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TCC O princípio da íntima convicção no Tribunal do Juri

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LARISSA TEIXEIRA GONÇALVES
AS CONSEQUÊNCIAS DO PRINCÍPIO DA ÍNTIMA CONVICÇÃO NO TRIBUNAL DO JÚRI
FRANCA
2014
LARISSA TEIXEIRA GONÇALVES
AS CONSEQUÊNCIAS DO PRINCÍPIO DA ÍNTIMA CONVICÇÃO NO TRIBUNAL DO JÚRI
Trabalho de Curso apresentado à Faculdade de Direito de Franca para aprovação no Curso de Graduação em Direito (Área de Concentração: Direito Processual Penal).
Orientador: Prof. Dr. Edson Mendonça Junqueira.
FRANCA
2014
ERRATA
 Gonçalves
.
Larissa Teixeira.
 As consequências do princípio da íntima convicção no tribunal do júri/ Larissa Teixeira Gonçalves. Franca, 
São Paulo, 201
4
.
 47
p.
 Orientador: Prof. Dr. 
Edson Mendonça Junqueira.
 Trabalho de Curso – FDF
 Área de Concentração: Direito 
Processual Penal.
 1.
Tribunal do Júri 
– Direito 
Processual Penal
CDD 341.43
LARISSA TEIXEIRA GONÇALVES
AS CONSEQUÊNCIAS DO PRINCÍPIO DA ÍNTIMA CONVICÇÃO NO TRIBUNAL DO JÚRI
Trabalho de Curso apresentado à Faculdade de Direito de Franca para aprovação no Curso de Graduação em Direito.
Franca, 4 de agosto de 2014.
Orientador: __________________________________________________________
Nome: Edson Mendonça Junqueira
Instituição: Faculdade de Direito de Franca
Examinador: _________________________________________________________
Nome: Frank Sérgio Pereira
Instituição:
Examinador: _________________________________________________________
Nome: Marcelo Toffano
Instituição:
Dedico este trabalho aos meus queridos pais Paulo e Tereza pela força e compreensão, sempre tão presentes em minha vida; aos meus queridos irmãos Paula e Leopoldo, pelo apoio e pelas horas divertidas que tivemos juntos; aos meus tão queridos avós Luzia e Reinaldo com quem aprendo a força e a energia da vida.
Agradeço aos meus pais pela compreensão, apoio e paciência que tiveram para me ver onde estou; aos meus irmãos pelo esforço que fizeram para eu chegar até aqui. Agradeço, também aos nobres colegas, especialmente a Kelly, Mariana e Karla, sempre tão presentes e com palavras de conforto. Agradeço, de forma especial, ao Dr. Luiz Gustavo Giuntini de Rezende e ao Luiz Roberto Pereira, que me acolheram e me oferecem todo o suporte necessário. E, em especial, ao meu nobre orientador, pela dedicação e orientação ao longo do trabalho.
Há um grande, um grande sol forte, tocando as pessoas grandes, no grande mundo duro.
Eddie Vedder
RESUMO
O presente estudo tem a finalidade analisar o Tribunal do Júri e seu aspecto Constitucional, haja visto que trata-se de uma instituição defendida como democrática e criticada como teatral. Defendida, pois o julgamento de um ou mais acusados é feito por cidadãos sorteados dentre aqueles de notória idoneidade, pessoas leigas, que têm a função de representar do povo proferindo um julgamento considerado justo e que é esperado pela sociedade. Criticada pelo fato de que não há necessidade de fundamentar a decisão dos jurados, tendo em vista que predomina o princípio da íntima convicção. Outro ponto criticado é o fato de que os jurados são pessoas do povo, facilmente influenciáveis, diferente do juiz togado, que tem conhecimento jurídico necessário acerca dos fatos, porque, este, acompanha o processo desde o início, ao passo que os jurados são restritos a algumas peças do processo e aos debates. Criticada, também, pelo fato de, muitas vezes, haver influência da mídia na decisão do Conselho de Sentença.
Palavras-chave: Tribunal do júri; íntima convicção; conselho de sentença; jurado; democracia.
ABSTRACT
This study aims to analyze a jury and his Constitutional aspect, given the fact that it is an institution defended as democratic and criticized as theatrical. Supported because the trial of one or more defendants is done by randomly selected citizens from those of notorious repute, lay people, who have the function of representing the people uttering a trial considered fair and what is expected by society. Criticized the fact that there is no need to motivate the judges' decision, given that the predominant principle of inner conviction. Another point criticized is the fact that jurors are common people, easily influenced, unlike the robin judge, who has the necessary legal knowledge of the facts, because this one, accompanying the process from the beginning, while jurors are restricted some parts of the process and discussion. Also criticized the fact often be influenced by the media in the Council Decision of Judgment. 
Keywords: Court jury; inner conviction; Board of sentence; juror; democracy.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
O Tribunal do Júri é uma instituição conhecida mundialmente tendo em vista seu caráter democrático, aonde um ou mais acusados são julgados por pessoas comuns, investidas de poder para tanto.
No entanto, ao longo da apresentação do trabalho, percebeu-se que tal instituição não é considerada tão democrática como alguns autores mencionam, pois, trata-se de dar poder a cidadãos leigos no aspecto jurídico e, que muitas vezes, são influenciados, seja através da apresentação dos debates, seja através da mídia.
Trata-se de um tema importante, pois, como se observará, o julgamento de uma pessoa em plenário pode ferir o princípio da dignidade da pessoa humana ao expor a intimidade, a moral, a vida pregressa dessa pessoa perante os jurados e curiosos.
No primeiro capítulo foi elaborado um breve esboço histórico sobre a origem do Tribunal do Júri, bem como a sua inserção nas Constituições Brasileiras até a presente Constituição Federal.
A seguir, foi exposto o Tribunal do Júri e suas características, seus princípios, rito e procedimento.
No capítulo terceiro foi colocado a respeito do Conselho de Sentença, os impedimentos e suspeições a que estão sujeitos os membros que irão compô-lo.
O capítulo quarto tratou do princípio da íntima convicção, a incomunicabilidade dos jurados durante o dever que lhes é incumbido. Este capítulo também versou sobre a falta de fundamentação da decisão a que os jurados estão incursos, e a necessidade de fundamentação quando a decisão é proferida por juiz togado.
Aqui, observa-se a grande importância do presente trabalho, eis que por falta de fundamentação do juiz togado a sentença será declarada nula, enquanto que pelo princípio da íntima convicção, os jurados julgam a pessoa do acusado, e não o crime cometido, baseando-se no sentimento íntimo que lhes adentra a consciência durante a exposição dos fatos pela acusação e defesa.
E, por fim, mas também de grande importância, o capítulo quinto remete ao princípio da dignidade da pessoa humana em comparação com o julgamento pelo Tribunal do Júri.
No mais, este trabalho abordou acerca da importância de adequar o Tribunal do Júri às garantias previstas na Constituição Federal, bem como diminuir a margem de erros a que o judiciário incorre quando a decisão é proferida por juízes leigos.
O objetivo desta monografia consiste na realização de pesquisa qualitativa. Será utilizada uma forma descritiva de informações que não podem ser quantificadas. Os dados obtidos serão ponderados por meio de análise de conteúdo tradicional.
O método utilizado neste trabalho será o analítico-sintético, em que o processo de análise nos permite partir de um texto global e descer ao exame minucioso de suas partes. Pelo processo de síntese chegamos ao conhecimento do todo depois de formada a compreensão das partes. Trata-se aqui da visão sintética e geral do texto.
CAPÍTULO I – HISTÓRICO
1.1 Esboço histórico
A origem do Tribunal do Júri é muito discutida entre os autores.Alguns dizem ter sua origem na Inglaterra. Segundo este entendimento, tal procedimento de julgamento teveorigem quando o Quarto Concílio de Latrão, convocado pelo Papa Inocêncio III em 1.215, aboliu as ordálias ou juízes de Deus, órgão encarregado pelos julgamentos.[1: STRECK, Lênio Luiz. Tribunal do júri: símbolos e rituais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 75.]
Assim descreve Antônio Alberto Machado, em seu livro Teoria Geral da Prova:
(...) no período imperial, com as invasões bárbaras e forte influência do direito germânico, a atividade probatória no processo penal passou a incorporar elementos religiosos e irracionais, estranhos ao processo, como as ordálias (urtuil) de Deus, entre elas os duelos judiciários, os juramentos, a prova do ferro em brasa etc.
Por meio das ordálias, acreditava-se na intervenção divina para se estabelecer a verdade nos julgamentos. Assim, por exemplo, se o acusado atravessasse uma fogueira pisando sobre as brasas e saísse ileso, era sinal inequívoco da sua inocência. As ordálias, bem como a tortura, duramente combatidas pela igreja católica, somente seriam abolidas com o Concílio de Latrão em 1215.
Nesse sistema das provas irracionais, o julgador formava intimamente a sua convicção acerca dos fatos e não tinha a necessidade de declinar os fundamentos de suas decisões. Nascia aí o sistema da convicção íntima do juiz, com todo seu caráter místico, autoritário e inteiramente livre de qualquer controle racional. É natural que esse sistema de prova se compatibilizasse por inteiro com o tipo de processo inquisitivo caracterizado pelo sigilo das apurações e pelo absolutismo do juiz.[2: MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 353.]
Porém, outros autores, a exemplo de Gladston Fernandes de Araújo, entendem que a origem do Tribunal do Júri remonta à era bíblica. Este autor cita o julgamento de Jesus, quando Pilatos pergunta à multidão quem era para ser libertado, Jesus ou Barrabás.[3: ARAÚJO, Gladston Fernandes de. Tribunal do júri: uma análise processual à luz da constituição federal. Rio de Janeiro: Impetus, 2004. p. 5.]
A Bíblia Sagrada historia que:
Pilatos pois como ouviu estas vozes, trouxe para fora Jesus: e assentou-se no seu tribunal, no lugar que se chama Litóstrotos, e em hebraico Gabata. Era então o dia da preparação da Páscoa, quase a hora sexta, e disse Pilatos aos judeus: Eis aqui o vosso rei. Mas eles diziam a gritos: Tira-o, tira-o, crucifica-o. Disse-lhes Pilatos: Pois eu hei de crucificar o vosso rei? Responderam os príncipes dos sacerdotes: Nós não temos outro rei senão César. Entãoporémlho entregou, para que fosse crucificado. E eles tomaram a Jesus, e o tiraram para fora.[4: BÍBLIA Sagrada. João, cap. XIX. v. 13, 14, 15, 16. Rio de Janeiro: Barsa. p. 96. 25 de fevereiro de 1972.]
Para Rogério Lauria Tucci,
Há quem afirme, com respeitáveis argumentos, que os mais remotos antecedentes do Tribunal do Júri se encontram na lei mosaica, nos dikastas, na Heliéia (tribunal dito popular) ou no Areópago gregos; nos centeni comitês, dos primitivos germanos; ou ainda, em solo britânico, de onde passou para os Estados Unidos e, depois de ambos para os continentes europeus e americano.[5: TUCCI, Rogério Lauria. Tribunal do júri. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 12.]
Apenas a título de esclarecimento, Dikastas eram cidadãos que exerciam serviço público, comparados aos jurados de hoje em dia. Proferiam seus votos de forma secreta formando a decisão final no Tribunal de Heliéia, na Grécia Antiga. Areópago era o Tribunal de Atenas, criado por Sólon para punir os crimes capitais.
O Almanaque Virtual – Bene Trovato descreve como era o julgamento no Tribunal de Atenas:
A processualidade nesse tribunal era de rigorosa simplicidade. A reunião era ao ar livre e à noite. Assim, o acusado não se intimidava com a sua imponente gravidade, e os juízes não eram influenciados pelas lágrimas e arrependimento. Afim de que os ouvidos fossem preservados como os olhos, nenhum artifício oratório era permitido para enternecer ou comover. A princípio, os acusados defendiam a própria causa. Mais tarde, e pra suprir a insuficiência dos seus meios, foi-lhes permitido tomarem defensores, mas estes deviam limitar-se a expor simplesmente os fatos sem apelar para comiseração e a piedade.[6: DETIZIO JR, Pedro. Almanaque virtual – Bene Trovato. Disponível em: <http://www.almanaque.cnt.br /areopago.htm>. Acesso em: 01 mar. 2014.]
Segundo Guilherme de Souza Nucci, as primeiras informações sobre Júri são encontradas na Palestina, onde havia o Tribunal dos Vinte e Três nas vilas que tivessem população superior a 120 famílias. Faziam parte desse Tribunal os padres, os sacerdotes e os principais chefes de família de Israel. O Tribunal dos Vinte e Três julgavam os crimes que eram punidos com pena de morte.[7: Cf. NUCCI, Guilherme de Souza.Manual de processo penal e execução penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p.529.]
Para alguns autores, essa instituição teve surgimento nas mais primitivas civilizações, quando dos primeiros agrupamentos sociais, onde os mesmos se organizavam para julgar seus pares quando estes cometiam fatos não suportados pela sociedade na época.
Mesmo não tendo origem na Inglaterra, foi lá que o Tribunal no Júri ganhou importância no século XIX e mostrou-se eficaz.
Segundo Rogério LauriaTucci:
Com essa destinação, já no século X da Era Cristã o júri era composto por vinte e quatro pessoas, escolhidas entre os vizinhos do acusado e os moradores do lugar em que cometida a infração penal; sendo, ao que tudo indica, permitida a recusa, tanto à acusação quanto à defesa.
Aliás, presentava-se como um conjunto de pessoas que testemunhavam em nome da comunidade, e cujo veredicto repousava no conhecimento próprio do fato, assim como do acusado (sua personalidade, vida pregressa etc.); e, portanto, ao mesmo tempo júri de acusação e júri de julgamento.
Com o transcorrer do tempo, e, pelo menos a partir do século XVII, substituídos os duelos judiciários, as ordálias e os julgamentos de Deus pela declaração de doze cavaleiros, consolidou-se o júri britânico com esse número de jurados.[8: TUCCI, Rogério Lauria. Tribunal do júri. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 28.]
Pouco se sabe sobre o surgimento da instituição do Tribunal do Júri. Porém, o modelo que o Brasil adota hoje é parecido com o britânico do século XI.
1.2 O tribunal do júri e as constituições brasileiras
No Brasil, o Tribunal do Júri, surgiucom a Lei de 18 de junho 1.822, quando ainda era colônia de Portugal, para julgar somente os crimes de imprensa. O conselho era composto por vinte e quatro homens considerados inteligentes, honrados, patriotas. No entanto, o princípio da soberania dos veredictos ainda não era adotado nessa época.[9: Cf. MARQUES, José Frederico. A instituição do júri. São Paulo: Bookseller, 1997. p. 37-38.]
Só em 1.824, quando do Brasil Império, é que o Tribunal do Júri passou a ser considerado órgão do poder Judiciário, com a criação da primeira Constituição do Brasil. O Conselho teve sua competência ampliada e julgava as causas cíveis e criminais.[10: Cf. PEREIRA, José Ruy Borges. O júri: teoria e prática. São Paulo: Síntese, 2001. p. 24.]
Já, com o surgimento do Código de Processo Criminal de 1.832, que julgava grande parte das infrações do ordenamento jurídico da época, instituiu-se dois conselhos. O 1.º Conselho de Jurados, ou Jury de Accusação e o 2.º Conselho de Jurados ou Jury de Sentença.[11: BRASIL. Código de processo criminal de 1832. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ LIM/LIM-29-11-1832.htm>. Acesso em: 29 mar. 2014.]
O primeiro era composto pelo juiz, escrivão, promotor e sessenta jurados, dos quais eram escolhidos vinte e três e sendo presidido pelo primeiro sorteado. Os jurados eram, então, dirigidos para uma sala onde discutiam sobre o autor, o fato e a materialidade do crime. Daí o princípio do sigilo das votações.
Ao 2.º Conselho de Jurados, constituído por doze pessoas, era oferecido libelo acusatório, sobrequal o juiz procedia ao interrogatório do acusado. Ouvido o advogado do acusado, as testemunhas de defesa, as testemunhas de acusação e, ainda, após os debates, eram apresentados os quesitos, conforme artigo 269, Lei de 29 de novembro de 1.832:
Art. 269. (...)
§ 1º Se existe crime no facto, ou objecto da accusação?
§ 2º Se o accusado é criminoso?
§ 3º Em que gráo de culpa tem incorrido?
§ 4º Se houve reincidencia (se disso se tratar)?
§ 5º Se ha lugar á indemnização?
Se o primeiro quesito fosse negativo, não se fariam os outros. Caso o acusado fosse absolvido era solto imediatamente. Sendo condenado, ocorria a supressão da denúncia, a qual era considerada abuso de expressão do pensamento.
A instituição do Tribunal do Júri foi retirada da Constituição de 1.891, retornando com a Constituição de 1.934 e, novamente retirada da Constituição de 1.937. Nesta última, surgiram dúvidas sobre a existência do Tribunal do Júri.[12: NUCCI, Guilherme de Souza. Júri: princípios constitucionais. 1. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 38.]
No entanto, o instituto foi reafirmado com o Decreto-Lei n.º 167 de 1.938, embora não houvesse o princípio da soberania dos veredictos. Tal Decreto-Lei dispunha sobre a aplicação da lei, a competência do júri e a função do jurado.[13: NUCCI, Guilherme de Souza. Júri: princípios constitucionais. 1. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 39.]
Esse ordenamento instituiu que a composição do Tribunal do Júri fosse de um juiz de direito e de vinte e um jurados, dos quais seriam escolhidos sete para formarem o Conselho de Sentença.[14: BRASIL. Decreto-Lei n.° 167, de 5 de janeiro de 1.938. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937-1946/Del0167.htm>. Acesso em: 28 mar. 2014.]
O princípio da soberania dos veredictos só foi inserido na Constituição de 1.946, considerada uma das mais democráticas já editadas. Esta Constituição também definiu a competência do Tribunal do Júri para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.[15: NUCCI, Guilherme de Souza. Júri: princípios constitucionais. 1. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 84.]
Já a Constituição de 1.967, em seu artigo 150, § 18, mencionou apenas o princípio da competência mínima do Tribunal do Júri, ou seja, o julgamento dos crimes dolosos contra a vida; não fazendo alusão, entretanto, aos outros princípios já citados, quais sejam, a soberania dos veredictos e o sigilo das votações.[16: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao67.htm>. Acesso em: 28 mar. 2014.]
1.3 O Tribunal do júri na Constituição de 1.988
Atualmente, o Código de Processo Penal estabelece a composição do Tribunal do Júri e a formação do Conselho de Sentença em seus artigos 447 a 452, sendo que a Constituição Federal, em seu artigo 5.º, inciso XXXVIII estabelece os princípios que regem o Tribunal do Júri. São eles:
a plenitude de defesa;
o sigilo das votações;
a soberania dos veredictos;
a competência para julgar somente os crimes dolosos contra a vida.
O instituto do Tribunal do Júri, na Constituição de 1.988, é considerado cláusula pétrea e está previsto, como dito anteriormente, no artigo 5.º, inciso XXXVIII, inserido no Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, não podendo ser, portanto, objeto de Emenda Constitucional.
O Tribunal do Júri é presidido por um juiz presidente, magistrado de carreira, e vinte e cinco jurados, dos quais são sorteados sete jurados para compor o Conselho de Sentença.
Leciona Fernando da Costa Tourinho Filho que “Mais simplificamente, pode-se dizer que o Júri é um Tribunal composto de 1 Juiz de Direito, que o preside, e de 7 cidadãos, de notória idoneidade, sorteados na própria sessão de julgamento, dentre uma lista de 21 nomes.”[17: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 102.]
Hoje em dia, o Tribunal do Júri é considerado um dos maiores institutos de democracia adotados, haja vista o julgamento do acusado pelos seus pares como ensina Eugênio Pacelli em sua obra Curso de Processo Penal:
Costuma-se afirmar que o Tribunal do Júri seria uma das mais democráticas instituições do Poder Judiciário, sobretudo pelo fato de submeter o homem ao julgamento de seus pares e não ao da Justiça togada. É dizer: aplicar-se-ia o Direito segundo a sua compreensão popular e não segundo a técnica dos Tribunais.
Nesse sentido, de criação da justiça fora dos limites do Direito positivo, o Tribunal do Júri é mesmo democrático.[18: OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 718.]
Na democracia há a prevalência do interesse coletivo sobre o individual, daí se extrai o porquê de o Tribunal do Júri estabelecer como competência mínima o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
No entanto, a questão é se se faz correto esse julgamento por pessoas, às vezes, leigas, sem conhecimento jurídico necessário, muitas vezes, levadas pela emoção, preconceito, ou mesmo pela influência da mídia, em muitos casos.
Eugênio Pacelli vai mais além sobre esse pensamento quando diz que o que pode ser democrático, também pode ser arbitrário:
E o Tribunal do Júri, no que tem, então, de democrático, tem também, ou melhor, pode ter também, de arbitrário.E isso ocorre em razão da inexistência do dever de motivação dos julgados. A resposta à quesitação pelo Conselho não exige qualquer fundamentação acerca da opção, permitindo que o jurado firme seu convencimento segundo lhe pareça comprovada ou revelada (aqui, no sentido metafísico) a verdade. E, convenhamos, esse é realmente um risco de grandes proporções. Preconceitos, ideias preconcebidas e toda sorte de intolerância podem emergir no julgamento em Plenário, tudo a depender da eficiência retórica dos falantes (Ministério Público, assistente de acusação e defesa).Enfim, bom ou ruim, o Júri tem previsão constitucional.[19: OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 719.]
Os jurados não têm acesso ao inquérito policial, ou mesmo aos autos do processo para verificar perícias ou até a oitiva de testemunhas, tendo que julgar sem ver as provas concretas dos autos, apenas ouvindo a acusação e a defesa, ou seja, quem se expressa melhor, ganha a credibilidade do Conselho de Sentença.
E mais, o julgamento é feito segunda a íntima convicção de cada jurado, sem ter que fundamentar sua decisão aos quesitos apresentados, ou mesmo sem a necessidade de fundamentar a sentença final proferida.
Alguns doutrinadores, tais como Eugênio Pacelli e Guilherme de Souza Nucci, defendem que o princípio da soberania dos veredictos é relativa, já que pode ocorrer o error in judicando, de acordo com o artigo 593, inciso III, alínea d, do Código de Processo Penal, o qual reza que as decisões proferidas pelo Conselho de Sentença pode ser revista quando a decisão se mostrar controvertida à prova dos autos. Porém, não será o réu levado a novo julgamento se a sentença for a mesma da anterior.
No entanto, a revisão da decisão proferida pelo Conselho de Sentença no Tribunal do Júri não é uma afronta à Constituição Federal, pois a decisão manifestamente desproporcional à prova dos autos deve ser revista, a fim de impedir o cerceamento de defesa.
Atualmente, há vasta discussão a respeito da manutenção do Tribunal do Júri no ordenamento jurídico, eis que este se encontra superado na maioria dos países do continente europeu, que adota o modelo dos Tribunais de Escabinato ou Misto, onde o juiz togado também profere seu voto em conjunto com os juízes leigos.
O Tribunal do Júri é baseado em quatro princípios constitucionais, inseridos no artigo 5.°, inciso XXXVIII, da Constituição da República Federativa do Brasil. Tais princípios dizem respeito à forma como se deve proceder quanto ao julgamento em plenário. O próximo capítulo faz uma abordagem quanto a esses princípios, bem como quanto ao procedimento adotado nasegunda fase do Tribunal do Júri.
CAPÍTULO II – O TRIBUNAL DO JÚRI
2.1 Os princípios do tribunal do júri
Os princípios constitucionais do Tribunal do Júri, conforme mencionados anteriormente, estão estabelecidos no artigo 5.º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal, quais sejam:
Art. 5º (...)
XXXVIII – é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
O Tribunal do Júri é considerado a instituição mais democrática existente no ordenamento jurídico, pois é admitida a participação de pessoas comuns, que não seja investida de títulos, para proceder ao julgamento de seu semelhante.
Como assevera Márcio Schlee Gomes:
Por mais singelo que pareça, sabe-se que o processo deve estar revestido de inúmeras e fecundas garantias ao réu, o que, por sinal, vem expresso na Constituição (devido processo legal, contraditório, ampla defesa, presunção de inocência) e é indiscutível em um Estado democrático.[20: GOMES, Márcio Schlee. Sigilo das votações e incomunicabilidade: garantias constitucionais do júri brasileiro. Revista Digital do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. Disponível em:<http://www.amprs.org.br/arquivos/revista_artigo/arquivo_1303928691.pdf>. Acesso: em 05 abr. 2014.]
Mauro Viveiros, eu sua obra Tribunal do Júri na Ordem Constitucional Brasileira, cita que:
De todo modo, se a participação popular na administração da justiça de um lado encontra forte rejeição de parte de certos setores adeptos de um positivismo-normativista exclusivista que, em geral, negam a possibilidade do leigo tomar parte nos julgamentos e decidir para além das regras de direito escritas, sob a acusação de arbítrio ou irracionalidade ideológico, por outro lado, não há como se negar, conforme disse Soriano que: “a relação entre jusnaturalismo e justiça popular é clara; há um direito natural a ser julgado por homens do povo, porque tais homens possuem um sentimento jurídico e um filosofia penal semelhantes; filosofia penal que comporta uma coincidência na tipologia delitiva e na responsabilidade penal. Sempre, claro está, obedecendo às coordenadas espaço-temporais referidas a uma sociedade secreta.”[21: VIVEIROS, Mauro. Tribunal do júri na ordem constitucional brasileira: um órgão da cidadania. 1. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. p 255.]
No entanto, observar-se-á que, para alguns autores, como Fernando da Costa Tourinho Filho e Fernando Capez, o Tribunal Popular não é considerado tão democrático na visão moderna.
2.1.1 Plenitude de defesa
O princípio da plenitude de defesa se difere do princípio da ampla defesa. Este compreende a autodefesa e a defesa técnica.
Autodefesa é aquela que o próprio réu alega em seu favor. Já a defesa técnica é aquela garantida pelo Código de Processo Penal, em seu artigo 261 que diz que “Nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor”.
A defesa técnica é direito fundamental a todos os acusados no Tribunal do Júri, tanto que se o juiz verificar que o réu encontra-se indefeso, poderá dissolver o Conselho de Sentença, designar nova data para julgamento, bem como proceder à nomeação de novo defensor ao acusado, conforme reza o artigo 497, inciso V, do Código de Processo Penal:
Art. 497. São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri, além de outras expressamente referidas neste Código:
(...)
V – nomear defensor ao acusado, quando considera-lo indefeso, podendo, neste caso, dissolver o Conselho e designar novo dia para o julgamento, com a nomeação ou a constituição de novo defensor.
Por esse princípio, o acusado poderá valer-se de todos os meios possíveis para defender-se das acusações, inclusive religiosos, políticos e morais. O acusado deverá argumentar tudo o que for dito em seu desfavor.
Além de ampla, a defesa necessita ser plena, ou seja, perfeita, ou próxima à perfeição.
2.2.2 Sigilo das votações
O Princípio do Sigilo das Votações é uma exceção ao Princípio da Publicidade. Por este princípio, todos os atos processuais devem ser públicos; em contrapartida, aquele está intimamente ligado à incomunicabilidade dos jurados.
Isso não significa que os jurados não poderão formular perguntas ou esclarecer fatos acerca do acontecido. O artigo 473, § 2.º reza que “os jurados poderão formular perguntas ao ofendido e às testemunhas, por intermédio do juiz presidente”. E, ainda, o § 3.º do mesmo artigo permite aos jurados requerer acareações, reconhecimento de pessoas e coisas e outras medidas para melhor conhecer dos fatos.
Após os debates em plenário, os jurados são dirigidos à sala secreta a fim de que seja proferido os seus votos.
A incomunicabilidade dos jurados consiste no fato de que não haja debates entre eles com a finalidade de dirigir ou expor os motivos que o levarão a absolver ou condenar o acusado, ou, ainda, apontar fatos controversos, tornando, dessa forma, o julgamento desequilibrado ou parcial.
O voto dos membros do Conselho de Sentença deve ser independente, livre e honesto, tendo em vista que cada jurado teve conhecimento dos fatos quando expostos pelo Ministério Público e pelo defensor, respectivamente.
Como leciona Eugênio Pacelli:
O sigilo das votações impõe o dever de silêncio (a regra da incomunicabilidade) entre os jurados, de modo a impedir que qualquer um deles possa influir no ânimo e no espírito dos demais, para fins da formação do convencimento acerca das questões de fato e de direito em julgamento. Dessa maneira, aos olhos da lei, estaria melhor preservada a pluralidade da decisão.[22: OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 548.]
Este princípio traduz numa garantia ao jurado de votar com imparcialidade e de acordo com o íntimo de cada componente do Conselho de Sentença, conforme artigo 472, do Código de Processo Penal:
Art. 472. Formado o Conselho de Sentença, o presidente, levantando-se, e, com ele, todos os presentes, fará aos jurados a seguinte exortação:
Em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidade e a proferir a vossa decisão de acordo com a vossa consciência e os ditames da justiça.
Os jurados, nominalmente chamados pelo presidente, responderão:
Assim o prometo.
O princípio do sigilo das votações consiste numa garantia assegurada aos jurados para que votem sem se sentirem pressionados.
2.2.3 Soberania dos veredictos
Este princípio tem limitação no artigo 593, inciso III, alínea d, do Código de Processo Penal, haja vista a possibilidade de novo julgamento do acusado, que também será realizado através do Tribunal do Júri, quando provar que a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova dos autos.
No entanto, não se admite nova apelação da sentença proferida no Tribunal do Júri pelo mesmo motivo já que a decisão dada pelo Conselho de Sentença é soberana.
A questão parece contraditória, mas conforme Fernando da Costa Tourinho Filho:
Tal circunstância revela, aparentemente, uma verdadeira contradição: se não foi soberana no primeiro julgamento, como poderia sê-la no segundo? Ao que parece, o legislador, embora reconhecendo ser soberana a decisão do Júri, permitiu que a instância superior, praticando verdadeiro attidi controlo, desse ao Tribunal popular uma oportunidade para corrigir a iniquidade. E o fez, com a regra do art. 593, III, d, do CPP. Contudo, renitindo o Tribunal leigo no mesmo erro, respeita-se seu entendimento.[23: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 106.]
Fernando Capez ensina que:
Trata-se de princípio relativo, logo não exclui a recorribilidade de suas decisões, limitando-se, contudo, a esfera recursal do juízo rescindente (judicium rescindem), ou seja, à anulação da decisão pelo mérito e a consequente devolução para novo julgamento (art. 593, III, d). Do mesmo modo,em obediência ao princípio maior da verdade e em atenção ao princípio da plenitude de defesa, admite-se alteração do meritum causae, em virtude de revisão criminal.[24: CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 584.]
A decisão proferida pelos jurados torna-se, muitas vezes, reformada diante da ausência de fundamentação, eis que a sentença a ser elaborada pelo juiz togado não precisa estar de acordo com as provas existentes dentro dos autos.
2.2.4 Competência para os crimes dolosos contra a vida
Dolo é a vontade livre e consciente que um indivíduo tem para praticar um fato contra outra pessoa, ou, ainda, de aceitar o resultado.
O princípio da competência para os crimes dolosos contra a vida não é absoluto, haja vista a possibilidade de ampliação por lei ordinária, embora pareça pouco provável.
Esse princípio trata da competência mínima para o julgamento em plenário. Os crimes previstos são: homicídio, induzimento, auxílio ou instigação ao suicídio, infanticídio e suas modalidades tentadas ou consumadas. São, em regra, apenados com pena de reclusão. Porém, os crimes de infanticídio e os crimes de aborto, são aplicados penas de detenção.
2.2 Procedimento em plenário
O rito do Tribunal do Júri é especial, previsto no Código de Processo Penal nos artigos 406 a 497, título modificado pela Lei n.º 11.689/2008.
Terminada a primeira fase, o juiz marca dia e horário para que sejam sorteados os vinte e cinco jurados que deverão comparecer no dia do julgamento em plenário.
Já em plenário, o juiz deve decidir sobre eventual questão incidental que venha a surgir, consignando as decisões em ata.
Tão logo, o juiz recolherá as cédulas com os nomes dos jurados a serem sorteados dentro da urna para compor o Conselho de Sentença.
Os jurados serão sorteados um a um, podendo haver recusa pelo Representante do Ministério Público e pelo advogado do acusado, respectivamente, sendo que poderão dispensar até três jurados, cada um, injustificadamente. A recusa dos demais jurados deverá ser justificada.
Formado o Conselho de Sentença, colher-se-á as declarações do ofendido, se possível e, após, far-se-á o interrogatório do acusado e, em seguida, ocorrerá a inquirição das testemunhas. Finda a produção da prova testemunhal, acontecerão os debates, tendo a acusação o tempo de uma hora e meia para narrar os fatos segundo a decisão de pronúncia. Ao assistente de acusação, é facultado falar nesse mesmo tempo em que o promotor de justiça se expressa.
O prazo regulamentar para a defesa é, também, de uma hora e meia para a sua manifestação.
Apartes são esclarecimentos feitos pela parte quando esta não detém o uso da palavra, no momento da acusação ou defesa. Esta questão é explicada por Guilherme de Souza Nucci:
A questão (do aparte) foi solucionada pela introdução do inciso XII ao art. 497 do CPP. Constitui atribuição do juiz presidente “regulamentar, durante os debates, a intervenção de uma das partes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder até 3 (três) minutos para cada aparte requerido, que serão acrescidos ao tempo desta última”.Deve a parte conceder apartes, quando solicitada pela contrária, sob pena de haver a intervenção do juiz presidente, concedendo o momento de interferência, para que se faça algum comentário importante, referente ao tema desenvolvido por aquele que está falando. O aparte é esclarecedor e ilustra o jurado, quando bem feito e sem abuso. Defendendo, igualmente, o aparte, por força de tradição.[25: NUCCI, Guilherme de Souza, Manual de processo penal e execução penal. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 789.]
“Os jurados poderão formular perguntas ao ofendido e às testemunhas, por intermédio do juiz presidente”, se achar necessário. Essa redação, dada pelo § 2.º, do artigo 473, do Código de Processo Penal, possibilita aos jurados formarem a íntima convicção, por meio de esclarecimento de dúvidas acerca dos fatos.
Outro ponto importante no julgamento pelo Tribunal do Júri diz respeito ao uso de algemas pelo acusado.
O uso de algemas, na moderna visão, pode causar constrangimento ao acusado e influenciar na decisão dos jurados, tendo em vista que estes podem ter uma opinião equivocada do indiciado. Há também o fato de não haver necessidade quanto ao uso do instrumento pelo fato de o acusado não ser pessoa de considerada periculosidade.
Sobre este tema, Rui Stocco e Alberto Silva Franco dispõem que:
Há quem entenda não deva o réu ser apresentado algemado logo no início do julgamento, nesse Estado permanecendo todo o tempo. Invoca-se em contrário a tal situação o princípio da “presunção de inocência”; e reprova-se seja acusado mantido “em exposição humilhante no banco dos réus”.
(...)
Revela-se anódino o argumento baseado na “presunção de inocência”. Provavelmente, a imposição de algemas ao réu terá resultado de ele ser considerado perigoso ou capaz de intentar fuga. Seria suficiente estar lardeados de guardas; mas, o conhecimento de sua personalidade, que dele tenha o Juízo, justificará a cautela maior das algemas. Raramente se deparará com arbitrariedade; nem se ofenderá princípio algum, constitucionalmente garantido. Se houver violência, o réu e seu defensor que protestem, para conhecimento da 2ª Instância.[26: MARREY, Adriano; FRANCO, Alberto Silva; STOCCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p 320.]
O entendimento do Supremo Tribunal Federal é de que:
Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.[27: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante n.° 11.]
Percebe-se que esta questão a respeito do uso de algemas já se encontra superada.
Concluindo o procedimento em plenário do Tribunal do Júri, nota-se que trata de uma apresentação cênica feita aos jurados, e também aos curiosos presentes, retratando a vida pregressa do indiciado e, muitas vezes, expondo a sua intimidade.
2.3 Pronunciamento do réu
Encerrada a primeira fase, ou fase de instrução, o juiz poderá optar por impronunciar o réu, absolve-lo sumariamente, desclassificar a infração ou pronunciar o acusado.
A decisão de impronúncia ocorre quando o juiz não tem convencimento da autoria do fato. Já a sentença de absolvição sumária é feita quando o juiz entender que o ato praticado pelo acusado é antijurídico ou houve ausência de culpabilidade. No tocante à desclassificação da infração, esta pode ocorrer para a mesma competência do Tribunal do Júri ou para outra competência que não seja deste.
A pronúncia trata-se de uma decisão meramente declaratória do juiz, que admitindo a imputação ao acusado, coloca fim à primeira fase do rito do Tribunal do Júri e submete o acusado a julgamento em plenário ou julgamento popular.
Fernando da Costa Tourinho Filho expõe de forma clara a decisão de pronúncia:
Todavia, se o Juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, proferirá sentença de pronúncia. Não se trata de sentença de mérito, pois, mesmo reconhecendo seja o réu o autor do crime, não aplica nenhuma sanctio juris. A sentença aí tem, evidentemente, caráter nitidamente processual.[28: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 76.]
E, ainda:
Com a pronúncia, o Juiz julga, apenas, admissível o jus accusationis. Tratando-se, como se trata, de sentença de natureza processual, não há falar em res judicata, e sim em preclusão pro judicato, podendo o Tribunal do Júri decidir contra aquilo que ficou assentado na pronúncia. O simples fato de o Tribunal do Júri poder contrariar o que nela ficou estabelecido está a indicar que a sentençade pronúncia não transita em julgado; e não transita, repita-se, porque se trata de decisão meramente processual, cuja finalidade é o direito de acusar do Estado, encerrando, assim, a primeira fase do procedimento, vale dizer, concluindo o judicium accusationis.[29: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 80.]
Pelo princípio in dubio pro reo, se houver dúvidas, por parte do juiz, sobre a autoria do fato, este deverá impronunciar o acusado ou absolvê-lo sumariamente.
Quando o juiz pronunciar o acusado e, havendo recurso das partes dessa decisão, sendo posteriormente reformada, é a chamada despronúncia.
A decisão de pronúncia, como todas as decisões proferidas por um magistrado, deve ter fundamento legal, sob pena de ser arguida nulidade do ato processual.
Antes da alteração do procedimento do Tribunal do Júri, feita pela Lei n.° 11.689/08, era apresentado, pelo Representante do Ministério Público, o libelo acusatório, e pela defesa, a contrariedade ao libelo. Eram as peças processuais inaugurais da segunda fase do Tribunal do Júri. As alegações em plenário eram feitas com base e restritas ao alegado nas referidas peças.
No entanto, com a modificação do procedimento do Júri, tais peças foram extintas e, atualmente, a matéria a ser alegada em plenário deve respeitar a decisão de pronúncia proferida pelo magistrado.
2.4 O Conselho de Sentença
O Conselho de Sentença é o principal órgão do Tribunal do Júri. Como mencionado anteriormente, ele é composto por sete jurados, os quais devem apreciar a matéria de fato do crime em julgamento, proferindo seus votos, de acordo com a íntima convicção de cada um.
Concorde Edilson Mougenot Bonfim, em sua obra Curso de Processo Penal:
Isto significa que os juízes leigos não estão vinculados aos elementos de prova constantes nos autos nem às normas legais, gozando de total liberdade no julgamento da causa. Exatamente por esse motivo, encontra a instituição do Júri inúmeros opositores. Vale lembrar, contudo, que a liberdade de julgamento e a soberania dos veredictos não impedem o reexame da decisão do Júri, e, se for o caso, a submissão do acusado a novo julgamento, nos termos do art. 593, III, d, do CPP (decisão manifestamente contrária à prova dos autos).[30: BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. 5.ed.São Paulo: Saraiva, 2010. p. 538.]
Os sete jurados que compõem o Conselho de Sentença são sorteados dentre os vinte e cinco jurados, previamente sorteados e convocados para comparecerem no dia e horário designados pelo magistrado para a realização do julgamento em plenário.
Os vinte e cinco jurados serão sorteados para comparecer em todos os julgamentos a serem realizados naquele mês. Para o próximo mês, serão sorteados outros vinte e cinco novos jurados para os julgamentos deste mês, e assim sucessivamente.
A esse respeito, Rui Stoco assevera que:
O Código de Processo Penal impôs ao sorteado a obrigação de comparecer a todas as sessões, sem restrições. Vale dizer, sorteado para uma sessão periódica do Júri, deve o cidadão comparecer a todas e ali permanecer até a formação do Conselho e somente depois de composto este, se não for um dos escolhidos, está dispensado daquela sessão de julgamento. Essa dispensa, entretanto, não o libera da sessão seguinte, dentro da mesma periódica para a qual é um dos 21 previamente sorteados.[31: TJSP – P – Rel. Alves Braga – RJTJSP 29/380. In: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 737.]
Os jurados que justificarem suas ausências no dia do julgamento em plenário continuarão a compor o Conselho de Sentença do mês, conforme entendimento jurisprudencial:
Em sede de julgamento pelo Tribunal do Júri, se os jurados que deixaram de comparecer à primeira sessão justificaram suas ausências, desnecessário se faz o sorteio de suplentes, pois os faltosos continuarão a integrar o corpo de Jurados da sessão periódica.[32: TJSP – 5ª C – AP 216.139-3/5 – Rel. Dante Busana – j. 24.09.1998 – RT 765/573. In: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 728.]
Sobre os jurados excluídos por impedimento, o entendimento é de que:
A lei processual prescreve que os Jurados excluídos por impedimento serão computados para a constituição do número legal. A respeito, ensina Espínola Filho: “Somente depois do sorteio, sendo possível levantar, contra o Jurado, impedimento ou suspeição, e só então lhe sendo dado afirmar-se impedido ou suspeito; e, doutra parte, não podendo as recusações peremptórias visar senão a um Jurado, que a sorte indicou para composição do conselho, bem se percebe que seria um contra-senso atribuir, ao afastamento, daí resultante, de um Jurado, o efeito retroativo de influir para a suspensão dos trabalhos, quando, em consequência, viesse o número de Jurados, livres e aptos a tomar parte no julgamento, a baixar a menos de 15” (Código de Processo Penal, v. 4/318)”.[33: TJSP – AP – Rel. Humberto da Nova – RJTJSP 7/515. In: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.p. 736.]
Os jurados, através do juiz presidente do Tribunal do Júri, poderão formular perguntas às partes, ofendido e testemunhas, acerca de fatos que lhes pareçam incompreendidos.
Conforme artigo 473, § 3.º, aos jurados também poderão “requerer acareações, reconhecimento de pessoas e coisas e esclarecimentos dos peritos, bem como a leitura de peças que se refiram” às provas dos autos, sejam elas colhidas através de oitiva das partes por carta precatória, provas cautelares, àquelas que foram antecipadas por risco de serem perdidas ou, ainda, provas não repetíveis.
O esclarecimento das questões as quais os jurados necessitam será feito pelo juiz togado. A votação dos quesitos, a ser feito na sala secreta, ocorrerá somente quando os jurados se afirmarem satisfeitos com a exposição dos fatos.
Rui Stoco leciona que:
No julgamento pelo Júri compete ao juiz, como presidente dos trabalhos, esclarecer os Jurados sobre as questões de fato, ministrando-lhes todos os meios para que possa habilitá-los a proferir um bom julgamento. Somente depois que os Jurados declarem que se encontram habilitados a julgar, sem qualquer dúvida a ser esmiuçada, seja através das explicações, ou por meio da leitura dos autos, que podem ser consultados pelos Jurados, é que serão propostos e votados os quesitos.[34: TJSP – AP – Rel. Hoppner Dutra – RJTJSP 19/466 e RT 434/348. In: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 735.]
E ainda:
Indagado por um Jurado sobre questão de fato que não possa ser esclarecida ‘à vista dos autos’ (art. 478, par. ún., do CPP) qual seja o motivo da divergência entre a palavra do réu, que negara a autoria, e a da testemunha, que a afirmara, deve o juiz explicar a impossibilidade de responder à pergunta nos limites autorizados pela lei e sem influir no julgamento. Não lhe é permitido, para contestar à indagação, sugerir ainda que subliminarmente, critério para valorar as provas e dirimir o conflito entre elas, lembrando que a testemunha responde penalmente por faltar à verdade e o réu não está sujeito à idêntica consequência.[35: TJSP – AP – 86.193-3 – Rel. Dante Busana – j. 07.05.1990, In: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 734.]
São isentos do serviço do Júri:
a) o Presidente da República e os Ministros de Estado;
b) os Governadores e seus Secretários;
c) os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Municipais e Distritais;
d) os Prefeitos;
e) os Magistrados, membros do Ministério Público e da Defensoria Pública;
f) os servidores do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública;
g) as autoridadese os servidores da polícia e da segurança pública;
h) os militares em serviços ativo;
i) os cidadãos maiores de setenta anos que requererem dispensa;
j) aquelas pessoas que requererem dispensa, demonstrando justo impedimento.
As causas de suspeição e impedimento a que os jurados estão sujeitos são as mesmas previstas para o juiz togado, elencadas nos artigos 252, 253 e 254 do Código de Processo Penal:
Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo que:
I – tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;
II – ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha;
III – tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão;
IV – ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou indiretamente interessado no feito.
Art. 253. Nos juízos coletivos, não poderão servir no mesmo processo os juízes que forem entre si parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive.
Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes:
I – se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes;
II – se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;
III – se ele, seu cônjuge, ou parente, consanguíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;
IV – se tiver aconselhado qualquer das partes;
V – se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;
VI – se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.
Há, ainda, o impedimento e a proibição de que tratam os artigos 448 e 449, respectivamente, do Código de Processo Penal:
Art. 448. São impedidos de servir no mesmo Conselho:
I – marido e mulher;
II – ascendente e descendente;
III – sogro e genro ou nora;
IV – irmãos e cunhados, durante o cunhadio;
V – tio e sobrinho;
VI – padrasto, madrasta ou enteado.
§ 1.° O mesmo impedimento ocorrerá em relação às pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar.
§ 2.° Aplicar-se-á aos jurados o disposto sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados.
Art. 449. Não poderá servir o jurado que:
I – tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, independentemente de causa determinante do julgamento posterior;
II – no caso do concurso de pessoas, houver integrado o Conselho de Sentença que julgou o outro acusado;
III – tiver manifestado prévia disposição para condenar ou absolver o acusado.
O impedimento do jurado não importa em nulidade do julgamento se este não influiu na sentença: “O impedimento de um Jurado não acarreta a nulidade do julgamento se não influiu no resultado da votação.”[36: TJSP – AP – Rel. Castro Duarte – RT 611/328. In: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.p. 741.]
Cabe ressaltar que não se sabe como seria essa influência que o jurado impedido poderia exercer no julgamento. Trata-se de uma questão muito subjetiva.
No entanto, se se descobre que o jurado era impedido, mas dentro do prazo para oferecimento de recurso, anular-se-á o julgamento.
A esse respeito, Rui Stoco ensina que:
Se o conhecimento de que o Jurado estava legalmente impedido for posterior à decisão do Júri, mas dentro do prazo de recurso, anula-se o julgamento para que o apelante enfrente novo Conselho de Sentença[37: TJMS – AP – Rel. Pereira Rosa – RT 560/377. In: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.p. 742.]
Essa anulação deverá ser feita em grau de recurso através de apelação, onde a parte prejudicada deverá alegar o ocorrido.
Já, pelo princípio da íntima convicção, que será tema do próximo capítulo, não cabe qualquer tipo de anulação, haja vista que é o princípio predominante na fase de julgamento em plenário.
CAPÍTULO III – O PRINCÍPIO DA ÍNTIMA CONVICÇÃO
O jurado como membro do Conselho de Sentença deve ser pessoa que tenha o necessário discernimento e notória idoneidade. Ao ser escolhido, espera-se que ele, como representante da sociedade, condene ou absolva o acusado, e muitas vezes o jurado é levado pelo clamor da sociedade.
Lênio Luiz Streck assinala que o papel do jurado é aquele exigido pela sociedade:
Pode-se acrescentar, ainda, que assim como o padrão de normalidade vigente na sociedade tem enorme influência na designação de quem possui as características que permitam o encaixe de alguém no conceito de “notória idoneidade”, tal “padrão de normalidade” terá efeito no âmbito da apreciação dos jurados sobre o acusado no momento do julgamento pelo júri. Ou seja, a partir da composição do corpo de jurados delineia-se o padrão de comportamento social a ser exigida do “restante da sociedade”.[38: STRECK, Lenio Luiz, Tribunal do júri. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 100.]
O compromisso do jurado é o de desempenhar o papel de juiz, com a precisada imparcialidade que tem os juízes togados. Paulo Roberto Leite Ventura afirma que: “A sua finalidade principal é a de investir o cidadão jurado na condição de julgador, concitado a desempenhar tal mister com imparcialidade, imbuído na mais absoluta consciência e tomado por um total espírito de justiça.”[39: VENTURA, Paulo Roberto Leite. O tribunal do júri. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1990. p. 53.]
A incomunicabilidade dos jurados é uma forma de assegurar a imparcialidade do Conselho de Sentença, pois, como já mencionado anteriormente, deve-se resguardar a opinião de cada membro do Conselho de Sentença de forma que a opinião de um dos membros não se sobreponha a outra.
Assinala Rui Stocco que:
Na verdade, não têm eles – como já se supôs – que “conferenciar” entre si, acerca do processo em julgamento. É óbvio que, nessa ocasião, algum jurado mais letrado poderá influir no entendimento dos demais, afetando sua independência e quebrando a incomunicabilidade que tanto se recomenda. Se precisarem de esclarecimentos, podem solicitá-los diretamente ao Juiz-Presidente.[40: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 411.]
E ainda, assegura que “Deve o sigilo da votação, quando possível, ser resguardado, também pela razão de que assim se assegura a incomunicabilidade dos Jurados, cuja violação acarretaria nulidade do julgamento (CPP, art. 564, III, j).”[41: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.p. 411.]
O Princípio da íntima Convicção é aquele que os jurados possuem para realizar o julgamento de acordo com a consciência de cada membro do Conselho de Sentença.
Por esse motivo é que o Tribunal do Júri é considerado umas das instituições mais democráticas existentes, pois o julgamento do acusado é feito pelos seus pares, pessoas que representam a sociedade.
Nesse contexto, entende Lênio Streck que o julgamento depende das diferentes estruturas sociais:
Assim, estruturas sociais de diferentes comunidades engendrarão corpos de jurados de acordo com os padrões internalizados de cada uma. Tal circunstância, indubitavelmente, terá significativas consequências nos resultados dos julgamentos, como se observará mais adiante.[42: STRECK, Lenio Luiz, Tribunal do júri. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 101.]
No entanto, é aqui o ponto contraditório, eis que os jurados não são investidos de jurisdição, não têm a técnica adequada, nem o necessárioconhecimento para condenar ou absolver o acusado, além do fato de não precisarem fundamentar suas decisões.
No saber de Aury Lopes Junior, “Os jurados carecem de conhecimento legal e dogmático mínimo para a realização dos diversos juízos axiológicos que envolvem a análise da norma penal e processual aplicável ao caso, bem como uma razoável valoração da prova”.[43: LOPES JUNIOR, Aury, Direito processual penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 321.]
Os jurados, aos olhos dos críticos, são pessoas fáceis de serem influenciadas, principalmente quando dos debates, aonde o Promotor de Justiça, órgão da acusação, e os defensores muitas vezes usam de palavras pesadas e argumentos que chamam a atenção dos jurados para uma ou outra decisão.
Aury Lopes Junior diz, ainda, que:
Argumenta-se, ainda, em torno da independência dos jurados. Grave equívoco. Os jurados estão muito mais suscetíveis a pressões e influências políticas, econômicas e, principalmente, midiática, na medida em que carecem das garantias orgânicas da magistratura.[44: LOPES JUNIOR, Aury, Direito processual penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 321.]
Outro ponto importante é o fato de que, no Tribunal do Júri, chama-se a atenção para a vida do acusado, pois discutem-se a conduta do criminoso, seus antecedentes criminais, sua moral. Como bem expressa Lênio Streck:
Como se viu, os discursos dos operadores jurídicos (acusação e defesa) no júri estão permeados, majoritariamente, pela visão de que o que mais importa é o autor do fato criminoso, e não o próprio fato cometido pelo acusado. Assim, percebe-se que no discurso da acusação está presente a tese da responsabilidade moral, enfim, da infalibilidade da sociedade como um todo e que todos têm a mesma chance, protegidos pelo dogma de que “todos são iguais perante a lei”, independentemente das condições sociais em que o indivíduo está inserido.[45: STRECK, Lênio Luiz, Tribunal do júri. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 119.]
Nos debates, ganha quem tem a melhor argumentação, a melhor oratória, a melhor forma de chamar a atenção dos jurados e, nem sempre quem tem a razão ou qual seria a melhor decisão para o acusado sobre o crime em comento.
A maior crítica está no fato de que os jurados não fundamentam suas decisões e, necessariamente, não são baseadas em provas dos autos, enquanto que, para o juiz togado, toda decisão proferida carece de fundamento legal, sob pena de nulidade, conforme artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal.
Aury Lopes Junior comenta:
A supremacia do poder dos jurados chega ao extremo de permitir que eles decidam completamente fora da prova dos autos. Imaginemos um julgamento realizado no Tribunal do Júri, cuja decisão seja manifestamente contrária à prova dos saltos (condenatória ou absolutória). Há recurso de apelação com base no art. 593, III, “d”, do CPP, que, uma vez provido pelo Tribunal, conduz à realização de novo júri (consequência da aplicação da primeira parte do parágrafo terceiro do 593). Esse “novo” júri será composto por outros jurados, mas como o espetáculo será realizado pelos mesmos “atores” em cima do mesmo “roteiro” e no mesmo cenário, a chance de o resultado final ser igual é imensa.[46: LOPES JUNIOR, Aury, Direito processual penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 323-324.]
Conforme assevera Guilherme de Souza Nucci:
A missão de julgar requer profissionais e preparo, não podendo ser feita por amadores. É impossível constituir um grupo de jurados preparados a entender as questões complexas que muitas vezes são apresentadas para decisão no Tribunal do Júri.[47: NUCCI, Guilherme de Souza. Júri:princípios constitucionais. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 183.]
Importante salientar que os jurados não estão presentes na primeira fase do processo de Júri – aquela onde há instruções, acareações, depoimentos, perícias – e, a eles, só cabem receber cópias de algumas peças processuais antes do início do julgamento em plenário.
Observa-se, aqui, o fato de, possivelmente, haver a dispensa de testemunhas arroladas, tanto pela defesa, quanto pela acusação, quando do início do julgamento pelo Tribunal do Júri.
Tem-se também que, por muitas vezes, o tempo para a acusação e defesa exporem seus argumentos torna-se encurtado diante de um crime cometido com detalhes, que exija mais atenção e exposição teses acusatórias ou defensivas.
Tanto acusação, quanto defesa se utilizam de palavras persuasivas, da retórica, da comoção social, bem como de uma interpretação teatral, gesticular, ampliando a imaginação dos jurados acerca do fato em discussão.
É necessária essa teatralização para que os jurados tenham informações a respeito do acontecimento. Há certo induzimento para que os jurados se reportem, mentalmente a acontecimentos análogos para se proceder à avaliação da conduta do agente.
LênioStreck afirma, em sua obra Tribunal do Júri, que:
O Tribunal do Júri, na medida em que é um ritual por excelência, é uma instituição que (re)articula mensagens diretamente relacionadas com a sociedade a qual representa. No seu interior, os atores (re)produzem, em considerável medida a própria sociedade. Por isto, o júri é visto, no âmbito (e nos limites) desta obra, como um momento extraordinário que (re)articula e (re)organiza de uma maneira diferente os momentos ordinários da rotina cotidiana da sociedade e, à parte de torna-la passível de ser lida/entendida, institui uma outra rotina, pela qual os agentes sociais venham a “perceber/entender” que as diferenças sociais são “normais”, e que a hierarquia da sociedade deve ser preservada e que a lei tem a função de, além de “conceder” chances iguais para todos, “proteger” a totalidade da sociedade, sem distinções de classes sociais, mantendo-se, assim, a ilusão de que vivemos em um corpo social sem fissuras.[48: STRECK, Lênio Luiz. Tribunal do júri. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 106.]
O argumento de que o Tribunal do Júri é uma instituição democrática parece estar ultrapassado. Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa, o significado da palavra democracia consiste em: “1. Governo do povo; soberania popular. 2. Doutrina ou regime político baseado nos princípios da soberania popular e da distribuição equitativa do poder”.[49: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da língua portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988. p. 154.]
Logo, democracia definido como o governo do povo e soberania popular, tem-se que é injusto que uma pessoa seja julgada apenas por sete jurados que compõem o Conselho de Sentença, sem dar o devido fundamento da decisão.
Nesse diapasão, vale notar que o juiz, representante do povo, foi investido de jurisdição para julgar. Este tem o conhecimento necessário, devendo fundamentar todas as suas decisões, devendo ser imparcial acerca dos fatos.
Se o juiz é o representante do povo, deveria ele proferir seu voto acerca dos crimes dolosos, tentados e consumados, contra a vida, pois cabe a ele o dever de imparcialidade. E, ainda, como representante do povo, uma pessoa estudada e investida do poder de jurisdição faria melhor julgamento que sete pessoas que não têm o conhecimento aprofundado de questões que só cabem ao juiz togado.
Mauro Viveiros, ensina que:
Assinala-se que, como um dos princípios fundamentais do processo penal é a busca da verdade material, da qual o princípio da imediação é um instrumento, torna-se impensável um Tribunal do júri sem que haja essa relação direta entre os juízes leigos e as partes, a qual permite que eles, os julgadores, com seus próprios sentidos, possam avaliar os meios de provas e os resultados probatórios alcançados.
Aury Lopes Junior leciona, em sua obra Direito Processual Penal:
A legitimidade democrática do juiz deriva do caráter democrático da Constituição e não da vontade da maioria. (...) É uma legitimidade democrática, fundada na garantia dos direito fundamentais e baseada na democracia substancial (enão meramente formal).[50: LOPES JUNIOR, Aury, Direito processual penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.p. 321.]
Pois bem, a Constituição representa o povo, seus direitos, a democracia. No entanto, o juiz representa a justiça. Logo, percebe-se um contrassenso entre democracia e justiça, sobretudo quando surge a dúvida de que pode o jurado ter seu convencimento formado a partir do momento em que tem conhecimento, através de terceiros, sobre como ocorreram os fatos, e nem sempre o que chega aos ouvidos das pessoas é como realmente aconteceram os fatos.
Ainda em plenário, deve o juiz ler os quesitos aos jurados e ao público presente, e questionar se o Conselho de Sentença se encontra satisfeito com a exposição dos fatos e se tem condições de votá-los.
Caso haja alguma dúvida, deverá o jurado perguntar ao juiz que a esclarecerá, conforme artigo 473, § 2.°, do Código de Processo Penal. Esse esclarecimento poderá ser feito em plenário ou na sala secreta no momento da votação.
Como ensina Paulo Roberto Leite Ventura a respeito dos quesitos:
Quesito é o questionário a ser formulado aos jurados, podendo ser desdobrado numa ou várias séries, desde que várias sejam as imputações feitas.
Quesitos são perguntas que sob a forma escrita, o Juiz Presidente dirige aos jurados, versando sobre o fato principal, as circunstâncias que o integram ou o modificam, e as que podem excluir a respectiva criminalidade, ou a punibilidade, ou a responsabilidade do réu.[51: VENTURA, Paulo Roberto Leite. O tribunal do júri. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1990. p. 69.]
As cédulas de votações deverão ser feitas em papel opaco de forma que quem se faça presente na sala secreta no momento da votação não veja os votos dos jurados.
Sobre a votação, Rui Stoco explica bem como ocorre quando leciona a respeito da matéria:
Como já se observou, a votação é simbólica e far-se-á em sigilo, mediante cédula de tamanho reduzido, que o Juiz-Presidente mandará distribuir aos Jurados antes da votação de cada quesito (CPP, art. 487). As cédulas serão necessariamente de papel opaco, facilmente dobráveis e conterão, já escritas, a palavra “sim” em uma, e a palavra “não” na outra (CPP, art. 485). A distribuição será feita por um dos oficiais de justiça.[52: FRANCO, Adriano Marrey Alberto Silva; STOCO, Rui. Teoria e prática do júri. 7. ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.p. 413-414.]
Os quesitos serão formulados de acordo com a sentença de pronúncia e serão na ordem que preceitua o artigo 483, do Código de Processo Penal:
Art. 483. Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre:
I – a materialidade do fato;
II – a autoria ou participação;
III – se o acusado deve ser absolvido;
IV – se existe causa de diminuição da pena alegada pela defesa;
V – se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.
Depois de votados os quesitos, o juiz redige a sentença, fundamentando-a de acordo com a votação dos jurados. E logo em seguida, faz a leitura em plenário para o acusado e o público presente.
O princípio da íntima convicção, por ser predominante na segunda fase do Tribunal do Júri, apresenta consequências, uma das quais é a falta de fundamentação a que o jurado não se submete, podendo, portanto, condenar o acusado pelo simples fato de o crime ter tido relevante clamor social e ter circunstâncias que tornam o acusado a peça principal do fato em questão.
CAPÍTULO IV – AS CONSEQUÊNCIAS DO PRINCÍPIO DA ÍNTIMA CONVICÇÃO
O Tribunal do Júri, instituição defendida como democrática e criticada como teatral, tem fundamento legal na Constituição Federal e é considerada cláusula pétrea.
Assevera Aury Lopes Junior que:
É verdade que o tribunal do Júri é cláusula pétrea da Constituição, art. 5°, XXXVIII, mas isso não desautoriza a crítica, até porque podemos, sim, questionar a legitimidade de tal instituição para estar na Constituição.
(...)
Democracia é algo muito mais complexo para ser reduzido na sua dimensão meramente formal-representativa. Seu maior valor está na dimensão substancial, enquanto sistema político-cultural que valoriza o indivíduo em todo feixe de relações que ele mantém com o Estado e com outros indivíduos. É fortalecimento e valorização do débil (no processo penal, o réu), na dimensão substancial do feito.[53: LOPES JUNIOR, Aury, Direito processual penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 320.]
Aury Lopes Junior também afirma que “a decisão dos jurados é absolutamente ilegítima porque carecedora de motivação”, dizendo ser arbitrária, pois seria uma sobreposição do poder sobre a razão.[54: LOPES JUNIOR, Aury, Direito processual penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 320.]
Michel Foucault, na obra Microfísica do Poder, vai muito além sobre o assunto:
Parece-me que não devemos partir da forma do tribunal e perguntar como e em que condições pode haver um tribunal popular, e sim partir da justiça popular, dos atos de justiça popular e perguntar que lugar pode ocupar um tribunal. É preciso se perguntar se esses atos de justiça popular podem ou não se coadunar com a forma de um tribunal. A minha hipótese é que o tribunal não é expressão natural da justiça popular mas, pelo contrário, tem por função histórica reduzi-la, dominá-la, sufoca-la, reinscrevendo-a no interior de instituições características do aparelho de Estado.[55: FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. São Paulo: Graal, 2011. p. 39.]
Há que se consignar que o procedimento intitulado Tribunal do Júri, como já visto, é bastante antigo, para não dizer arcaico, posto que advém da era em que a punição fora tida como castigo de forças superiores.
Ou seja, na antiguidade não havia procedimento formal para apurar a autoria e materialidade de conduta considerada criminosa. Na maioria das vezes, os crimes eram penalizados de imediato, utilizando-se apenas de ordálias, que eram produção de prova por meio da vontade divina, por exemplo, para a confirmação da autoria do delito.
As punições eram traduzidas na retribuição do mal, ou seja, eram impostas penas infames, que atingiam a integridade física do sujeito penalizado, sendo, na maioria, a pena de morte. Sequer havia respeito a princípios como a dignidade da pessoa humana, que, como foi visto, ocorreu posteriormente.
O julgamento por um corpo de jurados, como já foi mencionado neste trabalho, somente ocorreu após a verificação de que, para que um indivíduo fosse apenado, necessitaria de um julgamento do modo mais justo possível, sendo para a época, realizado pelo povo.
Assim, o Tribunal do Júri representou, no ato da sua instituição, um avanço muito grande com relação ao procedimento adotado para a aplicação (ou não) da punição.
Acontece que tal ocorreu em um período muito remoto, não correspondente à realidade atual.
O problema se agrava ao se verificar que vários veículos de comunicação, incluindo os intelectualmente superiores, entendem que o Tribunal do Júri é apenas um procedimento tratado como punição, posto que não atende ao princípio basilar do Estado Democrático de Direito, qual seja a dignidade da pessoa humana.
O princípio da dignidade da pessoa humana foi considerado uma norma garantidora aparecendo na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, elaborado pela Organização das Nações Unidas, em 1945.
A Carta das Nações Unidas de 1945 é o documento mais importante desta época e marca a preocupação das nações com valores como a igualdade, dignidade e a qualidade de vida.
A Organização das Nações Unidas (ONU) foi criada com a assinatura da Carta das Nações e composta, de início, por 51 países, cuja finalidade era a manutenção e melhoria dos níveis de qualidade de vida, ligada diretamente à dignidade da pessoa humana.
Desde a sua criação, a ONU comprometeu-se em promover o crescimento e a melhorar a qualidade de vida, utilizar instituições internacionais para promover o avanço econômico e social, conseguir cooperaçãointernacional necessária para resolver os problemas internacionais de ordem econômica, social, cultural ou de caráter humanitário e promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais de toda população do mundo, sem distinção de raça, religião, sexo, cor ou idioma.
Partindo desse contexto, pode-se dizer que o Tribunal do Júri, de certa forma, é uma afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana, princípio fundamental previsto na Constituição Federal, em seu artigo 1.°, inciso III.
Não parece adequado acusar ou defender uma pessoa em público, a ser julgada por sete jurados, representantes do povo, baseando-se no princípio da íntima convicção, sem que haja a competente fundamentação da decisão, ainda mais quando se trata de crime cometido contra a vida de um indivíduo.
E nem parece digno colocar um acusado em plenário e ressaltar seus erros, sua vida pregressa, conduta e moral perante cidadãos e curiosos, eis que, assim como muitas pessoas criticam o Tribunal do Júri, há aqueles em que vê uma diversão ao assistir o julgamento de um acusado em plenário.
Não se discute, aqui, o fato de que o acusado não deva responder pelo crime cometido, mas sim a forma como ele é colocado perante a sociedade, o modo como ocorre o julgamento.
Sabe-se que todos os atos da justiça são públicos, exceto aqueles em que tramitam em segredo de justiça. No entanto o Tribunal do Júri é muito mais que publicidade. Com este procedimento, expõe-se a intimidade do sujeito acusado.
Note-se que no Tribunal do Júri, especificamente na decisão dos jurados, não há comprovação da culpa do acusado, mas somente a convicção dos jurados. Ou seja, se o Conselho de Sentença por bem entender que o acusado se comporta como inocente, assim o absolverá. De forma contrária, pode o Conselho de Sentença não gostar do aspecto do indiciado e o condenar.
Da mesma forma, pode-se citar a respeito dos debates, em que ocorre uma ebulição de argumentos, aonde quem se expressar melhor acerca dos fatos e vida pregressa do acusado, ganha o voto dos jurados.
Vale salientar, no dizer de Celso Antônio Bandeira de Mello, em seu livro O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade que:
O que se encarece, neste passo, é que a isonomia se consagra como o maior dos princípios garantidores dos direitos individuais. Praeterlegem, a presunção genérica e absoluta é a da igualdade, porque o texto da Constituição o impõe. (...) Daí, o haver-se afirmado que discriminações que decorram de circunstâncias fortuitas, incidentais, conquanto correlacionadas com o tempo ou a época da norma legal, não autorizam a se pretender que a lei almejou desigualar situações e categorias de indivíduos. E se este intento não foi professado inequivocadamente pela lei, embora de modo implícito, é intolerável, injurídica e inconstitucional que qualquer desequiparação que se pretenda.[56: MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 45-46.]
A motivação das decisões judiciais é a parte mais importante de uma sentença ou decisão, pois é nela que o juiz se baseia para apreciar a matéria de fato e de direito contida no processo. Esse embasamento deve existir, pois a ausência do fundamento seria ato arbitrário e, sabe-se que arbitrariedade é um ato não correspondente à lei, fora de regra. A respeito da motivação da decisão, Tercio Sampaio Ferraz Junior escreve que:
O momento da motivação, assim, é, nos julgamentos jurídicos, memória e organização conceitual. Obedece a regras (processuais) e a cânones metódicos. Exige fundamentação e argumentação (momento das razões da motivação), citações, esquemas de raciocínio, usados como um fator em proveito de uma persuasão a ser obtida. Esse momento tem, assim, o sentido de uma forma de poder, que se revela na imposição imperativa da decisão, argumentação como poder persuasivo, cujo resultado imperativo se submete ao controle processual.[57: BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita; BERCOVICI, Gilberto; MELO, Claudineu de. Direitoshumanos, democracia e república. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2009. p 933.]
Outro ponto importante que deve ser observado é a influência da mídia nos crimes considerados como hediondos. Considerada como “quarto poder”, a mídia tem a finalidade de propagar informações acerca de acontecimentos que geram clamor social. Mas, nem tudo o que é informado por ela aconteceu da forma como foi propagada.
Da mesma forma em que a mídia garante a informação e a interação do público com os acontecimentos a nível mundial, ela é conhecida como formadora de opinião. 
Oacir Silva Mascarenhas escreve a respeito do tema na revista Âmbito Jurídico, dizendo que “os meios de comunicação acabam por controlar a sociedade na medida em que estereotipa certas situações, cria mitos, generaliza enfoques, perspectivas e comportamentos diante de um determinado fato ou conflito”.[58: MASCARENHAS, Oacir Silva. A influência da mídia na produção legislativa penal brasileira. Rio Grande, XIII, n. 83, dez. 2010. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/ ?n_link=revista_ artigos_leitura &a rtigo_id=8727&revista_caderno=3>. Acesso em: 01 mai. 2014.]
Dessa forma, tem-se que, pode ocorrer, por parte dos jurados, uma decisão arbitrária, especialmente em casos conhecidos a nível nacional, em que há grande influência da mídia, formando opiniões de pessoas que nem sequer se dará ao trabalho de analisar os fatos como realmente ocorreram e, ainda, pessoas que não tem conhecimento jurídico para entender o caso em questão.
Com relação à quesitação, esta deve ser elaborada de forma que os jurados entendam e saibam responder adequadamente. Pois, pode ser que o jurado não saiba as causas de diminuição de pena, ou a expressão “excludente de ilicitude”, ou outras expressões que poderão fazer parte do questionário, tais como dolo direto, dolo eventual, qualificadora, dentre outras.
Se o Tribunal Popular é uma garantia fundamental do acusado, poderia este não querer ser julgado perante o Conselho de Sentença, mas sim pelo juiz togado. Pois, ao que parece, as decisões proferidas pelos jurados, sem fundamentação, sem embasamento nas provas dos autos, tem mais chance de ser equivocada do que àquela proferida por um operador do direito.
O Tribunal do Júri deve ser adequado aos princípios constitucionais vigentes, havendo de ser, além disso, adequado à realidade do sistema jurídico do país. Ora, se se defende enunciados básicos, como por exemplo, a dignidade da pessoa humana, não há que se falar em exposição da intimidade, dos adjetivos, ou seja, de caracteres que só dizem respeito ao acusado.
Neste contexto, observa-se que o Tribunal do Júri afeta diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana, tendo em vista a forma como é realizado o julgamento em plenário, exaltando os defeitos e qualidades de uma pessoa colocada como sendo o centro de atenções das partes, dos jurados e dos curiosos.
Sabe-se que pode haver mudança nas cláusulas pétreas, desde que não seja prejudicial. Dessa forma, para melhorar esse modo de julgamento, o correto seria que o juiz togado proferisse sentença, de modo a fundamentar a melhor escolha para o acusado, possibilitando, ainda, a aplicação do princípio do in dubio pro reo, eis que na segunda fase do Tribunal do Júri não há necessidade de se verificar os indícios de autoria a que o juiz está adstrito para proferir a decisão de pronúncia.
Dessa forma e, tendo em vista que o artigo 1.°, inciso III da Constituição Federal sagra o principio da dignidade da pessoa humana como fundamento da República, percebe-se que há um conflito entre os princípios constitucionais.
Em primeiro lugar, a dignidade está relacionada com a própria pessoa, de forma que todos devem ser respeitados e tratados com igualdade perante os iguais. Portanto, não há que se falar em um acusado de um crime comum ser julgado perante o juiz togado e aquele que pratica um crime contra a vida ser julgado perante um Conselho de Sentença formado por

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