbanização, e tecnocracia (LOUREIRO, 2000), foram amplamente discutidos no século XX em diversas conferências intergovernamentais. Consequentemente, muitos acordos foram assinados com objetivos de reduzir o uso de combustíveis fósseis, preservar as matas que ainda restam, recuperar áreas desgastadas, tratar a água, promover orientações ao novo cidadão ecológico do século XXI e novos tributos industriais voltados para uma maior responsabilidade sócio-ambiental. Dentre estas conferências destaca-se a de Estocolmo - 72, que foi ampliada na Rio- 92, na qual novas perspectivas foram lançadas, porém com ideias ainda ingênuas de que os avanços do conhecimento científico e tecnológico seriam suficientes para gerar novos padrões de produção e utilização dos recursos naturais. Uma análise da Conferência Rio+10, em 2002, em Johanesburgo, constatou que, dos acordos assumidos com objetivo de alcançar a sustentabilidade, mesmo com os avanços científicos e tecnológicos, pouco progresso foi obtido. Sendo assim, faz-se necessário uma educação científica e tecnológica voltada para a complexidade desta sociedade, com aspectos críticos e reflexivos, a fim de minimizar as percepções fragmentadas e concepções restritas e equivocadas causadas pelos currículos disciplinares. A educação com enfoque CTS apresenta-se como uma das novas formas para se minimizar paradigmas capitalistas (BAZZO et al., 2007), mostrar as limitações e a serventia da Ciência e da Tecnologia, não para desqualificar o conhecimento, mas para desmistificar concepções. (CEREZO, 2004). O movimento CTS, surgido nas décadas de 60/70 do século XX tinha como objetivo rever a concepção clássica das relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade representada pela equação: +ciência=+ tecnologia=+ riqueza=+ bem-estar social. (CEREZO, 2004, p.12). Desenvolver conteúdos de CTS-A possibilita articulação de especificidades de cada ciência em um todo (interligação das ciências) e, ao mesmo tempo, visa analisar as consequências dessa relação, sempre respeitando as particularidades culturais em seu movimento histórico. Para um estudo dinâmico, que estabeleça relações entre os conteúdos ensinados e sua aplicação em relação ao movimento CTSA, é preciso atender às transformações sócio-ambientais e às novas necessidades frente às mudanças ocorridas. (CARVALHO, 2008). A interdisciplinaridade permite a unicidade das ciências e busca a reciprocidade de suas áreas, ultrapassando a segmentação e a mutilação do ser e do conhecimento, e tem por objetivo desfragmentar, dar vida e problematizar o conteúdo trabalhado. Para Novo (1997), interdisciplinaridade pode ser entendida como um processo no qual se produz uma cooperação articulada de diferentes perspectivas para a interpretação e/ou solução de questões concretas, de ordem intelectual ou prática. Mas nem todo processo interdisciplinar promove uma formação crítica, que auxilie as pessoas na tomada de decisões compartilhadas em relação às questões que envolvem CTS-A. Refletir sobre esse processo é o nosso interesse. 2. Objetivos Este trabalho tem por objetivo refletir sobre as possibilidades de uma formação crítica dos alunos, geradas pela introdução de atividades, disciplinas e projetos interdisciplinares com ênfase em Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTS-A), movimento que visa tanto à alfabetização científica quanto à participação dos cidadãos nos assuntos tecnocientíficos de interesse social. 3. Desenvolvimento As reflexões que se apresentam estão pautadas na revisão de diversos artigos procedentes do movimento CTS-A, elaborados por especialistas sobre o tema, dentre outros. Assim, trata-se de uma pesquisa bibliográfica com apresentação de dados descritivos. Os mesmos foram obtidos ao longo de estudos sobre o pensamento crítico em relação ao movimento CTS-A. Os programas e estudos sobre o movimento CTS estão sendo elaborados, desde o seu início, em três grandes direções, segundo Cerezo (2004): i) CTS no campo da pesquisa, visando promover uma visão não essencialista e contextualizada da atividade científica como processo social; ii) no campo das políticas públicas, no qual os estudos CTS têm facilitado a abertura de processos de tomada de decisão concernentes a políticas científico-tecnológicas e; iii) no campo da educação, no qual uma nova imagem de ciência e de tecnologia está sendo proposta. O movimento CTS no campo da educação adquiriu tal importância que hoje há inúmeros cursos e currículos com esse enfoque, bem como livros, revistas científicas, dissertações e teses que tratam de assuntos relacionados. No Brasil, após três décadas de produção no campo do Ensino de Ciências, só mais recentemente começam a surgir de forma mais intensa trabalhos sobre CTS, que, como se pode esperar de um campo novo, possui diversidade de interpretações e enfoques. Neste trabalho, enfocaremos as discussões promovidas no âmbito da educação CTS, destacando a questão da interdisciplinaridade na promoção de uma educação crítica, que leve à participação pública nas decisões relacionadas à Ciência e à Tecnologia, em contraposição aos estilos tecnocráticos vigentes. 4. Resultado e Discussão Segundo Chauí (2000), a atitude científica é extremamente objetiva e busca explicar os fatos e os fenômenos através de médias, padrões e critérios. Assim, fundamenta-se em leis que expliquem os fenômenos quantitativamente. Ela é construída pela investigação científica. A ciência é o conhecimento que resulta de um trabalho racional. Após o capitalismo, a técnica é um conhecimento empírico. Já a tecnologia é um saber teórico que se aplica. “Com a modernidade, buscamos nos libertar da tutela da fé religiosa através da razão natural e instrumental.” (SILVA, 2008, p. 217). No entanto, todo este determinismo foi monimizado em consequência de estudos científicos mais aprofundados em relação ao átomo, como os da teoria da relatividade ente outros. A ciência e suas teorias se renovam continuamente. Diante disso, o senso comum “ganha” significado, as verdades são contestadas e conhecimentos podem ganhar novas perspectivas. Logo, entende-se que os conhecimentos com base no senso comum não são mais tão desvalorizados pelas ciências. Mas, deve-se perceber que a ciência não é mais tão linear: o conhecimento adquirido passa a fazer parte dos contextos de pesquisas e, consequentemente, um mesmo fato ganha novas visões. Mas nada é totalmente novo, tudo está contaminado pelo velho. Para Marx e Engel (1998), as relações humanas estão interligadas com as relações materiais, com as forças de produção e com o processo de vida social, política, econômica e intelectual. Enfim, está condicionada pelo modo de produção da vida material. Então, toda transformação econômica e social está baseada nas contradições e conflitos que existem entre as forças produtivas sociais e as relações de produção. (MARX e ENGEL, 1998). Numa visão holística, em que há complexidade no todo, composto por diversas partes que se interagem, mas não se somam, a ciência falhou, ao supor que o conhecimento é limitado, linear e antropocêntrico, como discute Grün (1996). É preciso ponderar que as ciências estão em diálogo permanente, que tem trabalhado com a idéia de recursão (e não mais de causa e efeito), buscando não desconsiderar a instabilidade existente no planeta hoje. Enfim, tudo está em constante movimento e interação e o homem, ao contaminar sua obra, acaba por se contaminartambém. Mas apesar de toda a crise de legitimidade social por que passam a Ciência e a Tecnologia, duas ideias hoje são ainda muito fortes em nossa cultura: a neutralidade da ciência e o determinismo tecnológico que representam obstáculo para uma ciência democrática, capaz de melhorar a sociedade. (MOLINA, 2009, apud CASTRO, 2009). Segundo Freire (1970), diante de tal realidade a escola não pode ser bancária, mas libertadora. Ela precisa ser dialética e historicizar os conhecimentos, buscar significação de maneira viva e dinâmica, através de interlocuções conscientes dos efeitos da Ciência e Tecnologia sobre a nossa formação histórica, social e ambiental. Para Santos (2008), essas concepções se enquadram no que pode ser chamado de vissão humanística de ensino CTS, em uma perspectiva freireana. O movimento CTS se iniciou com forte conotação político-ideológica (WALKS, 1990 e FOUREZ, 1997, apud SANTOS, 2008) e aos poucos se tornou um slogan e foi sendo apropriado por propostas educacionais que estão distantes dos reais propósitos daqueles que defendiam a incorporação CTS nos currículos nos anos de 1970 e 1980. (SANTOS, 2008). Para superarmos a ideia de neutralidade e determinismo científico é necessária a mobilização da sociedade, ou seja, deve-se passar pela educação em todos os setores do ensino fundamental, médio, profissional e superior, formal e informal, o combate à ideia introjetada de que a Ciência e a Tecnologia são apolíticas. (MOLINA, 2009, apud CASTRO, 2009). Um trabalho pedagógico desta natureza representa ao educador um desafio. Pois promover transformações nas instituições escolares requer quebrar moldes educacionais, romper com estagnações e comodismos e compreender a descrença nas transformações. Para tanto, é necessário tornar a educação um movimento político. Sozinho nenhum educador irá gerar movimentos de curto ou longo prazo. É preciso conhecer para entender. Só se desenvolve senso de criticidade nos alunos se o professor despertar em si mesmo o senso crítico. Só se desenvolve senso crítico quando se faz uma leitura do todo e a integração e relação entre suas diferentes partes. Para isso, é necessária muita leitura e análise, para que possa inserir o trabalho na perspectiva da construção de um projeto de futuro para a humanidade e o planeta. O educador deve promover situações para que o conhecimento seja contextualizado e significativo, trabalhando assim com temas atuais, reais e próximos dos estudantes, que abordem as relações de homens e mulheres com o mundo. A interdisciplinaridade se estabelece por meio de ligações entre teoria e prática. Ela coloca o produto cognitivo em relação à realidade do aluno, reorganizando práticas escolares, integrando o grupo nas reflexões CTS-A e evitando as transferências simplistas. Para Molina (2009) levamos tempo para educar alguém a ser crítico com a tecnologia (e com a ciência) e a conhecer sua própria capacidade de decisão e sua autonomia de criatividade, mas estudos indicam que o enfoque CTS, com apoio em uma postura crítica, interdisciplinar, contextualizada e política pode favorecer a formação de atitudes mais questionadoras e atuantes. (BAZZO et al., 2007). 5. Considerações Finais Nesse trabalho buscou-se refletir sobre as perspectivas de utilização de práticas interdisciplinares relacionadas ao movimento CTS-A, na promoção de uma educação política e crítica. (SANTOS, 2008). Tal fato se fez necessário em função da atual realidade educacional, principalmente em relação à natureza, que nos currículos está esquecida, reprimida e silenciada como bem afirma Grün (1996). No entanto, essa realidade precisa ser mudada. Para tanto, é necessário uma educação que esteja engajada como processo político e crítico, em consonância com os princípios éticos, de co-responsabilidade e de justiça social. A interdisciplinaridade enquanto processo dinâmico e não segmentado do conhecimento e da realidade, possibilita a produção do conhecimento científico e tecnológico e resgata a dialética em relação ao homem, suas condições existenciais e as consequências socioambientais. Assim, ao fazer uma associação entre CTS-A e os conteúdos escolares através de temas interdisciplinares que focalizem a libertação da condição de exploração humana (FREIRE, 1970) é uma boa alternativa para a formação de alunos para atuarem de forma mais crítica e transformadora da realidade ambiental e social. Referências Bibliográficas BAZZO, W. A.; PINHEIRO, N. A. M.; SILVEIRA, R. M. C. F. Ciência, tecnologia e sociedade: A relevância do enfoque CTS para o contexto do ensino médio. Ciência & Educação, v. 13, n.1, pp. 71-84, 2007. CARVALHO, I. C. de M. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. 3ª Ed. São Paulo: Cortez, 2008. CASTRO, F, DE. Falsa Neutralidade. Entrevista com Fernando Tula Molina. Boletim Agência FAPESP. 16/01/2009. Disponível em: http://www.agencia.fapesp.br/materia/9971/entrevistas/falsa-neutralidade.htm. Acesso em: 20 /08/2009. CEREZO, J. A. L. Ciência, Tecnologia e Sociedade: O estado da Arte na Europa e nos Estados Unidos. In: SANTOS, L. W. [et al]. (organizadores). Ciência, Tecnologia e Sociedade: o desafio da interação. Londrina: IAPAR, 2004, pp.11-46. CHAUÍ, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2000. FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970. GRÜN, M. Ética e Educação Ambiental: A Conexão Necessária. Campinas, Papirus, 1996. LOUREIRO, C. F. B. Teoria Social e Questão Ambiental: pressupostos para uma práxis crítica em educação ambiental. In: LOUREIRO, C. F. B; LAYRARGUES, P. P.; CASTRO, R.S. de. (orgs). Sociedade e Meio Ambiente: a educação em debate. (Org.). Editora Cortez, 200, pp.13-52. LÜDKE, M. & ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: Abordagens Qualitativas. Editora Pedagógica e Universitária LTDA. São Paulo, EPU, 1986. MARX, K. & ENGEL, F. O manifesto comunista. Tradução Maria Lucia Como. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998. NOVO VILLAVERDE, M. El análisis de los problemas ambientales: modelos y metodología. In: NOVO VILLAVERDE, M.; LARA, R. (orgs). El análisis de los problemas ambientales. I. Madri: Fundación Universidad-Empresa, 1997. SANTOS, W. L. P. dos. Educação Científica Humanística em uma Perspectiva Freireana: Resgatando a Função do Ensino de CTS. In. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, v.1, n.1, p. 109-131, mar. 2008. SILVA, S. P. Currículo Interdisciplinar: resgate da dialética Todo-Parte. In: MENDONÇA, M. R. (Org.). Formação Continuada, Interdisciplinaridade e Inclusão Social. Universidade Federal de Goiás – Campus Catalão. Catalão: Modelo, 2008. pp. 215-238.
Compartilhar