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Reale e a teoria tridimensional do Direito

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REALE E A TEORIA TRIDIMENSIONAL DO DIREITO
I – INTRODUÇÃO:
 Miguel Reale  nasceu em São Bento do Sapucaí/SP em  6 de novembro de 1910 e  faleceu em 14 de abril de 2006
Seus pais foram Bagio Brás Reale e Felicidade Chiaradia Reale. O primário cursou no colégio Nossa Senhora da Glória em Itajubá/MG. O ensino médio estudou no Instituto Medio Dante Aligheri e foi diplomado em 1929. Seu curso de Direito foi realizado a cidade de Itajubá, em Minas Gerais. Miguel Reale lá viveu até 1921, fazendo o curso primário no Colégio Nossa Senhora da Glória. Em 1922, ingressou no Instituto Medio Dante Alighieri, em São Paulo, de onde sairia diplomado em 1929. Formou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (1934), onde foi professor catedrático (1941) e por duas vezes reitor eleito (1949 — 1950; 1969 — 1973).
 	Foi casado com Filomena "Nuce" Pucci por 63 anos, com quem teve os filhos Ebe, Lívia Maria e Miguel.
Ebe Reale é historiadora formada pela Faculdade Sedes Sapientiae, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, autora de Dissertação de Mestrado sobre a História do Município de Pindamonhangaba e professora de "Cultura Brasileira" na Escola de Comunicações da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) na Capital paulista. É membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, tendo publicado 18 livros sobre a História de São Paulo.
Lívia Maria Reale Ferrari era formada em Línguas Neolatinas e foi casada com Antônio Carlos Ferrari, tendo o casal falecido jovem, em 1973, deixando três filhos menores que foram criados por Miguel e Nuce Reale.
Miguel Reale Júnior, filho caçula de Miguel Reale, é advogado e professor, tendo ocupado o cargo de ministro da Justiça durante o governo Fernando Henrique Cardoso.
Destacamos alguns pontos principais de sua carreira: 
Em 1969 foi nomeado pelo presidente Artur da Costa e Silva para a “Comissão de Alto Nível”, incumbida de rever a Constituição de 1967. Resultou desse trabalho parte do texto da Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969, que consolidou o regime militar no Brasil.
Ocupou a cadeira 14 da Academia Brasileira de Letras, a partir de 16 de janeiro de 1975. Escreveu coluna quinzenal no jornal O Estado de S. Paulo, na qual tratou de questões filosóficas, jurídicas, políticas e sociais da atualidade.
Foi supervisor da comissão elaboradora do Código Civil brasileiro de 2002, cujo projeto foi posteriormente sancionado pelo presidente da República Fernando Henrique Cardoso, tornando-se a Lei nº 10.406 de 2002, novo Código Civil, que entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003.
Miguel Reale teve atuação de relevo no campo da filosofia, tendo sido um dos fundadores da Academia Brasileira de Filosofia e do Instituto de Filosofia Brasileira de Lisboa, Portugal. Foi organizador de sete Congressos Brasileiros de Filosofia (1950 a 2002) e do VIII Congresso Interamericano de Filosofia (Brasília, 1972), relator especial nos XII, XIII e XIV Congressos Mundiais de Filosofia (Veneza, 1958; Cidade do México, 1963; e Viena, 1968), conferencista especialmente convidado pela Federação Internacional de Sociedades Filosóficas para os XVI e XVIII Congressos Mundiais (Düsseldorf, Alemanha, 1978; e Brighton, Reino Unido, 1988), e organizador e presidente do Congresso Brasileiro de Filosofia Jurídica e Social (São Paulo, 1986, João Pessoa, 1988 e Paraíba, 1990).
Suas obras de destaque são: Filosofia do Direito e Lições Preliminares de Direito, O Direito como Experiência, Horizontes do Direito e da História, Experiência e Cultura, Nos Quadrantes do Direito Positivo, Pluralismo e Liberdade, todas obras clássicas do pensamento filosófico-jurídico brasileiro e foram traduzidas para o italiano, o espanhol e o francês.
Teve uma longa atuação na advocacia e na academia, sendo um autor de relevo no campo da filosofia do direito. É criador da teoria tridimensional do direito, que integra a norma jurídica ao fato social e aos valores culturais, num processo histórico-dialético de implicação e complementaridade, e que é particularmente difundida no Brasil.
II – DESENVOLVIMENTO:
 
 
 	A teoria Tridimensional de Miguel Reale defende a existência de três etapas que devem ser levadas em conta e estudadas em um caso jurídico: o Valor, o Fato e a Norma. Importa, desde logo, afirmar que esses três elementos devem estar sempre referidos ao plano cultural da sociedade onde se apresentam. 
Miguel Reale buscou, através desta teoria, unificar três concepções unilaterais do direito:
O valor, considerado não como um objeto ideal, mais como um dever ser, situado num plano prático e ligado a uma ação.
O fato, capaz de revelar as intencionalidades objetivas de um determinado lugar ou época, é compreendido não como um mero fato natural, mas sim sempre imantado por um valor.
A norma descreve os valores que vão se concretizando na condicionalidade dos fatos sociais e históricos.
A tridimensionalidade explica que os fatos geram juízos de valores que demandam normas para regulamentá-los. 
O problema crucial, segundo Reale, é a questão de que o Direito sempre foi visto ou analisado sob enfoque unilateral, ou seja, priorizando-se apenas um dos aspectos supracitados. É contra esses enfoques unilaterais que a Teoria Tridimensional vem rebater. Para Reale, o Direito não é apenas a norma ou a letra da lei, pois é muito mais do que a mera vontade do Estado ou do povo, é o reflexo de um ambiente cultural de determinado lugar e época, em que os três aspectos – fático, axiológico e normativo – se entrelaçam e se influenciam mutuamente numa relação dialética na estrutura histórica.
 	Nesse sentido, Reale (2003) também rebate qualquer tipo de idealismo que faz do Direito um corpo abstrato de teorias, geralmente omissos em relação à sua realidade sociocultural. Esta teoria, ao trabalhar com a experiência jurídica, tem como característica a própria atualização dos valores e o aperfeiçoamento do ordenamento jurídico. Neste sentido, expõe que tais elementos ou fatores não podem existir separados um dos outros, coexistindo como uma unidade concreta.
Por todo exposto, verifica-se a grande contribuição da Teoria tridimensional do Direito e a sapiência do jurista brasileiro ao desenvolvê-la, com a consequente evolução do ordenamento jurídico como um todo.
Reale liderou a equipe de juristas que elaborou o Código Civil brasileiro de 2002, sua teoria influenciou de forma decisiva a estrutura do novo Código, é possível analisar alguns pontos específicos que revelam uma concepção tridimensional do Direito. Contudo, a inovação mais importante introduzida no Código Civil que revela uma influência culturalista e tridimensional do Direito, encontra-se no instituto da função social do contrato, expresso no artigo 421.
"Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato."  Trata-se de um dispositivo que propicia ao aplicador do Direito coibir abusos, integrando o instituto do contrato e as partes contratantes, aos valores do bem comum e da finalidade social da lei.
Segundo Reale, direito é o ordenamento jurídico que indica regras de conduta para o convívio em sociedade, e busca valores ligados ao bem comum.
Existem dois tipos básicos de normas jurídicas, cada uma organizada de modo próprio: normas de organização e normas de conduta. 
A norma de organização regula o Estado, estruturando e organizando o funcionamento de seus órgãos. Os poderes sociais, estabelecendo e distribuindo competências. O direito, disciplinando a identificação, alteração e implantação das leis. A norma de conduta regula o comportamento dos cidadãos e dos grupos sociais.
Através da análise dos mais variados sentidos da palavra direito, verificamos os três elementos básicos a qualquer experiência jurídica, conforme a teoria desenvolvida por Reale, chamada tridimensionalidade, sendo: "um aspecto narrativo, um aspecto fático e um aspecto axiológico".  Sendo o direito fato, valor e norma.
O conceito de justiça para Reale é "a constante coordenaçãoracional das relações intersubjetivas, para que cada possa realizar, livremente seus valores potenciais visando atingir a plenitude do seu ser pessoal, em sintonia com a sua coletividade", a conclusão implícita nessa afirmação é a de que "cada tempo histórico tem o seu conceito de justiça". 
Toda norma tem como objetivo concretizar um valor e reconhecer que a pluralidade de valores é essencial a experiência jurídica.  
A justiça é necessária à vida social devido a desigualdades entre os homens, e busca igualdade de direito a todos.
Existem três modalidades de justiça, a comutativa, distributiva e a justiça social. 
A justiça comutativa organiza a convivência entre pessoas conforme igualdade aritmética. 
Na justiça distributiva a sociedade organizada se desenvolve com um tratamento de igualdade proporcional entre todos os membros. 
A justiça social refere-se ao principio de que todos os indivíduos da sociedade têm direitos e deveres iguais em todos os aspectos da vida social. 
Todos os direitos básicos para sobrevivência, como a saúde, justiça, educação, trabalho e manifestação cultural, devem ser garantidos a todos. 
O bem comum não se realiza sem o bem de cada membros da sociedade, e o direito consiste na concretização da ideia de justiça, tendo a pessoa como fonte de todos valores.  
Reale trata o fenômeno jurídico como parte do fenômeno cultural, alicerçado na própria postura humana, no que vem a ser histórico ciente de que as epistemologias da Fenomenologia e da Axiologia possam contribuir sobremaneira para o estudo mais acurado do fenômeno normativo, ao invés das visões unilaterais ainda predominantes no pensamento jurídico contemporâneo. 
 Segundo Miguel Reale, o direito é a ordenação ética coercível, heterônoma e bilateral atributiva das relações sociais, na medida do bem comum. Sua definição, portanto, apresenta a soma das Características gerais e Distintivas das normas éticas.
 O direito para Miguel Reale é uma ordenação. A palavra ordenação pode ser entendida como o conjunto de normas que organizam alguma coisa. Por ser uma ordenação ética, essas normas organizam a esfera ética da cultura humana.
 O direito, assim, é um conjunto de normas éticas (uma “ordenação ética”). Todas as normas éticas compartilham de determinadas características gerais, segundo Reale: são imperativas (impõem uma conduta; regem-se pelo princípio da imputação – “dever ser”), violáveis (a conduta pode ser respeitada ou não) e contrafáticas (ainda que sejam desrespeitadas, as normas éticas não perdem seu valor). 
 Para Miguel Reale, o direito tem todas as características distintivas das normas éticas, segundo ele:
 É coercível, ou seja, busca minimizar o índice de violabilidade mediante ameaças de recurso à força;
 É heterônomo, pois as normas jurídicas são elaboradas pelo Estado e devem ser cumpridas independentemente da aceitação íntima do destinatário;
 É axiologicamente bilateral, pois busca concretizar valores que não estão reduzidos a uma das partes da relação fática, e sim valores que levam ao bem comum;
 É atributivo, pois atribui poderes garantidos aos destinatários das normas jurídicas.
III - CONCLUSÂO 
No período que cursou o que podemos chamar de ensino médio, Reale era simpatizante do socialismo reformista de Carlo Rosselli, um socialismo liberal e fundou um movimento antifascista.
Ao conhecer Plínio Salgado, em outubro de 1932, após publicar o Manifesto de Outubro, documento que fundou o movimento integralista. Percebeu que poderia ser a sua experiência política e que poderia realizar dois valores fundamentais: “o socialismo em vinculação com a problemática nacional". E m novembro do mesmo ano ingressa no movimento como secretário da doutrina e um de seus principais doutrinadores.
Dentro da Ação Integralista Brasileira começa a defender suas ideias baseadas no corporativismo democrático de Mihail Manoilescu na obra Le Siècle du Corporativisme. Nega a concepção fascista da corporação como “órgão do Estado”, a favor das corporações como estrutura democrática com organização social autônoma. Dividindo os teóricos em três tipos: a maioria, na qual Plínio Salgado se identificava e que seguia os valores do nacionalismo ou da reação espiritualista no desempenho da política. Os que davam mais importância aos problemas jurídico-políticos da organização do Estado e da sociedade, no qual Reale se identificava. A minoria que se identificava com a milícia, a força aliciadora irracional dos símbolos. Eram anticomunistas e anticapitalistas e adotaram o antissemitismo com Gustavo Barroso destacando-se dentro dessa corrente.
Kant influenciou o autor na construção do seu pensamento jurídico filosófico, mas há uma distinção de suas ideias e o criticismo de Kant. O culturalismo jurídico de Reale tomou proporções de uma verdadeira teoria da justiça e do Direito com fundamentos epistemológicos e axiológicos próprios. Como também, dialoga com com Scheler, Hartmann, Durkheim, Bouglé, Husserl e Heidegger, entre outros.
Miguel Reale foi um ideólogo e formulador da Teoria Tridimensional do Direito, isto é, o direito segundo ele, não poderia ser analisado unilateralmente.
De acordo com Reale o direito é muito mais do que mera vontade do Estado ou do povo, é o reflexo da cultura de determinado lugar e época influenciando o processo histórico.
O direito, em sua percepção, deve ser projetado como uma realidade em constante mudança, assim como o homem está. Os valores não existem em si mesmo, de modo absoluto, que independem da existência e da história do homem, do ser que os percebem.
A grande importância para Filosofia do Direito foi postulada por Reale ao tratar o fenômeno jurídico como parte do fenômeno cultural embasado na postura humana o que trouxe um estudo mais preciso do fenômeno normativo, a despeito das visões unilaterais ainda predominantes no pensamento jurídico contemporâneo.
A Teoria Tridimensional do Direito cristaliza a percepção que o Direito para ser melhor compreendido deve ser concebido sob o fato, o valor e a norma, ou seja, um ciclo dinâmico interativo. O fato valorado gera norma, que se transforma em novo fato a gerar nova norma modificadora após a valorização da realidade a ser juridicizada.
Essa teoria veio ao encontro dos operadores do Direito pelo fato de inserir no ordenamento jurídico novas fontes e ampliar a visão da dinâmica social por trás da letra da lei.
A aplicabilidade da teoria de Reale pode ser percebida por exemplo, na Lei do Farol Baixo/Acesso que completa um ano no vigente 2017. O fato do farol acesso aumentar a visibilidade e a segurança no trânsito torna o valor da medida justa, considerando o bem estar da coletividade, resultando na norma que é a lei propriamente dita. Isso posto, está formado o ciclo dinâmico.
Pode-se ver então que a ideologia de Reale complementa o Direito ao inserir outras fontes no ordenamento jurídico, restando maior sensibilidade para valorar os fatos sociais.
Enfim, a Teoria Tridimensional do Direito permite apreender a realidade do Direito na sua forma fática, valorativa e normativa visando maior compreensão na elaboração e aplicação das leis pelos operadores do direito.
 
IV - REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:
CARVALHO, Jose Mauricio de. A teoria tridimensional do Direito de Miguel Reale. Departamento de Filosofia da UFSJ. Disponível em :http://www.cdpb.org.br/teoria_tridimensional_do_direito.pdf. acessado em: 06 de novembro de 2017.
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GONZALES, Everaldo Tadeu Quilici. A Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale e o novo Código Civil brasileiro. Disponível em: http://www.unimep.br/phpg/mostraacademica/anais/4mostra/pdfs/145.pdf. Acessado em: 06 de novembro de 2017. 
OLIVEIRA, Lucas Rodrigues. Etimologia jurídica do Direito e a Teoria Tridimensionalde Miguel reale com relação a Política. Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,etimologia-juridica-do-direito-e-a-teoria-tridimensional-de-miguel-reale-com-relacao-a-politica,45931.html>. Acesso em: 06 de Novembro de  2017.
REALE, Miguel. Variações sobre a Justiça .Disponível em: http://www.miguelreale.com.br/artigos/varjust.htm>. Acessado em: 06 de Novembro de  2017.
SANTOS, Eduardo Sens dos. Justiça e moral: estudo comparado dos conceitos em Kelsen, Kant, Reale e Del Vecchio. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12/justica-e-moral>. Acesso em: 06 de Novembro de  2017.
STACCIARINI, Samantha. Fundamentos do direito e da justiça. Revista Eletrônica Direito e Política, Itajaí, v.2, n.2, 2º quadrimestre de 2007. Disponível em: www.univali.br/direitoepolitica- ISSN 1980-7791. Acesso em: 06 de Novembro de  2017.
WIKPÉDIA. Miguel Reale. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Miguel_Reale. Acessado em 06 de novembro de 2017.

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