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Desenvolvimento Antropologia

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DESENVOLVIMENTO DA ANTROPOLOGIA 
É no século XX que a Antropologia se constituiu numa disciplina 
autônoma, caracterizada por técnicas de trabalho próprias e por um domínio específico de 
pesquisa: as sociedades denominadas primitivas. O aparecimento desta nova ciência do 
homem assinalou então o resultado de uma evolução bem mais antiga: a descoberta 
progressiva pela Europa de sociedades não industriais 
A diversidade de raças e de formas de organização social tinha sido posta 
em evidência já no século XIII, quando os primeiros grandes exploradores deram a 
conhecer a Europa oriental à Ásia central. O mais famoso destes, Marco Polo (1254 
1324), visitou a China, onde permaneceu dezesseis anos, e iniciou a moda das narrativas 
de viagem com o livro As Maravilhas do Mundo, que conheceu um êxito perdurável. 
O interesse pelas sociedades “exóticas” era alimentado e reforçado a partir 
da Renascença pela expansão mercantil e pela política do capitalismo nascente. Com as 
expedições militares e comerciais multiplicaram-se as crônicas memórias e narrativas que 
atraíam a curiosidade dos europeus para os outros continentes No século XVIII 
prosseguiram. e foram sobretudo coordenados, estes esforços de investigação. As 
sociedades da Oceania foram descobertas e incluídas na carta do mundo. O Noroeste da 
Ásia foi explorado metodicamente. Viajantes mergulharam no interior da África para 
efetuar uma exploração sistemática de regiões desconhecidas 
Aparição do “bom selvagem” 
As informações assim reunidas sobre as sociedades não européias 
renovaram o campo da reflexão filosófica. O tema do “bom selvagem» fez a sua aparição 
na obra de Diderot (Supplement au voyage de Bougainville), de Bernardin de Saint-Pierre 
(Paulo e Virgínia), de Rousseau, levando este a uma denúncia do luxo e da civilização 
moderna (Discours sur l'origine et les fondements de l'inegalité). No mesmo contexto 
ideológico despontou a nova idéia de uma evolução da humanidade que se teria 
desenvolvido a partir de um estado natural original até às formas mais complexas da 
sociedade industrial. Encontravam-se vestígios de tal concepção em Bayle, Condorcet, 
Montesquieu e nos filósofos ingleses Hobbes e Locke. Entre os principais representantes 
de um pensamento pre-antropológico em vias de constituir-se terá de se citar igualmente 
Voltaire, que, pela sua sensibilidade ao pluralismo da cultura, estabeleceu os 
fundamentos de um verdadeiro relativismo cultural. A palavra “Antropologia” era aliás 
empregada desde os fins do século XVIII para designar o conjunto das questões relativas 
à origem, às semelhanças e às diferenças das diversas sociedade então recenseadas. 
O século XIX prolongou e acelerou o movimento de descoberta das 
sociedades primitivas. A medida que o Ocidente estendeu o seu domínio sobre zonas 
cada vez mais vastas do planeta, exploradores, missionários, comerciantes e 
administradores coloniais acumularam observações sobre os povos recentemente 
conhecidos ou submetidos. 
 2 
O interesse dedicado à Antropologia levou à criação de sociedades 
cientificas em Paris (1838) e em Londres (1843). Os primeiros antropólogos eram juristas 
(como o suíço Johann Jacob Bachofen e o americano Lewis Henry Morgan), médicos 
(como o alemão Adolf Bastian). administradores ( como os ingleses Henry Sulner-Maine 
e J. F, Mac Lennan ) . 
Toda esta geração de investigadores, cujas obras foram publicadas depois 
de 1850, interpretou à distância os materiais reunidos por outros, colocados como 
observadores em contato com populações exóticas. Quer dizer que num primeiro período 
o antropólogo foi essencialmente um compilador, um homem de gabinete, que 
comparava entre si as informações de que dispunha, de origens diversas, sobre as etnias 
que se propunha estudar. 
Esta concepção resultava, por um lado, das teorias do Evolucionismo que 
dominavam então a reflexão científica. Com base no modelo daquilo que Charles Darwin 
propunha em Biologia, os antropólogos do século XIX esforçavam-se por estabelecer 
uma escala das civilizações, cujo escalão mais baixo seria constituído pelas “tribos 
selvagens” e o escalão mais elevado pelas “nações civilizadas”. 
Foi a obra de Lewis Henry Morgan que marcou mais profundamente este 
período da investigação. Este jurista americano demonstrou pela primeira vez a 
importância das relações de parentesco na organização das sociedades não ocidentais. A 
partir da análise das formas de filiação entre os índios iroqueses, definiu o casamento 
como uma troca, cujas funções políticas, econômicas e ideológicas entreviu. Dotou assim 
a Antropologia de uma problemática (o estudo dos sistemas de parentesco) que 
permanece ainda hoje no âmago desta disciplina. 
O quadro da evolução humana que conseguiu estabelecer ao utilizar as 
nomenclaturas de parentesco como uma sobrevivência de regimes sociais desaparecidos, 
seduziu Friedrich Engels, que fundamentou a Antropologia marxista na adesão crítica às 
principais teses de Morgan: evolução contínua da comunidade primitiva ate à família 
restrita, universalidade do matriarcado. 
Encontram-se os mesmos pressupostos nas obras do inglês Edward B. 
Tylor, que atribuiu como tarefa à Antropologia “estabelecer pelo menos uma escala 
grosseira da civilização”, colocando as sociedades européias “numa extremidade das 
séries sociais e as tribos selvagens na outra” e dispondo “o resto da humanidade entre 
estes dois limites”. Apesar do esquematismo das suas idéias, Tylor enriqueceu 
consideravelmente a reflexão antropológica. 
Evolucionismo 
Do ponto de vista evolucionista, a humanidade conheceu, em todos os 
tempos e em todos os lugares, as mesmas formas e as mesmas fases de desenvolvimento. 
Lewis Morgan distinguiu assim três fases principais na evolução de qualquer sociedade: 
selvageria, barbárie, civilização. Corrente de pensamento mais que doutrina constituída, o 
Evolucionismo dominou a Filosofia de Auguste Comte. A sua teoria dos “três estádios” 
fez recordar a das “três idades” do italiano Giovanni Batista Vico (1663-1744). 
Foi nos meados do século XIX que Lamarck (1744 - 1829) e Darwin 
fizeram definitivamente triunfar o ponto de vista evolucionista em Biologia: após as suas 
 3 
descobertas, a teoria da fixação das espécies foi abandonada. As especulações de 
Rousseau ou de Condorcet, no século anterior, sobre os progressos da humanidade 
receberam, assim, uma caução científica. A substituição do conceito de primitivo pelo de 
selvagem marcou o próprio nascimento da Antropologia. 
Os filósofos evolucionistas, como o alemão Gustav Klemm (1802 – 1867), 
ou o inglês Herbert Spencer (1820 – 1903), herdaram em compensação dos séculos XVII 
e XVIII a crença no homem universal. À semelhança de Pascal, que comparava já a 
humanidade ä um homem que aprendesse continuamente”, Sigmund Freud não hesitou 
em aproximar o psiquismo do primitivo do da criança. 
As pesquisas evolucionistas em Antropologia dedicavam-se sobretudo às 
sobrevivências das formas sociais anteriores. O costume do levirato (obrigação de uma 
viúva de casar com um irmão do defunto marido) era interpretado como um indício de 
um regime anterior de poliandria. Freud em “Totem e Tabu” apresentou a exogamia 
como uma sobrevivência do rapto de mulheres. Morgan não hesitou em explicar a 
estrutura de uma sociedade antiga. a “gens” grega, graças ao estudo das comunidades 
iroquesas do século XIX. Recorreu sistematicamente aos termos de parentesco para 
reconstituir as estruturas de filiação desaparecidas. No momento de elaborar as primeiras 
análises marxistas da família, Friedrich Engels (1820-1895) retomou os métodos de 
Morgan. 
Os primeiros evolucionistas apoiavam-se em inquéritos de campo 
minuciosos. O cuidado de fazer reconstituiçõesperfeitamente coerentes suscitava em 
compensação um grande número de descrições simplistas e esquemáticas. James Frazer 
sustentou assim que a magia precedeu por todo o lado a religião, sendo esta mesma 
seguida pelo pensamento científico. Para Edward Tylor, o regime matriarcal constituiu 
em todas as civilizações uma fase necessária anterior ao modo patriarcal de filiação. Do 
mesmo modo, John Mac Lennan comparava a prática do totemismo com uma fase 
constante da evolução religiosa. Inquéritos de campo mais escrupulosos desmentiram em 
seguida estas hipóteses e o descrédito que daqui resultou incidiu sobre o conjunto das 
pesquisas evolucionistas. 
Segundo Louis Bolk (1866-1930} foi a paragem do desenvolvimento 
fisiológico em determinada fase (fetalizacão) que distinguiu a espécie humana das 
diversas categorias de primatas. O homem apareceu, assim, como uma espécie de macaco 
prematuro e o desenvolvimento geral da espécie corresponde a uma regressão. As raças 
humanas mais “evoluídas” foram assim, segundo Bolk, as mais próximas da desaparição 
final. Tal teoria deu por conseguinte, acerca da evolução humana, uma explicação 
bastante matizada de racismo. 
Crítica do Evolucionismo 
Com excepção de alguns investigadores, a maior parte dos antropólogos 
da segunda metade do século XIX inspirava-se em postulados evolucionistas. Assistia-se 
a uma generalização do método comparativo: bastava um elemento de semelhança entre 
duas sociedades para que elas fossem situadas numa mesma fase de desenvolvimento. 
Reciprocamente, considerava-se como equivalentes elementos provenientes de duas 
culturas anteriormente consignados a um mesmo escalão da evolução. 
 4 
Por outro lado, tinha-se verificado um esforço para delinear seqüências 
evolutivas completas relativamente a certas instituições. Acontecia isto com a família 
conjugal moderna, cuja origem Morgan situava num estado de promiscuidade primitiva, 
ainda que nenhuma observação real pudesse verificar essa hipótese. Tinha-se consciência 
do risco de tais construções sintéticas, marcada sobretudo pelas lacunas da 
documentação. Assim, a geração dos antropólogos que publicaram as suas obras entre 
1900 e 1930 reagiu contra estas especulações. 
Nos fins do século XIX, um antropólogo americano de origem alemã, 
Franz Boas, criticou a escola evolucionista e estabeleceu os fundamentos de um novo 
método antropológico. 
Físico e geógrafo de formação, Boas considerou que o conhecimento 
exato dos fatos sociais só podia resultar de uma indução prudente a partir da observação 
concreta de grupos bem localizados no tempo e no espaço. 
Esta concentração sobre tarefas menos exaltantes mas mais rigorosas 
traduzia-se por um renovamento dos principais conceitos da Antropologia. Era salientada 
doravante a noção de difusão cultural, a qual se encontrava na origem de uma reflexão 
levada simultaneamente a efeito tanto na Alemanha como nos Estados Unidos. Assim, 
designava-se comumente pelo termo Difusionismo o conjunto de trabalhos da escola 
alemã e dos antropólogos americanos dos anos 1900-1930. 
Boas (Franz) 
Principal animador da investigação antropológica nos Estados Unidos 
durante a primeira metade do século XX. Franz Boas (1858 – 1942) foi sobretudo um 
teórico. Durante quarenta anos ensinou estatística e etnolingüística na Universidade de 
Columbia, em Nova Iorque. Partidário dos estudos rigorosos mas restritos, desconfiou 
sempre das generalizações. Especialista das sociedades esquimós, das línguas e das 
culturas indígenas, Boas realizou um enorme trabalho de inquérito e de compilação. 
Escreveu mais de seiscentos artigos sobre Etnologia, além das suas obras fundamentais: 
“The Mind of Primitive Man” (1911); “Primitive Arts” (1926); “General Anthropology” 
(1938); “Race, Language and Culture” (1940). 
Nascido em Minden (Vestefália), Franz Boas fez estudos de física, de 
geografia e de matemática em universidades alemãs: Heidelberg, Bonn, Kiel. Foi como 
geógrafo que fez, em 1883, uma viagem a Terra de Baffin, no Árctico; a descoberta das 
sociedades esquimós despertou o seu interesse pela Etnologia. Após uma primeira estada 
em Nova Iorque, Boas tornou-se professor de geografia na Universidade de Berlim. O 
seu segundo périplo conduziu-o à Colúmbia Britânica (Canadá). No regresso, em 1887, 
fixou-se nos Estados Unidos e adotou a nacionalidade americana. 
Foi a um dos seus alunos da Universidade de Clarke, A.F. Chamberlain, 
que foi atribuído o primeiro doutoramento em Antropologia. Conservador do Field 
Museum de Chicago, depois do American Museum, tornou-se professor em Columbia em 
1899. Dirigiu nesta época grande número de expedições, que permitiram estabelecer o 
célebre “Guia das Línguas dos Índios da América” (1901). Fundador do “Journal of 
American Linguistics” (1917), diretor do “Journal of American Folklore” (1909-1925), 
Boas presidiu a partir de 1910 a Academia das Ciências de Nova Iorque. 
 5 
Até a sua morte em 1942, Boas manifestou pelo trabalho, segundo a sua 
própria expressão, um “entusiasmo de gelo”. Ruth Benedict atribuiu a Boas a fundação 
da Antropologia como disciplina. As suas notas de viagem, pela exatidão, apresentavam 
certa relação com o material de laboratório. Geógrafo e físico de formação, Boas rejeitou 
todas as teorias especulativas sobre as sociedades: assim, a abordagem psicanalítica da 
vida dos grupos jamais lhe pareceu séria. Denunciou igualmente muito cedo, sob a 
influência do seu mestre Rudolf Vischow, certos aspectos, demasiado rígidos na sua 
opinião, das teorias de Darwin. 
Boas não rejeitou contudo a idéia de uma evolução de características 
físicas humanas: levou-a pelo contrário ao seu termo. Os seus estudos estatísticos sob a 
forma da cabeça de milhares de cidadãos americanos revelaram uma tendência para a 
uniformização, independente da origem racial e nacional. Boas desenvolveu assim uma 
tese que tornava vãs as controvérsias sobre a hereditariedade do meio: segundo ele, o 
homem não herda características fixas, mas potencialidades genéticas, destinadas a 
desenvolver-se segundo um meio ambiente físico e social determinado. A influência 
deste relativismo foi determinante para a Etnologia e a lingüística americanas dos 
princípios do século. As investigações ganharam com isso em exatidão e em riqueza 
documental, mas a renúncia a qualquer interpretação especulativa podia reduzir, em certa 
medida, a Antropologia ao folclore. 
Difusionismo 
O Difusionismo é uma corrente da ciência antropológica que faz do 
fenômeno da difusão de elementos culturais o princípio do desenvolvimento das 
civilizações. Inspirados em técnicas museográficas de classificação dos objetos e de 
análises das afinidades de estilo, os métodos difusionistas foram definidos na Alemanha 
no começo do século XX e conheceram depois de 1918 uma larga audiência nos Estados 
Unidos. Salientando os fenômenos de aquisição, de contato e de trocas culturais, os 
trabalhos de Franz Boas e dos seus discípulos traçaram a via para as investigações 
etnológicas sobre a aculturação e a transculturação. 
O alemão Fritz Graebner (1877-1934) formulou em 1911 os grandes 
conceitos do Difusionismo: os traços culturais, concebidos como os mais pequenos 
fragmentos discerníveis em determinada cultura, deviam ser situados pela análise nos 
complexos culturais (Kulturkomplex) formados pela reunião de diversos destes traços. A 
identificação de complexos culturais idênticos em diferentes regiões do mundo levava a 
investigar a sua área cultural (Kulturkreis), quer dizer, a ilhota da cultura original a partir 
da qual se difundiram. 
O método assim definido encorajava investigações de Etnologia 
comparativa. Wilhelm Schmidt, continuador de Graebner (e fundador darevista 
“Anthropos”), organizou um grande número de expedições para traçar a carta da difusão 
cultural. Porém, apesar de certos resultados positivos, a escola difusionista alemã só 
dificilmente conseguiu analisar na sua complexidade as trocas entre culturas. 
Coube aos etnólogos americanos afinar o método difusionista. Em “Man 
and Culture” Clark Wissler aprofundou, em 1923, a noção de complexo cultural, 
incluindo nele dados geográficos. Franz Boas, por seu lado, encarou a difusão, na 
totalidade, das dimensões que definem as relações de dois sistemas culturais em presença 
 6 
um do outro. Ao definir a noção de modelo cultural (cultural pattern), os difusionistas 
americanos precisavam as condições nas quais se efetuava toda a aquisição e mostrava 
que as suas modalidades dependiam ao mesmo tempo do grupo difusor e do grupo 
receptor. 
Pode-se censurar ao Difusionismo ter menosprezado as faculdades de 
invenção do homem ao admitir que as inovações se propagam mais do que se repetem. O 
grande mérito do Difusionismo reside no entanto no fato de salientar a importância dos 
contatos entre culturas e de tentar (antes dos estruturalistas, que lhe devem muito) 
organizar os seus elementos em conjuntos coerentes e significantes. 
A introdução do Difusionismo na França foi relativamente tardia. Só em 
1934 Georges Montandon retomou as teses difusionistas no seu “Traite d'Etnologie 
cyclo-culturalle et d'Ergologie systématique”. Embora certos etnólogos franceses como 
Andre Leroi-Gourhan se tenham inspirado em métodos elaborados pela escola 
difusionista americana, o estudo dos fenômenos de difusão não conheceu da parte dos 
antropólogos franceses o favor que lhe reservaram os seus confrades alemãos e italianos. 
A escola de Graebner e Schmidt, constituída por reação a certas análises 
evolucionistas, não soube evitar o excesso: para G. Elliot-Smith todas as civilizações 
teriam uma origem única: o Egito. 
Difusionismo e aculturação 
A escola denominada "histórico-cultural" ou “ciclo-cultural" alemã é 
representada nomeadamente por Fritz Graebner (1877-1934). Conservador do Museu de 
Colônia em 1900, inspirou-se em técnicas museográficas de classificação dos objetos e 
dos estilos para formular os principais conceitos difusionistas: um complexo cultural 
(Kulturkomplex) constitui um conjunto de traços unidos por um elo orgânico. A 
identificação em diversas regiões do mundo de complexos culturais idênticos levou à 
definição do círculo cultural (Kulturkreis) a partir dos quais estes complexos foram 
repartidos. O círculo cultural é considerado como a forma mais complexa de uma 
instituição, enquanto os complexos culturais resultam de migrações e de aquisições a 
partir deste centro comum. A difusão é o processo que gera os contatos entre as diferentes 
culturas e a circulação de características culturais. 
Assim definido, o método histórico-cultural conduz a vastas acumulações 
de materiais (empreende-se o levantamento de uma carta mundial de difusão a partir de 
alguns centros originais). Em alguns casos permite descobrir parentescos culturais entre 
sociedades muito afastadas. 
Nos Estados Unidos, são forjadas definições que completam a 
terminologia difusionista. A área cultural é uma área no centro da qual se encontram as 
características dominantes de uma sociedade; na sua periferia estas características 
misturam-se com características provenientes de áreas vizinhas. Esta noção visa dotar as 
características culturais ao avaliar a distância que as separa do seu centro de produção. 
Do mesmo modo é definido o “modelo cultural” (cultural pattern) que 
designa o conjunto dos mecanismos pelos quais dada sociedade se adapta às suas 
condições gerais de existência. Estas distinções feitas por investigadores como Alfred 
Louis Kroeber atraíram a atenção dos antropólogos para a maneira como se efetuam os 
 7 
contatos entre culturas. 
Em particular sublinham a importância no processo de aculturação do 
grupo receptor que seleciona e reinterpreta os elementos culturais estranhos em função 
das suas necessidades. Nota-se o interesse de tais concepções que excluem qualquer 
interpretação mecanicista da difusão cultural. 
Mais contestáveis parecem hoje os trabalhos da escola hiperdifusionista 
inglesa, denominada também por vezes heliocêntrica ou pan-egípcia. Ela situa no Egito o 
foco único de todas as culturas existentes. As viagens dos Egípcios (os “Filhos do Sol”, 
segundo o título de uma obra de William James Perry, um dos fundadores dessa escola) 
teriam difundido as características da cultura egípcia em todas as regiões do mundo. 
Considera-se hoje que esta teoria constitui apenas uma caricatura do Difusionismo. 
No Campo 
O desenvolvimento das investigações de inspiração difusionista foi 
acompanhado de uma ,redefinição das tarefas da Antropologia. Com o recenseamento de 
características culturais ganha crédito a idéia de que a acúmulo de materiais, até agora 
efetuada por não especialistas, constituiu uma fase importante do trabalho cientifico. 
Enquanto na época evolucionista as informações sobre as sociedades não industriais 
provinham, salvo raras excepções, de observadores não formados na disciplina, os 
antropólogos difusionistas organizavam campanhas de investigação para verificar e 
completar os conhecimentos já adquiridos, 
Em 1899, Alfred Cort Haddon conduziu uma expedição inglesa aos 
confins da Austrália e da Nova Guiné. Entre os seus colaboradores, encontrava-se 
Charles Gabriel Seligman, que efetuou, cerca de 1909, um inventário étnico das 
populações nilóticas, e William Haise Rivers, que em seguida fez uma estada na Índia e 
elaborou as primeiras técnicas modernas de pequisa de campo. 
O continente americano foi dividido em áreas culturais que os 
antropólogos percorriam: foi assim que Franz Boas acumulou um volume enorme de 
informações sobre os Kwakiutl, população da costa ocidental dos Estados Unidos. Robert 
Lowie fez uma estada entre os índios das planícies do centro. Alfred Kroeber entre as 
tribos do Sudoeste. Depois de 1918 as expedições de campo multiplicaram-se na África. 
Entre 1900 e 1930 os difusionistas reuniam uma documentação de riqueza 
excepcional. Porém, a abundância desta recolha levantou numerosas dificuldades 
teóricas: a noção de “característica” cultural foi difícil de definir e levou alguns 
antropólogos a estudar as sociedades apenas sob o aspecto das realizações materiais 
(habitat, costumes, etc.). Outros fizeram listas intermináveis de traços heteróclitos e 
estabeleceram entre eles relações puramente formais. Enfim, o estudo descritivo parece 
ser um fim em si quando nenhuma tentativa de síntese o acompanha, como acontece no 
caso de Franz Boas. É contra esta atomização da realidade social que reagiram os 
fundadores ingleses do funcionalismo. 
Funcionalismo 
A corrente funcionalista em Antropologia é inseparável do nome de 
Bronislaw Malinowski (1884-1942), que definiu assim o seu princípio: cada cultura 
representa um sistema de que todos os elementos são solidários. Por conseguinte não são 
 8 
estudados separadamente, fora do seu contexto, esquecendo o papel desempenhado por 
um rito, uma característica cultural ou uma técnica no funcionamento global de uma 
sociedade. “Em todos os tipos de civilização, cada costume, objeto e crença desempenha 
qualquer função vital, tem qualquer tarefa a realizar, representa uma parte indispensável 
do aparelho”. 
A teoria funcionalista apoia-se inteiramente na noção de necessidade: 
Malinowski recorda sem cessar que os homens constituem uma espécie animal. No 
âmago de qualquer instituição propõe investigar o organismo humano, vivente, 
palpitante, feito de carne e de sangue. As necessidades fisiológicas (alimentação.reprodução, metabolismo, proteção, etc.) determinam imperativos fundamentais. A sua 
satisfação não deixa contudo o indivíduo isolado face ao meio ambiente: a cultura é um 
verdadeiro meio secundário. Assim, surgem imperativos derivadas (Malinowski 
denomina-os também do instrumentais). O conjunto das instituições regulamenta as 
impulsões primarias e orienta a sua satisfação: a família, nomeadamente, verdadeira 
placenta social, nutre o indivíduo biológico com qualquer aquisição cultural do grupo e 
modela-o à sua imagem. 
A um terceiro nível, Malinowski considera a magia, a religião, a ciência 
como imperativos integrantes, cuja função consiste em manter a coesão do grupo. 
Reconhecendo neste ponto a contribuição do bahaviourismo, Malinowski recusa-se a 
abandonar o campo dos fatos observáveis. Censura aos evolucionistas no seu desejo de 
reconstituir o passado das instituições, a sua explicação da realidade pelo imaginário. 
As investigações difusionistas de Fritz Graebner, Leo Frobenius e 
Wilhelm Schmidt sobre a difusão das características culturais suscitam a zombaria de 
Malinowski. Segundo ele, o seu método eqüivale a investigar, em determinada cultura, as 
técnicas ou as instituições que se acomodam mal com a estrutura de conjunto e parecem 
assim adquiridas a uma civilização vizinha. Malinowski considera um erro de base 
cingir-se assim, para cada objeto, às qualidades que nada tem de comum com o seu fim e 
os seus empregos. 
Segundo Malinowski. a ciência do comportamento humano começa com a 
organização. A Antropologia, disciplina comparativa por excelência, deve portanto 
encarar, não praticas arbitrariamente isoladas devido ao seu caracter exótico, mas 
instituições: sistema de educação, de produção, costumes, e regras jurídicas, poder 
político. 
Malinowski declara ter-se limitado a introduzir na Etnologia o termo 
“função”, já utilizado em matemáticas por Leonhard Euler no século XVIII, depois no 
século XIX por Claude Bernhard em fisiologia, bem como em direito a em Economia Os 
mais célebres funcionalistas são Tylor, quando correlaciona as relações de parentesco e a 
vida econômica, Durkheim na sua análise das funções da vida religiosa, e Frazer quando 
substitui a crença e os ritmos totêmicos no contexto e na organização social de cada tribo. 
Malinowski mostra-se pelo contrário muito severo com Ruth Benedict, que se satisfaz 
com noções sumárias no que se refere ao gênio tribal dos grupos ou com Lewis Morgan, 
que trata as nomenclaturas de parentesco como sobrevivências, desdenhando do seu papel 
funcional. 
 9 
Malinowski e Radcliffe-Brown 
Ao termo funcionalismo esta ligado o nome do antropólogo inglês de 
origem polaca Bronislaw Malinowski. A análise funcional que ele enceta salienta as 
interferências entre diversos setores da realidade. A explicação dos fatos antropológicos 
consiste em esclarecer a maneira como eles estão ligados uns aos outros e a sua função 
relativamente ao conjunto de uma cultura. 
A fecundidade do método está plenamente ilustrada numa obra de 
Malinowski publicada em 1922, “Os Argonautas do Pacífico Ocidental”. Estudando uma 
instituição particular das ilhas Trobriand denominado “kula” na língua dos indígenas 
(trata-se da troca de objetos preciosos em vasta escala), Malinowski demonstrou que não 
se poderia compreender o funcionamento do “kula” sem ter em conta a tecnologia (pesca, 
industria de conchas, etc.), o sistema de organização social, a ideologia e a magia. 
A acumulação de dados, que designa o termo etnografia, deve levar à 
elaboração de documentos como genealogias, quadros de termos de parentesco, cartas, 
etc. Ao lado destas regras. normas e instituições que correspondem à imagem oficial que 
uma sociedade faz de si mesma, o antropólogo deve estudar o funcionamento real do 
sistema social através dos “imponderáveis da vida autentica”, comportamentos e atitudes 
dos indígenas. 
Esta espécie de análise exige que o investigador se dedique à “observação 
participante”, no sentido físico mas sobretudo psicológico da expressão. Trata-se com 
efeito de se libertar de qualquer forma de referência à cultura ocidental. a fim de 
compreender do interior as mentalidades e os valores estudados. Só esta recusa do 
etnocentrismo pode permitir uma investigação global e científica. 
Pela sua concepção da análise funcional concebida como uma verificação 
empírica incessante e multidimensional Malinowski renova numerosos setores de estudo 
da Antropologia. Mas apesar da originalidade da sua contribuição, foi alvo de numerosas 
críticas devido ao seu biologismo. O seu esforço para construir uma “teoria científica da 
cultura” (título de uma das suas obras. publicada em 1944) levou-o a afirmar a primazia 
das exigências fisiológicas (supostamente universais) do homem. Qualquer sistema 
cultural seria uma resposta a algumas necessidades fundamentais, de que Malinowski 
elaborou uma lista pouco convincente. 
Adquirindo uma certa tendência para o dogmatismo, que se afirmou nos 
últimos anos da sua vida, Malinowski chegou por outro lado a descurar a existência de 
conflitos na vida das sociedades primitivas. Este optimismo o fez menosprezar os 
elementos internos, isto é, não funcionais, de que é portadora qualquer cultura. 
“Os Argonautas do Pacífico Ocidental” 
A obra publicada por Bronislow Malinowski em 1922. intitulado 
“Argonauts of the Western Pacific” (Os Argonautas do Pacífico Ocidental), inicia uma 
nova era da etnografia. Renunciando as descrições livrescas. o autor relata as observações 
que pode fazer no decurso de uma longa estada nas ilhas Trobriand, arquipélago situado a 
nordeste da Nova Guine. Nesta relação, Malinowski conseguiu evitar os dois escolhos 
que então ameaçavam a Antropologia: dizer tudo com a sobrecarga de uma enorme 
compilação a maneira de Franz Boas; fazer uma seleção arbitrária ao ceder como Edward 
 10 
Westermarck e James Frazer, às atracões do exotismo. 
Malinowski desenvolveu a sua descrição em torno de uma prática de 
comércio simbólico o “kula”. Os chefes trobriandeses deslocam-se periodicamente de um 
“atoll” para outro para trocar bugigangas sem valor mercantil: braceletes de cobre, 
conchas, colares. Os objetos seguem assim um trajeto circular, indo alguns de oeste para 
este, seguindo os outros o caminho inverso A única proibição consiste em receber sem 
dar. 
Pode-se dar diversas interpretações a este estranho comportamento. bem 
distinto das trocas verificadas num mercado real. Observando que um sexo simbólico é 
atribuído aos objetos trocados, certos etnólogos pensaram numa sobrevivência de 
casamentos por rapto. Nota-se, com efeito, que os rituais do “kula” se assemelham em 
todos os pontos às cerimônias que selam as alianças entre tribos ou o restabelecimento da 
paz entre elas. O sistema parece aliás ligado à estabilidade das chefaturas, dependendo o 
poder político em cada uma das ilhas do arquipélago do sucesso alcançado por esta troca 
simbólica. 
O estudo minucioso feito por Malinowski sobre a natureza das dádivas das 
contradádivas, da equivalência aos presentes, dos prazos concedidos para quaisquer 
reciprocidade, etc. fez do “Kula” um dos clássicos da descrição etnográfica, do mesmo 
modo que os ritos de iniciação dos Bambara, o totemismo dos Arunta ou a incubação dos 
índios Caribe. Malinowski opera um verdadeiro “corte transversal na sociedade 
trobriandesa” ao analisar em torno do “Kula” a repartição das colheitas, as relações de 
parentesco, a organização da chefatura, o papel da magia, etc. O inquérito forneceu a 
Marcel Mauss o assunto de “Essai sur le don”. 
O papel capita1 da magia constitui o segundo polo da monografia de 
Malinowski. Como Bergson. o autor de “Os Argonautas do Pacífico Ocidental” vê na 
magia ummeio de preencher as lacunas do saber prático A vida trobriandesa está 
impregnada de rituais diversos: a construção das pirogas, a navegação, a pesca, a dança, a 
cultura de inhames, etc., eram acompanhados de cerimônias e de cantos. Dois fatores 
explicariam esta atmosfera mística: o medo do perigo, por um lado, pois contrariamente 
as saídas para o mar alto, a pesca na laguna não suscita qualquer ritual particular: os 
dados sociais por outro. 
Segundo Malinowski, que a sua chegada encontrou apenas doze europeus 
no arquipélago, a sociedade trobriandesa no início do século XX teria sido fortemente 
protegida de influencias ocidentais. No entanto, por mais diminuta que seja, a presença de 
estrangeiros bastava para provocar um fenômeno de aculturação ao encorajar a pesca de 
pérolas, pouco praticada até aí pelos indígenas 
O mesmo anti-historicismo caracterizou o pensamento de outro grande 
antropólogo, Altred Radcliffe-Brown. Este também salientou sobretudo a noção de 
função, mas definiu-a independentemente de qualquer teoria das necessidades biológicas 
e num sentido estritamente sociológico 
A sua obra esclarece de maneira original os problemas antropológicos do 
parentesco, no qual vê um sistema de relações de oposição e de complementaridade. As 
próprias atitudes familiares só podem ser compreendias umas em relação às outras, em 
 11 
função dos princípios estruturais que as organizam: princípio de equivalência dos irmãos 
(o que explica os costumes do levirato ou casamento de uma viuva com o irmão do 
marido defunto), da unidade da linhagem, de cumplicidades estabelecidas segundo a 
alternância das gerações. 
Este último princípio permite explicar que a atitude de respeito filia! de 
que dão testemunho as crianças nas numerosas. sociedades se opõe uma atitude de 
familiaridade, até mesmo de troca relativamente aos avós e a toda a geração anterior à 
dos pais. A novidade destas análises conduziu a Antropologia às suas vias mais 
modernas. 
Cultura e personalidade 
Paralelamente ao funcionalismo inglês desenvolveu-se nos Estados 
Unidos uma viva reação antidifusionista. Começou em 1936 com os trabalhos de Edward 
Sapir (1884-1939). Na escolha de artigos que forma a sua “Antropologia”, este adverte os 
investigadores contra o próprio conceito de difusão. O estudo da distribuição geográfica 
da cultura deve ter em conta, segundo ele, fatos como a migração, descurada pelos 
difusionistas, e índices fornecidos pela lingüistica . 
A língua de um povo oferece, com efeito, um campo de investigarão 
particularmente favorável tanto no seu vocabulário como na sua sintaxe a língua contém 
as marcas dos acontecimentos que modelaram a história do grupo Sapir abriu assim 
caminho a uma verdadeira etnolingüística. 
A questão que abordou, relativa às relações entre o indivíduo e as normas 
culturais, aparece como fio condutor de um conjunto de estudos que integram na 
Antropologia as aquisições da Psicologia e, depois de 1930, da psicanálise. Trata-se de 
rodear os “patterns", ou configurações características de uma cultura, e de as fazer 
corresponder a um tipo de personalidade: 
Este método é ilustrado como uma certa fantasia poética pelos trabalhos 
de Ruth Benedict ( 1887 1948). Na sua obra “Padrões de Cultura” (Patterns of Culture), 
publicada em 1934. esta opõe duas civilizações: uma “apolínea”, que se observa entre os 
índios Pueblos, é marcada pela moderação e pela paz: a outra, qualificada de 
“dionisíaca”, encontra-se entre os índios das planícies dos Estados Unidos e está baseada 
na luta e na competição A primeira corresponde a um tipo de homem conformista e 
equilibrado: a segunda a um tipo agressivo e ávido de emoções 
Com mais rigor, Margaret Mead tenta uma demonstração comparável na 
Nova Guine, onde fez uma estada de 1925 a 1933. O estudo de três tribos permite-lhe 
estabelecer o seguinte fato: os papéis sociais do homem e da mulher (e os temperamentos 
que daí resultam) variam segundo a organização cultural própria de cada grupo. Os 
resultados deste inquérito foram publicados sob os títulos “Growing up in New Guinea” 
(1930) e “Sex and temperament in three Primitive Societies” (1935). 
Coube a Ralph Linton a elaboração de uma teoria completa das relações 
entre personalidade e cultura. Desde 1936, no seu livro “The Study of Man”, analisou os 
mecanismos que integram o indivíduo ao sistema social: uma série de modelos, de que o 
indivíduo médio não tem consciência, dita os comportamentos em função do estatuto 
social. Cada indivíduo adquire assim, por meio da educação, uma personalidade 
 12 
estatutária que assegura a sua inserção social com maior ou menor êxito. 
Em 1946, em resultado da sua colaboração com o psicanalista Abraham 
Kardiner e com Cora Du Bois, Linton propos o conceito de personalidade de base, tipo 
social julgado normal numa sociedade e relativamente ao qual se definem os 
comportamentos de inadaptação ou de desvio (a loucura não tem o mesmo rosto em todas 
as sociedades). Linton salienta que diversas personalidades de base podem coexistir no 
interior do mesmo sistema de normas. Ele liga esta noção à de classe social. Por não 
terem conservado estas distinções alguns dos seus discípulos culturalistas não têm feito 
outra coisa senão reiterar com novas palavras, os lugares comuns mais tradicionais sobre 
a "alma" ou o "gênio" dos povos 
A Etnologia francesa 
O estudo das sociedades não industriais seguiu em França uma via própria. 
O próprio termo “Antropologia” foi utilizado para designar os trabalhos de descrição e de 
classificação dos grupos raciais, esforço que constituiu a preocupação máxima na 
segunda parte do século XIX (Paul Broca, Armand Quatrefages, Josepha Deniker) Foi 
sob o termo “Etnologia” e em relação bastante estreita com a Sociologia que se constituiu 
uma ciência do homem primitivo nos primeiros anos do século XX. 
Os fundadores da Etnologia francesa foram sociólogos que integraram a 
documentação acumulada sobre os povos primitivos numa reflexão global sobre a 
sociedade. A obra de Emile Durkheim é particularmente representativa de tal orientação. 
Este apresentou o princípio da especificidade do fato social, que não se poderia reduzir às 
suas repercussões psicológicas, e definiu um método de trabalho assente na comparação 
dos fatos sociais num meio homogêneo. 
O interesse deste método está claramente patente em “Les Formes 
élementaires de la vie religieuse” (1912) Estudando o totemismo na Austrália, Durkheim 
demonstrou que ele tem como efeito recrear periodicamente os elos de coesão e de 
continuidade que constituem a sociedade. A religião tem, neste caso, uma função de 
integração de grupo e uma finalidade comunitária. Estas idéias foram retomadas e 
exploradas pelos funcionalistas, e, em particular. por Radcliffe-Brawn. Toda uma 
corrente da Antropologia britânica, com Evans-Pritchard em primeiro plano encara 
doravante as tribos primitivas como microssociedades, cujas instituições podem ser 
facilmente analisadas. Esta Antropologia social é definida como uma “microsociologia” 
Em França, foi dada ainda durante muito tempo preferência à 
paleontologia e à pré-história. Paul Rivet (1876-1958), fundador do Musée de l'Homme, 
deplorava que os seus contemporâneos assimilassem a sua disciplina apenas ao estudo 
dos crânios 
A escola durkheimiana não estabeleceu qualquer dissociação entre a 
cultura primitiva e as mentalidades contemporâneas (que julgava diferentes sem dúvida, 
mas sem oposição de natureza). Ao contrário, Lucien Lévy-Bruhl (1875 – 1939), autor de 
“La Mentalite primitive”, mais filosofo do que sociólogo ou etnólogo, opunha o 
pensamento primitivo “místico e pre-lógico” à mentalidade moderna, que seria racional e 
lógica. O valor cientifico daobra é bastante contestado hoje, mas o seu método parece ter 
influenciado duradouramente os etnólogos franceses, que se apaixonaram pelos aspectos 
 13 
mais exóticos da vida primitiva, como o xamanismo os ritos da magia ou as cerimônias 
de iniciação. 
Estruturas e sociedades 
Marcel Mauss é geralmente considerado como o verdadeiro iniciador da 
Antropologia francesa moderna. Sobrinho e discípulo de Durkheim formou toda uma 
geração de investigadores: Denise Paulme, que publicou em 1947 o essencial do curso de 
Mauss sob o título “Manuel d'ethnographie”; Claude Lévi-Strauss, que reeditou em 1950 
alguns estudos do mestre sob o título de “Socialogie et Anthropologie”; Marcel Griaule, 
que organizou entre 1931 e 1933 uma primeira grande expedição antropológica de Dacar 
a Djibuti (o que dá uma idéia do atraso da Antropologia francesa de campo) e está na 
origem do livro de Michel Leiris “L'Afrique fantôme” diário de viagem da missão 
No seu “Essai sur le don”, Marcel Mauss põe em evidencia o princípio de 
reciprocidade que é a própria base da economia primitiva. A instituição do potlatch, que 
se observa na Polinésia, na Melanésia e no Noroeste americano, ilustra a importância da 
troca na vida social. A obrigação de dar e de receber afeta o conjunto das representações 
e dos comportamentos. O fato social deve por conseguinte ser estudado como um “fato 
total”, e os valores só tem significado em função uns dos outros. Neste emprego, o termo 
“função” tem um sentido matemático, e não empírico, como em Malinowski: com ele 
designa os serviços prestados pelas instituições à sociedade. 
O nome de Claude Lévi-Strauss domina a Antropologia francesa 
contemporânea. A sua obra constitui um esforço ininterrupto para enunciar as leis de 
funcionamento das sociedades primitivas. Desde a sua primeira obra de síntese, “Les 
Structures élémentaires de la parenté”, sistematiza a teoria da reciprocidade já enunciada 
por Marcel Mauss. A lógica do dom explica em particular a regra de proibição do incesto, 
universalmente confirmada: a proibição de desposar a mãe, filha ou a irmã é o “inverso 
de uma prescrição positiva”, que é a obrigação de dar a outrem filhas e irmãs com a 
obrigação de reciprocidade (lei da exogamia). 
O mesmo princípio permite a Claude Levi-Strauss reduzir a extrema 
diversidade das regras de casamento e de parentesco a alguns tipos de troca de mulheres. 
Contrariamente à utilização que dela fez Alfred Radcliffe-Brawn, a noção 
de estrutura na Antropologia estrutural de Lévi-Strauss não corresponde a qualquer 
realidade empírica. A estrutura aplica-se a modelos, construídos a partir de relações 
sociais diretamente observáveis e constituídas em sistemas. As leis de transformação de 
modelos são previsíveis, de modo que a Antropologia pode desprender uma espécie de 
arquitetura lógica que constitui a própria ordem das coisas. Trata-se de “fazer um 
inventário dos limites mentais, de reduzir os dados aparentemente arbitrários a uma 
ordem, de alcançar um nível em que uma necessidade se revela imanente nas ilusões da 
liberdade". 
As próprias instituições são tidas como a expressão de uma lógica, de um 
pensamento selvagem; a análise estrutural faz aparecer curiosas complementaridades 
entre dois sistemas considerados como opostos: o culto dos totens e a organização em 
castas, 
Os trabalhos de Claude Lévi-Strauss não renovaram apenas o estudo dos 
 14 
fenômenos. Com a colaboração de outros estruturalistas, como Lucien Sebag, tenta 
reconstituir o conjunto do sistema analógico em que se situam os mitos. 
Antropologia estrutural 
As figuras pintadas com que os índios Caduveo do Brasi1 ornam o rosto 
sugeriram a Claude Lévi-Strauss uma comparação com os jogos de cartas. Esta analogia 
ilustra a hipótese fundamental da Antropologia estrutural: cada cultura representa uma 
aplicação original de regras universais à maneira de um jogo que permite uma infinidade 
de combinações. Assim, na sua variedade, os sistemas de parentesco explicam-se por 
todo o lado pela proibição do incesto. Nenhuma sociedade é exatamente semelhante a 
outra, mas todas se constroem segundo as mesmas leis. A sua efetivação suscita o 
aparecimento de estruturas elementares, que o antropólogo pode reconstruir: os regimes 
matrimoniais organizam-se em conformidade com um numero limitado de modelos. Para 
lá da diversidade de civilizações desenha-se um repertório ideal. 
Claude Lévi-Strauss serve-se, no que toca a lingüistica, dos seus métodos 
e dos seus princípios de análise. Do mesmo modo que Ferdinand de Saussure recusava 
procurar fora da língua as leis do seu funcionamento, Lévi-Strauss critica vigorosamente 
o determinismo de Malinowski que pretende explicar as estruturas sociais pelas 
necessidades biológicas. Compara, quanto a ele, os diferentes aspectos da vida social a 
sistemas autônomos de símbolos. estruturados sobre o modelo da linguagem. O 
casamento é uma comunicação de mulheres, como a linguagem é uma comunicação de 
mensagens ou a Economia uma comunicação de bens. 
O método estrutural quer libertar o antropólogo de um antigo dilema: a 
descrição minuciosa das sociedades proíbe as generalizações, mas as analises 
comparativas sacrificam os pormenores específicos. Para Lévi-Strauss é a própria riqueza 
dos pormenores etnográficos que autoriza a explicação coerente. Na análise dos mitos ou 
dos sistemas de parentesco as estruturas são reconstituídas graças aos desvios 
significativos. Tal abordagem não fundamenta a universalidade dos símbolos no seu 
conteúdo, como no caso dos arquétipos de Carl Gustav Jung. De um modelo para outro é 
pelo contrario a variação que merece ser estudada. Duas versões de uma narrativa são 
interpretadas como a transformação de um mito segundo regras a determinar Os trabalhos 
de Georges Duméril sobre a estrutura tripartida das religiões indo-europeias ou a análise 
do sistema de castas na Índia por Louis Dumont participam da mesma tendência. 
Paradoxalmente, a escola estruturalista reconhece a sua dívida para com os 
nominalistas americanos (Boas, Lowie) cujas descrições, exatas mas atomizadas, 
privilegiam as características específicas de cada cultura. O método de Lévi-Strauss 
caracteriza-se por um movimento constante do vivido para o racial. Os modelos abstratos. 
distintos da realidade de que dão conta, apoiam-se num respeito meticuloso dos fatos. 
Etnólogos como D. Sperber, Robin, Fox ou Edmond Ronald Leach 
admiram, na análise estrutural a fecundidade das formalizações matemáticas. Leach 
preconiza o desenvolvimento da Antropologia numa verdadeira álgebra das relações 
(topologia) totalmente liberta das categorias clássicas de descrição. Os trabalhos de 
Malinowski ou de Radclifffe-Brown não passam, diz ele, de tipologias estéreis. Mas 
Leach censura a Lévi-Strauss a falta de gosto pela pesquisa de campo. que o impede de 
apreender os conflitos latentes em cada sociedade. Do mesmo modo Jean-Paul Sartre 
 15 
acusou algumas vezes o estruturalismo de afastar a História das suas descrições. 
Antropologia social 
A Antropologia social analisa as instituições que regem o comportamento 
humano: família, parentesco, sistema de culturas, regime político, culto religioso. 
Distingue-se nitidamente da Antropologia física que estuda o homem unicamente sob o 
seu aspecto biológico. 
A primeira cadeira de Antropologia social é atribuída a James Frazer, em 
Liverpool (em 1908). Porem, só em 1950 Ralph Piddington, Siegfried Frederick Nadel e 
Edward Evan Evans-Pritchard deram a esta disciplina a sua autonomia científica. 
Diferentemente do sociólogo, que no estudo das sociedades modernas deve encarar 
separadamente os fenômenos (divorcio, criminalidade, lazeres), o antropólogo dedica-se 
ao fato socialglobal. A sua análise tem como objeto de preferência. as populações 
primitivas, de pequenas dimensões. A Antropologia britânica pode ser definida como 
uma microsociologia. De resto, Evans-Pritchard introduziu uma distinção entre os 
objetivos fundamentais da Antropologia social, que analisa os sistemas de instituições, e 
a Etnologia cuja missão consiste em classificar as populações segundo as suas 
características raciais e culturais. Um etnólogo reconstitui a História dos contatos e das 
migrações, um antropólogo compara tipos de sociedade. 
Tradicionalmente os antropólogos britânicos (Malinowski, Fortes, Evans-
Pritchard, Radclffe-Brown) especializaram-se no estudo de um pequeno numero de 
sociedades, graças a estadas prolongadas no campo. Este método intensivo levou-os a 
encarar as estruturas sociais como sistemas perfeitamente integrados e em seguida a 
estabelecer tipologias. 
Seguindo o exemplo de Franz Boas, os investigadores americanos 
adotaram um ponto de vista mais enciclopédico. Longe de fazer abstração do pormenor 
dos costumes, preferiram os grandes inquéritos as analises estruturais. A ignorância dos 
idiomas vernaculares e a falta de trabalho de campo explicam, segundo Evans-Pritchard, 
o fato de a escola americana se dedicar sobretudo às manifestações culturais (idiomas, 
costumes, utensílios, “habitat”) em prejuízo da organização social. Assim se encontra 
definida uma Antropologia cultural a que Melville Jean Herskovits deu os seus 
fundamentos teóricos. Confunde-se em França, sob o termo único de “Etnologia”, a 
Antropologia social britânica e a Antropologia cultural americana. 
Evans-Pritchard definiu paradoxalmente a Antropologia social como uma 
arte, mais próxima das humanidades que das ciências naturais. O antropólogo. diz, não é 
um físico: ele não poderia pôr em evidência verdadeiras leis, pois as sociedades definem-
se mais como sistemas simbólicos do que como sistemas orgânicos. Não deve por 
conseguinte, como exigem os funcionalistas, limitar-se a uma descrição sincrônica: o 
conhecimento do seu passado é indispensável para compreender uma comunidade. O 
trabalho da Antropologia tem como finalidade interpretar, de preferência a explicar, 
dedica-se mais às estruturas do que às leis. 
As sociedades sem escrita constituem o domínio de estudo privilegiado, 
mas não exclusivo, da Antropologia social. É bem um olhar de etnólogo que lançam 
Oscar Lewis, Michel Croce Spinelli ou James Perry sobre certas camadas sociais, ao 
 16 
analisarem os fenômenos de aculturação nas nossas sociedades industriais 
contemporâneas. 
A Antropologia política 
Pode-se censurar a Lévi-Strauss, embora ele o tenha sempre negado, a 
exclusão da história do campo da Antropologia. Foi também em parte como reação à sua 
obra que se constituiu uma Antropologia política, que coloca os abalos históricos no 
próprio âmago da disciplina. 
Toda a Antropologia tem uma dimensão política. Isto é evidente no que se 
refere à Antropologia “aplicada”, que se generaliza quando as administrações coloniais 
utilizam (sobretudo nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha) os conhecimentos 
antropológicos no desejo de manter eficazmente a sua tutela. Mas isto parece ser 
verdadeiro também no que toca à personagem do antropólogo, que é (como o colonizador 
ou o missionário) um produto da expansão mundial do capitalismo. Assim, é através da 
mera convenção de linguagem que se usa exclusivamente à denominação de 
Antropologia política para designar uma corrente de investigação que se desenvolve por 
volta de 1940. 
É nessa data que se publica a obra dos ingleses Mayer Fortes e Edward 
Evan Evans-Pritchard, “African Political Systems” Uma primeira tentativa de 
classificação dos sistemas políticos primitivos encontra ai expressão. Na mesma altura, 
Evans-Pritchard publica o seu livro “The Nuer”, em que descreve a organização social 
como um estado de “anarquia ordenada". Esta análise, que dá um lugar prioritário aos 
fenômenos de dinamismo (entre os Nuer um grupo só existe na sua relação de oposição a 
outros grupos) devia encontrar largo eco em numerosos antropólogos ingleses. Isto 
acontece nomeadamente com Edmund Leach. 
Segundo ele, a ilusão funcionalista, que faz que se encare qualquer 
sociedade primitiva como um conjunto harmoniosamente equilibrado, é proveniente das 
próprias condições de trabalho do antropólogo. Durante uma estada de um ano ou dois no 
máximo entre determinada população, este não tem tempo de conhecer nem o passado 
nem aspectos ocultos e conflituais da sociedade que estuda. Assim, é levado, para 
disfarçar as lacunas da sua informação, a insistir nas considerações de equilíbrio e a 
valorizar as formas de solidariedade. 
As mesmas insuficiências estão na origem de todos os trabalhos que 
apresentam as sociedades primitivas como sociedades sem história. Contra esta 
simplificação, Leach incita a jamais descurar a instabilidade dos equilíbrios 
sociopoliticos. 
O método adotado por Leach tem como objetivo fazer sobressair o 
dinamismo inerente às estruturas. Por este motivo é qualificado de dinamista. Na França, 
é aplicado por Georges Balandier (nascido em 1920) ao domínio africano. Tudo se passa 
como se a problemática tradicional da Antropologia fosse reinterpretada por estes 
investigadores em função de uma variável fundamental, durante muito tempo ignorada, o 
poder político, que existe igualmente nas sociedades sem Estado e que é base real das 
relações de parentesco, de ficções míticas ou religiosas. Daqui resulta uma abordagem 
nova de todas as práticas indígenas: estas já não são consideradas como atitudes de 
 17 
conformismo com regras preestabelecidas, mas como estratégias que põem em jogo o 
capita! econômico e social dos agentes em presença. 
A Antropologia econômica 
Ao postular a necessidade de uma Antropologia econômica Maurice 
Godelier não tem a intenção de fundar uma nova disciplina: tenta pelo contrario superar 
os compartimentos, “fetiches” e as divisões arbitrárias entre ciências humanas: História, 
Sociologia, Antropologia e Economia. Refere-se aos fundadores do Evolucionismo. 
Edward Tylor e Lewis Morgan que estenderam uma ponte entre os dois domínios 
específicos da Antropologia: as sociedades sem escrita e o folclore regional da Europa, 
onde se exprimem igualmente sobrevivências de modos de produção pre-capitalistas. 
E esta diversidade de formações socioeconomicas que os antropólogos, 
segundo Godelier, devem analisar adotando resolutamente uma perspectiva histórica. 
Toma a sua conta a tese de Marx, segundo a qual o modo de produção da vida material 
condiciona o processo da vida social, política e intelectual; propõe nesta base uma 
avaliação geral do campo da Antropologia 
Os etnólogos mostraram sempre um certo interesse pelos fatores 
econômicos. É o caso em especial de Bronislaw Malinowski relativamente aos 
Trobriandeses (1922), de Raymond Firth, aos Polinésios (1939), de Edward Evans-
Pritchard, aos Nuer do Sudão (1940) ou de Louis Dumont, no seu estudo sobre as castas 
hindus (l966). Mas no total, salienta Andre Leroi-Gourhan, conhece-se melhor as trocas 
de prestigio que as trocas quotidianas, as prestações rituais que os serviços banais. 
No capitulo final da sua obra “Horizons, Trajets marxistes en 
Anthropolagie” (1973). Maurice Godelier critica o método funcional, inaugurado por 
Malinowski, retomado por Evans-Pritchard Firth ou Nadel. Com efeito estes separam 
cuidadosamente o estudo da Economia do da organização social das tribos primitivas. 
Mas tal distinção fundamenta-se, segundo ele, num duplo erro. Primeiro do que tudo 
dissecar assim as comunidades indígenas eqüivale a projetar sobre as comunidades 
indígenas as categorias próprias da nossa civilização:é uma marca de etnocentrismo. Em 
seguida, observa Godelier, o seu método traduz uma confusão entre as relações sociais 
visíveis e as estruturas reais subjacentes que só um estudo cientifico global pode revelar. 
Este empirismo leva os funcionalistas a considerar a produção e a circulação de bens 
materiais como subordinadas ao quadro institucional: parentesco, sistema político, 
religião 
Entre os economistas americanos duas escolas defrontam-se relativamente 
às sociedades primitivas. Para os formalistas. o homem deveria em toda a parte superar a 
penúria dos meios de vida disponíveis. Concordam assim com Malinowski a difícil 
satisfação das necessidades fisiológicas determinaria constantes no comportamento 
humano Os substantivistas são sensíveis pelo contrario à diversidade dos sistemas 
econômicos. 
Godelier patrocinou a publicação de uma antologia de textos “Un domaine 
conteste l’Anthropologie économique” (1974). Dois outros volumes deviam abordar o 
estudo de fenômenos como o “potlach”, as moedas primitivas, a organização do Estado 
Inca. A ambição de Maurice Godelier era apagar as fronteiras entre a História e a 
 18 
Antropologia. 
Durante muito tempo relegada para segundo plano, a análise dos fatos 
econômicos é objeto após uma vintena de anos de uma atenção cada vez maior, em 
particular da parte dos antropólogos marxistas, que se esforçam por transpor os esquemas 
do materialismo histórico para o estudo das sociedades primitivas. Os principais métodos 
desta Antropologia econômica estão expostas na obra de Maurice Godelier “Horizon, 
Trajets marxistes en Anthropologie” (1973). Através do estudo da divisão social do 
trabalho, das formas de produção, da troca e do consumo, esta escola propõe-se analisar o 
papel determinante, em última inst3ncia, da economia sobre a formação de estruturas 
sociais e de ideologias. E ao salientar a subordinação de todo o cultural ao econômico que 
este cometimento difere da Antropologia anterior. 
Com ela desenvolve-se o inquérito no campo, que se torna um trabalho 
coletivo e recorre a análises quantificáveis. A relação das terras e dos tempos de trabalho, 
a pesagem das colheitas, o exame dos modos de consumo exigem o auxilio de disciplinas 
afins como a pedagogia, a agronomia, a botânica No plano teórico, o estudo das 
economias primitivas faz sobressair a importância das preocupações culturais (procura de 
prestigio social, de bem-estar coletivo) nos comportamentos econômicos. Observa-se 
com efeito que os investimentos simbólicos- são tão necessários em inúmeras sociedades 
como os investimentos materiais, de que constituem uma forma transposta. 
Tais análises ultrapassam o campo especifico da Antropologia. Alguns 
economistas esperam que resulte dai um renovamento da economia clássica, que se 
constituiu unicamente com os materiais fornecidos pelas sociedades ocidentais. 
Para uma Antropologia geral 
No entanto, a própria validade de uma Antropologia foi posta em questão 
na interpretação do marxismo por Louis Althusser e na obra filosófica de Michel 
Foucault. Duvidando do valor epistemológico do conceito de homem, estes autores vêem 
na Antropologia não uma ciência mas uma ideologia. 
As obras críticas de antropólogos como Robert Jaulin traduzem um mal-
estar que se explica nomeadamente pela desaparição rápida das tribos primitivas que 
entraram em contato com o mundo ocidental. Apesar (e por vezes por causa) da 
organização de organismos de proteção como o I. N. I. no México, ou o F. U. N. A. I., no 
Brasil, as etnias amazônicas, e muitas outras, foram eliminadas pela chacina ou pelo 
etnocídio que triturou a sua cultura. Os Ona da Terra do Fogo constituem exemplo de 
uma civilização que desapareceu diante dos nossos olhos. 
Ameaçada pela desaparição progressiva das sociedades que foram 
inicialmente o objeto do seu estudo, a Antropologia tende então a relacionar com as 
sociedades modernas uma problemática elaborada em contato com povos arcaicos. Tal 
era nos princípios deste século o objetivo de Arnold Van Gennep (1873-1957). Uma 
dezena de anos depois, na mesma perspectiva, multiplicaram-se os trabalhos que 
incidiam sobre o folclore, o artesanato, a literatura oral, tão significativos tanto nos 
campos da Europa como nas savanas africanas ou nos gelos da Groenlândia. Disciplinas 
constituídas, como a história ou a Sociologia, começam assim a tirar partido dos métodos 
antropológicos. 
 19 
Procedentes de uma informação nas raízes, aquelas implicam com efeito 
uma abordagem direta e qualitativa da realidade. É também cada vez mais freqüente o 
fato de a observação etnográfica completar uma informação de natureza estatística, até 
mesmo de fornecer os elementos de uma interpretação original dos dados. 
A isso não se limita no entanto o interesse do método antropológico 
relativamente ao conjunto das ciências do homem: uma vez que incidiu exclusivamente, 
durante séculos, sobre civilizações estranhas, o olhar do antropólogo pode romper o 
etnocentrismo, o hábito da nossa própria cultura, e libertar-se de um condicionamento 
incompatível com a imparcialidade da análise científica. 
O interesse da atitude intelectual, que consiste em ver a realidade familiar 
com o olhar de um estranho, foi pressentido no século XVIII por Voltaire (Le Huron) e 
Montesquieu (Les Lettres persannes). Após um parêntese de dois séculos de expansão, no 
decurso dos quais a figura do outro se tornou a do primitivo, do exótico e do inferior, 
parece ter chegado o momento de as sociedades industrializadas voltarem este olhar 
crítico para si mesmas.

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