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UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 1 FILOSOFIA UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 2 SUMÁRIO PÀG. I – INTRODUÇÃO 01 1.1. Qual é a “utilidade” da filosofia? 01 1.2. As origens do pensamento filosófico 02 1.3. A Cosmologia dos Pré-socráticos 02 II – OS SOFISTAS 04 2.1. Sócrates 05 2.2. Platão 05 2.3. Aristóteles 06 III - OS FILOSÓFOS MODERNOS E A TEORIA DO CONHECIMENTO 07 3.1. O racionalismo 08 3.2. O empirismo 09 3.3. O criticismo de Kant 11 IV - PENSAMENTO E LINGUAGEM 11 4.1. O que e Linguagem 11 V – A FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA 12 5.1. Século XIX 12 5.2. O século XX 15 VI - AS DISCIPLINAS FILOSÓFICAS 17 6.1. A Metafísica 17 6.2. Epistemologia 19 6.3. Ética 21 VII - FILOSOFIA SOCIAL E POLÍTICA 23 VIII - ESTÉTICA 24 IX - DIMENSÃO PEDAGÓGICA DA FILOSOFIA 25 9.1. Abordagem Filosófica, Metafísica e Epistemológica da Formação da Pessoa 26 X - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 28 UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 3 Parabéns! Você optou por fazer um curso na modalidade a distância, um processo diferente da modalidade presencial. Se este é seu primeiro contato com a filosofia, você certamente estará se fazendo a pergunta - O que é a filosofia? Se não é seu primeiro contato, você provavelmente já se deu conta de que esta não é uma das perguntas mais fáceis de serem respondidas. No processo educativo, se pensássemos a filosofia como um instrumento de desenvolvimento de nossa capacidade argumentativa isto já justificaria sua importância e relevância. Se pensarmos a reflexão filosófica apenas como treinamento lógico do pensar, estaremos desvirtuando a filosofia e toda sua história de interação e interesse pelo processo educacional. I - INTRODUÇÃO Há uma pergunta que muitos se fazem quando ouve falar de filosofia: que utilidade tem a filosofia? A filosofia, por mais que ignoremos tem exercido uma admirável influência até mesmo sobre a vida de gente que nunca ouviu falar nela. Indiretamente, tem sido destilada através de sermões, da literatura, dos jornais e da tradição oral, afetando assim toda a perspectiva geral do mundo. Você sabe qual a etimologia da filosofia? Pitágoras (séc. VI .a.C.) - também conhecido como matemático – usou pela primeira vez a palavra filosofia (philos-sophia), que significa “amor à sabedoria”. É bom observar que a própria etimologia mostra que a filosofia não é puro logos, pura razão: ela é a procura amorosa da verdade. A filosofia propriamente dita tem condições de surgir no momento em que esse pensar é posto em causa, tornando-se objeto de uma reflexão. Examinando a palavra reflexão temos diversos significados: refletir é retomar o próprio pensamento, pensar o já pensado, voltar para si mesmo e colocar em questão o que já se conhece. 1.1. Qual é a “utilidade” da filosofia? Para responder a essa questão, gostaria de saber o que você entende por utilidade? A utilidade da filosofia está no fato de que ela, por meio da reflexão permite que o homem tenha mais que uma dimensão. A filosofia é a possibilidade de transcendência humana, a capacidade que só o homem tem de superar a sua imanência (situação dada e não escolhida). Pela transcendência o homem surge como um ser de projeto, capaz de construir o seu destino, capaz de liberdade. A filosofia recupera o processo perdido no imobilismo das coisas feitas (mortas porque já ultrapassadas). A filosofia impede a estagnação. Por isso o filosofar sempre se confronta com o poder, UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 4 não devendo sua investigação estar alheia à ética e à política. A filosofia é a crítica da ideologia. Atentando para a etimologia grega correspondente à verdade, observamos que a verdade é pôr a nu aquilo que estava escondido, e aí reside a vocação do filósofo: o desvelamento do que está encoberto pelo costume, pelo convencional, pelo poder. Finalmente, a filosofia exige coragem. Filosofar não é um exercício puramente intelectual. Descobrir a verdade é ter a coragem de enfrentar as formas estagnadas do poder que tentam manter o status quo, é aceitar o desafio da mudança. Saber para transformar. Em conversa com seus amigos, você disse que está estudando Filosofia. Mal acabou de falar e logo perguntaram: “O que é filosofia?” E agora, o que você irá responder? 1.2. As origens do pensamento filosófico. A filosofia ocidental nasceu na Grécia, entre os séculos VII e VI a.C., com uma preocupação em responder à questão da ordem do universo (cosmos). Este momento da história do pensamento é usualmente chamado de passagem do mito ao logos. Esta expressão pode gerar alguns mal-entendidos em função de seus termos principais: mito e logos. Veja, então, o que significa cada um: Mito – São explicações que se caracterizam por fazer referências a entidades sobrenaturais como sendo as responsáveis pelos fenômenos da natureza. Logos - O termo “logos”, em grego, significa razão, linguagem, ciência. Dentre os mal- entendidos comuns, pode-se destacar a suposição de que a passagem do “mito” ao “logos” se deu de maneira definitiva, com o abandono total de referências sobrenaturais, assim como achar que a explicação filosófica é dotada de razão, ao passo que o mito seria destituído dela (REALE e ANTISERI,1990). A escrita, que surgiu neste período, teve um papel importante nesta passagem, pois o que antes era apenas contado pela tradição oral, passou a ser escrito. Modificando, assim, o pensamento e o homem. 1.3. A Cosmologia dos Pré-socráticos. Os filósofos Pré-socráticos aparecem entre os séculos VII e VI a.C. em todas as colônias gregas que se espalham pela a costa do Mediterrâneo, principalmente na Ásia Menor. A preocupação destes primeiros pensadores era descobrir o princípio que explicasse sua existência e ordem. Por isso foram chamados “filósofos da natureza”. Do pouco que sobrou dos escritos do pensamento filosófico destes, nota-se que está permeado de mito (religião), pois seus argumentos são apresentados como verdade revelada pelos deuses. Suas explicações não fazem referência aos deuses como UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 5 sendo a causa única dos acontecimentos deste mundo. Os filósofos Pré-socráticos começam a indicar inúmeros princípios e causas físicas ou abstratas, que em alguns casos explicam não somente o mundo, mas também os deuses como parte dessa mesma estrutura. É neste período que surge o interesse pelo mundo e pelo significado da própria existência, como demonstra os pensadores destacados a seguir: Tales de Mileto (sécs. VII-VI a.C.) - Ele achava que a origem de todas as coisas seria a água. Não sabemos o que exatamente ele queria dizer com isso, mas devia estar convencido de que toda forma de vida teria se originado da água - para onde retorna quando se dissolve. Tales viajou por várias regiões, inclusive o Egito, onde, segundo consta, calculou a altura de uma pirâmide a partir da proporção entre sua própria altura e o comprimento de sua sombra: essa proporção é a mesma que existe entre a altura da pirâmide e o comprimento da sombra desta. Esse cálculo exprime o que, na geometria, até hoje se conhece como teorema de Tales. Anaximandro de Mileto (sécs. VII-VI a.C.) - Ele achava que nosso mundo seria apenas um entre uma infinidade de mundos que evoluiriam e se dissolveriam em algo que elechamou de ilimitado ou infinito. Não é fácil explicar o que ele queria dizer com isso, mas parece claro que Anaximandro não estava pensando em uma substância conhecida, tal como Tales concebeu. Talvez tenha querido dizer que a substância que gera todas as coisas deveria ser algo diferente das coisas criadas. Urna vez que todas as coisas criadas são limitadas, aquilo que vem antes ou depois delas teria de ser ilimitado. É evidente que esse elemento básico não poderia ser algo tão comum como a água. Anaxímenes de Mileto (séc. VI a.C.) - Ele pensava que a origem de todas as coisas teria de ser o ar ou o vapor. Anaxímenes conhecia, claro, a teoria da água de Tales. Mas de onde vem a água? Anaxímenes acreditava que a água seria ar condensado. Acreditava também que o fogo seria ar rarefeito. De acordo com Anaxímenes, o ar constituiria a origem da terra, da água e do fogo. Pitágoras de Samos (cerca de 530 a.C. até início do séc. V a.C.), grande matemático da Antigüidade, é o primeiro a usar o termo filósofo, pois, uma vez indicado como sábio (sophos), teria respondido que apenas era um "amante da sabedoria" (philo, "aquele que ama", sophia, "sabedoria"); desenvolveu uma teoria filosófica baseada na idéia de que tudo é composto de números – entendidos por ele como pequenas partículas materiais – e a ordem do universo é derivada de harmonias geométricas. Xenófanes de Cólofon (c. 570 a.C.) foi grande crítico da concepção popular e tradicional dos deuses. Tinha como fonte as obras de Homero, crítica esta que reaparecerá mais tarde na República de Platão. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 6 Heráclito de Éfeso (sécs. VI-V a.C.) defendeu a idéia de que tudo é um fluxo contínuo gerado por uma guerra eterna entre os contrários; nada permanece o mesmo e tudo é e não é ao mesmo tempo. Parmênides de Eléia (sécs. VI-V a.C.) criticou a visão de Heráclito e seus seguidores afirmando que somente a razão poderia fornecer o conhecimento do que é a natureza; para ele, os sentidos percebem o fluxo contínuo do mundo, mas somente a razão pode mostrar que por trás de tudo que muda está o imutável, o perfeito e eterno, isto é, o ser. Zenão de Eléia (sécs. VI-V a.C.) foi discípulo de Parmênides e desenvolveu uma série de paradoxos (argumentos que levam a sua própria contradição) sobre a existência do movimento. Empédocles de Agrigento (484/481- 424/421 a.C.) se referiu aos quatro elementos (água, terra, fogo e ar) como os responsáveis pela composição de tudo. Anaxágoras de Clazômenas (c. 500-428 a.C.) dizia que tudo na natureza é composto de sementes que determinam sua geração e vida. Leucipo de Mileto e seu discípulo Demócrito de Abdera (séc. V a.C.) criaram a idéia de átomo; acreditavam que tudo é composto de pequenas partículas indivisíveis que se unem e se separam continuamente formando todas as coisas (KIRK e RAVEN, 1982). A teoria atômica atual é muito semelhante a de Demócrito, a natureza é composta de diferentes átomos que se juntam para criar, se separam e voltam a se reunir para criar novas coisas. A ciência descobriu que os átomos podem ser divididos em partículas menores chamadas de PRÓTONS, NÊUTRONS e ELÉTRONS. Demócrito não teve acesso aos aparelhos eletrônicos de nossa época. Sua única ferramenta foi a razão, esta lhe dizia que “nada surge do nada e nada desaparece, então a natureza tende ser composta por pecinhas minúsculas que se combinam e depois se separam”. II – OS SOFISTAS A palavra SOFISTA, originalmente, significa "especialista do saber". Mas este termo adquiriu uma conotação negativa após a crítica e o ataque ferrenho que receberam de Sócrates, Platão e Aristóteles. O século V a.C., uma série de transformações sociais ocorreu no mundo grego, em especial nas grandes cidades. O poder da aristocracia diminui após uma série de reformas sociais que entregam parte considerável do poder político ao "demo", o povo. Atenas torna-se uma democracia e, como grande centro cultural da época, passa a atrair, como as demais cidades, um grande número de estrangeiros. Um grupo de pensadores e professores se torna importante nesse período, pois modificaram a perspectiva do UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 7 pensamento que até então se centrava na questão sobre a natureza, a chamada questão cosmológica, e se deslocou para a questão antropológica, a questão sobre o homem e tudo que o envolve. Segundo Guthrie (1995), os sofistas além de serem responsáveis por essa virada na percepção do pensamento, foram responsáveis por: � difundir e desenvolver a idéia do ensino com todos os professores remunerados; � estabelecer através do nomadismo (viajem de cidade a cidade) uma perspectiva cultural ampla; � despertar o interesse pela linguagem, consolidar um espírito de liberdade de pensamento e revalorização da lógica. 2.1. Sócrates Era ateniense, filho de um escultor e uma parteira. Embora não tenha fundado escola ele ensinava em locais públicos ou em qualquer um outro lugar que pudesse empreender conversação sobre os mais diversos temas. Causou forte impressão sobre a juventude ateniense e os mais diversos tipos de pessoas, o que o levou a ter um grande número de inimizades. Sócrates nunca escreveu suas idéias, pois acreditava que a verdade devia ser atingida através do diálogo. Seu primeiro pensamento tinha ligações com a filosofia naturalista, mas após o contato com os mestres sofistas, voltou-se para a questão do homem e do conhecimento. Sócrates investigava a natureza humana, enquanto os Pré-socráticos investigavam questões cosmológicas. Para Sócrates, o homem se definia em função de sua alma (psyché) e não de seu corpo. No pensamento de Sócrates, as virtudes se designavam na atividade que propicia o desenvolvimento do intelecto, da alma. Ele defendia a idéia de que o mal era fruto da ignorância e que o conhecimento levava ao bem, propiciador da verdade e do aprimoramento espiritual. Ao ser condenado a morte, não se revolta. Acreditava na imortalidade da alma humana, compreendia a filosofia como uma preparação para a morte, uma vez que esta propiciava o aprimoramento do espírito, em detrimento da satisfação corporal. Preparada, a alma se livra do corpo e passa a viver em um mundo livre da matéria (PLATÃO, 1972). Uma importante crítica de Sócrates em relação aos sofistas, era o método de ensino remunerado. Sócrates acreditava que todos possuíam já dentro de si a verdade eterna e única e o conhecimento não era adquirido, e sim, lembrado. Como nada escreveu, o pensamento de Sócrates pode ser percebido dentro dos escritos de seus discípulos, que sobre ele escreveram apresentando visões diversas e desenvolvendo escolas filosóficas de inspiração socrática. O seu principal discípulo foi Platão, que escrevia diálogos nos quais Sócrates era sempre seu personagem principal. Muitas vezes, residia a dificuldade de diferenciar o que era pensamento de Sócrates e o que é era pensamento de Platão. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 8 2.2. Platão Platão, cujo verdadeiro nome era Aristoclés, era cidadão ateniense de família aristocrática descendente de Sólon, o legislador. Tornou-se discípulo de Sócrates por volta dos vinte anos. Essa convivência transformou sua vida e pensamento. Após a morte do mestre, empreende em viagens para Grécia, Itália e Egito. Em 387 a.C., funda sua escola em Atenas, a Academia. Sua escola se tornou uma revolução no ensino e pólo de atração de alunos e pensadores. Platão assumiu as idéias de seu mestre, Sócrates, incorporando a elas, as suas, a ponto demuitas vezes dificultar a diferenciação das idéias de um e do outro. Sua principal inovação foi a defesa da existência de um mundo das idéias/formas. Na busca do verdadeiro conhecimento, Platão distingue a episteme (conhecimento) da doxa (opinião). Na episteme se tem o conhecimento verdadeiro e confiável, em contrapartida, na doxa, o mutável e inconsistente. Como Platão assume a posição socrática de inferioridade da matéria - que é amorfa (sem forma) e só possui determinação por que é limitada pelas formas/idéias -, a alma é o elemento eterno e perfeito aprisionado no corpo e que teve sua origem no mundo das idéias. A alma é imortal, mas precisa se aprimorar por um processo contínuo de reencarnação (metempsicose). No diálogo "Fédon", Platão defende a idéia socrática da eternidade da alma em contraposição às crenças contrárias e nega a ligação indissociável entre corpo e alma. Há no pensamento de Platão a identificação entre a virtude e o conhecimento; o mal é resultado da ignorância e o bem equivale ao conhecer. Em sua interpretação do mundo social, Platão via com desconfiança a democracia, uma vez que foi nesse sistema de governo que Sócrates foi condenado à morte. A sociedade ideal de Platão possuía três estratos: trabalhadores, guerreiros e magistrados, cada um deles composto por indivíduos que já nasciam com um tipo de alma com a predisposição a um dos tipos de atividade. 2.3. Aristóteles Aristóteles nasceu em Estagira, na Trácia, região da Macedônia. Seu pai foi médico da corte do rei Amintas, da Macedônia, pai de Filipe e avô de Alexandre, o Grande. Em 366 a.C., Aristóteles entra para a Academia de Platão e lá permanece por vinte anos, só se retirando após a morte do mestre. Enquanto esteve na Academia, Aristóteles conheceu uma série de sábios que ali estavam. Em 343 a.C., se torna preceptor de Alexandre, o Grande - na época com treze anos. Após a subida ao trono de Alexandre (336 a.C.), Aristóteles volta a Atenas e funda sua escola, próxima ao templo dedicado a Apolo Lício, daí o nome de "Liceu", pelo qual a escola era conhecida. Também chamada "escola peripatética", pois suas aulas em meio aos jardins eram comuns (perípatos, "passeio"). Até 323 a.C., ano da morte de Alexandre UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 9 e início da reação antimacedônica em Atenas, o Liceu se tornou um grande centro de produção filosófica e científica, chegando a relegar a segundo plano a Academia. Curiosamente, a mesma acusação feita a Sócrates, de impiedade, foi dirigida a Aristóteles. Esse vai para Cálcis e deixa Teofrasto no comando do Liceu. Morre poucos meses depois, em 322 a.C. Aristóteles foi dotado de mente enciclopédica, leu e escreveu sobre os mais diversos temas, alguns hoje pertencentes às ciências naturais e humanas. Foi o primeiro sistematizador da lógica clássica e seus princípios; estudou os argumentos, seus tipos, falhas, sua composição, sua relação com o raciocínio, etc. Uma das grandes diferenças entre o pensamento de Aristóteles e de seu mestre Platão, foi a crítica e recusa da existência do "mundo das idéias". Para Aristóteles, as idéias não se encontram em um mundo em separado; as idéias são produto da abstração que a mente faz do que é percebido pelos sentidos. Aristóteles desenvolve a física e a metafísica iniciadas pelos pré-socráticos. Determina a análise do mundo pelo que ele tem de geral, desenvolvendo os conceitos de causa (material, formal, eficiente, final), substância, acidentes, ato, potência, etc. Dentro de sua perspectiva, o ser humano é definido como uma composição de matéria e forma, onde seu corpo é a matéria e sua alma é sua forma. A alma é princípio de vida e qualquer ser vivo possui um tipo de alma. Só o ser humano tem alma intelectiva, responsável por sua capacidade racional. Todos os indivíduos desejam a felicidade, compreendida das mais diversas formas, mas apenas o desenvolvimento do intelecto e das virtudes propicia a máxima felicidade, o que não caracteriza um desprezo aos aspectos corporais, pois, para Aristóteles, as necessidades materiais têm de ser satisfeitas para atingirmos a contemplação. O ser humano é um animal racional, mas também é um animal político, social; o ser humano só consegue sobreviver em grupo e é nele que desenvolve sua potencialidade. As teorias de Platão e Aristóteles fundamentaram debates durante muitos séculos e somente a partir da filosofia moderna de Descartes (1596-1650) que surge uma nova metodologia com o intuito de resolver os temas da metafísica antiga e medieval. A partir dos conteúdos estudados, faça um quadro comparativo; entre as teorias de Platão e Aristóteles, identificando pontos de convergência e divergência. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 10 III - OS FILOSÓFOS MODERNOS E A TEORIA DO CONHECIMENTO O que é o conhecimento? Ele é possível? Quais são os seus limites? Existem regras para a obtenção de conhecimento verdadeiro? Estas eram algumas questões que ocupavam o pensamento filosófico na modernidade. A partir do século XIV, uma mudança na civilização européia começa a se processar. Esse processo de mudança de visão de mundo resultou no fim da Idade Média, convencionalmente determinado pelos historiadores em 1453, com a queda de Constantinopla pelos turcos. Com a expulsão dos árabes da península ibérica inicia-se a constituição dos Estados nacionais europeus, o que é a superação do sistema feudal, com seu poder político desagregado. A filosofia desvincula-se da teologia e o problema central do período medieval – Deus – é substituído por problemas do conhecimento, que se tornam as questões centrais do pensamento moderno. As descobertas de novas terras e o aparecimento dos Estados - ampliam a percepção cultural do homem moderno. As relações pessoais são relegadas a um plano secundário. As relações com Deus, intermediadas pela Igreja, passam a ser contestadas. Essas mudanças têm agora a imprensa para ajudar a propagação. O indivíduo é agora o cerne das perspectivas econômica, científica e religiosa. Em uma situação de mudança, onde a posição da pessoa já não está garantida, a desconfiança para com a tradição se torna a tônica dominante. A dúvida e a posição filosófica que a acompanha, o ceticismo, se tornam o substrato do mundo moderno. As grandes linhas de pensamento que tentam responder a pergunta do conhecimento no Período Moderno são duas: o racionalismo e o empirismo. A primeira tem como característica privilegiar a razão em detrimento das percepções sensoriais, que são vistas como responsáveis pelo erro e pelo engano. Ao contrário, o empirismo defende a idéia de que todo conhecimento humano tem origem na percepção sensível, não existindo idéias inatas, como era crença dos racionalistas. 3.1. O racionalismo Com a frase “se duvido, é porque penso, e se penso, existo” René Descartes, o principal pensador do racionalismo, filósofo e matemático (1596-1650). Nascido em La Haye, em uma família de posses – seu pai era magistrado da Bretanha - cedo perdeu a mãe e passou a ser criado por uma ama, UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 11 sem a presença do pai, que se mantinha ausente por muito tempo. Já maior, foi mandado para o principal colégio da Europa, La Fleche, dirigido por jesuítas. Lá mantinha o hábito da infância de acordar sempre perto do meio-dia. Apesar do horário flexível, Descartes desenvolveu uma mente que seria uma das mais férteis da modernidade. Em 1612, cansado da vida na escola e do que havia aprendidoali, parte para conseguir o conhecimento que pretendia, não mais nos livros, mas no mundo. Foi acusado de ateísmo, o que negou, mas acabou sendo preso, depois de inúmeras disputas teóricas. Manteve correspondência com diversas personalidades políticas e intelectuais de sua época. Essa fama levou com que a rainha Cristina, da Suécia, o convidasse para lá viver e fundar a "Academia de Ciências". O clima do país não lhe foi favorável além de ter que dar aulas na corte, no início da manhã em um rigoroso inverno sueco fez com que ele falecesse de pneumonia em 1650. Descartes, em sua procura pelo ponto de partida que garantiria o conhecimento correto, começa um processo de dúvida que tinha como objetivo descartar qualquer coisa que pudesse ser objetável; é o que se convencionou chamar "dúvida metódica", pois era apenas um caminho para a certeza, não uma desconfiança quanto às possibilidades do conhecimento humano. A certeza absoluta a que Descartes chega é a constatação da própria existência como ser pensante (res cogitans), o que traduziu em sua frase mais famosa: se duvido, é porque penso, e se penso, existo (cogito ergo sum). Descartes, em sua filosofia, distingue duas substâncias no mundo: a res cogitans , "a coisa pensante" (alma), e a res extensa, "a coisa extensa" (matéria). O mundo (matéria) é regido por leis mecanicistas. A alma não é regida por essas leis, as relações entre corpo e alma são apenas ocasionais, pois não se influenciam mutuamente. Outros grandes representantes do racionalismo foram: � Blaise Pascal (1623-1662) - filósofo, matemático e físico, que chamou a atenção para os limites da racionalidade ao admitir que "o coração tem razões que a própria razão desconhece"; � Baruch Spinoza (1632-1677) - o ser é uno: a substância ou Natureza: Deus é a própria ordem geométrica necessária a tudo. Espinosa elimina o dualismo cartesiano:a essência das coisas é uma. � Gottfried Wilhelm Leibniz (1646- 1716) - faz parte da tradição racionalista, mas advoga a impossibilidade da comunicação entre as substâncias, defendendo o paralelismo, isto é, mente e corpo não interagem, mas têm comportamentos correlatos. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 12 3.2. O empirismo “A mente é uma tabula rasa” John Locke O empirismo é característico do período moderno, onde empreende uma crítica à filosofia racionalista e às possibilidades de um conhecimento metafísico nos moldes da filosofia antiga e medieval. Dentre os principais pensadores do empirismo destacam-se: � Francis Bacon (1561-1626) - revaloriza a observação e o raciocínio indutivo como produtores de conhecimento científico. � Thomas Hobbes (1588-1679) - defende que apenas existe a substância material, ou seja, aquilo que pode ser percebido pela mente humana através dos sentidos. Esse ser material, (homem), tem como traço natural o egoísmo. Seu estado natural é o da "guerra de todos contra todos", mas sua racionalidade faz ver que a existência da sociedade lhe propiciaria uma vida mais longa e segura. Entrega, após um contrato natural tácito, seus direitos naturais nas mãos de um poder soberano, que passa a exercê-los de maneira despótica para garantir a existência da sociedade e a preservação de seus membros (HOBBES, 1979). � John Locke (1632-1704) – para ele as idéias inatas não existem; todas são derivadas da experiência sensível. Para ele “a mente é uma tabula rasa”. Da mesma maneira que Hobbes, Locke é um contratualista, mas não acredita que em estado natural a situação seja a de guerra de todos contra todos. Para Locke as pessoas decidem pela própria condição racional, por estabelecer um pacto implícito para a constituição da sociedade, e que ao ceder parte de seus direitos para o governo, essa cessão não é incondicional; se o governante não prestar contas de suas obrigações para com aqueles de onde emana seu poder, pode perder a representatividade, ser destituído e substituído. Locke é o grande teórico da democracia representativa. � George Berkeley (1685-1753) - Para Berkeley, existir é estar na consciência; ser é ser percebido (esse est percipi). Para ele a existência da matéria e o nosso conhecimento se resumem às imagens que temos em nossas mentes (imagens produzidas por nossos sentidos), embora não havendo certeza de que correspondem ao que os objetos são realmente; em outras palavras, não temos acesso ao que as coisas são em si mesmas. Segundo o bispo irlandês, o que garante que as coisas existem, mesmo quando não as percebemos, é o fato de tudo estar na mente de Deus, ser percebido por Deus (BERKELEY, 1980). � David Hume (1711-1776) - o maior nome do empirismo moderno. David Hume foi um dos primeiros filósofos a advogar explicitamente o ateísmo e sofreu as conseqüências de sua posição. Almejou uma cadeira de professor, o que nunca conseguiu, foi assistente de diversos personagens importantes de sua época e desejou profundamente ser reconhecido, em vida, por suas idéias como filósofo, mas isso não aconteceu. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 13 Hume, como os demais empiristas, defendia que a única fonte de idéias em nossa mente eram os sentidos. Aquelas percepções mais próximas no tempo e no espaço formam as impressões, que possuem mais força e vivacidade. Quando essas impressões não possuem mais as percepções para lhes garantir a força, se tornam idéias guardadas na memória, mais fracas e tênues. Além disso, a mente humana liga idéias vindas da percepção e cria seres imaginários. A alma humana é apenas o conjunto dessas impressões e idéias e, uma vez que cessa a atividade dos sentidos, cessa a alma. Para Hume, nossa mente estabelece uma relação que não está no fato em si, mas apenas na nossa disposição em vê-los assim. Todo conhecimento é conjetural, uma interpretação que a mente humana realiza sobre os fenômenos individuais que observa. Alguns iluministas franceses foram influenciados pelo pensamento empírico, em especial, as idéias políticas. Os iluministas criam no poder da razão humana como solução para os problemas do homem e da sociedade; empenharam- se em defender a universalização do saber - é o caso da elaboração da "enciclopédia" por D'Alembert e Diderot -; criticaram o absolutismo; veneravam a ciência como a expressão máxima da verdade; criticaram a tradição; eram otimistas utópicos que acreditavam no progresso irreversível da humanidade. � Jean-Jacques Rousseau (1712- 1778) foi, ao mesmo tempo, iluminista e precursor do romantismo. Pregava, dentro do espírito romântico, uma volta à natureza e uma crítica ao progresso científico e técnico. Como você estudou, Razão e Sentidos travam uma batalha no século XVII. Nesta batalha não houve um vencedor, mas sim vencedores. Muitas outras linhas de pensamento tiveram ali, a sua origem. 3.3. O criticismo de Kant Criador de um dos mais importantes sistemas filosóficos do século XVIII, Immanuel Kant (1724-1804) nasceu em Königsberg, de família humilde pertencente à seita protestante pietista, de grande rigor religioso. A figura da mãe foi de enorme influência na vida do pensador; mulher de pouca cultura formal, Regina Reuter instigou o comportamento reto e a admiração ao saber que Kant levaria por toda sua vida. Estudou na universidade da cidade natal, onde se formou em 1747, ano no qual teve que interromper os estudos de titulação que lhe fariam professor universitário em razão da necessidade de sobreviver. Somente em 1755, alcança o doutorado e ser livre-docente na Universidade de Königsberg. O período na livre docência também não foi fácil. Entre 1770 e 1781, Kantpreparou seu sistema filosófico, o que culminou com o aparecimento de sua grande obra, Crítica da Razão Pura (1781), a primeira das UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 14 críticas a que se seguem, Crítica da Razão Prática (1788) e Crítica do Juízo (1790). Em 1794, Kant é proibido de expressar suas opiniões sobre a religião; não se retrata, mas não aborda mais o assunto. Morre em 1804. Segundo Kant, a intuição sensível nos fornece os fenômenos indeterminados, o que por si mesmo não constitui conhecimento, dado serem percepções específicas sem traços de universalidade e necessidade. O conhecimento somente se constitui pela organização dos dados da intuição sensível por um elemento a priori que lhes dá forma e ordem. Esta estrutura racional ordenadora é uma lógica do entendimento e é vazia em si mesma, sem conteúdo. Sua função é objetivar o dado sensorial fornecendo a síntese (união) entre o particular sensorial e a universalidade da estrutura a priori que permite a própria constituição do conhecimento. Tanto espaço e tempo – formas a priori da intuição sensível que ordenam os fenômenos percebidos – quanto as categorias – conceitos puros que permitem a ligação dos fenômenos – constituem, ao mesmo tempo, o modo próprio daquele que conhece e o objeto conhecido. Os principais objetos de estudo da metafísica são Deus, a alma e a liberdade; esses objetos não podem ser conhecidos pela razão, pois estão além de seus limites (KANT, 1985). A conclusão de que Deus não pode ser conhecido pela razão humana, sem nenhuma referência ao mundo da experiência, não fez Kant, um crente fervoroso, renunciar suas crenças. Kant, quanto ao critério de ação, elaborou uma ética de cunho formal. A ação só deve ser realizada se for possível imaginá-la universal, pois isso determina o que é bom em si mesmo e não é apenas agradável. "Age sempre de maneira que fosse seu desejo que todos assim o fizessem"; essa é a máxima de Kant, o imperativo categórico (KANT, 2002). IV - PENSAMENTO E LINGUAGEM 4.1. O que é Linguagem A linguagem é um dos principais instrumentos na formação do mundo cultural, é através dela que transcendemos a nossa experiência. Quando damos nome a um objeto da natureza, nós o individualizamos, o diferenciamos do restante que o cerca; ele passa a existir para a nossa consciência. Com esse simples ato de nomear, distanciamos-nos da inteligência concreta animal e entramos no mundo do simbólico. O nome é símbolo dos objetos que existem no mundo natural e das entidades abstratas (existem somente no nosso pensamento), por exemplo, ações, estados ou qualidades como tristeza, beleza, (liberdade). A linguagem pode ser definida como um sistema simbólico, sendo o homem o único animal capaz de criar símbolos, ou seja, signos arbitrários em relação ao objeto que representam e, por isso mesmo, convencionados, ou seja, dependentes de UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 15 aceitação social. V – A FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA A filosofia contemporânea corresponde ao pensamento produzido a partir do século XIX. Uma série de acontecimentos políticos determinam essa época: a Revolução Francesa; a independência dos países latino-americanos no século XIX e dos países africanos e asiáticos no século XX; o colonialismo tardio no séc. XIX e seu declínio no séc. XX; a ascensão e posterior queda do poderio europeu no mundo; duas guerras mundiais; o período de bipolarização política entre Estados Unidos e União Soviética; o crescente e cada vez mais forte processo de interdependência mundial chamado por alguns de "globalização" e por outros de "mundialização"; massificação de diversos traços culturais, além de uma perspectiva, cada vez mais forte, de tendências fundamentalistas em questões religiosas. Vejamos agora, as principais escolas filosóficas contemporâneas e alguns de seus representantes: � o materialismo dialético (Marx, Engels); � o existencialismo (Kierkegaard, Sartre); � o positivismo (Comte, Stuart Mill); � a fenomenologia (Husserl, Heidegger); � o pragmatismo (Peirce, James); � o positivismo lógico (Carnap); � a filosofia analítica de linguagem artificial (Wittgenstein, Ayer) e de linguagem ordinária (Wittgenstein, Austin); � o neotomismo (Maritain, Gilson); � o neomarxismo ou Escola de Frankfurt (Adorno, Habermas). Para que você possa melhor assimilar as grandes perspectivas filosóficas, o não-dogmatismo e a diversidade do pensamento contemporâneo, organizamos os principais pensadores por século. 5.1. Século XIX Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770- 1830) foi o principal representante do idealismo alemão. Hegel criticava a idéia de Kant segundo a qual temos acesso ao fenômeno, mas não temos acesso ao númeno, a coisa em si. Para Hegel, não podemos nem mesmo afirmar a existência da coisa em si; nosso conhecimento se resume às idéias em nossa mente, em nossa consciência. Na filosofia de Hegel tudo que é racional é real e tudo que é real é racional, isto é, não há separação, como em Kant, das esferas teórica e prática. Há uma identidade entre o pensamento e a realidade; as regras do pensar são também as regras do mundo. Essas regras são regidas pelo princípio de contradição, que afirma que nada é idêntico a si mesmo e tudo se subordina à afirmação e à negação; UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 16 é a dialética hegeliana que se mostra como princípio de ordenação do mundo material, da história da humanidade e, principalmente, como processo pelo qual o Espírito (Deus) se desenvolve e se mostra. Assim, Hegel vê sua época - em todos os seus aspectos econômicos, políticos, religiosos, artísticos, científicos e filosóficos - como o momento de culminância do processo dialético de desenvolvimento do Espírito; dessa posição, Hegel advogava o "fim da história", no sentido de que a partir de então, nada mais haveria de relevante a ser revelado. Coincidentemente ou não, sua filosofia foi o último sistema filosófico da história produzido por um único pensador (REALE e ANTISERI, 1990). Hegel teve seus críticos ferrenhos, que em especial discordaram da subordinação do indivíduo ao todo, ao universal. Arthur Schopenhauer (1788-1860) afirmava a predominância da vontade sobre a realidade. Filósofo pessimista, afirmava que tudo o que é tido como bom, belo e agradável não passa de ilusão, por isso nunca atingimos a felicidade. Outro crítico da época, foi o dinamarquês Sören Kierkegaard (1813-1855), considerado o pai do existencialismo. No pensamento do dinamarquês não há essência do ser humano; ela é construção existencial de cada indivíduo, que faz a si mesmo durante sua vida. Extremamente religioso e crítico da estrutura da Igreja Luterana da Dinamarca - Kierkegaard a acusava de ter traído o espírito do Cristianismo ao se aliar à teologia de cunho hegeliano, o filósofo percebeu o quanto a posição única da existência do indivíduo causa angústia e desespero. A solução seria o salto no absurdo da fé, que possui princípios incompreensíveis à razão (KIERKEGAARD, 1979). Crítico tardio de Hegel e de Schopenhauer, Friedrich Nietzsche (1844-1900) é um dos pensadores mais instigadores da atualidade. Apesar de alemão, Nietzsche foi crítico da cultura germânica e da religião, em especial da cristã. Seus escritos não possuem estilo sistemático argumentativo. Os homens fracos e incapazes se defendem frente àqueles que são superiores por meio de duas armas poderosas: a moral e a religião. Assim como todas as grandes religiões, o Cristianismo prega uma moral de cordeiros onde os medíocres(a maioria das pessoas) oprimem aos superiores; os pobres, fracos e humildes merecem tudo e aos fortes, orgulhosos e aristocráticos é reservada a condenação. Nietzsche prega o advento do super-homem, aquele que é senhor de sua própria vontade, criador de sua própria moral. Uma vez que "Deus está morto", somente aquele que é superior aos demais tem a capacidade de assumir sua vontade, até então aprisionada. Esse homem está "além do bem e do mal", porque não é mais a sociedade que lhe impõe o certo e o errado, mas é ele que cria as virtudes necessárias a sua vida (NIETZSCHE, 1992). Uma outra vertente é o positivismo que tem como seu mais conhecido representante o francês UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 17 Auguste Comte (1798-1856), cuja filosofia muito influenciou o pensamento e a história do Brasil. Para Comte e os positivistas, somente a observação é fonte de conhecimento científico e todos os demais conhecimentos não passam de ilusão. O positivismo defendia a idéia de progresso contínuo e irreversível da humanidade, cuja face mais visível era o desenvolvimento da ciência e da técnica. Para Comte, as civilizações passam por três fases de desenvolvimento: � a primeira, associada a infância, é a fase mítica ou religiosa, onde as explicações ocorrem sempre com referências às divindades; � a segunda, a juventude, encontra-se a fase metafísica, onde princípios abstratos e não materiais são indicados como respostas aos acontecimentos; � a última é a maturidade, a fase científica, onde tudo é explicado pela observação e referência aos fenômenos. Comte foi expulso da Escola Politécnica de Paris (devido suas idéias republicanas) e começou a dar aulas particulares em casa; entre seus primeiros alunos já havia brasileiros que estudavam na capital francesa. A exposição do pensamento no século XIX não estaria completa sem a apresentação do pensamento do alemão Karl Marx (1818-1883). Marx era filho de advogado que, obrigado a escolher entre poder exercer a profissão ou permanecer judeu, se "converteu" ao protestantismo. Marx estudou na Universidade de Berlim, e se formou em 1841. No mesmo ano começou a trabalhar como jornalista no jornal "Gazeta Renana", que foi logo fechado pelo governo. Nessa época, Marx toma contato com as idéias de Ludwig Feuerbach (1804-1872), de quem assumirá a posição de que não é Deus que cria os homens, mas os homens é que criam Deus. Em 1843 vai para Paris, onde conhece Friedrich Engels (1820-1895), filho de industrial que havia, também após a leitura de Feuerbach, abandonado o idealismo hegeliano e abraçado o materialismo. Engels se tornaria - mesmo após a péssima impressão que deixou em Marx no primeiro encontro dos dois - o amigo e colaborador de Marx até o fim da vida desse; os dois escreveram juntos o "Manifesto Comunista", pequena obra que sintetizava a visão de mundo dos dois. Marx, em consonância com o positivismo assume a crença no progresso inevitável da humanidade. As leis dialéticas são leis da matéria e por isso mesmo, determinantes de uma mudança contínua. A situação do modo de produção capitalista produz as condições para superação desse mesmo sistema, pois o capitalista maximiza os lucros através da exploração do trabalho do proletariado, mas isso tem um limite na capacidade física do trabalhador. O capitalismo aumenta a produção e os lucros maximizando a técnica, que exige cada vez menos trabalho assalariado, UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 18 aumentando a produtividade. Ao mesmo tempo, desemprega uma massa de trabalhadores que não terá renda para consumir, o que leva a crises sucessivas de excesso de produção. A influência das idéias de Marx na política foi imensa, forjando parte da história do século XX e produzindo o ordenamento mundial atual. 5.2. O século XX No século XX temos uma pluralidade de perspectivas filosóficas. As principais são: Pragmatismo - os principais representantes são Charles Sanders Peirce (1839-1914), William James (1842-1919) e John Dewey (1859-1952). O pragmatismo é uma reação ao materialismo positivista que escolhe o caminho da prática. O pragmatismo afirma de maneira clara que o método pragmático consiste no estudo de várias doutrinas do ponto de vista de suas conseqüências práticas e seus resultados. Fenomenologia - seu principal representante foi Edmund Husserl (1859-1938). Husserl argumenta que devemos compreender os fenômenos como eles nos aparecem, independentes de suas relações. A fenomenologia é o método privilegiado do existencialismo. Os principais representantes do existencialismo no séc. XX são: Martin Heidegger (1889-1976), Karl Jaspers (1883-1969), Jean-Paul Sartre (1905-1980), Gabriel Marcel (1887-1973) e Maurice Merleau-Ponty (1908-1961). A filosofia de Heidegger é extremamente influente. É considerado um dos filósofos da "morte da filosofia", pois dizia que a filosofia, como vinha sendo produzida desde Sócrates, não propiciaria a posse da verdade – Nietzsche fazia a mesma crítica dizendo que a verdadeira filosofia era a dos pré- socráticos – e a saída seria o retorno à linguagem poética, que seria a única a permitir a posse do ser. Sartre se tornou o mais popular filósofo do século XX. Dentro do existencialismo e da fenomenologia, flertou com o marxismo soviético e chinês; foi da Resistência na época da Segunda Guerra Mundial; participou ativamente da política francesa do pós-guerra apoiando sindicatos e greves; participou do movimento de estudantes de 1968; escreveu romances e peças teatrais; foi agraciado com o Nobel de literatura, mas recusou; viajou o mundo apoiando revoluções sociais. O existencialismo de Sartre era ateu e sua filosofia pregava o controle da náusea e da angústia inevitáveis ao se perceber que Deus não existe e que todos os atos são de inteira responsabilidade do indivíduo, que não se reporta a nada para decidir sua existência e determinar sua própria essência (REALE; ANTISERI, 1990) (SARTRE, 2004). Neomarxistas - os teóricos da Escola de Frankfurt recriaram em novos moldes a abordagem de Marx (teoria crítica), por isso são chamados de neomarxistas. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 19 Não devemos confundir o pensamento de Frankfurt com os ditos marxistas, que eram ideólogos do mundo soviético; o marxismo da Escola de Frankfurt não era aceito pela ortodoxia dos países comunistas. Usando a teoria de Marx e dela fazendo uma mescla com outras doutrinas – por exemplo a psicanálise, esses teóricos desenvolveram uma crítica da sociedade de massas, da cultura, das artes, da ciência e da razão instrumental ligada à técnica. Neopositivismo, ou positivismo lógico - responsável por uma das revoluções do pensamento filosófico no século XX. Com ele a filosofia sofre o que se convencionou chamar de "giro lingüístico", determinando que a análise da linguagem se tornasse a atividade primordial da filosofia. Segundo os positivistas lógicos, somente são consideradas ciências aquelas áreas de conhecimento, cujas sentenças são verificáveis. Além desse critério de verificação, que estabelecia uma separação entre o que é e o que não é científico, os positivistas lógicos chamavam a atenção para o fato de que a linguagem comum não seria adequada para o conhecimento científico; defendiam, então, que somente uma linguagem artificial lógica e simbólica poderia tratar do conhecimento. O trabalho da filosofia estaria resumido à análise da linguagem das ciências por meio da lógica simbólica. Era essa linguagem que propiciaria a unificação das ciências, um idealdos neopositivistas. O projeto faliu; mesmo a física, modelo de ciência para os positivistas lógicos, possui proposições metafísicas, que não podem ser verificadas. A preocupação do positivismo com a questão da demarcação científica era reflexo da extrema importância que a ciência adquiriu dentro da sociedade ocidental. Em função desse interesse pelo conhecimento científico, uma área específica da filosofia surgiu no século XX: a filosofia da ciência. Karl Popper (1902-1994) assumiu a questão de determinar o que é ou não ciência. Crítico do positivismo lógico, Popper defendeu um novo critério de demarcação, que segundo ele, não estaria na verificação, mas no caráter falsificável de uma teoria. Somente uma teoria que se coloca à prova - dizendo exatamente o que admite ou não e como isso pode ser testado - é tida como científica. Teorias que nunca podem ser falsificadas são teorias metafísicas. Mas, ao contrário dos positivistas lógicos, Popper não dizia que teorias metafísicas não possuíam sentido; eram plenas de sentido e muitas vezes fonte de teorias científicas (POPPER, 1993, 1994). UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 20 VI - AS DISCIPLINAS FILOSÓFICAS A filosofia divide suas disciplinas em função dos problemas a que responde. São cinco as grandes áreas de investigação da filosofia: � a metafísica; � a epistemologia, ou teoria do conhecimento; � a ética; � a filosofia política; e � a estética; Dentro destas grandes áreas, temos divisões em disciplinas mais específicas que tiveram sua delimitação estabelecida a partir do século XIX e durante o século XX. Veja um exemplo! Dentro da epistemologia há a filosofia da ciência que, além da perspectiva geral que procura falar de todas as ciências, pode se dividir em filosofia das ciências naturais, formais e sociais. Estas divisões não tornam as disciplinas filosóficas estanques, pelo contrário, os problemas filosóficos se encontram e se inter-relacionam, constituindo uma rede com diversos nós de ligação. As três primeiras disciplinas que você estudará são: metafísica, a epistemologia e a ética. Que tal começar? 6.1. A Metafísica Este termo é o título de uma das principais obras de Aristóteles, apesar do filósofo grego não o ter utilizado. Andrônico de Rodes, organizador da obra completa de Aristóteles no século I a.C., ordenando os livros em ordem alfabética grega, percebeu um problema, pois o livro posterior à "Física" não tinha nome. Andrônico o nomeou "o livro que vem depois da Física", em grego "tà metà tà fisicà"; daí "metafísica". Aristóteles utilizava a expressão "filosofia primeira" para se referir à disciplina que hoje denominamos metafísica. O nome dado por Andrônico veio a se tornar aceito, em especial porque o termo se refere à coisas que estão além do que é físico. No caso de Aristóteles, a "filosofia primeira", ou metafísica, seria a área da filosofia que abordaria as causas primeiras de toda a existência, o ser em si mesmo, que Aristóteles identificava como Deus. De maneira introdutória pode-se dizer que a metafísica trata dos problemas do ser e da existência. O que existe? O que define a existência específica de algo e do todo? Que tipo de existência pode-se advogar da essência das coisas? Existem causas e quais? O que é necessário e o que é contingente? Todas estas são questões metafísicas. (ARISTÓTELES, 1984). Aristóteles já igualava o estudo metafísico ao estudo de Deus e essa tem sido uma preocupação constante dentro da filosofia. Desde a Antigüidade, os filósofos têm se perguntado pela possibilidade da existência ou não de uma entidade supra-natural, criadora ou co-eterna com o mundo. Muitos ao UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 21 longo do tempo desenvolveram argumentos favoráveis à crença na existência de Deus. Os argumentos elaborados utilizam inúmeras abordagens, observe: Platão chegou a identificar as idéias do Belo e do Bom com Deus e negou as divindades gregas como representativas da Divindade verdadeira (PLATÃO, 2001); Aristóteles falava de uma causa primeira, dentre todas as causas observadas, que ele identificou como uma divindade co-eterna ao universo (ARISTÓTELES, 1984); Santo Tomás de Aquino desenvolveu os argumentos de Aristóteles dentro de uma perspectiva cristã, o que ficou conhecido como as "cinco vias" sobre a existência de Deus (AQUINO, 2002); Santo Agostinho, santo Anselmo e Descartes desenvolveram um argumento – chamado de ontológico – que afirmava a existência de Deus a partir da própria idéia de Deus (AGOSTINHO, 1984) (ANSELMO, 1979) (DESCARTES, 1979); Pascal, à época de Descartes, desenvolveu um argumento baseado na maior probabilidade de acerto da crença na existência de Deus (PASCAL, 1973); Kant afirmou a necessidade moral da crença em Deus, sem a qual nenhuma vida moral poderia se constituir (KANT, 2002); Richard Swinburne - filósofo britânico da contemporaneidade - inspirado no argumento de Pascal utiliza um teorema da probabilidade- estatística (teorema de Bayes) para advogar a racionalidade da crença em um Deus pessoal, em especial o do Cristianismo (SWINBURNE, 1998); A razão da existência pessoal e da existência como um todo, também é um problema metafísico e com reflexos imediatos para o nosso viver cotidiano. Por exemplo, os objetivos que você traça em sua vida e as ações que realiza para alcançá- los. Em especial este problema se coloca quando o homem se defronta com condição mortal. A morte apressa as questões acerca do significado da vida, além da definição de que é algo bom ou ruim. Procurar sentido no que fazemos pode estar nos desejos pessoais, nas preocupações sociais, ou em algo fora desse mundo. Alguns filósofos argumentam que não há sentido na existência pessoal, que se daria pelo acaso e demandaria a produção livre e pessoal de um significado, sob pena de se admitir até mesmo o suicídio como resposta à falta de significado da existência. Outros dirão que mesmo que se produza significado, este é apenas subjetivo, pois o universo demonstra uma indiferença constante à existência e ao que o ser humano produz, já que tudo será consumido pelo tempo e desaparecerá para sempre, mesmo as lembranças que tenham de nós e de nossas ações. Talvez o ser humano não devesse se UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 22 preocupar tanto com sua existência como um ser único, achando que ele é especial (NAGEL, 2001, 2004). Antes de continuar dê uma parada e leia a poesia de Fernando Pessoa, denominada O Mistério das Cousas, ela possibilitará a reflexão sobre o que você estudou. O Mistério das Cousas Alberto Caeiro (Fernando Pessoa) Há Metafísica bastante em não pensar em nada. O que penso eu do mundo? Sei lá o que penso do mundo! Se eu adoecesse pensaria nisso. Que idéia tenho eu das cousas? Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos? Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma E sobre a criação do Mundo? Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos E não pensar. É correr as cortinas Da minha janela (mas ela não tem cortinas). O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério! O único mistério é haver quem pense no mistério. Quem está ao sol e fecha os olhos, Começa a não saber o que é o sol E a pensar muitas cousas cheias de calor. Mas abre os olhos e vê o sol, E já não pode pensar em nada, Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos De todos os filósofos e de todos os poetas. A luz do sol não sabe o que faz E por isso não erra e é comum e boa. Metafísica? Que metafísicatêm aquelas árvores? A de serem verdes e copadas e de terem ramos E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar, A nós, que não sabemos dar por elas. Mas que melhor metafísica que a delas, Que é a de não saber para que vivem Nem saber o que não sabem? "Constituição íntima das cousas"... "Sentido íntimo do Universo" ... Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada. É incrível que se possa pensar em cousas dessas, É como pensar em razões e fins Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão. Pensar no sentido íntimo das cousas É acrescentado, como pensar na saúde Ou levar um copo à água das fontes. O único sentido íntimo das cousas É elas não terem sentido íntimo nenhum. Não acredito em Deus porque nunca o vi. Se ele quisesse que eu acreditasse nele, Sem dúvida que viria falar comigo E entraria pela minha porta dentro Dizendo-me, Aqui estou! (Isto é talvez ridículo aos ouvidos De que, por não saber o que é olhar para as cousas, Não compreende quem fala delas Com o modo de falar que reparar para elas ensina.) Mas se Deus é as flores e as árvores E os montes e sol e o luar, Então acredito nele, Então acredito nele a toda a hora, E a minha vida é toda uma oração e uma missa, E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos. Mas se Deus é as árvores e as flores E os montes e o luar e o sol, Para que lhe chamo eu Deus? Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar; Porque, se ele se fez, para eu o ver, Sol e luar e flores e árvores e montes, Se ele me aparece como sendo árvores e montes E luar e sol e flores, É que ele quer que eu o conheça Como árvores e montes e flores e luar e sol. E por isso eu obedeço-lhe, (Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?), Obedeço-lhe a viver, espontaneamente, Como quem abre os olhos e vê, E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes, E amo-o sem pensar nele, UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 23 E penso-o vendo e ouvindo, E ando com ele a toda a hora. 6.2. Epistemologia A epistemologia, ou teoria do conhecimento, trata de todas as questões acerca do conhecimento humano: como procede; de onde parte; seus limites; seus tipos. Ao procurar conhecimento, pretende-se encontrar crenças verdadeiras justificadas. Dentro desta definição encontram-se dois conceitos que devem ser clarificados: verdade e justificação. Existem diversas teorias que definem o que é a verdade. Dentre elas temos a mais comum, a "teoria da correspondência" ou "teoria especular". O termo "especular" se refere a espelho, pois supõe que os conhecimentos que cada pessoa possui se espelham a realidade ou correspondem ao mundo como ele é. Assim, verdadeira é a crença que reproduz a estrutura do mundo e falsa é a crença que não reflete esta estrutura. Uma outra teoria, mais nova, é a pragmatista. Segundo esta teoria, a verdade é uma característica provisória das crenças, ou seja, enquanto estas produzem o resultado esperado em termos de finalidades práticas, elas sustentam o status de verdadeiras. Quanto à justificação, sua definição está ligada ao tipo de conhecimento que se pretende advogar, o procedimento necessário para atingi-lo e as evidências relevantes. Veja uma explicação! Se o que pretendo provar é um teorema matemático, o procedimento de justificação se resume ao conjunto de regras lógicas de demonstração e não necessito de evidência além do próprio cálculo lógico. O mesmo não acontece se a crença que pretendo justificar é a de que determinado vírus é o causador de uma doença específica; neste caso preciso de evidência observacional que deverá ser coletada, mensurada e relacionada com os efeitos que pretendo explicar. Ao tentar defender a existência da mente como algo imaterial a justificativa deverá possuir não só uma argumentação logicamente correta, mas também apresentar fatos plausíveis e não contraditórios em defesa do que se pretende afirmar como verdade. Todas estas características dizem respeito ao conhecimento, mas há uma área específica da epistemologia que se consolidou no passar dos séculos XIX e XX: a filosofia da ciência. O conhecimento científico, em especial o das ciências naturais, se desenvolveu enormemente a partir do início da modernidade com a Revolução Científica e a Revolução Industrial. A ciência se tornou, durante o século XIX e ainda hoje para alguns, o conhecimento privilegiado. A ciência tem uma enorme importância na sociedade de hoje, o que pode ser apreciado ao notar o grande interesse e dependência que se possui das questões científicas e tecnológicas. Aos filósofos interessam indagar o que caracteriza o conhecimento científico, seu UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 24 método ou métodos, suas teorias e a realidade da qual pretende falar. É bom lembrar que o problema da demarcação do que é ou não conhecimento científico vem desde o início dos questionamentos em filosofia da ciência e está ligado à questão do progresso da ciência. É importante ressaltar ainda, uma das posições mais radicais contra as convicções realistas do conhecimento: o ceticismo. O cético é um terrorista do conhecimento que pretende deixar em escombros o edifício do conhecimento. A metáfora do edifício do conhecimento foi utilizada por Descartes em sua obra "Discurso do Método", onde pretendia se defender dos argumentos céticos. O cético chama atenção para o fato de que constantemente o ser humano erra: nosso raciocínio se mostra errado, somos enganados pelos sentidos, confundimos sonho e realidade, e nossas teorias estão permanentemente se mostrando falhas. Em suma, não podemos dar crédito às nossas percepções e crenças, pois não possuímos garantia alguma da correção delas; no máximo podemos afirmar que temos opiniões acerca do mundo, nunca conhecimento de como ele realmente é. 6.3. Ética Os problemas éticos, assim como os políticos, são os que mais se relacionam com o nosso dia-a-dia. As questões éticas são relativas ao agir humano. O que é certo fazer? O que não devemos fazer? Qual ou quais são as fontes da moralidade? Há alguma relação entre o certo e o útil? A felicidade pessoal é a justificativa final das ações humanas? Além das questões éticas de cunho geral referidas acima, existem as questões mais específicas, relativas à época em que se vive, em especial aquelas que dizem respeito à vida. Veja estes exemplos! O aborto poderia ser eticamente justificado? A eutanásia não seria apenas um assassinato? Pode-se realizar pesquisas com células-tronco embrionárias? Estas questões estão ligadas com a concepção de ser humano. A moral tradicional e as religiões tentam respondê-las, mas como as concepções morais são variadas e as religiões são muitas, o papel da filosofia se mostra primordial, pois com o uso da nossa capacidade racional comum pode-se tentar o acordo. Se prestarmos atenção à história da humanidade, perceberemos que os diferentes povos e civilizações possuíam concepções contraditórias acerca do certo e do errado; as sociedades hoje existentes, tem percepção do bem e do mal também UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 25 variadas. A conclusão destas observações para o relativista moral é a de que a norma moral depende da sociedade em que se vive; o que é certo é aquele tipo de ação que a sociedade procura incentivar ou toma como normal, e o que é errado é a ação que aquela sociedade tenta proibir. Deste modo, para o relativista moral não podemos condenar moralmente asações de determinado povo, pois este está simplesmente fazendo aquilo que pensa estar certo. Qualquer tipo de repreensão moral seria derivada de uma atitude etnocêntrica. As posições relativistas vêm desde a Antigüidade. Alguns de seus mais famosos representantes foram os sofistas, na Grécia Antiga, e Montaigne, no início do Período Moderno. A crítica ao relativismo também é tão antiga quanto seus representantes. Sócrates constituiu seu pensamento na luta contra as posições céticas e relativistas dos sofistas, assim como Platão. Há uma coincidência nas diversas respostas dadas ao relativismo moral, mesmo quando estas respostas não derivam teorias éticas comuns. Platão, Aristóteles, os filósofos cristãos da Idade Média, os racionalistas modernos, os empiristas, os utilitaristas, Kant e diversos outros pensadores não coincidiram em suas propostas de uma teoria ética definidora do certo e do errado no agir humano, mas todos eles coincidiram em suas críticas ao relativismo e na possibilidade de chegarmos racionalmente ao que usualmente chamamos de "regra áurea", uma norma moral universal. Nisto estão ao lado das maiores tradições religiosas da história da humanidade (SINGER, 2002). As críticas ao relativismo e ao subjetivismo estão centradas na idéia da impossibilidade de crítica moral, de educação moral e reforma social ao admitirmos a posição relativista. Segundo os críticos do relativismo, basta que você se pergunte quais seriam as razões para condenar um ato em um grupo social diferente do seu ou em um subgrupo social da sociedade em que se está inserido. Como, por exemplo... Posso condenar um ato terrorista se esta pode ser uma ação vista como correta dentro do grupo ao qual o terrorista pertence? Olhe para os inúmeros subgrupos dentro da sociedade em que você vive. Se em um destes subgrupos a prática religiosa é diferente da maioria da sociedade, ela teria que ser condenada como errada? No caso do subjetivismo ético, os problemas se repetem. Imagine você se o certo e o errado fossem os objetos do desejo dos indivíduos. A responsabilidade moral, assim como a imputação de culpa, não poderiam ocorrer dentro da sociedade. Novamente, como pais e educadores agem? Dizem a seus filhos e alunos "façam o que desejam"? A idéia de educação moral está justamente baseada no controle dos desejos subjetivos. Como bem disse Thomas Hobbes, se esta é a natureza UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 26 egoística do homem, o estado da natureza é a guerra de todos contra todos (HOBBES, 1979). Há uma tentativa, com base no pensamento de Kant, de controlar o subjetivismo. Esta faz referência ao conceito de "observador ideal". O pensador que defende esta teórica foi o filósofo americano John Rawls. Nesta teoria, ao decidir sobre a ação, o indivíduo deve se colocar na posição de um observador ideal que procuraria ter o máximo conhecimento possível sobre a ação a ser realizada – inclusive as possíveis conseqüências – e procurar agir com total imparcialidade nas ações, isto é, levando os interesses de todas as pessoas – incluso ele próprio – igualmente em consideração (RAWLS, 2002). Uma das críticas a esta posição está ligada à exigência de total imparcialidade. Imagine! Você levaria igualmente em consideração os interesses de seus familiares e de um desconhecido? A questão mais central, diante das conseqüências para a possibilidade de uma ética é a questão do livre-arbítrio. Os seres humanos são efetivamente livres ao tomarem uma decisão ou isto não passa de uma ilusão? Diversos autores defenderam o determinismo como a posição teórica mais apropriada ao nosso conhecimento sobre o mundo e o ser humano. O determinismo defende que todas as ações no mundo estão determinadas por causas anteriores a elas, incluso as ações humanas. O ser humano tem que ter autonomia na escolha. Em algum momento nossa capacidade de decisão ou nossa vontade de poder escolher deve ocorrer sem nenhum constrangimento. Isso é possível? Pense em você! Quando decidiu fazer este curso, você não foi influenciado por nada a tomar esta decisão? Kant é responsável por uma das mais influentes elaborações éticas da filosofia. Kant estabeleceu uma regra moral de aplicação universal que se configurou no chamado "imperativo categórico": age de tal maneira que seja seu desejo que todos ajam da mesma forma. A ética de Kant é extremamente rígida e vinculada à noção do "dever"; se você faz o que é certo, mas o faz almejando algo mais além de fazer o que é certo, então a ação foi viciada. Agora, você estudará mais duas disciplinas filosóficas: a filosofia política e a estética. VII - FILOSOFIA SOCIAL E POLÍTICA A estrutura política, dos sistemas de governo e da justiça já era comum no pensamento dos filósofos da Antigüidade grega. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 27 Porém há dois tipos de contraposições teóricas clássicas na filosofia política. A primeira diz respeito à origem da sociedade e está dividida entre naturalistas e contratualistas. A segunda trata das relações entre ética e política que apresenta aqueles que defendem uma regulação ética da política e aqueles que defendem uma regulação exclusivamente política. Os pensadores naturalistas são aqueles que afirmam o aspecto natural e evolutivo do aparecimento e desenvolvimento das sociedades. Seu representante foi Aristóteles que definia o ser humano como um animal político. Para ele, o Estado é apenas o ápice do desenvolvimento social e gregário da natureza humana. O núcleo social básico é a família, e dela vêm as demais organizações sociais. Esta progressão é natural e evolutiva, pois o homem não é uma besta que vive solitária, nem um deus que não precisa dos outros para existir (ARISTÓTELES, 1985). Os contratualistas afirmam que qualquer sociedade surge em função de um pacto implícito entre os indivíduos que a comporão. As pessoas possuiriam diversos direitos que são naturais e por meio de uma decisão racional decidem por viver em grupo, abdicando de todos ou de alguns direitos naturais. Para Aristóteles, a política é a continuação da ética. Um ser humano somente se define em sociedade, pois é nela que deve se esforçar por adquirir hábitos virtuosos. Quase dois mil anos depois de Aristóteles, o diplomata e pensador político florentino Nicolau Maquiavel irá se contrapor à ligação entre ética e política. Para Maquiavel, a política possui regras próprias e o agir político deve ser definido pelos seus fins inerentes, que para ele são a manutenção do poder e da ordem na sociedade. Maquiavel estabelece uma diferença entre o que hoje chamamos "razão de Estado" e as razões pessoais do governante. Aquilo que individualmente para uma pessoa seria o correto fazer, não é necessariamente certo para um governante. Se necessário aos fins específicos do Estado, o governante deve agir na sua dependência, mesmo que pessoalmente em sua vida particular não o fizesse. O lema "os fins justificam os meios" é a expressão da desvinculação entre os preceitos éticos pessoais e os preceitos políticos públicos (MAQUIAVEL, 1973). Para finalizar as referências aos problemas e respostas abordados dentro da filosofia política, façamos referência à questão da justiça e sua distribuição. John Rawls e Robert Nozick foram dois filósofos americanos atuais que representaram idéias contrárias sobre a justiça distributiva. Rawls defendeu a importância do Estado como o elaborador e realizador de mecanismos sociais e econômicos que produzam justiça social. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensinode Jovens e Adultos 28 Caberia ao Estado diminuir as distâncias das diferenças entre as condições materiais dos indivíduos que compõem uma sociedade. Nozick, era frontalmente contra qualquer tipo de ação que interferisse nos direitos naturais de uma pessoa. A ação dos indivíduos dentro da sociedade deve ser livre de qualquer constrangimento. VIII - ESTÉTICA A estética é a área da filosofia que trata da beleza e da arte. A apreciação estética é parte do nosso cotidiano. Observe: Pode-se dizer que certas composições musicais são belas; quão bonita é uma paisagem; fala-se sobre a beleza de algumas pessoas; encanta-se com os quadros e as esculturas como belas. Mas o que há de comum em uma paisagem, uma música, uma pessoa e um quadro quando dizem que todos são belos? Você já deve ter se perguntado sobre isso e já deve ter percebido que, além de falar da beleza de coisas diferentes, as pessoas têm opiniões diferentes sobre o que é belo ou não. A tendência natural é chegar à conclusão de que gosto não se discute. Nem todas as teorias estéticas advogam um subjetivismo extremo, a mais usual perspectiva estética é a da imitação. Em Platão, todo o mundo físico é imitação do mundo das idéias, o que percebemos através da nossa capacidade racional que ultrapassa o sensorial e apreende a idéia imaterial e eterna do belo, a beleza em si mesma. Na perspectiva de Aristóteles a arte é por definição arte imitativa. Quanto mais perfeita a imitação realizada, mais a arte permite o aprimoramento humano, pois possibilita a percepção e a vivência de experiências múltiplas. Alguns outros teóricos se concentraram na emoção, tanto a que o artista pretenderia expressar, quanto aquela que ocorre em quem aprecia. Mas os problemas logo aparecem. Como posso ter certeza da apreensão correta da emoção do artista? Quanto à emoção produzida naquele que percebe a situação não é menos problemática. Se a emoção estética produzida por algo é diferente em duas pessoas é porque aquilo é falho? Não posso admitir que algo seja arte sem que aquilo produza em mim algum tipo de emoção? Um outro tipo de posição em estética advoga uma posição sociológica e histórica. Esta concepção afirma que a beleza e a arte são definidas em função das condições psicológicas e sociais existentes em determinados períodos e locais. Arte é aquilo que foi estabelecido como arte pelos manuais de história, pelos artistas, pelos marchands e pelos críticos. O mesmo ocorreria com a concepção de beleza. Dentro desta perspectiva há uma coincidência com o relativismo moral em ética UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 29 e com o ceticismo em epistemologia (GARDNER, 2002). Atualmente, o padrão de identificação do que é belo está ligado ao fato de evolutivamente as espécies reconhecerem a relação entre saúde e organismos de corpos simétricos. Esta hipótese explicativa é fruto de uma aliança nem sempre aceita entre estética e biologia evolucionista (WRIGHT, 1996). IX – DIMENSÃO PEDAGÓGICA DA FILOSOFIA A preocupação grega com a formação do indivíduo se desdobrou nas inúmeras interpretações do que é o ser humano e as condições de maleabilidade de formação a que está submetido. A filosofia não pretende somente justificar a interpretação do que é o homem, como também produz normatização acerca dos procedimentos de formação. Uma concepção antropológica da natureza humana mais comedida seria a interpretação aristotélica do ser humano como um ser com características próprias, mas maleável em sua formação, que se dará de maneira interativa com os outros e com as situações com que se defronta. Por exemplo: aristotelicamente, diríamos que: A educação envolve aspectos sociais, políticos e éticos que fazem dela uma arte regida pela prudência, e esta prudência se aplica à prática. A partir de agora vamos nos aprofundar nestes aspectos que envolvem o processo educativo. Iniciaremos revisitando Platão e Sócrates. A concepção de ser humano encontrada em Platão permite o aprimoramento pessoal, mas a prática educacional defendida por ele não permite variedade. Platão estabelece estritas regulações do processo educacional em relação aos tipos psicológicos que acreditava existirem. A imagem do Sócrates mestre é a de um indivíduo preocupado com os caminhos que o conhecimento e o aprimoramento moral do indivíduo poderiam tomar. Sócrates é apresentado nos diálogos de Platão como mais preocupado com o procedimento do que com o resultado final do empreendimento cognitivo. O processo educacional não termina, assim como a verdade não se apreende de todo. Esta perspectiva socrática vai até o advento do Cristianismo. Após a vitória do Cristianismo como religião dominante no mundo ocidental, a missão de preparar a vida deixa de ser uma função da filosofia e passa a ser da religião. 9.1. Abordagem Filosófica, Metafísica e Epistemológica da Formação da Pessoa A filosofia possibilitará a formação do indivíduo quando retomar a noção de razão prática, entendida como orientação para a vida. UNI – UNIÃO NACIONAL DE INSTRUÇÃO Ensino de Jovens e Adultos 30 Para isto devemos levar em consideração alguns fatores importantes para uma abordagem filosófica, metafísica e epistemológica da formação da pessoa. � Educação: a busca de uma constituição estável do ser humano que não muda com o tempo Ao advogarmos um modo específico de educar estamos supondo uma constituição estável do ser humano que não muda com o tempo. A indicação de propriedades definidoras não é empreendimento fácil e devemos ter o cuidado em não cristalizar interpretações e práticas, a ponto de se tornarem prejudiciais à formação da pessoa. � Ausência de regularidade do processo educacional A falta de regularidade do processo educacional também deve ser levada em conta para uma perspectiva pedagógico-filosófica enriquecedora. A figura do Sócrates inquiridor é exemplar dos descaminhos do processo educacional. Podemos justificar certas práticas educacionais, mas a dificuldade de que tais práticas ocorram sempre da mesma forma e resultem nos resultados pretendidos é uma pretensão que até a ciência natural contemporânea problematiza pelo uso contínuo da estatística e do cálculo de probabilidades. � A educação enquanto um processo histórico A educação e seus processos obedecem a uma referência histórica. Nenhum procedimento humano está desvinculado de seu momento histórico e dos valores que constituem as comunidades. Não perceber a historicidade dos procedimentos educacionais impede a compreensão da mudança e a contextualidade destes processos. � A linguagem como veículo dos processos educativos. A linguagem é o veículo privilegiado dos processos educacionais. A atenção aos significados e crenças vinculados no processo educacional nos remete à estrutura da argumentação, do diálogo, da formação pragmática do significado. A linguagem é o meio de compartilhamento de crenças. A linguagem produz significado dentro da comunidade de falantes, que determina o uso dos termos. Perceber a educação como um jogo lingüístico ajuda a tomá-la como um processo de interação segundo regras. � A cultura enquanto um conjunto de valores para as comunidades A cultura apresenta um conjunto de valores que norteiam todas as atividades dentro de uma comunidade. Uma educação plena e democrática deveria reproduzir os valores, criticá-los, repô-los, compará-los e disseminá-los em sua pluralidade. � Aspectos econômicos que influenciam a educação Por último – mas não seriam só estes os fatores existentes – citamos os aspectos
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