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O RABICHO DA GERALDA

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http://www.jangadabrasil.com.br/agosto36/cn36080b.htm 
 
 
O RABICHO DA GERALDA 
I 
Eu fui o liso Rabicho, 
Boi de fama conhecido 
Nunca houve neste mundo 
Outro boi tão destemido. 
Minha fama era tão grande 
Que enchia todo o sertão 
Vinham de longe vaqueiros 
Para me botarem no chão. 
Ainda eu era bezerro 
Quando fugi do curral 
E ganhei o mundo grande 
Correndo no bamburral. 
Onze anos eu andei 
Pelas caatingas fugido; 
Minha senhora Geralda 
Já me tinha por perdido. 
Morava em cima da serra 
Onde ninguém me avistava, 
Só sabiam que era vivo 
Pelo rasto que eu deixava. 
 
II 
Saí um dia a pastar 
Pela malhada do Xisto, 
Onde por minha desgraça 
Dum caboclinho fui visto. 
Partiu ele de carreira 
E foi por ali aos topes 
Dar novas de me ter visto 
Ao vaqueiro José Lopes. 
José Lopes que isso ouviu 
Foi gritando ao filho João: 
- "Vai me ver o Barbadinho 
E o cavalo Tropelão. 
Dá um pulo no compadre 
Que venha com seu ferrão, 
Para irmos ao Rabicho 
Que há de ser carreirão". 
Foi montando o José Lopes 
E deu linha ao Barbadinho; 
Tirando inculcas de mim 
Pela gente do caminho. 
Encontrou Tomé da Silva 
Que era velho topador: 
- "Dá-me novas do Rabicho 
http://www.jangadabrasil.com.br/agosto36/cn36080b.htm 
 
 
Da Geralda, meu senhor?" 
"- Homem, eu não o vi; 
Se o visse do mesmo jeito 
Ia andando meu caminho 
Que era lida sem proveito". 
"- Pois então saiba o senhor, 
A coisa foi conversada, 
A minha ama já disse 
Que desse boi não quer nada. 
Uma banda e mais o couro 
Ficará para o montório, 
A outra será pras missas 
Às almas do purgatório". 
Despediu-se o José Lopes 
E meteu-se num carrasco; 
Dando num rasto de boi 
Conheceu logo o meu casco. 
Todos três muito contentes 
Trataram de me seguir, 
Consumiram todo o dia 
E à noite foram dormir. 
No fim de uma semana 
Voltaram mortos de fome, 
Dizendo: "O bicho, senhores, 
Não é boi; é lobisome". 
 
III 
Outro dia eu malhei 
Perto duma ribanceira, 
Ao longe vi o Xerém 
Com seu amigo Moreira. 
Arranquei logo daí 
Em procura dum fechado, 
Juntou atrás o Moreira 
Correndo como um danado. 
Mas logo adiante esbarrei 
Escutando um zoadão: 
Moreira se despencou 
No fundo de um barrocão. 
"Corre, corre, boi malvado, 
Não quero saber de ti, 
Já me basta minha faca 
E a espora que perdi". 
Alevantou-se o Moreira 
Juntando todo o seu trem, 
E gritou que lhe acudisse 
Ao seu amigo Xerém. 
http://www.jangadabrasil.com.br/agosto36/cn36080b.htm 
 
 
Correu a ele o Xerém 
Com muita resolução; 
"- Não se zangue, sô Moreira, 
Que o Rabicho é tormentão". 
"- Ora deixe-me Xerém 
Vou mais quente que uma brasa". 
Seguiram pela vereda 
E lá foram ter à casa. 
 
IV 
Resolveram-se a chamar 
De Pajeú um vaqueiro; 
Dentre todos que lá tinha 
Era o maior caatingueiro. 
Chamava-se Inácio Gomes, 
Era um cabra curiboca 
De nariz achamurrado, 
Tinha cara de pipoca. 
Antes que de lá saísse 
Amolou o seu ferrão: 
"- Onde encontrar o Rabicho 
Dum tope o boto no chão". 
Quando esse cabra chegou 
Na fazenda da Quixaba, 
Foi todo mundo dizendo: 
Agora o Rabicho se acaba. 
"- Senhores, eu aqui estou 
Mas não conheço dos pastos 
Só quero me dêem um guia 
Que venha mostrar-me os rastos. 
Que eu não preciso de o ver 
Para pegar o seu boi; 
Basta-me só ver-lhe o rasto 
De três dias que se foi". 
 
V 
De manhã logo mui cedo 
Fui à malhada do Xisto, 
Em antes que eu visse o cabra 
Já ele me tinha visto. 
Foi uma carreira feia 
Para a serra da chapada; 
Quando eu cuidei era tarde, 
Tinha o cabra na rabada. 
"— Corra, corra, camarada, 
Puxe bem pela memória, 
Quando eu vim de minha terra 
http://www.jangadabrasil.com.br/agosto36/cn36080b.htm 
 
 
Não foi pra contar história". 
Tinha adiante um pau caído 
Na descida dum riacho; 
O cabra saltou por cima 
O ruço passou por baixo. 
"Puxe bem pela memória, 
Corra, corra, camarada, 
Quando eu vim da minha terra 
Não vim cá dar barrigada". 
O guia da contrabanda 
Ia gritando também: 
"Veja que eu não sou Moreira 
Nem seu amigo Xerém”. 
Apertei mais a carreira, 
Fui passar no boqueirão, 
O ruço rolou no fundo, 
O cabra pulou no chão. 
Encontrei-me cara a cara 
Com o cabra topetudo; 
Não sei como nesse dia 
Ali não se acabou tudo. 
Nesta passagem dei linha, 
Descansei meu coração; 
Que não era desta feita 
Que o Rabicho ia ao moirão. 
O cabra desfigurado 
Lá foi ter ao carrapicho: 
"- Seja bem aparecido 
Dá-me novas do Rabicho?" 
"Senhores, o boi eu vi, 
O mesmo foi que não ver, 
Pois como este excomungado 
Nunca vi um boi correr". 
Tomou-lhe o Góis neste tom: 
"- Desengane-se com o bicho; 
Pelos olhos se conhece 
Quem dá a volta ao Rabicho. 
Esse boi é escusado 
Não há quem lhe tire o fel; 
Ou ele morre de velho 
Ou de cobra cascavel". 
 
VI 
Veio aquela grande seca 
De todos tão conhecida; 
E logo vi que era o caso 
De despedir-me da vida. 
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Secaram-se os olhos-d’água 
Onde eu sempre ia beber, 
Botei-me no mundo grande 
Logo disposto a morrer. 
Segui por uma vereda 
Até dar num cacimbão 
Matei a sede que tinha 
Refresquei meu coração. 
Quando quis topar assunto 
Tinham fechado a porteira; 
Achei-me numa gangorra, 
Onde não vale carreira. 
Corrigi os quatro cantos 
Tornei a voltar atrás; 
Mas toda a minha derrota 
Foi o diabo do rapaz. 
Correu logo para a casa 
E gritou aforçurado: 
"- Gentes, venham depressa 
Que o Rabicho está pegado". 
Trouxeram três bacamartes, 
Cada qual mais desalmado, 
Os três tiros que me deram 
De todos fui trespassado. 
Só assim saltaram dentro, 
Eram vinte pra me matar, 
Sete nos pés, dez nos chifres, 
E mais três pra me sangrar. 
Disse então o José Lopes 
Ao compadre da Mafalda: 
"- Só assim nós comeria 
Do Rabicho da Geralda". 
Acabou-se o boi de fama 
O corredor famanaz 
Outro boi como o Rabicho 
Não haverá nunca mais. 
 
ALENCAR, José. "O nosso cancioneiro popular (Cartas ao senhor Serra)". 
Em O Globo, Rio de Janeiro, 10/12/1874. 
Nota: 
1. “A famosa composição não é divulgada isoladamente pelo autor de 
O Guarani, mas integra o último de uma série de artigos na imprensa do Rio 
de Janeiro, em 1874, nos quais discute o problema dialetológico do português 
do Brasil, defendendo a nossa separação idiomática de Portugal”. 
(Em SERAINE, Florival. Antologia do folclore cearense) 
http://www.jangadabrasil.com.br/agosto36/cn36080b.htm

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