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ARTIGO 1 MONOGRAFIA LILA

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1. A BRINCADEIRA E SUA RELAÇÃO ENSINO-APRENDIZAGEM NA PRÁTICA PEDAGÓGICA
Brincar é uma importante forma de comunicação, e por meio dessa prática a criança pode reproduzir o seu cotidiano. A brincadeira é uma atividade essencial durante a infância, e não pode ser vista na Educação Infantil como um simples passar de tempo. Para definir a brincadeira infantil, ressaltamos a importância do brincar para o desenvolvimento integral do ser humano nos aspectos físico, social, cultural, afetivo e cognitivo, tentando conscientizar pais, educadores e a sociedade de que o ato de brincar faz parte de uma aprendizagem prazerosa que não é apenas fazer, mas aprender. Ainda, brincar é uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento da identidade e da autonomia da criança.
1.1 AS CONCEPÇÕES SOBRE O BRINCAR
É de conhecimento universal que a criança sempre brincou, mas é novidade que se conheceu a real importância do brincar para o seu desenvolvimento. Tal tema vem sendo bastante pesquisado e discutido desde o século XVIII, em suas diferentes vertentes. Estudos sobre a importância da brincadeira na infância foram desenvolvidos por pesquisadores conceituados
 
 como Vygotsk, por exemplo, e, naturalmente, o brincar tem se destacado no ambiente escolar devido pesquisas e à necessidade de incitar a aprendizagem. A brincadeira na escola tornou-se, então, algo sério, pois desenvolve e estimula o aluno em três áreas distintas, mas que se completam, a saber: cognitiva, motora e sócio-afetiva. Entretanto, ainda é possível notar lacunas de conhecimentos entre o conceito e o processo envolvido na brincadeira. Para utilizá-la como instrumento pedagógico, o professor deve ter prévio conhecimento de sua importância e sua metodologia, não visando um conceito universal e fechado acerca do tema, mas buscando preencher essas lacunas com subsídios para a plena realização da brincadeira na prática educativa.
Entre as concepções sobre o brincar, destacam-se as de Froebel, o primeiro filófoso a justificar o seu uso para educar crianças em fase pré-escolar. Considerado por Blow (1991), psicólogo da infância, Froebel introduz o brincar para educar e desenvolver a criança. Sua teoria metafísica pressupõe que a atividade permite o estabelecimento de relações entre objetos culturais e a natureza, unificadas pelo mundo espiritual. Froebel concede o brincar como atividade livre e espontânea, responsável pelo desenvolvimento físico, moral e cognitivo da criança. A perspicácia do educador leva a criança a compreender que a educação é ato intencional, que requer orientação e materiais para facilitar a construção do conhecimento de pré-escolares. Entretanto, a aquisição do conhecimento requer a autoatividade, capaz de gerar autodeterminação que, por sua vez, se processa especialmente pelo brincar. Para Vygotsky (1994, p. 117), a brincadeira é importante porque “cria uma zona de desenvolvimento proximal da criança”, ou seja, a criança realiza, por meio de brinquedos, ações que vão além do que sua idade lhe permite realizar, superando progressivamente suas aquisições de forma criativa. Assim, a criança se projeta no mundo dos adultos, ensaiando atividades, comportamentos e hábitos para os quais ainda não está preparada, mas que por meio da brincadeira podem ser criados processos de desenvolvimento, internalizando-se o real e promovendo o desenvolvimento cognitivo. Portanto, brincar contribui para a interiorização de determinados modelos de personalidade em âmbito de grupos sociais diversos. Zilma de Moraes Ramos de Oliveira, em “Série Idéias”, ressalta:
ygotsky cria um conceito para explicitar o valor da experiência social no desenvolvimento cognitivo. Segundo ele, há uma ‘zona de desenvolvimento proximal’, que se refere à distância entre o nível de desenvolvimento atual – determinado através da solução de problemas pela criança, sem ajuda de alguém mais experiente – e o nível potencial de desenvolvimento – medido através da solução de problemas sob a orientação de adultos ou em colaboração com crianças mais experientes.
A brincadeira fornece, pois, ampla estrutura básica para mudanças de necessidade e de consciência, criando um novo tipo de atitude em relação ao real. Nela aparece a ação na esfera imaginativa numa situação de faz de conta, a criação das intenções voluntárias e a formação dos planos da vida real e das motivações volitivas, constituindo-se, assim, no mais alto nível de desenvolvimento pré- escolar.(OLIVEIRA, 1994, p 43 e 44).
A brincadeira é cada vez mais entendida como atividade que, alem de promover o desenvolvimento global das crianças, incentiva a interação entre os pares.
	Segundo Kishimoto (2005, p. 66):
Brincando, portanto, a criança coloca-se num papel de poder, em que ela pode dominar os vilões ou as situações que provocariam medo ou que a fariam sentir-se vulnerável e insegura. A brincadeira de super-herói, ao mesmo tempo em que ajuda a criança a construir a autoconfiança, leva-a a superar obstáculos da vida real, como se vestir, comer um alimento sem deixar cair, fazer amigos, enfim, corresponder às expectativas dos padrões adultos. (Kishimoto 2005, p. 66)
Estudiosos contemporâneos como Vygotsky, Montessori, Alícia Fernandes e Lino de Macedo deram um destaque especial às brincadeiras para as crianças, atribuindo-lhes papel decisivo na evolução dos processos de desenvolvimento humano. Para Vygotsky, o brincar da criança está sempre acima de sua idade média, acima de seu comportamento diário. Assim, na brincadeira, as crianças manifestam certas habilidades que não seriam esperadas em sua idade. Daí vê-se o quanto o brincar é benéfico ao aprendizado, pois a pessoa está em condições favoráveis para aprender. A promoção de atividades que favoreçam o envolvimento da criança em brincadeiras, principalmente aquelas que promovem a criação de situações imaginárias, tem nítida função pedagógica. A escola e, particularmente, a pré-escola poderiam se utilizar deliberadamente desse tipo de situações para atuar no processo de desenvolvimento das crianças. (Vygotsky apud Oliveira, 2004,67)
Assim, imaginação no brinquedo é a primeira possibilidade de ação da criança numa esfera cognitiva que lhe permite ultrapassar a dimensão perceptiva motora do comportamento. A brincadeira concede estruturas básicas necessárias para as mudanças das necessidades e da consciência infantil, vivenciando uma experiência, no ato de brincar, como se fosse bem maior do que realmente é. "As maiores aquisições de uma criança são conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro tornar-se-ão seu nível básico de ação real 
Desse modo, deve-se respeitar o interesse da criança e brincar, a partir da sua espontaneidade, e da mediação do educador formulando os desafios necessários à sua capacidade e acompanhando seu processo de construção do conhecimento. Outra importante contribuição nessa temática foi a de Maria Montessori, que desenvolveu um método e debruça-se sobre uma proposta educacional na qual o aluno é o sujeito de sua própria educação, proporcionando-lhe a possibilidade de vivenciar os valores que se propõe atingir ao longo da ação educativa que exerce, bem como propiciar a liberdade de movimentos e autodisciplina e a autodeterminação. Nesse método, o educando é educador de si mesmo, tendo a possibilidade de escolhar o seu trabalho, de se mover por conta própria, de se tornar responsável pelo seu progresso e crescimento. “Pelo método, o educando caminha para a independência e liberdade, numa atividade autodirigida”. (Mafra, 1986, 22)
O método Montessori, foi construído no dia a dia da criança e coloridas peças sólidas, de tamanhos, formas e texturas diferenciadas fazem parte das estratégias propostas que aguçam os pequenos a abrir, fechar, encaixar, abotoar, tatear, calcular, contar e uma infinidade de outros atrativos que provocam o raciocínio e auxiliam todo tipo de aprendizado do sistema decimal à estrutura da linguagem. O material dourado é um exemplo dos materiais criados por Maria Montessori que ainda hoje é largamente usadonas escolas públicas e particulares do Brasil e do mundo todo.
As contribuições dessa médica, pedagoga, antropóloga e psicóloga para a área educacional são ainda hoje universais. Como se percebe na utilização da disposição circular dos alunos, os jogos pedagógicos sempre disponíveis, os cubos lógicos de madeira para o ensino de matemática, como também na utilização de preceito da criança ser o condutor do próprio aprendizado; assim o educador atua na Educação Infantil como mediador do conhecimento com uma educação voltada para o desenvolvimento de seres humanos autoconfiantes e independentes que visam tanto o bem individual quanto o bem coletivo.
Durante muito tempo confundiu-se “ensinar” com “transmitir” e, nesse contexto, o aluno era um agente passivo da aprendizagem e o professor um transmissor. A ideia de um ensino despertado pelo interesse do aluno acabou transformando o sentido do que se entende por material pedagógico. Seu interesse passou a ser a força que comanda o processo de aprendizagem, suas experiências e descobertas, o motor de seu progresso, e o professor, um gerador de situações estimuladoras e eficazes.
...O interesse é uma especie de motor natural do comportamento infantil, é a fiel expressao de uma inclinação estintiva, o indicador de que a atividade da criança coincide com suas necessidades organicas. Por isso, é fundamental que todo o sistema educativo e o ensino sejam construidos em funçao dos interesses infantis,... Antes de tentar incorporar a criança a qualquer atividade, temos que despertar seu desejo por ela mesmo, temos que nos preocupar em saber se ela esta preparada para essa atividade. (VGOSKI, 2003, P.100)
	Na àrea Psicopedagogia, renomados autores como Pain, Fernades, Macedo, entre outros, chamaram atenção para o fato do brincar como um trabalho preventivo e várias pesquisas demonstram que a eficácia tem influência dos professores que podem estar enriquecendo o seu trabalho, diversificando recursos, data a amplitude ou problemas de aprendizagem, o diagnóstico e tratamento psicopedagógico, além de outros, muito se vale dos procedimentos utilizados na psicoterapia e no psicodiagnóstico, destre os quais se encontra o jogo ou o brincar. (PAIN, apud SISTO, 2001 p. 174)
As crianças fazem da brincadeira uma ponte para o imaginário e a partir dele muito pode ser trabalhado. Contar, ouvir histórias, dramatizar, jogar com regras entre outras atividades constituem meios prazerosos de aprendizagem. Além disso, expressam suas criações e emoções, refletem medos e alegrias, desenvolvem características importantes para a vida adulta. Com efeito, o brincar se constitui como recurso da psicopedagogia, tanto para tratar dos distúrbios quanto para levantar hipóteses diagnósticas a respeito da estruturação lógica do pensamento, fornecendo informações sobre como estão organizados o pensamento da criança, o seu nível operatório e a sua elaboração prática nos processos de vencer situações-problemas nos aspectos afetivos, sociais e cognitivos. Mas como precisar a importância do brincar na escola? Como pensar no brincar como construção do conhecimento?
Macedo (1997) faz uma argumentação eficaz quanto a isso: 
o conhecimento tratado como um jogo pode fazer sentido para a criança. Não se trata de ministrar os conteúdos escolares em forma de jogo... Mas possibilitar que aprendam com seriedade, com leveza e prazer, sem medo”. (Macedo, 1997, 139). 
	
A postura psicopedagógica deve propiciar modalidades de aprendizagem que possibilitem para cada ser atendente a sua singularidade através de experiências, e quanto a isso Fernández (2001, 71) diz que “o jogar-brincar da criança não só é produto do sujeito enquanto sujeito, mas também enquanto pensante. A inteligência se constrói a partir do jogar-brincar”.
Resgatar o prazer em aprender, já desconhecido por muitas crianças, e consequentemente proporcionar melhores condições de desenvolvimento se faz necessário e urgente. A importância do brincar tem sido evidenciada também em pesquisas recentes que levam a supor que a atividade pode aumentar certos tipos de aprendizagens, em particular, aquelas que requerem processos cognitivos mais elaborados através da imaginação e da exploração das crianças para desenvolverem suas próprias teorias do mundo, que permitem a negociação entre o mundo real e o imaginário por elas.
Assim, dando-lhes tempo para brincar, um ambiente para explorar e materiais que favoreçam as brincadeiras, os adultos estarão promovendo a aprendizagem das crianças. As brincadeiras proporcionam o aprender fazendo e brincando, possibilita a criança a aprender novos conceitos, adquirir informações e até mesmo superar dificuldades que venham a encontrar em suas tentativas de aprendizagem.
A sociedade em si reconhece o brincar como parte da infância. Essa atividade é destacada, como vimos, nas várias concepções teóricas, em que cada um, à sua maneira, mostra a importância da brincadeira para o desenvolvimento infantil, como também para a aquisição de conhecimentos. 
1.2 BRINCAR COMO FORMA DE COMUNICAÇÃO
O brincar vem sendo cada vez mais utilizado na educação, recebendo destaque como uma peça importantíssima para a formação da personalidade e inteligência da criança, além da evolução do pensamento, transformando-se em um artifício mais acessível para a construção do conhecimento.
É fundamental ter em mente que os brinquedos são tão importantes quanto um livro ao estudar. Segundo especialistas, as crianças que têm contato com o brinquedo desde bebê amadurecem mais rápido do que as que não têm, pois é através deste que as crianças desenvolvem noções de tamanho, forma, textura cor, e até de como funcionam as coisas.
Brincando, crianças constroem o seu próprio mundo; o mundo que querem e que gostam; e os brinquedos são ferramentas que contribuem para essa construção, pois permitem que a criança demonstre e crie fantasias de acordo com suas vivências e experiências. Diante disso, destacando o poder que a criança possui em relação às suas experiências, Freire (1996) questiona: “Por onde poderíamos começar, senão pelo conhecimento que a própria criança possui ao entrar na escola?” (FREIRE,1996). Frente a tal indagação e proposta de reflexão, é possível prever a participação significativa do brincar na construção do prévio conhecimento da criança, antes mesmo de iniciar a sua vida estudantil.
Vygotsky (1998) ilustra a importância do brinquedo no universo infantil:
“No princípio da idade pré-escolar, quando surgem os desejos que não podem ser imediatamente satisfeitos ou esquecidos, e permanece ainda a característica do estado precedente de uma tendência para a satisfação imediata desses desejos, o comportamento da criança muda. Para resolver essa tensão, a criança em idade pré-escolar envolve-se em um mundo ilusório e imaginário onde os desejos não realizáveis podem ser realizados, e esse mundo é o que chamamos de brinquedo”. (Vygotsky, 1998, p. 122)
Vygotsky (1998), um dos representantes mais importantes da psicologia, partiu do princípio de que o sujeito se constitui nas relações com os outros, por meio de atividades intrinsecamente humanas. Nesta linearidade, a brincadeira infantil assume uma posição privilegiada para a análise do processo de constituição do sujeito, rompendo com a visão tradicional de que é apenas uma atividade natural de satisfação de instintos infantis. A brincadeira e o jogo de faz de conta seriam considerados espaços de construção de conhecimentos pelas crianças, na medida em que os significados que ali transitam são apropriados por elas de forma específica. Vygotsky cita que a criança aprende por meio da interação, portanto, nada melhor que a brincadeira para que a mesma se integre de forma livre. Por meio da brincadeira simbólica a criança expressa e adquire conhecimento de mundo, manifesta desejos, relaciona-se com o outro... É uma situação feita para a troca de ideias e aprendizagens diversas. Para Vygotsky (1998), as necessidades da criança se realizam através do brinquedo:
(...) seas necessidades não realizáveis imediatamente não se desenvolvessem durante os anos escolares, não existiriam os brinquedos, uma vez que eles parecem ser inventados justamente quando as crianças começam experimentar tendências irrealizáveis”. (Vygotsky, 1998, p. 106)
Velasco (1996) trata da construção da personalidade da criança por meio do brincar da seguinte forma:
A criança constrói a sua personalidade brincando. A brincadeira é uma parcela importante da sua vida. Para o adulto as experiências tanto externas como internas podem ser férteis, mas para a criança essa riqueza encontra-se principalmente na brincadeira e na fantasia. Velasco (1996, p. 69)
Para atingir esse fim, é preciso que pais e educadores repensem o conteúdo e a sua prática pedagógica, substituindo a rigidez e a passividade pela vida, pela alegria, pelo entusiasmo de aprender, a maneira de ver, pensar, compreender e reconstruir o conhecimento, e este só é adquirido pela criança através da sua interação com o brinquedo. Dessa forma, faz-se necessário que os profissionais que atuam com crianças estejam preparados para utilizar o brinquedo como meio pedagógico, favorecendo, assim, a aprendizagem. Isso deixa claro que a tarefa do professor é, dentre outras, a de colocar a criança em circunstâncias favoráveis que lhes permitam descobrir aquilo que ela deve saber, ou seja, é a de criar situações mais estimuladoras para que a criança, por si só, descubra o conhecimento.
Assim, é coerente afirmar que o brincar tem enfoque tanto filosófico quanto sociológico, psicológico, criativo, psicoterapêutico, pedagógico e também por outros ângulos de abrangência mais restrita e particularizada. Nessa perspectiva, abordaremos os principais pontos de cada enfoque, segundo Santos (1999).Do ponto de vista filosófico, o brincar é abordado como o mecanismo para contrapor a racionalidade. Sabe-se que as características que definem o ser humano são a razão e a emoção, mas foi a racionalidade que perdurou durante séculos como instrumento de autodeterminação da pessoa e proclamada como a sua especificidade, em detrimento da emoção. Há que se repensar um novo tempo, em que intelecto e espírito, razão e emoção se integram como parâmetro na busca de um novo paradigma para a existência humana, consolidando as potencialidades pessoais às exigências das relaçoes sociais.
A ludicidade, entendida como um mecanismo da subjetividade, afetividade, dos valores e sentimentos, e, portanto, da emoção, deverá estar junto na ação humana, tanto quanto a razão.
Em relação à criança, é preciso que ela dê razão à sua fantasia, aos seus sonhos, pois sem isso estará limitada ao mundo da razão, desempenhando rotinas, resolvendo problemas e executando ordens, tendo sua expressão e criatividade limitadas. A criança, sem a fantasia do brincar, jamais terá o encontro, o mistério e a ousadia dos sonhadores, que só a emoção proporciona. A expressão lúdica tem a capacidade de unir razão e emoção, conhecimento e sonho, formando um ser humano mais complexo e pleno.
 Do ponto de vista sociológico, o brincar tem sido visto como a forma mais pura de inserção da criança na sociedade. Se o conhecimento social é a base sobre a qual os diversos grupos chegam a um acordo a respeito das convenções estabelecidas pela própria sociedade, os valores, crenças, hábitos, costumes, regras, leis, moral, ética, sistema de linguagem e modos de produção são conhecimentos assimilados pela criança através da brincadeira e do uso do objeto brinquedo, que é produzido pelo homem e colocado à disposição da criança. As pessoas somente podem produzir materiais de sua cultura, por isso o brinquedo é dotado de imagens, significados e simbologias próprias de uma determinada cultura. Nessa linha de enfoque, a apropriação da cultura é resultado das interações lúdicas, que se dá entre a criança, o brinquedo e as outras pessoas.
 Do ponto de vista psicológico, o brincar está presente em todo o desenvolvimento da criança nas diferentes formas de modificação do seu comportamento, pois na formação da personalidade, motivações, necessidades, emoções e valores, a interação criança/família, bem como criança/sociedade está associada aos efeitos do brincar.
Segundo psicólogos, não existe nenhum mecanismo que tenha se revelado como mais importante do que os brinquedos para facilitar o desenvolvimento da criança. Isso não significa que sem os brinquedos a criança não se desenvolva mais que apartir do brincar prazerozo preparado pela ludicidade, aprendizagem aconteçe de forma natural, vista como processo e não apenas produto.
Por outro lado, é na psicologia que se encontra o brinquedo como uma necessidade tão importante, tanto quanto o sono e a alimentação, e que garante uma boa saúde física e emocional.
 Do ponto de vista da criatividade, tanto o ato de brincar quanto o ato criativo estão centrados na busca do “eu”. É uma busca constante para descobrir algo novo. É no brincar que se pode ser criativo, e é no criar que se brinca com as imagens, símbolos e signos, fazendo uso do próprio potencial, livre e integralmente. Brincando, despertando a criatividade, o indivíduo descobre quem realmente é.
As condições favoráveis ao ato de brincar assemelham-se às condições do ato de criar. Para ambos é necessário ter a coragem de errar e lançar-se numa atividade de forma descompromissada; é necessário ter iniciativa e autonomia de pensamento. A criança que é incitada a brincar com liberdade, terá grandes possibilidades de se transformar num adulto criativo.
Do ponto de vista psicoterapêutico, o brincar tem a função de entender a criança em seus processos de crescimento e de remoção dos bloqueios do desenvolvimento, que se tornam evidentes. Na voz dos psicoterapeutas, o brincar é universal; é a própria saúde, facilita o crescimento e conduz aos relacionamentos grupais. É uma forma de comunicação consigo mesmo e com os outros; por isso só já é uma terapia.
Nessa linha de trabalho, o brincar representa a atividade principal da criança. Mesmo quando está, de alguma forma, debilitada, persiste nela a vontade de brincar. A psicoterapia busca resgatar no brinquedo o lado sadio e positivo da criança. O brincar assume a função terapêutica porque nessa atividade a criança pode exteriorizar seus medos, angústias, problemas internos e revelar-se inteiramente, resgatando a alegria, a felicidade, afetividade e o entusiasmo.
Por fim, do ponto de vista pedagógico, o brincar tem se revelado uma estratégia poderosa para a criança aprender. Nos dias atuais, o brincar vem sendo cada vez mais utilizado na educação, constituindo-se uma peça importante na formação da personalidade, nos domínios da inteligência, na evolução do pensamento e de todas as funções mentais superiores, transformando-se num meio viável para a construção do conhecimento.
Se uma criança nacesse como uma planta, com todas as formas de comportamento que conrrepondesse a vida futura, a educaçao não seria necessaria. A necessidade da educaçao surge, conforme a expressao de Tordike, do fato de que” o que existe não é o que deveria existir.” Por isso, a educaçao sempre denota uma modificaçao de comportamento em prol da elaboraçao do triunfo das outras... exatamento do mesmo modo, o carater não deve ser entendido como algo estatico, sobe a forma de uma soma acabada de peculiaridade, de reações-congenitas ou adquiridas...mas como uma torrente que se desloca dinamicamente, em luta constante. Em outros termo, o carater não surge das propriedades herdadas dos organismos tomadas tais como são, nem das influencias sociais do ambiente tomadas de forma independente, mas do choque contraditorio de umas contra outras e da transformação dialetica do comportamento herdado em comportamento pessoal.
Em vista, grandes movimentos foram realizados no Brasil a partir dos anos 80 em relação à valorização dos jogos e brinquedos, resultando na criação de brinquedotecas, principalmente nas escolas, com o objetivo de suprir as necessidades materiais, construir acervos, oferecer espaços para brincare proporcionar à criança o acesso a um maior número de brinquedos, promovendo o seu desenvolvimento e aprendizagem.
A partir de tudo o que foi elucidado sobre o tema, nos mais diferentes enfoques, pode-se perceber que o brincar está presente em todas as dimensões da existência do ser humano, e muito especialmente na vida da criança. Pode-se afirmar realmente que brincar é viver, e as crianças brincam porque esta é uma necessidade básica, assim como a nutrição, a saúde, a habitação e a educação.
1.3 O BRINCAR E SUA RELAÇÃO COM A INFÂNCIA TRADICIONAL 
As maiores aquisições de uma criança são conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro tornar-se-ão seu nível básico de ação real e moralidade. (Vygotsky)
		No século XV, a criança era vestida como adulto, e também agia como se fosse um. Atualmente, tal realidade ainda ocupa espaço em algumas famílias. Em contrapartida, alguns segmentos da literatura e segmentos sociais buscam conscientizar os adultos das necessidades e da responsabilidade de cada papel. O mundo contemporâneo oferece a proposta de novos conceitos aos pais e educadores no que condiz à inclusão da prática de brincadeiras no ato de educar a criança. A diversidade econômica, social e cultural imposta pelo novo milênio, principalmente a partir da segunda metade do século XX, causou profundos impactos na sociedade, transformando verdades antes consideradas imutáveis e sugerindo questionamentos sobre o rumo tomado pela humanidade. Aquilo que era tido como verdade absoluta deu espaço a tempos de mudanças e incertezas, em que a instabilidade, aliada à efemeridade, dita as novas relações entre os grupos sociais, hoje tão diversificados. As relações passaram a ser dialéticas e contraditórias, usando o tradicional e o moderno num mesmo contexto. Esse novo quadro paradoxal, resultado das mudanças sociais e da multiplicação de culturas tão distintas, está carregado de uma profusa ausência e vazio de valores. Entretanto, ao mesmo tempo em que a instabilidade assusta os estudos futuristas, é nítida a abertura de novas portas anunciando um mundo infinito de possibilidades. Marshall Berman elucida acerca dessa infinidade de possibilidades da seguinte forma:
São todos movidos, ao mesmo tempo, pelo desejo de mudança – de autotransformação e transformação do mundo em redor – e pelo terror da desorientação e da desintegração, o terror da vida que se desfaz em pedaços. Todos conhecem a vertigem e o terror de um mundo no qual tudo que é sólido se desmancha no ar (BERMAN, 1987, p. 13).
	Muitos adultos se referem à criança e ao que lhe é pertinente de uma maneira pejorativa. Brincar é o verbo da criança. Brincar é a maneira como ela conhece, experimenta, aprende, vivencia, expressa emoções, administra conflitos, interage consigo e com o mundo. O corpo é um brinquedo para a criança. Através dele ela descobre sons, descobre que pode rolar, virar cambalhota, saltar, manusear, apertar, enfim, que pode se comunicar.
		Direcionando um olhar crítico ao passado, pode-se notar que as referências históricas sobre família, materializadas sob a forma de diários, testamentos, pinturas, documentos e túmulos, constituem-se numa rica fonte de pesquisa para a busca de conhecimento da sociedade atual. Um valioso legado de impressões e vestígios faz-se muito útil para estudo das novas gerações, auxiliando a sociedade atual por meio de descobertas dos acontecimentos ocorridos no passado. Diante da riqueza de tais informações e significados, é interessante observar que não se encontra, até por volta do século XII, registros representando a infância. Denota-se, a partir de tal constatação, que a infância, antes dessa delimitação histórica, não existia conceitualmente. É bem provável que não existisse um significado de valor voltado para essa fase da vida. Posta tal constatação, Steinberg e Kincheloe definem o conceito de infância como uma classificação específica de seres humanos necessitados de um tratamento especial, diferente daquele fornecido aos adultos, que ainda não havia sido desenvolvido na Idade Média (STEINBERG, KINCHELOE, 2001, p. 11). Sabe-se que a infância sempre existiu desde os primórdios da humanidade, isso é fato, mas a sua percepção enquanto desenvolvimento e categoria social, digna de um olhar diferenciado, fora sentida somente a partir dos séculos XVII e XVIII. Carvalho (2003) aponta, sobre a verificação do surgimento da infância, a seguinte afirmativa:
A aparição da infância ocorreu em torno do século XIII e XIV, mas os sinais de sua evolução tornaram-se claros e evidentes, no continente europeu, entre os séculos XVI e XVII, no momento em que a estrutura social vigente (Mercantilismo) provocou uma alteração nos sentimentos e nas relações frente à infância. (CARVALHO, 2003, p. 47).
		Vejamos que a definição da palavra infância, original do latim infantia, significa “incapacidade de falar”. Nos primórdios dos tempos, considerava-se que a criança, antes dos 7 anos de idade, não tinha capacidade para falar e nem expressar seus pensamentos e sentimentos. Desde o seu princípio, à palavra infância é atribuído o significado de incapacidade, a marca da incompletude diante dos mais experientes, relegando à criança uma condição inferior diante do adulto, o anonimato, não havendo um espaço determinado para tal categoria socialmente. Ao serem representadas, principalmente através de pinturas, geralmente apareciam na forma de uma miniatura do adulto. Suas vestes de nada se diferenciavam da dos mais velhos. Notava-se que se tratava de crianças devido ao fato de essas figuras se apresentarem em tamanho reduzido, ainda que com características físicas de um adulto. Até esse período, tradicionalmente, esta primeira fase da vida da criança tinha uma breve duração, restringindo-se apenas à sua etapa de fragilidade física. Ao adquirir certa independência, a criança era inserida, imediatamente, no meio social frequentado por adultos, compartilhando de seus trabalhos e jogos, mesmo sem possuir preparo físico e psicológico para tal vivência. Neste período, o processo de socialização da criança com jovens e adultos era o que ditava a transmissão de valores aos pequenos, sendo a aprendizagem, nesta etapa da vida, de caráter prático, baseada na observação do trabalho executado pelos mais velhos. Phillipe Ariés (1986) reforça o entendimento sobre a inserção precoce da criança ao meio adulto com o seguinte posicionamento:
De criancinha pequena, ela se transforma imediatamente em homem jovem, sem passar pelas etapas da juventude, que talvez fossem praticadas antes da Idade Média e que se tornaram aspectos essenciais das sociedades evoluídas de hoje. (ARIÉS, 1986, p. 10).
		Ao final do século XVII começam a ser observadas algumas diferenças sociais na estrutura até então predominante. Escolas foram criadas, passando a promover boa parcela da formação inicial das crianças, ensinando a leitura, escrita e aritmética, visando a preparação do pequeno para a vida adulta. O aprendizado empírico é então substituído por cuidados especiais mais diretamente ligados às reais necessidades da criança, o que resulta em um novo olhar do adulto implicando em um sentimento mais fraterno. Esse processo dá devido à mobilização moral promovida pelos reformuladores católicos e protestantes, juntamente à cumplicidade sentimental das famílias. Ariès é crítico em seu posicionamento acerca da inserção da criança na atividade escolar: 
A despeito das muitas reticências e retardamentos, a criança foi separada dos adultos e mantida à distância numa espécie de quarentena, antes de ser solta no mundo. Essa quarentena foi a escola, o colégio. Começou então um longo processo de enclausuramento das crianças (como os loucos, dos pobres e das prostitutas) que se estende até nossos dias e ao qual se dá o nome de escolarização. (ARIÉS, 1986, p. 11)
		A infância passa a ser vista sob uma nova perspectiva a partir da Revolução Industrial, entre os séculos XVIII e XIX, quando lhe foi atribuído um valor econômico a ser explorado. As crianças retornamao mercado de trabalho devido à necessidade de mão de obra, não exercendo, de fato, o seu direito de acesso à escola, sendo submetidas às explorações em nome da economia do país. Diante desse quadro, Amarilha (2002) demonstra seu posicionamento:
Se a vida em comum com os adultos, antes da Revolução Industrial, tratava a criança com descaso, agora, o seu valor enquanto geração de braços para a indústria e cabeças para o comando lhe traz o exílio do seu tempo. Viver a infância passa a ser um período dominado por modelos de preparação para ser o futuro adulto. A criança como tal, com identidade específica, continua desrespeitada e desumanizada. (AMARILHA, 2002, p. 128-129)
Entre os anos de 1850 a 1950, com o desenvolvimento das ciências humanas, finalmente as crianças deixam as fábricas e retornam à escola. Ao final do século XIX, o posicionamento dos pais na estrutura familiar já garante mais compromisso com o bem-estar da criança, protegendo seus direitos e visando maiores cuidados. Muda, então, a noção de infância, cujo estudo passa a ser analisado à luz da Psicologia, da Sociologia e da Medicina, além de outros campos do saber, atribuindo-se um parecer científico a esta fase da vida humana, que passa, finalmente, a ser respeitada.
1.3 A INFÂNCIA MODERNA
	A contemporaneidade, com seu caráter efêmero e mutante, somada à vasta mudança consequente do seu curso, confere uma nova roupagem à noção que se tem de infância, atualmente dotada de novos conceitos que lhe sugerem um novo status. Novas conjecturas atribuem diferentes significados e interpretações sobre um mesmo fato, que variam de acordo com a visão de mundo de cada indivíduo, esta, por sua vez, formada a partir de suas experiências e bagagem cultural.
	Kuhlmann (2001) Ãrgumenta acerca da visão direcionada à criança da seguinte forma:
[...] considerar a infância como uma condição da criança. O conjunto de experiências vividas por elas em diferentes lugares históricos, geográficos e sociais é muito mais do que uma representação dos adultos sobre esta fase da vida. É preciso reconhecer as representações de infância e considerar as crianças concretas, localizá-las nas relações sociais, etc., reconhecê-las como produtoras da história. (KUHLMANN, 2001, p. 10)
A nova ordem imposta pela globalização traz consigo crianças diferentes de outrora, com características diversificadas, outras necessidades e aspirações. Boa parte dessa transformação se deve ao livre acesso às mídias, novo espaço de socialização que tomou o lugar que antes pertencia primeiramente à família e, posteriormente, à escola – agentes primários na troca de experiências - fornecendo todo e qualquer tipo de informação em tempo real, sujeitando a criança ao papel de receptor e consumidor em potencial. Vale ressaltar que esse novo meio de socialização é utilizado em todas as idades, sendo que as crianças iniciam a sua prática cada vez mais cedo. O consumismo, artifício fortemente presente na sociedade dessa nova era, utiliza-se da mídia para veicular a imagem de uma infância feliz, condição esta determinada pelo consumo de brinquedos e marcas, manipulando o consumidor enquanto delineia a visão de mundo que se forma na criança – fundamentada, claro, no consumismo.
Segundo Borba (2005), as crianças representam, hoje, uma parcela significativa do mercado, fator que tem provocado o aumento da produção cultural voltada para a infância, sobretudo no que se refere à cultura do consumo.
O hibridismo impregnado na sociedade atual também contribui para um novo olhar direcionado à infância nos dias de hoje, haja vista o paradoxo que constitui as relações, seja cultural, social, política ou economicamente. Tal afirmação bem é ilustrada com a criança: de um lado está a que é bem cuidada, amada, cujas necessidades são, pelo menos em boa parte, atendidas; de outro, está a criança rejeitada, marginalizada, cujas condições de sobrevivência são extremamente precárias.
Essa nova estrutura da sociedade acaba por desestabilizar as identidades culturais, fator que explica a fragmentação do homem moderno, explicada a partir de princípios que surgiram desde a sua infância, não havendo fronteiras definidas, tal como coloca por Stuart Hall (2004). Por outro lado, muitos produtos destinados às crianças, como livros infantis, brinquedos e filmes contribuem para a formação de uma identidade de forma mais atenciosa e direcionada às suas reais necessidades. Essa nova conjectura é que altera totalmente a noção de infância construída até então. Ghiraldelli Júnior (1996) aponta acerca desse novo olhar sobre a infância: 
Ser criança é ter corpo que consome coisa de criança. Que coisas são estas? Primeiro, coisas que a mídia define como tendo sido feitas para o corpo da criança. Segundo, coisas que ela define como sendo próprias do corpo da criança. Respectivamente, por um lado, bolachas, danoninhos, sucos, roupas, aparatos para jogos, etc, por outro, gestos, comportamentos, posturas corporais, expressões, etc. Ser criança é algo definido pela mídia, na medida em que é um corpo-que-consome-corpo. (GHIRALDELLI JR., 1996, p. 38).
Diante dos recursos aos quais hoje todos têm acesso e desse novo olhar direcionado à infância, fica evidente a independência que criança contemporânea adquiriu; ela amadurece precocemente, possui notável inteligência e criatividade, necessita ser ouvida e considerada como parte integrante da sociedade, claro que sem perder a sua essência. Permanece, entretanto, nesse quadro, a necessidade de proteção, apoio e carinho, além de orientação e auxílio na constituição de princípios e valores, para que a mesma saiba se posicionar e ter um olhar crítico diante do mundo que a cerca. São cuidados especiais e adaptados a esta nova era, digital e globalizada, que auxiliarão a criança no preparo para uma vivência plena nesses novos tempos, carregados de novas necessidades, aspirações, desejos e desafios, por meio de uma educação imbuída de criticidade que proporcione à criança o bom aproveitamento das oportunidades disponíveis para o seu crescimento, cabendo ao educador, portanto, compreender o processo de desenvolvimento do conceito de infância e suas determinações nos dias atuais, bem como valorização do brincar na Educação Infantil.

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