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A CONTRIBUIÇÃO DO PRONERA NA CONSTRUÇÃO DE

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UnB – Universidade de Brasília 
CDS – Centro de Desenvolvimento Sustentável 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A CONTRIBUIÇÃO DO PRONERA NA CONSTRUÇÃO DE 
PULÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO DO CAMPO E 
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 
 
 
 
 
 
Mônica Castagna Molina 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Orientadora: Lais Mourão Sá 
 
 
 
Tese de doutorado 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Brasília – DF: Novembro/2003 
 
ABSTRACT 
 
During the last few decades there has been a view of development in Brazilian 
society which has considered the rural areas as backward, inferior and archaic. At 
the same time, the city is projected as a place of modernity and progress. This 
view of modernity as a preserve of cities, has sustained the implementation of an 
agricultural development model based on large areas of mono crop culture, 
cultivated with the intensive use of chemical and mechanical inputs over large 
concentrations of land. This model of modernising agriculture has, over the last few 
decades, forced more than thirty million people to leave the countryside. Opposed 
to this view are social movements and sectors of civil society organising 
themselves and fighting for Land Reform, proposing the idea of the countryside as 
a space for social inclusion and democratization of Brazilian society. This is a 
central policy for changing the current development model, through its capacity for 
redistributing land and income. One of the main results of the struggle for land 
redistribution has also been the conquest of the redistribution of knowledge by 
rural workers. Part of these conquests have materialised in the setting up of the 
National Programme for Education in Land Reform, and in the construction of a 
National Initiative for Education of the Countryside, whose history has been 
recovered in this paper. This action by the social movements has been 
responsible for the broadening of the land debate, definitively incorporating into it 
one more theme: Education of the Countryside, building with this area as well a 
new space for the production of knowledge, whose main feature is 
transdisciplinarity. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A CONTRIBUIÇÃO DO PRONERA NA CONSTRUÇÃO DE 
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO DO CAMPO E 
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 
 
 
 
 
 
Mônica Castagna Molina 
 
Tese de Doutorado 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Brasília – DF Novembro de 2003 
 
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA 
CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 
 
 
A CONTRIBUIÇÃO DO PRONERA NA CONSTRUÇÃO DE 
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO DO CAMPO E 
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 
 
MÔNICA CASTAGNA MOLINA 
 
 
 
 
Tese de Doutorado submetida ao Centro de Desenvolvimento Sustentável da 
Universidade de Brasília, como parte dos requisitos necessários para a obtenção 
do Grau de Doutor em Desenvolvimento Sustentável, área de concentração em 
Política e Gestão Ambiental. 
 
 
Aprovado por: 
 
_______________________________________________ 
Laís Mourão Sá, Professora Doutora/UnB 
Orientadora 
 
________________________________________________ 
Leila Martins Chalub. Professora Doutora/UnB 
Examinadora Interna 
 
__________________________________________________ 
Suzi Huff Theodoro . Professora Doutora /UnB 
Examinadora Interna 
 
_________________________________________________ 
Bernardo Mançano Fernandes. Professor Doutor /UNESP 
Examinador Externo 
 
_________________________________________________ 
Roseli Salete Caldart. Professora Doutora/ITERRA 
Examinadora Externa 
 
_________________________________________________ 
Eliana Lutzgarda Collabina Ramirez Abrahão. Professora Doutora /UnB 
Examinadora Interna - Suplente 
 
 
Brasília, DF, 11 de novembro de 2003 
 
Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da Universidade de Brasília 
 
Molina, Mônica Castagna: 
Título / Mônica Castagna Molina. – Brasília, 2003. 
282 p. il. 
 
 
Orientadora: Laís Mourão Sá. 
Tese (Doutorado em Desenvolvimento Sustentável) - Universidade de Brasília. 
Centro de Desenvolvimento Sustentável. 
 
1. Sustentabilidade - Tese. 2. Reforma Agrária - Tese. 3. Educação do Campo - 
Tese. 4. Educação e a Questão Agrária – Tese. I. Sá, Laís Maria Mourão. II. 
Universidade de Brasília. III. Título. 
 
DF/BS/CCSA CDU 37.035 (81) 
(043.3) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
É concedida à Universidade de Brasília permissão para reproduzir cópias desta 
tese e emprestar ou vender tais cópias somente para propósitos acadêmicos e 
científicos. O autor reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta 
tese de doutorado pode ser reproduzida sem a autorização por escrito da autora. 
 
 
 
Mônica Castagna Molina 
Autora 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
O processo de produção de trabalhos acadêmicos costuma ser carregado 
de intensa solidão. Porém, esta tese, assim como a recente história de 
construção da Educação do Campo, só foi possível em função de um trabalho 
coletivo, fruto de muitas reflexões conjuntas no desafio de compreender a 
realidade do campo brasileiro e os caminhos para o seu desenvolvimento. Quero 
agradecer de coração a muitas pessoas que foram imprescindíveis para 
concretização desta tese. 
 
 
A Antonio Molina Serralvo e Cleyde Castagna Molina, pelo imenso e sólido 
amor que sempre me ofertaram. E ainda, por todo o apoio no trabalho pesado 
de tabulação e elaboração dos gráficos , e pelas longas orações. 
 
Á Sônia Meire Santos Azevedo de Jesus, amiga irmã, que viveu comigo a 
angústia da redação da tese, pela inestimável contribuição nos debates, na 
leitura, reescrita, enfim , no parto da tese. 
 
 A minha querida amiga Elisângela Nunes Pereira, por todo carinho e 
cuidado durante o período de redação, e também enorme contribuição em todo o 
trabalho de digitação e finalização da tese. 
 
 A amiga amada, Catarina dos Santos Machado, pela tão rica convivência e 
por todos os valores ensinados. 
 
 Aos grandes educadores, Bernardo Mançano Fernandes e Roseli Salet 
Caldart, não só pelas ricas contribuições ofertadas para a construção desta tese, 
desde o exame de qualificação, mas principalmente pelas lições práticas com o 
própria exemplo de vida. 
 
 Aos amigos Edgar Jorge Kolling, João Rezek Júnior, João Claúdio Todorov 
e Elfi Fenske, que arduamente trabalharam na luta de resistência para a 
manutenção do Pronera. 
 
As queridas amigas Érica , Martinha e Marianne, que tiveram muita 
paciência comigo no trabalho, durante a escrita da tese. 
 
Aos amigos, conselheiros, orientadores, irmãos, Ademir e Vilma Araújo 
pela afeto tão intenso e cumplicidade de décadas. 
 
A Laís Mourão de Sá, minha orientadora e amiga, pela tão doce 
convivência, pelos grandes ensinamentos e pela total confiança e liberdade na 
realização desta tese. 
 
 Ao estimado companheiro Lauro Morhy, que abraçou a luta pela Reforma 
Agrária e se empenhou intensamente para a viabilização dos projetos do Grupo 
de Tabalho de Apoio à Reforma Agrária, da UnB. 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Durante as últimas décadas tem prevalecido na sociedade brasileira uma visão 
de desenvolvimento que considera o espaço do rural como o espaço do 
atrasado, do inferior, do arcaico. Simultaneamente, projeta-se a cidade como o 
lugar da modernidade e do progresso. Essa visão da modernidade voltada para 
cidades, sustentou a implementação de um modelo de desenvolvimento agrícola 
baseado em extensas áreas de monocultura, cultivadas com utilização intensa 
de insumos químicos e mecanicos, sobre grandes concentrações fundiárias. 
Esse modelode modernização da agricultura expulsou, nas últimas décadas, 
mais de trinta milhões de pessoas do campo. Em oposição a esta visão, 
propondo o campo como espaço de inclusão social e democratização da 
sociedade brasileira movimentos sociais e setores da sociedade civil organizam-
se e lutam por Reforma Agrária. Esta é uma política central para mudança do 
modelo de desenvolvimento vigente, a partir de sua capacidade de desconcentrar 
terra e renda. Como um dos principais resultados da luta pela desconcentração 
fundiária, trabalhadores rurais têm conquistado também a desconcentração do 
conhecimento. Parte destas conquistas materializaram-se na criação do 
Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária, e na construção da 
Articulação Nacional por uma Educação do Campo, cujas histórias foram 
recuperadas neste trabalho. Esta ação dos movimentos sociais foi responsável 
pela ampliação do debate da questão agrária, incorporando a ele definitivamente 
mais um tema : a Educação do Campo, construindo também com esta área um 
novo espaço de produção do conhecimento, cujo marca principal é a 
transdiciplinaridade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
LISTA DE FIGURAS III 
LISTA DE TABELAS IV 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS V 
 
INTRODUÇÃO 1
 
1. A MUDANÇA DO MODELO DE DESENVOLVIMENTO A PARTIR 
DO CAMPO 
 
1.1. A Revalorização do Campo como Espaço de Desenvolvimento 5 
1.2. Desenvolvimento Sustentável e Questão Agrária 11 
1.3. O Papel da Reforma Agrária para a construção de um Novo Modelo 
 de Desenvolvimento 26 
1.4. A Educação como requisito para a construção da Sustentabilidade 
nas áreas de Reforma Agrária 33 
 
 
2. A CONSTRUÇÃO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO NA 
REFORMA AGRÁRIA E DA ARTICULAÇÃO NACIONAL POR UMA 
EDUCAÇÃO DO CAMPO 
 
2.1. Antecedentes da criação do Programa Nacional de Educação na 
Reforma Agrária 47 
2.2. O processo político que garantiu a existência do Pronera 52 
2.2. Antecedentes e reflexões da I Conferência Nacional Por Uma 
Educação Básica do Campo: as sementes de um novo paradigma 62 
2.3. Desdobramentos da Articulação Nacional Por Uma Educação 
do Campo: algumas ações no período de 1999 –2003 68 
2.4. Os primeiros frutos: a conquista das Diretrizes Operacionais 
para Educação Básica das Escolas do Campo 74 
 
3. PRONERA: CONSTITUIÇÃO PRÁTICA E TEÓRICA DA EDUCAÇÃO 
DO CAMPO 
3.1. A metodologia da pesquisa 83 
3.2. As estratégias adotadas nas primeiras experiências de 
Educação de Jovens e Adultos do Pronera 85 
3.3. As estratégias dos Cursos Profissionalizantes e Superiores do 
Pronera – a formação dos Educadores do Campo 100 
3.4. Ouvindo os sujeitos da Educação do Campo no Pronera 108 
3.4.1. A relação da alfabetização com a construção da cidadania 
e da auto-estima 108 
3.4.2. O difícil aprendizado das parcerias 113 
3.4.3. A contribuição do Pronera para a construção da 
Sustentabilidade 116 
3.4.4. O Pronera e a construção dos paradigmas da Educação 
do Campo 120 
 
CONCLUSÕES 
Dos espaços conquistados: Como amarrar nossos arados às estrelas 126 
 
FONTES PRIMÁRIAS DE PESQUISA POR ANO, TÍTULO E AUTOR 137 
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS 140 
ANEXOS 146 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
FIGURA 1 – Comprovação do rendimento médio mensal entre 
regiões e áreas urbanas e rurais 20 
 
 
FIGURA 2 – Principais resultados alcançados com a execução 
do Pronera, segundo os integrantes do MST 110 
 
FIGURA 3 – Participação de outras Secretarias Municipais 
e Estaduais na execução do Pronera, segundo os professores 115 
 
FIGURA 4 – Participação de outras Secretarias Municipais 
e Estaduais na execução do Pronera, segundo os gestores do Incra 115 
 
 
FIGURA 5 – Campos de intervenção nas questões ambientais após 
 a criação do Pronera, segundo professores 118 
 
 
FIGURA 6 – Novas áreas de conhecimento das universidades que 
 incluem a Educação do Campo, segundo os integrantes do MST 122 
 
 
FIGURA 7 – Ampliação de produção acadêmica das universidades, 
segundo os professores 123 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE TABELAS E QUADROS 
 
 
TABELA 1 – Proporção de Pobres no Meio Rural. Brasil e 
Regiões. 1990 20 
 
TABELA 2 – Média de Anos de Estudo da População de 15 anos 
ou mais. 2001 21 
 
TABELA 3 – Taxa de analfabetismo população de 15 anos ou 
mais. 1991-2000 22 
 
TABELA 4 – Freqüência à escola na faixa de 15 a 17 anos. 2000 22 
 
QUADRO 1 – Características de processo de gestão das Políticas 
Públicas 47 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
 
ANMTR – Associação Nacional das Mulheres Trabalhadoras Rurais 
CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil 
CNE – Conselho Nacional de Educação 
CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura 
CPT – Comissão Pastoral da Terra 
CRUB – Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras 
EFAs – Escolas Família Agrícola 
ENEJA – Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos 
ENERA – Encontro Nacional das Educadoras e dos Educadores da Reforma 
Agrária 
FUB – Fundação Universidade de Brasília 
GTRA – Grupo de Trabalho de Apoio à Reforma Agrária 
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano 
IES – Instituições de Ensino Superior 
INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária 
IPEA – Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas 
ITERRA – Instituto Técnico de Estudos e Pesquisas da Reforma Agrária 
MAB – Movimento de Atingidos por Barragens 
MEC – Ministério da Educação 
MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário 
MPA – Movimento de Pequenos Agricultores 
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra 
MS – Movimentos sociais 
ONG – Organização Não Governamental 
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar 
PRONAF – Programa Nacional de Apoio à Agricultura Familiar 
PRONERA – Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária 
SEDUC – Secretaria Estadual de Educação 
SOF – Secretaria de Orçamento Federal 
UECE – Universidade Estadual do Ceará 
UEMS – Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul 
UFAL – Universidade de Alagoas 
UFCE – Universidade Federal do Ceará 
UFPR – Universidade Federal do Paraná 
UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
UFS – Universidade Federal de Sergipe 
UnB – Universidade de Brasília 
UNEFAB – União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas 
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura 
UNESP – Universidade Estadual Paulista 
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância 
UNIJUI – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul 
UVA – Universidade do Vale do Acaraú 
 
 
 
Lista das universidades e instituições que já trabalharam e/ou são parceiras do 
Pronera 
 
Centro Federal de Formação Tecnológica do Maranhão 
Escola Estadual Agrícola Juvêncio Martins Ferreira – Unaí - MG 
Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária 
Instituto Tecnosma 
Universidade Estadual de Feira de Santana 
Universidade Estadual de Santa Cruz 
Universidade do Estado da Bahia – Campus de Barreiras 
Universidade do Estado da Bahia – Campus de Bom Jesus da Lapa 
Universidade do Estado da Bahia – Campus de Irecê 
Universidade do Estado da Bahia – Campus de Teixeirade Freitas 
Universidade Federal da Bahia 
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia 
Universidade Federal da Paraíba 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Campus de Macau 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Campus de Natal 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Campus de Caicó 
Universidade Estadual do Rio Grande do Norte – Campus dee Mossoró 
Universidade Federal do Piauí 
Universidade Federal de Pernambuco 
Universidade de Pernambuco – Campus de Petrolina 
Universidade de Pernambuco – Campus de Guaranhuns 
Universidade de Pernambuco – Campus de Nazaré 
Universidade Federal Rural de Pernambuco 
Universidade Federal de Sergipe 
Universidade Federal de Alagoas 
Universidade Federal do Maranhão – Campus de São Luís 
Universidade Federal do Maranhão – Campus de Imperatriz 
Universidade Estadual do Vale do Acaraú 
Universidade Federal do Ceará 
Universidade Estadual do Ceará 
Universidade Federal de Rondônia – Campus de Rolim de Moura 
Universidade Federal de Rondônia – Campus de Ji-Paraná 
Universidade do Tocantins – Campus de Palmas 
Universidade do Tocantins – Campus de Gurupi 
Universidade do Tocantins – Campus de Araguaína 
Universidade do Tocantins – Campus de Guaraí 
Universidade do Tocantins – Campus de Tocantinópolis 
Universidade Federal do Pará – Campus de Belém 
Universidade Federal do Pará – Campus de Marabá 
Universidade Federal do Acre 
Universidade do Estado do Pará 
Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul 
Universidade Federal do Mato Grosso do Sul 
Universidade do Estado do Mato Grosso – Campus de Nova Xavantina 
Universidade do Estado do Mato Grosso – Campus de Cáceres 
Universidade Federal de Goiás 
Universidade de Brasília 
Universidade do Oeste de Santa Catarina – Campus de Videira 
Universidade do Oeste de Santa Catarina – Campus de Chapecó 
Universidade Federal de Santa Maria 
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul 
Universidade do Vale do Rio dos Sinos 
Universidade Estadual de Londrina 
Universidade Estadual de Maringá 
Universidade Estadual de Ponta Grossa 
Universidade Federal do Paraná 
Universidade Estadual de Montes Claros 
Universidade Estadual de Minas Gerais 
Universidade Federal de Viçosa 
Universidade Federal de Minas Gerais 
Universidade Federal Fluminense 
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro 
Universidade Federal do Espírito Santo 
Universidade Estadual Júlio de Mesquita – Campus de Marília 
Universidade Estadual Júlio de Mesquita – Campus de Presidente Prudente 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
Desde a graduação trabalho com Reforma Agrária pesquisando esta temática, 
primeiro no âmbito do Direito Agrário, depois na área das Políticas Públicas, onde 
fiz Especialização sobre políticas para a questão agrária. No mestrado em 
Sociologia, desenvolvi pesquisa intitulada “Reforma Agrária e o Movimento dos 
Trabalhadores Rurais Sem Terra – A reinvenção do futuro”, na Universidade 
Estadual de Campinas. 
Em 1996, comecei a trabalhar na Universidade de Brasília, na Coordenação 
do Grupo de Trabalho de Apoio à Reforma Agrária, cuja missão é desenvolver 
projetos de ensino, pesquisa e extensão no âmbito da questão agrária brasileira. 
Em função deste trabalho tive a rica oportunidade de estreitar os vínculos anteriores 
com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a partir da realização em 
parceria de diversos projetos, em diferentes áreas do conhecimento. 
Uma das áreas de trabalho mais fecundas que nos envolvemos foi com o Setor 
de Educação do MST. A partir de suas demandas e projetos, realizamos ações 
educativas em diferentes níveis nas áreas de Reforma Agrária. A partir da realização 
do I Encontro Nacional das Educadoras e Educadores da Reforma Agrária, em 
1997, uma série de desdobramentos ocorreram. Um destes desdobramentos foi a 
criação do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – Pronera. 
Em função das atividades desenvolvidas na UnB, como coordenadora do 
Grupo de Trabalho de Apoio à Reforma Agrária, fiquei responsável pelas 
articulações insterinstitucional do processo de negociação que resultou no Pronera, 
sendo que tive o privilégio de participar de todas as discussões para criação desta 
política pública. Participei também, representando a UnB, das proposições e ações 
que resultaram na criação da Articulação Nacional por uma Educação do Campo. 
Membro da Comissão Pedagógica Nacional e da Comissão Executiva do 
Pronera, nos 5 anos recentes acompanhei, em vários momentos, as tentativas do 
governo Fernando Henrique de extinguir o Pronera, impedindo a liberação de 
recursos com contigenciamentos e alterando a estruturação e o funcionamento da 
Comissão Pedagógica, reduzindo-lhe a composição e se opondo ao 
encaminhamento de projetos. Apesar das investidas e de grande retenção de 
 2
recursos pelo governo, os movimentos sociais, principalmente através das ações do 
Movimento Sem Terra, conseguiram garantir a continuidade do Programa. 
O Pronera foi oficializado em 16 de abril de 1998. Até 2003 apoiou mais de 150 
projetos nos assentamentos rurais, contabilizando parcerias com mais de 55 
universidades públicas federais e estaduais. 
De onde nasce esta pesquisa? Da convicção de analisar teoricamente o 
significado de um movimento social impulsionar e pressionar construírem-se 
políticas públicas de educação. No exame de qualificação deste doutoramento, 
Roseli Salete Caldart ressaltou a necessidade de registrar “o que produz a 
proposição do Pronera e o que a proposição do Pronera produz”. Entender quais 
condições históricas e qual acúmulo político de forças tornou possível propor-se uma 
política de educação específica para as áreas de Reforma Agrária, numa conjuntura 
de desmonte e intervenção do Estado na educação. Ao mesmo tempo se quer 
analisar o que significou e o que produziu a existência desta política. Não se 
pretende avaliar eficiência pedagógica de práticas educativas que o Pronera apóia, 
porém estratégias de articulação dos movimentos sociais, significantemente do MST. 
Esta pesquisa é para mim a realização prática dos pressupostos teóricos de 
produção do conhecimento propostos por Edgar Morin. Não se produz ciência 
abortando-se a subjetividade dos sujeitos. Ao tempo que realizo esforços para 
análise teórica dos processos vividos, trago também a memória afetiva de co-
partícipe da escrita desta história. No livro O Pensamento Complexo, há um artigo 
intitulado “Viver, Compreender, Amar”, do qual extraio afirmação orientadora para 
este esforço de reflexão sobre o próprio processo que vivi: uma vida totalmente 
racional é pura loucura. (1999, p. 181) 
Reunir-se-ão elementos úteis a outras estratégias para elaborar políticas 
públicas de educação num campo novo de conhecimento que se está construindo a 
partir do que estamos chamando de transição de paradigmas. Desta reflexão 
proposta por Edgar Morin sobre transição de paradigmas propusemo-nos considerar 
a hipótese de compreender o campo do saber novo como campo do conhecimento 
que se produz a partir da transdisciplinaridade e exige um pensar complexo para 
absorvê-lo. Complexidade é a forma de pensar o mundo que mostra a necessidade 
de abordar todo problema e todo processo pelo ponto de vista da trama das relações 
 3
em que se inserem. Problema é processo não linear, não vertical, organizado em 
rede cuja lógica depende da realidade em si e da compreensão dos paradigmas que 
norteiam o conhecimento. 
Para Morin há complexidade quando os componentes “constituem um todo 
(como o econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo, o mitológico 
são inseparáveis) e existe um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo 
entre as partes e o todo, o todo e as partes” (2001, p.20).Nesse instante do 
apreender nos propusemos a analisar a questão agrária. Morin ensina-nos que a 
postura paradigmática implica questionar o conhecimento disponível e nova 
reorganização do conhecimento, longe das determinações e do entendimento de 
problemas por linearidade ou neutralidade histórica. O princípio basilar dessa 
organização é contextualizar, o que se deve ter como imperativo em educação. A 
referência de Morin muito vale para a Reforma Agrária e as novas 
socioterritorializações. 
Todo conhecimento constitui, ao mesmo tempo, uma tradução e 
uma reconstrução, a partir de sinais, signos, símbolos, sob a forma 
de representações, idéias, teorias, discursos. A organização dos 
conhecimentos é realizada em função de princípios e regras; 
comporta operações de ligação (conjunção, inclusão, implicação) e 
de separação à ligação, da ligação à separação, e, além disso, da 
análise à síntese, da síntese à análise. Ou seja: o conhecimento 
comporta, ao mesmo tempo, separação e ligação, análise e síntese 
(Morin, 2001, p. 24). 
 
 
São estas reflexões propostas que nos orientaram na análise da questão 
agrária brasileira, procurando compreender os diferentes elementos que a 
compõem. O aspecto principal desta reflexão sobre a questão agrária relaciona-se 
aos índices de concentração fundiária extremamente altos ainda vigentes na 
sociedade brasileira e as consequências sociais, econômicas, políticas, culturais e 
ambientais que advém desta concentração. 
A principal ferramenta para alterar esta situação é a intervenção do Estado 
na estrutura fundiária a partir da realização da Reforma Agrária. E a nossa primeira 
 4
hipótese de interpretação é que a luta dos movimentos sociais para a sua 
realização incorporou mais um elemento à constituição da questão agrária 
brasileira : a Educação do Campo. 
No primeiro capítulo refletimos sobre a emblemática luta produzida pelos 
movimentos sociais na perspectiva de ter o campo como espaço central de novo 
modelo de desenvolvimento, cuja preocupação não é produzir infinitamente 
mercadorias, mas criar vida digna e sustentável para a sociedade e a natureza. 
Construir esse modelo exige repensar as funções da agricultura e as do meio rural, 
aliadas à radical transformação do acesso e do uso do conhecimento no campo. 
Analisamos a ação prática dos movimentos sociais na busca deste modelo no 
segundo capítulo, em que reconstituímos a história do Programa Nacional de 
Educação na Reforma Agrária e a construção da Articulação Nacional por uma 
Educação do Campo. E aí se coloca nossa segunda hipótese de trabalho: o conjunto 
de práticas pedagógicas e reflexões teóricas produzidas a partir da intensa ação 
dos movimentos sociais cria um novo espaço de produção de conhecimento, 
essencialmente transdicipinar. 
No terceiro capítulo trabalhamos a constituição teórica e a prática do novo 
campo do conhecimento, pesquisando estratégias e práticas desenvolvidas nos 
projetos apoiados pelo Pronera. Em pesquisa documental, entrevistas semi-
estruturadas e aplicação de questionários recolhemos as problemáticas reunidas 
pelo fio condutor da análise das estratégias na implementação das experiências do 
Pronera. Fundamentamos a tese ora defendida: pensarmos o Pronera como 
constituinte prático e teórico da Educação do Campo e de produção de políticas 
públicas. 
Nas conclusões apresentaremos estratégias a incorporar seguindo as lições do 
Pronera e as da Articulação Nacional na construção de políticas públicas de 
Educação do Campo que são capazes de contribuir na promoção do 
Desenvolvimento Sustentável. 
 
 
 
 5
CAPÍTULO 1.º 
A MUDANÇA DO MODELO DE DESENVOLVIMENTO A PARTIR DO 
CAMPO 
 
1.1. A REVALORIZAÇÃO DO CAMPO COMO ESPAÇO DE 
DESENVOLVIMENTO 
 
A construção do modelo de desenvolvimento capaz de garantir aos brasileiros 
dignas condições de vida passa pelo campo. Encontrar alternativas para 
democratizar a distribuição de renda - indispensável à retomada do crescimento 
econômico - exige sistemático esforço e investimentos em estudo e pesquisa das 
possibilidades que o espaço rural representa em potencialidade de geração de 
empregos, renda, espaço de moradia, serviços. 
Além de alternativas para incluir mais de 52 milhões de pobres na sociedade, 
um novo modelo deve pensar caminhos para enfrentar o caos das metrópoles, 
conseqüência da modernização conservadora da agricultura. Redescobrir a 
interação campo-cidade, em que reflexões sobre ocupação e utilização do território 
são o eixo central para se construir um novo modelo. 
 A partir dos anos 70, o campo ocupou pouco espaço na agenda nacional de 
pesquisa. Levantamento preliminar em programa de pós-graduação brasileiro da 
Universidade Federal do Rio Grande do Sul atesta que somente 2% das pesquisas 
dizem respeito ao rural, que precisa ser reconduzido à agenda de pesquisas 
construindo conhecimentos que nos possibilitem utilizar todo o seu potencial. 
Atualmente diversas questões das sociedades contemporâneas tem restituído 
ao campo a importância que foi deixada para trás a partir da ênfase no 
desenvolvimento a partir das cidades. Wanderley (1997) analisa que problemas 
com o meio ambiente, discussões sobre o papel da agricultura no desenvolvimento, 
crises sociais e sobretudo ausência de emprego e transformações na agricultura 
 
recolocaram a problemática da “ruralidade” no contexto das 
sociedades modernas. Fala-se de um “renascimento rural”, da 
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necessidade de formulação de uma teoria da localidade (não 
apenas rural, diga-se de passagem) e de novas relações entre o 
campo e a cidade. Estes, longe de constituírem pólos opostos, 
guardam especificidades que não se anulam e que se expressam 
social, política e culturalmente (idem, p. 92). 
 
O debate da relação campo-cidade perpassa todas as reflexões que 
pretendemos desenvolver. Por muito tempo a visão que prevaleceu na sociedade, 
continuamente majoritária em muitos setores, é a que considera o campo lugar 
atrasado, do inferior, do arcaico. Nas últimas décadas consolidou-se um imaginário 
que projetou o espaço urbano como caminho natural único do desenvolvimento, do 
progresso, do sucesso econômico, tanto para indivíduos como para a sociedade. De 
certa maneira esta foi a visão-suporte para o processo de modernização da 
agricultura implementado no país. 
 
o desenvolvimento do capitalismo ocidental transformou a cidade em 
lugar privilegiado para a localização da indústria, do comércio e dos 
serviços, ou seja, um lugar de produção e trocas. Os centros urbanos 
passaram a ser pólos irradiadores de mercadorias e tecnologia e, 
consequentemente, de valores ideológicos e culturais, reforçando 
uma distinção dicotômica entre a cidade e o campo. Essa dicotomia 
tem funcionado como uma lógica explicativa fundante da realidade 
social, que ora contrapõe os dois pólos, ora subordina, 
incondicionalmente, o rural ao urbano SAUER (2002, p. 13) 
 
A leitura de "superioridade" do espaço urbano mascarou as conseqüências 
sociais, econômicas, ambientais, políticas e culturais nefastas do modelo de 
desenvolvimento agrícola das últimas décadas, enquanto à cidade associou-se ao 
espaço moderno, futurista, avançado. Trabalhadores rurais, indígenas, quilombolas, 
são vistos por setores da sociedade como inferiores, não merecedores dos direitos e 
das garantias legadas aos moradores de grandes centros urbanos. 
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Essa negação de direitos é facilmente constatada a partir da precariedade de 
condições de vida em que se encontram populações de áreas rurais. Wanderley 
(1997, p. 100) observa ser marcante no Brasil ausência de poder público no meio 
rural,verificando-se carência de bens e serviços nesses locais. Vê que “em 
conseqüência, o rural está sempre referido à cidade como sua periferia espacial 
precária, dela dependendo política, econômica e socialmente”. 
Em geral, a vida da população rural depende estreitamente do núcleo urbano 
que a congrega, para poder suprir demandas econômicas ou sociais. Wanderley 
(idem, p.100) enfatiza que no país o rural é espaço de precariedade social. Mesmo a 
supressão de necessidades elementares dos indivíduos (acesso a médicos, bancos 
e igrejas) exige que os moradores se desloquem para as áreas urbanas. Quando 
estas “pequenas aglomerações crescem e multiplicam suas atividades, o meio rural 
não se fortalece, pois o que resulta deste processo é freqüentemente a sua 
ascensão à condição de cidade, brevemente sede do poder municipal”. 
A ausência do poder e de investimentos públicos rurais associa-se a um 
paradigma de desenvolvimento que nas últimas décadas dominou a sociedade 
brasileira e a partir do qual - com o processo de modernização - o espaço rural foi 
destinado a perder importância, tornando-se completamente subordinado à cidade. 
Veiga (2002, p.5) explicita essa visão ao afirmar que no Brasil há grande 
crença “de que sua fortíssima urbanização transformará a população rural em 
relíquia de um ultrapassado subdesenvolvimento”. Boa parte das elites brasileiras 
entende o esvaziamento sociocultural e demográfico do meio rural como 
desenvolvimento, i.e., alcançaremos a plenitude da modernidade quando a imensa 
maioria da população for urbanizada. Esta leitura fortalece a compreensão de que 
não há sentido o Estado investir recursos, criar políticas públicas específicas para 
um espaço que se extinguirá. Segundo dados oficiais 75,5% da população residia 
em áreas urbanas em 1991, proporção que teria atingindo 81,2% em 2000 (p. 21). 
Veiga contesta esta análise estatística e aponta graves distorções 
metodológicas na construção dos índices. Estudando os dados da pesquisa IPEA-
IBGE-NESUR desde o censo de 1996, Veiga conclui que seria “ficção estatística” 
afirmar que 81,2% da população brasileira é urbana. A “ficção” origina-se de 
tradicionalmente, no Brasil, classificarem-se domicílios por zona onde se encontram: 
rural ou urbana. 
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Como todos municípios têm necessariamente zona urbana, “mesmo que 
sitiada pela mais cerrada das matas, pela mais rala das caatingas, pela mais 
extensiva das pastagens ou pela mais erma das plantações” são considerados 
urbanos os imensos contingentes populacionais que vivem no campo. 
Demonstrando a inconsistência da aferição, Veiga (idem, p. 5) observa que 
“casebres recenseados em veredas ou clareiras desses biomas são considerados 
tão urbanos quanto um duplex no centro de uma metrópole como São Paulo”. 
Wanderley (1997, p. 97/98) reitera esta crítica afirmando que no Brasil 
 
atribui-se a toda sede municipal a condição de cidade e à sua 
população a condição de urbana, independentemente de suas 
dimensões. Da mesma forma são consideradas igualmente urbanas 
certas concentrações populacionais que em alguns casos são de 
dimensão extremamente reduzida, como acontece com a grande 
maioria das sedes distritais. Além disso, é urbano quem habita 
sedes urbanas dos municípios, independentemente das profissões 
desempenhadas. Assim, um pequeno comerciante residente num 
‘village’ europeu ou norte-americano, sem ser agricultor é um rural, 
enquanto o agricultor brasileiro que more na cidade é aqui 
considerado um legítimo urbano. 
 
Ao definir rural e urbano aliando critérios que incluem densidade 
demográfica por quilômetro quadrado, localização e tamanho populacional, Veiga 
(2002, p. 112) sustenta que 86,6 milhões de pessoas (55% da população) pertencem 
de fato à rede urbana. Dos “5.507 municípios brasileiros, 4.990 podem ser quase 
tudo o que se queira, menos cidades. A não ser que esse vocábulo se tenha tornado 
sinônimo de vila, povoado, vilarejo ou aldeia”. 
Muito mais que alertar que não é urbana quase metade da população 
brasileira, esta abordagem permite caracterizar três padrões básicos de território: 
“realmente urbano, rural profundo e os meandros rurais imprecisos ou ambíguos.” A 
partir desta nova leitura “podemos considerar como população rural 52 milhões de 
pessoas” (Veiga, p.113). 
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Esta tipologia é de extrema importância porque permite um novo desenho 
para a elaboração das políticas públicas, a partir da vontade política de se construir 
um novo modelo de desenvolvimento. Interessa-nos demonstrar a importância do 
campo como espaço de inclusão social, a partir de uma nova visão territorial sobre 
os processos de desenvolvimento. Interessa-nos analisar quais são as 
possibilidades que podemos construir enquanto nação a partir da utilização dos 
vastos espaços territoriais rurais e do investimento intensivo na formação, 
valorização e escolarização formal da população do campo. 
Ignacy Sachs desenvolve reflexões que enfatizam a centralidade do espaço 
do campo para mudar o modelo desenvolvimento. Sachs (2001) aponta que já está 
em curso um novo movimento no processo migratório em função das próprias 
mudanças experimentadas pela sociedade nacional a partir dos ciclos econômicos 
que o país atravessa. As mudanças migratórias sinalizam crescerem as populações 
rurais em municípios que Veiga (2002, p. 78) admite serem municípios rurais 
atraentes. Em um quarto dos municípios essencialmente rurais houve crescimento 
populacional bem superior ao dos urbanos. Nos 1.109 municípios mais atraentes do 
Brasil rural, a população aumentou mais de 30%, enquanto cresceu 20% no Brasil 
urbano e 15% no conjunto do país. 
O movimento de crescimento que Sachs aponta muito importa para 
estabelecermos uma estratégia política deliberada que tenha forte intencionalidade 
de direcionar o desenvolvimento desde o Brasil rural. 
 Wanderley (2000) enfoca que a revalorização rural em curso relaciona-se a 
pela primeira vez na história brasileira a agricultura familiar estar sendo oficialmente 
reconhecida como ator social e a criação do Programa Nacional de Apoio à 
Agricultura Familiar – Pronaf é um sinal explícito disto. Se produtores de baixa 
renda e pequenos produtores eram antes os pobres do campo, hoje 
 
os agricultores familiares são percebidos como portadores de outra 
concepção de agricultura, diferente e alternativa à agricultura 
tradicional, diferente e alternativa à agricultura latifundiária e 
patronal dominante no país. A forte e efetiva demanda pela terra se 
traduz na emergência de um setor de assentamentos de Reforma 
Agrária. Uma das principais conseqüências dos dois movimentos é a 
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revalorização do meio rural como lugar de trabalho e de vida 
expresso na retomada da reivindicação por permanência ou retorno 
à terra. Esta “ruralidade” da agricultura familiar, que povoa o campo 
e anima sua vida social, se opõe, ao mesmo tempo, à relação 
absenteísta, despovoada e predatória do espaço rural, praticada 
pela agricultura latifundiária, à visão “urbano-centrada” dominante na 
sociedade e à percepção do meio rural sem agricultores Wanderley 
(2000, p. 29) 
 
Consoante essa reflexão, Sauer (2002, p.17) estuda que há o ressurgimento na 
atualidade de um “processo de retomada teórica do rural como tentativa de resgatar 
os diferentes processos de transformação porque passa a sociedade”. Desenvolve a 
reflexão analisando estar em curso amplo movimento social e político que trabalha 
recriar o sentido do espaço do campo na luta pela terra no Brasil. 
 
Essa luta é processo social e político que abarca diferentes 
transformações no meio rural, redirecionando e democratizando a 
participaçãoda população rural no conjunto da sociedade. A luta 
garante bem-estar social, melhoria de vida e impulsiona 
transformações culturais, simbólicas e representacionais, gesta 
valores e representações sociais. Cria perspectivas para o rural, 
transforma a relação com o meio ambiente (sustentabilidade) e com 
o lugar (reterritorialização) entre as pessoas (nova sociabilidade), 
abre perspectivas para a nova ruralidade no Brasil. 
 
Interpretação pertinente na recriação do sentido do espaço do campo não 
ignora subjetividades, representações nem o imaginário social, que possibilitará criar 
e inovar fundamentando-se na cultura de cada espaço/território. COSTA (2002) diz: 
 
a construção das representações pelos homens também incorpora o 
cotidiano desses homens. As representações da terra que os 
sujeitos em questão constróem nascem de suas experiências 
vivenciadas no dia-a-dia, na luta pela conquista da terra, do senso 
 11
comum que carregam consigo, da capacidade que contam de se 
descolarem do mundo (p. 148). 
 
A ativa luta social vivida no Brasil quanto ao acesso à terra insere-se num 
processo maior que questiona a lógica do modelo de desenvolvimento em que não 
há espaço para todos, e a natureza é mercadoria. Quando Wanderley (1997, 2000) 
e Sauer (2002) explicitam o processo de recriação do rural por lutas sociais como 
aquele que não quer só melhorias socioeconômicas, mas modo de vida harmonioso 
com a natureza, as pessoas, uso/produção de conhecimento, remetem-nos a 
conceituar desenvolvimento rural sustentável . 
 
1.2. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E QUESTÃO AGRÁRIA 
 
As interpretações dicotomizadas da realidade, fundadas na racionalidade 
científica que se estruturou baseada na separação sujeito-objeto do conhecimento, 
não têm sido capazes de responder aos inúmeros questionamentos que se colocam 
diante da gravidade e da diversidade dos problemas enfrentados pela sociedade 
contemporânea. 
A novidade dos problemas e ausência de respostas satisfatórias a eles, 
aliados a ineficiência dos modelos de explicação até então oferecidas pela ciência, 
caracterizam uma situação de transição, de mudanças de paradigmas. A 
complexidade dos problemas, exige que se pense como enfrentar as questões 
ambientais, econômicas, sociais, políticas, culturais através de reorientação do 
modelo de desenvolvimento vigente na sociedade. 
Esta crise do modelo de desenvolvimento e da forma de conhecer a própria 
realidade podem ser definidas como um momento de transição de paradigmas, onde 
ainda não existem novos métodos definidamente eficientes para conhecer, como 
também a própria idéia da autosuficiência dos métodos é posta em causa. É dentro 
deste ambiente de incertezas e de mudanças que Pires (1998) propõe uma reflexão 
sobre o conceito de desenvolvimento sustentável. 
 12
Este autor considera que ainda não há, de fato, um conceito preciso acerca 
do que seria considerado desenvolvimento sustentável, alertando que há muito mais 
uma rejeição dos padrões atuais, do que a definição do conteúdo dos novos 
padrões e valores. O certo é que uma concepção que analise o desenvolvimento 
buscando a sustentabilidade não pode continuar insistindo num padrão de leitura 
que só é capaz de perceber a realidade de uma maneira fragmentada, 
compartimentalizada, dividida em diferentes “caixinhas” de ciência. A idéia da 
sustentabilidade exige um olhar complexo, capaz de abordar simultaneamente os 
aspectos sociais, econômicos, ambientais, políticos, culturais e institucionais dos 
problemas analisados. 
De acordo com a reflexão proposta pelo autor, estaria se constituindo na 
ciência uma nova “consciência da complexidade do real”, onde uma das dicotomias 
fundantes do modo de conhecer estaria sendo posta em causa: a separação 
sociedade e natureza, a partir da constatação de que “o meio ambiente é 
frontalmente atingido pelos fatores econômicos, sociais e culturais da sociedade 
moderna” Pires (1998, p.20). 
Assim, a crença reconfortante para muitos cientistas da possível separação 
entre sujeito e objeto do conhecimento é profundamente abalada pela compreensão 
que qualquer ação sobre a natureza e o meio ambiente provoca novas alterações e 
novos padrões de comportamento na própria natureza, correlacionados ao tamanho 
e ao impacto da ação humana desencadeadora desta determinada reação. 
Esta profunda discussão sobre a forma de conhecer e intervir na realidade 
não deve ser apenas um exercício de diletantismo acadêmico, mas, deve estar 
orientada pela preocupação central de fundamentar um novo patamar para as 
relações entre a sociedade e a natureza, baseados em novos padrões de igualdade 
e de justiça social. 
Conforme observa Pires (1998, p.23 ), os problemas ambientais que 
enfrentamos atualmente são conseqüência do modelo de crescimento econômico 
que fundamenta-se em uma “ciência e uma técnica, que privilegia o lucro em 
detrimento da preservação, o capital vis-a-vis o trabalho, o econômico em relação ao 
social, o poder frente a ética”. 
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Uma nova forma de conhecer, baseada na preocupação de garantir um 
desenvolvimento sustentável para a humanidade necessita caminhar no sentido 
uma “inter e uma transdiciplinaridade das ciências, admitindo, contudo, a 
complexidade e o caráter incipiente desse processo”. (idem, p. 25 ) Ou seja, para de 
fato estabelecermos novos padrões de relação entre a sociedade e natureza, 
fundamentado na busca da sustentabilidade, é necessário não apenas aprender a 
interpretar a realidade através do cruzamento dos conceitos de diferentes áreas do 
conhecimento, mas também através do cruzamento dos diferentes métodos de 
investigação, produzindo assim novos campos disciplinares capazes de abarcar o 
conjunto de variáveis necessárias a uma leitura complexa dos fenômenos sócio-
ambientais. 
A crise do meio ambiente provoca e “testemunha profunda e dramática 
incapacidade da ciência dita universal de fornecer uma visão de mundo compatível 
com as aspirações/necessidades do homem”, segundo PENNA -VEGA (2003:22). 
Da crise ressurge a consciência imprescindível da transição para outro modo de 
pensar a vida, "uma ciência nova baseada na união cooperativa entre 
previsibilidade/imprevisibilidade, certo/incerto, determinado/indeterminado, 
complicado/complexo, ordem/desordem” (p. 23). 
Esta ciência exige compreendermos a relação questão agrária x 
desenvolvimento sustentável por interfaces e interpretações atualizadas sobre a 
realidade agrária, considerando-lhe a complexidade. Uma leitura complexa dos 
fenômenos, capaz de integrar o ambiental ao social ao econômico ao político ao 
cultural é modernizadora e modelar no desenvolvimento em que se opera. RAMOS 
(2001, p. 150) referencia : 
 
A atual discussão sobre desenvolvimento rural sustentável faz 
sentido quando inserida nas reflexões contemporâneas que os 
pensadores de diversas formações vêm fazendo sobre o processo 
de desenvolvimento, pensando nacionalmente ou não. O tema tem 
particular interesse quando remetido à situação dos países 
subdesenvolvidos, pois em suas áreas rurais está a maior parte da 
população mundial excluída daquele processo, muito tempo 
confundido com o processo de urbanização/industrialização. 
Mostrou-se que isto teve enraizamento cultural, já que se cristalizou 
 14
a visão de que rural significa atraso e conservadorismo, tendo 
predominado até hoje um economismo e um racionalismo 
reducionistas, nos quais a preocupação com a conservação do 
solo, do clima, enfim da paisagem ficou em segundo plano, tanto 
quanto a sua relação com a propriedade e com a estrutura fundiária. 
 
 
A relaçãoda estrutura fundiária com a insustentabilidade do modelo de 
desenvolvimento implementado é flagrante. A forma de distribuir a propriedade da 
terra num país influi determinantemente no conjunto de relações econômicas, 
políticas, culturais e sociais que nele se desenvolvem. A propriedade da terra, por 
bem específico que é, tem capacidade natural de produzir outros bens. Confere a 
seu detentor a automática capacidade de gerar riquezas. 
Concentrar a propriedade da terra concentra renda, riqueza, poder político, 
controla as relações sociais nesse espaço. A questão agrária é estrutural. 
Impossibilitar o acesso à terra como meio de produção impede classes 
trabalhadoras rurais de ter acesso a bens e a direitos fundamentais de alimento, 
emprego, moradia, educação. Inviabiliza-se analisar a questão agrária sob a visão 
reducionista. Ao privilegiar um só item (econômico/agronômico/socioagrário), corre-
se risco de propor soluções isoladas, de não incorporar elementos e informações 
definidoras à interpretação da realidade agrária. 
 
a questão agrária é o movimento do conjunto de problemas relativos 
ao desenvolvimento da agropecuária e das lutas de resistência dos 
trabalhadores, que são inerentes ao processo desigual e 
contraditório das relações capitalistas de produção. Em diferentes 
momentos da história, essa questão apresenta-se com 
características diversas, relacionadas aos distintos estágios de 
desenvolvimento do capitalismo. Assim, a produção teórica 
constantemente sofre modificações por causa das novas 
referências, formadas a partir das transformações da realidade 
FERNANDES (2001, p. 23). 
 
 15
As conseqüências da distribuição territorial fazem com que a elas se vincule a 
solução de diversos problemas da sociedade. O centro da questão agrária refere-se 
a níveis de concentração fundiária vigentes no Brasil e às distorções que gera no 
acesso ao trabalho. Concentrar terra nas mãos de poucos proprietários determina o 
círculo vicioso que impede evoluírem grandes parcelas da população e reproduz 
miséria econômica, social, política e cultural no campo e na cidade. 
É por isto que a questão agrária não envolve apenas aspectos agronômicos, 
econômicos, sociais, políticos, culturais ou ambientais. Estes aspectos estão todos 
relacionados e decorrem de uma característica básica da estrutura fundiária do 
Brasil: a concentração da propriedade no pólo superior da pirâmide dos 
proprietários, que provoca extrema fragmentação dos níveis inferiores; e a existência 
de uma grande população rural destituída de terra. “Quando se constata a formação 
desse círculo vicioso, não pode haver dúvida: o desenvolvimento do país em 
questão defronta-se com uma questão agrária” (SAMPAIO. 2002, p.318). 
Sampaio demonstra que existe íntima correlação entre a desigualdade social 
e os níveis de crescimento, contrariando as correntes econômicas majoritárias que 
consideram que os índices de concentração de renda e desigualdades sociais 
existentes na sociedade brasileira não alteram os níveis de crescimento econômico. 
Os índices de concentração da propriedade fundiária e as inúmeras 
distorções que ela acarreta nas relações econômicas, sociais, políticas, culturais e 
ambientais, desenvolvidas na sociedade brasileira, indicam a centralidade da 
questão agrária. A forma como se organiza a agricultura e distribuição da estrutura 
fundiária sobre a qual ela se faz terá conseqüências diretas e indiretas sobre o 
conjunto da população, e o acesso à terra é elemento fundamental desta equação, 
caso se busque de fato a sustentabilidade do desenvolvimento. 
Os dados disponíveis mais atualizados sobre concentração fundiária foram 
apresentados pelo Sistema Nacional de Cadastro Rural, do Incra, que divulgou, em 
agosto de 1996, o Atlas Fundiário Brasileiro. De acordo com esses dados, cerca da 
metade da área dos imóveis rurais do Brasil está concentrada em apenas 2% das 
propriedades. Nesses imóveis, 62,4% da área não é produtiva e poderia ser 
desapropriada para Reforma Agrária. Segundo o Atlas, existem no Brasil 75 imóveis 
cuja área de sua propriedade é de mais de 100 mil hectares. 
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Da leitura do Atlas Fundiário podemos afirmar que a concentração de terras 
no país permanece sem qualquer alteração que indique diminuição dos níveis de 
concentração, há 56 anos. Os números confirmam o problema estrutural apontado 
por Sampaio (2002) em relação à principal característica da estrutura fundiária 
brasileira: a concentração da propriedade da terra no topo da pirâmide dos 
proprietários pode ser traduzida pelo fato de as 87.594 propriedades consideradas 
grandes, a partir dos novos parâmetros estabelecidos pela Constituição Federal de 
1988, deterem 187.762.627,7 hectares, que representam 56,7% da área total dos 
imóveis em seu poder. 
A evolução da estrutura fundiária no país comprova que a concentração da 
propriedade da terra vem aumentando progressivamente. Os dados referentes ao 
período de 1992 a 1996 indicam que as propriedades com menos de 100 hectares 
foram perdendo seu peso, no total, enquanto as propriedades acima de mil hectares 
aumentaram de 45% para 55,2% de todas as terras do Brasil. 
A manutenção da concentração da propriedade da terra em níveis tão altos, 
e a inutilização da maior parte destas áreas traz graves conseqüências. Não é só no 
campo, e não somente para os trabalhadores rurais, que esta estrutura fundiária 
anacrônica é prejudicial: o conjunto da sociedade brasileira arca com os prejuízos da 
distorção. 
Os altos índices de concentração fundiária guardam intrínseca relação com 
a forma como se dá a utilização das terras no Brasil. É comum que a maior parte das 
grandes propriedades cultive pequena parcela de sua área, mascarando a realidade 
do não-aproveitamento da maior parte das terras concentradas nos latifúndios. 
Alertando para o desperdício das terras, WANDERLEY (1995, p.10) declara que 
“são 185 milhões de hectares (40% da área aproveitável) que têm proprietários e 
não são aproveitados produtivamente; quase toda esta terra apropriada sob a forma 
de latifúndios”. 
O processo de “modernização da agricultura” pelo qual passou o país, nas 
três últimas décadas, agravou a concentração fundiária e as conseqüências que 
dela advêm. O que se reflete é se a forma como se deu o processo de 
“modernização” é a única opção de que a sociedade dispõe para organizar sua 
agricultura. 
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O debate acerca da importância da estrutura fundiária tem sido, nos últimos 
tempos, um dos principais pontos de divergência entre os movimentos sociais rurais 
e representantes dos latifundiários, que reafirmam que o problema da Reforma 
Agrária, hoje, não é mais a concentração fundiária do Brasil, mas o insucesso dos 
assentamentos. 
Contestando a interpretação que historicamente ignora o peso e a força 
econômica e a política do latifúndio no Brasil, os movimentos sociais reiteram que o 
grande problema do país é manter os atuais índices de concentração de propriedade 
da terra, em função da concentração da riqueza e do poder político que ela produz. 
A não-resolução dos problemas resultantes da concentração fundiária traz 
conseqüências econômicas, sociais, políticas, culturais para o conjunto da 
sociedade. 
No caso brasileiro, ao dificultar esta decisão do Estado está o antigo pacto 
estabelecido entre este e a classe proprietária, para modernizar o latifúndio, sem 
desconcentrar a propriedade da terra. Esse pacto impede o avanço do 
desenvolvimento integral das potencialidades da sociedade nacional. Analisando as 
características do processo de modernização da agricultura brasileira, compete 
aclarar que são próprias do modelo implementado a produçãoconstante da miséria, 
da exclusão social. 
As principais características da modernização da agricultura brasileira têm 
indicado contradições a partir do modelo de desenvolvimento dentro do qual a 
modernização foi gestada. Este debate repôs a preocupação que influenciou as 
ciências sociais, na década dos 60, sobre crescimento e desenvolvimento. Para 
Martins (1994, p. 52), depois de trinta anos de captura do desenvolvimento pela 
ideologia do crescimento, estamos diante dos mesmos problemas, ”reconhecendo 
que três décadas de crescimento apenas repõem o tema e o problema original: o 
não- desenvolvimento no crescimento”. 
Apesar do crescimento econômico experimentado no período, não houve 
melhoria significativa nos padrões de desenvolvimento da sociedade brasileira. Ao 
contrário. SACHS (2001, p. 75-76) destaca: 
 
de 1940 a 1980 o Brasil cresceu ao ritmo descomunal de 7% ao 
ano, dobrando portanto o seu PIB de 10 em 10 anos. Porém este 
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avanço ocorreu por meio de um crescimento socialmente perverso, 
alimentado pelo aprofundamento persistente das desigualdades e 
pela gestão inflacionária dos conflitos distributivos. Assim, o Brasil 
foi o campeão do crescimento durante quatro décadas, mas saiu 
desta experiência como um país profundamente injusto e, portanto, 
subdesenvolvido. Tamanha injustiça é incompatível com o conceito 
de desenvolvimento humano, que supõe a extensão de todos os 
direitos - inclusive os econômicos, sociais e culturais - ao conjunto 
dos cidadãos. Dito de outra maneira, o desenvolvimento implica a 
cidadania universal efetiva, condição esta que não está presente 
hoje. Há duas décadas o país não consegue retomar o crescimento 
e muito menos arcar com a dívida social acumulada. 
 
Analisando os dados apresentados no “Relatório sobre o Desenvolvimento 
Humano no Brasil”, produzidos desde 1996 pelo Instituto de Pesquisa Econômica 
Aplicada – IPEA, comprovamos essas afirmações. São radiografias das condições 
econômicas e sociais que avaliam dados sobre renda, escolaridade e expectativa 
de vida nos estados brasileiros. 
Avaliar um modelo de desenvolvimento da perspectiva dos níveis de 
desenvolvimento humano franqueia que as políticas públicas proponham ações 
voltadas à transformação do padrão de vida dos povos e da superação da pobreza. 
O documento do IPEA menciona: 
 
O Desenvolvimento Humano é um conceito amplo e integral que 
pode ser definido como o processo de ampliação da gama de 
opções e oportunidades das pessoas. Dentro desse espectro, três 
opções básicas estão presentes em todos os níveis de 
desenvolvimento e aparecem como condição para as demais: 
desfrutar uma vida longa e saudável, adquirir conhecimento e ter 
acesso aos recursos necessários a um padrão de vida decente IPEA 
(2002, p. 3). 
 
Dados destes relatórios apontam que um em cada três brasileiros não tem 
renda suficiente para suprir suas necessidades básicas, havendo mais de 52 
 19
milhões de pessoas abaixo do nível de pobreza. Sem consenso sobre o exato 
número de pobres - os dados utilizados para medir pobreza no Brasil variam com as 
metodologias de instituições e pesquisadores - importa a absurda parcela que vive 
em condições desumanas. Outro indicador aponta a gravidade da situação social: a 
renda média dos 10% mais ricos da população é quase 30 vezes maior do que a 
renda média dos 40% mais pobres. 
De acordo com Figueiredo (1996), os métodos mensuráveis da pobreza 
variam entre o direto e o de renda. Pelo direto, consideram-se pobres pessoas cuja 
cesta de consumo não atende às necessidades mínimas essenciais de 
sobrevivência. Pelo de renda, consideram-se pobres pessoas cuja renda está abaixo 
da faixa determinada, que satisfaz as necessidades básicas de sobrevivência. 
Independentemente do método, precisamos ressaltar a forte incidência de 
população rural pobre. Na literatura sobre modernização agrícola, tem sido objeto de 
diferentes estudos a análise das relações entre a modernização e a concentração da 
distribuição da renda e a pobreza na área rural, cujos estudos apontam ser a 
pobreza fenômeno de extensão fundamentalmente rural. Figueiredo (1996, p. 103) 
observa que “a agricultura apresenta níveis mais baixos de renda média e maiores 
níveis de pobreza absoluta do que o observado para o total dos demais setores”. 
A reflexão sobre a relação da pobreza rural e a insustentabilidade do modelo 
de desenvolvimento agrícola encontram-se em trabalhos diversos. Análises indicam 
vinculações entre pobreza, fome e estrutura agrária, à parte critérios metodológicos 
variados que apuram índices e resultados não coincidentes entre os trabalhos. 
Analisando principais pesquisas sobre o tema, Norder (1997, P.13), in 
“Assentamentos Rurais: Casa, Comida e Trabalho” reforça a reincidência da miséria 
na área rural. Conclui: “independentemente dos critérios e das divergências 
numéricas entre estas pesquisas quantitativas, todos estes estudos mostram que a 
pobreza e a fome são proporcionalmente maiores no campo que na cidade”. 
Confirmando a gravidade da situação rural, Leone (1994, p. 30) registra que 
a indigência, o nível mais acentuado de carências, “tem maior incidência nas áreas 
rurais, havendo nestas áreas uma maior proporção de indigentes com relação à 
população total da localidade de cada região”. As tabelas que seguem mostram a 
proporção pobres nas áreas urbanas e nas áreas rurais. 
 20
 
Tabela 1. Proporção de Pobres no Meio Rural: Brasil e Regiões. 1990. 
(Percentagem) 
 
Regiões Metropolitanas (%) Urbano (%) 
Rural 
(%) 
SUL 17,6 16,8 28,9 
SUDESTE 26,9 17,7 27,1 
NORDESTE 43,4 43,8 49,1 
CENTRO-OESTE 22,4 23,2 31,8 
NORTE 43,4 43,2 - 
BRASIL 28,9 26,8 39,2 
Fonte: Rocha (1995), a partir de dados do IBGE/PNAD (Citado por VEIGA. 1998) 
Nota: Meio Rural do Norte não investigado pela PNAD e estado de Tocantins incluído em Goiás. 
 
 
Pelo IBGE, prepondera a desigualdade ao aferir-se renda em áreas rurais, se 
comparada o rendimento real médio mensal1 de domicílio rural ao de zona urbana. 
Na urbana, o valor é igual a R$ 854,00 e na rural é de R$ 328,00, o equivale a 
38% do urbano. 
 
Rendimento real médio mensal - 2000
0
200
400
600
800
1000
1200
Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro
Oeste
Urbana
Rural
 
 
Figura1. Comprovação do rendimento médio mensal entre as áreas urbanas e 
rurais. 
 
 
1 Soma do rendimento mensal de trabalho com o rendimento proveniente de outras fontes. 
Fonte: IBGE – Censo Demográfico 2000 
 21
Os baixos índices de desenvolvimento do campo relacionam-se à 
impossibilidade básica de acesso à terra pelos trabalhadores rurais. Veiga (1998, p. 
3) enfatiza que diversos trabalhos comprovam que a pobreza rural relaciona-se ao 
modelo adotado para se desenvolver a agricultura. “Isso significa que se quiser 
discutir a fundo pobreza rural tem que discutir as características da nossa 
agricultura. E a mais marcante é o contraste entre o perfil da agricultura brasileira e 
o perfil da agricultura de um país considerado desenvolvido” . 
Além dos piores índices de renda, estão no campo também os piores 
índices de escolaridade. Os dados da Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar 
– PNAD, comparam a proporção da população ocupada em todos os setores 
econômicos. A escolaridade média da população de 15 anos ou mais, moradora em 
zonas rurais (3,4 anos) é metade da estimada para a população urbana (7 anos). 
Urgem atitudes que diminuam a desigualdade. 
 
Tabela 2. Média de Anos de Estudos da População de 15 anos ou mais (2001) 
 
Urbano Rural
Brasil 7,0 3,4
Norte 6,4 3,3
Nordeste5,8 2,6
Sudeste 7,5 4,1
Sul 7,3 4,6
Centro Oeste 7,0 4,1
Fonte: IBGE - PNAD 2001
Regiões Geográficas Anos de Estudos
Nota: Exclusive população rural de Rondônia, Acre, 
Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
Número Médio de Anos de Estudos da 
População de 15 anos ou mais - 2001
 
Os índices de analfabetismo também preocupam. Segundo a PNAD, 29,8% 
da população adulta2 da zona rural é analfabeta, enquanto na zona urbana a taxa é 
10,3%. O dado é mais grave se considerarmos que a taxa de analfabetismo 
mensurada não inclui os analfabetos funcionais, população com menos de quatro 
séries do ensino fundamental cursadas. 
 
 
2 De 15 anos ou mais. 
 22
Tabela 3. Taxa de analfabetismo da população (15 anos ou mais.1991-2000) 
1991 2000 1991 2000 1991 2000
Brasil 19,7 13,6 40,1 29,8 13,8 10,3
Norte 24,3 16,3 38,2 29,9 15,5 11,2
Nordeste 37,1 26,2 56,4 42,7 25,8 19,5
Sudeste 11,9 8,1 28,8 19,3 9,8 7,0
Sul 11,9 7,7 18,2 12,5 9,7 6,5
Centro Oeste 16,6 10,8 30,0 19,9 13,6 9,4
Fonte: IBGE - Censos Demográficos 1991 e 2000
Taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais - 1991-2000
Taxa de Analfabetismo (%)
Total
Regiões 
Geográficas Rural Urbana
 
 
Na faixa etária correspondente ao ensino médio, a situação do estudo na área 
rural é ainda mais grave. De acordo com o Censo Demográfico 2000, somente 66% 
de jovens entre 15 a 17 anos residentes em zonas rurais freqüentam a escola, o 
que significa 1.462.454 alunos. Além disso, do total de 2.215.591 jovens rurais, 
17,3% estão ainda nas séries iniciais do ensino fundamental. Entre os jovens 
urbanos são 5,5%, indicando sério problema de atraso escolar. 
Tabela 4. Freqüência à escola na faixa de 15 a 17 anos. 2000. 
Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural
Brasil 2.215.591 80,7% 66,0% 5,5% 17,3% 30,7% 30,8% 38,1% 12,9% 1,8% 1,1% 4,7% 4,0%
Norte 273.629 80,1% 56,3% 8,3% 20,6% 38,7% 25,2% 23,9% 4,2% 3,9% 1,8% 5,2% 4,5%
Nordeste 1.111.055 80,3% 70,1% 10,9% 26,0% 39,5% 33,7% 24,4% 5,5% 1,5% 0,9% 3,9% 4,0%
Sudeste 446.957 82,1% 63,4% 3,0% 5,4% 26,2% 30,6% 46,7% 22,8% 1,5% 1,0% 4,8% 3,6%
Sul 291.099 77,7% 65,0% 2,0% 2,5% 21,8% 23,7% 46,8% 33,4% 1,7% 1,1% 5,4% 4,3%
Centro Oeste 92.851 80,0% 60,8% 3,9% 7,0% 33,3% 34,7% 35,2% 14,4% 2,0% 1,1% 5,4% 3,6%
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2000
Ensino Regular
Freqüência à escola na faixa de 15 a 17 anos - 2000
Taxa de Freqüência 
à escola
Outros 
Níveis/Modal. de 
ensino
População 
Rural de 15 
a 17 anos
Região 
Geográfica 1ª a 4ª 5ª a 8ª
Ensino Fundamental
Ensino Médio
Educação de 
Jovens e 
Adultos
 
 
A ausência de políticas públicas educacionais específicas para o campo é 
forte componente dos fatores que contribuem para impedir o desenvolvimento 
efetivo das comunidades rurais. Abramovay (2001) analisa a importância da 
educação para o desenvolvimento do campo: 
 
o mais importante desafio que têm pela frente as forças capazes de 
levar adiante um pacto de desenvolvimento territorial consiste na 
Fonte: IBGE – PNAD 2001 
 23
mudança do ambiente educacional existente no meio rural. A 
tradição histórica brasileira (própria de sociedades de passado 
escravista) que dissocia o trabalho do conhecimento persiste até 
hoje no meio rural. Como em toda a América Latina, persiste no 
Brasil o costume de que fica na propriedade paterna aquele filho 
com menos vocação para o estudo. Aos mais dinâmicos e 
empreendedores todos apontam o caminho da migração como o 
mais promissor: os pais, os colegas, os professores e os próprios 
extensionistas. É claro que se forma assim um perfeito círculo 
vicioso entre a escassez de oportunidades e a precariedade dos 
talentos para explorá-las. (Abramovay, 2001; p. 31) . 
 
Enquanto escolas rurais favorecerem êxodos e ativarem baixa auto-estima 
em trabalhadores rurais/agricultores/jovens e estigmatizarem o espaço rural com 
preconceito e desvalorização, difícil será mudar a visão do que pode significar para o 
jovem o espaço do campo. Construir o olhar que faculta perceber a indissolubilidade 
dos laços desse espaço com questões vitais como preservar recursos naturais, 
produzir alimentos e qualidade de vida exige reconstruir o saber e o aprendizado de 
outra forma de aprender no campo. A idéia central é: não se trata apenas de 
melhorar a escola ou ampliar cursos profissionalizantes, mas modificar a lógica do 
uso e do acesso ao conhecimento no campo brasileiro. 
Ressalta-se que este processo necessariamente tem dois sentidos: não só 
levar e ampliar o acesso aos conhecimentos científicos quanto recuperar e ampliar a 
utilização dos amplos saberes os quais são detentores os trabalhadores rurais. 
Saberes estes que foram sistematicamente ignorados e desvalorizados por este 
modelo de desenvolvimento agrícola baseado na modernização tecnológica. 
Mas, só faz sentido discutir proposta educacional específica para o homem do 
campo partindo-se de um novo projeto de desenvolvimento para o campo, como 
parte de novo modelo de desenvolvimento. As complexidades a enfrentar para se 
mudar o acesso e o uso do conhecimento no campo não produzirão efeitos sem se 
alterar profundamente as próprias condições de sobrevivência no espaço rural da 
sociedade brasileira. 
 24
No Seminário Internacional Distribuição de Riqueza, Pobreza e Crescimento 
Econômico, realizado em Brasília, em julho de 1998, Veiga, sustentou a tese de que 
uma mudança efetiva nos padrões de desenvolvimento da sociedade brasileira para 
níveis maiores de igualdade e distribuição de riqueza requer mudança significativa 
no padrão de desenvolvimento agrícola adotado. Ao fazer a ligação entre pobreza 
rural, desenvolvimento e crescimento econômico, o autor sustentou a tese de que a 
Reforma Agrária e a agricultura familiar se apresentam como políticas cruciais para 
um novo modelo de desenvolvimento no campo. 
Este autor também observa ser preciso estar atento ao fato de que ainda 
haja tanta pobreza no meio rural num país que teve um dos maiores êxodos do 
mundo: aproximadamente 30 milhões de pessoas deixaram o campo, entre 1960 e 
1980, o que teria significado cerca de 300 mil famílias por ano. 
Uma das principais críticas ao modelo de desenvolvimento adotado no país, 
pode ser apresentado através do que tem sido considerado como estratégia urbana 
de desenvolvimento rural e que teve um amplo respaldo de uma determinada visão 
teórica sobre os processos de desenvolvimento, o que nos remete as discussões 
anteriores sobre a responsabilidade das leituras científicas. 
De acordo com o livro Reforma Agrária e Agricultura Familiar no Século XXI, 
estas estratégias urbanas de desenvolvimento rural, que foram amplamente 
desenvolvidas em parte dos países da América Latina basearam-se principalmente 
em estratégias de estímulo à modernização da grande propriedade tradicional, por 
meio, sobretudo, de generosos subsídios, modernizando a produção dos latifúndios 
sem democratização do acesso à terra, o provocou extrema redução de 
oportunidades de trabalho agrícola e acirrou intensamente os conflitos fundiários. A 
opção por este caminho, que significou o desprezo do Estado e da sociedade à 
produção agrícola realizada a partir das unidades familiares de produção, se 
explicam por diversos fatores, entre eles por razões 
 
políticas e econômicas específicas a estes países, em geral relacionadas 
ao poder das oligarquias rurais em manter um status quo marcado pela alta 
concentração dos recursos fundiários. No entanto, esta adoção contou com 
uma justificativa intelectual proporcionada pela visão teórica 
predominante sobre o papel da agricultura no processo dedesenvolvimento econômico. Segundo esta visão, o potencial da 
 25
agricultura para estimular o crescimento econômico era muito limitado. Ao 
setor agrícola caberia financiar o processo de industrialização, fornecer 
mão-de-obra barata e gerar divisas por intermédio, sobretudo, da 
exportação de produtos tropicais (...) O “atraso” da agricultura, visto como 
fonte de crises agrárias e estrangulamentos ao crescimento da indústria, 
deveria ser enfrentado pela modernização do latifúndio (...) A integração do 
latifúndio à economia moderna por intermédio da tecnificação seria 
suficiente para assegurar que a agricultura desempenhasse suas funções e 
para dinamizar a economia rural. Em nenhum momento levou-se em 
consideração as conseqüências socioeconômicas e políticas da adoção 
desta estratégia, em particular sobre a distribuição de renda, tal era a 
confiança na leitura teórica que colocava todas as expectativas na 
indústria como dínamo do crescimento, e nas cidades como locus de 
desenvolvimento. Esta visão limitada da inserção da agricultura na 
economia ignorava não apenas os efeitos sociais negativos de um 
crescimento baseado na modernização do latifúndio, como também a 
correlação positiva entre crescimento econômico e distribuição de renda. 
(GUANZIROLI, et al. 2001, p. 16). (grifos nossos) 
 
 
Estabelecida a relação entre o padrão de desenvolvimento agrícola adotado 
no Brasil e os altos índices de pobreza encontrados na área rural, é necessário 
encontrar alternativas capazes de transformar a situação social da população, 
proporcionando-lhes condições dignas de vida. Neste cenário se coloca a 
possibilidade de a Reforma Agrária contribuir com a alteração deste modelo, pelas 
implicações econômicas, sociais, políticas e culturais que produz. Para tanto, não se 
pode prescindir do papel do Estado. Quando se busca o desenvolvimento, e não 
apenas o crescimento econômico, é imprescindível a atuação do Estado. A lógica de 
operação do mercado não se preocupa se há ou não desenvolvimento paralelo ao 
crescimento econômico. 
 
 
 
1.3. O PAPEL DA REFORMA AGRÁRIA PARA A CONSTRUÇÃO DE 
UM NOVO MODELO DE DESENVOLVIMENTO 
 26
 
Debater Reforma Agrária provoca interesses contraditórios e conflitivos 
entre os atores que têm interesse em realizá-la e os que desejam impedi-la de 
concretizar-se. No debate sobre o caráter da Reforma Agrária nos anos noventa foi 
majoritária a idéia de que esta política pública não era mais necessária do ponto do 
vista do desenvolvimento econômico do país. Um dos motes da concepção de 
Reforma Agrária como política social compensatória foi a idéia de “terra para quem 
nela não mais trabalha” (SILVA, 1989, p. 43). Por essa concepção, grandes 
produtores respondem às demandas do mercado. Nesta etapa, é caro capitalizar e 
tornar competitivos os pequenos agricultores beneficiários da Reforma Agrária. 
Apesar de assumir o caráter conservador da modernização agrícola 
brasileira, este autor defende que uma ampla Reforma Agrária “não é mais 
necessária do ponto de vista do desenvolvimento das forças produtivas no campo” 
(SIVA, 1989, p. 48). Por esta análise, o Brasil agrícola vai muito bem, pois ocorreu 
forte modernização no campo, com instalação de diversos complexos agroindustriais 
que alteraram o modo de produção na agricultura. Ao país compete agora enfrentar 
somente uma “questão social”, a ser tratada como resquício da inevitável 
modernização. 
A visão segundo a qual a Reforma Agrária não tem mais sentido econômico 
na sociedade brasileira atualmente, parte do pressuposto de que o modelo de 
desenvolvimento vigente na agricultura não deve ser alterado, por ser eficiente, já 
que conseguiu responder aos desafios colocados ao setor na década de 60, não 
cabendo mais uma ampla distribuição de terra aos trabalhadores rurais. De acordo 
com essa concepção, não são necessárias profundas alterações na organização da 
produção agrícola nacional, em função da sua eficiência produtiva. A leitura de que 
do ponto de vista econômico a Reforma Agrária não é mais necessária separa a 
questão fundiária da questão da produção e do abastecimento, ou seja, da “questão 
agrícola”. 
De acordo com Veiga, (1998) a leitura que supõe não haver mais sentido 
econômico para a Reforma Agrária hoje está associada a um tremendo dilema para 
os economistas brasileiros (independente do espectro político em que se encontram: 
direita, centro ou esquerda), que separam radicalmente os aspectos sociais e os 
 27
econômicos da atuação do Estado, particularmente quando se discute a questão da 
estrutura agrária. O autor ressalta ser possível e muitas vezes necessário, para fins 
analíticos e de estudos de especialização, fazer-se essa distinção. Não se pode 
perder de vista porém, que na realidade concreta, cotidiana, estes aspectos não se 
separam. Observa que nas Ciências Humanas, de muito se fazer essa separação e 
especializar pesquisadores em aspectos sociais e em aspectos econômicos, muitos 
economistas e sociólogos acabam tratando a realidade de forma separada. 
Veiga (1998, p.1) observa que um dos grandes problemas teóricos e 
políticos que temos para enfrentar a pobreza rural está em um pensamento 
arraigado da elite intelectual brasileira segunda a qual “o crescimento nada tem a 
ver com desigualdade; o que leva a pensar que a redistribuição de ativos fundiários 
não teria sentido econômico, sendo aceitável apenas como política de cunho social”. 
É a separação entre os aspectos sociais e econômicos das conseqüências 
da redistribuição da estrutura fundiária que leva parcela significativa dos pensadores 
brasileiros a afirmar que a Reforma Agrária não tem mais sentido econômico 
atualmente, que a ela resta o papel de política social, no sentido de fazer justiça 
social aos sem-terra. 
Contrariando a visão que sustenta que a Reforma Agrária é política somente 
de cunho social, no Seminário Internacional “Distribuição de Riqueza, Pobreza e 
Crescimento Econômico” foram apresentados diversos trabalhos comprovando os 
efeitos econômicos da política de reestruturação fundiária. Pesquisas discutidas no 
Seminário comprovaram que, ao promover a distribuição da terra, que é um ativo 
financeiro, a Reforma Agrária produz efeitos agregados, sustentando o próprio 
crescimento econômico, o que confirma o papel estratégico do meio rural no 
processo de desenvolvimento. O Seminário, que tinha como objetivo principal 
discutir argumentos teóricos e evidências empíricas capazes de mostrar a relação 
entre desigualdade e crescimento econômico, apresentou como uma de suas 
principais conclusões a importância da Reforma Agrária como política das mais 
eficazes no combate à pobreza rural. 
Uma das mais graves conseqüências da visão, segundo a qual a reforma da 
estrutura fundiária teria sentido somente como política social, é que ela retira o 
caráter estratégico da reflexão sobre a intrínseca conexão entre a pobreza rural e o 
modelo de desenvolvimento agrícola adotado no país, fazendo com que em lugar de 
 28
se pensar a Reforma Agrária como questão estrutural, se proceda à comparação de 
custos e benefícios desta política com outras políticas assistenciais. 
Embora os partidários desta leitura da Reforma Agrária como política social 
façam também suas as críticas aos custos sociais da modernização conservadora 
da agricultura brasileira (êxodo rural, pobreza, superexploração dos trabalhadores 
etc.), eles não aceitam a idéia quando se propõe que estes custos são parte do 
próprio modelo implementado, não sendo factível a separação do agrário e do 
agrícola. Novamente essa separação do econômico e do social justifica a posição 
em defesa da eficácia

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